I - A concreta taxa de álcool no sangue não pode ser provada por meio de confissão ou de depoimento: nos termos legais, só pode ser feita através de teste no ar expirado ou por meio de análise ao sangue. II - O arguido não pode confessar que conduzia com uma determinada taxa de álcool no sangue: falta-lhe, para o efeito, razão de ciência. III - Ainda que a margem de erro legalmente admissível seja levada em conta no momento da calibração do aparelho, tal facto apenas garante que o aparelho em concreto está apto a efectuar medições e que os resultados obtidos sempre se situarão dentro dos limites definidos por aquelas margens de erro. IV - O princípio in dubio pro reo impõe a dedução do erro máximo admissível ao valor registado no talão emitido pelo alcoolímetro.
RECURSO N.º 24/09.2GAMAI.P1 Tribunal Judicial da Maia - ..º Juízo Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I – Relatório 1. No processo sumário n.º 24/09.2GAMAI, do ..º Juízo de competência criminal do Tribunal Judicial da Maia, o arguido B………., melhor identificado nos autos, foi submetido a julgamento e condenado, pela autoria de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez que lhe havia sido imputado, p. e p. pelos artigos 292.º, n.º1, 294.º n.º 1 e 69.º, n.º1, al. a), todos do Código Penal, na pena de 70 dias de multa, à taxa diária de 6,00€, num total de 420,00€, e bem assim na pena acessória de proibição de conduzir quaisquer veículos com motor pelo período de 4 meses. 2. Inconformado, o Ministério Público recorreu da sentença absolutória, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): I) Consta dos autos que efectuado ao arguido teste quantitativo de pesquisa de álcool no sangue, através de ar expirado, no aparelho Drager Alcotest 7110MKIII p, acusou uma taxa de 1.70/g/l. II) A M.ma Juíza “a quo” efectuou desconto naquela taxa com base em “margem de erro admissível nos alcoolímetros”. III) In casu, não se pode fazer correcção na TAS por aplicação das margens de erro. IV) - O exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito. V) - Em face do constante quer do regime do Decreto Regulamentar n.º 24/98 de 30 de Outubro, da Portaria n.º 748/94 de 13 de Agosto, da Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio e da Portaria n.º 1556/2007 de 10 de Dezembro, a solução para o caso concreto, na nossa modesta opinião é a mesma, ou seja, não podia no caso concreto ser efectuado tal desconto. VI) - De facto, os erros a que se alude no artigo 6 da Portaria n.º 748/94 e no art. 8 da Portaria n.º 1556/2007 de 10 de Dezembro, são considerados nas operações de aprovação e de verificação dos aparelhos em apreço, efectuados pelo Instituto Português da Qualidade, sendo de ter em conta o referido no artigo 10.º desta última Portaria quanto à validade dos aparelhos que tenham sido autorizados ao abrigo de legislação anterior à entrada em vigor da mesma. VII) - Ao valor que consta dos talões emitidos por aquele alcoolímetro, não têm de se fazer desconto, uma vez que os níveis máximos de erro já foram tidos em consideração, na aprovação, verificações e ensaios a que aquele é sujeito. VIII) - Ao fazê-lo a Douta Decisão padece do vício de erro notório na apreciação da prova, cfr, artigo 410.º, n.º2, al. c) do C.P.P. IX) - Assim atento o resultante do auto de notícia e elementos de prova, que foram vertidos na acusação e em função da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, dentre a qual o documento de fls. 10, a confissão do arguido e a não pretensão de realização de contra-prova, o Tribunal não podia deixar de decidir de acordo com aquela, e dever considerar a taxa de 1, 70 g/l, ou seja, o facto dado como provado está em desconformidade com o que realmente se provou. X) - Não se reportando, em termos de facto provado ao valor que resulta do exame, decidiu contra Direito. XI) - Da Sentença recorrida não se verificam os pressupostos de aplicação do principio in dubio pro reo, dado que da prova produzida não resultou qualquer elemento que pudesse causar a dúvida razoável sobre a taxa detectada e colocasse em causa o valor registado no talão de fls. 10. Da fundamentação de facto não consta que algum elemento de prova tenha infirmando ou suscitado alguma dúvida em relação ao valor registado. XII) - Deve a al. b) dos factos provados ter a seguinte redacção b) - Na ocasião acima referida era portador de uma taxa de álcool no sangue de 1,70 g/l. XIII) - Em face a TAS de 1, 70 g/l, consideramos ser como justa nos termos conjugados dos artigos 40.º e 71.º do Código Penal uma pena multa não inferior a 75 dias, mantendo-se quanto a nós adequada a proibição de conduzir quaisquer veículos com motor por 4 meses. XIV) - Ao não considerar para efeito de pena a aplicar a TAS de 1, 70 g/l e considerar, ao invés, a TAS 1,57 g/l, a M Juíza "a quo" violou os artigos 40.º, n.º 1 e n.º 2, 71.º, n.º l e 2, 77.º, n.º 1 e 2, 292.º, n.º 1 e 294.º, n.º l, do Código Penal, artigo 410.º, n.º 2, al. c) do C.P.P., artigos 153.º, n.º 1 e 158.º, n.º 1, al) e b) e 170.º n.º 3 e 4 do Código da Estrada e Decreto Regulamentar n.º 24/98 de 30 de Outubro, o Decreto Regulamentar n.º 24/98 de 30 de Outubro, a Portaria n.º 1006/98 de 30 de Novembro, e, presentemente, a Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio e a Portaria n.º 902-B/2007, de 13 de Agosto e Portaria n.º 1556/07 de 10 de Dezembro e o princípio do in dubio pro reo. Nestes termos e nos demais de direito, que os Venerandos Desembargadores do Tribunal da Relação do Porto se dignarão suprir, revogando-se parcialmente a Douta Sentença, dando-se como provado que o arguido era portador de uma taxa de álcool no sangue de 1,70 g/l. e consequentemente condenando-o numa pena de multa não inferior a 75 dias, por crime de condução de veículo em estado de embriaguez agravado, far-se-á a já costumada justiça. 3. O arguido não respondeu ao recurso. 4. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido da procedência do recurso. 5. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º2, do Código de Processo Penal (diploma que passaremos a designar de C.P.P.), foram colhidos os vistos, após o que foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.º3, do mesmo diploma. II – Fundamentação 1. Conforme jurisprudência constante e pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (entre muitos, os Acs. do S.T.J., de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242; de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271). Assim, atento o teor das conclusões, a questão que importa apreciar e decidir consiste em saber se a sentença recorrida enferma do vício do erro notório na apreciação da prova, por ser inadmissível descontar à concreta TAS do arguido, aferida pelo alcoolímetro, o valor do erro máximo admissível previsto no Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros; e bem assim se, alterada a matéria de facto quanto à TAS, o arguido deverá ser condenado em pena não inferior a 75 dias de multa. 2. Da sentença recorrida 2.1. O tribunal a quo considerou provados os seguintes factos: a) No dia 05.Janeiro.2009, pelas 22h 40m o arguido conduziu o automóvel pesado de mercadorias de matrícula ..-..-RZ, pela Rua ………., Maia b) Na ocasião acima referida era portador de uma taxa de álcool no sangue de pelo menos 1,57 g/l. c) Actuou de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que conduzia veículo por via de circulação terrestre, afecta ao trânsito público, tendo ingerido bebidas alcoólicas, e querendo fazê-lo. d) O arguido é motorista de pesados, e no dia referido em a) realizara, no exercício da sua profissão e ao volante do ..-..-RZ, um transporte de mercadoria, que continuaria no dia seguinte. e) O arguido parara para jantar e pernoitar, e depois do jantar decidira estacionar o seu camião noutro local, mais seguro, a cerca de 500 metros do local onde o parara anteriormente, por forma a seguir viagem no dia seguinte. f) Foi nesse percurso que lhe foi detectada a taxa de alcoolémia referida em b). g) O arguido aufere 545 € mensais, acrescidos de suplementos de viagens. h) É divorciado mas vive em união de facto e a sua companheira aufere 1000 € mensais como encarregada de refeitório. i) É pai de 2 filhos, um dos quais vive com a respectiva mãe, não contribuindo o arguido para o seu sustento. O outro vive com o casal. j) Pagam 360 € mensais em amortização de empréstimo para compra de casa e 280 € mensais em amortização de empréstimo referente a uma segunda habitação. k) Confessou os factos descritos na acusação e declarou-se arrependido. l) O arguido não tem antecedentes criminais. 2.2. Consignou-se, a propósito dos factos não provados: «Com pertinência ao objecto de processo não se provaram quaisquer outros factos para além ou em contrário dos constantes no ponto anterior, designadamente que o arguido fosse portador de uma taxa de 1,70 g/l de álcool no sangue.» 2.2. O tribunal recorrido fundamentou a sua convicção nos seguintes termos (transcrição): «O tribunal fundou a sua convicção nas declarações do arguido, que admitiu ter conduzido a viatura depois de ter ingerido bebidas alcoólicas, ter efectuado o teste de pesquisa de álcool no sangue e ter o aparelho Drager 7110 MKIII P acusado taxa de 1,70 g/l., o que resulta também da análise do talão de fls. 10. O arguido relatou depois o que consta nas alíneas d) e j). No que diz respeito à quantidade de álcool no sangue de que o arguido era portador, o tribunal considera que a medição efectuada no Drager 7110 MKIII P está sujeita a uma margem de erro, conforme a menção constante a fls. 18 do “manual de operações” do Drager 7110, divulgado pela sociedade “Tecniquitel”que introduziu tal aparelho em Portugal. O uso do dito aparelho no território nacional, com a característica descrita, foi validado através de “despacho de aprovação de modelo”, publicado a 25.09.1996 e em 05.03.1998 (referente a alterações) e emitido pelo Instituto Português da Qualidade, entidade com competência para o efeito, nos termos do estatuído pelo Regulamento de Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, aprovado pela Portaria 748/94, publicada no DR de 13.08.1994, na qual se definiam os requisitos a que tinham que obedecer os aparelhos destinados a efectuar as medições de álcool (sendo certo que tal Portaria se manteve em vigor até 11.12.2007, já que a ela aludia o Decreto Regulamentar 24/98, de 30.10 e aludia a actual Lei 18/2007, de 17.05, no seu art.º 14 n.º 2). Em tal Portaria aludia-se, de forma clara, às margens de erros admissíveis nos alcoolímetros, que eram os definidos pela norma NF X-20-701, da Organização Internacional de Metrologia Legal. A Portaria 748/94 foi expressamente revogada pela Portaria 1556/2007, de 10.12.2007, que aprovou o novo Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, e na qual se continua a referir o Instituto Português da Qualidade como entidade competente para efectuar o controlo metrológico dos alcoolímetros. Nesta nova Portaria continua a aludir-se, de forma expressa no seu art.º 8.º, às margens de erros admissíveis nos alcoolímetros, que são os definidos no anexo da própria Portaria. Assim sendo, não resta senão concluir, como defendeu o arguido, que o aparelho usado para medir o nível de álcool no sangue ao arguido nestes autos fornece um valor não totalmente rigoroso, porque sujeito a erro, que todavia se encontra compreendido dentro dos valores máximos legalmente admissíveis (motivo pelo qual o dito aparelho foi aprovado em Portugal e o seu uso continua a ser legal – cfr. art.º 10 da Portaria 1556/2007). A aplicação das apontadas margens de erro ao valor encontrado produz um intervalo de valores dentro do qual se há-de encontrar o valor de álcool no sangue de que o arguido era realmente portador (neste sentido, entre outros, Ac. TRP de 19.12.2007, relatado pelo Sr. Desembargador Pinto Monteiro, Ac. TRP de 02.04.2008, relatado pelo Sr. Desembargador José Carreto, e Ac. Tribunal da Relação do Porto de 07.05.2008, relatado pelo Sr. Desembargador Luís Teixeira, todos em www.dgsi.pt). A DGV divulgou mesmo uma tabela (que foi remetida aos tribunais através da Circular 101/2006 do Conselho Superior da Magistratura) na qual se faz aplicação prática do acima referido, encontrando-se previsto para cada valor de álcool no sangue, obtido através do aparelho Drager 7110, o valor mínimo a que tal há-de corresponder, ou seja, o valor de álcool no sangue de que, pelo menos, o sujeito ao teste há-de ser portador, deduzida a margem de erro máximo aplicável. De acordo com tal tabela, que se tem como boa, a uma taxa de álcool no sangue de 1,70 g/l corresponde, pelo menos o valor de 1,57 g/l, que é o valor que se considera nestes autos, atento até o princípio in dubio por reo, sendo certo que em audiência não se vislumbrou a possibilidade de produzir qualquer meio de prova adicional com vista a sanar esta questão e se entende, na esteira nomeadamente do Ac. TRP de 10.09.2008 (recurso 3109/08-4) e de 21.05.2008 (recurso1716/08) que a confissão produzida em audiência se reporta tão só à condução, realização do teste e valor que este indicou e não à taxa de álcool no sangue de que o arguido era concreta e efectivamente portador, facto que não está abrangido pelo seu conhecimento pessoal, antes pressupõe um juízo técnico. No que se reporta às condições de vida e antecedentes criminais, o tribunal valorou as declarações do arguido e o teor do CRC junto aos autos Os descritos meios de prova, analisados à luz das regras de experiência, serviram para formar a convicção supra expressa.» 3. Apreciando 1. Dispõe o artigo 428.º, n.º 1, do C.P.P., que os Tribunais da Relação conhecem de facto e de direito. Porém, o seu poder de cognição encontra-se delimitado pelas conclusões da motivação do recorrente. Resulta da análise da motivação que o recorrente insurge-se contra a decisão da matéria de facto na parte em que se deu como provada a taxa de álcool no sangue de pelo menos 1,57 g/l, por aplicação do desconto da “margem de erro” ao valor indicado no alcoolímetro. A matéria de facto pode ser sindicada por duas vias: no âmbito, mais restrito, dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º2, do C.P.P., no que se convencionou chamar de “revista alargada”; ou através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412.º, n.º3, 4 e 6, do mesmo diploma. No primeiro caso, estamos perante a arguição dos vícios decisórios previstos nas diversas alíneas do n.º 2 do referido artigo 410.º, cuja indagação, como resulta do preceito, tem que resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos, para a fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento (cfr. Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 10. ª ed., 729, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, Verbo, 2ª ed., 339 e Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6.ª ed., 77 e ss.). No segundo caso, a apreciação não se restringe ao texto da decisão, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada) produzida em audiência, mas sempre dentro dos limites fornecidos pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus de especificação imposto pelos n.º 3 e 4 do art. 412.º do C.P. Penal. No recurso em análise, invoca-se a existência de erro notório na apreciação da prova, vício decisório previsto no artigo 410.º, n.º2, alínea c), do C.P.P., que se verifica quando um homem médio, perante o teor da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta de que o tribunal violou as regras da experiência ou de que efectuou uma apreciação manifestamente incorrecta, desadequada, baseada em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios. O erro notório também se verifica quando se violam as regras sobre prova vinculada ou das leges artis (sobre este vício, e os demais vícios decisórios previsto no artigo 410.º, n.º2, todos de conhecimento oficioso, ver Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos em processo penal, 6.ª edição, pp.67 e seguintes). 2. A questão colocada no recurso em apreço tem sido largamente debatida na jurisprudência dos tribunais superiores e traduz-se em saber da admissibilidade do desconto na concreta TAS (taxa de álcool no sangue) aferida pelo alcoolímetro que procedeu à medição do álcool no sangue do recorrido (por conversão do valor no ar expirado), do valor do erro máximo admissível (EMA) previsto no Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, desconto que, caso se verifique, consubstanciará, na tese do recorrente, o vício decisório do erro notório na apreciação da prova. Tem sido questionado se, para o preenchimento do elemento do tipo objectivo do crime previsto no artigo 292.º do Código Penal que consiste na condução de veículos, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l, deve ser considerada a taxa de alcoolemia que foi registada pelo alcoolímetro utilizado ou se o tribunal deve antes ter em conta a taxa resultante da subtracção da margem de erro máximo admissível ao valor indicado no aparelho. No sentido de que não deve ser efectuado o desconto do valor do “erro máximo admissível” na TAS registada no alcoolímetro que procedeu à medição, pronunciaram-se, entre outros: os Acs. da R. de Coimbra de 30/01/08, Proc. n.º 91/07.3PANZN.C1, de 11/11/08, Proc. n.º <a href="https://acordao.pt/decisoes/124202" target="_blank">62/08.2GBPNH.C1</a> e de 10/12/08, Proc. n.º 17/07.4PANZR; Acs. da R. de Lisboa, de 03/10/07, Proc. n.º 4223/07-3, de 20/02/08, Proc. n.º 183/2008-3 e de 27/10/2009, Proc. n.º 54/07.9PTALM.L1-5; Acs. da R. do Porto de 2/07/2008, Proc. n.º 0813031 e de 14/01/09, Proc. n.º 0815205, todos em www.dgsi.pt.). O entendimento oposto sustenta que há lugar à dedução do valor do “erro máximo admissível” à taxa registada no alcoolímetro, tendo-se pronunciado nesse sentido, entre outros: os Acs. da R. do Porto, de 02/04/08, Proc. n.º 0810479, de 07/05/08, Proc. n.º 0810922, de 26/11/08, Proc. n.º 0812537; Acs. da R. de Coimbra de 09/01/08, Proc. n.º 15/07.1PAPBL-C1 e Proc. n.º 426/04.6TSTR.C1; Ac. da R. Guimarães de 26/02/07, Proc. n.º 2602/06.2; Ac. da R. de Lisboa, de 07/05/08, Proc. n.º 2199/08-3 e bem assim o voto de vencido do Desembargador João Latas no Ac. da R. Évora de 01/07/08, Proc. nº 2699/07-1, todos em www.dgsi.pt.). Vejamos, pois, seguindo de perto o que sobre a questão já explanámos no Recurso n.º <a href="https://acordao.pt/decisoes/144737" target="_blank">291/09.1PAVNF.P1</a> 3. De harmonia com o disposto no artigo 81.º do Código da Estrada (diploma que foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio, com as alterações que sucessivamente lhe foram introduzidas pelos Decretos-Leis n.º 2/98, de 3 de Janeiro, 265-A/2001, de 28 de Setembro, pela Lei n.º 20/2002, de 21 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 44/2005, de 23 de Fevereiro e pela Lei n.º 78/2009, de 13 de Agosto), é proibido conduzir sob influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas, considerando-se sob influência de álcool o condutor «que apresente uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,5 g/l ou que, após exame realizado nos termos previstos no presente Código e legislação complementar, seja como tal considerado em relatório médico» (n.º1 e 2 do referido preceito legal). Nos termos do n.º3 do mencionado artigo, a conversão dos valores do teor de álcool no ar expirado (TAE) em teor de álcool no sangue (TAS) é baseada no princípio de que 1 mg de álcool por litro de ar expirado é equivalente a 2,3 g de álcool por litro de sangue. A condução com uma taxa igual ou superior a 0,5g/l e inferior a 0,8 g/l constitui contra-ordenação sancionada com coima de €250,00 a € 1250,00, sendo a condução com uma taxa igual ou superior a 0,8 g/l e inferior a 1,2 g/l sancionada com coima de € 500,00 a €2500,00. Por sua vez, no artigo 292.º, n.º1, do Código Penal, dispõe-se: «Quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1, 2g/l, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.» O preenchimento do tipo objectivo de crime impõe a determinação da concreta taxa de álcool no sangue de que o condutor é portador, já que só a condução com taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l integra a referida previsão legal. Os artigos 152.º e seguintes do Código da Estrada regem sobre o procedimento para a fiscalização da condução sob influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas, determinando o respectivo artigo 158.º, n.º1, que são fixados em regulamento, além do mais: o tipo de material a utilizar na fiscalização e nos exames laboratoriais para determinação dos estados de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas; os métodos a utilizar para a determinação do doseamento de álcool ou de substâncias psicotrópicas no sangue. A matéria da fiscalização da condução sob o efeito do álcool foi objecto de regulamentação pelo Decreto Regulamentar n.º 24/98, de 30 de Outubro, diploma que distinguia entre aparelhos analisadores de medição “qualitativos” e os aparelhos “quantitativos” - os primeiros com meras funções de despistagem/triagem, após o que os condutores seriam submetidos aos analisadores "quantitativos" ou a exame hematológico - cfr. art. 1.º, n.º 1, do mencionado diploma. O referido Decreto Regulamentar n.º 24/98, de 30 de Outubro, foi revogado pela Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio, que aprovou o Novo Regulamento da Fiscalização da Condução sob o Efeito do Álcool, não tendo procedido, todavia a alterações relevantes para os efeitos que ora interessam. No artigo 1.º, do Regulamento de Fiscalização, enunciam-se os meios de detecção e medição da taxa de álcool no sangue, designadamente, analisadores qualitativos e quantitativos, estes por teste no ar expirado ou análise de sangue. No artigo 14.º prescreve-se que nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só podem ser utilizados aparelhos que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, exigindo-se, previamente a esta aprovação, a existência de homologação de modelo, da competência do Instituto Português da Qualidade, de acordo com os termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros. No caso dos autos não está em causa a utilização de um aparelho de medição “qualitativo”, mas sim um aparelho de medição “quantitativo” - aparelho Drager mod.7110MKIII P, aprovado pela D.G.V. conforme despacho nº.12594/07, de 16-3. Como aparelho de medição quantitativo, tal instrumento está sujeito a operações de controlo metrológico. A Portaria n.º 748/94, de 3 de Outubro, aprovou o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, o qual nos termos do seu artigo 3.º, definia “os erros máximos admissíveis para a Primeira Verificação (PV) e Verificação Periódica (VP) em teor de álcool expirado (TAE) e convertido em Teor de Álcool no Sangue (TAS)” em conformidade com a tabela anexa. A Portaria n.º 748/94 foi revogada pela Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro (art. 2.º), que procedeu à aprovação do novo regulamento a que deve obedecer o controlo metrológico dos alcoolímetros, estabelecendo o respectivo n.º1 que o regulamento aplica-se «a alcoolímetros quantitativos ou analisadores quantitativos.» Por outro lado, o artigo 5.º do mesmo Regulamento (quer o primitivo quer o novo) estabelece: «O controlo metrológico dos alcoolímetros é da competência do Instituto Português da Qualidade, I.P. - IPQ e compreende as seguintes operações: a) Aprovação do modelo; b) Primeira verificação; c) Verificação periódica; d) Verificação extraordinária». O artigo 8.º do referido Regulamento, sob a epígrafe “Erros Máximos Admissíveis”, estabelece: «Os erros máximos admissíveis (EMA), variáveis em função do teor de álcool no ar expirado (TAE) são os constantes do quadro anexo ao presente diploma e que dele faz parte integrante.» O n.º 2, do artigo 9º, prescreve, por seu turno: «Os registos da medição devem conter, entre outros elementos, a marca, o modelo e o número de série do alcoolímetro assim como a data da última verificação metrológica.» Finalmente, na Portaria n.º 902-B/2007, de 13 de Agosto, especificam-se as características técnicas, gerais e físicas, a que devem obedecer os analisadores quantitativos, entre elas, que os referidos instrumentos devem «cumprir os requisitos metrológicos e técnicos definidos no regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros» e «usar a unidade de leitura em gramas de álcool por litro de sangue (TAS) segundo o factor fixado no nº 3 do artigo 81º, do Código da Estrada». 4. Para quem perfilha o entendimento de que é inadmissível a subtracção da margem de EMA ao valor indicado no aparelho utilizado numa medição concreta, a previsão da referida margem reporta-se tão-somente à Aprovação e às Verificações periódicas subsequentes realizadas pelo IPQ como condição da homologação e aprovação dos aparelhos de medição. A Metrologia Legal é o ramo da Metrologia, que trata das exigências legais, técnicas e administrativas, relativas às unidades de medida, aos métodos de medição, aos instrumentos de medição e às medidas materializadas, fornecendo um quadro destinado a conferir às medições um nível básico de segurança, que passa nomeadamente por um sistema de unidade definida, estrita verificação e calibração dos instrumentos de medição e definição de um conjunto de erros máximos admissíveis. Sobre esta temática e em abono do supra referido entendimento – que sustenta a não consideração da margem de EMA -, tem sido largamente citada a comunicação apresentada por Maria do Céu Ferreira e António Cruz no 2.º Encontro Nacional da Sociedade Portuguesa de Metrologia, em 17 de Novembro de 2006, com o título CONTROLO METROLOGICO DE ALCOOLÍMETROS NO INSTITUTO PORTUGUÊS DA QUALIDADE. Nessa comunicação podemos ler: «A definição, através da Portaria n.º 748/94, de determinados erros máximos admissíveis, quer para a Aprovação de Modelo e Primeira Verificação, quer para a Verificação Periódica, visa definir barreiras limite dentro das quais as indicações dos instrumentos de medição, obtidas nas condições estipuladas de funcionamento, são correctas. Ou seja, um alcoolímetro de modelo aprovado e com verificação válida, utilizado nas condições normais, fornece indicações válidas e fiáveis para os fins legais.» Mais adiante: «Os EMA são limites definidos convencionalmente em função não só das características dos instrumentos, como da finalidade para que são usados. Ou seja, tais valores limite, para mais e para menos, não representam valores reais de erro, numa qualquer medição concreta, mas um intervalo dentro do qual, com toda a certeza (uma vez respeitados os procedimentos de medição), o valor da indicação se encontra. É sabido que a qualquer resultado de medição está sempre associada uma incerteza de medição, uma vez que não existem instrumentos de medição absolutamente exactos. Esta incerteza de medição é avaliada no acto da aprovação de modelo por forma a averiguar se o instrumento durante a sua vida útil possui características construtivas, por forma a manter as qualidades metrológicas regulamentares, nomeadamente fornecer indicações dentro dos erros máximos admissíveis prescritos no respectivo regulamento.» (www.spmet.pt/comunicacoes_2_encontro/Alcoolimetros_MCFerreira.pdf) Em termos conclusivos, dizem os referidos autores: «O valor da indicação do instrumento é em cada situação, o mais correcto. O eventual erro da indicação, nesse momento, nessa operação, com o operador que a tiver efectuado, nas circunstâncias de ambiente locais, quaisquer que tenham sido outros factores de influência externos ou contaminantes do ar expirado, seja ele positivo ou negativo, está com toda a probabilidade contido nos limites do EMA.» Do teor desta comunicação não logramos extrair, como conclusão, que o tribunal não possa fazer uso das margens de erro dos aparelhos de medição para reduzir tanto quanto possível a divergência entre o resultado do exame e a realidade. Ainda que na referida comunicação se diga que os EMA não representam valores reais de erro, certo é que se realça que tais valores representam um intervalo dentro do qual, com toda a certeza, o valor da indicação se encontra. Admitindo que a margem de erro legalmente admissível é tida em conta no momento da calibração do aparelho, tal facto apenas garante que o aparelho em concreto está apto a efectuar medições e que os resultados obtidos sempre se situarão dentro dos limites daquelas margens de erro. Por outras palavras, como se assinala no Acórdão da Relação de Lisboa, de 7 de Maio de 2008 (Proc. n.º 2199/08-3), se o aparelho se encontra aprovado, se foi sujeito à verificação periódica e está a funcionar regularmente, o tribunal tem todas as razões para ter por seguro, para além de qualquer dúvida razoável, que o examinado tinha a taxa de álcool que resulta da subtracção da margem de erro máximo admissível ao valor indicado pelo aparelho. Diz-se nesse aresto (excluem-se as menções a notas de rodapé): «Embora nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só possam ser utilizados analisadores que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, sendo a aprovação precedida de homologação de modelo, a efectuar pelo Instituto Português de Qualidade, nos termos do Regulamento do Controlo Metrológico de Alcoolímetros (n.º 1 e 2 do artigo 14º), regulamento esse que impõe o respeito pela Recomendação n.º 126 da Organização Internacional da Metrologia Legal (OIML R 126), os valores determinados pelos aparelhos não são completamente precisos, havendo sempre uma determinada margem de erro que não obsta à aprovação do modelo e à certificação de cada aparelho na primeira verificação e nas verificações sucessivas. Daí que, como se afirma no ponto 5 da Recomendação n.º 126 da OIML, mesmo com um aparelho aprovado e sujeito a verificação periódica, exista ou possa existir em cada medição individual uma certa imprecisão. Se em 95% das medições essa imprecisão não deve ultrapassar os valores referidos no ponto 5.2.2 da OIML R 126, os quais são claramente inferiores à margem de erro admissível do aparelho, nas restantes medições a imprecisão pode ser superior. Estando a aprovação do modelo e a certificação de cada aparelho na primeira verificação e nas verificações seguintes sujeitas à não ultrapassagem da margem de erro admissível fixada, consoante o caso, nos pontos 5.1.1 a 5.1.3 da OIML R 126 e no quadro anexo à Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro, o tribunal não pode estar seguro de que o condutor fiscalizado, em cada caso concreto, tenha conduzido o veículo com a exacta taxa de álcool indicada pelo aparelho.» No caso em apreço, acresce que, ao contrário do exigido pelo n.º 2, do artigo 9.º, da Portaria n.º 1556/2007, de 10/12, o registo da medição nem sequer contém a data da última verificação metrológica, como se infere da documentação para a qual remete a motivação da decisão sobre a matéria de facto. 5. Questões idênticas têm sido colocadas noutros países, a propósito da medição da taxa de alcoolemia relevante para fins sancionatórios. Nos E.U.A., as questões colocadas pelos testes de «DUI» (driving under the influence) ou «DWI» (driving while intoxicated), realizados através dos «breath tests», por não medirem directamente a taxa de álcool no sangue, mas antes o fazerem através da conversão de valores obtidos no ar expirado por meio de instrumentos de medição que comportam margens de erro, constituem um tema de eleição em disputas judiciárias com origem na condução em estado de embriaguez, com tratamento diverso conforme o Estado em que ocorram. Em França, o Décret n.º 85-1519 du 31 décembre 1985 (consultar em http://www.legifrance.gouv.fr.), relativo aos instrumentos destinados à medição da concentração de álcool no ar expirado, estabeleceu, no seu artigo 3.º, os seguintes erros máximos tolerados «sur la mesure de la concentration d'alcool éthylique, en plus ou en moins, sur les instruments en service»: «- 0,032 milligramme par litre, pour toute concentration inférieure à 0,40 milligramme par litre ; - 8 centièmes, en valeur relative, pour toute concentration supérieure ou égale à 0,40 milligramme par litre et inférieure à 1 milligramme par litre ; - 15 centièmes, en valeur relative, pour toute concentration supérieure ou égale à 1 milligramme par litre et inférieure à 2 milligrammes par litre ; - 30 centièmes, en valeur relative, pour toute concentration supérieure ou égale à 2 milligrammes par litre.» Entretanto, sobre essa matéria veio reger o Décret n.º 2001-387 du 3 mai 2001 e o artigo 15.º do Arrêté du 8 juillet 2003 relativo ao controlo dos alcoolímetros (designados de éthylomètres - consulta em http://droit.org/jo/20030720/INDI0301735A.html). Reconhecendo a legislação francesa, como não poderia deixar de ser, a existência de margens de erro dos éthylométres, tem-se colocado, como em Portugal, a questão de saber se essas margens devem ser consideradas apenas no momento da aprovação e da verificação periódica dos aparelhos de medição ou se podem ser ponderadas nas medições concretamente efectuadas aos condutores. Sobre essa questão pronunciou-se recentemente a Chambre Criminelle da Cour de Cassation, em 24 de Junho de 2009, no pourvoi 09-81119, sobre decisão que havia sido tomada pela Cour d`Appel de Poitiers. A referida Cour d`Appel tinha decidido que o preceito relativo às margens de erro é apenas aplicável nas verificações periódicas dos éthylomètres e não nos controlos efectuados aos condutores. Ora, a Cour de Cassation, diversamente, ainda que tenha rejeitado o pourvoi, não deixou de dizer que «Si c'est à tort qu'un arrêt énonce que les marges d'erreur prévues par les articles 3 du décret du 31 décembre 1985 et 15 de l'arrêté du 8 juillet 2003 ne peuvent s'appliquer à une mesure effectuée lors d'un contrôle d'alcoolémie, il n'encourt pas pour autant la censure dès lors que l'interprétation des mesures du taux d'alcoolémie effectuées au moyen d'un éthylomètre constitue pour le juge une faculté et non une obligation» (ou seja, ensaiando uma tradução: se é sem razão que a sentença enuncia que as margens de erro previstas pelas disposições regulamentares em causa não se podem aplicar a uma medida efectuada aquando de um controlo de alcoolemia, apesar disso a sentença não incorre em censura porque a interpretação das medidas da taxa de alcoolemia efectuada por meio de um etilómetro constitui para o juiz uma faculdade e não uma obrigação - http://www.legifrance.gouv.fr/affichJuriJudi.do?oldAction=rechJuriJudi&idTexte=JURITEXT000020903672). Reconhece-se, por conseguinte, a admissibilidade de consideração das margens de erro legalmente previstas nas medições concretamente efectuadas, segundo o critério do julgador. É o que ocorre, aliás, com os controladores de velocidade ou cinemómetros, também sujeitos a controlo metrológico e que comportam, como acontece com qualquer instrumento de medição, margens de erro, distinguindo-se a velocidade medida, da velocidade considerada, como faz expressamente, entre nós, a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), no respectivo sítio (veja-se o quadro sobre equipamentos de fiscalização disponível em http://www.ansr.pt/Default.aspx?tabid=102&language=pt-PT). Também em França, a lei, através do Arrêté du 4 juin 2009 relatif aux cinémomètres de contrôle routier, fixou as margens de erro dos cinemómetros, a deduzir no controlo de velocidade efectuado por radar, conforme se trate de radar fixo ou instalado em veículo em movimento (http://legifrance.gouv.fr/affichTexte.do?cidTexte= JORFTEXT00002 0777051). Pese embora a existência de controlo metrológico dos controladores de velocidade, mal se compreende que se proceda à dedução de margens de erro nos resultados obtidos pelos mesmos e que se actue de forma diversa no controlo da alcoolemia, mormente quando da taxa de álcool apurada depende o preenchimento de um crime ou de um mero ilícito contra-ordenacional, o que ocorre quando a taxa se encontre na fronteira entre os dois tipos de ilícito. Na vizinha Espanha, o artigo 379.º do Código Penal previa a condução sob o efeito de drogas tóxicas, estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou de bebidas alcoólicas, sem, no entanto, fixar qualquer taxa de alcoolemia para o preenchimento do tipo de crime. A prática normalmente adoptada passava pela utilização de um etilómetro evidencial, aprovado pelo Centro Español de Metrologia que, conjugadamente com outros elementos de prova, permitisse determinar o efeito das bebidas alcoólicas e similares nas faculdades necessárias para conduzir. Em todo o caso, desde Maio de 1999 que uma taxa de álcool superior a 0,25 mg. no ar expirado ou 0,5 g/l no sangue fazia incorrer o condutor numa infracção de natureza administrativa, entendendo-se, porém, que a mera circunstância de se exceder a referida taxa de álcool não determinava a subsunção da conduta ao tipo criminal (sobre esta matéria ver Francisco Muñoz Conde, Derecho Penal – Parte Especial, tirant le blanch, 12.ª ed., pp. 653 e segs.). Através da Ley Orgánica 15/2007, de 30 de noviembre, procedeu-se à alteração do Código Penal, passando o artigo 379.º a contar com dois números, sendo o n.º2 relativo à condução de veículo com motor ou ciclomotor sob a influência de drogas tóxicas, estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou de bebidas alcoólicas, estabelecendo-se que será condenado com as penas previstas no número anterior quem conduzir com uma taxa de álcool no ar expirado superior a 0,60 mg/l ou com uma taxa de álcool no sangue superior a 1,2 g/l. Na sequência desta alteração legislativa ganhou renovada importância a questão da determinação da taxa de álcool para marcar a fronteira entre o ilícito penal e o ilícito de natureza administrativa (tendo em vista o que sobre este determinava o Real Decreto 1428/2003, de 21 de noviembre). Existindo o indispensável controlo metrológico que é exercido pelo Centro Español de Metrologia, a legislação aplicável, mais concretamente o Real Decreto 889/2006 de 21 de julio e a ORDEN ITC/3707/2006, de 22 de noviembre (esta em BOE n.º 292, de 7.12.2006, ambos disponíveis no sítio do referido Centro ou do Boletín Oficial del Estado) fixam as margens de erro dos aparelhos de medição do álcool, etilómetros, nos artigos 9.º e 15.º da referida Orden, por referência ao anexo segundo do diploma. Ainda assim, não tem deixado de colocar-se a questão da consideração dessas margens de erro nas concretas operações de medição do álcool efectuadas aos condutores, resultando das consultas efectuadas que tem sido largamente defendida, inclusivamente ao nível da Fiscalia em diversos tribunais, a correcção dos resultados das medições efectuadas pelos etilómetros através da consideração das margens de erro. Assim, para além dos utilíssimos elementos que se colhem no voto de vencido do Dr. Pedro Martins, no Acórdão da Relação de Lisboa, de 27 de Outubro de 2009 (aresto acima referido), salientamos as CONCLUSIONES DE LAS JORNADAS DE FISCALES DELEGADOS DE SEGURIDAD VIAL, que tiveram lugar nos dias 17 e 18 de Janeiro de 2008, em Madrid, em que se faz expressa menção há necessidade de valoração das margens de erro dos etilómetros e dos cinemómetros (http://aspex.juntaex.es/CONCLUSIONES_REDUCIDAS.pdf). Segundo se colhe da INSTRUCCIÓN GENERAL da Fiscalía Provincial de Las Palmas, o Fiscal General del Estado aprovou, em 7 de Março de 2008, as conclusões das referidas jornadas de Madrid (http://www.policialocallaspalmasdegrancanaria.com/carpeta/InstruccionGeneralPoliciaAbril2008.pdf). Relativamente à prova por «etilómetro», Jesús Barquín Sanz e Juan de Dios Luna del Castillo, professores titulares de Direito Penal e de Estatística e Investigação Operativa, respectivamente, da Universidade de Granada, reportando-se precisamente ao etilómetro evidencial Dräger Alcotest 7110, abordam especificamente a questão da tolerância e margens de erro na prova por etilómetro. A primeira a considerar, segundo os referidos autores, é a correspondente ao erro técnico admissível nos instrumentos de medição utilizados, conforme reconhecido pela Dirección General de Tráfico, na sua Instrucción 02/S 61, de 15 de Abril de 2002. E concluem serem favoráveis à observação das margens de erro por conferirem garantias à prova, pois graças à consideração de tais margens «se puede tener una razonable confianza en que, quien es denunciado por conducir superando los límites de alcohol, lleva verdaderamente en sangre tasas de etanol que superan com claridad lo permitido». Salientam esses autores que os erros de medição dos instrumentos técnicos não são hipóteses metafísicas nem enteléquias, mas factos comprovados, e que aos princípios e garantias do direito sancionador repugna a ideia de castigar indiscriminadamente, havendo que recorrer às margens de tolerância que, com sólido fundamento técnico, são tidas em conta no ordenamento jurídico (INGESTA MODERADA DE ALCOHOL Y PRUEBA DEL ETILÓMETRO - Evolución de la concentración de etanol en aire espirado tras consumo moderado de alcohol siguiendo el rito social; factores asociados con esta evolución y con lapercepción de mareo y de incapacidad de conducción tras dicho consumo, Revista Electrónica de Ciencia Penal y Criminología ARTÍCULOS, RECPC 07-15 (2005), http://criminet.ugr.es/recpc). 6. Revertendo ao caso concreto em apreço, temos que o tribunal decidiu que à taxa de alcoolemia no sangue registada pelo alcoolímetro correspondia a taxa de, pelo menos, 1,57 g/l, uma vez deduzido o valor de erro máximo admissível. Desde já adiantamos que não nos parece que a questão se resolva com recurso ao regime do artigo 344.º, n.º1 e 2, do C.P.P., no que concerne à confissão integral e sem reservas, porquanto afigura-se-nos que tal confissão não tem a virtualidade de abranger a TAS indicada no talão do alcoolímetro. Nos termos do disposto no artigo 140.º, n.º 2, do C.P.P., «Às declarações do arguido é correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 128.º e 138.º, salvo quando a lei dispuser de forma diferente», consignando-se no n.º 1, do artigo 128.º: «A testemunha é inquirida sobre factos de que possua conhecimento directo e que constituam objecto de prova.» Como se realça no Acórdão desta Relação, de 26 de Novembro de 2008, Proc. n.º 0812537, da conjugação destes dois normativos ressalta que, quer as declarações do arguido, quer o depoimento das testemunhas, só assumem relevância em relação aos factos que sejam do conhecimento daquele que os relata, sendo que outro entendimento é susceptível de conduzir a que a verdade material, cuja descoberta o processo penal visa alcançar, pudesse ser alicerçada na confissão de factos não verdadeiros ou cuja veracidade o arguido não tivesse capacidade para afirmar por ultrapassarem aquilo que é capaz de apreender. Em consequência, «os limites da capacidade cognitiva individual serão também os limites daquilo que, de forma juridicamente relevante, pode ser declarado ou deposto – e, portanto, também confessado. A contrario, tudo o que esteja para além desses limites ou constitui declaração ou depoimento irrelevante, não podendo valer mais do que uma mera opinião, ou constitui raciocínio lógico-dedutivo que, se pertinente, o tribunal também terá de fazer e de forma autónoma». Dito de outro modo: só se pode confessar o que, efectivamente, é susceptível de ser confessado. O arguido pode confessar que ingeriu vários copos de vinho ou outras bebidas alcoólicas, que estava convencido de que, se fiscalizado, acusaria uma taxa muito superior ao legalmente permitido e que tendo feito o teste do álcool acusou uma taxa de x g/l de álcool no sangue. Mas já não parece que possa confessar que conduzia com uma determinada taxa de álcool no sangue, pois falta-lhe, para o efeito, razão de ciência A prova da concreta taxa de álcool no sangue, nos termos legais, só pode ser feita através de teste no ar expirado ou por meio de análise ao sangue, pelo que não se vislumbra que possa ser provada por meio de confissão ou por depoimento. Do que se extrai que o arguido podia ter efectivamente conhecimento (porque compreendidos tais factos nos limites da sua capacidade cognitiva) de que estava a conduzir um veículo automóvel pesado de mercadorias na via pública, depois de ter ingerido bebidas alcoólicas em quantidades que lhe podiam determinar uma TAS igual ou superior a 1,2 g/l, e bem assim que a taxa de alcoolemia no sangue, registada no teste de detecção e quantificação de álcool no sangue, por meio de analisador quantitativo, era de 1,70 gr./l. Contudo, a circunstância de o alcoolímetro indicar uma certa TAS não significa que quem foi submetido ao teste necessariamente seja portador dessa exacta TAS e, novamente prosseguindo na esteira do citado Acórdão de 26 de Novembro de 2008, «ultrapassando obviamente as capacidades cognitivas do arguido, como de qualquer ser humano, a determinação da concreta TAS de que era portador – resultado que só é alcançável, pelo menos com o rigor exigível, através de exame realizado mediante a utilização de aparelho próprio para o efeito – não podia ele validamente confessar um facto que não podia conhecer». Este entendimento não põe em causa a prova resultante do instrumento de medição, designadamente a fé sobre os factos presenciados que o artigo 170.º do Código da Estrada reconhece ao auto de notícia e «aos elementos de prova obtidos através de aparelhos ou instrumentos aprovados nos termos legais e regulamentares.» Embora se trate de um caso de prova (pesquisa no ar expirado) a fazer necessariamente através de utilização de aparelho próprio para o efeito, tem-se debatido se o analisador quantitativo visa obter prova documental, uma vez que o resultado consubstancia uma «notação corporizada em escrito ou qualquer outro meio técnico, nos termos da lei penal» - artigo 164.º, n.º 1, do C.P.P., e artigos 255.º, alínea b), e 258.º, do Código Penal, – e não prova pericial porque, para este efeito, não tem lugar uma percepção ou apreciação de factos que exijam «especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos» - artigo 151.º do C.P.P. (é o entendimento perfilhado no Ac. da Relação de Lisboa, de 7 de Maio de 2008, no proc. n.º 2199/2008-3; também no sentido de que não se trata de prova pericial, Paula Melo, Condução sob influência do álcool – Apreciação dos meios de prova, Maia Jurídica, Revista de Direito, Ano II, n.º2, Julho-Dezembro de 2004). Diversamente, há quem sustente que os «métodos alcoolímetros consistem em actos de prova preconstituída, de carácter pericial» (Benjamim Rodrigues, Da prova penal, Tomo I, Coimbra 2008, p. 117). Em Espanha, relativamente à prova da taxa de álcool por alcoolímetro/etilómetro a questão tem sido de há muito suscitada, ora sendo entendida como prova secundária em relação à prova testemunhal que era prestada pelos agentes autuantes (sobretudo quando o tipo legal de crime não estipulava uma taxa concreta, como já acima se assinalou), ora definida como prova pericial preconstituída “lato sensu” (sobre esta questão ver, por exemplo, o texto NUEVA DOCTRINA JURISPRUDENCIAL DEL TRIBUNAL SUPREMO Y DEL TRIBUNAL CONSTITUCIONAL EN MATERIA DE PRUEBA EN EL PROCESO PENAL, Sevilla, 6 y 7 Mayo 2009, http://www juntadeandalucia.es/justicia/fiscales/cda/views/channel/adri_fis_mostrar_contenidos_canal_subcanales/0,21452, 12351747_52678719,00.html) A verdade, porém, é que em qualquer caso, terá de ser sempre no respeito dos próprios limites dos equipamentos em causa – legalmente previstos – que a prova deve ser apreciada. Ora, como já se assinalou, ainda que a margem de erro legalmente admissível seja levada em conta no momento da calibração do aparelho, tal facto apenas garante que o aparelho em concreto está apto a efectuar medições e que os resultados obtidos sempre se situarão dentro dos limites definidos por aquelas margens de erro. Em termos gerais, para mais sem que conste a data da última verificação metrológica, afigura-se-nos inteiramente justificada a decisão do tribunal recorrido, que atendeu ao erro máximo admissível, deduzindo-o ao valor registado no talão emitido pelo alcoolímetro, o que se impõe desde logo por força do princípio in dubio pro reo. Estamos perante uma incerteza balizada por normas do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, resultante das margens de erro toleradas, que o tribunal não pode ignorar sob pena de, uma vez desconsideradas, poderem levar à condenação do arguido por crime sem que a taxa real de álcool chegue a atingir o limiar que define o ilícito criminal ou, em todo o caso, com efeitos desfavoráveis ao nível da determinação da sanção. Do que se conclui no sentido da inexistência de qualquer erro notório na apreciação da prova que justifique a alteração da decisão recorrida. 7. O recorrente circunscreve, essencialmente, a matéria do recurso à questão da sentença recorrida ter considerado, na fixação da taxa de alcoolemia, que havia que deduzir o valor do erro máximo admissível. Realmente, conformando-se com a qualificação jurídico-criminal dos factos, o recorrente limita-se a pedir que à condenação do arguido se somem mais 5 dias de multa, considerando adequada a sua razão diária e bem assim a pena acessória imposta. Assim, a sua discordância em relação à taxa de alcoolemia considerada na sentença repercute-se, minimamente, na parte dispositiva da sentença, que só é colocada em causa por uma diferença de apenas 5 dias de multa. Tendo em vista que os tribunais não têm por vocação discutir questões académicas, para as quais não se vislumbre qualquer interesse actual e concreto, não deixamos de nos interrogar sobre se a discordância quanto à fundamentação da sentença, com tão mínima dissidência relativamente à parte decisória, não estará próximo da fronteira da falta de interesse em agir. Em todo o caso, não há que alterar, pelas razões supra explanadas, a matéria de facto e, igualmente, o decidido quanto à pena, devendo o recurso improceder na totalidade. III – Dispositivo Em face do exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal desta Relação em julgar improcedente o recurso. Sem tributação. Porto, 20 de Janeiro de 2010 (Consigna-se que o acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo primeiro signatário – artigo 94.º, n.º2, do C.P.P.) Jorge Manuel Baptista Gonçalves Adelina da Conceição Cardoso Barradas de Oliveira
RECURSO N.º 24/09.2GAMAI.P1 Tribunal Judicial da Maia - ..º Juízo Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I – Relatório 1. No processo sumário n.º 24/09.2GAMAI, do ..º Juízo de competência criminal do Tribunal Judicial da Maia, o arguido B………., melhor identificado nos autos, foi submetido a julgamento e condenado, pela autoria de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez que lhe havia sido imputado, p. e p. pelos artigos 292.º, n.º1, 294.º n.º 1 e 69.º, n.º1, al. a), todos do Código Penal, na pena de 70 dias de multa, à taxa diária de 6,00€, num total de 420,00€, e bem assim na pena acessória de proibição de conduzir quaisquer veículos com motor pelo período de 4 meses. 2. Inconformado, o Ministério Público recorreu da sentença absolutória, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): I) Consta dos autos que efectuado ao arguido teste quantitativo de pesquisa de álcool no sangue, através de ar expirado, no aparelho Drager Alcotest 7110MKIII p, acusou uma taxa de 1.70/g/l. II) A M.ma Juíza “a quo” efectuou desconto naquela taxa com base em “margem de erro admissível nos alcoolímetros”. III) In casu, não se pode fazer correcção na TAS por aplicação das margens de erro. IV) - O exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito. V) - Em face do constante quer do regime do Decreto Regulamentar n.º 24/98 de 30 de Outubro, da Portaria n.º 748/94 de 13 de Agosto, da Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio e da Portaria n.º 1556/2007 de 10 de Dezembro, a solução para o caso concreto, na nossa modesta opinião é a mesma, ou seja, não podia no caso concreto ser efectuado tal desconto. VI) - De facto, os erros a que se alude no artigo 6 da Portaria n.º 748/94 e no art. 8 da Portaria n.º 1556/2007 de 10 de Dezembro, são considerados nas operações de aprovação e de verificação dos aparelhos em apreço, efectuados pelo Instituto Português da Qualidade, sendo de ter em conta o referido no artigo 10.º desta última Portaria quanto à validade dos aparelhos que tenham sido autorizados ao abrigo de legislação anterior à entrada em vigor da mesma. VII) - Ao valor que consta dos talões emitidos por aquele alcoolímetro, não têm de se fazer desconto, uma vez que os níveis máximos de erro já foram tidos em consideração, na aprovação, verificações e ensaios a que aquele é sujeito. VIII) - Ao fazê-lo a Douta Decisão padece do vício de erro notório na apreciação da prova, cfr, artigo 410.º, n.º2, al. c) do C.P.P. IX) - Assim atento o resultante do auto de notícia e elementos de prova, que foram vertidos na acusação e em função da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, dentre a qual o documento de fls. 10, a confissão do arguido e a não pretensão de realização de contra-prova, o Tribunal não podia deixar de decidir de acordo com aquela, e dever considerar a taxa de 1, 70 g/l, ou seja, o facto dado como provado está em desconformidade com o que realmente se provou. X) - Não se reportando, em termos de facto provado ao valor que resulta do exame, decidiu contra Direito. XI) - Da Sentença recorrida não se verificam os pressupostos de aplicação do principio in dubio pro reo, dado que da prova produzida não resultou qualquer elemento que pudesse causar a dúvida razoável sobre a taxa detectada e colocasse em causa o valor registado no talão de fls. 10. Da fundamentação de facto não consta que algum elemento de prova tenha infirmando ou suscitado alguma dúvida em relação ao valor registado. XII) - Deve a al. b) dos factos provados ter a seguinte redacção b) - Na ocasião acima referida era portador de uma taxa de álcool no sangue de 1,70 g/l. XIII) - Em face a TAS de 1, 70 g/l, consideramos ser como justa nos termos conjugados dos artigos 40.º e 71.º do Código Penal uma pena multa não inferior a 75 dias, mantendo-se quanto a nós adequada a proibição de conduzir quaisquer veículos com motor por 4 meses. XIV) - Ao não considerar para efeito de pena a aplicar a TAS de 1, 70 g/l e considerar, ao invés, a TAS 1,57 g/l, a M Juíza "a quo" violou os artigos 40.º, n.º 1 e n.º 2, 71.º, n.º l e 2, 77.º, n.º 1 e 2, 292.º, n.º 1 e 294.º, n.º l, do Código Penal, artigo 410.º, n.º 2, al. c) do C.P.P., artigos 153.º, n.º 1 e 158.º, n.º 1, al) e b) e 170.º n.º 3 e 4 do Código da Estrada e Decreto Regulamentar n.º 24/98 de 30 de Outubro, o Decreto Regulamentar n.º 24/98 de 30 de Outubro, a Portaria n.º 1006/98 de 30 de Novembro, e, presentemente, a Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio e a Portaria n.º 902-B/2007, de 13 de Agosto e Portaria n.º 1556/07 de 10 de Dezembro e o princípio do in dubio pro reo. Nestes termos e nos demais de direito, que os Venerandos Desembargadores do Tribunal da Relação do Porto se dignarão suprir, revogando-se parcialmente a Douta Sentença, dando-se como provado que o arguido era portador de uma taxa de álcool no sangue de 1,70 g/l. e consequentemente condenando-o numa pena de multa não inferior a 75 dias, por crime de condução de veículo em estado de embriaguez agravado, far-se-á a já costumada justiça. 3. O arguido não respondeu ao recurso. 4. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido da procedência do recurso. 5. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º2, do Código de Processo Penal (diploma que passaremos a designar de C.P.P.), foram colhidos os vistos, após o que foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.º3, do mesmo diploma. II – Fundamentação 1. Conforme jurisprudência constante e pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (entre muitos, os Acs. do S.T.J., de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242; de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271). Assim, atento o teor das conclusões, a questão que importa apreciar e decidir consiste em saber se a sentença recorrida enferma do vício do erro notório na apreciação da prova, por ser inadmissível descontar à concreta TAS do arguido, aferida pelo alcoolímetro, o valor do erro máximo admissível previsto no Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros; e bem assim se, alterada a matéria de facto quanto à TAS, o arguido deverá ser condenado em pena não inferior a 75 dias de multa. 2. Da sentença recorrida 2.1. O tribunal a quo considerou provados os seguintes factos: a) No dia 05.Janeiro.2009, pelas 22h 40m o arguido conduziu o automóvel pesado de mercadorias de matrícula ..-..-RZ, pela Rua ………., Maia b) Na ocasião acima referida era portador de uma taxa de álcool no sangue de pelo menos 1,57 g/l. c) Actuou de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que conduzia veículo por via de circulação terrestre, afecta ao trânsito público, tendo ingerido bebidas alcoólicas, e querendo fazê-lo. d) O arguido é motorista de pesados, e no dia referido em a) realizara, no exercício da sua profissão e ao volante do ..-..-RZ, um transporte de mercadoria, que continuaria no dia seguinte. e) O arguido parara para jantar e pernoitar, e depois do jantar decidira estacionar o seu camião noutro local, mais seguro, a cerca de 500 metros do local onde o parara anteriormente, por forma a seguir viagem no dia seguinte. f) Foi nesse percurso que lhe foi detectada a taxa de alcoolémia referida em b). g) O arguido aufere 545 € mensais, acrescidos de suplementos de viagens. h) É divorciado mas vive em união de facto e a sua companheira aufere 1000 € mensais como encarregada de refeitório. i) É pai de 2 filhos, um dos quais vive com a respectiva mãe, não contribuindo o arguido para o seu sustento. O outro vive com o casal. j) Pagam 360 € mensais em amortização de empréstimo para compra de casa e 280 € mensais em amortização de empréstimo referente a uma segunda habitação. k) Confessou os factos descritos na acusação e declarou-se arrependido. l) O arguido não tem antecedentes criminais. 2.2. Consignou-se, a propósito dos factos não provados: «Com pertinência ao objecto de processo não se provaram quaisquer outros factos para além ou em contrário dos constantes no ponto anterior, designadamente que o arguido fosse portador de uma taxa de 1,70 g/l de álcool no sangue.» 2.2. O tribunal recorrido fundamentou a sua convicção nos seguintes termos (transcrição): «O tribunal fundou a sua convicção nas declarações do arguido, que admitiu ter conduzido a viatura depois de ter ingerido bebidas alcoólicas, ter efectuado o teste de pesquisa de álcool no sangue e ter o aparelho Drager 7110 MKIII P acusado taxa de 1,70 g/l., o que resulta também da análise do talão de fls. 10. O arguido relatou depois o que consta nas alíneas d) e j). No que diz respeito à quantidade de álcool no sangue de que o arguido era portador, o tribunal considera que a medição efectuada no Drager 7110 MKIII P está sujeita a uma margem de erro, conforme a menção constante a fls. 18 do “manual de operações” do Drager 7110, divulgado pela sociedade “Tecniquitel”que introduziu tal aparelho em Portugal. O uso do dito aparelho no território nacional, com a característica descrita, foi validado através de “despacho de aprovação de modelo”, publicado a 25.09.1996 e em 05.03.1998 (referente a alterações) e emitido pelo Instituto Português da Qualidade, entidade com competência para o efeito, nos termos do estatuído pelo Regulamento de Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, aprovado pela Portaria 748/94, publicada no DR de 13.08.1994, na qual se definiam os requisitos a que tinham que obedecer os aparelhos destinados a efectuar as medições de álcool (sendo certo que tal Portaria se manteve em vigor até 11.12.2007, já que a ela aludia o Decreto Regulamentar 24/98, de 30.10 e aludia a actual Lei 18/2007, de 17.05, no seu art.º 14 n.º 2). Em tal Portaria aludia-se, de forma clara, às margens de erros admissíveis nos alcoolímetros, que eram os definidos pela norma NF X-20-701, da Organização Internacional de Metrologia Legal. A Portaria 748/94 foi expressamente revogada pela Portaria 1556/2007, de 10.12.2007, que aprovou o novo Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, e na qual se continua a referir o Instituto Português da Qualidade como entidade competente para efectuar o controlo metrológico dos alcoolímetros. Nesta nova Portaria continua a aludir-se, de forma expressa no seu art.º 8.º, às margens de erros admissíveis nos alcoolímetros, que são os definidos no anexo da própria Portaria. Assim sendo, não resta senão concluir, como defendeu o arguido, que o aparelho usado para medir o nível de álcool no sangue ao arguido nestes autos fornece um valor não totalmente rigoroso, porque sujeito a erro, que todavia se encontra compreendido dentro dos valores máximos legalmente admissíveis (motivo pelo qual o dito aparelho foi aprovado em Portugal e o seu uso continua a ser legal – cfr. art.º 10 da Portaria 1556/2007). A aplicação das apontadas margens de erro ao valor encontrado produz um intervalo de valores dentro do qual se há-de encontrar o valor de álcool no sangue de que o arguido era realmente portador (neste sentido, entre outros, Ac. TRP de 19.12.2007, relatado pelo Sr. Desembargador Pinto Monteiro, Ac. TRP de 02.04.2008, relatado pelo Sr. Desembargador José Carreto, e Ac. Tribunal da Relação do Porto de 07.05.2008, relatado pelo Sr. Desembargador Luís Teixeira, todos em www.dgsi.pt). A DGV divulgou mesmo uma tabela (que foi remetida aos tribunais através da Circular 101/2006 do Conselho Superior da Magistratura) na qual se faz aplicação prática do acima referido, encontrando-se previsto para cada valor de álcool no sangue, obtido através do aparelho Drager 7110, o valor mínimo a que tal há-de corresponder, ou seja, o valor de álcool no sangue de que, pelo menos, o sujeito ao teste há-de ser portador, deduzida a margem de erro máximo aplicável. De acordo com tal tabela, que se tem como boa, a uma taxa de álcool no sangue de 1,70 g/l corresponde, pelo menos o valor de 1,57 g/l, que é o valor que se considera nestes autos, atento até o princípio in dubio por reo, sendo certo que em audiência não se vislumbrou a possibilidade de produzir qualquer meio de prova adicional com vista a sanar esta questão e se entende, na esteira nomeadamente do Ac. TRP de 10.09.2008 (recurso 3109/08-4) e de 21.05.2008 (recurso1716/08) que a confissão produzida em audiência se reporta tão só à condução, realização do teste e valor que este indicou e não à taxa de álcool no sangue de que o arguido era concreta e efectivamente portador, facto que não está abrangido pelo seu conhecimento pessoal, antes pressupõe um juízo técnico. No que se reporta às condições de vida e antecedentes criminais, o tribunal valorou as declarações do arguido e o teor do CRC junto aos autos Os descritos meios de prova, analisados à luz das regras de experiência, serviram para formar a convicção supra expressa.» 3. Apreciando 1. Dispõe o artigo 428.º, n.º 1, do C.P.P., que os Tribunais da Relação conhecem de facto e de direito. Porém, o seu poder de cognição encontra-se delimitado pelas conclusões da motivação do recorrente. Resulta da análise da motivação que o recorrente insurge-se contra a decisão da matéria de facto na parte em que se deu como provada a taxa de álcool no sangue de pelo menos 1,57 g/l, por aplicação do desconto da “margem de erro” ao valor indicado no alcoolímetro. A matéria de facto pode ser sindicada por duas vias: no âmbito, mais restrito, dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º2, do C.P.P., no que se convencionou chamar de “revista alargada”; ou através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412.º, n.º3, 4 e 6, do mesmo diploma. No primeiro caso, estamos perante a arguição dos vícios decisórios previstos nas diversas alíneas do n.º 2 do referido artigo 410.º, cuja indagação, como resulta do preceito, tem que resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos, para a fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento (cfr. Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 10. ª ed., 729, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, Verbo, 2ª ed., 339 e Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6.ª ed., 77 e ss.). No segundo caso, a apreciação não se restringe ao texto da decisão, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada) produzida em audiência, mas sempre dentro dos limites fornecidos pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus de especificação imposto pelos n.º 3 e 4 do art. 412.º do C.P. Penal. No recurso em análise, invoca-se a existência de erro notório na apreciação da prova, vício decisório previsto no artigo 410.º, n.º2, alínea c), do C.P.P., que se verifica quando um homem médio, perante o teor da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta de que o tribunal violou as regras da experiência ou de que efectuou uma apreciação manifestamente incorrecta, desadequada, baseada em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios. O erro notório também se verifica quando se violam as regras sobre prova vinculada ou das leges artis (sobre este vício, e os demais vícios decisórios previsto no artigo 410.º, n.º2, todos de conhecimento oficioso, ver Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos em processo penal, 6.ª edição, pp.67 e seguintes). 2. A questão colocada no recurso em apreço tem sido largamente debatida na jurisprudência dos tribunais superiores e traduz-se em saber da admissibilidade do desconto na concreta TAS (taxa de álcool no sangue) aferida pelo alcoolímetro que procedeu à medição do álcool no sangue do recorrido (por conversão do valor no ar expirado), do valor do erro máximo admissível (EMA) previsto no Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, desconto que, caso se verifique, consubstanciará, na tese do recorrente, o vício decisório do erro notório na apreciação da prova. Tem sido questionado se, para o preenchimento do elemento do tipo objectivo do crime previsto no artigo 292.º do Código Penal que consiste na condução de veículos, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l, deve ser considerada a taxa de alcoolemia que foi registada pelo alcoolímetro utilizado ou se o tribunal deve antes ter em conta a taxa resultante da subtracção da margem de erro máximo admissível ao valor indicado no aparelho. No sentido de que não deve ser efectuado o desconto do valor do “erro máximo admissível” na TAS registada no alcoolímetro que procedeu à medição, pronunciaram-se, entre outros: os Acs. da R. de Coimbra de 30/01/08, Proc. n.º 91/07.3PANZN.C1, de 11/11/08, Proc. n.º 62/08.2GBPNH.C1 e de 10/12/08, Proc. n.º 17/07.4PANZR; Acs. da R. de Lisboa, de 03/10/07, Proc. n.º 4223/07-3, de 20/02/08, Proc. n.º 183/2008-3 e de 27/10/2009, Proc. n.º 54/07.9PTALM.L1-5; Acs. da R. do Porto de 2/07/2008, Proc. n.º 0813031 e de 14/01/09, Proc. n.º 0815205, todos em www.dgsi.pt.). O entendimento oposto sustenta que há lugar à dedução do valor do “erro máximo admissível” à taxa registada no alcoolímetro, tendo-se pronunciado nesse sentido, entre outros: os Acs. da R. do Porto, de 02/04/08, Proc. n.º 0810479, de 07/05/08, Proc. n.º 0810922, de 26/11/08, Proc. n.º 0812537; Acs. da R. de Coimbra de 09/01/08, Proc. n.º 15/07.1PAPBL-C1 e Proc. n.º 426/04.6TSTR.C1; Ac. da R. Guimarães de 26/02/07, Proc. n.º 2602/06.2; Ac. da R. de Lisboa, de 07/05/08, Proc. n.º 2199/08-3 e bem assim o voto de vencido do Desembargador João Latas no Ac. da R. Évora de 01/07/08, Proc. nº 2699/07-1, todos em www.dgsi.pt.). Vejamos, pois, seguindo de perto o que sobre a questão já explanámos no Recurso n.º 291/09.1PAVNF.P1 3. De harmonia com o disposto no artigo 81.º do Código da Estrada (diploma que foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio, com as alterações que sucessivamente lhe foram introduzidas pelos Decretos-Leis n.º 2/98, de 3 de Janeiro, 265-A/2001, de 28 de Setembro, pela Lei n.º 20/2002, de 21 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 44/2005, de 23 de Fevereiro e pela Lei n.º 78/2009, de 13 de Agosto), é proibido conduzir sob influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas, considerando-se sob influência de álcool o condutor «que apresente uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,5 g/l ou que, após exame realizado nos termos previstos no presente Código e legislação complementar, seja como tal considerado em relatório médico» (n.º1 e 2 do referido preceito legal). Nos termos do n.º3 do mencionado artigo, a conversão dos valores do teor de álcool no ar expirado (TAE) em teor de álcool no sangue (TAS) é baseada no princípio de que 1 mg de álcool por litro de ar expirado é equivalente a 2,3 g de álcool por litro de sangue. A condução com uma taxa igual ou superior a 0,5g/l e inferior a 0,8 g/l constitui contra-ordenação sancionada com coima de €250,00 a € 1250,00, sendo a condução com uma taxa igual ou superior a 0,8 g/l e inferior a 1,2 g/l sancionada com coima de € 500,00 a €2500,00. Por sua vez, no artigo 292.º, n.º1, do Código Penal, dispõe-se: «Quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1, 2g/l, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.» O preenchimento do tipo objectivo de crime impõe a determinação da concreta taxa de álcool no sangue de que o condutor é portador, já que só a condução com taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l integra a referida previsão legal. Os artigos 152.º e seguintes do Código da Estrada regem sobre o procedimento para a fiscalização da condução sob influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas, determinando o respectivo artigo 158.º, n.º1, que são fixados em regulamento, além do mais: o tipo de material a utilizar na fiscalização e nos exames laboratoriais para determinação dos estados de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas; os métodos a utilizar para a determinação do doseamento de álcool ou de substâncias psicotrópicas no sangue. A matéria da fiscalização da condução sob o efeito do álcool foi objecto de regulamentação pelo Decreto Regulamentar n.º 24/98, de 30 de Outubro, diploma que distinguia entre aparelhos analisadores de medição “qualitativos” e os aparelhos “quantitativos” - os primeiros com meras funções de despistagem/triagem, após o que os condutores seriam submetidos aos analisadores "quantitativos" ou a exame hematológico - cfr. art. 1.º, n.º 1, do mencionado diploma. O referido Decreto Regulamentar n.º 24/98, de 30 de Outubro, foi revogado pela Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio, que aprovou o Novo Regulamento da Fiscalização da Condução sob o Efeito do Álcool, não tendo procedido, todavia a alterações relevantes para os efeitos que ora interessam. No artigo 1.º, do Regulamento de Fiscalização, enunciam-se os meios de detecção e medição da taxa de álcool no sangue, designadamente, analisadores qualitativos e quantitativos, estes por teste no ar expirado ou análise de sangue. No artigo 14.º prescreve-se que nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só podem ser utilizados aparelhos que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, exigindo-se, previamente a esta aprovação, a existência de homologação de modelo, da competência do Instituto Português da Qualidade, de acordo com os termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros. No caso dos autos não está em causa a utilização de um aparelho de medição “qualitativo”, mas sim um aparelho de medição “quantitativo” - aparelho Drager mod.7110MKIII P, aprovado pela D.G.V. conforme despacho nº.12594/07, de 16-3. Como aparelho de medição quantitativo, tal instrumento está sujeito a operações de controlo metrológico. A Portaria n.º 748/94, de 3 de Outubro, aprovou o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, o qual nos termos do seu artigo 3.º, definia “os erros máximos admissíveis para a Primeira Verificação (PV) e Verificação Periódica (VP) em teor de álcool expirado (TAE) e convertido em Teor de Álcool no Sangue (TAS)” em conformidade com a tabela anexa. A Portaria n.º 748/94 foi revogada pela Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro (art. 2.º), que procedeu à aprovação do novo regulamento a que deve obedecer o controlo metrológico dos alcoolímetros, estabelecendo o respectivo n.º1 que o regulamento aplica-se «a alcoolímetros quantitativos ou analisadores quantitativos.» Por outro lado, o artigo 5.º do mesmo Regulamento (quer o primitivo quer o novo) estabelece: «O controlo metrológico dos alcoolímetros é da competência do Instituto Português da Qualidade, I.P. - IPQ e compreende as seguintes operações: a) Aprovação do modelo; b) Primeira verificação; c) Verificação periódica; d) Verificação extraordinária». O artigo 8.º do referido Regulamento, sob a epígrafe “Erros Máximos Admissíveis”, estabelece: «Os erros máximos admissíveis (EMA), variáveis em função do teor de álcool no ar expirado (TAE) são os constantes do quadro anexo ao presente diploma e que dele faz parte integrante.» O n.º 2, do artigo 9º, prescreve, por seu turno: «Os registos da medição devem conter, entre outros elementos, a marca, o modelo e o número de série do alcoolímetro assim como a data da última verificação metrológica.» Finalmente, na Portaria n.º 902-B/2007, de 13 de Agosto, especificam-se as características técnicas, gerais e físicas, a que devem obedecer os analisadores quantitativos, entre elas, que os referidos instrumentos devem «cumprir os requisitos metrológicos e técnicos definidos no regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros» e «usar a unidade de leitura em gramas de álcool por litro de sangue (TAS) segundo o factor fixado no nº 3 do artigo 81º, do Código da Estrada». 4. Para quem perfilha o entendimento de que é inadmissível a subtracção da margem de EMA ao valor indicado no aparelho utilizado numa medição concreta, a previsão da referida margem reporta-se tão-somente à Aprovação e às Verificações periódicas subsequentes realizadas pelo IPQ como condição da homologação e aprovação dos aparelhos de medição. A Metrologia Legal é o ramo da Metrologia, que trata das exigências legais, técnicas e administrativas, relativas às unidades de medida, aos métodos de medição, aos instrumentos de medição e às medidas materializadas, fornecendo um quadro destinado a conferir às medições um nível básico de segurança, que passa nomeadamente por um sistema de unidade definida, estrita verificação e calibração dos instrumentos de medição e definição de um conjunto de erros máximos admissíveis. Sobre esta temática e em abono do supra referido entendimento – que sustenta a não consideração da margem de EMA -, tem sido largamente citada a comunicação apresentada por Maria do Céu Ferreira e António Cruz no 2.º Encontro Nacional da Sociedade Portuguesa de Metrologia, em 17 de Novembro de 2006, com o título CONTROLO METROLOGICO DE ALCOOLÍMETROS NO INSTITUTO PORTUGUÊS DA QUALIDADE. Nessa comunicação podemos ler: «A definição, através da Portaria n.º 748/94, de determinados erros máximos admissíveis, quer para a Aprovação de Modelo e Primeira Verificação, quer para a Verificação Periódica, visa definir barreiras limite dentro das quais as indicações dos instrumentos de medição, obtidas nas condições estipuladas de funcionamento, são correctas. Ou seja, um alcoolímetro de modelo aprovado e com verificação válida, utilizado nas condições normais, fornece indicações válidas e fiáveis para os fins legais.» Mais adiante: «Os EMA são limites definidos convencionalmente em função não só das características dos instrumentos, como da finalidade para que são usados. Ou seja, tais valores limite, para mais e para menos, não representam valores reais de erro, numa qualquer medição concreta, mas um intervalo dentro do qual, com toda a certeza (uma vez respeitados os procedimentos de medição), o valor da indicação se encontra. É sabido que a qualquer resultado de medição está sempre associada uma incerteza de medição, uma vez que não existem instrumentos de medição absolutamente exactos. Esta incerteza de medição é avaliada no acto da aprovação de modelo por forma a averiguar se o instrumento durante a sua vida útil possui características construtivas, por forma a manter as qualidades metrológicas regulamentares, nomeadamente fornecer indicações dentro dos erros máximos admissíveis prescritos no respectivo regulamento.» (www.spmet.pt/comunicacoes_2_encontro/Alcoolimetros_MCFerreira.pdf) Em termos conclusivos, dizem os referidos autores: «O valor da indicação do instrumento é em cada situação, o mais correcto. O eventual erro da indicação, nesse momento, nessa operação, com o operador que a tiver efectuado, nas circunstâncias de ambiente locais, quaisquer que tenham sido outros factores de influência externos ou contaminantes do ar expirado, seja ele positivo ou negativo, está com toda a probabilidade contido nos limites do EMA.» Do teor desta comunicação não logramos extrair, como conclusão, que o tribunal não possa fazer uso das margens de erro dos aparelhos de medição para reduzir tanto quanto possível a divergência entre o resultado do exame e a realidade. Ainda que na referida comunicação se diga que os EMA não representam valores reais de erro, certo é que se realça que tais valores representam um intervalo dentro do qual, com toda a certeza, o valor da indicação se encontra. Admitindo que a margem de erro legalmente admissível é tida em conta no momento da calibração do aparelho, tal facto apenas garante que o aparelho em concreto está apto a efectuar medições e que os resultados obtidos sempre se situarão dentro dos limites daquelas margens de erro. Por outras palavras, como se assinala no Acórdão da Relação de Lisboa, de 7 de Maio de 2008 (Proc. n.º 2199/08-3), se o aparelho se encontra aprovado, se foi sujeito à verificação periódica e está a funcionar regularmente, o tribunal tem todas as razões para ter por seguro, para além de qualquer dúvida razoável, que o examinado tinha a taxa de álcool que resulta da subtracção da margem de erro máximo admissível ao valor indicado pelo aparelho. Diz-se nesse aresto (excluem-se as menções a notas de rodapé): «Embora nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só possam ser utilizados analisadores que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, sendo a aprovação precedida de homologação de modelo, a efectuar pelo Instituto Português de Qualidade, nos termos do Regulamento do Controlo Metrológico de Alcoolímetros (n.º 1 e 2 do artigo 14º), regulamento esse que impõe o respeito pela Recomendação n.º 126 da Organização Internacional da Metrologia Legal (OIML R 126), os valores determinados pelos aparelhos não são completamente precisos, havendo sempre uma determinada margem de erro que não obsta à aprovação do modelo e à certificação de cada aparelho na primeira verificação e nas verificações sucessivas. Daí que, como se afirma no ponto 5 da Recomendação n.º 126 da OIML, mesmo com um aparelho aprovado e sujeito a verificação periódica, exista ou possa existir em cada medição individual uma certa imprecisão. Se em 95% das medições essa imprecisão não deve ultrapassar os valores referidos no ponto 5.2.2 da OIML R 126, os quais são claramente inferiores à margem de erro admissível do aparelho, nas restantes medições a imprecisão pode ser superior. Estando a aprovação do modelo e a certificação de cada aparelho na primeira verificação e nas verificações seguintes sujeitas à não ultrapassagem da margem de erro admissível fixada, consoante o caso, nos pontos 5.1.1 a 5.1.3 da OIML R 126 e no quadro anexo à Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro, o tribunal não pode estar seguro de que o condutor fiscalizado, em cada caso concreto, tenha conduzido o veículo com a exacta taxa de álcool indicada pelo aparelho.» No caso em apreço, acresce que, ao contrário do exigido pelo n.º 2, do artigo 9.º, da Portaria n.º 1556/2007, de 10/12, o registo da medição nem sequer contém a data da última verificação metrológica, como se infere da documentação para a qual remete a motivação da decisão sobre a matéria de facto. 5. Questões idênticas têm sido colocadas noutros países, a propósito da medição da taxa de alcoolemia relevante para fins sancionatórios. Nos E.U.A., as questões colocadas pelos testes de «DUI» (driving under the influence) ou «DWI» (driving while intoxicated), realizados através dos «breath tests», por não medirem directamente a taxa de álcool no sangue, mas antes o fazerem através da conversão de valores obtidos no ar expirado por meio de instrumentos de medição que comportam margens de erro, constituem um tema de eleição em disputas judiciárias com origem na condução em estado de embriaguez, com tratamento diverso conforme o Estado em que ocorram. Em França, o Décret n.º 85-1519 du 31 décembre 1985 (consultar em http://www.legifrance.gouv.fr.), relativo aos instrumentos destinados à medição da concentração de álcool no ar expirado, estabeleceu, no seu artigo 3.º, os seguintes erros máximos tolerados «sur la mesure de la concentration d'alcool éthylique, en plus ou en moins, sur les instruments en service»: «- 0,032 milligramme par litre, pour toute concentration inférieure à 0,40 milligramme par litre ; - 8 centièmes, en valeur relative, pour toute concentration supérieure ou égale à 0,40 milligramme par litre et inférieure à 1 milligramme par litre ; - 15 centièmes, en valeur relative, pour toute concentration supérieure ou égale à 1 milligramme par litre et inférieure à 2 milligrammes par litre ; - 30 centièmes, en valeur relative, pour toute concentration supérieure ou égale à 2 milligrammes par litre.» Entretanto, sobre essa matéria veio reger o Décret n.º 2001-387 du 3 mai 2001 e o artigo 15.º do Arrêté du 8 juillet 2003 relativo ao controlo dos alcoolímetros (designados de éthylomètres - consulta em http://droit.org/jo/20030720/INDI0301735A.html). Reconhecendo a legislação francesa, como não poderia deixar de ser, a existência de margens de erro dos éthylométres, tem-se colocado, como em Portugal, a questão de saber se essas margens devem ser consideradas apenas no momento da aprovação e da verificação periódica dos aparelhos de medição ou se podem ser ponderadas nas medições concretamente efectuadas aos condutores. Sobre essa questão pronunciou-se recentemente a Chambre Criminelle da Cour de Cassation, em 24 de Junho de 2009, no pourvoi 09-81119, sobre decisão que havia sido tomada pela Cour d`Appel de Poitiers. A referida Cour d`Appel tinha decidido que o preceito relativo às margens de erro é apenas aplicável nas verificações periódicas dos éthylomètres e não nos controlos efectuados aos condutores. Ora, a Cour de Cassation, diversamente, ainda que tenha rejeitado o pourvoi, não deixou de dizer que «Si c'est à tort qu'un arrêt énonce que les marges d'erreur prévues par les articles 3 du décret du 31 décembre 1985 et 15 de l'arrêté du 8 juillet 2003 ne peuvent s'appliquer à une mesure effectuée lors d'un contrôle d'alcoolémie, il n'encourt pas pour autant la censure dès lors que l'interprétation des mesures du taux d'alcoolémie effectuées au moyen d'un éthylomètre constitue pour le juge une faculté et non une obligation» (ou seja, ensaiando uma tradução: se é sem razão que a sentença enuncia que as margens de erro previstas pelas disposições regulamentares em causa não se podem aplicar a uma medida efectuada aquando de um controlo de alcoolemia, apesar disso a sentença não incorre em censura porque a interpretação das medidas da taxa de alcoolemia efectuada por meio de um etilómetro constitui para o juiz uma faculdade e não uma obrigação - http://www.legifrance.gouv.fr/affichJuriJudi.do?oldAction=rechJuriJudi&idTexte=JURITEXT000020903672). Reconhece-se, por conseguinte, a admissibilidade de consideração das margens de erro legalmente previstas nas medições concretamente efectuadas, segundo o critério do julgador. É o que ocorre, aliás, com os controladores de velocidade ou cinemómetros, também sujeitos a controlo metrológico e que comportam, como acontece com qualquer instrumento de medição, margens de erro, distinguindo-se a velocidade medida, da velocidade considerada, como faz expressamente, entre nós, a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), no respectivo sítio (veja-se o quadro sobre equipamentos de fiscalização disponível em http://www.ansr.pt/Default.aspx?tabid=102&language=pt-PT). Também em França, a lei, através do Arrêté du 4 juin 2009 relatif aux cinémomètres de contrôle routier, fixou as margens de erro dos cinemómetros, a deduzir no controlo de velocidade efectuado por radar, conforme se trate de radar fixo ou instalado em veículo em movimento (http://legifrance.gouv.fr/affichTexte.do?cidTexte= JORFTEXT00002 0777051). Pese embora a existência de controlo metrológico dos controladores de velocidade, mal se compreende que se proceda à dedução de margens de erro nos resultados obtidos pelos mesmos e que se actue de forma diversa no controlo da alcoolemia, mormente quando da taxa de álcool apurada depende o preenchimento de um crime ou de um mero ilícito contra-ordenacional, o que ocorre quando a taxa se encontre na fronteira entre os dois tipos de ilícito. Na vizinha Espanha, o artigo 379.º do Código Penal previa a condução sob o efeito de drogas tóxicas, estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou de bebidas alcoólicas, sem, no entanto, fixar qualquer taxa de alcoolemia para o preenchimento do tipo de crime. A prática normalmente adoptada passava pela utilização de um etilómetro evidencial, aprovado pelo Centro Español de Metrologia que, conjugadamente com outros elementos de prova, permitisse determinar o efeito das bebidas alcoólicas e similares nas faculdades necessárias para conduzir. Em todo o caso, desde Maio de 1999 que uma taxa de álcool superior a 0,25 mg. no ar expirado ou 0,5 g/l no sangue fazia incorrer o condutor numa infracção de natureza administrativa, entendendo-se, porém, que a mera circunstância de se exceder a referida taxa de álcool não determinava a subsunção da conduta ao tipo criminal (sobre esta matéria ver Francisco Muñoz Conde, Derecho Penal – Parte Especial, tirant le blanch, 12.ª ed., pp. 653 e segs.). Através da Ley Orgánica 15/2007, de 30 de noviembre, procedeu-se à alteração do Código Penal, passando o artigo 379.º a contar com dois números, sendo o n.º2 relativo à condução de veículo com motor ou ciclomotor sob a influência de drogas tóxicas, estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou de bebidas alcoólicas, estabelecendo-se que será condenado com as penas previstas no número anterior quem conduzir com uma taxa de álcool no ar expirado superior a 0,60 mg/l ou com uma taxa de álcool no sangue superior a 1,2 g/l. Na sequência desta alteração legislativa ganhou renovada importância a questão da determinação da taxa de álcool para marcar a fronteira entre o ilícito penal e o ilícito de natureza administrativa (tendo em vista o que sobre este determinava o Real Decreto 1428/2003, de 21 de noviembre). Existindo o indispensável controlo metrológico que é exercido pelo Centro Español de Metrologia, a legislação aplicável, mais concretamente o Real Decreto 889/2006 de 21 de julio e a ORDEN ITC/3707/2006, de 22 de noviembre (esta em BOE n.º 292, de 7.12.2006, ambos disponíveis no sítio do referido Centro ou do Boletín Oficial del Estado) fixam as margens de erro dos aparelhos de medição do álcool, etilómetros, nos artigos 9.º e 15.º da referida Orden, por referência ao anexo segundo do diploma. Ainda assim, não tem deixado de colocar-se a questão da consideração dessas margens de erro nas concretas operações de medição do álcool efectuadas aos condutores, resultando das consultas efectuadas que tem sido largamente defendida, inclusivamente ao nível da Fiscalia em diversos tribunais, a correcção dos resultados das medições efectuadas pelos etilómetros através da consideração das margens de erro. Assim, para além dos utilíssimos elementos que se colhem no voto de vencido do Dr. Pedro Martins, no Acórdão da Relação de Lisboa, de 27 de Outubro de 2009 (aresto acima referido), salientamos as CONCLUSIONES DE LAS JORNADAS DE FISCALES DELEGADOS DE SEGURIDAD VIAL, que tiveram lugar nos dias 17 e 18 de Janeiro de 2008, em Madrid, em que se faz expressa menção há necessidade de valoração das margens de erro dos etilómetros e dos cinemómetros (http://aspex.juntaex.es/CONCLUSIONES_REDUCIDAS.pdf). Segundo se colhe da INSTRUCCIÓN GENERAL da Fiscalía Provincial de Las Palmas, o Fiscal General del Estado aprovou, em 7 de Março de 2008, as conclusões das referidas jornadas de Madrid (http://www.policialocallaspalmasdegrancanaria.com/carpeta/InstruccionGeneralPoliciaAbril2008.pdf). Relativamente à prova por «etilómetro», Jesús Barquín Sanz e Juan de Dios Luna del Castillo, professores titulares de Direito Penal e de Estatística e Investigação Operativa, respectivamente, da Universidade de Granada, reportando-se precisamente ao etilómetro evidencial Dräger Alcotest 7110, abordam especificamente a questão da tolerância e margens de erro na prova por etilómetro. A primeira a considerar, segundo os referidos autores, é a correspondente ao erro técnico admissível nos instrumentos de medição utilizados, conforme reconhecido pela Dirección General de Tráfico, na sua Instrucción 02/S 61, de 15 de Abril de 2002. E concluem serem favoráveis à observação das margens de erro por conferirem garantias à prova, pois graças à consideração de tais margens «se puede tener una razonable confianza en que, quien es denunciado por conducir superando los límites de alcohol, lleva verdaderamente en sangre tasas de etanol que superan com claridad lo permitido». Salientam esses autores que os erros de medição dos instrumentos técnicos não são hipóteses metafísicas nem enteléquias, mas factos comprovados, e que aos princípios e garantias do direito sancionador repugna a ideia de castigar indiscriminadamente, havendo que recorrer às margens de tolerância que, com sólido fundamento técnico, são tidas em conta no ordenamento jurídico (INGESTA MODERADA DE ALCOHOL Y PRUEBA DEL ETILÓMETRO - Evolución de la concentración de etanol en aire espirado tras consumo moderado de alcohol siguiendo el rito social; factores asociados con esta evolución y con lapercepción de mareo y de incapacidad de conducción tras dicho consumo, Revista Electrónica de Ciencia Penal y Criminología ARTÍCULOS, RECPC 07-15 (2005), http://criminet.ugr.es/recpc). 6. Revertendo ao caso concreto em apreço, temos que o tribunal decidiu que à taxa de alcoolemia no sangue registada pelo alcoolímetro correspondia a taxa de, pelo menos, 1,57 g/l, uma vez deduzido o valor de erro máximo admissível. Desde já adiantamos que não nos parece que a questão se resolva com recurso ao regime do artigo 344.º, n.º1 e 2, do C.P.P., no que concerne à confissão integral e sem reservas, porquanto afigura-se-nos que tal confissão não tem a virtualidade de abranger a TAS indicada no talão do alcoolímetro. Nos termos do disposto no artigo 140.º, n.º 2, do C.P.P., «Às declarações do arguido é correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 128.º e 138.º, salvo quando a lei dispuser de forma diferente», consignando-se no n.º 1, do artigo 128.º: «A testemunha é inquirida sobre factos de que possua conhecimento directo e que constituam objecto de prova.» Como se realça no Acórdão desta Relação, de 26 de Novembro de 2008, Proc. n.º 0812537, da conjugação destes dois normativos ressalta que, quer as declarações do arguido, quer o depoimento das testemunhas, só assumem relevância em relação aos factos que sejam do conhecimento daquele que os relata, sendo que outro entendimento é susceptível de conduzir a que a verdade material, cuja descoberta o processo penal visa alcançar, pudesse ser alicerçada na confissão de factos não verdadeiros ou cuja veracidade o arguido não tivesse capacidade para afirmar por ultrapassarem aquilo que é capaz de apreender. Em consequência, «os limites da capacidade cognitiva individual serão também os limites daquilo que, de forma juridicamente relevante, pode ser declarado ou deposto – e, portanto, também confessado. A contrario, tudo o que esteja para além desses limites ou constitui declaração ou depoimento irrelevante, não podendo valer mais do que uma mera opinião, ou constitui raciocínio lógico-dedutivo que, se pertinente, o tribunal também terá de fazer e de forma autónoma». Dito de outro modo: só se pode confessar o que, efectivamente, é susceptível de ser confessado. O arguido pode confessar que ingeriu vários copos de vinho ou outras bebidas alcoólicas, que estava convencido de que, se fiscalizado, acusaria uma taxa muito superior ao legalmente permitido e que tendo feito o teste do álcool acusou uma taxa de x g/l de álcool no sangue. Mas já não parece que possa confessar que conduzia com uma determinada taxa de álcool no sangue, pois falta-lhe, para o efeito, razão de ciência A prova da concreta taxa de álcool no sangue, nos termos legais, só pode ser feita através de teste no ar expirado ou por meio de análise ao sangue, pelo que não se vislumbra que possa ser provada por meio de confissão ou por depoimento. Do que se extrai que o arguido podia ter efectivamente conhecimento (porque compreendidos tais factos nos limites da sua capacidade cognitiva) de que estava a conduzir um veículo automóvel pesado de mercadorias na via pública, depois de ter ingerido bebidas alcoólicas em quantidades que lhe podiam determinar uma TAS igual ou superior a 1,2 g/l, e bem assim que a taxa de alcoolemia no sangue, registada no teste de detecção e quantificação de álcool no sangue, por meio de analisador quantitativo, era de 1,70 gr./l. Contudo, a circunstância de o alcoolímetro indicar uma certa TAS não significa que quem foi submetido ao teste necessariamente seja portador dessa exacta TAS e, novamente prosseguindo na esteira do citado Acórdão de 26 de Novembro de 2008, «ultrapassando obviamente as capacidades cognitivas do arguido, como de qualquer ser humano, a determinação da concreta TAS de que era portador – resultado que só é alcançável, pelo menos com o rigor exigível, através de exame realizado mediante a utilização de aparelho próprio para o efeito – não podia ele validamente confessar um facto que não podia conhecer». Este entendimento não põe em causa a prova resultante do instrumento de medição, designadamente a fé sobre os factos presenciados que o artigo 170.º do Código da Estrada reconhece ao auto de notícia e «aos elementos de prova obtidos através de aparelhos ou instrumentos aprovados nos termos legais e regulamentares.» Embora se trate de um caso de prova (pesquisa no ar expirado) a fazer necessariamente através de utilização de aparelho próprio para o efeito, tem-se debatido se o analisador quantitativo visa obter prova documental, uma vez que o resultado consubstancia uma «notação corporizada em escrito ou qualquer outro meio técnico, nos termos da lei penal» - artigo 164.º, n.º 1, do C.P.P., e artigos 255.º, alínea b), e 258.º, do Código Penal, – e não prova pericial porque, para este efeito, não tem lugar uma percepção ou apreciação de factos que exijam «especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos» - artigo 151.º do C.P.P. (é o entendimento perfilhado no Ac. da Relação de Lisboa, de 7 de Maio de 2008, no proc. n.º 2199/2008-3; também no sentido de que não se trata de prova pericial, Paula Melo, Condução sob influência do álcool – Apreciação dos meios de prova, Maia Jurídica, Revista de Direito, Ano II, n.º2, Julho-Dezembro de 2004). Diversamente, há quem sustente que os «métodos alcoolímetros consistem em actos de prova preconstituída, de carácter pericial» (Benjamim Rodrigues, Da prova penal, Tomo I, Coimbra 2008, p. 117). Em Espanha, relativamente à prova da taxa de álcool por alcoolímetro/etilómetro a questão tem sido de há muito suscitada, ora sendo entendida como prova secundária em relação à prova testemunhal que era prestada pelos agentes autuantes (sobretudo quando o tipo legal de crime não estipulava uma taxa concreta, como já acima se assinalou), ora definida como prova pericial preconstituída “lato sensu” (sobre esta questão ver, por exemplo, o texto NUEVA DOCTRINA JURISPRUDENCIAL DEL TRIBUNAL SUPREMO Y DEL TRIBUNAL CONSTITUCIONAL EN MATERIA DE PRUEBA EN EL PROCESO PENAL, Sevilla, 6 y 7 Mayo 2009, http://www juntadeandalucia.es/justicia/fiscales/cda/views/channel/adri_fis_mostrar_contenidos_canal_subcanales/0,21452, 12351747_52678719,00.html) A verdade, porém, é que em qualquer caso, terá de ser sempre no respeito dos próprios limites dos equipamentos em causa – legalmente previstos – que a prova deve ser apreciada. Ora, como já se assinalou, ainda que a margem de erro legalmente admissível seja levada em conta no momento da calibração do aparelho, tal facto apenas garante que o aparelho em concreto está apto a efectuar medições e que os resultados obtidos sempre se situarão dentro dos limites definidos por aquelas margens de erro. Em termos gerais, para mais sem que conste a data da última verificação metrológica, afigura-se-nos inteiramente justificada a decisão do tribunal recorrido, que atendeu ao erro máximo admissível, deduzindo-o ao valor registado no talão emitido pelo alcoolímetro, o que se impõe desde logo por força do princípio in dubio pro reo. Estamos perante uma incerteza balizada por normas do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, resultante das margens de erro toleradas, que o tribunal não pode ignorar sob pena de, uma vez desconsideradas, poderem levar à condenação do arguido por crime sem que a taxa real de álcool chegue a atingir o limiar que define o ilícito criminal ou, em todo o caso, com efeitos desfavoráveis ao nível da determinação da sanção. Do que se conclui no sentido da inexistência de qualquer erro notório na apreciação da prova que justifique a alteração da decisão recorrida. 7. O recorrente circunscreve, essencialmente, a matéria do recurso à questão da sentença recorrida ter considerado, na fixação da taxa de alcoolemia, que havia que deduzir o valor do erro máximo admissível. Realmente, conformando-se com a qualificação jurídico-criminal dos factos, o recorrente limita-se a pedir que à condenação do arguido se somem mais 5 dias de multa, considerando adequada a sua razão diária e bem assim a pena acessória imposta. Assim, a sua discordância em relação à taxa de alcoolemia considerada na sentença repercute-se, minimamente, na parte dispositiva da sentença, que só é colocada em causa por uma diferença de apenas 5 dias de multa. Tendo em vista que os tribunais não têm por vocação discutir questões académicas, para as quais não se vislumbre qualquer interesse actual e concreto, não deixamos de nos interrogar sobre se a discordância quanto à fundamentação da sentença, com tão mínima dissidência relativamente à parte decisória, não estará próximo da fronteira da falta de interesse em agir. Em todo o caso, não há que alterar, pelas razões supra explanadas, a matéria de facto e, igualmente, o decidido quanto à pena, devendo o recurso improceder na totalidade. III – Dispositivo Em face do exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal desta Relação em julgar improcedente o recurso. Sem tributação. Porto, 20 de Janeiro de 2010 (Consigna-se que o acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo primeiro signatário – artigo 94.º, n.º2, do C.P.P.) Jorge Manuel Baptista Gonçalves Adelina da Conceição Cardoso Barradas de Oliveira