Processo:291/09.1PAVNF.P1
Data do Acordão: 05/01/2010Relator: JORGE GONÇALVESTribunal:trp
Decisão: Meio processual:

Na fixação da taxa de álcool no sangue, é correcta a decisão de deduzir ao valor registado pelo alcoolímetro o valor do erro máximo admissível, deduzindo-o ao valor registado no talão emitido pelo alcoolímetro, desde logo por força do princípio in dubio pro reo.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
JORGE GONÇALVES
Descritores
CONDUÇÃO SOB O EFEITO DE ÁLCOOL ALCOOLÉMIA
No do documento
Data do Acordão
01/06/2010
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
REC PENAL.
Decisão
NEGADO PROVIMENTO.
Sumário
Na fixação da taxa de álcool no sangue, é correcta a decisão de deduzir ao valor registado pelo alcoolímetro o valor do erro máximo admissível, deduzindo-o ao valor registado no talão emitido pelo alcoolímetro, desde logo por força do princípio in dubio pro reo.
Decisão integral
RECURSO N.º 291/09.1PAVNF.P1
Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão - .º Juízo de competência especializada criminal


Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:

I – Relatório
1. No processo sumário n.º 291/09.1PAVNF, do 2.º Juízo de competência especializada criminal do Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão, o arguido B………, melhor identificado nos autos, foi submetido a julgamento e absolvido da autoria do crime de condução de veículo em estado de embriaguez que lhe havia sido imputado.

2. Inconformado, o Ministério Público recorreu da sentença absolutória, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): 
1) Não estando legalmente estabelecida qualquer margem de erro a atender nos resultados obtidos pelos analisadores quantitativos de avaliação da taxa de álcool no sangue, mais não restava ao Tribunal recorrido do que dar como provado que o arguido conduziu o ciclomotor referido nos autos com a TAS de 1,28 g/l, tal como consta dos resultados do exame de pesquisa de tal taxa no ar expirado juntos a fls. 4.
2) Quer consideremos o disposto na Portaria nº 748/94 de 13 de Agosto, quer atentemos no actualmente previsto na Portaria nº 1556/2007 de 10 de Dezembro que agora regulamenta o controle metrológico dos alcoolímetros, outra conclusão não se pode extrair que não seja a de que a aplicação das margens de erro nelas previstas se reconduz apenas aos momentos de aprovação e das subsequentes verificações dos alcoolímetros, operações da competência do Instituto Português da Qualidade.
3) Em nenhum dos elementos de prova valorados pelo Tribunal recorrido resulta que a taxa de álcool com que o arguido conduzia fosse diversa da que resulta do exame efectuado – 1,28 g/l – e, concretamente, que correspondesse ao valor de 1,18 g/l, a que se atendeu na sentença.
4) Ao ter dado como provada e ao ter atentado na referida taxa de 1,18 g/l padece a sentença recorrida de erro notório na apreciação da prova, nos termos previstos no artº 410º, nº 2, al. c) do Código de Processo Penal, tendo assim violado o disposto nos arts. 292º, nº 1, 69º, nº 1, al. a), 70º e 71º todos do Código Penal, 153º, nº 1 e 158º, nº 1, als. a) e b), ambos do Código da Estrada e o Decreto Regulamentar nº 24/98 de 30 de Outubro.
5) Atenta a taxa de álcool que resultou do citado exame – 1,28 g/l – e os restantes factos considerados provados na sentença recorrida, mostram-se preenchidos os elementos do tipo legal de crime pelo qual o arguido se encontrava acusado.
6) As penas, principal e acessória, a aplicar deverão respeitar as necessidades de prevenção geral e especial, bem como a medida da culpa do agente, nos termos do disposto nos arts. 40º, 70º e 71º do Código Penal.
7) Em face da matéria apurada em audiência de julgamento, bem como, atendendo às necessidades de prevenção geral e especial, à medida da culpa do arguido, ao facto de o mesmo ter já antecedentes criminais embora pela prática de crimes de natureza diversa e à taxa de álcool com que o arguido conduzia, mostra-se adequada a aplicação ao mesmo de uma pena não inferior a 80 dias de multa e de uma sanção acessória de proibição de conduzir veículos com motor correspondente a 4 meses.
8) Face ao disposto no artigo 47º, nº 2 do Código Penal, tendo em conta a matéria factual relativa à situação económica e financeira do arguido dada como provada na sentença recorrida, o montante diário da pena de multa aplicada deverá ser fixado num quantitativo equivalente ao mínimo legal de € 5,00 (cinco euros).
9) Face a tudo o que se deixou exposto deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, deverá ser revogada a sentença recorrida, substituindo-a por acórdão que condene o arguido pela prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez pelo qual vinha acusado, pelo menos, nas penas supra indicadas. 
Nestes termos e noutros, que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado, revogando-se parcialmente a sentença recorrida no tocante à matéria de facto nela dada como provada e proferindo-se acórdão que condene o arguido na pena de multa e na sanção acessória, pelo menos nos mínimos acima indicados, assim se fazendo JUSTIÇA.

3. O arguido não respondeu ao recurso.

4. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido da verificação do vício do erro notório na apreciação da prova, pugnando pelo reenvio do processo.

5. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º2, do Código de Processo Penal (diploma que passaremos a designar de C.P.P.), foram colhidos os vistos, após o que foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.º3, do mesmo diploma.

II – Fundamentação
1. Conforme jurisprudência constante e pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (entre muitos, os Acs. do S.T.J., de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242; de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271).
Assim, atento o teor das conclusões, a questão que importa apreciar e decidir consiste em saber se a sentença recorrida enferma do vício do erro notório na apreciação da prova, por ser inadmissível descontar à concreta TAS do arguido, aferida pelo alcoolímetro, o valor do erro máximo admissível previsto no Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros; e bem assim se o arguido deverá ser condenado em pena não inferior a 80 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 4 meses.

2. Da sentença recorrida
2.1. O tribunal a quo considerou provados os seguintes factos:
1- No dia 03 de Abril de 2009, cerca das 4.15h., o arguido conduziu o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-CL, na ………., Vila Nova de Famalicão, afectado por uma taxa de alcoolemia no sangue, registada, de 1,28 gr./l., correspondente à taxa de, pelo menos, 1,18 gr./l., deduzido o valor de erro máximo admissível;
2- Agindo da forma descrita, tinha o arguido a vontade livre e perfeita consciência de estar a conduzir pela via pública o referido veículo depois de ter ingerido bebidas alcoólicas em quantidades que lhe podia determinar uma TAS igual ou superior a 1,2 g/l, bem sabendo o carácter proibido e punível de tal conduta;
3- O arguido possui uma condenação pela prática de um crime de lenocínio, por factos de 27.01.2004, tendo sido condenado numa pena de 8 meses de prisão substituída por 240 dias de multa, à taxa diária de 5,00 e possui ainda uma condenação pela prática de um crime de Usurpação (Direito de Autor), por factos de 30.07.2005, tendo sido condenado numa pena de 230 dias de multa á taxa diária de 2,50 €;
4- Confessou os factos e mostrou-se arrependido;
5- O arguido encontra-se desempregado há cerca de 3/4 anos, sendo que ajuda ocasionalmente num restaurante, no que aufere cerca de 120/150 euros;
6- Reside com a companheira que ganha 500 euros e 3 filhos menores, em casa arrendada, pela qual paga cerca de 300 euros;
7- O arguido efectuou exame de pesquisa de álcool no sangue através do ar expirado no aparelho Drager mod.7110MKIII P, aprovado pela DGV conforme despacho nº.12594/07, de 16-3.

2.2. Consignou-se, a propósito dos factos não provados:
«Nenhuns outros factos de relevo lograram comprovação.»

2.3. O tribunal recorrido fundamentou a sua convicção nos seguintes termos (transcrição):
«Relativamente aos factos provados e não provados, baseou o tribunal a sua convicção: - no teor e análise dos documentos juntos aos autos, designadamente, de fls. 3, 4 e 11 e 12 e 22 a 24, - no teor das declarações prestadas pelo arguido em audiência, descrevendo o sucedido, confessando os factos, no sentido de que efectivamente bebeu, foi fiscalizado no âmbito de uma “operação stop” e sabia que não devia conduzir depois de ter bebido, demonstrando-se arrependido da sua actuação, e elucidando ainda o tribunal quanto a alguns aspectos da sua actual situação pessoal.
Ora, tais documentos e declarações, analisados critica e conjugadamente, e sendo o valor registado da taxa de álcool de 1,28 gr./l. deduzido do valor de erro máximo admissível - em conformidade com o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, aprovado pela Portaria n.º1556/2007, de 10-12 (por aplicação da percentagem máxima de EMA, já que o valor registado e obtido através do aparelho referido em 7., constante do registo de medição de fls.4, contrariamente ao que também estabelece tal portaria, não contém, por exemplo, a data da última verificação metrológica) -, levaram a que o tribunal se convencesse quanto aos factos que apurou.»

3. Apreciando
1. O tribunal recorrido fundamentou de direito a sua decisão nos seguintes termos:
«Vem o arguido acusado por factos susceptíveis de o constituírem, em autoria material, na prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.292º do C.P. (por referência ao nº.1 do mencionado artigo).
Dispõe o art.292º, nº.1 do C.P. que “quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l., é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias ...”.
Ora, em face dos factos provados e supra descritos e das disposições legais referidas, forçoso é concluir que não se encontra preenchida a tipicidade objectiva e subjectiva do crime pelo qual vem acusado o arguido, pois que, desde logo, não se apurou que o arguido tivesse conduzido então o veículo supra referido com uma TAS igual ou superior a 1,2 gr./l., já que, do que se apurou, deduzido, à registada, o valor de EMA, ficamos com uma TAS de, pelo menos, 1,18 gr./l., ou seja, inferior à que o C.P. estipulou como limite mínimo para configurar a conduta como criminalmente punível.
E não se diga, salvo o devido respeito, que ao tribunal está vedada a aplicação da referida margem de EMA, designadamente, em casos como o presente, em que o arguido confessou os factos.
É que, por um lado, a confissão dos arguidos só pode ser entendida como uma confissão de factos, da realidade susceptível de simples percepção (in casu, a constatação de que, efectuado o teste, este deu o resultado que do talão consta, independentemente da sua fiabilidade ou correcção), e não já uma confissão que abranja qualquer tipo de medição, constatação ou juízo técnico.
Por outro lado, o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, aprovado pela Portaria n.º1556/2007, de 10-12, é exactamente aquele que regula a própria definição, aprovação, verificação, requisitos e erros máximos admissíveis dos aparelhos/alcoolímetros, como aquele que in casu foi usado para a detecção da TAS. Ou seja, entendemos que a aplicação do EMA se impõe, tanto como se impõe, e por isso se admite, o uso de tais aparelhos – como aparelhos de medição técnica legalmente reconhecidos - para a detecção da taxa de álcool, pelo que, a não aplicação do EMA constante da referida Portaria só poderia então implicar que não se atribuísse, de igual modo, qualquer relevo ao próprio registo da TAS efectuado por tal tipo de aparelhos (havendo então que considerar apenas como reconhecível e, também apenas em princípio fiável, por exemplo, o exame efectuado através da recolha de sangue – e mesmo este se efectuado pois de forma e em correctas condições).
Por último, acrescente-se que, sendo certo que o EMA constante do anexo à referida Portaria implica que tal erro tanto pode ser para valores maiores como menores, tal não significa que o tribunal não deva aplicar o EMA no sentido em que o fez, ou seja, deduzindo o EMA à taxa registada, pois que, estando nós no domínio do direito penal, como se escreveu no Ac.R.P. de 28-5-2008 (in www.dgsi.pt) “(…) se sabemos que o erro existe e qual é (mas entre duas margens: mínimo e máximo), cremos que o que há a fazer é só corrigi-lo usando (porque em direito sancionatório) a certeza do erro mínimo (porque cientificamente não é possível eliminá-lo)”.
Assim, porque o arguido conduzia o veículo referido em 1. com uma taxa de álcool no sangue cujo valor, deduzido o EMA, é inferior a 1,2 gr./l, a sua conduta não pode concluir-se como integradora da tipicidade do crime p. e p. pelo art.292º, nº.1 do C.P., pelo que nada mais resta a este tribunal senão absolvê-lo da sua prática.»

2. Dispõe o artigo 428.º, n.º 1, do C.P.P., que os Tribunais da Relação conhecem de facto e de direito. Porém, o seu poder de cognição encontra-se delimitado pelas conclusões da motivação do recorrente.
Resulta da análise da motivação que o recorrente insurge-se contra a decisão da matéria de facto que deu como provada a taxa de álcool no sangue de 1,28 g/l, indicada no auto de notícia, mas fazendo-a corresponder à taxa de 1,18 g/l, após dedução do erro máximo admissível, tendo sido esta a taxa atendida.
A matéria de facto pode ser sindicada por duas vias: no âmbito, mais restrito, dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º2, do C.P.P., no que se convencionou chamar de “revista alargada”; ou através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412.º, n.º3, 4 e 6, do mesmo diploma.
No primeiro caso, estamos perante a arguição dos vícios decisórios previstos nas diversas alíneas do n.º 2 do referido artigo 410.º, cuja indagação, como resulta do preceito, tem que resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos, para a fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento (cfr. Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 10. ª ed., 729, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, Verbo, 2ª ed., 339 e Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6.ª ed., 77 e ss.). 
No segundo caso, a apreciação não se restringe ao texto da decisão, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada) produzida em audiência, mas sempre dentro dos limites fornecidos pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus de especificação imposto pelos n.º 3 e 4 do art. 412.º do C.P. Penal.
No recurso em análise, invoca-se a existência de erro notório na apreciação da prova, vício decisório previsto no artigo 410.º, n.º2, alínea c), do C.P.P., que se verifica quando um homem médio, perante o teor da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta de que o tribunal violou as regras da experiência ou de que efectuou uma apreciação manifestamente incorrecta, desadequada, baseada em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios. O erro notório também se verifica quando se violam as regras sobre prova vinculada ou das leges artis (sobre este vício, e os demais vícios decisórios previsto no artigo 410.º, n.º2, todos de conhecimento oficioso, ver Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos em processo penal, 6.ª edição, pp.67 e seguintes).

3. A questão colocada no recurso em apreço tem sido largamente debatida na jurisprudência dos tribunais superiores e traduz-se em saber da admissibilidade do desconto na concreta TAS (taxa de álcool no sangue) aferida pelo alcoolímetro que procedeu à medição do álcool no sangue do recorrido (por conversão do valor no ar expirado), do valor do erro máximo admissível (EMA) previsto no Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, desconto que, caso se verifique, consubstanciará, na tese do recorrente, o vício decisório do erro notório na apreciação da prova.
Tem sido questionado se, para o preenchimento do elemento do tipo objectivo do crime previsto no artigo 292.º do Código Penal que consiste na condução de veículos, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l, deve ser considerada a taxa de alcoolemia que foi registada pelo alcoolímetro utilizado ou se o tribunal deve antes ter em conta a taxa resultante da subtracção da margem de erro máximo admissível ao valor indicado no aparelho.
No sentido de que não deve ser efectuado o desconto do valor do “erro máximo admissível” na TAS registada no alcoolímetro que procedeu à medição, pronunciaram-se, entre outros: os Acs. da R. de Coimbra de 30/01/08, Proc. n.º 91/07.3PANZN.C1, de 11/11/08, Proc. n.º <a href="https://acordao.pt/decisoes/124202" target="_blank">62/08.2GBPNH.C1</a> e de 10/12/08, Proc. n.º 17/07.4PANZR; Acs. da R. de Lisboa, de 03/10/07, Proc. n.º 4223/07-3, de 20/02/08, Proc. n.º 183/2008-3 e de 27/10/2009, Proc. n.º 54/07.9PTALM.L1-5; Acs. da R. do Porto de 2/07/2008, Proc. n.º 0813031 e de 14/01/09, Proc. n.º 0815205, todos em www.dgsi.pt.).
O entendimento oposto sustenta que há lugar à dedução do valor do “erro máximo admissível” à taxa registada no alcoolímetro, tendo-se pronunciado nesse sentido, entre outros: os Acs. da R. do Porto, de 02/04/08, Proc. n.º 0810479, de 07/05/08, Proc. n.º 0810922, de 26/11/08, Proc. n.º 0812537; Acs. da R. de Coimbra de 09/01/08, Proc. n.º 15/07.1PAPBL-C1 e Proc. n.º 426/04.6TSTR.C1; Ac. da R. Guimarães de 26/02/07, Proc. n.º 2602/06.2; Ac. da R. de Lisboa, de 07/05/08, Proc. n.º 2199/08-3 e bem assim o voto de vencido do Desembargador João Latas no Ac. da R. Évora de 01/07/08, Proc. nº 2699/07-1, todos em www.dgsi.pt.).
Vejamos, pois.

4. De harmonia com o disposto no artigo 81.º do Código da Estrada (diploma que foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio, com as alterações que sucessivamente lhe foram introduzidas pelos Decretos-Leis n.º 2/98, de 3 de Janeiro, 265-A/2001, de 28 de Setembro, pela Lei n.º 20/2002, de 21 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 44/2005, de 23 de Fevereiro e pela Lei n.º 78/2009, de 13 de Agosto), é proibido conduzir sob influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas, considerando-se sob influência de álcool o condutor «que apresente uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,5 g/l ou que, após exame realizado nos termos previstos no presente Código e legislação complementar, seja como tal considerado em relatório médico» (n.º1 e 2 do referido preceito legal). Nos termos do n.º3 do mencionado artigo, a conversão dos valores do teor de álcool no ar expirado (TAE) em teor de álcool no sangue (TAS) é baseada no princípio de que 1 mg de álcool por litro de ar expirado é equivalente a 2,3 g de álcool por litro de sangue.
A condução com uma taxa igual ou superior a 0,5g/l e inferior a 0,8 g/l constitui contra-ordenação sancionada com coima de €250,00 a € 1250,00, sendo a condução com uma taxa igual ou superior a 0,8 g/l e inferior a 1,2 g/l sancionada com coima de € 500,00 a €2500,00.
Por sua vez, no artigo 292.º, n.º1, do Código Penal, dispõe-se: 
«Quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1, 2g/l, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.» 
O preenchimento do tipo objectivo de crime impõe a determinação da concreta taxa de álcool no sangue de que o condutor é portador, já que só a condução com taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l integra a referida previsão legal.
Os artigos 152.º e seguintes do Código da Estrada regem sobre o procedimento para a fiscalização da condução sob influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas, determinando o respectivo artigo 158.º, n.º1, que são fixados em regulamento, além do mais: o tipo de material a utilizar na fiscalização e nos exames laboratoriais para determinação dos estados de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas; os métodos a utilizar para a determinação do doseamento de álcool ou de substâncias psicotrópicas no sangue.
A matéria da fiscalização da condução sob o efeito do álcool foi objecto de regulamentação pelo Decreto Regulamentar n.º 24/98, de 30 de Outubro, diploma que distinguia entre aparelhos analisadores de medição “qualitativos” e os aparelhos “quantitativos” - os primeiros com meras funções de despistagem/triagem, após o que os condutores seriam submetidos aos analisadores "quantitativos" ou a exame hematológico - cfr. art. 1.º, n.º 1, do mencionado diploma.
O referido Decreto Regulamentar n.º 24/98, de 30 de Outubro, foi revogado pela Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio, que aprovou o Novo Regulamento da Fiscalização da Condução sob o Efeito do Álcool, não tendo procedido, todavia a alterações relevantes para os efeitos que ora interessam.
No artigo 1.º, do Regulamento de Fiscalização, enunciam-se os meios de detecção e medição da taxa de álcool no sangue, designadamente, analisadores qualitativos e quantitativos, estes por teste no ar expirado ou análise de sangue. No artigo 14.º prescreve-se que nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só podem ser utilizados aparelhos que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, exigindo-se, previamente a esta aprovação, a existência de homologação de modelo, da competência do Instituto Português da Qualidade, de acordo com os termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros. 
No caso dos autos não está em causa a utilização de um aparelho de medição “qualitativo”, mas sim um aparelho de medição “quantitativo” - aparelho Drager mod.7110MKIII P, aprovado pela D.G.V. conforme despacho nº.12594/07, de 16-3.
Como aparelho de medição quantitativo, tal instrumento está sujeito a operações de controlo metrológico.
A Portaria n.º 748/94, de 3 de Outubro, aprovou o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, o qual nos termos do seu artigo 3.º, definia “os erros máximos admissíveis para a Primeira Verificação (PV) e Verificação Periódica (VP) em teor de álcool expirado (TAE) e convertido em Teor de Álcool no Sangue (TAS)” em conformidade com a tabela anexa.
A Portaria n.º 748/94 foi revogada pela Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro (art. 2.º), que procedeu à aprovação do novo regulamento a que deve obedecer o controlo metrológico dos alcoolímetros, estabelecendo o respectivo n.º1 que o regulamento aplica-se «a alcoolímetros quantitativos ou analisadores quantitativos.»
Por outro lado, o artigo 5.º do mesmo Regulamento (quer o primitivo quer o novo) estabelece: «O controlo metrológico dos alcoolímetros é da competência do Instituto Português da Qualidade, I.P. - IPQ e compreende as seguintes operações: a) Aprovação do modelo; b) Primeira verificação; c) Verificação periódica; d) Verificação extraordinária».
O artigo 8.º do referido Regulamento, sob a epígrafe “Erros Máximos Admissíveis”, estabelece: «Os erros máximos admissíveis (EMA), variáveis em função do teor de álcool no ar expirado (TAE) são os constantes do quadro anexo ao presente diploma e que dele faz parte integrante.»
O quadro referido é o seguinte:

O n.º 2, do artigo 9º, prescreve, por seu turno: «Os registos da medição devem conter, entre outros elementos, a marca, o modelo e o número de série do alcoolímetro assim como a data da última verificação metrológica.»
Finalmente, na Portaria n.º 902-B/2007, de 13 de Agosto, especificam-se as características técnicas, gerais e físicas, a que devem obedecer os analisadores quantitativos, entre elas, que os referidos instrumentos devem «cumprir os requisitos metrológicos e técnicos definidos no regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros» e «usar a unidade de leitura em gramas de álcool por litro de sangue (TAS) segundo o factor fixado no nº 3 do artigo 81º, do Código da Estrada».

5. Para quem perfilha o entendimento de que é inadmissível a subtracção da margem de EMA ao valor indicado no aparelho utilizado numa medição concreta, a previsão da referida margem reporta-se tão-somente à Aprovação e às Verificações periódicas subsequentes realizadas pelo IPQ como condição da homologação e aprovação dos aparelhos de medição.
A Metrologia Legal é o ramo da Metrologia, que trata das exigências legais, técnicas e administrativas, relativas às unidades de medida, aos métodos de medição, aos instrumentos de medição e às medidas materializadas, fornecendo um quadro destinado a conferir às medições um nível básico de segurança, que passa nomeadamente por um sistema de unidade definida, estrita verificação e calibração dos instrumentos de medição e definição de um conjunto de erros máximos admissíveis. 
Sobre esta temática e em abono do supra referido entendimento – que sustenta a não consideração da margem de EMA -, tem sido largamente citada a comunicação apresentada por Maria do Céu Ferreira e António Cruz no 2.º Encontro Nacional da Sociedade Portuguesa de Metrologia, em 17 de Novembro de 2006, com o título CONTROLO METROLOGICO DE ALCOOLÍMETROS NO INSTITUTO PORTUGUÊS DA QUALIDADE.
Nessa comunicação podemos ler:
«A definição, através da Portaria n.º 748/94, de determinados erros máximos admissíveis, quer para a Aprovação de Modelo e Primeira Verificação, quer para a Verificação Periódica, visa definir barreiras limite dentro das quais as indicações dos instrumentos de medição, obtidas nas condições estipuladas de funcionamento, são correctas. Ou seja, um alcoolímetro de modelo aprovado e com verificação válida, utilizado nas condições normais, fornece indicações válidas e fiáveis para os fins legais.»
Mais adiante:
«Os EMA são limites definidos convencionalmente em função não só das características dos instrumentos, como da finalidade para que são usados. Ou seja, tais valores limite, para mais e para menos, não representam valores reais de erro, numa qualquer medição concreta, mas um intervalo dentro do qual, com toda a certeza (uma vez respeitados os procedimentos de medição), o valor da indicação se encontra. É sabido que a qualquer resultado de medição está sempre associada uma incerteza de medição, uma vez que não existem instrumentos de medição absolutamente exactos. Esta incerteza de medição é avaliada no acto da aprovação de modelo por forma a averiguar se o instrumento durante a sua vida útil possui características construtivas, por forma a manter as qualidades metrológicas regulamentares, nomeadamente fornecer indicações dentro dos erros máximos admissíveis prescritos no respectivo regulamento.» (www.spmet.pt/comunicacoes_2_encontro/Alcoolimetros_MCFerreira.pdf)
Em termos conclusivos, dizem os referidos autores:
«O valor da indicação do instrumento é em cada situação, o mais correcto. O eventual erro da indicação, nesse momento, nessa operação, com o operador que a tiver efectuado, nas circunstâncias de ambiente locais, quaisquer que tenham sido outros factores de influência externos ou contaminantes do ar expirado, seja ele positivo ou negativo, está com toda a probabilidade contido nos limites do EMA.»
Do teor desta comunicação não logramos extrair, como conclusão, que o tribunal não possa fazer uso das margens de erro dos aparelhos de medição para reduzir tanto quanto possível a divergência entre o resultado do exame e a realidade.
Ainda que na referida comunicação se diga que os EMA não representam valores reais de erro, certo é que se realça que tais valores representam um intervalo dentro do qual, com toda a certeza, o valor da indicação se encontra.
Admitindo que a margem de erro legalmente admissível é tida em conta no momento da calibração do aparelho, tal facto apenas garante que o aparelho em concreto está apto a efectuar medições e que os resultados obtidos sempre se situarão dentro dos limites daquelas margens de erro.
Por outras palavras, como se assinala no Acórdão da Relação de Lisboa, de 7 de Maio de 2008 (Proc. n.º 2199/08-3), se o aparelho se encontra aprovado, se foi sujeito à verificação periódica e está a funcionar regularmente, o tribunal tem todas as razões para ter por seguro, para além de qualquer dúvida razoável, que o examinado tinha a taxa de álcool que resulta da subtracção da margem de erro máximo admissível ao valor indicado pelo aparelho.
Diz-se nesse aresto (excluem-se as menções a notas de rodapé):
«Embora nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só possam ser utilizados analisadores que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, sendo a aprovação precedida de homologação de modelo, a efectuar pelo Instituto Português de Qualidade, nos termos do Regulamento do Controlo Metrológico de Alcoolímetros (n.º 1 e 2 do artigo 14º), regulamento esse que impõe o respeito pela Recomendação n.º 126 da Organização Internacional da Metrologia Legal (OIML R 126), os valores determinados pelos aparelhos não são completamente precisos, havendo sempre uma determinada margem de erro que não obsta à aprovação do modelo e à certificação de cada aparelho na primeira verificação e nas verificações sucessivas. 
Daí que, como se afirma no ponto 5 da Recomendação n.º 126 da OIML, mesmo com um aparelho aprovado e sujeito a verificação periódica, exista ou possa existir em cada medição individual uma certa imprecisão. 
Se em 95% das medições essa imprecisão não deve ultrapassar os valores referidos no ponto 5.2.2 da OIML R 126, os quais são claramente inferiores à margem de erro admissível do aparelho, nas restantes medições a imprecisão pode ser superior. 
Estando a aprovação do modelo e a certificação de cada aparelho na primeira verificação e nas verificações seguintes sujeitas à não ultrapassagem da margem de erro admissível fixada, consoante o caso, nos pontos 5.1.1 a 5.1.3 da OIML R 126 e no quadro anexo à Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro, o tribunal não pode estar seguro de que o condutor fiscalizado, em cada caso concreto, tenha conduzido o veículo com a exacta taxa de álcool indicada pelo aparelho.»
No caso em apreço, acresce que, ao contrário do exigido pelo n.º 2, do artigo 9.º, da Portaria n.º 1556/2007, de 10/12, o registo da medição nem sequer contém a data da última verificação metrológica, como se infere da documentação para a qual remete a motivação da decisão sobre a matéria de facto.

6. Questões idênticas têm sido colocadas noutros países, a propósito da medição da taxa de alcoolemia relevante para fins sancionatórios.
Nos E.U.A., as questões colocadas pelos testes de «DUI» (driving under the influence) ou «DWI» (driving while intoxicated), realizados através dos «breath tests», por não medirem directamente a taxa de álcool no sangue, mas antes o fazerem através da conversão de valores obtidos no ar expirado por meio de instrumentos de medição que comportam margens de erro, constituem um tema de eleição em disputas judiciárias com origem na condução em estado de embriaguez, com tratamento diverso conforme o Estado em que ocorram.
Em França, o Décret n.º 85-1519 du 31 décembre 1985 (consultar em http://www.legifrance.gouv.fr.), relativo aos instrumentos destinados à medição da concentração de álcool no ar expirado, estabeleceu, no seu artigo 3.º, os seguintes erros máximos tolerados «sur la mesure de la concentration d'alcool éthylique, en plus ou en moins, sur les instruments en service»:
«- 0,032 milligramme par litre, pour toute concentration inférieure à 0,40 milligramme par litre ;
- 8 centièmes, en valeur relative, pour toute concentration supérieure ou égale à 0,40 milligramme par litre et inférieure à 1 milligramme par litre ;
- 15 centièmes, en valeur relative, pour toute concentration supérieure ou égale à 1 milligramme par litre et inférieure à 2 milligrammes par litre ;
- 30 centièmes, en valeur relative, pour toute concentration supérieure ou égale à 2 milligrammes par litre.» 

Entretanto, sobre essa matéria veio reger o Décret n.º 2001-387 du 3 mai 2001 e o artigo 15.º do Arrêté du 8 juillet 2003 relativo ao controlo dos alcoolímetros (designados de éthylomètres - consulta em http://droit.org/jo/20030720/INDI0301735A.html).
Reconhecendo a legislação francesa, como não poderia deixar de ser, a existência de margens de erro dos éthylométres, tem-se colocado, como em Portugal, a questão de saber se essas margens devem ser consideradas apenas no momento da aprovação e da verificação periódica dos aparelhos de medição ou se podem ser ponderadas nas medições concretamente efectuadas aos condutores.
Sobre essa questão pronunciou-se recentemente a Chambre Criminelle da Cour de Cassation, em 24 de Junho de 2009, no pourvoi 09-81119, sobre decisão que havia sido tomada pela Cour d`Appel de Poitiers. 
A referida Cour d`Appel tinha decidido que o preceito relativo às margens de erro é apenas aplicável nas verificações periódicas dos éthylomètres e não nos controlos efectuados aos condutores.
Ora, a Cour de Cassation, diversamente, ainda que tenha rejeitado o pourvoi, não deixou de dizer que «Si c'est à tort qu'un arrêt énonce que les marges d'erreur prévues par les articles 3 du décret du 31 décembre 1985 et 15 de l'arrêté du 8 juillet 2003 ne peuvent s'appliquer à une mesure effectuée lors d'un contrôle d'alcoolémie, il n'encourt pas pour autant la censure dès lors que l'interprétation des mesures du taux d'alcoolémie effectuées au moyen d'un éthylomètre constitue pour le juge une faculté et non une obligation» (ou seja, ensaiando uma tradução: se é sem razão que a sentença enuncia que as margens de erro previstas pelas disposições regulamentares em causa não se podem aplicar a uma medida efectuada aquando de um controlo de alcoolemia, apesar disso a sentença não incorre em censura porque a interpretação das medidas da taxa de alcoolemia efectuada por meio de um etilómetro constitui para o juiz uma faculdade e não uma obrigação - http://www.legifrance.gouv.fr/affichJuriJudi.do?oldAction=rechJuriJudi&idTexte=JURITEXT000020903672).
Reconhece-se, por conseguinte, a admissibilidade de consideração das margens de erro legalmente previstas nas medições concretamente efectuadas, segundo o critério do julgador.
É o que ocorre, aliás, com os controladores de velocidade ou cinemómetros, também sujeitos a controlo metrológico e que comportam, como acontece com qualquer instrumento de medição, margens de erro, distinguindo-se a velocidade medida, da velocidade considerada, como faz expressamente, entre nós, a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), no respectivo sítio (veja-se o quadro sobre equipamentos de fiscalização disponível em http://www.ansr.pt/Default.aspx?tabid=102&language=pt-PT).
Também em França, a lei, através do Arrêté du 4 juin 2009 relatif aux cinémomètres de contrôle routier, fixou as margens de erro dos cinemómetros, a deduzir no controlo de velocidade efectuado por radar, conforme se trate de radar fixo ou instalado em veículo em movimento (http://legifrance.gouv.fr/affichTexte.do?cidTexte= JORFTEXT00002
0777051).
 Pese embora a existência de controlo metrológico dos controladores de velocidade, mal se compreende que se proceda à dedução de margens de erro nos resultados obtidos pelos mesmos e que se actue de forma diversa no controlo da alcoolemia, mormente quando da taxa de álcool apurada depende o preenchimento de um crime ou de um mero ilícito contra-ordenacional, o que ocorre quando a taxa se encontre na fronteira entre os dois tipos de ilícito.
Na vizinha Espanha, o artigo 379.º do Código Penal previa a condução sob o efeito de drogas tóxicas, estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou de bebidas alcoólicas, sem, no entanto, fixar qualquer taxa de alcoolemia para o preenchimento do tipo de crime.
A prática normalmente adoptada passava pela utilização de um etilómetro evidencial, aprovado pelo Centro Español de Metrologia que, conjugadamente com outros elementos de prova, permitisse determinar o efeito das bebidas alcoólicas e similares nas faculdades necessárias para conduzir. Em todo o caso, desde Maio de 1999 que uma taxa de álcool superior a 0,25 mg. no ar expirado ou 0,5 g/l no sangue fazia incorrer o condutor numa infracção de natureza administrativa, entendendo-se, porém, que a mera circunstância de se exceder a referida taxa de álcool não determinava a subsunção da conduta ao tipo criminal (sobre esta matéria ver Francisco Muñoz Conde, Derecho Penal – Parte Especial, tirant le blanch, 12.ª ed., pp. 653 e segs.).
Através da Ley Orgánica 15/2007, de 30 de noviembre, procedeu-se à alteração do Código Penal, passando o artigo 379.º a contar com dois números, sendo o n.º2 relativo à condução de veículo com motor ou ciclomotor sob a influência de drogas tóxicas, estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou de bebidas alcoólicas, estabelecendo-se que será condenado com as penas previstas no número anterior quem conduzir com uma taxa de álcool no ar expirado superior a 0,60 mg/l ou com uma taxa de álcool no sangue superior a 1,2 g/l.
Na sequência desta alteração legislativa ganhou renovada importância a questão da determinação da taxa de álcool para marcar a fronteira entre o ilícito penal e o ilícito de natureza administrativa (tendo em vista o que sobre este determinava o Real Decreto 1428/2003, de 21 de noviembre).
Existindo o indispensável controlo metrológico que é exercido pelo Centro Español de Metrologia, a legislação aplicável, mais concretamente o Real Decreto 889/2006 de 21 de julio e a ORDEN ITC/3707/2006, de 22 de noviembre (esta em BOE n.º 292, de 7.12.2006, ambos disponíveis no sítio do referido Centro ou do Boletín Oficial del Estado) fixam as margens de erro dos aparelhos de medição do álcool, etilómetros, nos artigos 9.º e 15.º da referida Orden, por referência ao anexo segundo do diploma.
Ainda assim, não tem deixado de colocar-se a questão da consideração dessas margens de erro nas concretas operações de medição do álcool efectuadas aos condutores, resultando das consultas efectuadas que tem sido largamente defendida, inclusivamente ao nível da Fiscalia em diversos tribunais, a correcção dos resultados das medições efectuadas pelos etilómetros através da consideração das margens de erro.
Assim, para além dos utilíssimos elementos que se colhem no voto de vencido do Dr. Pedro Martins, no Acórdão da Relação de Lisboa, de 27 de Outubro de 2009 (aresto acima referido), salientamos as CONCLUSIONES DE LAS JORNADAS DE FISCALES DELEGADOS DE SEGURIDAD VIAL, que tiveram lugar nos dias 17 e 18 de Janeiro de 2008, em Madrid, em que se faz expressa menção há necessidade de valoração das margens de erro dos etilómetros e dos cinemómetros (http://aspex.juntaex.es/CONCLUSIONES_REDUCIDAS.pdf). Segundo se colhe da INSTRUCCIÓN GENERAL da Fiscalía Provincial de Las Palmas, o Fiscal General del Estado aprovou, em 7 de Março de 2008, as conclusões das referidas jornadas de Madrid (http://www.policialocallaspalmasdegrancanaria.com/carpeta/InstruccionGeneralPoliciaAbril2008.pdf).
 Relativamente à prova por «etilómetro», Jesús Barquín Sanz e Juan de Dios Luna del Castillo, professores titulares de Direito Penal e de Estatística e Investigação Operativa, respectivamente, da Universidade de Granada, reportando-se precisamente ao etilómetro evidencial Dräger Alcotest 7110, abordam especificamente a questão da tolerância e margens de erro na prova por etilómetro. 
A primeira a considerar, segundo os referidos autores, é a correspondente ao erro técnico admissível nos instrumentos de medição utilizados, conforme reconhecido pela Dirección General de Tráfico, na sua Instrucción 02/S 61, de 15 de Abril de 2002.
E concluem serem favoráveis à observação das margens de erro por conferirem garantias à prova, pois graças à consideração de tais margens «se puede tener una razonable confianza en que, quien es denunciado por conducir superando los límites de alcohol, lleva verdaderamente en sangre tasas de etanol que superan com claridad lo permitido». Salientam esses autores que os erros de medição dos instrumentos técnicos não são hipóteses metafísicas nem enteléquias, mas factos comprovados, e que aos princípios e garantias do direito sancionador repugna a ideia de castigar indiscriminadamente, havendo que recorrer às margens de tolerância que, com sólido fundamento técnico, são tidas em conta no ordenamento jurídico (INGESTA MODERADA DE ALCOHOL Y PRUEBA DEL ETILÓMETRO - Evolución de la concentración de etanol en aire espirado tras consumo moderado de alcohol siguiendo el rito social; factores asociados con esta evolución y con lapercepción de mareo y de incapacidad de conducción tras dicho consumo, Revista Electrónica de Ciencia Penal y Criminología ARTÍCULOS, RECPC 07-15 (2005), http://criminet.ugr.es/recpc).

7. Revertendo ao caso concreto em apreço, temos que o tribunal decidiu que à taxa de alcoolemia no sangue registada pelo alcoolímetro correspondia a taxa de, pelo menos, 1,18 g/l, uma vez deduzido o valor de erro máximo admissível.
Estamos precisamente perante um caso de fronteira, em que a consideração ou não do EMA determina a diferente qualificação jurídica dos factos no quadro do ilícito de natureza contra-ordenacional ou do ilícito criminal.
Desde já adiantamos que não nos parece que a questão se resolva com recurso ao regime do artigo 344.º, n.º1 e 2, do C.P.P., no que concerne à confissão integral e sem reservas.
Realmente, se é certo que da acta da audiência de julgamento resulta que o arguido confessou integralmente e sem reservas os factos, afigura-se-nos que tal confissão não tem a virtualidade de abranger a TAS de 1,28 g/l indicada no talão do alcoolímetro.
Nos termos do disposto no artigo 140.º, n.º 2, do C.P.P., «Às declarações do arguido é correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 128.º e 138.º, salvo quando a lei dispuser de forma diferente», consignando-se no n.º 1, do artigo 128.º: «A testemunha é inquirida sobre factos de que possua conhecimento directo e que constituam objecto de prova.»
Como se realça no Acórdão desta Relação, de 26 de Novembro de 2008, Proc. n.º 0812537, da conjugação destes dois normativos ressalta que, quer as declarações do arguido, quer o depoimento das testemunhas, só assumem relevância em relação aos factos que sejam do conhecimento daquele que os relata, sendo que outro entendimento é susceptível de conduzir a que a verdade material, cuja descoberta o processo penal visa alcançar, pudesse ser alicerçada na confissão de factos não verdadeiros ou cuja veracidade o arguido não tivesse capacidade para afirmar por ultrapassarem aquilo que é capaz de apreender. 
Em consequência, «os limites da capacidade cognitiva individual serão também os limites daquilo que, de forma juridicamente relevante, pode ser declarado ou deposto – e, portanto, também confessado. A contrario, tudo o que esteja para além desses limites ou constitui declaração ou depoimento irrelevante, não podendo valer mais do que uma mera opinião, ou constitui raciocínio lógico-dedutivo que, se pertinente, o tribunal também terá de fazer e de forma autónoma».
Dito de outro modo: só se pode confessar o que, efectivamente, é susceptível de ser confessado. O arguido pode confessar que ingeriu vários copos de vinho ou outras bebidas alcoólicas, que estava convencido de que, se fiscalizado, acusaria uma taxa muito superior ao legalmente permitido e que tendo feito o teste do álcool acusou uma taxa de x g/l de álcool no sangue. Mas já não parece que possa confessar que conduzia com uma determinada taxa de álcool no sangue, pois falta-lhe, para o efeito, razão de ciência 
A prova da concreta taxa de álcool no sangue, nos termos legais, só pode ser feita através de teste no ar expirado ou por meio de análise ao sangue, pelo que não se vislumbra que possa ser provada por meio de confissão ou por depoimento.
Do que se extrai que o arguido tinha efectivamente conhecimento (porque compreendidos tais factos nos limites da sua capacidade cognitiva) de que estava a conduzir um veículo automóvel ligeiro de passageiros na via pública, depois de ter ingerido bebidas alcoólicas em quantidades que lhe podiam determinar uma TAS igual ou superior a 1,2 g/l, bem sabendo o carácter proibido e punível de tal conduta; que a taxa de alcoolemia no sangue, registada no teste de detecção e quantificação de álcool no sangue, por meio de analisador quantitativo, era de 1,28 gr./l. 
Contudo, a circunstância de o alcoolímetro indicar uma certa TAS não significa que quem foi submetido ao teste necessariamente seja portador dessa exacta TAS e, novamente prosseguindo na esteira do citado Acórdão de 26 de Novembro de 2008, «ultrapassando obviamente as capacidades cognitivas do arguido, como de qualquer ser humano, a determinação da concreta TAS de que era portador – resultado que só é alcançável, pelo menos com o rigor exigível, através de exame realizado mediante a utilização de aparelho próprio para o efeito – não podia ele validamente confessar um facto que não podia conhecer». 
Este entendimento não põe em causa a prova resultante do instrumento de medição, designadamente a fé sobre os factos presenciados que o artigo 170.º do Código da Estrada reconhece ao auto de notícia e «aos elementos de prova obtidos através de aparelhos ou instrumentos aprovados nos termos legais e regulamentares.»
Embora se trate de um caso de prova (pesquisa no ar expirado) a fazer necessariamente através de utilização de aparelho próprio para o efeito, tem-se debatido se o analisador quantitativo visa obter prova documental, uma vez que o resultado consubstancia uma «notação corporizada em escrito ou qualquer outro meio técnico, nos termos da lei penal» - artigo 164.º, n.º 1, do C.P.P., e artigos 255.º, alínea b), e 258.º, do Código Penal, – e não prova pericial porque, para este efeito, não tem lugar uma percepção ou apreciação de factos que exijam «especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos» - artigo 151.º do C.P.P. (é o entendimento perfilhado no Ac. da Relação de Lisboa, de 7 de Maio de 2008, no proc. n.º 2199/2008-3; também no sentido de que não se trata de prova pericial, Paula Melo, Condução sob influência do álcool – Apreciação dos meios de prova, Maia Jurídica, Revista de Direito, Ano II, n.º2, Julho-Dezembro de 2004).
Diversamente, há quem sustente que os «métodos alcoolímetros consistem em actos de prova preconstituída, de carácter pericial» (Benjamim Rodrigues, Da prova penal, Tomo I, Coimbra 2008, p. 117).
Em Espanha, relativamente à prova da taxa de álcool por alcoolímetro/etilómetro a questão tem sido de há muito suscitada, ora sendo entendida como prova secundária em relação à prova testemunhal que era prestada pelos agentes autuantes (sobretudo quando o tipo legal de crime não estipulava uma taxa concreta, como já acima se assinalou), ora definida como prova pericial preconstituída “lato sensu” (sobre esta questão ver, por exemplo, o texto NUEVA DOCTRINA JURISPRUDENCIAL DEL TRIBUNAL SUPREMO Y DEL TRIBUNAL CONSTITUCIONAL EN MATERIA DE PRUEBA EN EL PROCESO PENAL, Sevilla, 6 y 7 Mayo 2009, http://www juntadeandalucia.es/justicia/fiscales/cda/views/channel/adri_fis_mostrar_contenidos_canal_subcanales/0,21452,
12351747_52678719,00.html)
A verdade, porém, é que em qualquer caso, terá de ser sempre no respeito dos próprios limites dos equipamentos em causa – legalmente previstos – que a prova deve ser apreciada.
Ora, como já se assinalou, ainda que a margem de erro legalmente admissível seja levada em conta no momento da calibração do aparelho, tal facto apenas garante que o aparelho em concreto está apto a efectuar medições e que os resultados obtidos sempre se situarão dentro dos limites definidos por aquelas margens de erro.
Em termos gerais, mas sobretudo numa situação como a dos autos, em que a alcoolemia registada pelo alcoolímetro se situa precisamente na fronteira que delimita a contra-ordenação do crime, para mais sem que conste a data da última verificação metrológica, afigura-se-nos inteiramente justificada a decisão do tribunal recorrido, que atendeu ao erro máximo admissível, deduzindo-o ao valor registado no talão emitido pelo alcoolímetro, o que se impõe desde logo por força do princípio in dubio pro reo. 
Estamos perante uma incerteza balizada por normas do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, resultante das margens de erro toleradas, que o tribunal não pode ignorar sob pena de, uma vez desconsideradas, poderem levar à condenação do arguido por crime sem que a taxa real de álcool chegue a atingir o limiar que define o ilícito criminal ou, em todo o caso, com efeitos desfavoráveis ao nível da determinação da sanção.
Do que se conclui no sentido da inexistência de qualquer erro notório na apreciação da prova que justifique a alteração da decisão recorrida. 

8. Face ao exposto, a pretensão do Ministério Público de que o arguido seja condenado pela prática do crime, p. e p. pelos artigos 292.º, n.º 1 e 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, não pode deixar de ser considerada improcedente, ficando prejudicada a questão da aplicação ao arguido da pena de multa e sanção acessória de proibição de conduzir.
Todavia, conforme estabelecido no artigo 77.º, n.º 1, do Decreto-Lei nº 433/82, de 21 de Outubro, o tribunal poderá apreciar como contra-ordenação uma infracção que foi acusada como crime, prevendo-se neste normativo exactamente a situação em que a acusação foi deduzida por crime e no julgamento se apura que os factos constituem apenas infracção contra-ordenacional.
Estando em causa uma taxa de álcool no sangue de 1,18 g/l, o tribunal a quo deveria ter apreciado a responsabilidade do arguido pela prática da contra-ordenação muito grave [artigo 146.º, alínea j), do Código da Estrada] que integra a sua conduta. 
Em consequência, a decisão recorrida deverá ser substituída por outra que, apreciando a responsabilidade contra-ordenacional do arguido, lhe aplique, se for o caso, as sanções correspondentes

III – Dispositivo

Em face do exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal desta Relação em julgar improcedente o recurso interposto pelo Ministério Público, determinando, porém, que o tribunal de 1.ª instância, em face da matéria de facto provada, aprecie a eventual responsabilidade contra-ordenacional do arguido.

Sem tributação.

Porto, 6 de Janeiro de 2010
(Consigna-se que o acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo primeiro signatário – artigo 94.º, n.º2, do C.P.P.)
Jorge Manuel Baptista Gonçalves
Adelina da Conceição Cardoso Barradas de Oliveira

RECURSO N.º 291/09.1PAVNF.P1 Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão - .º Juízo de competência especializada criminal Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I – Relatório 1. No processo sumário n.º 291/09.1PAVNF, do 2.º Juízo de competência especializada criminal do Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão, o arguido B………, melhor identificado nos autos, foi submetido a julgamento e absolvido da autoria do crime de condução de veículo em estado de embriaguez que lhe havia sido imputado. 2. Inconformado, o Ministério Público recorreu da sentença absolutória, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): 1) Não estando legalmente estabelecida qualquer margem de erro a atender nos resultados obtidos pelos analisadores quantitativos de avaliação da taxa de álcool no sangue, mais não restava ao Tribunal recorrido do que dar como provado que o arguido conduziu o ciclomotor referido nos autos com a TAS de 1,28 g/l, tal como consta dos resultados do exame de pesquisa de tal taxa no ar expirado juntos a fls. 4. 2) Quer consideremos o disposto na Portaria nº 748/94 de 13 de Agosto, quer atentemos no actualmente previsto na Portaria nº 1556/2007 de 10 de Dezembro que agora regulamenta o controle metrológico dos alcoolímetros, outra conclusão não se pode extrair que não seja a de que a aplicação das margens de erro nelas previstas se reconduz apenas aos momentos de aprovação e das subsequentes verificações dos alcoolímetros, operações da competência do Instituto Português da Qualidade. 3) Em nenhum dos elementos de prova valorados pelo Tribunal recorrido resulta que a taxa de álcool com que o arguido conduzia fosse diversa da que resulta do exame efectuado – 1,28 g/l – e, concretamente, que correspondesse ao valor de 1,18 g/l, a que se atendeu na sentença. 4) Ao ter dado como provada e ao ter atentado na referida taxa de 1,18 g/l padece a sentença recorrida de erro notório na apreciação da prova, nos termos previstos no artº 410º, nº 2, al. c) do Código de Processo Penal, tendo assim violado o disposto nos arts. 292º, nº 1, 69º, nº 1, al. a), 70º e 71º todos do Código Penal, 153º, nº 1 e 158º, nº 1, als. a) e b), ambos do Código da Estrada e o Decreto Regulamentar nº 24/98 de 30 de Outubro. 5) Atenta a taxa de álcool que resultou do citado exame – 1,28 g/l – e os restantes factos considerados provados na sentença recorrida, mostram-se preenchidos os elementos do tipo legal de crime pelo qual o arguido se encontrava acusado. 6) As penas, principal e acessória, a aplicar deverão respeitar as necessidades de prevenção geral e especial, bem como a medida da culpa do agente, nos termos do disposto nos arts. 40º, 70º e 71º do Código Penal. 7) Em face da matéria apurada em audiência de julgamento, bem como, atendendo às necessidades de prevenção geral e especial, à medida da culpa do arguido, ao facto de o mesmo ter já antecedentes criminais embora pela prática de crimes de natureza diversa e à taxa de álcool com que o arguido conduzia, mostra-se adequada a aplicação ao mesmo de uma pena não inferior a 80 dias de multa e de uma sanção acessória de proibição de conduzir veículos com motor correspondente a 4 meses. 8) Face ao disposto no artigo 47º, nº 2 do Código Penal, tendo em conta a matéria factual relativa à situação económica e financeira do arguido dada como provada na sentença recorrida, o montante diário da pena de multa aplicada deverá ser fixado num quantitativo equivalente ao mínimo legal de € 5,00 (cinco euros). 9) Face a tudo o que se deixou exposto deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, deverá ser revogada a sentença recorrida, substituindo-a por acórdão que condene o arguido pela prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez pelo qual vinha acusado, pelo menos, nas penas supra indicadas. Nestes termos e noutros, que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado, revogando-se parcialmente a sentença recorrida no tocante à matéria de facto nela dada como provada e proferindo-se acórdão que condene o arguido na pena de multa e na sanção acessória, pelo menos nos mínimos acima indicados, assim se fazendo JUSTIÇA. 3. O arguido não respondeu ao recurso. 4. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido da verificação do vício do erro notório na apreciação da prova, pugnando pelo reenvio do processo. 5. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º2, do Código de Processo Penal (diploma que passaremos a designar de C.P.P.), foram colhidos os vistos, após o que foram os autos à conferência, por dever ser o recurso aí julgado, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.º3, do mesmo diploma. II – Fundamentação 1. Conforme jurisprudência constante e pacífica, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas na motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (entre muitos, os Acs. do S.T.J., de 25.6.1998, in B.M.J. 478, p. 242; de 3.2.1999, in B.M.J. 484, p. 271). Assim, atento o teor das conclusões, a questão que importa apreciar e decidir consiste em saber se a sentença recorrida enferma do vício do erro notório na apreciação da prova, por ser inadmissível descontar à concreta TAS do arguido, aferida pelo alcoolímetro, o valor do erro máximo admissível previsto no Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros; e bem assim se o arguido deverá ser condenado em pena não inferior a 80 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 4 meses. 2. Da sentença recorrida 2.1. O tribunal a quo considerou provados os seguintes factos: 1- No dia 03 de Abril de 2009, cerca das 4.15h., o arguido conduziu o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-CL, na ………., Vila Nova de Famalicão, afectado por uma taxa de alcoolemia no sangue, registada, de 1,28 gr./l., correspondente à taxa de, pelo menos, 1,18 gr./l., deduzido o valor de erro máximo admissível; 2- Agindo da forma descrita, tinha o arguido a vontade livre e perfeita consciência de estar a conduzir pela via pública o referido veículo depois de ter ingerido bebidas alcoólicas em quantidades que lhe podia determinar uma TAS igual ou superior a 1,2 g/l, bem sabendo o carácter proibido e punível de tal conduta; 3- O arguido possui uma condenação pela prática de um crime de lenocínio, por factos de 27.01.2004, tendo sido condenado numa pena de 8 meses de prisão substituída por 240 dias de multa, à taxa diária de 5,00 e possui ainda uma condenação pela prática de um crime de Usurpação (Direito de Autor), por factos de 30.07.2005, tendo sido condenado numa pena de 230 dias de multa á taxa diária de 2,50 €; 4- Confessou os factos e mostrou-se arrependido; 5- O arguido encontra-se desempregado há cerca de 3/4 anos, sendo que ajuda ocasionalmente num restaurante, no que aufere cerca de 120/150 euros; 6- Reside com a companheira que ganha 500 euros e 3 filhos menores, em casa arrendada, pela qual paga cerca de 300 euros; 7- O arguido efectuou exame de pesquisa de álcool no sangue através do ar expirado no aparelho Drager mod.7110MKIII P, aprovado pela DGV conforme despacho nº.12594/07, de 16-3. 2.2. Consignou-se, a propósito dos factos não provados: «Nenhuns outros factos de relevo lograram comprovação.» 2.3. O tribunal recorrido fundamentou a sua convicção nos seguintes termos (transcrição): «Relativamente aos factos provados e não provados, baseou o tribunal a sua convicção: - no teor e análise dos documentos juntos aos autos, designadamente, de fls. 3, 4 e 11 e 12 e 22 a 24, - no teor das declarações prestadas pelo arguido em audiência, descrevendo o sucedido, confessando os factos, no sentido de que efectivamente bebeu, foi fiscalizado no âmbito de uma “operação stop” e sabia que não devia conduzir depois de ter bebido, demonstrando-se arrependido da sua actuação, e elucidando ainda o tribunal quanto a alguns aspectos da sua actual situação pessoal. Ora, tais documentos e declarações, analisados critica e conjugadamente, e sendo o valor registado da taxa de álcool de 1,28 gr./l. deduzido do valor de erro máximo admissível - em conformidade com o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, aprovado pela Portaria n.º1556/2007, de 10-12 (por aplicação da percentagem máxima de EMA, já que o valor registado e obtido através do aparelho referido em 7., constante do registo de medição de fls.4, contrariamente ao que também estabelece tal portaria, não contém, por exemplo, a data da última verificação metrológica) -, levaram a que o tribunal se convencesse quanto aos factos que apurou.» 3. Apreciando 1. O tribunal recorrido fundamentou de direito a sua decisão nos seguintes termos: «Vem o arguido acusado por factos susceptíveis de o constituírem, em autoria material, na prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.292º do C.P. (por referência ao nº.1 do mencionado artigo). Dispõe o art.292º, nº.1 do C.P. que “quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l., é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias ...”. Ora, em face dos factos provados e supra descritos e das disposições legais referidas, forçoso é concluir que não se encontra preenchida a tipicidade objectiva e subjectiva do crime pelo qual vem acusado o arguido, pois que, desde logo, não se apurou que o arguido tivesse conduzido então o veículo supra referido com uma TAS igual ou superior a 1,2 gr./l., já que, do que se apurou, deduzido, à registada, o valor de EMA, ficamos com uma TAS de, pelo menos, 1,18 gr./l., ou seja, inferior à que o C.P. estipulou como limite mínimo para configurar a conduta como criminalmente punível. E não se diga, salvo o devido respeito, que ao tribunal está vedada a aplicação da referida margem de EMA, designadamente, em casos como o presente, em que o arguido confessou os factos. É que, por um lado, a confissão dos arguidos só pode ser entendida como uma confissão de factos, da realidade susceptível de simples percepção (in casu, a constatação de que, efectuado o teste, este deu o resultado que do talão consta, independentemente da sua fiabilidade ou correcção), e não já uma confissão que abranja qualquer tipo de medição, constatação ou juízo técnico. Por outro lado, o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, aprovado pela Portaria n.º1556/2007, de 10-12, é exactamente aquele que regula a própria definição, aprovação, verificação, requisitos e erros máximos admissíveis dos aparelhos/alcoolímetros, como aquele que in casu foi usado para a detecção da TAS. Ou seja, entendemos que a aplicação do EMA se impõe, tanto como se impõe, e por isso se admite, o uso de tais aparelhos – como aparelhos de medição técnica legalmente reconhecidos - para a detecção da taxa de álcool, pelo que, a não aplicação do EMA constante da referida Portaria só poderia então implicar que não se atribuísse, de igual modo, qualquer relevo ao próprio registo da TAS efectuado por tal tipo de aparelhos (havendo então que considerar apenas como reconhecível e, também apenas em princípio fiável, por exemplo, o exame efectuado através da recolha de sangue – e mesmo este se efectuado pois de forma e em correctas condições). Por último, acrescente-se que, sendo certo que o EMA constante do anexo à referida Portaria implica que tal erro tanto pode ser para valores maiores como menores, tal não significa que o tribunal não deva aplicar o EMA no sentido em que o fez, ou seja, deduzindo o EMA à taxa registada, pois que, estando nós no domínio do direito penal, como se escreveu no Ac.R.P. de 28-5-2008 (in www.dgsi.pt) “(…) se sabemos que o erro existe e qual é (mas entre duas margens: mínimo e máximo), cremos que o que há a fazer é só corrigi-lo usando (porque em direito sancionatório) a certeza do erro mínimo (porque cientificamente não é possível eliminá-lo)”. Assim, porque o arguido conduzia o veículo referido em 1. com uma taxa de álcool no sangue cujo valor, deduzido o EMA, é inferior a 1,2 gr./l, a sua conduta não pode concluir-se como integradora da tipicidade do crime p. e p. pelo art.292º, nº.1 do C.P., pelo que nada mais resta a este tribunal senão absolvê-lo da sua prática.» 2. Dispõe o artigo 428.º, n.º 1, do C.P.P., que os Tribunais da Relação conhecem de facto e de direito. Porém, o seu poder de cognição encontra-se delimitado pelas conclusões da motivação do recorrente. Resulta da análise da motivação que o recorrente insurge-se contra a decisão da matéria de facto que deu como provada a taxa de álcool no sangue de 1,28 g/l, indicada no auto de notícia, mas fazendo-a corresponder à taxa de 1,18 g/l, após dedução do erro máximo admissível, tendo sido esta a taxa atendida. A matéria de facto pode ser sindicada por duas vias: no âmbito, mais restrito, dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º2, do C.P.P., no que se convencionou chamar de “revista alargada”; ou através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412.º, n.º3, 4 e 6, do mesmo diploma. No primeiro caso, estamos perante a arguição dos vícios decisórios previstos nas diversas alíneas do n.º 2 do referido artigo 410.º, cuja indagação, como resulta do preceito, tem que resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos, para a fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento (cfr. Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 10. ª ed., 729, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, Verbo, 2ª ed., 339 e Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6.ª ed., 77 e ss.). No segundo caso, a apreciação não se restringe ao texto da decisão, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada) produzida em audiência, mas sempre dentro dos limites fornecidos pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus de especificação imposto pelos n.º 3 e 4 do art. 412.º do C.P. Penal. No recurso em análise, invoca-se a existência de erro notório na apreciação da prova, vício decisório previsto no artigo 410.º, n.º2, alínea c), do C.P.P., que se verifica quando um homem médio, perante o teor da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta de que o tribunal violou as regras da experiência ou de que efectuou uma apreciação manifestamente incorrecta, desadequada, baseada em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios. O erro notório também se verifica quando se violam as regras sobre prova vinculada ou das leges artis (sobre este vício, e os demais vícios decisórios previsto no artigo 410.º, n.º2, todos de conhecimento oficioso, ver Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos em processo penal, 6.ª edição, pp.67 e seguintes). 3. A questão colocada no recurso em apreço tem sido largamente debatida na jurisprudência dos tribunais superiores e traduz-se em saber da admissibilidade do desconto na concreta TAS (taxa de álcool no sangue) aferida pelo alcoolímetro que procedeu à medição do álcool no sangue do recorrido (por conversão do valor no ar expirado), do valor do erro máximo admissível (EMA) previsto no Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, desconto que, caso se verifique, consubstanciará, na tese do recorrente, o vício decisório do erro notório na apreciação da prova. Tem sido questionado se, para o preenchimento do elemento do tipo objectivo do crime previsto no artigo 292.º do Código Penal que consiste na condução de veículos, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l, deve ser considerada a taxa de alcoolemia que foi registada pelo alcoolímetro utilizado ou se o tribunal deve antes ter em conta a taxa resultante da subtracção da margem de erro máximo admissível ao valor indicado no aparelho. No sentido de que não deve ser efectuado o desconto do valor do “erro máximo admissível” na TAS registada no alcoolímetro que procedeu à medição, pronunciaram-se, entre outros: os Acs. da R. de Coimbra de 30/01/08, Proc. n.º 91/07.3PANZN.C1, de 11/11/08, Proc. n.º 62/08.2GBPNH.C1 e de 10/12/08, Proc. n.º 17/07.4PANZR; Acs. da R. de Lisboa, de 03/10/07, Proc. n.º 4223/07-3, de 20/02/08, Proc. n.º 183/2008-3 e de 27/10/2009, Proc. n.º 54/07.9PTALM.L1-5; Acs. da R. do Porto de 2/07/2008, Proc. n.º 0813031 e de 14/01/09, Proc. n.º 0815205, todos em www.dgsi.pt.). O entendimento oposto sustenta que há lugar à dedução do valor do “erro máximo admissível” à taxa registada no alcoolímetro, tendo-se pronunciado nesse sentido, entre outros: os Acs. da R. do Porto, de 02/04/08, Proc. n.º 0810479, de 07/05/08, Proc. n.º 0810922, de 26/11/08, Proc. n.º 0812537; Acs. da R. de Coimbra de 09/01/08, Proc. n.º 15/07.1PAPBL-C1 e Proc. n.º 426/04.6TSTR.C1; Ac. da R. Guimarães de 26/02/07, Proc. n.º 2602/06.2; Ac. da R. de Lisboa, de 07/05/08, Proc. n.º 2199/08-3 e bem assim o voto de vencido do Desembargador João Latas no Ac. da R. Évora de 01/07/08, Proc. nº 2699/07-1, todos em www.dgsi.pt.). Vejamos, pois. 4. De harmonia com o disposto no artigo 81.º do Código da Estrada (diploma que foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 114/94, de 3 de Maio, com as alterações que sucessivamente lhe foram introduzidas pelos Decretos-Leis n.º 2/98, de 3 de Janeiro, 265-A/2001, de 28 de Setembro, pela Lei n.º 20/2002, de 21 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 44/2005, de 23 de Fevereiro e pela Lei n.º 78/2009, de 13 de Agosto), é proibido conduzir sob influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas, considerando-se sob influência de álcool o condutor «que apresente uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 0,5 g/l ou que, após exame realizado nos termos previstos no presente Código e legislação complementar, seja como tal considerado em relatório médico» (n.º1 e 2 do referido preceito legal). Nos termos do n.º3 do mencionado artigo, a conversão dos valores do teor de álcool no ar expirado (TAE) em teor de álcool no sangue (TAS) é baseada no princípio de que 1 mg de álcool por litro de ar expirado é equivalente a 2,3 g de álcool por litro de sangue. A condução com uma taxa igual ou superior a 0,5g/l e inferior a 0,8 g/l constitui contra-ordenação sancionada com coima de €250,00 a € 1250,00, sendo a condução com uma taxa igual ou superior a 0,8 g/l e inferior a 1,2 g/l sancionada com coima de € 500,00 a €2500,00. Por sua vez, no artigo 292.º, n.º1, do Código Penal, dispõe-se: «Quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1, 2g/l, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.» O preenchimento do tipo objectivo de crime impõe a determinação da concreta taxa de álcool no sangue de que o condutor é portador, já que só a condução com taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l integra a referida previsão legal. Os artigos 152.º e seguintes do Código da Estrada regem sobre o procedimento para a fiscalização da condução sob influência de álcool ou de substâncias psicotrópicas, determinando o respectivo artigo 158.º, n.º1, que são fixados em regulamento, além do mais: o tipo de material a utilizar na fiscalização e nos exames laboratoriais para determinação dos estados de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas; os métodos a utilizar para a determinação do doseamento de álcool ou de substâncias psicotrópicas no sangue. A matéria da fiscalização da condução sob o efeito do álcool foi objecto de regulamentação pelo Decreto Regulamentar n.º 24/98, de 30 de Outubro, diploma que distinguia entre aparelhos analisadores de medição “qualitativos” e os aparelhos “quantitativos” - os primeiros com meras funções de despistagem/triagem, após o que os condutores seriam submetidos aos analisadores "quantitativos" ou a exame hematológico - cfr. art. 1.º, n.º 1, do mencionado diploma. O referido Decreto Regulamentar n.º 24/98, de 30 de Outubro, foi revogado pela Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio, que aprovou o Novo Regulamento da Fiscalização da Condução sob o Efeito do Álcool, não tendo procedido, todavia a alterações relevantes para os efeitos que ora interessam. No artigo 1.º, do Regulamento de Fiscalização, enunciam-se os meios de detecção e medição da taxa de álcool no sangue, designadamente, analisadores qualitativos e quantitativos, estes por teste no ar expirado ou análise de sangue. No artigo 14.º prescreve-se que nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só podem ser utilizados aparelhos que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, exigindo-se, previamente a esta aprovação, a existência de homologação de modelo, da competência do Instituto Português da Qualidade, de acordo com os termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros. No caso dos autos não está em causa a utilização de um aparelho de medição “qualitativo”, mas sim um aparelho de medição “quantitativo” - aparelho Drager mod.7110MKIII P, aprovado pela D.G.V. conforme despacho nº.12594/07, de 16-3. Como aparelho de medição quantitativo, tal instrumento está sujeito a operações de controlo metrológico. A Portaria n.º 748/94, de 3 de Outubro, aprovou o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, o qual nos termos do seu artigo 3.º, definia “os erros máximos admissíveis para a Primeira Verificação (PV) e Verificação Periódica (VP) em teor de álcool expirado (TAE) e convertido em Teor de Álcool no Sangue (TAS)” em conformidade com a tabela anexa. A Portaria n.º 748/94 foi revogada pela Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro (art. 2.º), que procedeu à aprovação do novo regulamento a que deve obedecer o controlo metrológico dos alcoolímetros, estabelecendo o respectivo n.º1 que o regulamento aplica-se «a alcoolímetros quantitativos ou analisadores quantitativos.» Por outro lado, o artigo 5.º do mesmo Regulamento (quer o primitivo quer o novo) estabelece: «O controlo metrológico dos alcoolímetros é da competência do Instituto Português da Qualidade, I.P. - IPQ e compreende as seguintes operações: a) Aprovação do modelo; b) Primeira verificação; c) Verificação periódica; d) Verificação extraordinária». O artigo 8.º do referido Regulamento, sob a epígrafe “Erros Máximos Admissíveis”, estabelece: «Os erros máximos admissíveis (EMA), variáveis em função do teor de álcool no ar expirado (TAE) são os constantes do quadro anexo ao presente diploma e que dele faz parte integrante.» O quadro referido é o seguinte: O n.º 2, do artigo 9º, prescreve, por seu turno: «Os registos da medição devem conter, entre outros elementos, a marca, o modelo e o número de série do alcoolímetro assim como a data da última verificação metrológica.» Finalmente, na Portaria n.º 902-B/2007, de 13 de Agosto, especificam-se as características técnicas, gerais e físicas, a que devem obedecer os analisadores quantitativos, entre elas, que os referidos instrumentos devem «cumprir os requisitos metrológicos e técnicos definidos no regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros» e «usar a unidade de leitura em gramas de álcool por litro de sangue (TAS) segundo o factor fixado no nº 3 do artigo 81º, do Código da Estrada». 5. Para quem perfilha o entendimento de que é inadmissível a subtracção da margem de EMA ao valor indicado no aparelho utilizado numa medição concreta, a previsão da referida margem reporta-se tão-somente à Aprovação e às Verificações periódicas subsequentes realizadas pelo IPQ como condição da homologação e aprovação dos aparelhos de medição. A Metrologia Legal é o ramo da Metrologia, que trata das exigências legais, técnicas e administrativas, relativas às unidades de medida, aos métodos de medição, aos instrumentos de medição e às medidas materializadas, fornecendo um quadro destinado a conferir às medições um nível básico de segurança, que passa nomeadamente por um sistema de unidade definida, estrita verificação e calibração dos instrumentos de medição e definição de um conjunto de erros máximos admissíveis. Sobre esta temática e em abono do supra referido entendimento – que sustenta a não consideração da margem de EMA -, tem sido largamente citada a comunicação apresentada por Maria do Céu Ferreira e António Cruz no 2.º Encontro Nacional da Sociedade Portuguesa de Metrologia, em 17 de Novembro de 2006, com o título CONTROLO METROLOGICO DE ALCOOLÍMETROS NO INSTITUTO PORTUGUÊS DA QUALIDADE. Nessa comunicação podemos ler: «A definição, através da Portaria n.º 748/94, de determinados erros máximos admissíveis, quer para a Aprovação de Modelo e Primeira Verificação, quer para a Verificação Periódica, visa definir barreiras limite dentro das quais as indicações dos instrumentos de medição, obtidas nas condições estipuladas de funcionamento, são correctas. Ou seja, um alcoolímetro de modelo aprovado e com verificação válida, utilizado nas condições normais, fornece indicações válidas e fiáveis para os fins legais.» Mais adiante: «Os EMA são limites definidos convencionalmente em função não só das características dos instrumentos, como da finalidade para que são usados. Ou seja, tais valores limite, para mais e para menos, não representam valores reais de erro, numa qualquer medição concreta, mas um intervalo dentro do qual, com toda a certeza (uma vez respeitados os procedimentos de medição), o valor da indicação se encontra. É sabido que a qualquer resultado de medição está sempre associada uma incerteza de medição, uma vez que não existem instrumentos de medição absolutamente exactos. Esta incerteza de medição é avaliada no acto da aprovação de modelo por forma a averiguar se o instrumento durante a sua vida útil possui características construtivas, por forma a manter as qualidades metrológicas regulamentares, nomeadamente fornecer indicações dentro dos erros máximos admissíveis prescritos no respectivo regulamento.» (www.spmet.pt/comunicacoes_2_encontro/Alcoolimetros_MCFerreira.pdf) Em termos conclusivos, dizem os referidos autores: «O valor da indicação do instrumento é em cada situação, o mais correcto. O eventual erro da indicação, nesse momento, nessa operação, com o operador que a tiver efectuado, nas circunstâncias de ambiente locais, quaisquer que tenham sido outros factores de influência externos ou contaminantes do ar expirado, seja ele positivo ou negativo, está com toda a probabilidade contido nos limites do EMA.» Do teor desta comunicação não logramos extrair, como conclusão, que o tribunal não possa fazer uso das margens de erro dos aparelhos de medição para reduzir tanto quanto possível a divergência entre o resultado do exame e a realidade. Ainda que na referida comunicação se diga que os EMA não representam valores reais de erro, certo é que se realça que tais valores representam um intervalo dentro do qual, com toda a certeza, o valor da indicação se encontra. Admitindo que a margem de erro legalmente admissível é tida em conta no momento da calibração do aparelho, tal facto apenas garante que o aparelho em concreto está apto a efectuar medições e que os resultados obtidos sempre se situarão dentro dos limites daquelas margens de erro. Por outras palavras, como se assinala no Acórdão da Relação de Lisboa, de 7 de Maio de 2008 (Proc. n.º 2199/08-3), se o aparelho se encontra aprovado, se foi sujeito à verificação periódica e está a funcionar regularmente, o tribunal tem todas as razões para ter por seguro, para além de qualquer dúvida razoável, que o examinado tinha a taxa de álcool que resulta da subtracção da margem de erro máximo admissível ao valor indicado pelo aparelho. Diz-se nesse aresto (excluem-se as menções a notas de rodapé): «Embora nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só possam ser utilizados analisadores que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, sendo a aprovação precedida de homologação de modelo, a efectuar pelo Instituto Português de Qualidade, nos termos do Regulamento do Controlo Metrológico de Alcoolímetros (n.º 1 e 2 do artigo 14º), regulamento esse que impõe o respeito pela Recomendação n.º 126 da Organização Internacional da Metrologia Legal (OIML R 126), os valores determinados pelos aparelhos não são completamente precisos, havendo sempre uma determinada margem de erro que não obsta à aprovação do modelo e à certificação de cada aparelho na primeira verificação e nas verificações sucessivas. Daí que, como se afirma no ponto 5 da Recomendação n.º 126 da OIML, mesmo com um aparelho aprovado e sujeito a verificação periódica, exista ou possa existir em cada medição individual uma certa imprecisão. Se em 95% das medições essa imprecisão não deve ultrapassar os valores referidos no ponto 5.2.2 da OIML R 126, os quais são claramente inferiores à margem de erro admissível do aparelho, nas restantes medições a imprecisão pode ser superior. Estando a aprovação do modelo e a certificação de cada aparelho na primeira verificação e nas verificações seguintes sujeitas à não ultrapassagem da margem de erro admissível fixada, consoante o caso, nos pontos 5.1.1 a 5.1.3 da OIML R 126 e no quadro anexo à Portaria n.º 1556/2007, de 10 de Dezembro, o tribunal não pode estar seguro de que o condutor fiscalizado, em cada caso concreto, tenha conduzido o veículo com a exacta taxa de álcool indicada pelo aparelho.» No caso em apreço, acresce que, ao contrário do exigido pelo n.º 2, do artigo 9.º, da Portaria n.º 1556/2007, de 10/12, o registo da medição nem sequer contém a data da última verificação metrológica, como se infere da documentação para a qual remete a motivação da decisão sobre a matéria de facto. 6. Questões idênticas têm sido colocadas noutros países, a propósito da medição da taxa de alcoolemia relevante para fins sancionatórios. Nos E.U.A., as questões colocadas pelos testes de «DUI» (driving under the influence) ou «DWI» (driving while intoxicated), realizados através dos «breath tests», por não medirem directamente a taxa de álcool no sangue, mas antes o fazerem através da conversão de valores obtidos no ar expirado por meio de instrumentos de medição que comportam margens de erro, constituem um tema de eleição em disputas judiciárias com origem na condução em estado de embriaguez, com tratamento diverso conforme o Estado em que ocorram. Em França, o Décret n.º 85-1519 du 31 décembre 1985 (consultar em http://www.legifrance.gouv.fr.), relativo aos instrumentos destinados à medição da concentração de álcool no ar expirado, estabeleceu, no seu artigo 3.º, os seguintes erros máximos tolerados «sur la mesure de la concentration d'alcool éthylique, en plus ou en moins, sur les instruments en service»: «- 0,032 milligramme par litre, pour toute concentration inférieure à 0,40 milligramme par litre ; - 8 centièmes, en valeur relative, pour toute concentration supérieure ou égale à 0,40 milligramme par litre et inférieure à 1 milligramme par litre ; - 15 centièmes, en valeur relative, pour toute concentration supérieure ou égale à 1 milligramme par litre et inférieure à 2 milligrammes par litre ; - 30 centièmes, en valeur relative, pour toute concentration supérieure ou égale à 2 milligrammes par litre.» Entretanto, sobre essa matéria veio reger o Décret n.º 2001-387 du 3 mai 2001 e o artigo 15.º do Arrêté du 8 juillet 2003 relativo ao controlo dos alcoolímetros (designados de éthylomètres - consulta em http://droit.org/jo/20030720/INDI0301735A.html). Reconhecendo a legislação francesa, como não poderia deixar de ser, a existência de margens de erro dos éthylométres, tem-se colocado, como em Portugal, a questão de saber se essas margens devem ser consideradas apenas no momento da aprovação e da verificação periódica dos aparelhos de medição ou se podem ser ponderadas nas medições concretamente efectuadas aos condutores. Sobre essa questão pronunciou-se recentemente a Chambre Criminelle da Cour de Cassation, em 24 de Junho de 2009, no pourvoi 09-81119, sobre decisão que havia sido tomada pela Cour d`Appel de Poitiers. A referida Cour d`Appel tinha decidido que o preceito relativo às margens de erro é apenas aplicável nas verificações periódicas dos éthylomètres e não nos controlos efectuados aos condutores. Ora, a Cour de Cassation, diversamente, ainda que tenha rejeitado o pourvoi, não deixou de dizer que «Si c'est à tort qu'un arrêt énonce que les marges d'erreur prévues par les articles 3 du décret du 31 décembre 1985 et 15 de l'arrêté du 8 juillet 2003 ne peuvent s'appliquer à une mesure effectuée lors d'un contrôle d'alcoolémie, il n'encourt pas pour autant la censure dès lors que l'interprétation des mesures du taux d'alcoolémie effectuées au moyen d'un éthylomètre constitue pour le juge une faculté et non une obligation» (ou seja, ensaiando uma tradução: se é sem razão que a sentença enuncia que as margens de erro previstas pelas disposições regulamentares em causa não se podem aplicar a uma medida efectuada aquando de um controlo de alcoolemia, apesar disso a sentença não incorre em censura porque a interpretação das medidas da taxa de alcoolemia efectuada por meio de um etilómetro constitui para o juiz uma faculdade e não uma obrigação - http://www.legifrance.gouv.fr/affichJuriJudi.do?oldAction=rechJuriJudi&idTexte=JURITEXT000020903672). Reconhece-se, por conseguinte, a admissibilidade de consideração das margens de erro legalmente previstas nas medições concretamente efectuadas, segundo o critério do julgador. É o que ocorre, aliás, com os controladores de velocidade ou cinemómetros, também sujeitos a controlo metrológico e que comportam, como acontece com qualquer instrumento de medição, margens de erro, distinguindo-se a velocidade medida, da velocidade considerada, como faz expressamente, entre nós, a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), no respectivo sítio (veja-se o quadro sobre equipamentos de fiscalização disponível em http://www.ansr.pt/Default.aspx?tabid=102&language=pt-PT). Também em França, a lei, através do Arrêté du 4 juin 2009 relatif aux cinémomètres de contrôle routier, fixou as margens de erro dos cinemómetros, a deduzir no controlo de velocidade efectuado por radar, conforme se trate de radar fixo ou instalado em veículo em movimento (http://legifrance.gouv.fr/affichTexte.do?cidTexte= JORFTEXT00002 0777051). Pese embora a existência de controlo metrológico dos controladores de velocidade, mal se compreende que se proceda à dedução de margens de erro nos resultados obtidos pelos mesmos e que se actue de forma diversa no controlo da alcoolemia, mormente quando da taxa de álcool apurada depende o preenchimento de um crime ou de um mero ilícito contra-ordenacional, o que ocorre quando a taxa se encontre na fronteira entre os dois tipos de ilícito. Na vizinha Espanha, o artigo 379.º do Código Penal previa a condução sob o efeito de drogas tóxicas, estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou de bebidas alcoólicas, sem, no entanto, fixar qualquer taxa de alcoolemia para o preenchimento do tipo de crime. A prática normalmente adoptada passava pela utilização de um etilómetro evidencial, aprovado pelo Centro Español de Metrologia que, conjugadamente com outros elementos de prova, permitisse determinar o efeito das bebidas alcoólicas e similares nas faculdades necessárias para conduzir. Em todo o caso, desde Maio de 1999 que uma taxa de álcool superior a 0,25 mg. no ar expirado ou 0,5 g/l no sangue fazia incorrer o condutor numa infracção de natureza administrativa, entendendo-se, porém, que a mera circunstância de se exceder a referida taxa de álcool não determinava a subsunção da conduta ao tipo criminal (sobre esta matéria ver Francisco Muñoz Conde, Derecho Penal – Parte Especial, tirant le blanch, 12.ª ed., pp. 653 e segs.). Através da Ley Orgánica 15/2007, de 30 de noviembre, procedeu-se à alteração do Código Penal, passando o artigo 379.º a contar com dois números, sendo o n.º2 relativo à condução de veículo com motor ou ciclomotor sob a influência de drogas tóxicas, estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou de bebidas alcoólicas, estabelecendo-se que será condenado com as penas previstas no número anterior quem conduzir com uma taxa de álcool no ar expirado superior a 0,60 mg/l ou com uma taxa de álcool no sangue superior a 1,2 g/l. Na sequência desta alteração legislativa ganhou renovada importância a questão da determinação da taxa de álcool para marcar a fronteira entre o ilícito penal e o ilícito de natureza administrativa (tendo em vista o que sobre este determinava o Real Decreto 1428/2003, de 21 de noviembre). Existindo o indispensável controlo metrológico que é exercido pelo Centro Español de Metrologia, a legislação aplicável, mais concretamente o Real Decreto 889/2006 de 21 de julio e a ORDEN ITC/3707/2006, de 22 de noviembre (esta em BOE n.º 292, de 7.12.2006, ambos disponíveis no sítio do referido Centro ou do Boletín Oficial del Estado) fixam as margens de erro dos aparelhos de medição do álcool, etilómetros, nos artigos 9.º e 15.º da referida Orden, por referência ao anexo segundo do diploma. Ainda assim, não tem deixado de colocar-se a questão da consideração dessas margens de erro nas concretas operações de medição do álcool efectuadas aos condutores, resultando das consultas efectuadas que tem sido largamente defendida, inclusivamente ao nível da Fiscalia em diversos tribunais, a correcção dos resultados das medições efectuadas pelos etilómetros através da consideração das margens de erro. Assim, para além dos utilíssimos elementos que se colhem no voto de vencido do Dr. Pedro Martins, no Acórdão da Relação de Lisboa, de 27 de Outubro de 2009 (aresto acima referido), salientamos as CONCLUSIONES DE LAS JORNADAS DE FISCALES DELEGADOS DE SEGURIDAD VIAL, que tiveram lugar nos dias 17 e 18 de Janeiro de 2008, em Madrid, em que se faz expressa menção há necessidade de valoração das margens de erro dos etilómetros e dos cinemómetros (http://aspex.juntaex.es/CONCLUSIONES_REDUCIDAS.pdf). Segundo se colhe da INSTRUCCIÓN GENERAL da Fiscalía Provincial de Las Palmas, o Fiscal General del Estado aprovou, em 7 de Março de 2008, as conclusões das referidas jornadas de Madrid (http://www.policialocallaspalmasdegrancanaria.com/carpeta/InstruccionGeneralPoliciaAbril2008.pdf). Relativamente à prova por «etilómetro», Jesús Barquín Sanz e Juan de Dios Luna del Castillo, professores titulares de Direito Penal e de Estatística e Investigação Operativa, respectivamente, da Universidade de Granada, reportando-se precisamente ao etilómetro evidencial Dräger Alcotest 7110, abordam especificamente a questão da tolerância e margens de erro na prova por etilómetro. A primeira a considerar, segundo os referidos autores, é a correspondente ao erro técnico admissível nos instrumentos de medição utilizados, conforme reconhecido pela Dirección General de Tráfico, na sua Instrucción 02/S 61, de 15 de Abril de 2002. E concluem serem favoráveis à observação das margens de erro por conferirem garantias à prova, pois graças à consideração de tais margens «se puede tener una razonable confianza en que, quien es denunciado por conducir superando los límites de alcohol, lleva verdaderamente en sangre tasas de etanol que superan com claridad lo permitido». Salientam esses autores que os erros de medição dos instrumentos técnicos não são hipóteses metafísicas nem enteléquias, mas factos comprovados, e que aos princípios e garantias do direito sancionador repugna a ideia de castigar indiscriminadamente, havendo que recorrer às margens de tolerância que, com sólido fundamento técnico, são tidas em conta no ordenamento jurídico (INGESTA MODERADA DE ALCOHOL Y PRUEBA DEL ETILÓMETRO - Evolución de la concentración de etanol en aire espirado tras consumo moderado de alcohol siguiendo el rito social; factores asociados con esta evolución y con lapercepción de mareo y de incapacidad de conducción tras dicho consumo, Revista Electrónica de Ciencia Penal y Criminología ARTÍCULOS, RECPC 07-15 (2005), http://criminet.ugr.es/recpc). 7. Revertendo ao caso concreto em apreço, temos que o tribunal decidiu que à taxa de alcoolemia no sangue registada pelo alcoolímetro correspondia a taxa de, pelo menos, 1,18 g/l, uma vez deduzido o valor de erro máximo admissível. Estamos precisamente perante um caso de fronteira, em que a consideração ou não do EMA determina a diferente qualificação jurídica dos factos no quadro do ilícito de natureza contra-ordenacional ou do ilícito criminal. Desde já adiantamos que não nos parece que a questão se resolva com recurso ao regime do artigo 344.º, n.º1 e 2, do C.P.P., no que concerne à confissão integral e sem reservas. Realmente, se é certo que da acta da audiência de julgamento resulta que o arguido confessou integralmente e sem reservas os factos, afigura-se-nos que tal confissão não tem a virtualidade de abranger a TAS de 1,28 g/l indicada no talão do alcoolímetro. Nos termos do disposto no artigo 140.º, n.º 2, do C.P.P., «Às declarações do arguido é correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 128.º e 138.º, salvo quando a lei dispuser de forma diferente», consignando-se no n.º 1, do artigo 128.º: «A testemunha é inquirida sobre factos de que possua conhecimento directo e que constituam objecto de prova.» Como se realça no Acórdão desta Relação, de 26 de Novembro de 2008, Proc. n.º 0812537, da conjugação destes dois normativos ressalta que, quer as declarações do arguido, quer o depoimento das testemunhas, só assumem relevância em relação aos factos que sejam do conhecimento daquele que os relata, sendo que outro entendimento é susceptível de conduzir a que a verdade material, cuja descoberta o processo penal visa alcançar, pudesse ser alicerçada na confissão de factos não verdadeiros ou cuja veracidade o arguido não tivesse capacidade para afirmar por ultrapassarem aquilo que é capaz de apreender. Em consequência, «os limites da capacidade cognitiva individual serão também os limites daquilo que, de forma juridicamente relevante, pode ser declarado ou deposto – e, portanto, também confessado. A contrario, tudo o que esteja para além desses limites ou constitui declaração ou depoimento irrelevante, não podendo valer mais do que uma mera opinião, ou constitui raciocínio lógico-dedutivo que, se pertinente, o tribunal também terá de fazer e de forma autónoma». Dito de outro modo: só se pode confessar o que, efectivamente, é susceptível de ser confessado. O arguido pode confessar que ingeriu vários copos de vinho ou outras bebidas alcoólicas, que estava convencido de que, se fiscalizado, acusaria uma taxa muito superior ao legalmente permitido e que tendo feito o teste do álcool acusou uma taxa de x g/l de álcool no sangue. Mas já não parece que possa confessar que conduzia com uma determinada taxa de álcool no sangue, pois falta-lhe, para o efeito, razão de ciência A prova da concreta taxa de álcool no sangue, nos termos legais, só pode ser feita através de teste no ar expirado ou por meio de análise ao sangue, pelo que não se vislumbra que possa ser provada por meio de confissão ou por depoimento. Do que se extrai que o arguido tinha efectivamente conhecimento (porque compreendidos tais factos nos limites da sua capacidade cognitiva) de que estava a conduzir um veículo automóvel ligeiro de passageiros na via pública, depois de ter ingerido bebidas alcoólicas em quantidades que lhe podiam determinar uma TAS igual ou superior a 1,2 g/l, bem sabendo o carácter proibido e punível de tal conduta; que a taxa de alcoolemia no sangue, registada no teste de detecção e quantificação de álcool no sangue, por meio de analisador quantitativo, era de 1,28 gr./l. Contudo, a circunstância de o alcoolímetro indicar uma certa TAS não significa que quem foi submetido ao teste necessariamente seja portador dessa exacta TAS e, novamente prosseguindo na esteira do citado Acórdão de 26 de Novembro de 2008, «ultrapassando obviamente as capacidades cognitivas do arguido, como de qualquer ser humano, a determinação da concreta TAS de que era portador – resultado que só é alcançável, pelo menos com o rigor exigível, através de exame realizado mediante a utilização de aparelho próprio para o efeito – não podia ele validamente confessar um facto que não podia conhecer». Este entendimento não põe em causa a prova resultante do instrumento de medição, designadamente a fé sobre os factos presenciados que o artigo 170.º do Código da Estrada reconhece ao auto de notícia e «aos elementos de prova obtidos através de aparelhos ou instrumentos aprovados nos termos legais e regulamentares.» Embora se trate de um caso de prova (pesquisa no ar expirado) a fazer necessariamente através de utilização de aparelho próprio para o efeito, tem-se debatido se o analisador quantitativo visa obter prova documental, uma vez que o resultado consubstancia uma «notação corporizada em escrito ou qualquer outro meio técnico, nos termos da lei penal» - artigo 164.º, n.º 1, do C.P.P., e artigos 255.º, alínea b), e 258.º, do Código Penal, – e não prova pericial porque, para este efeito, não tem lugar uma percepção ou apreciação de factos que exijam «especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos» - artigo 151.º do C.P.P. (é o entendimento perfilhado no Ac. da Relação de Lisboa, de 7 de Maio de 2008, no proc. n.º 2199/2008-3; também no sentido de que não se trata de prova pericial, Paula Melo, Condução sob influência do álcool – Apreciação dos meios de prova, Maia Jurídica, Revista de Direito, Ano II, n.º2, Julho-Dezembro de 2004). Diversamente, há quem sustente que os «métodos alcoolímetros consistem em actos de prova preconstituída, de carácter pericial» (Benjamim Rodrigues, Da prova penal, Tomo I, Coimbra 2008, p. 117). Em Espanha, relativamente à prova da taxa de álcool por alcoolímetro/etilómetro a questão tem sido de há muito suscitada, ora sendo entendida como prova secundária em relação à prova testemunhal que era prestada pelos agentes autuantes (sobretudo quando o tipo legal de crime não estipulava uma taxa concreta, como já acima se assinalou), ora definida como prova pericial preconstituída “lato sensu” (sobre esta questão ver, por exemplo, o texto NUEVA DOCTRINA JURISPRUDENCIAL DEL TRIBUNAL SUPREMO Y DEL TRIBUNAL CONSTITUCIONAL EN MATERIA DE PRUEBA EN EL PROCESO PENAL, Sevilla, 6 y 7 Mayo 2009, http://www juntadeandalucia.es/justicia/fiscales/cda/views/channel/adri_fis_mostrar_contenidos_canal_subcanales/0,21452, 12351747_52678719,00.html) A verdade, porém, é que em qualquer caso, terá de ser sempre no respeito dos próprios limites dos equipamentos em causa – legalmente previstos – que a prova deve ser apreciada. Ora, como já se assinalou, ainda que a margem de erro legalmente admissível seja levada em conta no momento da calibração do aparelho, tal facto apenas garante que o aparelho em concreto está apto a efectuar medições e que os resultados obtidos sempre se situarão dentro dos limites definidos por aquelas margens de erro. Em termos gerais, mas sobretudo numa situação como a dos autos, em que a alcoolemia registada pelo alcoolímetro se situa precisamente na fronteira que delimita a contra-ordenação do crime, para mais sem que conste a data da última verificação metrológica, afigura-se-nos inteiramente justificada a decisão do tribunal recorrido, que atendeu ao erro máximo admissível, deduzindo-o ao valor registado no talão emitido pelo alcoolímetro, o que se impõe desde logo por força do princípio in dubio pro reo. Estamos perante uma incerteza balizada por normas do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, resultante das margens de erro toleradas, que o tribunal não pode ignorar sob pena de, uma vez desconsideradas, poderem levar à condenação do arguido por crime sem que a taxa real de álcool chegue a atingir o limiar que define o ilícito criminal ou, em todo o caso, com efeitos desfavoráveis ao nível da determinação da sanção. Do que se conclui no sentido da inexistência de qualquer erro notório na apreciação da prova que justifique a alteração da decisão recorrida. 8. Face ao exposto, a pretensão do Ministério Público de que o arguido seja condenado pela prática do crime, p. e p. pelos artigos 292.º, n.º 1 e 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, não pode deixar de ser considerada improcedente, ficando prejudicada a questão da aplicação ao arguido da pena de multa e sanção acessória de proibição de conduzir. Todavia, conforme estabelecido no artigo 77.º, n.º 1, do Decreto-Lei nº 433/82, de 21 de Outubro, o tribunal poderá apreciar como contra-ordenação uma infracção que foi acusada como crime, prevendo-se neste normativo exactamente a situação em que a acusação foi deduzida por crime e no julgamento se apura que os factos constituem apenas infracção contra-ordenacional. Estando em causa uma taxa de álcool no sangue de 1,18 g/l, o tribunal a quo deveria ter apreciado a responsabilidade do arguido pela prática da contra-ordenação muito grave [artigo 146.º, alínea j), do Código da Estrada] que integra a sua conduta. Em consequência, a decisão recorrida deverá ser substituída por outra que, apreciando a responsabilidade contra-ordenacional do arguido, lhe aplique, se for o caso, as sanções correspondentes III – Dispositivo Em face do exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal desta Relação em julgar improcedente o recurso interposto pelo Ministério Público, determinando, porém, que o tribunal de 1.ª instância, em face da matéria de facto provada, aprecie a eventual responsabilidade contra-ordenacional do arguido. Sem tributação. Porto, 6 de Janeiro de 2010 (Consigna-se que o acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo primeiro signatário – artigo 94.º, n.º2, do C.P.P.) Jorge Manuel Baptista Gonçalves Adelina da Conceição Cardoso Barradas de Oliveira