Processo:58/09.7PAMDL.P1
Data do Acordão: 02/03/2010Relator: ARTUR VARGUESTribunal:trp
Decisão: Meio processual:

Relativamente à pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor prevista no artigo 69º/1 al.a) do C.Penal, não é admissível a aplicação do instituto da suspensão nem o recurso à atenuação especial.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
ARTUR VARGUES
Descritores
INIBIÇÃO DA FACULDADE DE CONDUZIR SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA ATENUAÇÃO ESPECIAL DA PENA
No do documento
Data do Acordão
03/03/2010
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
REC. PENAL.
Decisão
PROVIDO PARCIALMENTE.
Sumário
Relativamente à pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor prevista no artigo 69º/1 al.a) do C.Penal, não é admissível a aplicação do instituto da suspensão nem o recurso à atenuação especial.
Decisão integral
RECURSO Nº 58/09.7PAMDL.P1
Proc. nº 58/09.7PAMDL, do 1º Juízo, do Tribunal Judicial de Mirandela


Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto

I - RELATÓRIO

1. Nos presentes autos com o NUIPC 58/09.7PAMDL, do 1º Juízo, do Tribunal Judicial de Mirandela, em processo sumário, foi o arguido B…………… condenado, por sentença de 15/04/09, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292º, nº 1, do Código Penal, na pena de 70 dias de multa, à taxa diária de cinco euros e na sanção acessória de inibição de conduzir qualquer tipo de veículo motorizado, especialmente atenuada, pelo período de um mês, nos termos dos artigos 72º e 69º, nº 1, alínea a), do mesmo diploma legal.

2. O Ministério Público não se conformou com a decisão e dela interpôs recurso, impetrando a sua revogação parcial e substituição por outra que considere a TAS como sendo de 1,38 g/l e condene o arguido na pena de 80 dias de multa, à taxa diária de cinco euros e ainda na pena acessória de inibição de conduzir qualquer veículo motorizado pelo período de três meses.

2.1 Extraiu o recorrente da motivação as seguintes conclusões (transcrição):

1. É o Instituto Português de Qualidade (IPQ) – e só ele – enquanto gestor e coordenador do Sistema Português de Qualidade (SPQ), que, a nível nacional, garante a observância dos princípios e das regras que disciplinam a normalização, a certificação e a metrologia, incluindo os aparelhos para exame de pesquisa de álcool nos condutores de veículos;
2. À data dos factos do caso em tela, nem o Código da Estrada, nem o Decreto Regulamentar nº 24/98, de 30 de Outubro, nem a Portaria nº 1006/98 de 30 de Novembro, ou outro diploma em vigor, permitia fixar qualquer margem de erro a atender nos resultados obtidos pelos analisadores quantitativos de avaliação do teor de álcool no sangue;
3. Ainda que se aceite que tenham de ser consideradas as margens de erro fixadas na sobredita Portaria, em sintonia com a Convenção Internacional a que Portugal aderiu, por força do Decreto do Governo nº 34/84, de 11 de Julho, a aplicação dessas margens de erro reporta-se à aprovação do modelo e às verificações dos alcoolímetros, da competência do Instituto Português da Qualidade, não existindo fundamento para que o julgador, oficiosamente e sem elementos de prova que o sustentem, proceda a correcções da taxa de álcool no sangue apurada pelos alcoolímetros, adequadamente aprovados e verificados; 
4. É ainda de referir, pela sua relevância, que foi publicado através da Portaria nº 1556/2007, de 10 de Dezembro, o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, donde se extrai – a nosso ver – no quadro a ela anexo que os erros máximos admissíveis – EMA, são levados em conta na “Aprovação de modelo/primeira verificação” e na “Verificação periódica/verificação extraordinária” e não aquando dos actos de fiscalização levados a efeito por agentes policiais.
5. O Tribunal a quo incorreu nos vícios da contradição insanável da fundamentação, previsto no art. 410.°, n.º 2, al. b) do CPP (de conhecimento oficioso) e de erro notório na apreciação da prova, previsto no art. 410.°, n.º 2, al. c) do CPP, já que o julgador ao alicerçar a sua convicção, além, do mais, na confissão do arguido e no talão do alcoolímetro junto aos autos que traduziu uma TAS de 1,38g/l, não podia ter considerado provado que a tal TAS correspondia uma TAS de 1,26g/l uma vez que não resulta dos autos qualquer elemento probatório que permita realizar tal operação. 
6. Nesta decorrência, concluindo-se pela TAS de 1,38g/l, haverá que proceder novamente à determinação da medida da pena principal e da pena acessória. 
7. A lei penal fixa o limite mínimo da pena acessória de inibição de conduzir em três meses, não sendo susceptível de atenuação especial.
8. Assim, conformando-nos com os demais fundamentos constantes, neste particular, na decisão recorrida, o arguido deverá ser condenado pelo crime cometido, na pena de 80 (oitenta) dias de multa à taxa diária de 5 (cinco) euros, e ainda na pena acessória de inibição de conduzir qualquer veículo motorizado pelo período de três meses. 

V - NORMAS VIOLADAS.
Foram violados os arts. 29.º e 35.º da Lei 173/99, de 21-09, 410.º, n.º 2, alíneas b) e c), do Código de Processo Penal, 153.º, n.º 1, e 158.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código da Estrada, as normas constantes do Decreto Regulamentar n.º 24/98, de 30 de Outubro e da Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro, que deveriam ter sido interpretadas em consonância com a interpretação que lhes é dada nas sobreditas conclusões que aqui se dão por reproduzidas.
3. O arguido não apresentou resposta.

4. Nesta Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da procedência do recurso, nos seguintes termos (transcrição):
A questão principal posta na motivação de recurso interposto pelo M.P. em 5-5-2009, em que é recorrido o arguido B………….., da sentença de fls. 31 a 61, proferida, notificada ao M.P. e ao arguido e depositada em 15-4-2009, que condenou aquele arguido pela prática de 1 crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelos arts. 292 n° 1 e 69 n° 1 al. a) do C.P., na pena de setenta dias de multa, à taxa diária de 5 euros e na sanção  pena) acessória de inibição (devia ser dito de proibição) de conduzir qualquer tipo de veículo motorizado, especialmente atenuada, pelo período de 1 mês, é idêntica à já colocada em dezenas de recursos neste Relação, que é a de saber se é legal o Juiz de julgamento poder, sem que a acusação ou a defesa tenha requerido ou proposto, alterar com os reflexos inerentes nos factos provados referentes ao grau de álcool (alcoolemia) e na eventual qualificação jurídica desses factos, o resultado constante do talão de registo de TAS verificado na realização do teste quantitativo de grau de álcool no sangue do condutor de veículo efectuado com aparelho legalmente aprovado, testado e certificado pela entidade e autoridade competente, mesmo quando o arguido confessa os factos da acusação – onde é descrita a TAS inscrita no talão – não requereu contra-prova, nem põe em causa o estado, a aprovação e a certificação do aparelho de medida e sem que tenha sido produzida prova de que a medição efectuada pelo aparelho está errada e quando o julgador funda a sua convicção para dar como provados os factos na confissão do arguido desses factos e no dito talão.
A Relação do Porto está dividida quanto à solução correcta dessa questão, havendo numerosos acórdãos num sentido e no outro, isto é, no sentido defendido na decisão recorrida e no sentido oposto, o sustentado na motivação do presente recurso. A nossa opinião é no sentido de que a interpretação defendida na motivação de recurso é a única correcta pelos fundamentos aí expressos, com os quais estamos de acordo, opinião que temos mantido em todos os processos em que a mesma questão foi posta sobre a qual emitimos parecer, não vendo nós razões para alterar o entendimento que sempre defendemos.
Pelo que, entendemos que deve ser dado provimento ao recurso nessa questão.
No que concerne à questão da aplicação da atenuação especial da pena acessória, aplicada e sustentada na decisão recorrida, também entendemos, tal como o recorrente, que tal pena não é susceptível de atenuação especial, dado que tal atenuação contraria os pressupostos e a finalidade da previsão dessa pena acessória.
De facto, o crime pelo qual o arguido foi condenado é punível com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias ( art. 292 n° 1 do C.P. ) e com a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre 3 meses e 3 anos ( art. 69 n° 1 al. a) do C.P. ). O mínimo de pena acessória previsto é de 3 meses.
Não estando em causa que a determinação da medida da pena acessória deve obedecer aos mesmos critérios estabelecidos para a determinação da medida da pena no art. 71 do C.P. para a pena principal, isto é, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, ainda que sem respeito por qualquer fórmula matemática ou por qualquer proporção matemática, certo é que "como ensina o Prof. Figueiredo Dias, a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados tem como pressuposto material a circunstância de, consideradas as circunstâncias do facto e da personalidade do agente, o exercício da condução se revelar especialmente censurável, donde que então essa circunstância vai elevar o limite da culpa" (v. Germano Marques da Silva em "Crimes Rodoviários Pena Acessória e Medidas de Segurança", pag. 31 ). Ora, a atenuação especial da pena depende, nos termos do art. 72 do C.P., da verificação de circunstâncias anteriores, posteriores ou contemporâneas do crime que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena, ou seja, da verificação de circunstâncias opostas às que constituem o pressuposto material da aplicação da pena acessória. É pelo facto da conduta de condução de veículo automóvel em estado de embriaguez se revelar especialmente censurável e pôr em perigo altos valores e interesses, como a vida e bens de valor elevado, elevando o limite da culpa, que o legislador se viu na necessidade, para reforçar a finalidade preventiva e para combater a perigosidade daquela conduta, de cominar para a mesma uma pena acessória, para além da pena principal. Portanto, o pressuposto material da aplicação da pena acessória opõe-se aos pressupostos da atenuação especial da pena. Daí entender-se que não é admissível a aplicação da atenuação especial da proibição de conduzir prevista nos arts. 72 e 73 do C.P. ( v. nesse sentido Paulo Pinto Albuquerque em Comentário do Código Penal, pag. 226 ).
Assim, o tribunal ao reduzir o mínimo da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor de 3 meses para 1 mês fez errada interpretação e aplicação do direito. Mais, para fundamentar a redução dessa pena para aquela medida, deu por verificadas circunstâncias que não têm virtualidades para diminuir de forma acentuada a culpa do agente, a ilicitude do facto ou a necessidade da pena, nomeadamente a confissão integral e sem reservas e o facto de não lhe serem conhecidos antecedentes criminais ou infracções estradais registadas, pois o arguido só confessou o que não podia negar, dado que foi apanhado em flagrante por agente da autoridade a conduzir automóvel em estado de embriaguez, e o facto de não ter registados antecedentes criminais no CRC ou contra-ordenações registadas no RIC não pode favorecê-lo de forma acentuada, dado que o comportamento respeitador da normas é o exigível ao comum dos cidadãos, não devendo aquele ser beneficiado por adoptar esse comportamento. Portanto, nem ao abrigo do art. 72 do C.P., a pena acessória deveria ter sido especialmente atenuada.

5. Foi cumprido o estabelecido no artigo 417º, nº 2, do CPP, inexistindo resposta.

6. Colhidos os vistos, foram os autos à conferência.

Cumpre apreciar e decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO
1. Âmbito do Recurso

O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, havendo ainda que ponderar as questões de conhecimento oficioso, mormente os vícios enunciados no artigo 410º, nº 2, do CPP – neste sentido, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª Edição, Editorial Verbo, pág. 335; Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª Edição, Edições Rei dos Livros, pág. 103, Ac. do STJ de 28/04/99, CJ/STJ, 1999, Tomo 2, pág. 196 e Ac. do Pleno do STJ nº 7/95, de 19/10/95, DR I Série A de 28/12/95.
No caso em apreço, atendendo às conclusões da motivação do recurso, as questões que se suscitam são as seguintes:

A decisão recorrida incorreu em vício de contradição insanável da fundamentação, a que se reporta o artigo 410º, nº 2, alínea b), do CPP?

O acórdão recorrido incorreu em vício de erro notório na apreciação da prova, a que se reporta o artigo 410º, nº 2, alínea c), do CPP?

Admissibilidade da atenuação especial da pena acessória de proibição de conduzir.

2. A Decisão Recorrida

O Tribunal a quo deu como provados os seguintes factos (transcrição): 

1- No dia 21 de Fevereiro de 2009, pelas 23.26 horas, o arguido conduzia o veículo ligeiro com a matrícula ..-..-NX na EN 216, na Av. das Comunidades Europeias, em Mirandela.
2- Submetido ao controle de alcoolémia, através do alcoolímetro Drager modelo Alcotest MKIII-P com o nº ARRL-0051 aprovado pela DGV em 6 de Agosto de 1998, acusou a T.A.S. de 1,38 g/l, que corresponde, deduzida a margem de erro, no caso de 8%, a pelo menos 1,26 g/l.
3- Agiu o arguido livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que ingerira bebidas com teor alcoólico e em quantidade que admitiu determinar-lhe uma TAS superior a 1,20 g/l e que, por isso, não podia conduzir veículos automóveis na via pública como efectivamente fazia. 
4- Sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei. 
5- O arguido confessou e demonstrou arrependimento.
6- É casado, vive com a mulher, de baixa prolongada por doença, e dois filhos de 28 e 29 anos, ambos desempregados, bem como o genro também desempregado, e dois netos, todos a seu cargo.
7- Habitam em casa própria, e subsistem do ordenado do arguido, como motorista de pesados por conta da empresa «C…………» para a qual trabalha desde 1985, auferindo um salário de cerca de 700 €.
8- Não lhe são conhecidos antecedentes criminais não tendo nenhuns averbados no crc. 
9- Não tem averbados quaisquer antecedentes estradais no seu RIC.

No que tange aos factos não provados (transcrição):

Com relevo para a decisão da causa, não se provou:
a) Que o arguido conduzia com a T.A.S. de 1,38gl/l,

Fundamentou a formação da sua convicção nos seguintes termos (transcrição):
O tribunal formou a sua convicção quanto aos factos provados com base no teor do Certificado de Registo Criminal do arguido, RIC, e no teor do talão do alcoolímetro, bem como na sua confissão do teor objectivo dos factos atinentes ao que concerne à ingestão de bebidas, ao acto de condução e bem assim à consciência da ilicitude do acto.
Atente-se que a confissão do arguido, quanto a nós, mais não abrange do que a cognoscibilidade da ingestão do álcool e do seu efeito sob a capacidade de conduzir e bem assim do resultado do exame corporizado no talão do alcoolímetro, e de modo algum pode ser tida como confissão «metrológica» da quantidade de gramas por litro no sangue que detinha. Com isto nos afastamos de (cremos parte não significativa) da jurisprudência que vem pugnando pela imutabilidade dos «factos» confessados – mesmo no que tange à quantificação dependente de verificação com recurso a meios de obtenção de prova do jaez dos que infra analisaremos…[1]
O elemento subjectivo decorre do compaginar das regras da experiência concatenado com o que se extrai dos factos objectivos, pois que outra forma não existe de apurar um facto que em si, se traduz num dado do mundo interno: a consciência e vontade do arguido em praticar tais factos é incontornavelmente expressa no próprio acto de conduzir, na medida em que o fez deliberada e livremente, pois nada vem provado que possa afastar o preenchimento subjectivo. 
Na verdade, extrai-se que o arguido decidiu conduzir o veículo mesmo sabendo que ingerira já bebidas alcoólicas em quantidade que admitiu ser adequada a pô-lo no estado em que se encontrava e que o fez ciente de que cometia um crime, sem motivo justificativo, e tal facto, em si, é do conhecimento do comum dos cidadãos de média e sã consciência.
Fundou-se no teor do talão do alcoolímetro de folhas 5, quanto aos factos relativos ao nível de alcoolémia, corrigido pela margem de erro máxima admissível. 
Antes da entrada em vigor da Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro, seguíamos uma linha de raciocínio que não vemos razões para alterar, bem ao invés cremos sair reforçada.
Julgamos que a correcção da taxa de alcoolémia com as margens de erro é imposta pelo plasmado na 
- Recomendação da OIML, transposta nos Decreto-Lei 291/90 de 20 de Setembro e Portaria 1556/2007, publicada no DR I Série em 10 de Dezembro, Portaria 902-B/2007 de 13 de Agosto e Lei 18/2007 de 17 de Maio força do estatuído no artigo 8º da Constituição da República Portuguesa;
- A Directiva 83/575/CEE do Conselho de 23 de Outubro de 1983 que altera a Directiva 71/316/CEE relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes às disposições comuns sobre os instrumentos de medição e os métodos de controle metrológico que veio a ter expressão nos Decretos supra mencionados e ainda na Portaria 1556/2007, publicada no DR I Série em 10 de Dezembro último que expressamente consigna o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros;
Neste particular o Tribunal não deu como provado o nível exacto de alcoolémia detectado pela análise do alcoolímetro Drager modelo Alcotest MKIII-P com o nº ARRL-0057 aprovado pela DGV em 6 de Agosto de 1998 através do Despacho do IPQ nº 211.06.96.3.30, DR II Série de 25 de Setembro de 1996; antes procedeu à aplicação da taxa de 8% nos termos da portaria[2] que corresponde, deduzida a margem de erro, a pelo menos 1,28g/l.
Trata-se quanto a nós de uma questão de apreciação de prova em que temos que lançar mão da regra prevista no artigo 127º do Código de Processo Penal, isto é, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.»
Todavia, face ao bloco normativo que de modo detalhado define e limita os modos processualmente idóneos à demonstração de um dos elementos do tipo objectivo do crime, excluindo quaisquer outros, afigura-se-nos dilúcido que no caso concreto vale nesta matéria algo mais do que uma mera limitação ou excepção ao princípio da livre apreciação da prova vigente em processo penal. 
Não está aberta ao juiz a possibilidade de apreciação diversa daquela que impõe o recurso a tais meios técnicos, ainda quando fundamentasse essa apreciação (e na medida em que tal fosse cogitável) em razões também técnicas, nos termos do n.º 2 do artigo 163.º do Código de Processo Penal. 
Em conclusão, trata-se aqui de um autêntico domínio de prova vinculada[3]. 
Por isso principiámos por dizer que a prova de diversa taxa de alcoolémia da apresentada no talão do alcoolímetro se baseava nos dispositivos legais supra mencionados, conforme passaremos a explicitar.
A colheita de ar expirado, para efeitos de determinação da presença de álcool no sangue, mais não é do que um exame, levado a cabo por um meio técnico adequado.
Não constitui o exame ao álcool no sangue realizado por alcoolímetro um meio de prova, como é por exemplo a prova pericial, mas meio de obtenção prova.
Em todas as situações em que se utilizam mecanismos (de entre uma infinidade deles, destacam-se os vulgares radares, alcoolímetros e balanças) ou se atribuem certas características a um aparelho ou produto, com vista a determinar uma qualidade ou quantidade relevantes juridicamente, os serviços respectivos devem verificar a sua funcionalidade e aferição, a qual, nalguns casos, é feita por organismos oficiais.
Ao proceder à leitura dos registos concretizados nos alcoolímetros da taxa de álcool no sangue de um arguido, temos por seguro que o julgador deve usar das margens de erro previstas para esses registos, pois de outro modo estaria a basear-se em registos que, cientificamente, não são reconhecidos como seguros e exactos, sendo que tais margens de erro são[4] as previstas no actual Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou Substâncias Psicotrópicas aprovado pela Lei 18/2007 de 17 de Maio e legislação conexa.
Vejamos.
No 14º daquele Diploma, reportando-se à aprovação dos equipamentos para o efeito:
«1 - Nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só podem ser utilizados analisadores que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária. 
2 - A aprovação a que se refere o número anterior é precedida de homologação de modelo, a efectuar pelo Instituto Português da Qualidade, nos termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros.»
Procedendo a atenta leitura do preceito, cumpre perguntar, então, se acaso a Portaria 748/94 de 13 de Agosto estivesse nesse momento revogada, para que Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros remeteria o actual compêndio legal?
Poder-se-ia pensar que tal estaria previsto em Regulamentação posterior designadamente na Portaria 902-B/2007 de 13 de Agosto, que para além do mais veio fixar os requisitos a que devem obedecer os analisadores quantitativos.
Todavia, a referida Portaria, logo na sua I Secção, epigrafada Analisadores Quantitativos estatui:
1.º Os analisadores quantitativos são instrumentos de medição da concentração da massa de álcool por unidade de volume na análise do ar alveolar expirado (TAE). 
2.º Os aparelhos definidos no número anterior devem obedecer às seguintes características: 
A - Características técnicas: 
a) Cumprir os requisitos metrológicos e técnicos definidos no Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros;
Entretanto entrou em vigor a Portaria 1556/2007, publicada no DR I Série em 10 de Dezembro último, em cujo preâmbulo pode ler-se
«O controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição em Portugal, em geral, obedece ao regime constante do Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro, às disposições regulamentares gerais constantes do Regulamento Geral do Controlo Metrológico aprovado pela Portaria n.º 962/90, publicada no Diário da República, 1.ª série, de 9 de Outubro de 1990, e ainda às disposições constantes das portarias específicas de cada instrumento de medição. 
Recentemente, o Decreto-Lei n.º 192/2006, de 26 de Setembro, transpondo para o direito interno a Directiva n.º 2004/22/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março, veio regular o controlo metrológico dos 11 instrumentos de medição elencados no seu artigo 2.º 
Para os instrumentos de medição abrangidos pelo Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro, e que não mereceram qualquer adaptação através do Decreto-Lei n.º 192/2006, de 26 de Setembro, verifica-se a necessidade de actualizar as regras a que o respectivo controlo metrológico deve obedecer com vista a acompanhar, tecnicamente, o que vem sendo indicado nas Recomendações da Organização Internacional de Metrologia Legal. A actualização mostra-se ainda necessária para simplificar e clarificar procedimentos, dando, assim, cumprimento à medida prevista no Programa SIMPLEX para 2007. 
Pelos motivos acima indicados, a presente portaria procede à aprovação do novo regulamento a que deve obedecer o controlo metrológico dos alcoolímetros.»
Se dúvidas houvesse quanto à vigência do Regulamento contido na Portaria nº 784/94 de 3 de Outubro, até à entrada em vigor deste novo Regulamento, julgamos que o teor do Preâmbulo da nova Portaria e bem assim da disposição revogatória expressa do seu artigo 2º («2.º É revogada a Portaria n.º 748/94, de 3 de Outubro.») não permitem a subsistência delas.
Doutro passo esta Portaria 1556/07 vem expressamente aprovar novo Regulamento do Controle Metrológico dos Alcoolímetros no qual, como se constata no Anexo, constam os erros máximos admissíveis.
No caso vertente a margem de erro é de 8%, face às tabelas da já supra referenciada norma[5] quadro demonstrativo se pode compulsar infra:

TAS     ……………      Erro Máximo Admissível
< 0, 920--------------------------+-0,032g/l
0, 4< ou =2g/l-------------------+-8%
< ou =2g/l------------------------30+-%
São pois aplicáveis as margens de erro máximo admissíveis previstos na Norma AFNOR de 1 de Fevereiro de 1992 NF X 20-701.
Em deliberação recente aliás o CSM emitiu Circular 89/2007 circulando esclarecimento do IPQ a propósito de tal questão, em ofício de 27 de Junho.
Diga-se até que tais margens foram elevadas pela Portaria 1556/2007, publicada no DR I Série em 10 de Dezembro último.
Se as compararmos com as anteriores são notórias as diferenças:
TAS                                         Erro Máximo Admissível
< 0, 920---------------------------------+-0,07g/l
0, 92<2,30 g/l--------------------------+-7,5%
2,2<4,60g/l-----------------------------+-15%
4,60<6,90g/l---------------------------+-30%
No caso vertente a margem de erro é agora de 8%.
Outro sentido não tem a nosso ver tal elevação senão exprimir, por banda do legislador a diminuída fiabilidade absoluta que tem tais aparelhos de medição e deste modo, em sede como a penal, dotar a necessária valoração da prova técnica – por natureza mais fiável do que a restante – de um critério depurativo e algo elástico que permita ao arguido ser defendido da contingência da evolução científica. 
Se o que hoje é verdade em ciência amanhã já o não é – e a mutação das margens de erro dos mesmíssimos aparelhos expressa nas duas portarias que vimos de analisar em percentagens não despiciendas, que podem significar a diferença entre uma condenação e uma absolvição…. bem o exprime – há-de a mesma mutabilidade ser de algum modo acautelada no domínio da verdade judiciária, onde por razões de certeza e segurança jurídica, não pode dizer-se que o que é verdade hoje, amanhã já o não será….
Como?
Assumindo que a ciência não é exacta e infalível, nem os instrumentos por ela criados o são e por essa via, admitindo que as margens de erro por ela própria postas e ditas como fiáveis deverão ser para o julgador um norte e não uma tábua rasa.
Mais que não fosse, pois face a tal meio de obtenção de prova, tendo em conta a admissão pelo próprio legislador da existência de falibilidade permanente do mesmo, em coerência com o princípio de um exame crítico das provas produzidas, mais não restaria ao julgador a nosso ver do que, lançando mão do princípio in dúbio pro reo dar como não provado o facto que o talão do alcoolímetro se destina a provar…
Em sentido semelhante ao que ora defendemos poderá ver-se jurisprudência disponível nas bases de dados on-line dos Tribunais Superiores[6]
Quanto ao critério de escolha e à determinação da medida concreta da pena principal e medida da pena acessória, pronunciou-se (transcrição):
Conhecidas que são, por já suficientemente enunciadas pela doutrina autorizada[7], as três fases do procedimento de determinação da pena - investigação e determinação da moldura legal, investigação e determinação dentro daquela moldura legal da medida concreta a aplicar, e escolha da espécie da pena, cumpre fazê-lo no caso em análise.
Para o tipo de crime de condução sob feito do álcool estabelece a lei penal a pena de prisão até 1 ano ou pena de multa até 120 dias.
A esta pena principal acresce a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, prevista no art.º 69.º, n.º1, al. a), do Código Penal, a redacção por último dada pela Lei n.º 77/2001, de 13 de Julho, situada entre três meses e três anos.
Observando o critério firmado no artigo 70º e as finalidades das penas consagradas no artigo 40º, ambos do Código Penal, importa desde logo optar, dentro das duas espécies de pena que a moldura do crime em causa consente, optar pela que, em concreto deverá ser cominada. 
Ao tribunal impõe-se a preferência pela pena não privativa da liberdade por ser possível considerar que esta realizará de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, quais sejam a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, afigurando-se ser ela uma censura suficiente do facto, e simultaneamente, uma garantia para a comunidade da validade e vigência da norma violada. 
Desde logo se pondera como essenciais a inexistência de antecedentes criminais ou estradais do arguido.
Os factos pelos quais ora é julgado aparecem como o primeiro contacto quer com a justiça penal quer com a contra-ordenacional.
Todavia não pode considerar-se que sem mais desnecessária qualquer pena em termos de prevenção especial.
Não se ignora porém que este é daqueles tipos legais de crime em que, pela sua natureza à comunidade não repugna a opção por pena não detentiva, por ser eminentemente, e num país com hábitos de consumo de álcool tão elevados e generalizados como o é, susceptível de ser cometido pelo comum dos cidadãos.
Resulta aparentemente num contra-senso esta asserção, mas na verdade, se analisarmos objectivamente a criminalidade rodoviária primária, ressalta à evidência que este tipo de comportamento desviante, quando primário, note-se, tem em média como agente cidadãos integrados, e não delinquentes que percorram outro tipo de ilícito.
Opta-se, pois, pela pena de multa.
Na dosimetria da pena, no caso concreto do arguido, revela grau de ilicitude assaz baixo, atendendo ademais à taxa de álcool que ostentava que se situa no limite mínimo da incriminação.
O dolo emerge na sua modalidade menos intensa.
O seu comportamento posterior aos factos, confessando espontaneamente, deixam antever capacidade de autocensura, se bem que neste particular tipo de crime, em que as particularidades da prova a mesma não assume um relevo especial, sempre é de ponderar.
Afiguram-se sobremaneira relevantes as necessidades de prevenção geral tendo em conta o elevadíssimo número de vezes que este crime é cometido nesta comarca, como o mero cotejo do tratamento estatístico poderá comprovar.
Necessário se mostra pois que a pena a cominar imprima ao arguido a injunção para um processo de recondução a uma conduta conforme ao lícito.
Julga-se pois adequado fixar-lhe a pena de multa em 70 (setenta) dias.
Impõe-se teoricamente a ponderação da situação sócio-económica do condenado espelhada nos factos provados. Todavia, emerge da redacção do falado artigo 47º no seu nº 2 do Código Penal aprovada pela Lei 59/2007 de 4 de Setembro pouca margem para o julgador a tomar em conta: o mínimo legal é actualmente de € 5 euros (cinco euros) para o quantitativo diário da pena de multa. 
O salário mínimo nacional é actualmente de 450,00 €, aprovado pelo DL 246/2008 de 18 de Dezembro.
Ou seja, projectando a taxa de esforço diária num agente que aufira o salário mínimo, seja que tenha disponível diariamente o equivalente a 1/30 do salário mínimo nacional, temos que o mesmo auferirá 15 € diários, e a taxa diária será de 5 €, restando-lhe 10 € para (sobre)viver.
No mínimo dos mínimos o que se põe ao julgador é ter como baliza o quantitativo que supera o terço disponível diário da remuneração mínima garantida aprovada para o ano em curso.
Já não falamos de casos em que tal remuneração se destina ao sustento de uma família, como é o caso do arguido, pessoa que sustenta um agregado com mais cinco elementos, sem rendimentos.
Irrogar tal montante diário é impor uma taxa de esforço que situará a família próximo da insubsistência.
No entanto, é-nos vedado fazer uma interpretação abrrogante. 
Fixa-se no mínimo imposto pelo legislador de 2007 a taxa diária – 5 €.
Atenhamo-nos agora na pena acessória.
Segundo o disposto no artigo 69.º, n.º1, alínea a) do Código Penal, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 77/2001, de 13 de Julho, quem for punido por crime previsto nos artigos 291.º e 292.º, do CP, é condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos. 
Da reforma operada pelo Decreto-Lei 48/95 de 15 de Março e pela referida Lei 77/2001 de 13.07, resulta que esta sanção inibitória tem natureza de pena acessória, tal como propunha, de lege ferenda, Figueiredo Dias[8].
Tal, aliás resulta claramente do texto do mencionado artigo 69.º, da sua inserção sistemática e do elemento histórico[9], traduzindo-se numa censura adicional pelo crime praticado.
Não obstante a formulação legal, pois, aparentemente dando da pena acessória uma ideia automática não pode da mesma tomar-se tal entendimento, sob pena de fazer-se da Lei Penal uma interpretação frontalmente violadora do disposto no artigo 30º nº 4 da Lei Fundamental, que veda qualquer efeito automático da pena.
O Prof. Figueiredo Dias entende que esta pena acessória tem por pressuposto material “a circunstância de, consideradas as circunstâncias do facto e da personalidade do agente, o exercício da condução se revelar especialmente censurável.” (...) “Por isso, à proibição de conduzir deve também assinalar-se (e pedir-se) um efeito de prevenção geral de intimidação, que não terá em si nada de ilegítimo porque só pode funcionar dentro do limite da culpa. Por fim, mas não por último, deve esperar-se desta pena acessória que contribua, em medida significativa, para a emenda cívica do condutor imprudente ou leviano.”[10].
Como à principal, pois, a esta pena acessória, há-de subjazer um juízo de censura global pelo crime praticado, pelo que se impõe aqui, também para a determinação da sua necessidade e medida concreta o recurso aos critérios estabelecidos nos artigos 40º e 71.º do Código Penal.
O artigo 40° do Código Penal dispõe que «a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade» - n° 1, e que «em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa» - n° 2.
Temos pois protecção de bens jurídicos e socialização do agente do crime, sendo a culpa o limite da pena mas não seu fundamento. 
A culpa não justifica a pena, retributivamente, mas funciona em intervenção de contraposição à lógica do utilitarismo preventivo.
Sendo o modelo do Código Penal de prevenção, em que a pena é determinada pela necessidade de protecção de bens jurídicos e não de retribuição da culpa e do facto, a culpa emerge como travão de fins utilitaristas do sistema penal.
Assim sendo, dentro na moldura penal correspondente ao crime o juiz, face à ponderação do caso concreto e em função das necessidades que se lhe apresentem, fixará o quantum concretamente adequado de protecção, conjugando-o a partir daí com as exigências de prevenção especial em relação ao agente (prevenção da reincidência), sem poder ultrapassar a medida da culpa.
E a finalidade de reintegração do agente na sociedade há-de ser, em cada caso, prosseguida pela imposição de uma pena cuja espécie e medida, determinada por critérios derivados das exigências de prevenção especial, se mostre adequada e seja exigida pelas necessidades de ressocialização do agente, ou pela intensidade da advertência que se revele suficiente para realizar tais finalidades.
Na prossecução das finalidades da punição e na determinação em concreto da pena, o juiz deve orientar-se pelos critérios do artigo 71° do Código Penal.
No crime de condução de veículo em estado de embriaguez, como crime de perigo abstracto, as exigências de prevenção geral são determinantes na fixação da medida concreta da pena, para acalmia da comunidade e afirmação de valores essenciais afectados por comportamentos que, antes e para além de causarem efectivos danos, são aptos a colocar em perigo bens jurídicos essenciais, como sejam a segurança rodoviária e indirectamente bens pessoais, como seja a vida, de indiscutível valor supremo. 
Todavia, como já expendemos supra, no caso concreto, tais exigências foram de algum modo já acorridas com a pena principal, denotando a pena acessória uma função de acrescento nesta particular matéria de prevenção geral.
Acresce-lhe ainda uma função de prevenção especial de socialização.
Terá como limite a culpa.
Temos pois uma sanção acessória que se situa, por força do artigo 69º do Código Penal entre os 3 meses e os 3 anos de inibição.
Ora, desde logo há que ponderar se será esta a medida adequada face à concreta situação do arguido.
E cremos bem que não.
Julgamos ser este um dos casos em que deve funcionar a atenuação especial da pena enquanto «válvula de segurança» do sistema, como tem sido defendido na doutrina (particularmente, entre nós, Figueiredo Dias[11], e na jurisprudência[12], acorrendo a situações excepcionais em que, por força de circunstâncias que atenuem acentuadamente a culpa (ou ilicitude) e a necessidade da pena, e em que se verifique que as molduras penais estabelecidas para o respectivo tipo de crime se mostrem francamente desajustadas, correspondendo a uma violência punir o arguido de acordo com os parâmetros normais.
E quanto a nós é este o caso vertente.
Estamos perante um arguido que conduz há 24 anos, de forma profissional, ou seja, passa o seu dia de trabalho na estrada, ao volante de um pesado, consabidamente veículo sujeito a mais fiscalizações que um ligeiro. E no entanto não tem averbado no seu RIC qualquer infracção, sendo igualmente primário em termos criminais.
No caso presente, pois, justifica-se a atenuação especial, considerando que 
- a acentuada diminuição da ilicitude está, desde logo, patente na análise que se fez a propósito da qualificação dos factos, face ao nível de alcoolémia;
- relativamente à culpa, provou-se que o arguido agiu voluntária e livremente, com plena consciência das características do produto que ingerira mas agiu com dolo eventual, o que de algum modo tem o condão de atenuar acentuadamente a sua culpa, conjuntamente com a circunstância de ter conduzido dentro da localidade;
- no que diz respeito à necessidade de pena, justifica-se a atenuação pois o arguido está familiar e profissionalmente integrado e faz da condução profissão, o que, se não negamos de algum modo agrava de certo jeito a sua culpa porque lhe era mais exigível o comportamento lícito alternativo, não deixa porém de impor que se pondere doutro passo que o crime foi cometido ao volante de um ligeiro, fora do serviço, no fim de semana; o arguido conduzia dentro da povoação e não em qualquer dos itinerários limítrofes e mais acometidos por sinistralidade; que confessou; que fazendo da condução profissão, para mais sendo o único sustento da família é de crer que a pena principal e a pena acessória atenuada sirvam para o arredar de futuros comportamentos.
Assim, tendo em atenção a moldura penal abstracta aplicável, a qual tem um mínimo de 3 meses e um máximo de 3 anos, especialmente atenuada nos termos dos artigos 72º e 73º, nº 1 al. a) a c) teremos uma moldura que oscilará entre dez dias e dois anos.
Atendendo à factualidade provada, temos que:
- a ilicitude do facto, traduzida na sua gravidade, é de grau baixo, pois a taxa de alcoolemia do arguido há-de ver reflectida na ilicitude essa diminuída quantidade, bem como a menor perigosidade do local, comparativamente com outros;
- o facto de o arguido conduzir há longos anos sem ter qualquer infracção averbada, sendo passível de um juízo de prognose favorável a circunstância de ser motorista profissional e o bom comportamento futuro ser condição de subsistência de todo o seu agregado;
- relativamente à culpa, já foram salientadas supra a sua fisionomia e a sua relevância; releva-se todo o circunstancialismo provado relativamente às suas origens e inserção sócio-familiares e económicas, a apontarem para uma impoluta conduta; também no plano profissional, será de relevar o facto de o seu percurso profissional ser caracterizado pela boa conduta que aqui releva porque com reflexos no RIC; o arguido confessou os factos e mostrou-se arrependido, contribuindo para lhe dar um enquadramento atenuativo;
Tendo em conta todo este circunstancialismo, a pena acessória afigura-se-nos, tendo em conta a dosimetria da pena principal já irrogada, dever ser fixada em um mês por justa, adequada à culpa, não deixando de satisfazer as finalidades conjugadas da prevenção geral e da prevenção especial acrescentadas que se assinalam à pena acessória.

Apreciemos.

Dos vícios de contradição insanável da fundamentação e de erro notório na apreciação da prova

Conforme estabelecido no artigo 428º, nº 1, do CPP, os Tribunais da Relação conhecem de facto e de direito, de onde resulta que, em regra e quanto a estes Tribunais, a lei não restringe os respectivos poderes de cognição.

A matéria de facto pode ser sindicada por duas vias: no âmbito, mais restrito, dos vícios previstos no artigo 410º, nº 2, do CPP., no que se denomina de “revista alargada” ou através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se reporta o artigo 412º, nºs 3, 4 e 6, do mesmo diploma legal.

Estabelece-se no artigo 410º, nº 2, do CPP que, mesmo nos casos em que a lei restringe a cognição do tribunal, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:

1) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada – alínea a);

2) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão – alínea b); 

3) Erro notório na apreciação da prova – alínea c).

Estes vícios, que são de conhecimento oficioso, têm, em qualquer das suas modalidades, de resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos, para o fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento (cfr. Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 10ª ed., pag. 729, Germano Marques da Silva, ob. cit. pag. 339, Simas Santos e Leal Henriques, ob. cit. pags. 77/78 e Acs. do STJ de 05/06/08, Proc. nº 06P3649 e de 14/05/09, Proc. nº 1182/06.3PAALM.S1, in www.dgsi.pt.

O vício previsto na alínea b), do nº 2, do artigo 410º, do CPP, contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, verifica-se quando, de acordo com um raciocínio lógico na base do texto da decisão, por si ou conjugado com as regras da experiência comum, seja de concluir que a fundamentação justifica decisão oposta, ou não justifica a decisão, ou torna-a fundamentalmente insuficiente, por contradição insanável entre factos provados, entre factos provados e não provados, entre uns e outros e a indicação e análise dos meios de prova fundamentos da convicção do Tribunal - cfr Ac. do STJ de 13/10/1999, CJACSTJ 1999, Ano VII, Tomo III, pags 186/187 e Acórdão do mesmo Tribunal de 03/07/02, Proc. nº 1748/02-5ª.

Estamos perante o vício de erro notório na apreciação da prova – alínea c), do nº 2, da mesma disposição legal - quando um homem médio, colocado perante o teor da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta de que o tribunal violou as regras da experiência ou de que efectuou uma apreciação manifestamente incorrecta, desadequada, baseada em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios, perspectivando-se em duas vertentes, a do erro na apreciação dos factos e a do erro na valoração da prova produzida. 

Este erro ocorre, pois, também, quando se violam as regras sobre prova vinculada ou das leges artis.

Não se prende, porém, este vício, com uma diferente convicção em termos probatórios e uma diversa valoração da prova produzida em audiência que o recorrente entenda serem as correctas, prefigurando-se, sim, “quando se depara ter sido usado um processo racional e lógico mas, retirando-se, contudo, de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, irrazoável, arbitrária ou visivelmente violadora do sentido da decisão e/ou das regras da experiência comum, bem como das regras que impõem prova tarifada para determinados factos” – Ac. do STJ de 18/03/04, Proc. nº 03P3566.

Não se inclui, pois, no erro notório na apreciação da prova a discordância que o recorrente possa ter em relação à livre valoração da matéria de facto produzida em audiência, realizada pelo julgador de acordo com o estabelecido no artigo 127º, do Código de Processo Penal.

- Invoca o recorrente o vício de contradição insanável da fundamentação por, tendo o julgador alicerçado a sua convicção na confissão do arguido e no talão do alcoolímetro junto aos autos que traduziu uma TAS de 1,38 g/l, não podia ter considerado provado que a tal TAS correspondia uma TAS de 1,26 g/l uma vez que inexiste nos autos qualquer elemento probatório que permita realizar essa operação. 

- Afirma existir também erro notório na apreciação da prova, por ser inadmissível descontar à concreta TAS aferida pelo alcoolímetro que procedeu à medição do álcool no sangue do recorrido, o valor do erro máximo admissível previsto no Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros.

Vejamos então se tendo o arguido confessado integralmente e sem reservas os factos que lhe vinham imputados, deveriam ser dados como provados todos aqueles factos, nomeadamente o valor da TAS constante do talão do alcoolímetro.

O tribunal recorrido deu como provado, na parte que interessa para a decisão, que no dia 21/02/2009, pelas 23.26 horas, na Av. das Comunidades Europeias, em Mirandela, o arguido conduzia o veículo ligeiro de matrícula ..-..-NX e submetido ao controle de alcoolémia através do alcoolímetro Drager modelo Alcotest MKIII-P com o nº ARRL-0051 aprovado pela DGV em 6 de Agosto de 1998, acusou a TAS de 1,38 g/l, que corresponde, deduzida a margem de erro, no caso de 8%, a pelo menos 1,26 g/l.

Mais está provado que agiu o arguido livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que ingerira bebidas com teor alcoólico e em quantidade que admitiu determinar-lhe uma TAS superior a 1,20 g/l e que, por isso, não podia conduzir veículos automóveis na via pública como efectivamente fazia. 

Consta ainda da factualidade provada que o arguido confessou os factos, sendo que na respectiva motivação da sua convicção a sentença recorrida menciona que a formou“(…) no teor do talão do alcoolímetro, bem como na sua confissão do teor objectivo dos factos atinentes ao que concerne ao acto de condução e bem assim à consciência da ilicitude do acto”, acrescentando ainda que “a confissão do arguido, quanto a nós, mais não abrange do que a cognoscibilidade da ingestão do álcool e do seu efeito sob a capacidade de conduzir e bem assim do resultado do exame corporizado no talão do alcoolímetro, e de modo algum pode ser tida como confissão «metrológica» da quantidade de gramas por litro no sangue que detinha”.

Explicita que “fundou-se no teor do talão do alcoolímetro de folhas 5, quanto aos factos relativos ao nível de alcoolémia, corrigido pela margem de erro máxima admissível” sendo que “a correcção da taxa de alcoolémia com as margens de erro é imposta pelo plasmado na Recomendação da OIML, transposta nos Decreto-Lei 291/90 de 20 de Setembro e Portaria 1556/2007, publicada no DR I Série em 10 de Dezembro, Portaria 902-B/2007 de 13 de Agosto e Lei 18/2007 de 17 de Maio força do estatuído no artigo 8º da Constituição da República Portuguesa” e bem assim na “Directiva 83/575/CEE do Conselho de 23 de Outubro de 1983 que altera a Directiva 71/316/CEE relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes às disposições comuns sobre os instrumentos de medição e os métodos de controle metrológico que veio a ter expressão nos Decretos supra mencionados e ainda na Portaria 1556/2007, publicada no DR I Série em 10 de Dezembro último que expressamente consigna o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros”.

Mais acrescentou, elucidando cabalmente o processo de formação da sua convicção, que “o Tribunal não deu como provado o nível exacto de alcoolémia detectado pela análise do alcoolímetro Drager modelo Alcotest MKIII-P com o nº ARRL-0057 aprovado pela DGV em 6 de Agosto de 1998 através do Despacho do IPQ nº 211.06.96.3.30, DR II Série de 25 de Setembro de 1996; antes procedeu à aplicação da taxa de 8% nos termos da portaria que corresponde, deduzida a margem de erro, a pelo menos 1,28g/l (pretenderia dizer 1,26 g/l, como consta da factualidade provada)”.

Ora, cumpre apurar qual o alcance da confissão efectuada pelo arguido em audiência e mormente se ela tem o mérito de abranger todos os factos imputados, designadamente a TAS de 1,38 g/l indicada no talão do alcoolímetro após realização do teste de detecção da taxa de álcool no sangue, no dia 21/02/09, em seguida à intercepção pelas autoridades policiais.

Nos termos do estabelecido no artigo 140º, nº 2, do CPP, “Às declarações do arguido é correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 128º e 138º, salvo quando a lei dispuser de forma diferente”, consignando-se no nº 1, do artigo 128º que “A testemunha é inquirida sobre factos de que possua conhecimento directo e que constituam objecto de prova”.

Como se salienta no Ac. R. do Porto de 26/11/08, Proc. nº 0812537, da conjugação destes dois normativos ressalta que, quer as declarações do arguido, quer o depoimento das testemunhas, só assumem relevância em relação aos factos que sejam do conhecimento daquele que os relata, sendo que outro entendimento é susceptível de conduzir a que a verdade material, cuja descoberta o processo penal visa alcançar, pudesse ser alicerçada na confissão de factos não verdadeiros ou cuja veracidade o arguido não tivesse capacidade para afirmar por ultrapassarem aquilo que é capaz de apreender. 

Em consequência, “os limites da capacidade cognitiva individual serão também os limites daquilo que, de forma juridicamente relevante, pode ser declarado ou deposto – e, portanto, também confessado. A contrario, tudo o que esteja para além desses limites ou constitui declaração ou depoimento irrelevante, não podendo valer mais do que uma mera opinião, ou constitui raciocínio lógico-dedutivo que, se pertinente, o tribunal também terá de fazer e de forma autónoma”.

O arguido tinha efectivamente conhecimento (porque compreendidos tais factos nos limites da sua capacidade cognitiva) de que estava a conduzir um veículo automóvel ligeiro de passageiros na via pública, em Mirandela, pelas 23.26 horas, de que tinha ingerido bebidas alcoólicas antes de exercer a condução, de que foi fiscalizado pelos agentes da autoridade e por eles submetido a teste de detecção e quantificação de álcool no sangue, por meio de analisador quantitativo e que este indicou uma TAS de 1,38 g/l e sobre tal se tem de entender que versou a sua confissão.

Contudo (e como melhor se explicitará infra) a circunstância de o alcoolímetro indicar uma certa TAS não significa que quem foi submetido ao teste necessariamente seja portador dessa exacta TAS e, novamente seguindo o aresto supra citado, “ultrapassando obviamente as capacidades cognitivas do arguido, como de qualquer ser humano, a determinação da concreta TAS de que era portador – resultado que só é alcançável, pelo menos com o rigor exigível, através de exame realizado mediante a utilização de aparelho próprio para o efeito – não podia ele validamente confessar um facto que não podia conhecer”. 

Carecendo, pois, o arguido do conhecimento exacto da TAS de que na realidade era portador, mas apenas estando ciente da indicada pelo aparelho em que realizou o teste, a confissão que efectuou só pode abranger esta. 

Para que o julgador forme a sua convicção no que tange à concreta TAS de que o arguido era portador, terá de atender à confissão, com os limites referidos e ao conjunto da demais prova produzida, em que se inclui o talão emitido pelo alcoolímetro e apreciá-la de acordo com os princípios e regras probatórias vigentes no processo penal. 

Foi na verdade o que realizou o tribunal recorrido, pois atendeu à TAS indicada no talão do alcoolímetro junto aos autos a fls. 5 deduzindo-lhe o valor de EMA, obtendo desta forma o valor da TAS de, pelo menos, 1,26 g/l que veio a ser dado como provado.

Suscita-se então a questão da admissibilidade ou inadmissibilidade legal do desconto na concreta TAS aferida pelo alcoolímetro que procedeu à medição do álcool no sangue do recorrido, do valor do erro máximo admissível previsto no Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, de que resultará, na tese do recorrente, o vício de erro notório na apreciação da prova.

Vejamos então.

Da análise do texto da sentença recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, não resulta que esteja ela viciada de erro notório na apreciação da prova, porquanto mostra-se fundamentada, de forma límpida e cristalina, entendível perfeitamente pelo homem médio, a razão de na factualidade provada se ter feito constar que o arguido conduzia veículo automóvel e foi submetido ao controle de alcoolémia que acusou uma taxa de alcoolémia no sangue de 1,38 g/l, correspondente a taxa não inferior a 1,26 g/l, após dedução do valor do erro máximo admissível.

Na verdade, nela, como expressamente se consigna, ponderou-se o teor do talão do alcoolímetro onde o arguido realizou o teste de quantificação de álcool no sangue, conjugado com a tabela de margens de erro constantes da Portaria nº 1556/07, de 10/12 e bem assim com a confissão do arguido, no sentido de que efectivamente ingeriu e sabia que não devia conduzir depois de ter ingerido bebidas alcoólicas em quantidade que admitiu determinar-lhe uma TAS superior a 1,20 g/l

Apresenta-se, assim, claramente inteligível a discrepância em relação ao que consta do talão de fls. 5. 

Mas a problemática em análise apresenta-se, também na vertente de violação das regras sobre o valor da prova vinculada, na medida em que, se se considerar que o teste de detecção e quantificação da taxa de álcool no sangue se integra neste tipo de prova e posto que se presume subtraído à livre apreciação do julgador o juízo técnico, científico ou artístico inerente à prova pericial, conforme estabelecido no artigo 163º, nº 1, do CPP, a divergência não fundamentada da convicção do julgador relativamente ao juízo contido no parecer dos peritos (nº 2, da mesma disposição legal), consubstancia um erro notório na apreciação da prova.

A questão do desconto dos EMA apresenta-se controvertida e tem sido objecto de decisões judiciais divergentes, perfilando-se duas correntes em presença.

Uma dessas correntes sustenta não ser de efectuar o desconto do valor do “erro máximo admissível” na TAS registada no alcoolímetro que procedeu à medição e tem acolhimento, entre outros, nos Acs. R. de Coimbra de 12/12/07, Proc. nº 110/07.3GTCTB.C1, de 30/01/08, Proc. nº 91/07.3PANZN.C1, de 11/11/08, Proc. nº <a href="https://acordao.pt/decisoes/124202" target="_blank">62/08.2GBPNH.C1</a> e de 10/12/08, Proc. nº 17/07.4PANZR; Acs. R. de Lisboa de 03/10/07, Proc. nº 4223/07-3, de 20/02/08, Proc. nº 183/2008-3; Ac. R. do Porto de 08/04/08, Proc. nº 1491/08-5 e Ac. R. Porto de 14/01/09, Proc. nº 0815205, todos em www.dgsi.pt.

A outra corrente entende que essa dedução se impõe e nas suas fileiras militam, também a título apenas meramente enunciativo, os Acs. R. do Porto de 19/12/07, Proc. nº 000040884; de 02/04/08, Proc. nº 479/08; de 07/05/08, Proc. nº 0810922, de 28/05/08, Proc. nº 0811347, de 26/11/08, Proc. nº 0812537, de 09/12/09, Proc. nº <a href="https://acordao.pt/decisoes/144818" target="_blank">531/09.7GAVNF.P1</a>, 16/12/09, Proc. nº <a href="https://acordao.pt/decisoes/144777" target="_blank">82/09.0GCAMT.P1</a>, 06/01/010, Proc. nº <a href="https://acordao.pt/decisoes/144737" target="_blank">291/09.1PAVNF.P1</a>, 20/01/010, Proc. nº <a href="https://acordao.pt/decisoes/144660" target="_blank">24/09.2GAMAI.P1</a> e 03/02/010, Proc. nº <a href="https://acordao.pt/decisoes/144582" target="_blank">658/09.5GBAMT.P1</a>; Acs. R. Coimbra de 09/01/08, Proc. nº 15/07.1PAPBL-C1 e Proc. nº 426/04.6TSTR.C1; Ac. R. de Guimarães de 26/02/07, Proc. nº 2602/06.2; Ac. R. de Lisboa de 07/05/08, Proc. nº 2199/08-3 e bem assim o voto de vencido do Desembargador João Latas no Ac. R. de Évora de 01/07/08, Proc. nº 2699/07-1, todos em www.dgsi.pt.

Nos termos do nº 1, do artigo 81º, do Código da Estrada, é proibido conduzir sob influência de álcool, sendo que se considera nesse estado, conforme preceitua o nº 2 da mesma disposição, o condutor que apresente uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,5 g/l ou que, após exame realizado nos termos previstos no mesmo Código e legislação complementar, seja como tal considerado em relatório médico, consignando-se ainda que a conversão dos valores do teor do álcool no ar expirado (TAE) em teor de álcool no sangue (TAS) é baseada no princípio de que 1 mg de álcool por litro de ar expirado é equivalente a 2,3 g de álcool por litro de sangue – nº 3. 

Por sua vez, no artigo 292º, do Código Penal, tipifica-se como infracção criminal a condução de veículo, com ou sem motor, pelo menos negligentemente, em via pública ou equiparada, por quem tiver uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l.

Para que se preencha este elemento objectivo do mencionado tipo legal de crime (taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l) importa, assim, determinar a concreta taxa de alcoolemia de que o condutor é portador.

Por remissão do nº 1, do artigo 158º, do Código da Estrada, regem quanto aos meios e procedimentos relativos a detecção e comprovação do estado de influenciado pelo álcool, o Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas, aprovado pela Lei nº 18/2007, de 17/05, o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, aprovado pela Portaria nº 1556/2007, de 10/12 e a Portaria nº 902-B/2007, de 13/08.

No artigo 1º, do Regulamento de Fiscalização, enunciam-se os meios de detecção e medição da taxa de álcool no sangue, designadamente, analisadores qualitativos e quantitativos, estes por teste no ar expirado ou análise de sangue, consignando-se no artigo 14º que nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só podem ser utilizados aparelhos que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, sendo que prévia a esta aprovação se exige a homologação de modelo, da competência do Instituto Português da Qualidade, de acordo com os termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros. 

O Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, aprovado pela Portaria nº 1556/2007 de 10/12, define o que se entende por alcoolímetros, consignando que são “instrumentos destinados a medir a concentração mássica de álcool por unidade de volume na análise do ar alveolar expirado” (artigo 2º, nº 1), enuncia como seus requisitos que “deverão cumprir os requisitos metrológicos e técnicos definidos pela Recomendação OIML R 126” (artigo 4º) e que compete ao Instituto Português da Qualidade, I.P. – IPQ o seu controlo metrológico, que compreende as operações de aprovação de modelo, primeira verificação, verificação periódica e verificação extraordinária (artigo 5º).

O artigo 8º, do mesmo diploma legal, reporta-se aos “erros máximos admissíveis – EMA, variáveis em função do teor de álcool no ar expirado – TAE” consagrando-se que “são o constante do quadro que figura no quadro anexo ao presente diploma e que dele faz parte integrante”, sendo o quadro referido o seguinte:






Com interesse para a questão em análise temos ainda o nº 2, do artigo 9º, segundo o qual “os registos da medição devem conter, entre outros elementos, a marca, o modelo e o número de série do alcoolímetro assim como a data da última verificação metrológica”.

Na Portaria nº 902-B/2007, de 13/08, especificam-se as características técnicas, gerais e físicas a que devem obedecer os analisadores quantitativos, entre elas, que os referidos instrumentos devem “cumprir os requisitos metrológicos e técnicos definidos no regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros” e “usar a unidade de leitura em gramas de álcool por litro de sangue (TAS) segundo o factor fixado no nº 3 do artigo 81º, do Código da Estrada”.

Em artigo intitulado “A Alcoolemia e o Controlo Metrológico dos Alcoolímetros”, datado de 28/04/2008, disponível em www.ipq.pt, António Cruz, Maria do Céu Ferreira e Andreia Furtado, respectivamente Director do Departamento de Metrologia do IPQ, Responsável pelo Laboratório de Química-Física do IPQ e Técnica Superior do Laboratório de Química-Física do IPQ, manifestaram-se no sentido de que:

“Os Erros Máximos Admissíveis (EMA) são limites definidos convencionalmente em função não só das características dos instrumentos, como da finalidade para que são usados, ou seja, tais valores limite, para mais e para menos, não representam valores reais de erro, numa qualquer medição concreta, mas um intervalo dentro do qual, com toda a certeza (uma vez respeitados os procedimentos de medição) o valor da indicação se encontra” acrescentando ainda que “a qualquer resultado de medição está sempre associada uma incerteza de medição, uma vez que não existem instrumentos de medição absolutamente exactos. Esta incerteza de medição é avaliada no acto da Aprovação de Modelo por forma a averiguar se o instrumento durante a sua vida útil possui características construtivas adequadas, de forma a manter as qualidades metrológicas regulamentares, nomeadamente fornecer indicações dentro dos EMA prescritos no respectivo regulamento”. 

Referem ainda os mesmos autores que “a definição, através da Portaria 1556/2007, de determinados EMA, quer para a Aprovação de Modelo e Primeira Verificação, quer para a Verificação Periódica, visa definir barreiras limite dentro das quais as indicações dos instrumentos de medição, obtidas nas condições estipuladas de funcionamento são correctas. Ou seja, um alcoolímetro de modelo aprovado e com verificação válida, utilizado nas condições normais, fornece indicações válidas e fiáveis para os fins legais”.

Mais acrescentam que “a operação de adição ou subtracção dos EMA aos valores das indicações dos alcoolímetros sujeitos a controlo metrológico é totalmente desprovida de justificação metrológica, sendo o valor da indicação do aparelho em cada operação de medição, o mais correcto. O eventual erro da indicação, nessa operação, nesse momento, com o operador que a tiver efectuado, nas circunstâncias de ambiente locais, quaisquer que tenham sido outros factores de influência externos ou contaminantes do ar expirado, seja ele positivo ou negativo, está com toda a probabilidade contido nos limites do EMA”.

Contudo, do teor deste artigo e mormente dos excertos que respingamos, não resulta, em nosso entender, necessariamente, que esteja defeso considerar a necessidade de o Tribunal fazer uso das margens de erro dos aparelhos de medição para reduzir ao máximo o erro entre ao resultado do exame e a realidade.

Como se salienta no Ac. R. do Porto de 04/11/09, Proc. nº 643/07-1PBMAI.P1 “ainda que se possa aceitar que o erro existente é um erro legalmente previsto, a leitura final, embora legal, não é garantida como a real. E se a margem de erro legalmente admissível é levada em conta no momento da calibração do aparelho, tal facto apenas garante que o aparelho em concreto está apto a efectuar medições e que os resultados obtidos sempre se situarão dentro dos limites daquelas margens de erro, ainda que se admita mesmo que a incerteza se aproxime do grau zero, sendo certo que, perante a medição, o julgador terá de admitir sempre como provável a hipótese daquele resultado estar próximo do limite mínimo ou do limite máximo, da dita margem de erro”. 

Na verdade, “tecnicamente, não está explicado e temos dúvidas que o possa ser, em que termos o acto da calibração elimina ou reduz praticamente a zero, a dita margem de erro, no acto da medição ou realização do teste” e desde logo porque o alcoolímetro “ao efectuar cada uma das medições, dará uma resposta em função do álcool contido no ar expirado, o que pode significar que a cada medição corresponda um resultado diferente”. 

Do artigo supra mencionado parece resultar que ao ser calibrado o aparelho, este fica apto a, perante a quantidade de álcool do ar expirado, efectuar logo a “correcção” ou “dedução”, tendo em conta a margem de erro admissível.

Surge então, no desenvolvimento deste raciocínio, pertinente a questão: como é possível o aparelho efectuar uma “correcção” de determinada percentagem de margem de erro (por exemplo de 30%) ao ser realizado um teste a um condutor, para logo de seguida proceder a uma “correcção” de apenas 0,5% em teste ao condutor seguinte?

Na esteira deste aresto, entendemos que não se mostra demonstrado que efectivamente seja possível calibrar o alcoolímetro de molde a efectuar essas correcções e, nessa medida, aqui se ancora a dúvida inamovível quanto à existência e concreta expressão do desvio entre o valor indicado no instrumento de medida e o valor real, o que conduz a que necessariamente se tenha de proceder ao desconto do valor do erro máximo admissível indicado no quadro anexo à Portaria nº 1556/2007 no valor de TAS registado no talão emitido pelo alcoolímetro, desde logo por imposição do princípio in dubio pro reo”. 

Na verdade, encontrando-se a aprovação de modelo e a certificação de cada aparelho na primeira verificação e nas verificações seguintes sujeitas à não ultrapassagem das margens de erro admissível fixadas no quadro anexo mencionado, o tribunal não pode estar seguro de que o condutor submetido ao teste, em cada caso concreto, tenha tripulado o veículo com a exacta taxa de álcool indicada pelo aparelho. 

Porém, como se destaca no Ac. R. de Lisboa. de 07/05/08, Proc. nº 2199/08-3, se o aparelho se encontra aprovado, se foi sujeito à verificação periódica e está a funcionar regularmente, o tribunal tem todas as razões para ter por seguro, “para além de qualquer dúvida razoável”, que o examinado tinha a taxa de álcool que resulta da subtracção da margem de erro máximo admissível ao valor indicado pelo aparelho. 

Acresce que a medição da taxa de álcool no sangue, o teste realizado com o alcoolímetro, não constitui prova pericial, porquanto não exige especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos, apresentando-se antes como um exame, não obstante ser efectuado por aparelho tecnologicamente sofisticado, pelo que o resultado do teste não pode ser considerado prova vinculada. 

Como se salienta no Ac. R. de Coimbra de 09/01/08, Proc. nº 15/07.1PAPBL-C1, “os exames (artigo 171º, do Código de Processo Penal), mais não são do que meios através dos quais se captam indícios relativos à prática de uma infracção e que tanto podem ser realizados em pessoas e lugares, como em coisas, quer por mera observação, quer pela utilização de aparelhos ou mecanismos.

No caso dos exames, na ausência de norma expressa, a regra de apreciação da prova é a prevista no artigo 127º, do Código de Processo Penal, isto é, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador” 

Assim, ao proceder ao desconto do valor correspondente ao erro máximo admissível para o grau de alcoolemia indicado no alcoolímetro, naquele por este indicado, não violou o tribunal recorrido disposição legal alguma, apenas apreciou a prova de acordo com as regras da experiência e a sua livre convicção, conforme estabelecido no mencionado artigo 127º.

Em conclusão, da análise da decisão recorrida, perscrutando-a com o escopo de detectar a existência de algum dos vícios invocados pelo recorrente a que se reporta o artigo 410º, nº 2, do CPP, nos termos em definidos ficaram, concluímos pela sua não verificação, porquanto inexiste contradição alguma da fundamentação e também se não vislumbra erro grosseiro e manifesto na apreciação da prova, porquanto foi feita uma aplicação rigorosa dos princípios que a regem.

Improcedem, pois, estes fundamentos do recurso.

Admissibilidade da atenuação especial da pena acessória de proibição de conduzir.

O tribunal a quo condenou o arguido na sanção acessória de inibição (em rigor, pena acessória de proibição) de conduzir qualquer tipo de veículo motorizado, especialmente atenuada, pelo período de um mês, nos termos dos artigos 72º e 69º, nº 1, alínea a), do Código Penal.

Estabelece-se no artigo 69º, nº 1, alínea a), supra referido, que é condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos quem for punido por crime previsto no artigo 292º.

Seguindo a lição de Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, As Consequências jurídicas do Crime, Aequitas, 1993, pag. 90, as penas acessórias desempenham uma função preventiva adjuvante da pena principal, com sentido e conteúdo não apenas de intimidação da generalidade, mas também de defesa contra a perigosidade individual.

Porque se trata de uma pena, ainda que acessória, deve o julgador, na sua graduação atender, também, ao estabelecido no artigo 71º, do CP, tendo presente que a sua finalidade (ao contrário da pena principal que visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração social do agente) assenta na censura da perigosidade, embora a ela não seja estranha a finalidade de prevenção geral (cfr. Figueiredo Dias, ob.cit. pág. 165).

A decisão recorrida considerou estar perante um caso em que deve funcionar a atenuação especial da pena, porquanto o arguido conduz há 24 anos, de forma profissional, ou seja, passa o seu dia de trabalho na estrada, ao volante de um pesado, consabidamente veículo sujeito a mais fiscalizações que um ligeiro. E no entanto não tem averbado no seu RIC qualquer infracção, sendo igualmente primário em termos criminais.
No caso presente, pois, justifica-se a atenuação especial, considerando que 
- a acentuada diminuição da ilicitude está, desde logo, patente na análise que se fez a propósito da qualificação dos factos, face ao nível de alcoolémia;
- relativamente à culpa, provou-se que o arguido agiu voluntária e livremente, com plena consciência das características do produto que ingerira mas agiu com dolo eventual, o que de algum modo tem o condão de atenuar acentuadamente a sua culpa, conjuntamente com a circunstância de ter conduzido dentro da localidade;
- no que diz respeito à necessidade de pena, justifica-se a atenuação pois o arguido está familiar e profissionalmente integrado e faz da condução profissão, o que, se não negamos de algum modo agrava de certo jeito a sua culpa porque lhe era mais exigível o comportamento lícito alternativo, não deixa porém de impor que se pondere doutro passo que o crime foi cometido ao volante de um ligeiro, fora do serviço, no fim de semana; o arguido conduzia dentro da povoação e não em qualquer dos itinerários limítrofes e mais acometidos por sinistralidade; que confessou; que fazendo da condução profissão, para mais sendo o único sustento da família é de crer que a pena principal e a pena acessória atenuada sirvam para o arredar de futuros comportamentos”.

Ora, em nosso entender e na esteira dos Acs. da R. de Évora de 09/07/02, CJ Ano XXVII, 2002, Tomo IV, pag 252 e da Relação de Lisboa de 21/11/06, CJ Ano XXXI, 2006, Tomo V, pag. 128 (com a concordância de Paulo Pinto de Albuquerque em Comentário do Código Penal, UCE, 2008, pag. 226), não é admissível a atenuação especial da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor prevista no artigo 69º, nº 1, alínea a), do Código Penal, por aplicação do estabelecido nos artigos 72º e 73º, do mesmo diploma legal (nem, aliás, pela de quaisquer outros normativos).

É que, tendo como escopo a pena acessória, na sua essência, a prevenção da perigosidade do agente, embora também vise fins de prevenção geral, posto que lhe é alheia a finalidade de integração do agente, vedada está a atenuação especial da pena, assim como, aliás, a aplicação do instituto da suspensão, admissíveis apenas quando se trata de contra-ordenações (cfr. artigos 140º e 141°, respectivamente, do Código da Estrada), o que resulta, desde logo, também, no que à atenuação tange, da leitura do respectivo texto, pois o artigo 73º, do CP, tem o seu campo de aplicação limitado às penas principais de prisão e multa, em passo algum se referindo à pena acessória de proibição de conduzir.

Porque assim é, tem de proceder o recurso neste segmento, pelo que, tendo em atenção:

O baixo grau de ilicitude do facto, atenta a TAS apurada, pouco acima do valor que confere significado criminal à conduta.
Que o arguido agiu com dolo eventual (não se entende bem como, mas certo é que esta factualidade se mostra provada e não é colocada em causa).

Que exerce a condução há 24 anos, de forma profissional, não registando antecedentes criminais ou contra-ordenacionais na área da condução motorizada.

Que está familiar e profissionalmente integrado, ponderando também as razões de prevenção geral, a pena acessória de proibição de conduzir terá de ser aplicada pelo período mínimo legal, ou seja, três meses, pois se mostra ela, nesta medida, como suficiente, proporcional e adequada às suas finalidades.

III - DISPOSITIVO

Pelo exposto, acordam os Juízes da 1ª Secção Criminal desta Relação em conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência, condenar o arguido B…………, na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de três meses, nos termos do artigo 69º, nº 1, alínea a), do Código Penal, mantendo, no mais, a decisão recorrida.

Sem tributação.

Porto, 3 de Março de 2010
(Consigna-se que o presente acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo primeiro signatário – artigo 94º, nº 2, do CPP)
Artur Daniel T. Vargues da Conceição
Jorge Manuel Baptista Gonçalves
________________
[1] Com explicitação integral do que propendemos a ter como correcta interpretação da confissão formulada veja-se Acórdão da Tribunal da Relação do Porto de 2 de Abril de 2008 in DGSI.
[2] Actualmente Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro.
[3] Em sentido oposto Germano Marques da Silva, Crimes Rodoviários, 1996, p. 81.
[4] Rectius eram, face à entrada em vigor do Novo Regulamento do Controle Metrológico dos Alcoolímetros 
Anteriormente Portaria 748/94 de 13 de Agosto que aprovou Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros.
Vejamos: o Código da Estrada dispõe no seu artigo 81º, na parte que ora interessa:
Condução sob influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas1 - É proibido conduzir sob influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas. 
2 - Considera-se sob influência de álcool o condutor que apresente uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,5 g/l ou que, após exame realizado nos termos previstos no presente Código e legislação complementar, seja como tal considerado em relatório médico. 
3 - A conversão dos valores do teor de álcool no ar expirado (TAE) em teor de álcool no sangue (TAS) é baseada no princípio de que 1 mg de álcool por litro de ar expirado é equivalente a 2,3 g de álcool por litro de sangue. 
4 - Considera-se sob influência de substâncias psicotrópicas o condutor que, após exame realizado nos termos do presente Código e legislação complementar, seja como tal considerado em relatório médico ou pericial. 
(…)
Quanto aos meios a utilizar na determinação da alcoolémia, rege o artigo 153º do Código da Estrada :
Fiscalização da condução sob influência de álcool
1 - O exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito. 
2 - Se o resultado do exame previsto no número anterior for positivo, a autoridade ou o agente de autoridade deve notificar o examinando, por escrito, ou, se tal não for possível, verbalmente, daquele resultado, das sanções legais dele decorrentes, de que pode, de imediato, requerer a realização de contraprova e de que deve suportar todas as despesas originadas por esta contraprova no caso de resultado positivo. 
3 - A contraprova referida no número anterior deve ser realizada por um dos seguintes meios, de acordo com a vontade do examinando: 
a) Novo exame, a efectuar através de aparelho aprovado;
b) Análise de sangue.
4 - No caso de opção pelo novo exame previsto na alínea a) do número anterior, o examinando deve ser, de imediato, a ele sujeito e, se necessário, conduzido a local onde o referido exame possa ser efectuado. 
5 - Se o examinando preferir a realização de uma análise de sangue, deve ser conduzido, o mais rapidamente possível, a estabelecimento oficial de saúde, a fim de ser colhida a quantidade de sangue necessária para o efeito. 
6 - O resultado da contraprova prevalece sobre o resultado do exame inicial.
7 - Quando se suspeite da utilização de meios susceptíveis de alterar momentaneamente o resultado do exame, pode a autoridade ou o agente de autoridade mandar submeter o suspeito a exame médico. 
8 - Se não for possível a realização de prova por pesquisa de álcool no ar expirado, o examinando deve ser submetido a colheita de sangue para análise ou, se esta não for possível por razões médicas, deve ser realizado exame médico, em estabelecimento oficial de saúde, para diagnosticar o estado de influenciado pelo álcool. 
Os aparelhos em questão estão sujeitos à aprovação e fiscalização Instituto Português da Qualidade e o quadro legal que lhes é aplicável é actualmente o seguinte:
a) - Decreto-Lei 291/90 de 20 de Setembro que estabelece o Regime Geral do Controle Metrológico, estabelecendo no seu artigo 1º nº 2 
«Os métodos e instrumentos de medição obedecem à qualidade metrológica estabelecida nos respectivos regulamentos de controlo metrológico de harmonia com as directivas comunitárias ou, na sua falta, pelas recomendações da Organização Internacional de Metrologia Legal (OIML) ou outras disposições aplicáveis indicadas pelo Instituto Português da Qualidade.»
b) Portaria 962/90 de 9 de Outubro que aprovou o Regulamento Geral do Controlo Metrológico;
c) Portaria nº748/94, de 13 de Agosto que aprovou em Anexo o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros.
É precisamente o nº 6 do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros que determina a aplicabilidade dos erros máximos previstos na Norma AFNOR de 1 de Fevereiro de 1992 NF X 20-701 (v.nº.4 do seu Anexo)
Ora, não desconhecemos que parte da jurisprudência entende que tal normativo já se não encontra em vigor.
Vejamos porquê.
Na sequência da alteração do Código da Estrada, por via do Decreto-Lei nº.2/98, de 3 de Janeiro, o Decreto Regulamentar nº.24/98, de 30 de Outubro revogou expressamente o Decreto Regulamentar nº.12/90, consignando os procedimentos para a fiscalização da condução sob a influência do álcool. 
Ora com base nesta expressa menção do artigo 15º os partidários da revogação da Portaria nº.748/94 entendem que esta aprovou o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros nos termos e para os efeitos do disposto no nº.2 do artigo.1º do Decreto Regulamentar nº.12/90, como decorre do nº.1 do seu Anexo, onde se diz que « O presente Regulamento aplica-se, exclusivamente, a alcoolímetros destinados à determinação da taxa de álcool, para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 1.º do Decreto Regulamentar n.º 12/90, de 14 de Maio. »
Ora, se este último, veio a ser expressamente revogado tacitamente deveria entender-se que igualmente o foi o compêndio normativo em análise.
Salvo o devido respeito pela interpretação em causa, cremos que se toma a árvore pela floresta.
Na verdade, o que o mencionado Decreto Regulamentar nº.24/98, de 30 de Outubro instituiu foram os procedimentos para a fiscalização da condução sob a influência do álcool. 
Em nada veio alterar, dispor ou modificar – ou sequer reservar para posterior intervenção legislativa - o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros.
E tanto assim é que ulteriormente nenhuma intervenção nesse domínio ocorreu, não sendo em boa e sã interpretação sistemática de entender que desde então até ao presente o IPQ levou a cabo a sua actividade de fiscalização e aprovação sem Regulamento expresso.
Mais. 
Se tal interpretação se sustentasse, seria supor que um Decreto Regulamentar ( o nº.24/98, de 30 de Outubro) teria levado a cabo uma autêntica derrogação da recepção no direito interno de norma, já transposta e aplicada, de uma Recomendação da Organização Internacional de Metrologia Legal, consubstanciada no Decreto-Lei  291/90 de 20 de Setembro, Portaria 962/90 e Portaria 748/94 de 13 de Agosto. 
Tal normativo, na medida em que traduz o cumprimento de uma Convenção Internacional a que Portugal aderiu, beneficia da protecção que a tais normais de direito supra-nacional é garantida por força do artigo 8º da Constituição da República Portuguesa.
Doutro passo, está também o Estado Português obrigado ao respeito pelas Directiva 83/575/CEE do Conselho de 23 de Outubro de 1983 que altera a Directiva 71/316/CEE relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes às disposições comuns sobre os instrumentos de medição e os métodos de controle metrológico que veio a ter expressão nos Decretos supra mencionados e ainda na Portaria 748/94 de 13 de Agosto que expressamente consigna o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros;
Não se vê, pois, como pura e simplesmente poderia o Decreto-Regulamentar deixar o vazio legal da transposição operada por uma Directiva Comunitária.
Cremos, pois, que quando se defende a revogação da falada Portaria 748/94 de 13 de Agosto por via de se ter revogado o regime de fiscalização da condução sob efeito do álcool mediante a utilização de alcoolímetros se confundem duas realidades: uma coisa é o regime de fiscalização em si, outra, bem diversa, é a Regulamentação do Controlo Metrológico mediante o qual se efectua tal fiscalização.
E nessa medida afigura-se-nos bem pobre e simplista o argumento literal do disposto no já transcrito nº.1 do seu Anexo, onde se diz que «O presente Regulamento aplica-se, exclusivamente, a alcoolímetros destinados à determinação da taxa de álcool, para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 1.º do Decreto Regulamentar n.º 12/90, de 14 de Maio».
[5] e aliás circuladas pelo CSM a pedido da DGV em Oficio/Circular
[6] Acórdão de 19.12.2007, de 02.04.2008, 07.05.2008, 14.05.2008, 15.10.2008, 22.10.2008, 26.11.2008, 21.01.2009, 04.02.2009, de  do Tribunal da Relação do Porto; de 09.01 de 2008 e da mesma data, de diversa secção, ambos do Tribunal da Relação de Coimbra; Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 07 de Maio de 2008 publicado on line na DGSI.
[7] cfr. FIGUEIREDO DIAS, “Direito Penal II, Parte Geral, As Consequências Jurídicas do Crime”, Secção de Textos da Universidade de Coimbra, 1988, pág. 229 e ss. e mais recentemente “Direito Penal Português, Parte Geral II, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, Ano 1993, pág. 198 e ss.
[8] in Direito Penal Português, Consequências Jurídicas do Crime, Notícias Editorial, §§ 205 e 793
[9] Actas da Comissão de Revisão do Código Penal, n.ºs 5, 8, 10 e 41
[10] “Direito Penal Português, As consequências jurídicas do crime”, Notícias Editorial, § 205
[11] Op cit, pág. 304
[12] Acs. do STJ de 20-10-2004, Proc. n.º 2824/04 - 3.ª, e de 17-11-2005, Proc. n.º 1296/05 - 5.ª

RECURSO Nº 58/09.7PAMDL.P1 Proc. nº 58/09.7PAMDL, do 1º Juízo, do Tribunal Judicial de Mirandela Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto I - RELATÓRIO 1. Nos presentes autos com o NUIPC 58/09.7PAMDL, do 1º Juízo, do Tribunal Judicial de Mirandela, em processo sumário, foi o arguido B…………… condenado, por sentença de 15/04/09, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo artigo 292º, nº 1, do Código Penal, na pena de 70 dias de multa, à taxa diária de cinco euros e na sanção acessória de inibição de conduzir qualquer tipo de veículo motorizado, especialmente atenuada, pelo período de um mês, nos termos dos artigos 72º e 69º, nº 1, alínea a), do mesmo diploma legal. 2. O Ministério Público não se conformou com a decisão e dela interpôs recurso, impetrando a sua revogação parcial e substituição por outra que considere a TAS como sendo de 1,38 g/l e condene o arguido na pena de 80 dias de multa, à taxa diária de cinco euros e ainda na pena acessória de inibição de conduzir qualquer veículo motorizado pelo período de três meses. 2.1 Extraiu o recorrente da motivação as seguintes conclusões (transcrição): 1. É o Instituto Português de Qualidade (IPQ) – e só ele – enquanto gestor e coordenador do Sistema Português de Qualidade (SPQ), que, a nível nacional, garante a observância dos princípios e das regras que disciplinam a normalização, a certificação e a metrologia, incluindo os aparelhos para exame de pesquisa de álcool nos condutores de veículos; 2. À data dos factos do caso em tela, nem o Código da Estrada, nem o Decreto Regulamentar nº 24/98, de 30 de Outubro, nem a Portaria nº 1006/98 de 30 de Novembro, ou outro diploma em vigor, permitia fixar qualquer margem de erro a atender nos resultados obtidos pelos analisadores quantitativos de avaliação do teor de álcool no sangue; 3. Ainda que se aceite que tenham de ser consideradas as margens de erro fixadas na sobredita Portaria, em sintonia com a Convenção Internacional a que Portugal aderiu, por força do Decreto do Governo nº 34/84, de 11 de Julho, a aplicação dessas margens de erro reporta-se à aprovação do modelo e às verificações dos alcoolímetros, da competência do Instituto Português da Qualidade, não existindo fundamento para que o julgador, oficiosamente e sem elementos de prova que o sustentem, proceda a correcções da taxa de álcool no sangue apurada pelos alcoolímetros, adequadamente aprovados e verificados; 4. É ainda de referir, pela sua relevância, que foi publicado através da Portaria nº 1556/2007, de 10 de Dezembro, o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, donde se extrai – a nosso ver – no quadro a ela anexo que os erros máximos admissíveis – EMA, são levados em conta na “Aprovação de modelo/primeira verificação” e na “Verificação periódica/verificação extraordinária” e não aquando dos actos de fiscalização levados a efeito por agentes policiais. 5. O Tribunal a quo incorreu nos vícios da contradição insanável da fundamentação, previsto no art. 410.°, n.º 2, al. b) do CPP (de conhecimento oficioso) e de erro notório na apreciação da prova, previsto no art. 410.°, n.º 2, al. c) do CPP, já que o julgador ao alicerçar a sua convicção, além, do mais, na confissão do arguido e no talão do alcoolímetro junto aos autos que traduziu uma TAS de 1,38g/l, não podia ter considerado provado que a tal TAS correspondia uma TAS de 1,26g/l uma vez que não resulta dos autos qualquer elemento probatório que permita realizar tal operação. 6. Nesta decorrência, concluindo-se pela TAS de 1,38g/l, haverá que proceder novamente à determinação da medida da pena principal e da pena acessória. 7. A lei penal fixa o limite mínimo da pena acessória de inibição de conduzir em três meses, não sendo susceptível de atenuação especial. 8. Assim, conformando-nos com os demais fundamentos constantes, neste particular, na decisão recorrida, o arguido deverá ser condenado pelo crime cometido, na pena de 80 (oitenta) dias de multa à taxa diária de 5 (cinco) euros, e ainda na pena acessória de inibição de conduzir qualquer veículo motorizado pelo período de três meses. V - NORMAS VIOLADAS. Foram violados os arts. 29.º e 35.º da Lei 173/99, de 21-09, 410.º, n.º 2, alíneas b) e c), do Código de Processo Penal, 153.º, n.º 1, e 158.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código da Estrada, as normas constantes do Decreto Regulamentar n.º 24/98, de 30 de Outubro e da Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro, que deveriam ter sido interpretadas em consonância com a interpretação que lhes é dada nas sobreditas conclusões que aqui se dão por reproduzidas. 3. O arguido não apresentou resposta. 4. Nesta Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da procedência do recurso, nos seguintes termos (transcrição): A questão principal posta na motivação de recurso interposto pelo M.P. em 5-5-2009, em que é recorrido o arguido B………….., da sentença de fls. 31 a 61, proferida, notificada ao M.P. e ao arguido e depositada em 15-4-2009, que condenou aquele arguido pela prática de 1 crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelos arts. 292 n° 1 e 69 n° 1 al. a) do C.P., na pena de setenta dias de multa, à taxa diária de 5 euros e na sanção pena) acessória de inibição (devia ser dito de proibição) de conduzir qualquer tipo de veículo motorizado, especialmente atenuada, pelo período de 1 mês, é idêntica à já colocada em dezenas de recursos neste Relação, que é a de saber se é legal o Juiz de julgamento poder, sem que a acusação ou a defesa tenha requerido ou proposto, alterar com os reflexos inerentes nos factos provados referentes ao grau de álcool (alcoolemia) e na eventual qualificação jurídica desses factos, o resultado constante do talão de registo de TAS verificado na realização do teste quantitativo de grau de álcool no sangue do condutor de veículo efectuado com aparelho legalmente aprovado, testado e certificado pela entidade e autoridade competente, mesmo quando o arguido confessa os factos da acusação – onde é descrita a TAS inscrita no talão – não requereu contra-prova, nem põe em causa o estado, a aprovação e a certificação do aparelho de medida e sem que tenha sido produzida prova de que a medição efectuada pelo aparelho está errada e quando o julgador funda a sua convicção para dar como provados os factos na confissão do arguido desses factos e no dito talão. A Relação do Porto está dividida quanto à solução correcta dessa questão, havendo numerosos acórdãos num sentido e no outro, isto é, no sentido defendido na decisão recorrida e no sentido oposto, o sustentado na motivação do presente recurso. A nossa opinião é no sentido de que a interpretação defendida na motivação de recurso é a única correcta pelos fundamentos aí expressos, com os quais estamos de acordo, opinião que temos mantido em todos os processos em que a mesma questão foi posta sobre a qual emitimos parecer, não vendo nós razões para alterar o entendimento que sempre defendemos. Pelo que, entendemos que deve ser dado provimento ao recurso nessa questão. No que concerne à questão da aplicação da atenuação especial da pena acessória, aplicada e sustentada na decisão recorrida, também entendemos, tal como o recorrente, que tal pena não é susceptível de atenuação especial, dado que tal atenuação contraria os pressupostos e a finalidade da previsão dessa pena acessória. De facto, o crime pelo qual o arguido foi condenado é punível com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias ( art. 292 n° 1 do C.P. ) e com a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre 3 meses e 3 anos ( art. 69 n° 1 al. a) do C.P. ). O mínimo de pena acessória previsto é de 3 meses. Não estando em causa que a determinação da medida da pena acessória deve obedecer aos mesmos critérios estabelecidos para a determinação da medida da pena no art. 71 do C.P. para a pena principal, isto é, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, ainda que sem respeito por qualquer fórmula matemática ou por qualquer proporção matemática, certo é que "como ensina o Prof. Figueiredo Dias, a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados tem como pressuposto material a circunstância de, consideradas as circunstâncias do facto e da personalidade do agente, o exercício da condução se revelar especialmente censurável, donde que então essa circunstância vai elevar o limite da culpa" (v. Germano Marques da Silva em "Crimes Rodoviários Pena Acessória e Medidas de Segurança", pag. 31 ). Ora, a atenuação especial da pena depende, nos termos do art. 72 do C.P., da verificação de circunstâncias anteriores, posteriores ou contemporâneas do crime que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena, ou seja, da verificação de circunstâncias opostas às que constituem o pressuposto material da aplicação da pena acessória. É pelo facto da conduta de condução de veículo automóvel em estado de embriaguez se revelar especialmente censurável e pôr em perigo altos valores e interesses, como a vida e bens de valor elevado, elevando o limite da culpa, que o legislador se viu na necessidade, para reforçar a finalidade preventiva e para combater a perigosidade daquela conduta, de cominar para a mesma uma pena acessória, para além da pena principal. Portanto, o pressuposto material da aplicação da pena acessória opõe-se aos pressupostos da atenuação especial da pena. Daí entender-se que não é admissível a aplicação da atenuação especial da proibição de conduzir prevista nos arts. 72 e 73 do C.P. ( v. nesse sentido Paulo Pinto Albuquerque em Comentário do Código Penal, pag. 226 ). Assim, o tribunal ao reduzir o mínimo da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor de 3 meses para 1 mês fez errada interpretação e aplicação do direito. Mais, para fundamentar a redução dessa pena para aquela medida, deu por verificadas circunstâncias que não têm virtualidades para diminuir de forma acentuada a culpa do agente, a ilicitude do facto ou a necessidade da pena, nomeadamente a confissão integral e sem reservas e o facto de não lhe serem conhecidos antecedentes criminais ou infracções estradais registadas, pois o arguido só confessou o que não podia negar, dado que foi apanhado em flagrante por agente da autoridade a conduzir automóvel em estado de embriaguez, e o facto de não ter registados antecedentes criminais no CRC ou contra-ordenações registadas no RIC não pode favorecê-lo de forma acentuada, dado que o comportamento respeitador da normas é o exigível ao comum dos cidadãos, não devendo aquele ser beneficiado por adoptar esse comportamento. Portanto, nem ao abrigo do art. 72 do C.P., a pena acessória deveria ter sido especialmente atenuada. 5. Foi cumprido o estabelecido no artigo 417º, nº 2, do CPP, inexistindo resposta. 6. Colhidos os vistos, foram os autos à conferência. Cumpre apreciar e decidir. II - FUNDAMENTAÇÃO 1. Âmbito do Recurso O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, havendo ainda que ponderar as questões de conhecimento oficioso, mormente os vícios enunciados no artigo 410º, nº 2, do CPP – neste sentido, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª Edição, Editorial Verbo, pág. 335; Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª Edição, Edições Rei dos Livros, pág. 103, Ac. do STJ de 28/04/99, CJ/STJ, 1999, Tomo 2, pág. 196 e Ac. do Pleno do STJ nº 7/95, de 19/10/95, DR I Série A de 28/12/95. No caso em apreço, atendendo às conclusões da motivação do recurso, as questões que se suscitam são as seguintes: A decisão recorrida incorreu em vício de contradição insanável da fundamentação, a que se reporta o artigo 410º, nº 2, alínea b), do CPP? O acórdão recorrido incorreu em vício de erro notório na apreciação da prova, a que se reporta o artigo 410º, nº 2, alínea c), do CPP? Admissibilidade da atenuação especial da pena acessória de proibição de conduzir. 2. A Decisão Recorrida O Tribunal a quo deu como provados os seguintes factos (transcrição): 1- No dia 21 de Fevereiro de 2009, pelas 23.26 horas, o arguido conduzia o veículo ligeiro com a matrícula ..-..-NX na EN 216, na Av. das Comunidades Europeias, em Mirandela. 2- Submetido ao controle de alcoolémia, através do alcoolímetro Drager modelo Alcotest MKIII-P com o nº ARRL-0051 aprovado pela DGV em 6 de Agosto de 1998, acusou a T.A.S. de 1,38 g/l, que corresponde, deduzida a margem de erro, no caso de 8%, a pelo menos 1,26 g/l. 3- Agiu o arguido livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que ingerira bebidas com teor alcoólico e em quantidade que admitiu determinar-lhe uma TAS superior a 1,20 g/l e que, por isso, não podia conduzir veículos automóveis na via pública como efectivamente fazia. 4- Sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei. 5- O arguido confessou e demonstrou arrependimento. 6- É casado, vive com a mulher, de baixa prolongada por doença, e dois filhos de 28 e 29 anos, ambos desempregados, bem como o genro também desempregado, e dois netos, todos a seu cargo. 7- Habitam em casa própria, e subsistem do ordenado do arguido, como motorista de pesados por conta da empresa «C…………» para a qual trabalha desde 1985, auferindo um salário de cerca de 700 €. 8- Não lhe são conhecidos antecedentes criminais não tendo nenhuns averbados no crc. 9- Não tem averbados quaisquer antecedentes estradais no seu RIC. No que tange aos factos não provados (transcrição): Com relevo para a decisão da causa, não se provou: a) Que o arguido conduzia com a T.A.S. de 1,38gl/l, Fundamentou a formação da sua convicção nos seguintes termos (transcrição): O tribunal formou a sua convicção quanto aos factos provados com base no teor do Certificado de Registo Criminal do arguido, RIC, e no teor do talão do alcoolímetro, bem como na sua confissão do teor objectivo dos factos atinentes ao que concerne à ingestão de bebidas, ao acto de condução e bem assim à consciência da ilicitude do acto. Atente-se que a confissão do arguido, quanto a nós, mais não abrange do que a cognoscibilidade da ingestão do álcool e do seu efeito sob a capacidade de conduzir e bem assim do resultado do exame corporizado no talão do alcoolímetro, e de modo algum pode ser tida como confissão «metrológica» da quantidade de gramas por litro no sangue que detinha. Com isto nos afastamos de (cremos parte não significativa) da jurisprudência que vem pugnando pela imutabilidade dos «factos» confessados – mesmo no que tange à quantificação dependente de verificação com recurso a meios de obtenção de prova do jaez dos que infra analisaremos…[1] O elemento subjectivo decorre do compaginar das regras da experiência concatenado com o que se extrai dos factos objectivos, pois que outra forma não existe de apurar um facto que em si, se traduz num dado do mundo interno: a consciência e vontade do arguido em praticar tais factos é incontornavelmente expressa no próprio acto de conduzir, na medida em que o fez deliberada e livremente, pois nada vem provado que possa afastar o preenchimento subjectivo. Na verdade, extrai-se que o arguido decidiu conduzir o veículo mesmo sabendo que ingerira já bebidas alcoólicas em quantidade que admitiu ser adequada a pô-lo no estado em que se encontrava e que o fez ciente de que cometia um crime, sem motivo justificativo, e tal facto, em si, é do conhecimento do comum dos cidadãos de média e sã consciência. Fundou-se no teor do talão do alcoolímetro de folhas 5, quanto aos factos relativos ao nível de alcoolémia, corrigido pela margem de erro máxima admissível. Antes da entrada em vigor da Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro, seguíamos uma linha de raciocínio que não vemos razões para alterar, bem ao invés cremos sair reforçada. Julgamos que a correcção da taxa de alcoolémia com as margens de erro é imposta pelo plasmado na - Recomendação da OIML, transposta nos Decreto-Lei 291/90 de 20 de Setembro e Portaria 1556/2007, publicada no DR I Série em 10 de Dezembro, Portaria 902-B/2007 de 13 de Agosto e Lei 18/2007 de 17 de Maio força do estatuído no artigo 8º da Constituição da República Portuguesa; - A Directiva 83/575/CEE do Conselho de 23 de Outubro de 1983 que altera a Directiva 71/316/CEE relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes às disposições comuns sobre os instrumentos de medição e os métodos de controle metrológico que veio a ter expressão nos Decretos supra mencionados e ainda na Portaria 1556/2007, publicada no DR I Série em 10 de Dezembro último que expressamente consigna o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros; Neste particular o Tribunal não deu como provado o nível exacto de alcoolémia detectado pela análise do alcoolímetro Drager modelo Alcotest MKIII-P com o nº ARRL-0057 aprovado pela DGV em 6 de Agosto de 1998 através do Despacho do IPQ nº 211.06.96.3.30, DR II Série de 25 de Setembro de 1996; antes procedeu à aplicação da taxa de 8% nos termos da portaria[2] que corresponde, deduzida a margem de erro, a pelo menos 1,28g/l. Trata-se quanto a nós de uma questão de apreciação de prova em que temos que lançar mão da regra prevista no artigo 127º do Código de Processo Penal, isto é, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.» Todavia, face ao bloco normativo que de modo detalhado define e limita os modos processualmente idóneos à demonstração de um dos elementos do tipo objectivo do crime, excluindo quaisquer outros, afigura-se-nos dilúcido que no caso concreto vale nesta matéria algo mais do que uma mera limitação ou excepção ao princípio da livre apreciação da prova vigente em processo penal. Não está aberta ao juiz a possibilidade de apreciação diversa daquela que impõe o recurso a tais meios técnicos, ainda quando fundamentasse essa apreciação (e na medida em que tal fosse cogitável) em razões também técnicas, nos termos do n.º 2 do artigo 163.º do Código de Processo Penal. Em conclusão, trata-se aqui de um autêntico domínio de prova vinculada[3]. Por isso principiámos por dizer que a prova de diversa taxa de alcoolémia da apresentada no talão do alcoolímetro se baseava nos dispositivos legais supra mencionados, conforme passaremos a explicitar. A colheita de ar expirado, para efeitos de determinação da presença de álcool no sangue, mais não é do que um exame, levado a cabo por um meio técnico adequado. Não constitui o exame ao álcool no sangue realizado por alcoolímetro um meio de prova, como é por exemplo a prova pericial, mas meio de obtenção prova. Em todas as situações em que se utilizam mecanismos (de entre uma infinidade deles, destacam-se os vulgares radares, alcoolímetros e balanças) ou se atribuem certas características a um aparelho ou produto, com vista a determinar uma qualidade ou quantidade relevantes juridicamente, os serviços respectivos devem verificar a sua funcionalidade e aferição, a qual, nalguns casos, é feita por organismos oficiais. Ao proceder à leitura dos registos concretizados nos alcoolímetros da taxa de álcool no sangue de um arguido, temos por seguro que o julgador deve usar das margens de erro previstas para esses registos, pois de outro modo estaria a basear-se em registos que, cientificamente, não são reconhecidos como seguros e exactos, sendo que tais margens de erro são[4] as previstas no actual Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou Substâncias Psicotrópicas aprovado pela Lei 18/2007 de 17 de Maio e legislação conexa. Vejamos. No 14º daquele Diploma, reportando-se à aprovação dos equipamentos para o efeito: «1 - Nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só podem ser utilizados analisadores que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária. 2 - A aprovação a que se refere o número anterior é precedida de homologação de modelo, a efectuar pelo Instituto Português da Qualidade, nos termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros.» Procedendo a atenta leitura do preceito, cumpre perguntar, então, se acaso a Portaria 748/94 de 13 de Agosto estivesse nesse momento revogada, para que Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros remeteria o actual compêndio legal? Poder-se-ia pensar que tal estaria previsto em Regulamentação posterior designadamente na Portaria 902-B/2007 de 13 de Agosto, que para além do mais veio fixar os requisitos a que devem obedecer os analisadores quantitativos. Todavia, a referida Portaria, logo na sua I Secção, epigrafada Analisadores Quantitativos estatui: 1.º Os analisadores quantitativos são instrumentos de medição da concentração da massa de álcool por unidade de volume na análise do ar alveolar expirado (TAE). 2.º Os aparelhos definidos no número anterior devem obedecer às seguintes características: A - Características técnicas: a) Cumprir os requisitos metrológicos e técnicos definidos no Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros; Entretanto entrou em vigor a Portaria 1556/2007, publicada no DR I Série em 10 de Dezembro último, em cujo preâmbulo pode ler-se «O controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição em Portugal, em geral, obedece ao regime constante do Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro, às disposições regulamentares gerais constantes do Regulamento Geral do Controlo Metrológico aprovado pela Portaria n.º 962/90, publicada no Diário da República, 1.ª série, de 9 de Outubro de 1990, e ainda às disposições constantes das portarias específicas de cada instrumento de medição. Recentemente, o Decreto-Lei n.º 192/2006, de 26 de Setembro, transpondo para o direito interno a Directiva n.º 2004/22/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março, veio regular o controlo metrológico dos 11 instrumentos de medição elencados no seu artigo 2.º Para os instrumentos de medição abrangidos pelo Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro, e que não mereceram qualquer adaptação através do Decreto-Lei n.º 192/2006, de 26 de Setembro, verifica-se a necessidade de actualizar as regras a que o respectivo controlo metrológico deve obedecer com vista a acompanhar, tecnicamente, o que vem sendo indicado nas Recomendações da Organização Internacional de Metrologia Legal. A actualização mostra-se ainda necessária para simplificar e clarificar procedimentos, dando, assim, cumprimento à medida prevista no Programa SIMPLEX para 2007. Pelos motivos acima indicados, a presente portaria procede à aprovação do novo regulamento a que deve obedecer o controlo metrológico dos alcoolímetros.» Se dúvidas houvesse quanto à vigência do Regulamento contido na Portaria nº 784/94 de 3 de Outubro, até à entrada em vigor deste novo Regulamento, julgamos que o teor do Preâmbulo da nova Portaria e bem assim da disposição revogatória expressa do seu artigo 2º («2.º É revogada a Portaria n.º 748/94, de 3 de Outubro.») não permitem a subsistência delas. Doutro passo esta Portaria 1556/07 vem expressamente aprovar novo Regulamento do Controle Metrológico dos Alcoolímetros no qual, como se constata no Anexo, constam os erros máximos admissíveis. No caso vertente a margem de erro é de 8%, face às tabelas da já supra referenciada norma[5] quadro demonstrativo se pode compulsar infra: TAS …………… Erro Máximo Admissível < 0, 920--------------------------+-0,032g/l 0, 4< ou =2g/l-------------------+-8% < ou =2g/l------------------------30+-% São pois aplicáveis as margens de erro máximo admissíveis previstos na Norma AFNOR de 1 de Fevereiro de 1992 NF X 20-701. Em deliberação recente aliás o CSM emitiu Circular 89/2007 circulando esclarecimento do IPQ a propósito de tal questão, em ofício de 27 de Junho. Diga-se até que tais margens foram elevadas pela Portaria 1556/2007, publicada no DR I Série em 10 de Dezembro último. Se as compararmos com as anteriores são notórias as diferenças: TAS Erro Máximo Admissível < 0, 920---------------------------------+-0,07g/l 0, 92<2,30 g/l--------------------------+-7,5% 2,2<4,60g/l-----------------------------+-15% 4,60<6,90g/l---------------------------+-30% No caso vertente a margem de erro é agora de 8%. Outro sentido não tem a nosso ver tal elevação senão exprimir, por banda do legislador a diminuída fiabilidade absoluta que tem tais aparelhos de medição e deste modo, em sede como a penal, dotar a necessária valoração da prova técnica – por natureza mais fiável do que a restante – de um critério depurativo e algo elástico que permita ao arguido ser defendido da contingência da evolução científica. Se o que hoje é verdade em ciência amanhã já o não é – e a mutação das margens de erro dos mesmíssimos aparelhos expressa nas duas portarias que vimos de analisar em percentagens não despiciendas, que podem significar a diferença entre uma condenação e uma absolvição…. bem o exprime – há-de a mesma mutabilidade ser de algum modo acautelada no domínio da verdade judiciária, onde por razões de certeza e segurança jurídica, não pode dizer-se que o que é verdade hoje, amanhã já o não será…. Como? Assumindo que a ciência não é exacta e infalível, nem os instrumentos por ela criados o são e por essa via, admitindo que as margens de erro por ela própria postas e ditas como fiáveis deverão ser para o julgador um norte e não uma tábua rasa. Mais que não fosse, pois face a tal meio de obtenção de prova, tendo em conta a admissão pelo próprio legislador da existência de falibilidade permanente do mesmo, em coerência com o princípio de um exame crítico das provas produzidas, mais não restaria ao julgador a nosso ver do que, lançando mão do princípio in dúbio pro reo dar como não provado o facto que o talão do alcoolímetro se destina a provar… Em sentido semelhante ao que ora defendemos poderá ver-se jurisprudência disponível nas bases de dados on-line dos Tribunais Superiores[6] Quanto ao critério de escolha e à determinação da medida concreta da pena principal e medida da pena acessória, pronunciou-se (transcrição): Conhecidas que são, por já suficientemente enunciadas pela doutrina autorizada[7], as três fases do procedimento de determinação da pena - investigação e determinação da moldura legal, investigação e determinação dentro daquela moldura legal da medida concreta a aplicar, e escolha da espécie da pena, cumpre fazê-lo no caso em análise. Para o tipo de crime de condução sob feito do álcool estabelece a lei penal a pena de prisão até 1 ano ou pena de multa até 120 dias. A esta pena principal acresce a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, prevista no art.º 69.º, n.º1, al. a), do Código Penal, a redacção por último dada pela Lei n.º 77/2001, de 13 de Julho, situada entre três meses e três anos. Observando o critério firmado no artigo 70º e as finalidades das penas consagradas no artigo 40º, ambos do Código Penal, importa desde logo optar, dentro das duas espécies de pena que a moldura do crime em causa consente, optar pela que, em concreto deverá ser cominada. Ao tribunal impõe-se a preferência pela pena não privativa da liberdade por ser possível considerar que esta realizará de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, quais sejam a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, afigurando-se ser ela uma censura suficiente do facto, e simultaneamente, uma garantia para a comunidade da validade e vigência da norma violada. Desde logo se pondera como essenciais a inexistência de antecedentes criminais ou estradais do arguido. Os factos pelos quais ora é julgado aparecem como o primeiro contacto quer com a justiça penal quer com a contra-ordenacional. Todavia não pode considerar-se que sem mais desnecessária qualquer pena em termos de prevenção especial. Não se ignora porém que este é daqueles tipos legais de crime em que, pela sua natureza à comunidade não repugna a opção por pena não detentiva, por ser eminentemente, e num país com hábitos de consumo de álcool tão elevados e generalizados como o é, susceptível de ser cometido pelo comum dos cidadãos. Resulta aparentemente num contra-senso esta asserção, mas na verdade, se analisarmos objectivamente a criminalidade rodoviária primária, ressalta à evidência que este tipo de comportamento desviante, quando primário, note-se, tem em média como agente cidadãos integrados, e não delinquentes que percorram outro tipo de ilícito. Opta-se, pois, pela pena de multa. Na dosimetria da pena, no caso concreto do arguido, revela grau de ilicitude assaz baixo, atendendo ademais à taxa de álcool que ostentava que se situa no limite mínimo da incriminação. O dolo emerge na sua modalidade menos intensa. O seu comportamento posterior aos factos, confessando espontaneamente, deixam antever capacidade de autocensura, se bem que neste particular tipo de crime, em que as particularidades da prova a mesma não assume um relevo especial, sempre é de ponderar. Afiguram-se sobremaneira relevantes as necessidades de prevenção geral tendo em conta o elevadíssimo número de vezes que este crime é cometido nesta comarca, como o mero cotejo do tratamento estatístico poderá comprovar. Necessário se mostra pois que a pena a cominar imprima ao arguido a injunção para um processo de recondução a uma conduta conforme ao lícito. Julga-se pois adequado fixar-lhe a pena de multa em 70 (setenta) dias. Impõe-se teoricamente a ponderação da situação sócio-económica do condenado espelhada nos factos provados. Todavia, emerge da redacção do falado artigo 47º no seu nº 2 do Código Penal aprovada pela Lei 59/2007 de 4 de Setembro pouca margem para o julgador a tomar em conta: o mínimo legal é actualmente de € 5 euros (cinco euros) para o quantitativo diário da pena de multa. O salário mínimo nacional é actualmente de 450,00 €, aprovado pelo DL 246/2008 de 18 de Dezembro. Ou seja, projectando a taxa de esforço diária num agente que aufira o salário mínimo, seja que tenha disponível diariamente o equivalente a 1/30 do salário mínimo nacional, temos que o mesmo auferirá 15 € diários, e a taxa diária será de 5 €, restando-lhe 10 € para (sobre)viver. No mínimo dos mínimos o que se põe ao julgador é ter como baliza o quantitativo que supera o terço disponível diário da remuneração mínima garantida aprovada para o ano em curso. Já não falamos de casos em que tal remuneração se destina ao sustento de uma família, como é o caso do arguido, pessoa que sustenta um agregado com mais cinco elementos, sem rendimentos. Irrogar tal montante diário é impor uma taxa de esforço que situará a família próximo da insubsistência. No entanto, é-nos vedado fazer uma interpretação abrrogante. Fixa-se no mínimo imposto pelo legislador de 2007 a taxa diária – 5 €. Atenhamo-nos agora na pena acessória. Segundo o disposto no artigo 69.º, n.º1, alínea a) do Código Penal, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 77/2001, de 13 de Julho, quem for punido por crime previsto nos artigos 291.º e 292.º, do CP, é condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos. Da reforma operada pelo Decreto-Lei 48/95 de 15 de Março e pela referida Lei 77/2001 de 13.07, resulta que esta sanção inibitória tem natureza de pena acessória, tal como propunha, de lege ferenda, Figueiredo Dias[8]. Tal, aliás resulta claramente do texto do mencionado artigo 69.º, da sua inserção sistemática e do elemento histórico[9], traduzindo-se numa censura adicional pelo crime praticado. Não obstante a formulação legal, pois, aparentemente dando da pena acessória uma ideia automática não pode da mesma tomar-se tal entendimento, sob pena de fazer-se da Lei Penal uma interpretação frontalmente violadora do disposto no artigo 30º nº 4 da Lei Fundamental, que veda qualquer efeito automático da pena. O Prof. Figueiredo Dias entende que esta pena acessória tem por pressuposto material “a circunstância de, consideradas as circunstâncias do facto e da personalidade do agente, o exercício da condução se revelar especialmente censurável.” (...) “Por isso, à proibição de conduzir deve também assinalar-se (e pedir-se) um efeito de prevenção geral de intimidação, que não terá em si nada de ilegítimo porque só pode funcionar dentro do limite da culpa. Por fim, mas não por último, deve esperar-se desta pena acessória que contribua, em medida significativa, para a emenda cívica do condutor imprudente ou leviano.”[10]. Como à principal, pois, a esta pena acessória, há-de subjazer um juízo de censura global pelo crime praticado, pelo que se impõe aqui, também para a determinação da sua necessidade e medida concreta o recurso aos critérios estabelecidos nos artigos 40º e 71.º do Código Penal. O artigo 40° do Código Penal dispõe que «a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade» - n° 1, e que «em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa» - n° 2. Temos pois protecção de bens jurídicos e socialização do agente do crime, sendo a culpa o limite da pena mas não seu fundamento. A culpa não justifica a pena, retributivamente, mas funciona em intervenção de contraposição à lógica do utilitarismo preventivo. Sendo o modelo do Código Penal de prevenção, em que a pena é determinada pela necessidade de protecção de bens jurídicos e não de retribuição da culpa e do facto, a culpa emerge como travão de fins utilitaristas do sistema penal. Assim sendo, dentro na moldura penal correspondente ao crime o juiz, face à ponderação do caso concreto e em função das necessidades que se lhe apresentem, fixará o quantum concretamente adequado de protecção, conjugando-o a partir daí com as exigências de prevenção especial em relação ao agente (prevenção da reincidência), sem poder ultrapassar a medida da culpa. E a finalidade de reintegração do agente na sociedade há-de ser, em cada caso, prosseguida pela imposição de uma pena cuja espécie e medida, determinada por critérios derivados das exigências de prevenção especial, se mostre adequada e seja exigida pelas necessidades de ressocialização do agente, ou pela intensidade da advertência que se revele suficiente para realizar tais finalidades. Na prossecução das finalidades da punição e na determinação em concreto da pena, o juiz deve orientar-se pelos critérios do artigo 71° do Código Penal. No crime de condução de veículo em estado de embriaguez, como crime de perigo abstracto, as exigências de prevenção geral são determinantes na fixação da medida concreta da pena, para acalmia da comunidade e afirmação de valores essenciais afectados por comportamentos que, antes e para além de causarem efectivos danos, são aptos a colocar em perigo bens jurídicos essenciais, como sejam a segurança rodoviária e indirectamente bens pessoais, como seja a vida, de indiscutível valor supremo. Todavia, como já expendemos supra, no caso concreto, tais exigências foram de algum modo já acorridas com a pena principal, denotando a pena acessória uma função de acrescento nesta particular matéria de prevenção geral. Acresce-lhe ainda uma função de prevenção especial de socialização. Terá como limite a culpa. Temos pois uma sanção acessória que se situa, por força do artigo 69º do Código Penal entre os 3 meses e os 3 anos de inibição. Ora, desde logo há que ponderar se será esta a medida adequada face à concreta situação do arguido. E cremos bem que não. Julgamos ser este um dos casos em que deve funcionar a atenuação especial da pena enquanto «válvula de segurança» do sistema, como tem sido defendido na doutrina (particularmente, entre nós, Figueiredo Dias[11], e na jurisprudência[12], acorrendo a situações excepcionais em que, por força de circunstâncias que atenuem acentuadamente a culpa (ou ilicitude) e a necessidade da pena, e em que se verifique que as molduras penais estabelecidas para o respectivo tipo de crime se mostrem francamente desajustadas, correspondendo a uma violência punir o arguido de acordo com os parâmetros normais. E quanto a nós é este o caso vertente. Estamos perante um arguido que conduz há 24 anos, de forma profissional, ou seja, passa o seu dia de trabalho na estrada, ao volante de um pesado, consabidamente veículo sujeito a mais fiscalizações que um ligeiro. E no entanto não tem averbado no seu RIC qualquer infracção, sendo igualmente primário em termos criminais. No caso presente, pois, justifica-se a atenuação especial, considerando que - a acentuada diminuição da ilicitude está, desde logo, patente na análise que se fez a propósito da qualificação dos factos, face ao nível de alcoolémia; - relativamente à culpa, provou-se que o arguido agiu voluntária e livremente, com plena consciência das características do produto que ingerira mas agiu com dolo eventual, o que de algum modo tem o condão de atenuar acentuadamente a sua culpa, conjuntamente com a circunstância de ter conduzido dentro da localidade; - no que diz respeito à necessidade de pena, justifica-se a atenuação pois o arguido está familiar e profissionalmente integrado e faz da condução profissão, o que, se não negamos de algum modo agrava de certo jeito a sua culpa porque lhe era mais exigível o comportamento lícito alternativo, não deixa porém de impor que se pondere doutro passo que o crime foi cometido ao volante de um ligeiro, fora do serviço, no fim de semana; o arguido conduzia dentro da povoação e não em qualquer dos itinerários limítrofes e mais acometidos por sinistralidade; que confessou; que fazendo da condução profissão, para mais sendo o único sustento da família é de crer que a pena principal e a pena acessória atenuada sirvam para o arredar de futuros comportamentos. Assim, tendo em atenção a moldura penal abstracta aplicável, a qual tem um mínimo de 3 meses e um máximo de 3 anos, especialmente atenuada nos termos dos artigos 72º e 73º, nº 1 al. a) a c) teremos uma moldura que oscilará entre dez dias e dois anos. Atendendo à factualidade provada, temos que: - a ilicitude do facto, traduzida na sua gravidade, é de grau baixo, pois a taxa de alcoolemia do arguido há-de ver reflectida na ilicitude essa diminuída quantidade, bem como a menor perigosidade do local, comparativamente com outros; - o facto de o arguido conduzir há longos anos sem ter qualquer infracção averbada, sendo passível de um juízo de prognose favorável a circunstância de ser motorista profissional e o bom comportamento futuro ser condição de subsistência de todo o seu agregado; - relativamente à culpa, já foram salientadas supra a sua fisionomia e a sua relevância; releva-se todo o circunstancialismo provado relativamente às suas origens e inserção sócio-familiares e económicas, a apontarem para uma impoluta conduta; também no plano profissional, será de relevar o facto de o seu percurso profissional ser caracterizado pela boa conduta que aqui releva porque com reflexos no RIC; o arguido confessou os factos e mostrou-se arrependido, contribuindo para lhe dar um enquadramento atenuativo; Tendo em conta todo este circunstancialismo, a pena acessória afigura-se-nos, tendo em conta a dosimetria da pena principal já irrogada, dever ser fixada em um mês por justa, adequada à culpa, não deixando de satisfazer as finalidades conjugadas da prevenção geral e da prevenção especial acrescentadas que se assinalam à pena acessória. Apreciemos. Dos vícios de contradição insanável da fundamentação e de erro notório na apreciação da prova Conforme estabelecido no artigo 428º, nº 1, do CPP, os Tribunais da Relação conhecem de facto e de direito, de onde resulta que, em regra e quanto a estes Tribunais, a lei não restringe os respectivos poderes de cognição. A matéria de facto pode ser sindicada por duas vias: no âmbito, mais restrito, dos vícios previstos no artigo 410º, nº 2, do CPP., no que se denomina de “revista alargada” ou através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se reporta o artigo 412º, nºs 3, 4 e 6, do mesmo diploma legal. Estabelece-se no artigo 410º, nº 2, do CPP que, mesmo nos casos em que a lei restringe a cognição do tribunal, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum: 1) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada – alínea a); 2) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão – alínea b); 3) Erro notório na apreciação da prova – alínea c). Estes vícios, que são de conhecimento oficioso, têm, em qualquer das suas modalidades, de resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos, para o fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento (cfr. Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 10ª ed., pag. 729, Germano Marques da Silva, ob. cit. pag. 339, Simas Santos e Leal Henriques, ob. cit. pags. 77/78 e Acs. do STJ de 05/06/08, Proc. nº 06P3649 e de 14/05/09, Proc. nº 1182/06.3PAALM.S1, in www.dgsi.pt. O vício previsto na alínea b), do nº 2, do artigo 410º, do CPP, contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, verifica-se quando, de acordo com um raciocínio lógico na base do texto da decisão, por si ou conjugado com as regras da experiência comum, seja de concluir que a fundamentação justifica decisão oposta, ou não justifica a decisão, ou torna-a fundamentalmente insuficiente, por contradição insanável entre factos provados, entre factos provados e não provados, entre uns e outros e a indicação e análise dos meios de prova fundamentos da convicção do Tribunal - cfr Ac. do STJ de 13/10/1999, CJACSTJ 1999, Ano VII, Tomo III, pags 186/187 e Acórdão do mesmo Tribunal de 03/07/02, Proc. nº 1748/02-5ª. Estamos perante o vício de erro notório na apreciação da prova – alínea c), do nº 2, da mesma disposição legal - quando um homem médio, colocado perante o teor da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta de que o tribunal violou as regras da experiência ou de que efectuou uma apreciação manifestamente incorrecta, desadequada, baseada em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios, perspectivando-se em duas vertentes, a do erro na apreciação dos factos e a do erro na valoração da prova produzida. Este erro ocorre, pois, também, quando se violam as regras sobre prova vinculada ou das leges artis. Não se prende, porém, este vício, com uma diferente convicção em termos probatórios e uma diversa valoração da prova produzida em audiência que o recorrente entenda serem as correctas, prefigurando-se, sim, “quando se depara ter sido usado um processo racional e lógico mas, retirando-se, contudo, de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, irrazoável, arbitrária ou visivelmente violadora do sentido da decisão e/ou das regras da experiência comum, bem como das regras que impõem prova tarifada para determinados factos” – Ac. do STJ de 18/03/04, Proc. nº 03P3566. Não se inclui, pois, no erro notório na apreciação da prova a discordância que o recorrente possa ter em relação à livre valoração da matéria de facto produzida em audiência, realizada pelo julgador de acordo com o estabelecido no artigo 127º, do Código de Processo Penal. - Invoca o recorrente o vício de contradição insanável da fundamentação por, tendo o julgador alicerçado a sua convicção na confissão do arguido e no talão do alcoolímetro junto aos autos que traduziu uma TAS de 1,38 g/l, não podia ter considerado provado que a tal TAS correspondia uma TAS de 1,26 g/l uma vez que inexiste nos autos qualquer elemento probatório que permita realizar essa operação. - Afirma existir também erro notório na apreciação da prova, por ser inadmissível descontar à concreta TAS aferida pelo alcoolímetro que procedeu à medição do álcool no sangue do recorrido, o valor do erro máximo admissível previsto no Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros. Vejamos então se tendo o arguido confessado integralmente e sem reservas os factos que lhe vinham imputados, deveriam ser dados como provados todos aqueles factos, nomeadamente o valor da TAS constante do talão do alcoolímetro. O tribunal recorrido deu como provado, na parte que interessa para a decisão, que no dia 21/02/2009, pelas 23.26 horas, na Av. das Comunidades Europeias, em Mirandela, o arguido conduzia o veículo ligeiro de matrícula ..-..-NX e submetido ao controle de alcoolémia através do alcoolímetro Drager modelo Alcotest MKIII-P com o nº ARRL-0051 aprovado pela DGV em 6 de Agosto de 1998, acusou a TAS de 1,38 g/l, que corresponde, deduzida a margem de erro, no caso de 8%, a pelo menos 1,26 g/l. Mais está provado que agiu o arguido livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que ingerira bebidas com teor alcoólico e em quantidade que admitiu determinar-lhe uma TAS superior a 1,20 g/l e que, por isso, não podia conduzir veículos automóveis na via pública como efectivamente fazia. Consta ainda da factualidade provada que o arguido confessou os factos, sendo que na respectiva motivação da sua convicção a sentença recorrida menciona que a formou“(…) no teor do talão do alcoolímetro, bem como na sua confissão do teor objectivo dos factos atinentes ao que concerne ao acto de condução e bem assim à consciência da ilicitude do acto”, acrescentando ainda que “a confissão do arguido, quanto a nós, mais não abrange do que a cognoscibilidade da ingestão do álcool e do seu efeito sob a capacidade de conduzir e bem assim do resultado do exame corporizado no talão do alcoolímetro, e de modo algum pode ser tida como confissão «metrológica» da quantidade de gramas por litro no sangue que detinha”. Explicita que “fundou-se no teor do talão do alcoolímetro de folhas 5, quanto aos factos relativos ao nível de alcoolémia, corrigido pela margem de erro máxima admissível” sendo que “a correcção da taxa de alcoolémia com as margens de erro é imposta pelo plasmado na Recomendação da OIML, transposta nos Decreto-Lei 291/90 de 20 de Setembro e Portaria 1556/2007, publicada no DR I Série em 10 de Dezembro, Portaria 902-B/2007 de 13 de Agosto e Lei 18/2007 de 17 de Maio força do estatuído no artigo 8º da Constituição da República Portuguesa” e bem assim na “Directiva 83/575/CEE do Conselho de 23 de Outubro de 1983 que altera a Directiva 71/316/CEE relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes às disposições comuns sobre os instrumentos de medição e os métodos de controle metrológico que veio a ter expressão nos Decretos supra mencionados e ainda na Portaria 1556/2007, publicada no DR I Série em 10 de Dezembro último que expressamente consigna o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros”. Mais acrescentou, elucidando cabalmente o processo de formação da sua convicção, que “o Tribunal não deu como provado o nível exacto de alcoolémia detectado pela análise do alcoolímetro Drager modelo Alcotest MKIII-P com o nº ARRL-0057 aprovado pela DGV em 6 de Agosto de 1998 através do Despacho do IPQ nº 211.06.96.3.30, DR II Série de 25 de Setembro de 1996; antes procedeu à aplicação da taxa de 8% nos termos da portaria que corresponde, deduzida a margem de erro, a pelo menos 1,28g/l (pretenderia dizer 1,26 g/l, como consta da factualidade provada)”. Ora, cumpre apurar qual o alcance da confissão efectuada pelo arguido em audiência e mormente se ela tem o mérito de abranger todos os factos imputados, designadamente a TAS de 1,38 g/l indicada no talão do alcoolímetro após realização do teste de detecção da taxa de álcool no sangue, no dia 21/02/09, em seguida à intercepção pelas autoridades policiais. Nos termos do estabelecido no artigo 140º, nº 2, do CPP, “Às declarações do arguido é correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 128º e 138º, salvo quando a lei dispuser de forma diferente”, consignando-se no nº 1, do artigo 128º que “A testemunha é inquirida sobre factos de que possua conhecimento directo e que constituam objecto de prova”. Como se salienta no Ac. R. do Porto de 26/11/08, Proc. nº 0812537, da conjugação destes dois normativos ressalta que, quer as declarações do arguido, quer o depoimento das testemunhas, só assumem relevância em relação aos factos que sejam do conhecimento daquele que os relata, sendo que outro entendimento é susceptível de conduzir a que a verdade material, cuja descoberta o processo penal visa alcançar, pudesse ser alicerçada na confissão de factos não verdadeiros ou cuja veracidade o arguido não tivesse capacidade para afirmar por ultrapassarem aquilo que é capaz de apreender. Em consequência, “os limites da capacidade cognitiva individual serão também os limites daquilo que, de forma juridicamente relevante, pode ser declarado ou deposto – e, portanto, também confessado. A contrario, tudo o que esteja para além desses limites ou constitui declaração ou depoimento irrelevante, não podendo valer mais do que uma mera opinião, ou constitui raciocínio lógico-dedutivo que, se pertinente, o tribunal também terá de fazer e de forma autónoma”. O arguido tinha efectivamente conhecimento (porque compreendidos tais factos nos limites da sua capacidade cognitiva) de que estava a conduzir um veículo automóvel ligeiro de passageiros na via pública, em Mirandela, pelas 23.26 horas, de que tinha ingerido bebidas alcoólicas antes de exercer a condução, de que foi fiscalizado pelos agentes da autoridade e por eles submetido a teste de detecção e quantificação de álcool no sangue, por meio de analisador quantitativo e que este indicou uma TAS de 1,38 g/l e sobre tal se tem de entender que versou a sua confissão. Contudo (e como melhor se explicitará infra) a circunstância de o alcoolímetro indicar uma certa TAS não significa que quem foi submetido ao teste necessariamente seja portador dessa exacta TAS e, novamente seguindo o aresto supra citado, “ultrapassando obviamente as capacidades cognitivas do arguido, como de qualquer ser humano, a determinação da concreta TAS de que era portador – resultado que só é alcançável, pelo menos com o rigor exigível, através de exame realizado mediante a utilização de aparelho próprio para o efeito – não podia ele validamente confessar um facto que não podia conhecer”. Carecendo, pois, o arguido do conhecimento exacto da TAS de que na realidade era portador, mas apenas estando ciente da indicada pelo aparelho em que realizou o teste, a confissão que efectuou só pode abranger esta. Para que o julgador forme a sua convicção no que tange à concreta TAS de que o arguido era portador, terá de atender à confissão, com os limites referidos e ao conjunto da demais prova produzida, em que se inclui o talão emitido pelo alcoolímetro e apreciá-la de acordo com os princípios e regras probatórias vigentes no processo penal. Foi na verdade o que realizou o tribunal recorrido, pois atendeu à TAS indicada no talão do alcoolímetro junto aos autos a fls. 5 deduzindo-lhe o valor de EMA, obtendo desta forma o valor da TAS de, pelo menos, 1,26 g/l que veio a ser dado como provado. Suscita-se então a questão da admissibilidade ou inadmissibilidade legal do desconto na concreta TAS aferida pelo alcoolímetro que procedeu à medição do álcool no sangue do recorrido, do valor do erro máximo admissível previsto no Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, de que resultará, na tese do recorrente, o vício de erro notório na apreciação da prova. Vejamos então. Da análise do texto da sentença recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, não resulta que esteja ela viciada de erro notório na apreciação da prova, porquanto mostra-se fundamentada, de forma límpida e cristalina, entendível perfeitamente pelo homem médio, a razão de na factualidade provada se ter feito constar que o arguido conduzia veículo automóvel e foi submetido ao controle de alcoolémia que acusou uma taxa de alcoolémia no sangue de 1,38 g/l, correspondente a taxa não inferior a 1,26 g/l, após dedução do valor do erro máximo admissível. Na verdade, nela, como expressamente se consigna, ponderou-se o teor do talão do alcoolímetro onde o arguido realizou o teste de quantificação de álcool no sangue, conjugado com a tabela de margens de erro constantes da Portaria nº 1556/07, de 10/12 e bem assim com a confissão do arguido, no sentido de que efectivamente ingeriu e sabia que não devia conduzir depois de ter ingerido bebidas alcoólicas em quantidade que admitiu determinar-lhe uma TAS superior a 1,20 g/l Apresenta-se, assim, claramente inteligível a discrepância em relação ao que consta do talão de fls. 5. Mas a problemática em análise apresenta-se, também na vertente de violação das regras sobre o valor da prova vinculada, na medida em que, se se considerar que o teste de detecção e quantificação da taxa de álcool no sangue se integra neste tipo de prova e posto que se presume subtraído à livre apreciação do julgador o juízo técnico, científico ou artístico inerente à prova pericial, conforme estabelecido no artigo 163º, nº 1, do CPP, a divergência não fundamentada da convicção do julgador relativamente ao juízo contido no parecer dos peritos (nº 2, da mesma disposição legal), consubstancia um erro notório na apreciação da prova. A questão do desconto dos EMA apresenta-se controvertida e tem sido objecto de decisões judiciais divergentes, perfilando-se duas correntes em presença. Uma dessas correntes sustenta não ser de efectuar o desconto do valor do “erro máximo admissível” na TAS registada no alcoolímetro que procedeu à medição e tem acolhimento, entre outros, nos Acs. R. de Coimbra de 12/12/07, Proc. nº 110/07.3GTCTB.C1, de 30/01/08, Proc. nº 91/07.3PANZN.C1, de 11/11/08, Proc. nº 62/08.2GBPNH.C1 e de 10/12/08, Proc. nº 17/07.4PANZR; Acs. R. de Lisboa de 03/10/07, Proc. nº 4223/07-3, de 20/02/08, Proc. nº 183/2008-3; Ac. R. do Porto de 08/04/08, Proc. nº 1491/08-5 e Ac. R. Porto de 14/01/09, Proc. nº 0815205, todos em www.dgsi.pt. A outra corrente entende que essa dedução se impõe e nas suas fileiras militam, também a título apenas meramente enunciativo, os Acs. R. do Porto de 19/12/07, Proc. nº 000040884; de 02/04/08, Proc. nº 479/08; de 07/05/08, Proc. nº 0810922, de 28/05/08, Proc. nº 0811347, de 26/11/08, Proc. nº 0812537, de 09/12/09, Proc. nº 531/09.7GAVNF.P1, 16/12/09, Proc. nº 82/09.0GCAMT.P1, 06/01/010, Proc. nº 291/09.1PAVNF.P1, 20/01/010, Proc. nº 24/09.2GAMAI.P1 e 03/02/010, Proc. nº 658/09.5GBAMT.P1; Acs. R. Coimbra de 09/01/08, Proc. nº 15/07.1PAPBL-C1 e Proc. nº 426/04.6TSTR.C1; Ac. R. de Guimarães de 26/02/07, Proc. nº 2602/06.2; Ac. R. de Lisboa de 07/05/08, Proc. nº 2199/08-3 e bem assim o voto de vencido do Desembargador João Latas no Ac. R. de Évora de 01/07/08, Proc. nº 2699/07-1, todos em www.dgsi.pt. Nos termos do nº 1, do artigo 81º, do Código da Estrada, é proibido conduzir sob influência de álcool, sendo que se considera nesse estado, conforme preceitua o nº 2 da mesma disposição, o condutor que apresente uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,5 g/l ou que, após exame realizado nos termos previstos no mesmo Código e legislação complementar, seja como tal considerado em relatório médico, consignando-se ainda que a conversão dos valores do teor do álcool no ar expirado (TAE) em teor de álcool no sangue (TAS) é baseada no princípio de que 1 mg de álcool por litro de ar expirado é equivalente a 2,3 g de álcool por litro de sangue – nº 3. Por sua vez, no artigo 292º, do Código Penal, tipifica-se como infracção criminal a condução de veículo, com ou sem motor, pelo menos negligentemente, em via pública ou equiparada, por quem tiver uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l. Para que se preencha este elemento objectivo do mencionado tipo legal de crime (taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l) importa, assim, determinar a concreta taxa de alcoolemia de que o condutor é portador. Por remissão do nº 1, do artigo 158º, do Código da Estrada, regem quanto aos meios e procedimentos relativos a detecção e comprovação do estado de influenciado pelo álcool, o Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas, aprovado pela Lei nº 18/2007, de 17/05, o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, aprovado pela Portaria nº 1556/2007, de 10/12 e a Portaria nº 902-B/2007, de 13/08. No artigo 1º, do Regulamento de Fiscalização, enunciam-se os meios de detecção e medição da taxa de álcool no sangue, designadamente, analisadores qualitativos e quantitativos, estes por teste no ar expirado ou análise de sangue, consignando-se no artigo 14º que nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só podem ser utilizados aparelhos que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, sendo que prévia a esta aprovação se exige a homologação de modelo, da competência do Instituto Português da Qualidade, de acordo com os termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros. O Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, aprovado pela Portaria nº 1556/2007 de 10/12, define o que se entende por alcoolímetros, consignando que são “instrumentos destinados a medir a concentração mássica de álcool por unidade de volume na análise do ar alveolar expirado” (artigo 2º, nº 1), enuncia como seus requisitos que “deverão cumprir os requisitos metrológicos e técnicos definidos pela Recomendação OIML R 126” (artigo 4º) e que compete ao Instituto Português da Qualidade, I.P. – IPQ o seu controlo metrológico, que compreende as operações de aprovação de modelo, primeira verificação, verificação periódica e verificação extraordinária (artigo 5º). O artigo 8º, do mesmo diploma legal, reporta-se aos “erros máximos admissíveis – EMA, variáveis em função do teor de álcool no ar expirado – TAE” consagrando-se que “são o constante do quadro que figura no quadro anexo ao presente diploma e que dele faz parte integrante”, sendo o quadro referido o seguinte: Com interesse para a questão em análise temos ainda o nº 2, do artigo 9º, segundo o qual “os registos da medição devem conter, entre outros elementos, a marca, o modelo e o número de série do alcoolímetro assim como a data da última verificação metrológica”. Na Portaria nº 902-B/2007, de 13/08, especificam-se as características técnicas, gerais e físicas a que devem obedecer os analisadores quantitativos, entre elas, que os referidos instrumentos devem “cumprir os requisitos metrológicos e técnicos definidos no regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros” e “usar a unidade de leitura em gramas de álcool por litro de sangue (TAS) segundo o factor fixado no nº 3 do artigo 81º, do Código da Estrada”. Em artigo intitulado “A Alcoolemia e o Controlo Metrológico dos Alcoolímetros”, datado de 28/04/2008, disponível em www.ipq.pt, António Cruz, Maria do Céu Ferreira e Andreia Furtado, respectivamente Director do Departamento de Metrologia do IPQ, Responsável pelo Laboratório de Química-Física do IPQ e Técnica Superior do Laboratório de Química-Física do IPQ, manifestaram-se no sentido de que: “Os Erros Máximos Admissíveis (EMA) são limites definidos convencionalmente em função não só das características dos instrumentos, como da finalidade para que são usados, ou seja, tais valores limite, para mais e para menos, não representam valores reais de erro, numa qualquer medição concreta, mas um intervalo dentro do qual, com toda a certeza (uma vez respeitados os procedimentos de medição) o valor da indicação se encontra” acrescentando ainda que “a qualquer resultado de medição está sempre associada uma incerteza de medição, uma vez que não existem instrumentos de medição absolutamente exactos. Esta incerteza de medição é avaliada no acto da Aprovação de Modelo por forma a averiguar se o instrumento durante a sua vida útil possui características construtivas adequadas, de forma a manter as qualidades metrológicas regulamentares, nomeadamente fornecer indicações dentro dos EMA prescritos no respectivo regulamento”. Referem ainda os mesmos autores que “a definição, através da Portaria 1556/2007, de determinados EMA, quer para a Aprovação de Modelo e Primeira Verificação, quer para a Verificação Periódica, visa definir barreiras limite dentro das quais as indicações dos instrumentos de medição, obtidas nas condições estipuladas de funcionamento são correctas. Ou seja, um alcoolímetro de modelo aprovado e com verificação válida, utilizado nas condições normais, fornece indicações válidas e fiáveis para os fins legais”. Mais acrescentam que “a operação de adição ou subtracção dos EMA aos valores das indicações dos alcoolímetros sujeitos a controlo metrológico é totalmente desprovida de justificação metrológica, sendo o valor da indicação do aparelho em cada operação de medição, o mais correcto. O eventual erro da indicação, nessa operação, nesse momento, com o operador que a tiver efectuado, nas circunstâncias de ambiente locais, quaisquer que tenham sido outros factores de influência externos ou contaminantes do ar expirado, seja ele positivo ou negativo, está com toda a probabilidade contido nos limites do EMA”. Contudo, do teor deste artigo e mormente dos excertos que respingamos, não resulta, em nosso entender, necessariamente, que esteja defeso considerar a necessidade de o Tribunal fazer uso das margens de erro dos aparelhos de medição para reduzir ao máximo o erro entre ao resultado do exame e a realidade. Como se salienta no Ac. R. do Porto de 04/11/09, Proc. nº 643/07-1PBMAI.P1 “ainda que se possa aceitar que o erro existente é um erro legalmente previsto, a leitura final, embora legal, não é garantida como a real. E se a margem de erro legalmente admissível é levada em conta no momento da calibração do aparelho, tal facto apenas garante que o aparelho em concreto está apto a efectuar medições e que os resultados obtidos sempre se situarão dentro dos limites daquelas margens de erro, ainda que se admita mesmo que a incerteza se aproxime do grau zero, sendo certo que, perante a medição, o julgador terá de admitir sempre como provável a hipótese daquele resultado estar próximo do limite mínimo ou do limite máximo, da dita margem de erro”. Na verdade, “tecnicamente, não está explicado e temos dúvidas que o possa ser, em que termos o acto da calibração elimina ou reduz praticamente a zero, a dita margem de erro, no acto da medição ou realização do teste” e desde logo porque o alcoolímetro “ao efectuar cada uma das medições, dará uma resposta em função do álcool contido no ar expirado, o que pode significar que a cada medição corresponda um resultado diferente”. Do artigo supra mencionado parece resultar que ao ser calibrado o aparelho, este fica apto a, perante a quantidade de álcool do ar expirado, efectuar logo a “correcção” ou “dedução”, tendo em conta a margem de erro admissível. Surge então, no desenvolvimento deste raciocínio, pertinente a questão: como é possível o aparelho efectuar uma “correcção” de determinada percentagem de margem de erro (por exemplo de 30%) ao ser realizado um teste a um condutor, para logo de seguida proceder a uma “correcção” de apenas 0,5% em teste ao condutor seguinte? Na esteira deste aresto, entendemos que não se mostra demonstrado que efectivamente seja possível calibrar o alcoolímetro de molde a efectuar essas correcções e, nessa medida, aqui se ancora a dúvida inamovível quanto à existência e concreta expressão do desvio entre o valor indicado no instrumento de medida e o valor real, o que conduz a que necessariamente se tenha de proceder ao desconto do valor do erro máximo admissível indicado no quadro anexo à Portaria nº 1556/2007 no valor de TAS registado no talão emitido pelo alcoolímetro, desde logo por imposição do princípio in dubio pro reo”. Na verdade, encontrando-se a aprovação de modelo e a certificação de cada aparelho na primeira verificação e nas verificações seguintes sujeitas à não ultrapassagem das margens de erro admissível fixadas no quadro anexo mencionado, o tribunal não pode estar seguro de que o condutor submetido ao teste, em cada caso concreto, tenha tripulado o veículo com a exacta taxa de álcool indicada pelo aparelho. Porém, como se destaca no Ac. R. de Lisboa. de 07/05/08, Proc. nº 2199/08-3, se o aparelho se encontra aprovado, se foi sujeito à verificação periódica e está a funcionar regularmente, o tribunal tem todas as razões para ter por seguro, “para além de qualquer dúvida razoável”, que o examinado tinha a taxa de álcool que resulta da subtracção da margem de erro máximo admissível ao valor indicado pelo aparelho. Acresce que a medição da taxa de álcool no sangue, o teste realizado com o alcoolímetro, não constitui prova pericial, porquanto não exige especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos, apresentando-se antes como um exame, não obstante ser efectuado por aparelho tecnologicamente sofisticado, pelo que o resultado do teste não pode ser considerado prova vinculada. Como se salienta no Ac. R. de Coimbra de 09/01/08, Proc. nº 15/07.1PAPBL-C1, “os exames (artigo 171º, do Código de Processo Penal), mais não são do que meios através dos quais se captam indícios relativos à prática de uma infracção e que tanto podem ser realizados em pessoas e lugares, como em coisas, quer por mera observação, quer pela utilização de aparelhos ou mecanismos. No caso dos exames, na ausência de norma expressa, a regra de apreciação da prova é a prevista no artigo 127º, do Código de Processo Penal, isto é, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador” Assim, ao proceder ao desconto do valor correspondente ao erro máximo admissível para o grau de alcoolemia indicado no alcoolímetro, naquele por este indicado, não violou o tribunal recorrido disposição legal alguma, apenas apreciou a prova de acordo com as regras da experiência e a sua livre convicção, conforme estabelecido no mencionado artigo 127º. Em conclusão, da análise da decisão recorrida, perscrutando-a com o escopo de detectar a existência de algum dos vícios invocados pelo recorrente a que se reporta o artigo 410º, nº 2, do CPP, nos termos em definidos ficaram, concluímos pela sua não verificação, porquanto inexiste contradição alguma da fundamentação e também se não vislumbra erro grosseiro e manifesto na apreciação da prova, porquanto foi feita uma aplicação rigorosa dos princípios que a regem. Improcedem, pois, estes fundamentos do recurso. Admissibilidade da atenuação especial da pena acessória de proibição de conduzir. O tribunal a quo condenou o arguido na sanção acessória de inibição (em rigor, pena acessória de proibição) de conduzir qualquer tipo de veículo motorizado, especialmente atenuada, pelo período de um mês, nos termos dos artigos 72º e 69º, nº 1, alínea a), do Código Penal. Estabelece-se no artigo 69º, nº 1, alínea a), supra referido, que é condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos quem for punido por crime previsto no artigo 292º. Seguindo a lição de Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, As Consequências jurídicas do Crime, Aequitas, 1993, pag. 90, as penas acessórias desempenham uma função preventiva adjuvante da pena principal, com sentido e conteúdo não apenas de intimidação da generalidade, mas também de defesa contra a perigosidade individual. Porque se trata de uma pena, ainda que acessória, deve o julgador, na sua graduação atender, também, ao estabelecido no artigo 71º, do CP, tendo presente que a sua finalidade (ao contrário da pena principal que visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração social do agente) assenta na censura da perigosidade, embora a ela não seja estranha a finalidade de prevenção geral (cfr. Figueiredo Dias, ob.cit. pág. 165). A decisão recorrida considerou estar perante um caso em que deve funcionar a atenuação especial da pena, porquanto o arguido conduz há 24 anos, de forma profissional, ou seja, passa o seu dia de trabalho na estrada, ao volante de um pesado, consabidamente veículo sujeito a mais fiscalizações que um ligeiro. E no entanto não tem averbado no seu RIC qualquer infracção, sendo igualmente primário em termos criminais. No caso presente, pois, justifica-se a atenuação especial, considerando que - a acentuada diminuição da ilicitude está, desde logo, patente na análise que se fez a propósito da qualificação dos factos, face ao nível de alcoolémia; - relativamente à culpa, provou-se que o arguido agiu voluntária e livremente, com plena consciência das características do produto que ingerira mas agiu com dolo eventual, o que de algum modo tem o condão de atenuar acentuadamente a sua culpa, conjuntamente com a circunstância de ter conduzido dentro da localidade; - no que diz respeito à necessidade de pena, justifica-se a atenuação pois o arguido está familiar e profissionalmente integrado e faz da condução profissão, o que, se não negamos de algum modo agrava de certo jeito a sua culpa porque lhe era mais exigível o comportamento lícito alternativo, não deixa porém de impor que se pondere doutro passo que o crime foi cometido ao volante de um ligeiro, fora do serviço, no fim de semana; o arguido conduzia dentro da povoação e não em qualquer dos itinerários limítrofes e mais acometidos por sinistralidade; que confessou; que fazendo da condução profissão, para mais sendo o único sustento da família é de crer que a pena principal e a pena acessória atenuada sirvam para o arredar de futuros comportamentos”. Ora, em nosso entender e na esteira dos Acs. da R. de Évora de 09/07/02, CJ Ano XXVII, 2002, Tomo IV, pag 252 e da Relação de Lisboa de 21/11/06, CJ Ano XXXI, 2006, Tomo V, pag. 128 (com a concordância de Paulo Pinto de Albuquerque em Comentário do Código Penal, UCE, 2008, pag. 226), não é admissível a atenuação especial da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor prevista no artigo 69º, nº 1, alínea a), do Código Penal, por aplicação do estabelecido nos artigos 72º e 73º, do mesmo diploma legal (nem, aliás, pela de quaisquer outros normativos). É que, tendo como escopo a pena acessória, na sua essência, a prevenção da perigosidade do agente, embora também vise fins de prevenção geral, posto que lhe é alheia a finalidade de integração do agente, vedada está a atenuação especial da pena, assim como, aliás, a aplicação do instituto da suspensão, admissíveis apenas quando se trata de contra-ordenações (cfr. artigos 140º e 141°, respectivamente, do Código da Estrada), o que resulta, desde logo, também, no que à atenuação tange, da leitura do respectivo texto, pois o artigo 73º, do CP, tem o seu campo de aplicação limitado às penas principais de prisão e multa, em passo algum se referindo à pena acessória de proibição de conduzir. Porque assim é, tem de proceder o recurso neste segmento, pelo que, tendo em atenção: O baixo grau de ilicitude do facto, atenta a TAS apurada, pouco acima do valor que confere significado criminal à conduta. Que o arguido agiu com dolo eventual (não se entende bem como, mas certo é que esta factualidade se mostra provada e não é colocada em causa). Que exerce a condução há 24 anos, de forma profissional, não registando antecedentes criminais ou contra-ordenacionais na área da condução motorizada. Que está familiar e profissionalmente integrado, ponderando também as razões de prevenção geral, a pena acessória de proibição de conduzir terá de ser aplicada pelo período mínimo legal, ou seja, três meses, pois se mostra ela, nesta medida, como suficiente, proporcional e adequada às suas finalidades. III - DISPOSITIVO Pelo exposto, acordam os Juízes da 1ª Secção Criminal desta Relação em conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência, condenar o arguido B…………, na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de três meses, nos termos do artigo 69º, nº 1, alínea a), do Código Penal, mantendo, no mais, a decisão recorrida. Sem tributação. Porto, 3 de Março de 2010 (Consigna-se que o presente acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo primeiro signatário – artigo 94º, nº 2, do CPP) Artur Daniel T. Vargues da Conceição Jorge Manuel Baptista Gonçalves ________________ [1] Com explicitação integral do que propendemos a ter como correcta interpretação da confissão formulada veja-se Acórdão da Tribunal da Relação do Porto de 2 de Abril de 2008 in DGSI. [2] Actualmente Portaria 1556/2007 de 10 de Dezembro. [3] Em sentido oposto Germano Marques da Silva, Crimes Rodoviários, 1996, p. 81. [4] Rectius eram, face à entrada em vigor do Novo Regulamento do Controle Metrológico dos Alcoolímetros Anteriormente Portaria 748/94 de 13 de Agosto que aprovou Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros. Vejamos: o Código da Estrada dispõe no seu artigo 81º, na parte que ora interessa: Condução sob influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas1 - É proibido conduzir sob influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas. 2 - Considera-se sob influência de álcool o condutor que apresente uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,5 g/l ou que, após exame realizado nos termos previstos no presente Código e legislação complementar, seja como tal considerado em relatório médico. 3 - A conversão dos valores do teor de álcool no ar expirado (TAE) em teor de álcool no sangue (TAS) é baseada no princípio de que 1 mg de álcool por litro de ar expirado é equivalente a 2,3 g de álcool por litro de sangue. 4 - Considera-se sob influência de substâncias psicotrópicas o condutor que, após exame realizado nos termos do presente Código e legislação complementar, seja como tal considerado em relatório médico ou pericial. (…) Quanto aos meios a utilizar na determinação da alcoolémia, rege o artigo 153º do Código da Estrada : Fiscalização da condução sob influência de álcool 1 - O exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito. 2 - Se o resultado do exame previsto no número anterior for positivo, a autoridade ou o agente de autoridade deve notificar o examinando, por escrito, ou, se tal não for possível, verbalmente, daquele resultado, das sanções legais dele decorrentes, de que pode, de imediato, requerer a realização de contraprova e de que deve suportar todas as despesas originadas por esta contraprova no caso de resultado positivo. 3 - A contraprova referida no número anterior deve ser realizada por um dos seguintes meios, de acordo com a vontade do examinando: a) Novo exame, a efectuar através de aparelho aprovado; b) Análise de sangue. 4 - No caso de opção pelo novo exame previsto na alínea a) do número anterior, o examinando deve ser, de imediato, a ele sujeito e, se necessário, conduzido a local onde o referido exame possa ser efectuado. 5 - Se o examinando preferir a realização de uma análise de sangue, deve ser conduzido, o mais rapidamente possível, a estabelecimento oficial de saúde, a fim de ser colhida a quantidade de sangue necessária para o efeito. 6 - O resultado da contraprova prevalece sobre o resultado do exame inicial. 7 - Quando se suspeite da utilização de meios susceptíveis de alterar momentaneamente o resultado do exame, pode a autoridade ou o agente de autoridade mandar submeter o suspeito a exame médico. 8 - Se não for possível a realização de prova por pesquisa de álcool no ar expirado, o examinando deve ser submetido a colheita de sangue para análise ou, se esta não for possível por razões médicas, deve ser realizado exame médico, em estabelecimento oficial de saúde, para diagnosticar o estado de influenciado pelo álcool. Os aparelhos em questão estão sujeitos à aprovação e fiscalização Instituto Português da Qualidade e o quadro legal que lhes é aplicável é actualmente o seguinte: a) - Decreto-Lei 291/90 de 20 de Setembro que estabelece o Regime Geral do Controle Metrológico, estabelecendo no seu artigo 1º nº 2 «Os métodos e instrumentos de medição obedecem à qualidade metrológica estabelecida nos respectivos regulamentos de controlo metrológico de harmonia com as directivas comunitárias ou, na sua falta, pelas recomendações da Organização Internacional de Metrologia Legal (OIML) ou outras disposições aplicáveis indicadas pelo Instituto Português da Qualidade.» b) Portaria 962/90 de 9 de Outubro que aprovou o Regulamento Geral do Controlo Metrológico; c) Portaria nº748/94, de 13 de Agosto que aprovou em Anexo o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros. É precisamente o nº 6 do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros que determina a aplicabilidade dos erros máximos previstos na Norma AFNOR de 1 de Fevereiro de 1992 NF X 20-701 (v.nº.4 do seu Anexo) Ora, não desconhecemos que parte da jurisprudência entende que tal normativo já se não encontra em vigor. Vejamos porquê. Na sequência da alteração do Código da Estrada, por via do Decreto-Lei nº.2/98, de 3 de Janeiro, o Decreto Regulamentar nº.24/98, de 30 de Outubro revogou expressamente o Decreto Regulamentar nº.12/90, consignando os procedimentos para a fiscalização da condução sob a influência do álcool. Ora com base nesta expressa menção do artigo 15º os partidários da revogação da Portaria nº.748/94 entendem que esta aprovou o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros nos termos e para os efeitos do disposto no nº.2 do artigo.1º do Decreto Regulamentar nº.12/90, como decorre do nº.1 do seu Anexo, onde se diz que « O presente Regulamento aplica-se, exclusivamente, a alcoolímetros destinados à determinação da taxa de álcool, para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 1.º do Decreto Regulamentar n.º 12/90, de 14 de Maio. » Ora, se este último, veio a ser expressamente revogado tacitamente deveria entender-se que igualmente o foi o compêndio normativo em análise. Salvo o devido respeito pela interpretação em causa, cremos que se toma a árvore pela floresta. Na verdade, o que o mencionado Decreto Regulamentar nº.24/98, de 30 de Outubro instituiu foram os procedimentos para a fiscalização da condução sob a influência do álcool. Em nada veio alterar, dispor ou modificar – ou sequer reservar para posterior intervenção legislativa - o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros. E tanto assim é que ulteriormente nenhuma intervenção nesse domínio ocorreu, não sendo em boa e sã interpretação sistemática de entender que desde então até ao presente o IPQ levou a cabo a sua actividade de fiscalização e aprovação sem Regulamento expresso. Mais. Se tal interpretação se sustentasse, seria supor que um Decreto Regulamentar ( o nº.24/98, de 30 de Outubro) teria levado a cabo uma autêntica derrogação da recepção no direito interno de norma, já transposta e aplicada, de uma Recomendação da Organização Internacional de Metrologia Legal, consubstanciada no Decreto-Lei 291/90 de 20 de Setembro, Portaria 962/90 e Portaria 748/94 de 13 de Agosto. Tal normativo, na medida em que traduz o cumprimento de uma Convenção Internacional a que Portugal aderiu, beneficia da protecção que a tais normais de direito supra-nacional é garantida por força do artigo 8º da Constituição da República Portuguesa. Doutro passo, está também o Estado Português obrigado ao respeito pelas Directiva 83/575/CEE do Conselho de 23 de Outubro de 1983 que altera a Directiva 71/316/CEE relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes às disposições comuns sobre os instrumentos de medição e os métodos de controle metrológico que veio a ter expressão nos Decretos supra mencionados e ainda na Portaria 748/94 de 13 de Agosto que expressamente consigna o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros; Não se vê, pois, como pura e simplesmente poderia o Decreto-Regulamentar deixar o vazio legal da transposição operada por uma Directiva Comunitária. Cremos, pois, que quando se defende a revogação da falada Portaria 748/94 de 13 de Agosto por via de se ter revogado o regime de fiscalização da condução sob efeito do álcool mediante a utilização de alcoolímetros se confundem duas realidades: uma coisa é o regime de fiscalização em si, outra, bem diversa, é a Regulamentação do Controlo Metrológico mediante o qual se efectua tal fiscalização. E nessa medida afigura-se-nos bem pobre e simplista o argumento literal do disposto no já transcrito nº.1 do seu Anexo, onde se diz que «O presente Regulamento aplica-se, exclusivamente, a alcoolímetros destinados à determinação da taxa de álcool, para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 1.º do Decreto Regulamentar n.º 12/90, de 14 de Maio». [5] e aliás circuladas pelo CSM a pedido da DGV em Oficio/Circular [6] Acórdão de 19.12.2007, de 02.04.2008, 07.05.2008, 14.05.2008, 15.10.2008, 22.10.2008, 26.11.2008, 21.01.2009, 04.02.2009, de do Tribunal da Relação do Porto; de 09.01 de 2008 e da mesma data, de diversa secção, ambos do Tribunal da Relação de Coimbra; Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 07 de Maio de 2008 publicado on line na DGSI. [7] cfr. FIGUEIREDO DIAS, “Direito Penal II, Parte Geral, As Consequências Jurídicas do Crime”, Secção de Textos da Universidade de Coimbra, 1988, pág. 229 e ss. e mais recentemente “Direito Penal Português, Parte Geral II, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, Ano 1993, pág. 198 e ss. [8] in Direito Penal Português, Consequências Jurídicas do Crime, Notícias Editorial, §§ 205 e 793 [9] Actas da Comissão de Revisão do Código Penal, n.ºs 5, 8, 10 e 41 [10] “Direito Penal Português, As consequências jurídicas do crime”, Notícias Editorial, § 205 [11] Op cit, pág. 304 [12] Acs. do STJ de 20-10-2004, Proc. n.º 2824/04 - 3.ª, e de 17-11-2005, Proc. n.º 1296/05 - 5.ª