Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO 1º recurso Recorrente: Susana ... (…) Recorrida: Maria ... (…) 2º recurso Recorrente: Maria ... (…) Recorrida: Susana ... (…) Susana ... (…) veio propor a presente ação declarativa de condenação contra Maria ... (..), peticionando que: (i) se declare a nulidade das duas declarações de reconhecimento de obrigação pecuniária, acordo de pagamento e constituição de garantia, do contrato de arrendamento e da cessão da posição contratual da trabalhadora, por simulados, nos termos do artigo 240º, nº 2, do Código Civil, ou anuláveis, nos termos dos artigos 247º e 251º do Código Civil, com as devidas consequências legais; (ii) se declare nulo o contrato de trespasse dissimulado, nos termos do artigo 241º, nº 1, e do artigo 220º, do Código Civil, com as devidas consequências legais; (iii) se condene a Ré no pagamento à Autora de uma indemnização no valor de € 50.000,00 por abuso de direito, nos termos do artigo 334º do Código Civil; (iv) se condene a Ré no pagamento à Autora de uma indemnização no valor de € 79.895,93, por danos patrimoniais, nos termos dos artigos 562º e 564º, nº 1, do Código Civil; e (v) se condene a Ré no pagamento à Autora de uma indemnização no valor de € 40.000,00 por danos não patrimoniais, nos termos do artigo 496º do Código Civil. Alega, para tanto e em síntese, que a Ré trespassou para si três estabelecimentos comerciais ((…) – Acessórios de Moda, Ala (…) e In (…)) que funcionam em espaços sitos na Avenida (…), em Viana do Castelo, tendo as partes, para concretizarem tal intenção, celebrado um contrato de arrendamento para fins não habitacionais, um contrato de cessão da posição contratual, em que a Ré lhe cedeu a sua posição de entidade patronal relativamente à empregada da primeira dos mencionados estabelecimentos, e tendo, para o mesmo efeito, a Autora assinado dois documentos intitulados reconhecimento de obrigação pecuniária, acordo de pagamento e constituição de garantia. Mais alega que, tendo entregado à Ré a quantia de € 78.354,37 e faltando, de acordo com aqueles dois últimos documentos, pagar a quantia de € 56.550,00, a Ré a passou impedir de explorar normalmente os negócios trespassados, fazendo queixas à ASAE, proibindo-a de usar a marca (...) – Acessórios de Moda, registada a seu favor, facto que desconhecia, e tentando que os fornecedores deixassem de a fornecer e passassem a fornecer uma nova loja que, entretanto, abriu a 30 metros da loja principal da Autora, o que fez com que tivesse sido obrigada a mudar o nome da sua loja e a clientela ficado confusa, motivando a diminuição das receitas. Alega, ainda, os danos patrimoniais, ao nível do seu negócio, e não patrimoniais que a conduta da Ré lhe provocou. A Ré contestou, defendendo-se por impugnação. Em sede de audiência prévia, foi o processo saneado, definido o objeto do litígio e selecionados os temas de prova. *Realizou-se audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais. *Foi proferida sentença com a seguinte parte dispositiva: “Em face do exposto, julgo a acção proposta por Susana ... (…) contra Maria ... (…) parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente, declarando a nulidade do contrato de trespasse celebrado entre as partes em 28 de Janeiro de 2015, dos acordos de reconhecimento de obrigação pecuniária, acordo de pagamento e constituição de garantia, assinados na mesma data, do contrato de arrendamento com prazo certo para fins não habitacionais com fiança, celebrado em 1 de Janeiro de 2015, e do contrato de cessão da posição contratual em contrato de trabalho, celebrado em 28 de Janeiro de 2015: Condeno a Autora a restituir à Ré o arrendado mencionado em b) e os estabelecimentos comerciais mencionados nas alíneas c) e d), com todo os móveis e existências à data da celebração do trespasse, ou, quanto a estas últimas, o respectivo valor à mesma data; Condeno a Ré a restituir à Autora todas as quantias recebidas, em consequências dos acordos supra referidos, deduzidas do valor recebido a título de rendas pela ocupação do espaço mencionado em b); Relego para execução de sentença o apuramento dos valores supra referidos, ao abrigo do disposto no artigo 609º, nº 2, do Código de Processo Civil. Custas por Autora e Ré, em partes iguais”. *A Autora apresentou recurso de apelação, pugnando por que seja dado provimento ao recurso, proferindo-se acórdão a suprir a nulidade parcial da sentença por violação do artigo 608º, n. º2 e do artigo 615º, n. º1, al. d), ambos do CPC, na parte em que o julgador decide não se pronunciar sobre os pedidos indemnizatórios, aproveitando-se todo o demais e a conhecer e decidir os pedidos indemnizatórios formulados na petição inicial, a saber: A) condenar a recorrida no pagamento à recorrente de uma indemnização no valor de € 50.000,00 por abuso de direito, nos termos do artigo 334º do CC; B) condenar a recorrida no pagamento à recorrente de uma indemnização no valor de €79.895,93 por danos patrimoniais, nos termos do artigo 562º e 564º, n. º1 do CC; C) condenar a recorrida no pagamento à recorrente de uma indemnização no valor de €40.000,00 por danos não patrimoniais, nos termos do artigo 496º do CC”. Após o corpo das alegações escreve o seguinte: “CONCLUSÕES: A) A douta sentença, datada de 19 de junho de 2018, julgou parcialmente procedente a ação de processo comum que correu seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de (…), Juízo Central Cível, Juiz 4, sob o n.º 3113/17.6T8VCT, da qual é autora a ora recorrente. B). Na sua petição inicial, a recorrente peticionou a procedência da ação e em consequência, dos seguintes pedidos: “a) Declarar a nulidade das duas declarações de “reconhecimento de obrigação pecuniária acordo de pagamento e constituição de garantia”, do contrato de arrendamento e da cessão de posição contratual da trabalhadora, por simulados, nos termos do artigo 240º, n.º 2 do CC, ou anuláveis nos termos dos artigos 247º e 251º do CC, com as devidas consequências legais; b). Declarar nulo o contrato de trespasse dissimulado, nos termos do artigo do artigo 241º, n. º1 como, nos termos do artigo 220º, com as devidas consequências legais; c). Condenar a ré no pagamento a autora de uma indemnização no valor de 50.000,00€ por abuso de direito nos termos do artigo 334º do CC; d). Condenar a ré no pagamento a autora de uma indemnização no valor de 79.895,93€ por danos patrimoniais nos termos do artigo 562º e 564º, n. º1 do CC; e). Condenar a ré no pagamento a autora de uma indemnização no valor de 40.000,00€ por danos não patrimoniais nos termos do artigo 496º do CC.” C). Procederam, com as demais consequências legais, as alíneas a) e b), provando-se a existência de um negócio simulado e de um negócio dissimulado, o primeiro nulo por simulção e o segundo por falta de forma. D). Contudo, o meritíssimo juiz a quo não se pronunciou relativamente aos três pedidos indemnizatórios contidos nas alíneas c), d) e e), recaindo nessa omissão o objeto do presente recurso. E). Pois, por muito respeito que mereça o vertido na douta sentença de que se recorre, a recorrente não pode, de modo algum, deixar passar em branco a questão da indemnização que merece ser aprofundada de forma atenta e prudente. Apreciemos, pois, o problema em causa: F) Entendeu o tribunal a quo que, julgadas as alíneas a) e b) e face a “invalidade formal do negócio celebrado pelas partes, fica prejudicado o conhecimento do restante peticionado”, isto nos termos do artigo 608º, n.º 2 do CPC. G). Ora, o normativo invocado para descartar o conhecimento destes pedidos diz que o julgador só não terá de se pronunciar sobre TODAS as questões que as partes tenham submetido se a solução dada a uma ou umas das questões prejudicar a decisão de outras. H) O meritíssimo juiz a quo considerou que a invalidade formal do trespasse celebrado entre as partes impossibilita o conhecimento dos pedidos indemnizatórios. Mas não explica em que medida.... Pois, qual é a relação de prejudicialidade existente entre essas questões? I) A existir, essa conexão deveria ter sido muito bem fundamentada na sentença na medida em que abre a porta ao julgador para se inibir de se pronunciar sobre questões formuladas. J) A recorrente entende e irá demonstrar (coisa que não foi feita na sentença), que inexiste qualquer conexão de prejudicialidade entre as questões decididas e as questões por decidir. K). Sobre esta questão o Supremo Tribunal de Justiça pronunciou-se dizendo que “A nulidade consistente na omissão de pronúncia ou no desrespeito pelo objecto do recurso, em directa conexão com os comandos ínsitos nos artºs. 608.º e 609.º do CPC, só se verifica quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões ou pretensões que devesse apreciar e cuja apreciação lhe foi colocada. A expressão «questões» prende-se com as pretensões que os litigantes submetem à apreciação do tribunal e as respectivas causas de pedir e não se confunde com as razões (de facto ou de direito), os argumentos, os fundamentos, os motivos, os juízos de valor ou os pressupostos em que as partes fundam a sua posição na controvérsia.” – Cf. Acórdão do STJ de 03/10/2017, no âmbito do processo n.º <a href="https://acordao.pt/decisoes/136952" target="_blank">2200/10.6TVLSB.P1</a>. S1 (nosso negrito). L). De facto, não estão aqui em causa argumentos ou juízos de valores, mas sim, questões levantadas na causa de pedir e concretizadas no pedido. M) E quanto a esses pedidos, a petição inicial não os apresenta de forma subsidiária em que requer que, caso não vençam os dois primeiros pedidos sobre a declaração de nulidade do contrato então se aprecie a procedência dos três pedidos indemnizatórios. N). Pois, a petição inicial apresenta cinco pedidos, todos eles cumulativos que podem ser apreciados de forma isolada e individual na medida em que a decisão aplicada numa das alíneas não influenciará nem fará depender a decisão aplicada nas outras. O). De facto, quer o tribunal tivesse decidido pela validade do trespasse ou não, tal não condicionava os pedidos indemnizatórios que devem ter em conta mais do que o contrato em si, mas também toda a conduta da ré e as consequências da mesma na esfera jurídica da autora. Analisando um por um: P). Relativamente ao primeiro pedido indemnizatório, este visa ressarcir a autora devido a má-fé, ao dolo e ao abuso de direito na modalidade de venire contra facum próprium da ré – cf. Artigos 153º a 178º da PI. Q) “O abuso do direito é de conhecimento oficioso, pelo que deve ser objecto de apreciação e decisão, ainda que não invocado.” – cf. Acórdão do STJ de 11/12/2012, no âmbito do processo nº 116/07.2TBMCN.P1. S1 R). Assim, mesmo que a questão não tivesse sido levantada pelas partes, o tribunal deveria pronunciar-se sobre ela. S). Sendo que, in casus, não só a questão foi levantada como o tribunal considerou não poder dela conhecer, na medida em que, no seu entender, a invalidade do trepasse prejudicava a decisão sobre esta questão. T). Ora, independentemente do trespasse ser válido ou inválido por vício de forma, tal não obsta a que seja respeitado o valor da confiança e da boa-fé nas relações jurídicas. U). Ou seja, não é pelo negócio dissimulado ser nulo por vício de forma que a recorrida pode agir à revelia dos princípios gerais de boa fé, impune à prática de qualquer tipo de dolo, só porque o negócio é inválido. V) Assim, apesar de invalidade do trespasse, nada impede ao conhecimento do pedido na alínea c) do artigo 2º do presente recurso, que até deveria ser de conhecimento oficioso, na medida em que a solução dada àquela primeira questão não prejudica a decisão desta segunda. W). Continuando e no que toca ao segundo pedido indemnizatório, este refere-se aos danos patrimoniais sofridos pela recorrente em consequência das atitudes desleais da recorrida, nomeadamente, e entre outros, em termos de lucro cessante – cf. artigos 179º a 192º da PI. X). De facto, as atitudes da recorrida com o intuito de arruinar o negócio da recorrente (abrindo uma loja idêntica ao lado, denegrindo a imagem da recorrente junto de fornecedores e clientes...) tiveram como consequência a queda da faturação da recorrente. Y). Nesse ponto também, a validade ou invalidade do trepasse pouco ou nada importa para o conhecimento e para a decisão da questão, pois, a assim não ser, estaríamos a considerar que pelo negócio ser inválido, tudo é permitido e que a recorrida podia, na impunidade total, causar prejuízos patrimoniais à recorrente. Z). Ou seja, apesar de invalidade do trespasse, nada impede ao conhecimento do pedido na alínea d) do artigo 2º do presente recurso, na medida em que a solução dada àquela primeira questão não prejudica a decisão desta segunda. AA). Por fim, quanto ao último pedido de indemnização relacionado com danos não patrimoniais sofridos pela recorrente em consequência das atitudes da recorrida, aqui também, não se compreende o motivo do não conhecimento da questão – cf. artigos 193º a 202º da PI. AB) A verdade é que, negócio válido ou não, a recorrente foi vítima da recorrida, sofreu perseguição, difamação, traição, e devido a isso caiu no desânimo e na tristeza, influenciando o seu bem estar físico e moral. AC) Isso também deverá ficar inapreciado, ou melhor, impune, porque houve invalidade formal do contrato de trespasse? O que é que uma coisa tem a ver com a outra?... NADA. AD) Não parece ser esse o intuito do legislador ao abrir o desvio do artigo 608º, n.º 2 do CPC. AE) Mais uma vez, apesar de invalidade do trespasse, nada impede ao conhecimento do pedido da alínea e) do artigo 2º do presente recurso, na medida em que a solução dada àquela primeira questão não prejudica a decisão desta segunda. EM SUMA, AF). Poderiam até tais pedidos ser improcedentes por falta de requisitos (o que não se admite, mas simplesmente se poderá), mas nunca por nunca, poderia o julgador deixar de se pronunciar sobre eles. AG). In casus, não se verifica a tal relação de prejudicialidade de que depende a abertura estabelecida no artigo 608º, n.º 2 do CPC e que permitiria a legítima não pronuncia do julgador sobre estas questões. AH) O pedido sobre a invalidade do negócio e o pedido de indemnização decorrente dessa relação contratual (válida ou inválida), são questões que devem ser apreciadas de forma autónoma, sendo que todos os quadros decisórios poderiam ter acontecido (negócio válido e procedência do pedido indemnizatório, ou negócio inválido e improcedência do pedido indemnizatório, ou negócio válido e improcedência do pedido indemnizatório, ou ainda negócio inválido e procedência do pedido indemnizatório), mas em caso algum se pode dizer que “em face da invalidade formal do negócio celebrado entre as partes, fica prejudicado o conhecimento do restante pedido peticionado”. AI). Por certo, e no que toca à declaração de nulidade por falta de forma do contrato de trespasse, essa nulidade não afeta, nem pode afetar a decisão sobre a indemnização. AJ) Pois a suceder, estaríamos a abrir um precedente que permitiria a quem realiza contratos ilegais, beneficiar da “proteção” do artigo 608º, n.º 2, do CPC, entendido no sentido de que a decisão sobre a nulidade do negócio impossibilita o conhecimento da questão sobre o direito a indemnização. AK). Também não se pode dizer que a consequência da nulidade ser a restituição de tudo quanto foi prestado impossibilita o conhecimento das questões indemnizatórias, pois uma coisa é a consequência da nulidade e outras coisas são as consequências da má fé, do abuso de direito, dos danos patrimoniais e não patrimoniais. AL) A restituição de tudo quanto se prestou não invalida nem impede a censurabilidade de tais condutas e a proteção e ressarcimento de quem foi lesado. AM) Não foi, de todo, esse o alcance que o legislador pretendeu dar à excepção contida na norma do artigo 608º, n.º 2 que como se demonstrou, não pode aqui ser invocada. AN) Nos dizeres de Lebre de Freitas (in Código de Processo Civil Anotado), sobre o Juiz recai a obrigação de apreciar/conhecer “todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (…) , sendo que, ao ocorrer uma tal omissão de apreciação/conhecimento (…), então o não conhecimento do pedido, causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outras questões, constitui nulidade”. AO) O Meritíssimo juiz a quo não podia abster-se de se pronunciar sobre os pedidos indemnizatórios, quer seja pela procedência, quer seja pela improcedência dos mesmos. AP) Impõe-se a apreciação e decisão sobre os pedidos indemnizatórios formulados na PI, sob pena de nulidade parcial da sentença por violação do artigo 608º, n. º2 e do artigo 615º, n. º1, al. d), ambos do CPC, na parte em que o julgador decide não se pronunciar sobre os pedidos indemnizatórios, aproveitando-se todo o demais. AQ). Tal nulidade fica aqui desde já arguida, requerendo a este Venerando Tribunal o suprimento da mesma, apreciando e decidindo os pedidos indemnizatórios formulados na PI e transcritos no artigo 2º, alíneas c), d) e e) supra do presente recurso. Para uma justa decisão sobre os mesmos deverá atender-se, para além do vertido nos artigos 153º a 202º da petição inicial, em relação a cada um deles, e face aos factos provados em primeira instância, ao que infra se irá expor: AR) O princípio da confiança é um princípio ético fundamental de que a ordem jurídica em momento algum se alheia. AS). Está presente, desde logo, na norma do art. 334.º do CC: “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.” AT) O venire contra factum proprium é uma das modalidades de abuso de direito, que obsta a que alguém possa contradizer o seu próprio comportamento, após ter produzido, em outra pessoa, uma determinada expectativa. AU). Ora, ficou como matéria provada que quando a recorrente celebrou os contratos simulados com a recorrida, a primeira, de boa-fé e dado o discurso e comportamento da segunda, pressupôs a manutenção da marca (…) – Acessórios de Moda no estabelecimento negociado, bem como a sua utilização posterior, só tendo aceitado o preço proposto naquele pressuposto – cf. alínea pp) da sentença de que se recorre. AV). Ficou provado também, que durante as negociações, a recorrida nunca disse à recorrente que a marca em questão e o logótipo associado estavam registados a favor da recorrida no Instituto Nacional da Propriedade Industrial – cf. alínea dd) da sentença recorrida. AW). Provou-se que a recorrida vendeu à recorrente sacos, autocolantes, cartões de visita e etiquetas com os dizeres (…) – Acessórios de moda e respectivo logótipo – cf. alínea hh) da sentença recorrida. AX). Provou-se que após a celebração do negócio com a recorrida, a recorrente iniciou a exploração das lojas mantendo a fisionomia exterior e interior do estabelecimento, tal como era quando a recorrida os explorava – cf. alíneas t) e u) da sentença recorrida. AY). Mantendo o mesmo programa informático (alínea v), o mesmo endereço eletrónico (alínea w), o mesmo toldo com inscrição da marca (alínea x), os mesmos sacos, envelopes, etiquetas com indicação da marca (…) – Acessórios de Moda (alínea y) e tendo até a recorrente celebrado contratos de publicidade para promover a referida marca (alínea z). AZ) Isso tudo com o conhecimento e consentimento da recorrida que continuou a frequentar o espaço durante pelo menos o ano de 2015 – cf. alíneas aa), cc) e bb) da sentença recorrida. BA) Só depois da zanga entre as partes (em que a recorrente cansada de passar por mera empregada no seu próprio negócio, proibiu a entrada da recorrida no estabelecimento) é que a recorrida veio levantar a questão da proibição do uso da marca, até lá nunca censurado - cf. alínea ee) da sentença recorrida. BB). Obrigando a recorrente a desistir da prestigiada e conceituada marca (…) – Acessórios de Moda, causando-lhe graves prejuízos e frustrando as expetativas que a recorrida lhe permitiu, inicialmente, criar. BC). Há “venire contra factum proprium” quando uma pessoa declare avançar com certa atuação e depois se negue (cf. entendimento do Tribunal da Relação de Lisboa no Acórdão 9081/2005-7 de 12/07/2006). BD) De facto, a proibição do “venire contra factum proprium” é a consagração de que ninguém pode se opor a um facto a que ele próprio deu causa. BE). Ora, os factos dados como provados em primeira instância refletem bem esse exato comportamento da recorrida que durante as negociações e por mais de um ano deixou a recorrente acreditar e fez com que acreditasse, que podia usar a marca. BF). Para um belo dia se lembrar, sem mais nem menos, de tirar o tapete, proibindo, o uso da dita marca. BG). Pois caso a recorrente não estivesse plenamente convencida que tinha adquirido também o direito ao uso da marca, a mesma poderia ter logo iniciado a sua atividade explorando a sua própria marca, o que lhe poderia ter evitado muitos prejuízos. BH) São elementos essenciais do venire contra factum proprium: i) uma conduta inicial; ii) a legítima confiança despertada por conta dessa conduta inicial; iii) um comportamento contraditório em relação à conduta inicial; iv) um prejuízo, concreto ou potencial, decorrente da contradição. BI). Como já se elencou supra, todos esses pressupostos figuram na sentença recorrida como matéria provada em sede de primeira instância. BJ). Pois, a recorrente, estando de boa fé e com base na situação de confiança criada pela contraparte, tomou disposições e organizou planos de vida de onde lhe resultaram danos pela frustração da sua legítima confiança. BK) Assim, as atitudes da recorrida, todas elas com contornos de malvadez, deslealdade, má-fé e até crueldade, manifestam claramente abuso de direito na sua modalidade de “venire contra factum proprium” o qual é absolutamente proibido por lei. BL) Uma das consequências do abuso de direito consiste na obrigação de indemnizar nos termos do artigo 483º, n.º 1 do CC (Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24/04/2008). BM). Pelo que tendo em conta os factos provados em sede de primeira instância e apesar de o trespasse celebrado ter sido decretado nulo com restituição de tudo quanto foi prestado, uma vez verificados os pressupostos do abuso de direito nos termos do artigo 334º do CC, a recorrida deverá pagar a recorrente uma indemnização de montante nunca inferior a 50.000,00€. BN). Para além disso, as atitudes desleais da recorrida que foram descritas supras e dadas como provadas causaram e causam um prejuízo real na esfera jurídica da recorrente. BO) Não bastante a proibição do uso da marca, para arruinar ainda mais o negócio da recorrente, a recorrida abriu, em 01/06/2017, a menos de 50 metros do mesmo, um estabelecimento de nome (…) – Acessórios de Moda, que comercializa o mesmo tipo de produtos – cf. alínea kk) dos factos provados constantes da sentença recorrida. BP) E ainda tentou (e conseguiu) desviar fornecedores e clientes da loja da recorrente, dizendo que o estabelecimento desta última era “de baixo nível” – cf. alínea mm) dos factos provados constantes da sentença recorrida. BQ). Relativamente ao negócio in (…) também trespassado, e que a recorrente não pude explorar por não ser possível legalizá-lo, apesar de não se ter provado que as fiscalizações de que foi alvo foram fruto de denuncias da recorrida, a verdade é que as mesmas ocorreram após a zanga entre partes – cf. alínea nn) da sentença recorrida. BR). Sendo convicção da recorrente, não só que a recorrida sabia perfeitamente da impossibilidade de legalizar o negócio quando o vendeu e deliberadamente ocultou essa informação à recorrente como também está convicta de que as fiscalizações da ASAE a loja In (…) são obra de denuncias feitas pela recorrida. BS) De qualquer forma, o artigo 483º do Código Civil fixa o princípio geral da responsabilidade civil por factos ilícitos dispondo que “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou de qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes de violação”. BT). Ora quanto ao requisito da culpa, como se demonstrou supra, está bem presente nas atitudes da recorrente que longe de inocente, está carregada de desejo de vingança, orgulho e maldade. BU) A recorrida não aceitou perder o controle do negócio, apesar de o ter vendido. BV). Esta sabia muito bem o que fazia, pois, ao contrário da recorrente que lhe fez inteira confiança, a recorrida sempre foi aconselhada e assessorada por advogados e contabilistas – cf. alíneas p) e q) dos factos provados constantes da sentença recorrida. BW). Com os desvios de clientela e fornecedores e com a proibição do uso da marca, a recorrida tinha consciência que iria provocar prejuízos à recorrente e era essa a sua real intenção. BX) Para além de violar os princípios de boa-fé nas relações comerciais e de frustrar as expetativas da recorrente, a recorrida incorreu em concorrência desleal, violando o artigo 317º do Código da Propriedade Industrial. BY) “Constitui concorrência desleal todo o acto de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de actividade económica, nomeadamente: a) Os actos susceptíveis de criar confusão com a empresa, o estabelecimento, os produtos ou os serviços dos concorrentes, qualquer que seja o meio empregue; b) As falsas afirmações feitas no exercício de uma actividade económica, com o fim de desacreditar os concorrentes (...)”. BZ). De tudo isto decorre que a recorrida violou, com culpa, os direitos da recorrente legalmente protegidos, causando-lhe diversos prejuízos patrimoniais que devem ser indemnizados por verificação dos pressupostos do supracitado artigo 483º, n.º 1 do CC. CA). Nomeadamente: - 1.200,00€ gastos em multas (cf. comprovativos de pagamentos juntos a PI como doc n.º 19); - 2.500,00€ gastos em sacos e etiquetas da marca (…) - Acessórios de Moda, adquiridos a recorrida; - 2.114,93€ gastos em sacos e etiquetas da marca (cf. faturas juntas à PI como doc. n.º 25); - 5.867,11€ gastos com a aquisição do stock de mercadorias para a loja “In (…)” e que não conseguiu revender pelo facto de a loja ter sido encerrada por desconformidade legal (cf. doc. n.º 26 junto à PI); - 1.200,77€ gastos em publicidade (cf. recibos de pagamento juntos à PI como doc n.º 27); - 416,79€ gastos em software e hardware adquiridos pela recorrente (cf. recibos de pagamentos juntos à PI como doc n.º 28); - 248,46€ pelo custo anual do alojamento do site da loja. In (…) (cf. recibo de pagamento junto à PI como doc n.º 29); - 18.200,00€ a título de rendas pagas pela recorrente pelo arrendamento da loja “(…) – Acessórios de Moda” (cf. recibos de renda juntos à PI como doc. n.º 30); - 3.000,00€ a título de rendas pagas pela recorrente pelo arrendamento das lojas “In (…)” e “Ala (…) s”, entretanto encerradas; - 28.147,87€ a título de encargos com a funcionária cedida pelo recorrida a recorrente (cfr. recibos de vencimentos juntos à PI como doc n.º 31). Esses valores atingem o valor global, nunca inferior a 62.895,93€. CB). Para além desses valores, mas sempre na perspetiva patrimonial, há ainda que ter em consideração no cálculo da indemnização, o chamado lucro cessante, ou mais certeiramente, a frustração do ganho, cuja reparação está prevista no artigo 564º, n.º 1 do CC. CC) “O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão.” CD) E, embora não ficasse provado em sede de primeira instância, porque o tribunal decidiu não conhecer esta questão, a consequência da proibição do uso da marca, a abertura da outra loja a menos de 50 metros, o encerramento da loja ..., e todas as artimanhas levadas a cabo para desviar a clientela, é óbvia e lógica. CE). Por certo, aquando da celebração dos trespasses, e atendendo ao investimento feito, a perspetiva de negócio ia bem mais além do que um ano de exploração, vislumbrando-se um crescimento gradual dos lucros do negócio, por vários e longos anos. CF). As ações da recorrida fizeram com que o negócio da recorrente tivesse um lucro inferior aquele que poderia ter tido, não fossem aquelas ações. CG) Assim, tendo por referência o volume de faturação apurado em janeiro 2015, quando se celebrou o trespasse e o lucro apurado em janeiro 2016, quando deixou de poder usar a marca “(…) – Acessórios de Moda” existe uma diferença de 6.300,00€ (cf. relatórios contabilísticos juntos à PI como doc. n.º 32). CH). Sendo que este valor ainda se agravou em 2017, com a abertura da nova loja da recorrida, para uma redução de faturação apurado até agosto de 10.700,00€ em relação a 2015 (cf. doc. n.º 33 junto à PI). CI). Tendo em conta a média do lucro mensal da loja em tempos de laboração, até a data, a recorrente já perdeu de ganhar a quantia de 17.000,00€. CJ). Quantia essa que teria ganho se a recorrida não tivesse agido da forma que fez, consciente e deliberada, com o intuito de prejudicar a recorrente. CK) Todos esses valores, no montante global de 79.895,93€, constituem danos patrimoniais causados pela recorrida à recorrente, devendo ser indemnizados, por força do artigo 562º e 564º do CC. CL). Por outro lado, dispõe o artigo 496º n.º 1 do CC que “na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.” CM) A recorrente tem sido vítima de difamação na praça pública, perante os seus clientes e fornecedores. CN) Ficou provado que a recorrida tentou que um dos fornecedores deixasse de vender a recorrente dizendo que a loja desta era “de baixo nível”, denegrindo a imagem da recorrente e da sua marca no mercado - cf. alínea mm) da sentença recorrida. CO). É claro que, dado o investimento feito e sendo esse o seu sustento e o do seu agregado familiar, essas ocorrências afetaram o bem-estar psicológico da recorrente que se sente traída e engana por aquela a quem sempre se dedicou. CP). Cumulando a isso todos os embaraços judiciais nas quais a recorrente nunca pensou se ver implicada e que lhe causam, para além da perda de tempo e de dinheiro, uma enorme tristeza. CQ) Toda esta situação tem causado grandes dores de cabeça à recorrente, noites sem dormir e graves preocupações posto que está prestes a ver ruir todo o seu investimento. CR). Pelo que tendo em conta os factos provados em sede de primeira instância e apesar de o trespasse celebrado ter sido decretado nulo com restituição de tudo quanto foi prestado, os danos não patrimoniais aqui descritos e causados à recorrente por culpa da recorrida, devem ser indemnizados, nos termos do artigo 496º do CC, num montante não inferior a 40.000,00€”.*A Ré/Apelada apresentou contra-alegações, onde pugna por que seja mantida a decisão recorrida, na parte ora submetida a recurso, (ou seja na questão da prejudicialidade e pedidos indemnizatórios) para tanto Concluindo: “1ª A recorrida perfilha o entendimento, salvo melhor opinião, de que a sentença recorrida não padece da invocada nulidade ao declarar, na sequência da decisão que tomou, a prejudicialidade dos pedidos indemnizatórios; 2ª Com efeito ao qualificar juridicamente o negócio como trespasse e declarando a sua nulidade (aliás pedido formulado pela Autora), o julgador aplicou, consequentemente, os efeitos legais da nulidade negocial – 286 e 289 do Código Civil. 3 º Ora independentemente, da maior ou menor concordância com a decisão da primeira instância, no que especificamente se reporta a esta questão – da prejudicialidade – a decisão integra em si um raciocínio lógico correcto, dado que respeita integralmente o preceituado no artigo 608/2 do Código Civil. 4º – Apesar de deduzidos pedidos autónomos e não subsidiários entre si, tal não significa que os mesmos não sejam legalmente incompatíveis. 5 º – O Sr. Juiz ao conferir procedência ao pedido formulado em B, entrou em linha de “colisão” com os demais pedidos formulados, dado que os efeitos da nulidade negocial se circunscrevem à restituição de tudo o que foi prestado, balizado pela possibilidade de restituição, ou o seu respectivo valor (não sendo restituível o gozo da coisa); 6º – Pelo que quanto à questão da prejudicialidade, nos termos da sentença proferida, a mesma afigura-se correcta. 7º - No que se reporta à parte II do recurso instaurado pela recorrente, ou seja quanto à sua pretensão indemnizatória, entende a recorrida que a mesma não merece procedência. 8º – A recorrente pretende sustentar as indemnizações que peticiona em factos que não conseguiu provar, que não constam, por isso dos factos provados, mas que constam dos factos considerados não provados. 9º– Como se pode verificar, pelas presentes alegações, a recorrente não procedeu à impugnação da prova, ou seja: não diz que factos pretende ver reconhecidos como provados e porquê, de modo a sustentar os seus pedidos indemnizatórios. 10º – Conformou-se com os factos considerados provados, sendo que dos mesmos, não se extraem quaisquer danos ou prejuízos tal como invocado pela recorrente e supra rebatido no corpo contra-alegatório. 11º – Quem invoca um direito tem a seu cargo o ónus probatório dos factos constitutivos do direito alegado – artigo 342 do Código Civil . 12º– Estes factos têm de ser concretizados em sede de prova, não podem fundamentar-se em abstracções, convicções, presunções … tem de haver sustentação. E essa prova a autora recorrente não fez. Não viu provados os factos com os quais fundamentava os seus pedidos indemnizatórios, na sua petição inicial. 13º– Pelo que entende a recorrida, deverem improceder os pedidos indemnizatórios formulados pela recorrente, sendo a recorrida absolvida de tais pedidos”.*A Ré apresentou, também, recurso de apelação, pugnando por que seja revogada a decisão recorrida, julgando-se o pedido deduzido pela Autora totalmente improcedente por não provado. Após o corpo das alegações escreve o seguinte: “CONCLUSÕES: 1ª A recorrente perfilha o entendimento, salvo melhor opinião, de que a douta sentença não terá decidido de forma acertada, atendendo a todos os factos que foram transpostos para os autos e submetidos a julgamento, assim como, ainda, atendendo aos normativos legais aplicáveis neste caso. 2ª Antes de mais, e desde logo, impugnando o recorrente a decisão proferida sobre a matéria de facto, como previsto, aliás, no artigo 690º-A, nº 1, do C.P.Civil, porquanto existe nos autos gravação da prova testemunhal em causa. 3ª De facto, o Tribunal "a quo", deveria ter considerado provada a seguinte factualidade, conforme transcrição das gravações supra (constante dos minutos identificados de acordo com o CD audio, disponibilizado pelo Tribunal, tudo melhor identificado acima por referência a cada testemunha) conjugada com os documentos juntos aos autos: Que este negócio teve como fundamento o precário estado de saúde da ré. Que a morosidade na obtenção de um interessado para um trespasse não era compatível com a pressa que a ré tinha em deixar de trabalhar (naquela altura); Que uma das possibilidades seria liquidar/vender – ainda que em saldo, a mercadoria e existências e fechar a loja ou arrendá-la. Que em conversa com a Autora, esta mostrou-se interessada por esta hipótese. Mas ainda assim não tinha sequer meios financeiros para fazer face ao negócio. Acordaram fazer um inventário de todos os bens: existiam bens contabilizados informaticamente e bens não contabilizados nestes moldes. Quanto aos bens informatizados contabilisticamente seria mais fácil o inventário, pois só seria necessário confirmar a existências. Acordaram que os valores seriam os valores a preço de custo. Quanto aos outros bens – que estavam no armazém, havia também um inventário no computador, mas era necessária a sua conferência. Contabilizado também o seu valor (igualmente a preço de custo) a autora que interveio activamente nas respectivas inventariações, apresentou à ré um documento por si manuscrito no qual discriminava todos os bens e respectivos valores. Acordaram num pagamento diluído num espaço temporal de cinco anos. Os bens tratados contabilisticamente foram processados na sua transmissão por emissão de facturas; assim como do imobilizado em amortização. Quanto aos outros seria necessária a elaboração de um documento onde ficasse a constar o montante da dívida e o modo de pagamento. Como a autora também iria pagar os bens facturados em prestações, acordaram as partes que seriam feitos dois documentos: um para os bens facturados e outro para os demais bens. Foram estes os documentos “titulados de Reconhecimento de obrigação pecuniária, acordo de pagamento e obrigação de garantia” que foram assinados e autenticados”. O primeiro por João (…) o (documento 14 junto com a contestação, visto a autora, quando juntou o doc. 2 à sua PI, não ter fuito a junção integral do documento), o segundo por Rui ... (conforme identificação do respectivo advogado autenticador). Os sacos não entraram nestas contas, porque inicialmente nem entrariam no negócio. E só entraram porque a autora não tinha condições financeiras para mandar fazer sacos e porque se comprometeu a tapar o logótipo com auto-adesivo. Foram pagos à parte em três acordadas prestações. Este o cerne negocial. Compra e venda de stock e imobilizado. Foi isto que as partes negociaram e quiseram. Os demais documentos surgem como acessórios à vida da Autora. Quis ela arrendar a fracção autónoma da ré. Nada obsta a essa possibilidade. Aliás a ré, com o fecho da loja já pensara nessa possibilidade. Quis a Autora arrendar, numa fase inicial a loja onde funcionava o anterior estabelecimento “...” e que a ré já tinha procedido à entrega do arrendado ao senhorio. Posteriormente a ré mudou-se para outra loja. Quis a autora contratar a trabalhadora que trabalhou para a ré no estabelecimento ..., porque já conhecia os produtos. Aqui, para obviar, celebraram uma cessão da trabalhadora. Mas todos os acordos negociais nos revelam como primeiro foco a aquisição da mercadoria das lojas pertencentes à Teresa ..., aqui Ré. Nunca a autora ou a ré, equacionaram entre si um trespasse de estabelecimentos comerciais. Nunca sequer verbalizaram perante as pessoas que acompanharam de perto este negócio essa eventualidade. A marca, que a autora alega ser elemento incorpóreo de alto valor, não foi contabilizado em nenhum documento, não foi processado, negociado ou pago por qualquer modo. Assim como a carteira de clientes, volume de negócios, posição de mercado, todos estes elementos que compõem um estabelecimento comercial, não foram sequer representados pelas partes. 4ª. Daí se retirando um conteúdo útil e relevante para a decisão a proferir no caso dos presentes autos. 5ª Entendendo a recorrente que em conformidade com o teor dos depoimentos prestados em audiência de julgamento conjugados pelo documentos juntos aos autos que deveria ter sido considerado provado que não houve trespasse de qualquer estabelecimento; que o que houve foi a compra e venda de mercadoria e imobilizado dos estabelecimentos que foram explorados pela ré, e que devido ao pagamento destes bens num espaço temporal de 5 anos, foram outorgados dois documentos de reconhecimento de obrigação pecuniária, com plano de pagamentos. 6ª Que esses dois documentos de reconhecimentos de dívida se fundamentam no seguinte: O de 92.954,13Euros, no facto de pagamento prestacional, já que a transmissão da mercadoria e imobilizado em amortização foi objecto da competente facturação a favor da Autora; O de 34.790,24Euros. no facto de não poder ser objecto de facturação (era material não contabilizado informaticamente) e por isso ambas as partes pretendiam um documento onde ficasse plasmada a quantia em dívida. a) o primeiro foi autenticado por João ... (..) b) o segundo foi autenticado por Rui (…), advogado; 7ª Não existem nos autos quaisquer elementos que nos permitam assim concluir, mas existem elementos que a ré alegou e invocou a seu favor, que nos permitem concluir que pretenderam, ambas as partes um contrato de compra e venda do stock da loja … acessórios de moda e das loja “...” e “...” pelo que como tal deverá ser tratado o negócio celebrado entre autora e ré. 8ª Devem ser considerados não provados: a) todos os factos considerados provados, pelo sr. Juiz do Tribunal recorrido, no qual se refere à transmissão ou negócio incidente sobre o(s)estabelecimento(s) comercial(ais), ou seja, as alíneas g), h), i), j), p) r) ,s), bb) e pp), vão impugnadas. O facto vertido em q) vai também impugnado dado que segundo a testemunha A., quer a autora quer esta com o seu marido, falaram do negócio várias vezes com ele sem a presença da ré. b) os factos considerados provados vertidos em r) e ii), porquanto: Ambas as partes assumiram nas suas peças processuais que foi celebrado um contrato de arrendamento para fins não habitacionais com fiança, e que celebraram também na mesma data um aditamento a esse contrato. Assim, no contrato de arrendamento referido ficou a constar uma renda mensal de 350,00Euros (o montante que a Autora solicitou à ré que vigorasse no primeiro ano de Contrato. No aditamento, ficou a constar a renda a vigorar a partir do segundo ano de contrato, ou seja 700,00Euros. Para além da assumpção deste facto pelas partes, também foram juntos aos autos os respectivos documentos – desde logo pela Autora – sob os nºs 4 e 5 da petição inicial e ainda os recibos de renda – docs 30 e seguintes juntos pela Autora. Pelo que, o facto considerado provado em r) padece de erro. Este facto tem importante relevância (caso V/Exas., Srs. Desembargadores, considerem pertinente a qualificação jurídica de trespasse, porquanto o gozo não é passível de restituição, sendo a respectiva contrapartida objecto de retenção- conferir ainda os citados recibos de renda juntos aos autos pela própria Autora). Em face do ora exposto, não se percebe o raciocíonio lógico-matemático que o Sr, Juiz do Tribunal recorrido verteu em ii) É que o arrendamento da fracção H, titulada registralmente pela ré, nada tem que ver com o valor do negócio, ou seja, com os valor de 134.754,37Euros- este é como se referiu, à saciedade, o valor somado da mercadoria e imobilizado. Quanto a este valor de 134.734,37Euros, chega-se, facilmente através do documento junto na contestação sob o nº 3. Nesse documento a Autora, pelo seu próprio punho (como assumido na sentença recorrida) esquematiza todos os montantes sobre os quais incidiu o negócio. Artigos sem factura da loja té --------------------------- 16.369,65Euros Artigos sem factura da loja in (..)/ala ------------------------ 7.598,16Euros restante imobilizado --------------------------------------- 1.375,00Euros artigos vários ------------------------------------------------ 151,98Euros 10% inventário computador ------------------------------------------ 9.295,45Euros sub total: 34.790,24Euros Este montante encontra paralelo em algum documento de reconhecimento de obrigação pecuniária, junto a estes autos? Efectivamente trata-se do documento junto pela Autora sob o número 3 e que a ré aceita na sua contestação. Mas nesse mesmo documento manuscrito pela Autora (doc 3 da contestação) podemos ainda constatar o montante dos produtos inventariados informaticamente (designado pela Autora inventário computadores), ou seja: da mercadoria da loja in (…) --------------------------- 16.405,68Euros da mercadoria da loja Gift ---------------------------- 76.548,45Euros sub total ---------------------------------------------------- 92.954,13Euros Estes montantes e respectiva referência estão devidamente identificados no documento nº 8, junto pela Autora na sua petição inicial. A contabilidade operou, inclusivamente, as respectivas facturas, ambas com data de 31-12-2014. Estes montantes, quer do documento 3 da contestação, quer do documento 8 da petição inicial encontram paralelo em algum documento de reconhecimento de obrigação pecuniária, junto a estes autos? Efectivamente trata-se do documento junto pela Autora sob o nº 2, e que a ré aceita na sua contestação. o referido documento nº 3 da contestação (e também o nº 16), não padece da invocada ausência de outros elementos, para afirmar o seu teor. Por conseguinte, deve ser valorizado na produção de prova destes autos. É um documento importante, não só para pôr em causa o raciocínio do julgador vertido na al. ii) dos factos provados, como para consolidar que o objecto do negócio foi a liquidação do stock/imobilizado/existências de mercadorias. Em parte alguma dos citados documentos se pode chegar à conclusão de que os montantes assumidos como divida, pela Autora, se reportam à transmissão de dois/três estabelecimentos comerciais. c) O facto vertido em p) deverá ser rectificado, dado que não foi o filho da ré quem autenticou o documento onde se previa o pagamento de 92.954,13 Euros. Foi um outro advogado – conforme documento 14 junto com a Contestação. O filho da ré apenas autenticou o documento que titulava a quantia de 34.790,24Euros, apesar de contrariado, mas a pedido da autora e seu marido ( e bem assim da sua mãe); 9ª Em oposição e decorrentemente da prova supra apreciada nos documentos e supra transcrita - depoimentos, devem ser considerados provados os factos vertidos nos artigos 12 a 24 , 31 a 36, 44 a 46, 48, 70 da contestação apresentada. 10ª a)Em face de todo o supra exposto, entende a ré recorrente que todos os contratos em discussão foram efectuados ao abrigo das normas do direito civil, e assim sendo, regulados pelos artigos 405º, art. 1112/2 e a contrário, nºs 3 e 4, 358/2, 1022 e 1069, todos do Código Civil, 11ª Posto o que, entende a recorrente, com o devido respeito, que a decisão da matéria de facto deverá, nos termos supra expostos, ser alterada em conformidade com os depoimentos daquelas testemunhas, e documentos referidos, passando assim a integrar a factualidade apurada a supra identificada na conclusão 3ª. 12ª Devendo, em consequência ser julgada não provada e improcedente a presente acção. 13ª Sendo essa decisão a que mais ajustada e correcta resulta, no entender da recorrente, no caso dos autos, impondo-se, pois, por tais motivos e com aqueles fundamentos, a revogação da sentença proferida. 14ª A sentença recorrida, por incorrecta interpretação e aplicação dos normativos legais, terá violado, salvo melhor opinião, o disposto nos artigos 405º, art. 1112/2 e a contrário, nºs 3 e 4, 358/2, 1022 e 1069, todos do Código Civil, artigo 304 – p, nº 2 do Código da Propriedade Industrial).*Pronunciou-se o Tribunal a quo pelo indeferimento da nulidade invocada pela Autora, imputada à sentença e escudada no art. 615º, nº1, alínea d), do Código de Processo Civil, que apreciou ao abrigo do nº1, do art. 617º, do CPC, pois que “Na sentença recorrida se afirma que “em face da invalidade formal do negócio celebrado pelas partes, fica prejudicado o conhecimento do restante peticionado – cf. art. 608º nº2, do Código de Processo Civil”. Como se compreenderá não há que conhecer dos restantes pedidos quando o Tribunal, depois de analisar o primeiro dos pedidos deduzidos pela Autora (o de declaração de nulidade das duas declarações de “reconhecimento de obrigações pecuniárias acordo de pagamento e constituição de garantia”, do contrato de arrendamento e de cessão da posição contratual da trabalhadora, por simulados, nos termos do art. 240º, do Código Civil), conclui que o que as partes pretenderam, de facto e efectivamente, foi trespassar os três estabelecimentos e sanciona tal encontro de vontades com a nulidade com fundamento em omissão da forma legalmente exigida por lei. Se não há simulação e se o negócio efectivamente celebrado é formalmente inválido, não há que conhecer do restante peticionado porque estruturado à volta de comportamento da Ré relacionado com os vícios alegados e que, em face do decidido, não cumpre conhecer”. *Após os vistos, cumpre apreciar e decidir os recursos interposto.*II. FUNDAMENTAÇÃO - OBJETO DO RECURSO Apontemos as questões objeto do presente recurso, tendo presente que o mesmo é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil. Assim, as questões decidendas são as seguintes: A- 1º recurso (apelação da Autora) 1. Da rejeição do recurso por incumprimento pela apelante do ónus de apresentação de conclusões de recurso, 2. Da oportunidade da rejeição.*B - 2º recurso (apelação da Ré) 1. Do incumprimento pela Apelante dos ónus impostos para a impugnação da decisão da matéria de facto (falta de indicação da prova - facto por facto - em que se fundamenta o erro, falta de análise crítica da prova de cada um dos concretos pontos de facto considerados incorretamente julgados e falta de indicação das passagens da gravação em que funda o recurso quanto a cada questão de facto impugnada) e, caso o mesmo se não verifique, se cumpre proceder à alteração da factualidade dada como provada e não provada pelo tribunal nos termos preconizados pela apelante; 2. Da modificabilidade da decisão de mérito (saber se se deverá realizar nova interpretação e aplicação do direito à nova factualidade apurada). *II. A - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Foram os seguintes os factos considerados provados pelo Tribunal de 1ª instância (transcrição): a) A autora é empresária por conta própria; b) A aquisição do direito de propriedade da fração autónoma designada pela letra(…), correspondente ao estabelecimento comercial com entrada pelo nº (…), da Avenida (…), que faz parte do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na Avenida (…),e Rua (…), freguesia de (…), concelho de (…), descrito na Conservatória de Registo Predial de (…), sob o nº (…), encontra-se inscrita a favor da Ré; c) Durante 28 anos, o estabelecimento de venda de produtos ao público denominado (…) – Acessórios de Moda, a funcionar na supra referida fração, foi explorado pela Ré; d) Paralelamente, a mesma também explorou os estabelecimentos de venda de produtos ao público designados por Ala (…) e In (…) ambos localizados em (…), na referida Av. (…); e) (…) – Acessórios de Moda é o estabelecimento/loja mais rentável, uma vez que representa cerca de 70% da globalidade dos negócios; f) Nessas lojas, a Autora trabalhou ao serviço da ré, por mais de 20 anos, exercendo as suas funções principalmente na loja referida na alínea c), mas também, ocasionalmente, nos outros espaços explorados pela Ré; g) Por causa de problemas de saúde de que veio a padecer, designadamente, por ter sofrido um acidente vascular cerebral, a Ré propôs à Autora a transmissão, a título definitivo, dos estabelecimentos mencionados nas alíneas c) e d); h) O que a Autora aceitou, depois de negociar com a Autora o preço da transmissão, que acordaram que fosse fixado em € 134.754,37; i) A negociação foi conduzida pela Ré, em quem a Autora confiava; j) Para a concretização do negócio referido em g), a Ré apresentou à Autora dois escritos elaborados a seu mando, intitulados de reconhecimento de obrigação pecuniária, acordo de pagamento e constituição de garantia, ambos datados de 28 de Janeiro de 2015, para que esta os assinasse juntamente consigo e com o fiador, Joel (…), cujas cópias se encontram juntas aos autos de fls. 157 a 162 e cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzidos; k) Um dos escritos prevê a forma de pagamento da quantia de € 92.954,13 e o outro a quantia de € 34.790,24; l) De acordo com a cláusula segunda, nº 5, do primeiro dos referidos escritos, “para pagamento do sobredito preço do trespasse, e de modo a cumprir pontualmente o pagamento das parcelas anuais referidas no número anterior, a Primeira Contraente compromete-se a fazer entregas mensais, no último dia de cada mês, à Segunda Contraente, que delas dará quitação, com o montante mínimo de € 1.000,00”; m) De acordo com a cláusula quinta, do primeiro dos referidos escritos, “como garantia de cumprimento do pagamento da quantia em causa e até integral pagamento da mesma, a Primeira Outorgante dá como garantia à Segunda Outorgante o estabelecimento comercial CAE: (…) – “Comércio a retalho de outros produtos novos em estabelecimentos n. e.”, denominado por “Loja (…)/Gift” instalado e a funcionar no rés-do-chão, com entrada pelo nº (…), do prédio urbano, sito na Avenida (…)”; n) Os escritos em causa foram assinados pela Autora, pela Ré e por Joel (…) em 28 de … de …; o) Ainda nesse dia, foi também emitida uma fatura de 4.510,00€, correspondente à venda de parte do imobilizado daqueles estabelecimentos, tendo naquela mesma data a Autora pago à Ré, por cheque, aquele valor; p) A Ré, para além de ter conduzido a negociação com a Autora, foi assessorada pelos seus contabilistas, que se encontravam presentes na reunião em que os escritos mencionados na alínea j) foram assinados, juntamente com o filho da Ré, advogado, que autenticou as assinaturas dos mesmos, e o marido desta; q) A Autora, antes de assinar os escritos mencionados na alínea j), não se aconselhou com advogado ou contabilista; r) Por causa do acordo mencionado nas alíneas g) e h), no dia 1 de Janeiro de 2015, Autora e Ré celebraram um acordo, por elas apelidado de contrato de arrendamento com prazo certo para fins não habitacionais com fiança, nos termos do qual a segunda cedeu à primeira o gozo da fracção autónoma designada pela letra “(…)”, correspondente ao estabelecimento com entrada pelo número (…) da Avenida (…), que faz parte do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na Avenida (…), número v(…) e Rua … de (…), número (…), em (…), pelo valor mensal de € 350,00, nos termos que melhor surgem descritos na cópia junta aos autos de fls. 23v a 27 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido; s) Por causa do acordo mencionado nas alíneas g) e h), em 28 de Janeiro de 2015, Autora, Ré e Paula (…), celebraram um acordo, por escrito, apelidado de Cessão de Posição Contratual em Contrato de Trabalho, nos termos que melhor surgem reproduzidos na cópia de fls. 28 a 29 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido; t) Após a celebração dos acordos supra descritos, a Autora iniciou a exploração dos estabelecimentos/lojas supra descritos; u) A fisionomia exterior e interior dos estabelecimentos, sob a exploração da Autora, manteve-se tal como era quando era a Ré a explorá-los; v) A Autora, depois de começar a explorar os estabelecimentos/lojas, continuou a usar o programa informático de faturação que a Ré utilizava; w) A Autora, depois de começar a explorar os estabelecimentos/lojas, continuou a usar o endereço eletrónico que a Ré usava – (…) hotmail.com – designadamente, para fazer encomendas a fornecedores; x) A Autora, depois de começar a explorar os estabelecimentos/lojas, manteve o toldo da loja (…) é – Acessórios de Moda com a inscrição (…) – Acessórios de Moda; y) A Autora, depois de começar a explorar os estabelecimentos/lojas, continuou a usar no giro comercial da loja (…) – Acessórios de Moda, designadamente, na venda de produtos aos clientes, sacos, envelopes e autocolantes nos quais se encontravam apostos os dizeres (…) – Acessórios de Moda; z) A Autora, depois de começar a explorar os estabelecimentos/lojas, passou a fazer publicidade aos mesmos, designadamente, em rádios locais e em panfletos de eventos locais, sendo que quanto à loja (…) utilizou os dizeres (…) – Acessórios de Moda; aa) A Ré teve conhecimento, logo depois de a Autora dar início à exploração das lojas, do que se menciona nas alíneas v) a z); bb) Logo depois de a Autora dar início à exploração das lojas, a Ré passou a aparecer ocasionalmente no espaço onde funcionava a loja (…) – Acessórios de Moda, comportando-se perante os clientes como se fosse a dona do estabelecimento; cc) Não mostrando a Ré vontade de fazer cessar o seu comportamento, que se prolongou durante pelo menos o ano de 2015, com a tolerância da Autora, esta proibiu expressamente a Ré de entrar na loja; dd) Durante as negociações para a transmissão dos estabelecimentos/lojas, a Ré não disse à Autora que as marcas (…) – Acessórios de Moda, (…) Gift e o logótipo (…) Acessórios de Moda se encontravam registados a seu favor no Instituto Nacional da Propriedade Industrial; ee) Por missiva datada de 20 de Dezembro de 2016 e recebida pela Autora em 22 do mesmo mês e ano, a Ré escreveu que “não detendo V. Exa. qualquer título válido que legitime o uso das referidas marcas e logótipo (quer na loja, quer nas redes sociais, sacos, vinhetas, papel timbrado, etiquetas, toldo placa, entre outros), fica, de imediato, proibida dessa atitude abusiva”, conforme se retira das cópias juntas aos autos de procedimento cautelar (apenso A) a fls. 48v e 49 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido; ff) A partir desse momento, a Autora deixou de utilizar aquelas marcas e logótipos no giro comercial da loja; gg) E mudou o nome da loja mais para (…) – Acessórios de Moda; hh) O recheio de produtos da loja (…) – Acessórios de Moda incluía, à data da transmissão, sacos, autocolantes, envelopes, cartões-de-visita e etiquetas com os dizeres (…) – Acessórios de Moda e respetivo logótipo; ii) O valor global de € 134.754,37 da acordada transmissão das lojas/estabelecimentos seria realizado em cinco anos, com um pagamento inicial de € 5.000,00 e o pagamento de € 24.548,88 até ao final de cada ano, correspondendo o referido valor de pagamento anual à soma da quantia de € 6.958,04 (relativa à parte do imobilizado) com a quantia de € 17.590,84 [relativa ao valor da ocupação do espaço decorrente do acordo referido em r)]; jj) Do valor global foi já pago pela Autora a quantia de € 78.354,37, encontrando-se ainda por pagar a quantia de € 56.550,00; kk) Em 01.06.2017, a Ré abriu uma loja a menos de 50 metros da loja explorada pela Autora com o nome de (…) – Acessórios de Moda; ll) Autora e Ré trocaram a correspondência consubstanciada nas missivas cujas cópias se encontram juntas aos autos de fls. 57v a 61 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido; mm) Após o momento referido em cc), a Ré tentou que um dos fornecedores da loja explorada pela Autora, representada por Edouard (…), deixasse de vender produtos à Autora, dizendo-lhe que ia abrir outra loja e que a Autora era “de baixo nível”; nn) Após o momento referido em cc), a loja da Autora, In (…), foi fiscalizada pela ASAE (Autoridade de Segurança Alimentar e Económica); oo) A marca (…) – Acessórios de Moda é, no seu ramo (moda, design e decoração), uma marca prestigiada no comércio local, assentando na experiência de um estabelecimento que esteve aberto ao público durante 28 anos; pp) Quando a Autora celebrou os acordos mencionados nas alíneas j), r) e s) pressupôs a manutenção da marca (…) – Acessórios de Moda no estabelecimento/loja negociado, bem como a sua utilização posterior, só tendo aceitado o preço proposto naquele pressuposto. *Foram os seguintes os factos considerados não provados pelo Tribunal de 1ª instância (transcrição): Da petição inicial: artigos 16º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea u) a z), 23º a 29º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea bb), 30º a 36º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas mm) e nn), 38º a 40º, 41º, parte final, a 44º, 51º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea pp), 52º a 61º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas w) a z)e pp), 63º, 66º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea kk) e 67º a 72º. Da contestação da Ré: artigos 12º a 24º, 31º a 36º, 44º a 46º, 48º, parte final, 55º e 70º. *II. B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO A- 1º recurso (apelação da Autora) 1. Da rejeição do recurso 1.1. Por incumprimento, pela Autora/Apelante, do ónus de apresentação de conclusões de recurso Cumpre, antes de mais, analisar se a apelante observou os ónus legalmente impostos, enunciados nos artºs 639º e 640º, do Código de Processo Civil, diploma a que pertencem todos os artigos a citar sem outra referência, que constituem requisitos habilitadores ao conhecimento, por este tribunal, da impugnação e, no caso afirmativo, uma vez fixada a matéria de facto, apreciar da modificabilidade da fundamentação jurídica. Desde logo, o nº1, daquele artigo, consagrando o ónus de alegar e formular conclusões, estabelece que “O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”, sendo as conclusões das alegações de recurso que balizam a pronúncia do tribunal (negrito e sublinhado nosso). O referido ónus subdivide-se: - no da apresentação das alegações; - no de formulação de conclusões. As alegações destinam-se à apresentação dos argumentos pelos quais se sustenta a alteração da decisão. As conclusões são proposições que, de forma sintética, condensem o exposto na motivação do recurso, cabendo sublinhar que as especificações que a lei manda enunciar nas conclusões, têm a essencial função de definir e delimitar o objeto do recurso, circunscrevendo o campo de intervenção do tribunal superior. Assim, devem as conclusões corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que se pretende obter do Tribunal de 2ª instância, em contraposição com o que foi decidido pelo tribunal a quo, incluindo, na parte final, aquilo que o recorrente efetivamente pretende obter – revogação, anulação ou modificação da decisão recorrida (1). A lei exige que o recorrente condense em conclusões os fundamentos por que pede a revogação, a modificação ou a anulação da decisão. Com as necessárias distâncias, tal como a motivação do recurso pode ser associada à causa de pedir, também as conclusões, como proposições sintéticas, encontram paralelo na formulação do pedido que deve integrar a petição inicial. Rigorosamente, as conclusões devem (deveriam) corresponder a fundamentos que, com o objetivo de obter a revogação, alteração ou anulação da decisão recorrida, se traduzam na enunciação de verdadeiras questões de direito (ou de facto) cujas respostas interfiram com a decisão recorrida e com o resultado pretendido, sem que jamais se possam confundir com os argumentos de ordem jurisprudencial ou doutrinário, os quais não devem ultrapassar o setor da motivação (2). Como decorre do nº3, do art. 639º, as conclusões exercem a função de delimitar o objeto do recurso, sendo que, como ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que o recorrente pretende obter do tribunal superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo. Incluindo, na parte final, o resultado procurado, devem respeitar na sua essência cada uma das alíneas do nº2, integrando-se as respostas a tais premissas essenciais no encadeamento lógico da decisão pretendida. Se, para atingir o resultado declarado, o tribunal a quo assentou em determinada motivação, dando respostas às diversas questões, as conclusões devem elencar os passos fundamentais que, na perspetiva do recorrente, deveriam ter sido dados para atingir um resultado diverso (3). O ónus de formular conclusões, no final das alegações, só pode considerar-se satisfeito quando o recorrente termina a sua minuta com a enunciação de proposições que sintetizem, com clareza, precisão e concisão, os fundamentos ou razões jurídicas pelas quais pretende obter o provimento do recurso (anulação, alteração ou revogação da decisão do tribunal a quo) (4), sendo frequentes situações irregulares: alegações deficientes, obscuras, complexas ou sem as especificações exigidas pelo nº2, ocorrendo situações em que as conclusões são reprodução (total ou parcial) dos argumentos anteriormente apresentados, sem qualquer preocupação de síntese, como se o volume ou a quantidade das conclusões fosse sinónimo de qualidade ou como se houvesse necessidade de assegurar, por essa via, a delimitação do objeto do processo e a apreciação pelo tribunal ad quem de todas as questões suscitadas (5). Quanto a tal ónus prevê a lei a possibilidade de supressão de certas falhas que podem traduzir-se em deficiências, insuficiências, contradição, excesso, obscuridade, complexidade, prolixidade ou inocuidade, sendo suscetíveis de superação por via da resposta a um despacho de convite ao aperfeiçoamento (6). Na verdade, o nº3, daquele artigo, estatui que “Quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o número anterior, o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afetada”. E, com a reforma do regime dos recursos introduzida pelo DL nº 303/2007, de 24 de Agosto, a falta de conclusões passou, a par da ausência de alegações, a constituir fundamento de rejeição de recurso - cf. artigo 685.º-C, nº 2, al. b), do CPC, na redação anterior à Lei nº 41/2013 - e, deste modo, quando antes se admitia o convite ao recorrente a suprir a falta de conclusões, com a nova lei o convite passou a ter lugar, apenas, quando as conclusões sejam deficientes, obscuras complexas ou quando nelas se não tenha procedido às especificações previstas no nº 2 do citado artigo 639.º, sendo que, para a falta de conclusões dispõe, presentemente, a al. b), do nº2, do art. 641º (rejeição de recurso). Como se analisa no Acórdão da Relação do Porto supra citado, o cerne da questão, face às diferentes consequências que a lei atribui - rejeição do recurso para a falta de conclusões (7) e convite ao aperfeiçoamento para situações de conclusões com vícios: deficientes, obscuras, complexas ou quando nelas se não tenha procedido às especificações previstas no nº 2, do citado artigo 639º -, “consiste em distinguir o que sejam conclusões “deficientes, obscuras e complexas” e que situações integram a “ausência de conclusões”. Aí se refere, “para isso, fazemos apelo à delimitação proposta no Acórdão do STJ de 09/07/2015 (8) já citado: “As conclusões são deficientes designadamente quando não retractem todas as questões sugeridas pela motivação (insuficiência), quando não revelem incompatibilidade com o teor da motivação (contradição), quando não encontrem apoio na motivação, surgindo desgarradas (excessivas), quando não correspondam a proposições logicamente adequadas às premissas (incongruentes), ou quando surjam amalgamadas, sem a necessária discriminação, questões ligas à matéria de facto e questões de direito. Obscuras serão as conclusões formuladas de tal modo que se revelem ininteligíveis, de difícil inteligibilidade ou que razoavelmente não permitam ao recorrido ou ao tribunal percepcionar o trilho seguido pelo recorrente para atingir o resultado que proclama. As conclusões serão complexas quando não cumpram as exigências de sintetização a que se refere o nº1 (prolixidade) ou quando, a par das verdadeiras questões que interferem na decisão do caso, surjam outras sem qualquer interesse (inoquidade) ou que constituem mera repetição de argumentos anteriormente apresentados. Complexidade que também deverá decorrer do fato de se transferirem para o segmento que deve integrar as conclusões, argumentos, referências doutrinais ou jurisprudências propícias ao segmento da motivação. Ou ainda, quando se mostre desrespeitada a regra que aponta para a necessidade de a cada conclusão corresponder uma proposição, evitando amalgamar diversas questões.” No que tange ao sentido a dar à “omissão absoluta” de conclusões, para o efeito de o juiz proceder ao convite ao aperfeiçoamento ou, desde logo, à pura e simples rejeição do recurso, afirma António Abrantes Geraldes: “Estabelecendo o paralelismo com a petição inicial, tal como esta está ferida de ineptidão quando falta a indicação do pedido, também as alegações destituídas em absoluto de conclusões são “ineptas”, determinando a rejeição do recurso, sem que se justifique a prolação de qualquer despacho de convite à sua apresentação.” (9). (negrito nosso). Respondendo à questão de saber se a repetição em sede de conclusões da motivação vertida na alegação propriamente dita - que se verifica in casu - configura ou não um caso de falta de conclusões: - Uma corrente jurisprudencial (cf. Acs do STJ de 6/4/17, 297/13, de 9/7/2015, 818/07 e, ainda, de 13/10/2016, 5048/14.5TENT-A.E1.S1 (10)) e doutrinária (v. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa) vem considerando que “Apesar de constituir uma técnica manifestamente errada e violadora das exigências de sistematização impostas pelo preceito, a circunstância de, em sede de conclusões, o recorrente reproduzir a motivação vertida na alegação propriamente dita não configura um caso de falta de conclusões”, não podendo, por isso, o recurso ser rejeitado de imediato, devendo ser proferido despacho de convite ao aperfeiçoamento, com fundamento na apresentação de conclusões complexas ou prolixas (11). - Outra corrente, que adiante se aprofundará e que é por nós perfilhada, considera nenhum valor ter o puro ato inútil de mera repetição do já dito, intitulado de “conclusões”, estando as mesmas, na formulação da lei adjetiva, em real e efetiva falta, pois que para além do dito nada se acrescenta e nada se sintetiza, a motivar a rejeição do recurso, consequência legalmente estatuída, e que se impõe ao aplicador da lei, para a falta de cumprimento de tal ónus. Ora, analisando, em pormenor, a alegação de recurso apresentada pela apelante, verifica-se que a Recorrente, no que faz constar sob “concluindo”, limita-se a reproduzir, integralmente e ipsis verbis, o extenso corpo das suas alegações, aí “colando” o que, já havia escrito anteriormente, com insignificantes alterações de pormenor na redação e agrupamento. Consideramos, por isso, e porque nada de novo (a sintetizar) foi feito, mas, mero ato inútil, de repetição do já dito, não cumprido o ónus de apresentação de conclusões, o que não pode deixar de conduzir à rejeição do recurso, por aplicação da al. b), do nº2, do artigo 641º. Vejamos mais em pormenor a lei, a Doutrina e a Jurisprudência e a razão de assim considerarmos. Estabelece o referido preceito que: 2. “O requerimento é indeferido quando: a) … b) Não contenha ou junte a alegação do recorrente ou quando esta não tenha conclusões”. Ora, “O art. 639º, nº3, em conjugação com o art. 641º, nº2, al. b), não deixa margem para dúvidas, devendo o indeferimento do recurso com fundamento na falta de conclusões ser assumido logo no tribunal a quo, sem embargo de oportuna intervenção do tribunal ad quem” (12). Como se referiu, o nº1, do art. 639º, impõe que, na alegação, se conclua, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que se pede a alteração ou anulação da decisão e que o recorrente deve terminar as suas alegações de recurso com conclusões sintéticas (onde indicará os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida). Essas conclusões devem ser idóneas para delimitar de forma clara, inteligível e concludente o objecto do recurso, permitindo apreender as questões de facto ou de direito que o recorrente pretende suscitar na impugnação que deduz e que ao tribunal superior cumpre solucionar. Não devem valer como conclusões arrazoados longos e confusos em que se não discriminam com facilidade as questões invocadas (13). Como considerámos no Ac. desta Relação de 3/5/2018, proferido na Apelação nº <a href="https://acordao.pt/decisoes/192364" target="_blank">276/11.8TBTMC.G1</a>, por, ainda assim se revelar ter existido espírito de síntese, “o facto de os Recorrentes, nas “conclusões”, reproduzirem parte do corpo das suas alegações, não impõe a rejeição do recurso apenas podendo haver lugar ao convite a que alude o nº3, do referido artigo, caso se considere serem as mesmas “deficientes, obscuras ou complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o número anterior”. E, na verdade, como se decidiu no Acórdão do STJ de 13/7/2017, processo 6322/11.8TBLRA-A.C2. S1, relatado pelo Senhor Juiz Conselheiro Fonseca Ramos, as “conclusões das alegações que reproduzem o texto das alegações, dão a conhecer o objeto do recurso - art. 635º, nº3, do Código de Processo Civil - o que não pode deixar de ser tido em consideração no juízo de ponderação que importa convocar quanto a saber se, por tal procedimento, é como se não existissem. A equivalência que o Acórdão recorrido faz, considerando não haver conclusões, pelo facto delas serem a reprodução das alegações, parece excessivo. Cumpre ao Tribunal recorrido convidar o recorrente ao aperfeiçoamento das alegações, assinalando a incorreção formal que, drasticamente, serviu para rejeitar o recurso” (14) (15). Como refere Abrantes Geraldes, “Ainda que algumas das situações exemplificadas (como é o caso da anteriormente referida) justificassem efeitos mais gravosos, foi adoptada uma solução paliativa que possibilita a supressão das deficiências através de despacho de convite ao aperfeiçoamento. Ao invés do que ocorre quando faltam pura e simplesmente as conclusões, em que o juiz a quo profere despacho de rejeição imediata do recurso, qualquer intervenção no sentido do aperfeiçoamento das irregularidades passíveis de superação foi guardada para o relator no tribunal ad quem, como se extrai, com toda a clareza, do nº3 do art. 639º e da al. a) do nº 3 do art. 652º” (16) (negrito nosso). Efetivamente, “se o recorrente não alegar, ou alegando, não concluir, o requerimento de interposição do recurso é indeferido, nos termos do estipulado pelo artigo 641º, nº 2, b), do CPC, mas se alegar e concluir faltando as especificações quanto à exatidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso, o mesmo é, imediatamente, rejeitado, mas se, apenas, faltar a indicação (…) sobre o sentido da decisão que defende ou a indicação das normas jurídicas violadas, o sentido em que as mesmas deveriam ser interpretadas e aplicadas ou, em caso de erro, a norma jurídica que deveria ser aplicável, a rejeição do recurso só pode ser determinada, atento o estipulado pelos artigos 640º, nºs 1 e 2 e 639º, nºs 1, 2 e 3, do CPC, após prévio convite inconclusivo quanto ao aperfeiçoamento das alegações, exceto se o Tribunal «ad quem» e a parte contrária conseguem apreender as questões suscitadas pelo recorrente (17). Porém, no caso concreto, apesar da falsa aparência, meramente formal, de apresentação de conclusões (extensas), nenhumas conclusões foram apresentadas, mesmo que por reprodução de algo já dito, tendo, sim, ocorrido mero e integral copiar do anteriormente escrito (e mero colar de todo o corpo das alegações), o que de conclusões se não trata e nunca podendo tratar, pois que assim não podem ser entendidas, dada a ausência de síntese. “Em boa verdade, o recurso a este expediente de copy paste, para duplicar as alegações como se fosse para concluir, revela um uso abusivo dos meios automáticos de processamento de texto e conduz à inexistência material de conclusões, pois se, sob este título, apenas se derrama (…) o teor da parte analítica e argumentativa, o que de facto se oferece ao tribunal de recurso é uma fraude” (18), com o que se não pode pactuar por, desde logo, criar entraves, acrescidos esforços, custos, dificuldades e prejuízos para a celeridade processual e, consequentemente, para a realização da justiça, que se impõe que seja exercida em prazo razoável, o que se não compagina com atuações como a dos autos. A reprodução integral do anteriormente alegado no corpo das alegações, ainda que apelidada pela apelante de conclusões, não pode ser considerada para efeito do cumprimento do dever de apresentação das conclusões do recurso, nem podem ser consideradas deficientes (motivação insuficiente, contraditória, incongruente ou mesmo excessiva), obscuras ou complexas, equivalendo, ao invés, à ausência de conclusões, o que sempre dará lugar à rejeição do recurso (19). No recente Acórdão da Relação do Porto de 24/1/2018, bem se decidiu que as “conclusões são a enumeração clara e enxuta dos fundamentos expostos no corpo das alegações pelos quais a parte entende que se justifica a revogação, alteração ou anulação da decisão recorrida, com eventual resumo sintético das preposições que configuram a exposição dos argumentos relativos a cada uma dessas questões invocadas. A mera repetição de argumentos nas conclusões das alegações de recurso configura uma actuação processual inútil e prejudicial ao fim visado, e violadora das regras processuais” (20). Mais aí se considerou que a “ausência de conclusões – enquanto indicação sintética das questões colocadas pelos recorrentes – implica que o recurso deva ser rejeitado, ao abrigo do disposto no art. 641º, nº2, al. b), do CPC”, citando abundante doutrina e jurisprudência (21). Ora, in casu, independentemente da análise da verificação de deficiências, de repetições e de falta de espírito de síntese e, até, de análise sobre se o referido dá ou não a conhecer o objeto do recurso, verifica-se que ocorre mera e integral repetição do corpo das alegações, com total e absoluta falta de conclusões, pois que síntese dos fundamentos invocados não houve nenhuma. A recorrente apresentou a sua alegação e esta não contém conclusões, pois que o dito, em completa, absoluta e extensa repetição, não pode ser tido como conclusões, em cumprimento do ónus imposto no nº1, do art. 639º, do CPC – o de formular conclusões -, justificando, plenamente, os efeitos mais gravosos de que fala Abrantes Geraldes e que estão associados ao absoluto incumprimento de tal ónus sem que tal se mostre desproporcional ou excessivo, pois que tendo a parte o ónus de formular conclusões, sem o que se extrai automaticamente os efeitos gravosos da rejeição do recurso, nem sequer um esboço de esforço nesse sentido revelou ter feito (meramente “colando”), pelo que sofre as consequências da sua falta de rigor, por imperativo do princípio da auto-responsabilização das partes. Acresce que, tendo a interpretação da lei de ser feita com um sentido que na letra da mesma tenha o mínimo de correspondência e não podendo o seu aplicador ser visto como legislador, tem de se observar na aplicação da lei o sentido que da sua letra, aberta, ostensiva e claramente, decorre. Impondo a lei uma determinada consequência para a inobservância de um ónus, afigura-se-nos não poder o aplicador buscar “solução paliativa” e aplicar um outro procedimento e consequência diverso do estatuído. O “propiciar a obtenção de decisões que privilegiem o mérito ou a substância sobre a forma”, referido na exposição de motivos constante do preâmbulo do novo CPC, não implicou a derrogação dos princípios da preclusão e da autorresponsabilidade das partes. A deficiência, obscuridade ou complexidade das conclusões das alegações de recurso são vícios que afetam conclusões, supondo, assim, pelo menos, um ensaio de síntese dos fundamentos do recurso. Tal esboço não se verifica em nominadas “conclusões” que apenas repetem – com cosméticas e minudentes alterações de pormenor na redação e agrupamento – o teor integral do corpo das alegações, não sendo, assim, passíveis de despacho de aperfeiçoamento (22). E apesar de se privilegiarem as decisões de mérito relativamente às de forma, o certo é que nenhuma substância conclusiva foi apresentada e os ónus impostos têm de ser cumpridos, tendo de ser respeitadas as regras adjetivas, sob pena de a parte se sujeitar às consequências de tal incumprimento. Havendo norma expressa a regular a questão, nenhum dever de colaboração do juiz com a apelante e nenhum dever no âmbito de gestão processual do Tribunal se impondo a esse nível atenta a consequência diretamente consagrada, que cabe aplicar, sob pena de cairmos, adjetivamente, no reino onde vale tudo, impondo-se um processo equitativo, “de forma, materialmente, adequada a uma tutela efetiva, sendo a forma um meio de proporcionar às partes o acesso à justiça, com a finalidade de ser obtido o justo equilíbrio de interesses” (23). O STJ já considerou, com inteira apropriação para o caso, que: - O recorrente deve terminar as suas alegações de recurso com conclusões sintéticas (onde indicará os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida); - Essas conclusões devem ser idóneas para delimitar de forma clara, inteligível e concludente o objecto do recurso, permitindo apreender as questões de facto ou de direito que o recorrente pretende suscitar na impugnação que deduz e que o tribunal superior cumpre solucionar; - Não devem valer como conclusões arrazoadas longas e confusas em que se não discriminam com facilidade as questões invocadas; - No caso, o recorrente não reduziu a complexidade nem a inteligibilidade das alegações e porque não cumpriu o ónus que lhe é imposto o acórdão recorrido, que não apreciou o recurso por o recorrente não realizar conclusões juridicamente válidas, merece confirmação (24). E, tal como, até conclui Abrantes Geraldes, ao referir justificarem algumas das situações, que exemplifica, “efeitos mais gravosos” que o despacho de convite ao aperfeiçoamento (25) - logo rejeição do recurso –, vem sendo entendido por forte corrente jurisprudencial de todas as Relações e vem sendo considerado por alguns que jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem lidado com diversas anomalias conclusivas de uma forma, por vezes, benevolente, “flexível”, entendendo estes que “Este laisser faire, laisser passer em relação, não só à prolixidade das conclusões, mas também quanto a outras irregularidades na elaboração das conclusões das alegações de recurso, pode evitar alguma morosidade pontual, mas tem um assinalável efeito perverso que é a instalação de uma certa indisciplina no cumprimento do ónus de concluir, de repercussões dilatórias gerais. Isto porque a sucessão de decisões permissivas vai cimentando uma rotina de cedência (…). O exarar juízos reprovadores (…) sobre a prolixidade ou outras anomalias das conclusões, e depois não adoptar as consequências lógicas e legais (…) dá a imagem de uma justiça que, embora veja o que está mal, não é capaz de se impor” (26). No caso, perante a gravosa irregularidade dos autos (total repetição da extensa alegação do recurso), nenhum convite a aperfeiçoamento de conclusões no sentido de sintetização pode ser feito, pois que, por total falta das conclusões impostas por lei (forma sintética legalmente imposta pelo nº1, do art. 639º), não podem os apelantes deixar de sofrer a consequência do incumprimento do ónus em causa, o de formular as ditas conclusões, definidas legalmente, - a rejeição do recurso (al. b), do nº2, do art. 641º). *2. Da oportunidade da rejeição Para efeito de ser proferido despacho liminar sobre o requerimento de interposição de recurso, o julgador, após exercício do contraditório, “conhece, oficiosamente ou mediante iniciativa do recorrido, das questões ligadas à admissibilidade, designadamente a recorribilidade, a tempestividade, a legitimidade, a competência ou o patrocínio judiciário. O facto de a pronúncia se concretizar quando a parte contrária já teve a oportunidade de contra-alegar amplia as possibilidades de uma decisão mais correta e completa quanto aos diversos aspetos que devem ser observados na fase introdutória do recurso (27). E, se nada vir que obste à admissibilidade do recurso, o juiz fixa o seu efeito e ordena a subida. In casu, o juiz a quo emitiu despacho liminar sobre o requerimento de interposição do recurso, admitindo-o, sendo que “O despacho de rejeição imediata do recurso deve ser reservado para casos em que a mera leitura do requerimento e das alegações torne manifesta a ausência do requisito da recorribilidade da decisão. É este critério que permite cindir a mera admissão ou rejeição liminar do recurso da apreciação dos seus fundamentos materiais que fica reservada para momento posterior” (28), não se encontrando prevista a possibilidade de introdução de despacho de convite às partes a pronunciar-se sobre aspeto que fundamente rejeição, sendo que, desde logo, “A falta de alegações ou de conclusões impõe a rejeição imediata do recurso, sem que se admita despacho de aperfeiçoamento, tendo em conta o que se encontra previsto no art. 641º, nº2, al. b)” (29). Ora, o despacho liminar de admissão do recurso não é vinculativo, cabendo, sempre, nos termos do nº5, do art. 641º, ao Tribunal Superior decidir da admissão ou rejeição do recurso. E a apreciação genérica e tabelar por parte do Relator dos aspetos formais relacionados com a admissibilidade do recurso não produz efeitos de caso julgado formal, não precludindo a possibilidade de posterior pronúncia de sentido diverso, seja por iniciativa própria do Relator, seja por sugestão dos Adjuntos (30) (31) (32), não constituindo a decisão, sem audição prévia das partes, decisão-surpresa, pois que quem tem o poder de admitir liminarmente também tem o de rejeitar (33) e é a própria lei a prevenir, até, expressamente este fundamento específico de rejeição. Acresce que, como vimos, o coletivo de juízes, que não está vinculado nem ao decidido pelo juiz a quo nem ao decidido pelo Relator, podendo ao apreciar decidir livremente pela rejeição do recurso, que vem admitido. Tal solução sempre se impõe, até, por um argumento de maioria de razão, pois que podendo o recurso ser rejeitado por um juiz só, por maioria de razão não poderia deixar de ser permitido o conhecimento imediato a um coletivo de juízes (que é quem tudo definitiva, livre e autonomamente decide neste Tribunal Superior). Assim, não sendo o despacho a admitir o recurso vinculativo para o Tribunal da Relação (artigo 641.º, nº 5, do CPC), nem fazendo o despacho do Relator caso julgado, cabendo ao coletivo de juízes, também, conhecer da admissibilidade do recurso e verificando-se - não obstante a ilusória aparência formal em contrário - a falta, como supra exposto, do objeto do recurso - “conclusões” - prejudicado fica o conhecimento do mérito do mesmo (34). *B- 2º recurso (apelação da Ré) 1. Rejeição do recurso quanto à impugnação da decisão sobre a matéria de facto 1.1. Por incumprimento, pela Ré/Apelante, dos ónus (primários e secundários) impostos para a impugnação decisão sobre a matéria de facto Conclui a Ré/Apelante dever a decisão da matéria de facto ser alterada em conformidade com os depoimentos das testemunhas e documentos referidos, passando a integrar a factualidade apurada a supra identificada na conclusão 3ª, devendo, em consequência ser julgada não provada e improcedente a presente ação. Ora, analisando as alegações da Ré Apelante, verifica-se que a mesma não especifica separadamente cada facto que impugna, com indicação dos concretos meios de prova que, no seu entender, levariam a uma decisão divergente da tomada quanto a cada facto e, ainda, em que sentido é que esta prova deveria ser interpretada, efetuando análise crítica da mesma, com indicação da relevância e do específico momento da gravação onde é tratado, tudo fazendo em bloco e pedindo que, na procedência da impugnação da matéria de facto, se proceda à nova qualificação jurídica e se julgue totalmente improcedente a ação. A fim de fixar, definitivamente, a matéria de facto e de analisar da modificabilidade da fundamentação jurídica, antes de mais, cumpre decidir se a apelante impugnante observou os ónus legalmente impostos em sede de impugnação da decisão da matéria de facto, e que vêm enunciados no art. 640º, os quais constituem requisitos habilitadores a que o tribunal ad quem possa conhecer da impugnação e decidi-la. Na verdade, no que se reporta à atividade jurisdicional que, quanto a tal, deve ser levada a cabo por este Tribunal de Segunda Instância, o nº1, do art. 640º, consagra que, quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a)- os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b)- os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c)- a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (negrito nosso). O n.º 2, do referido artigo acrescenta que: a) … quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (negrito nosso). Como resulta do referido preceito, e seguindo a lição de Abrantes Geraldes, quando o recurso verse a impugnação da decisão da matéria de facto deve o recorrente observar as seguintes regras: a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; (negrito nosso) b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos; c) Relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exactidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos;(…) e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar a interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente (35) (negrito nosso, por revelar relevância para o caso). Com a reforma introduzida ao Código de Processo Civil pelos Decretos-Leis n.ºs 39/95, de 15/02 e 329-A/95, de 12/12, o legislador consagrou o registo da audiência de discussão e julgamento, com a gravação integral da prova produzida, e conferiu às partes duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto. O tribunal de segunda instância passou a fazer um novo julgamento da matéria impugnada, assegurando um efetivo duplo grau de jurisdição, sendo isto que resulta do estatuído no art. 662º, n.º 1, do CPC, quando nele se expressa que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Comparando o anterior regime com o atual (cf. o art. 712º, do anterior CPC, com o art. 662º do atual), verificamos que a possibilidade de alteração da matéria de facto, que era excecional, passou a ser função normal do Tribunal da Relação, elevado a verdadeiro Tribunal de substituição, verificados os referidos requisitos legais. Conferiu-se, assim, às partes um duplo grau de jurisdição, por forma a poderem reagir contra eventuais e hipotéticos erros de julgamento, com vista a alcançar uma maior certeza e segurança jurídicas e a, desse modo, obter decisões mais justas, alcançando-se, assim, uma maior equidade e paz social, sempre buscadas pelo Estado, verdadeiro interessado na realização da justiça. O duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto pressupõe novo julgamento quanto à matéria de facto impugnada e “somente será alcançado se a Relação, perante o exame e análise crítica das provas produzidas, a respeito dos pontos de facto impugnados, puder formar a sua própria convicção, no gozo pleno do princípio da livre apreciação das prova, sem estar limitada pela convicção que serviu de base à decisão recorrida, em função do princípio da imediação da prova, princípio este que tido por absoluto transformaria este duplo grau de jurisdição em matéria de facto, numa garantia praticamente inútil” (36). Tendo o recurso por objeto a impugnação da matéria de facto, a Relação deve proceder a um novo julgamento, limitado à matéria de facto impugnada, procedendo à efetiva reapreciação da prova produzida, devendo nessa tarefa considerar os meios de prova indicados no recurso, assim como, ao abrigo do princípio do inquisitório, outros que entenda relevantes, apreciando livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto impugnado, exceto no que respeita a factos para cuja prova a lei exija formalidades especiais ou que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados por documento, acordo ou confissão (art. 607º, n.º 5 do Cód. Proc. Civil). Contudo, o legislador, ao impor ao recorrente o cumprimento das referidas regras, visou afastar soluções que pudessem reconduzir-nos a uma repetição dos julgamentos, tal como foi rejeitada a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, tendo o legislador optado por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências pelo recorrente. (37) Não se consagra a possibilidade de repetição do julgamento e de reapreciação de todos os pontos de facto, mas, apenas e só, a reapreciação pelo tribunal superior e, consequente, formação da sua própria convicção (à luz das mesmas regras de direito probatório a que está sujeito o tribunal recorrido) quanto a concretos pontos de facto julgados provados e/ou não provados pelo tribunal recorrido. A possibilidade de reapreciação da prova produzida em 1ª instância, enquanto garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, nunca poderá envolver a reapreciação global de toda a prova produzida, impondo-se, por isso, ao impugnante, no respeito dos princípios estruturantes da cooperação e da lealdade e boa-fé processuais, a observância das citadas regras. O Tribunal da Relação, sendo de 2ª instância, continua a ter competência residual em sede de reponderação ou reapreciação da matéria de facto (38), estando subtraída ao seu campo de cognição a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo que não seja alvo de impugnação. Em suma, deve, assim, o recorrente, sob cominação de rejeição do recurso, para além de delimitar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, deixar expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, sendo que, como refere Abrantes Geraldes, esta última exigência (plasmada na transcrita alínea c) do nº 1 do art. 640º) vem reforçar o ónus de alegação imposto ao recorrente (…) por forma a obviar a interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente, devendo ser apreciada à luz de um critério de rigor enquanto decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo (39). É entendimento doutrinal e jurisprudencial uniforme que, nas conclusões das alegações, que têm como finalidade delimitar o objeto do recurso (cf. nº4, do art. 635º, do CPC) e fixar as questões a conhecer pelo tribunal ad quem, o recorrente tem de delimitar o objeto da impugnação de forma rigorosa, indicando os concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados, sob pena de rejeição do recurso, como a lei adjetiva comina no nº1, do art. 640º. Não obstante o NCPC proceder, como vimos, ao alargamento e reforço dos poderes da Relação no domínio da reapreciação da matéria de facto, deve ser rejeitado o recurso, no atinente a tal ponto, quando o recorrente não cumpra os ónus impostos pelos nº1 e 2, a), do art. 640º (40). E impõe-se a rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto quando ocorra: a) falta de conclusões sobre a impugnação da matéria de facto (art. 635º, n.º 4 e 641º, n.º 2, al. b); b) falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (art. 640º, n.º 1, al. a)); c) falta de especificação (que pode constar apenas na motivação), dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.); d) falta de indicação exata, (que pode constar apenas na motivação), das passagens da gravação em que o recorrente se funda; e) falta de posição expressa, (que pode constar apenas na motivação), sobre o resultado pretendido a cada segmento da impugnação” (41). Tais critérios têm sido aplicados pelo Supremo Tribunal de Justiça (42), que tem vindo a distinguir, quanto aos ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, entre: - ónus primários, que se reportam ao mérito da pretensão; - ónus secundários, que respeitam a requisitos formais. Quanto aos ónus primários, onde inclui a obrigação do recorrente de formular conclusões e nestas especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e a falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados e falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação, requisitos estes sobre que versa o n.º 1, do art. 640º, do CPC, a jurisprudência tem considerado que aquele critério é de aplicar de forma rigorosa, pelo que sempre que se verifique o incumprimento de algum desses ónus por parte do recorrente se impõe rejeitar o recurso (43). Quanto aos ónus secundários, os enunciados no n.º 2, do referido artigo, em que se consagra a obrigação do recorrente, quando os meios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas que tenha sido gravada, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes, a jurisprudência considera que embora a observância desse ónus deva ser apreciada à luz de um critério de rigor, não convém exponenciar esse critério ao ponto de ser violado o princípio da proporcionalidade e denegada a reapreciação da decisão da matéria de facto com invocação de fundamentos que não encontram sustentação clara na letra ou no espírito do legislador (44). Assim, e como decidiu o STJ, o apelante pretendendo que o Tribunal da Relação reaprecie o julgamento da matéria de facto, para dar cabal cumprimento ao preceituado na al. c) do nº1, do art. 640º, do NCPC (2013), deve ser claro e inequívoco, afirmando que os pontos da matéria de facto impugnados deveriam ter as respostas que segundo a sua apreciação deveriam ter tido, indicando-as, de harmonia com as provas que indicou. Tal ónus não se satisfaz expressando o recorrente meras apreciações discordantes do julgamento e juízos de valor críticos, referidos aos depoimentos das testemunhas indicadas. A mera indicação de que certos pontos da matéria de facto, que são indicados, não deveriam ter tido as respostas que tiveram, sem se dizer quais as respostas que numa correta apreciação deviam merecer, não cumpre aquele ónus (45). A delimitação tem de ser concreta e específica e o recorrente tem de indicar, com clareza e precisão, os meios de prova em que fundamenta a sua impugnação, bem como as concretas razões de censura. Tal tem de ser especificado quanto a cada concreto facto. Não pode ser efetuado em termos latos, genéricos e em bloco. Analisado as conclusões das alegações da Apelante, entendemos que a Recorrente, que impugna a decisão da matéria de facto, não faz referência aos concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados indicando, justificadamente, os elementos probatórios que conduziriam à alteração de cada concreto ponto e a decisão que devia ter sido proferida quanto a cada concreto facto, procedendo a uma análise critica das provas e indicando a decisão que devia ser proferida sobre as concretas questões de facto impugnadas, em obediência às três alíneas do nº1, do referido art. 640º. Na verdade, e após o que refere no corpo das alegações, formula a Ré as conclusões supra referidas, que, como se referiu, delimitam o objeto do seu recurso. E, efetivamente, verifica-se que a recorrente, nas conclusões, não indica especificadamente os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, não especifica os meios probatórios que determinariam decisão diversa da tomada em Primeira Instância para cada um dos factos que pretende impugnar. Ora, como vimos, tal não basta para que se possa considerar cumprido aquele ónus, o que obsta ao conhecimento do objeto de recurso, pois que nesta Segunda Instância não se realiza novo julgamento sendo, tão só, de reapreciar os concretos meios probatórios relativamente aos pontos de facto impugnados e não em bloco. A falta de indicação por parte da apelante quer dos elementos probatórios que conduziriam à alteração de cada um dos pontos nos termos por ela propugnados, quer da decisão que, no seu entender, deveria sobre eles ter sido proferida, relativamente a cada facto concreto, e não em bloco, situação esta que se verifica in casu, têm, como consequência, a imediata rejeição do recurso, na parte respeitante aos pontos da matéria de facto relativamente aos quais se verifica a omissão, pois que quanto ao recurso da matéria de facto não existe despacho de aperfeiçoamento ao contrário do que sucede quanto ao recurso em matéria de direito, por aplicação do disposto no art. 639º, nº3, do CPC. Acresce que a recorrente não fez, também, qualquer apreciação crítica dos meios de prova produzidos, quanto a cada concreto facto, a justificar o erro de julgamento que invoca em termos genéricos, tendo de o fazer, pois que só assim cumpriria a exigência de obrigatória especificação imposta pelo nº1, do art. 640º. E, como se decidiu no Ac. da Relação de Lisboa de 13/3/2014 “Ao impugnar a decisão de facto, à luz do NCPC, cabe ao recorrente, em sede conclusiva, expressar o sentido da decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica, de que não poderá demitir-se, dos meios de prova produzidos/invocados – exigência nova de reforço do ónus de alegação e conclusão, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente – sob pena de rejeição da impugnação, por insuficiência ou obscuridade, na parte não fundamentada em exame crítico das provas. Tais exigências devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor, em decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão de facto se transforme em simples manifestação de inconsequente inconformismo (46). No mesmo sentido se orienta toda a jurisprudência – v., designadamente Ac. da Relação de Guimarães de 3/3/2016, Processo 283/08 e de 4/2/2016:Processo 283/08.8TBCHV.A.G1 (47) – onde se refere que “Tal como se impõe, por mor do preceituado no nº4, do art. 607º, do CPC, que o tribunal de 1ª instância faça a análise crítica das provas (de todas as provas que se tenham revelado decisivas) também o recorrente, ao enunciar os concretos meios de prova que devem conduzir a uma decisão diversa, deve fundamentar tal pretensão numa análise (crítica) dos meios de prova, não bastando reproduzir um ou outro segmento descontextualizado dos depoimentos. (…) Não cumpre o ónus de impugnação da decisão relativa à matéria de facto a que se refere a al. b), do nº1, do art. 640º, do NCPC, o recorrente que se limita a transcrever uma parte … do depoimento, aí partindo para a formulação da sua pretensão de modificação de diversos pontos da matéria de facto que indicou em bloco”. E, servindo as conclusões para delimitar o objeto do recurso, nelas devem ser identificados com precisão os pontos de facto que são objeto de impugnação (quanto aos demais previstos no art. 640º, é suficiente que constem de forma explícita na motivação do recurso) (48). Sendo função das conclusões do recurso indicar, embora de forma sintética, os fundamentos porque se pede a alteração (seja de facto seja de direito) da decisão, nelas tem o recorrente, que impugna a matéria de facto, de especificar os concretos factos que entende estarem mal julgados. A aferição deste mau julgamento é a questão colocada à decisão do tribunal de 2ª instância e, como tal, tem de constar das conclusões ou estará fora do objeto do recurso. Já a especificação dos concretos meios de prova que impunham decisão diversa e o cumprimento da exigência indicada na al. a), do nº2, do art. 640º, do NCPC, têm a sua sede própria no corpo da alegação. Acresce, ainda, que cabe ter em conta, que, quanto ao recurso da decisão da matéria de facto, não existe a possibilidade de despacho de convite ao aperfeiçoamento, sendo este tipo de despacho reservado somente aos recursos em matéria de direito. A falta de especificação nas conclusões dos factos concretos que se consideram mal julgados não dá lugar a despacho de aperfeiçoamento no quadro do nº3, do art. 639º, do NCPC (49). Como se decidiu no Acórdão desta Secção, em que a ora relatora foi adjunta, proferido na apelação nº <a href="https://acordao.pt/decisoes/192950" target="_blank">3361/12.5TBBCL.G1</a>, no que respeita aos ónus da impugnação secundários, está-se “perante meros requisitos de forma, destinados a facilitar a localização dos depoimentos relevantes no suporte técnico que contém a gravação da audiência, pelo que o cumprimento desse ónus tem de ser “interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não se justificando a imediata e liminar rejeição do recurso quando, apesar de a indicação do recorrente não for totalmente exata e precisa, não exista dificuldade relevante na localização pelo tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento” (50). Conforme se lê no acórdão do STJ, cujo excerto se acaba de transcrever e infra identificado, “na interpretação da norma que consagra este ónus de indicação exata a cargo do recorrente que impugna prova gravada, não pode deixar de se ter em consideração a filosofia subjacente ao atual CPC, acentuando a prevalência do mérito e da substância sobre os requisitos ou exigências puramente formais, carecidos de uma interpretação funcionalmente adequada e compaginável com as exigências resultantes do princípio da proporcionalidade e da adequação – evitando que deficiências ou irregularidades puramente adjetivas impeçam a composição do litígio ou acabem por distorcer o conteúdo da sentença de mérito, condicionado pelo funcionamento de desproporcionadas cominações ou preclusões processuais”. Acontece que não obstante ser entendimento unânime do STJ no sentido de que aquele ónus de impugnação secundário tem de ser apreciado à luz de um critério da proporcionalidade, sendo de rejeitar a impugnação da matéria de facto quando não exista dificuldade relevante na localização pelo tribunal dos excertos da gravação em que a parte tenha fundado a sua impugnação, já existe discordância sobre as concretas condições que têm de se encontrar observadas para que à luz do enunciado critério de proporcionalidade se considere estar cumprido minimamente esse critério, de modo a não levar à rejeição do recurso quanto à impugnação da matéria de facto. Assim, enquanto no Ac. do STJ. de 09/07/2015, proferido no Proc. 284040/11.0YIPRT.G1.S1, se considerou que “tendo o apelante, nas suas conclusões de recurso (i) identificado os pontos de facto que considerava mal julgados, por referência aos quesitos da base instrutória, (ii) indicado o depoimento das testemunhas, que entendeu mal valorados, (iii) fornecido a indicação da sessão no qual foram prestados e do início e termo dos mesmos, apresentado a sua transcrição, (iv), bem como referido qual o resultado probatório que no seu entender deveria ter tido lugar, relativamente a cada quesito e meio de prova, tanto bastava para que a Relação tivesse procedido à reapreciação da matéria de facto, ao invés de a rejeitar” (51), outros entendem que o cumprimento daquele ónus por referência ao princípio da proporcionalidade não se basta com a indicação do início e termo dos depoimentos em que se funda o recurso, sequer com a apresentação da transcrição integral desses depoimentos, mas exige a indicação da concreta passagem ou passagens da gravação em que se funda o recurso (início e termo do excerto ou excertos em relação aos depoimentos que o recorrente considere relevantes) ou a transcrição desse excerto ou excertos. Neste último sentido pronunciou-se o Ac. STJ. de 14/09/2006, Proc. n.º 06B1998, onde se lê que: “Deve ser rejeitado o pedido de alteração da matéria de facto formulado na apelação que se refira unicamente aos depoimentos de determinadas testemunhas, mas omita os concretos pontos gravação das declarações daquelas que impunham uma decisão diversa sobre os trechos da matéria de facto impugnada”. Também no Ac. do STJ. de 19/01/2016, Proc. n.º 3326/10.4TBLRA.C1. S1, pondera-se que “ a falta de indicação exata e precisa do segmento da gravação em que se fundamenta o recurso, nos termos da alínea a) do n.º 2 do art. 640º do CPC não implica, só por si a rejeição do pedido de impugnação sobre a decisão da matéria de facto, desde que o recorrente se reporte à fixação eletrónica/digital e transcreve os excertos que entenda relevantes de forma a permitir a reanálise dos factos e o contraditório. Ainda no Ac. do STJ. de 19/02/2015, Proc. <a href="https://acordao.pt/decisoes/119983" target="_blank">405/09.1TMCBR.C1</a>.S1, escreve-se que “… a apresentação das transcrições globais dos depoimentos não satisfaz a exigência determinada pela al. a) do n.º 2 do art. 640º do Cód. Proc. Civil”. Sem se perder de vista que o ónus enunciado no n.º 2 do art. 640º é meramente processual, destinando-se a facilitar a localização pelo tribunal ad quem, mas também pelo recorrido, dos depoimentos relevantes no suporte técnico que contém a gravação, habilitando o último a exercer cabalmente o seu direito de defesa em sede de contra-alegações e a apreender o raciocínio seguido nessa impugnação pelo recorrente por referência a esses concretos elementos probatórios, e que a filosofia subjacente ao atual CPC acentua a prevalência do mérito e da substância sobre os requisitos ou exigências meramente formais, reclamando que se interprete o art. 640º, n.º 2, al. a) de forma funcionalmente adequada atento o fim a que se destina, o que reclama o recurso ao princípio da proporcionalidade na apreciação do cumprimento daquele ónus, sendo de rejeitar toda e qualquer interpretação do enunciado normativo no sentido de impor o indeferimento do recurso da matéria de facto como decorrência automática do incumprimento do ónus que prescreve, propendemos para este segundo entendimento. É que, de contrário, não só estaríamos a fazer tábua rasa daquele preceito legal, que é expresso no sentido de impor ao recorrente a indicação com exatidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso, ou em alternativa, proceder à transcrição das mesmas, falando, aliás, em “transcrição de enxertos” de depoimento ou depoimentos que o recorrente “considere relevantes”, como se estaria a minorar os princípios da auto-responsabilidade das partes que, em sede de recurso, independentemente do valor da causa, têm de estar sempre representadas por técnico habilitado com os indispensáveis conhecimentos jurídicos – advogado -, além de se estar a restringir, minorando-os, os deveres de cooperação, lealdade e boa-fé processuais a que se encontram adstritas e, inclusivamente, se poder fazer perigar os direitos de defesa do recorrido, que desconheceria quais os concretos e específicos fundamentos probatórios em que o recorrente funda a sua impugnação e o raciocínio por ele seguido a partir desses fundamentos, por forma a poder cabalmente defender-se, em sede de contra-alegações, carreando para os autos outros excertos do depoimento daquela ou de outras testemunhas ou partes que sustentariam, na sua perspetiva, o julgamento feito pelo tribunal a quo. Resulta do que se vem dizendo, que não pudemos deixar de sufragar a posição jurisprudencial que sustenta que ao cumprimento do ónus enunciado no art. 640º, n.º 2, al. a), não basta ao recorrente que pretende atacar a decisão quanto aos concretos pontos da matéria de facto dados como provados e/ou não provados pelo tribunal a quo indicar o início e o termos dos depoimentos que, na sua perspetiva, impõem solução diversa, sequer a transcrição integral desses depoimentos, mas antes reclama que o recorrente indique a concreta passagem em que se funda o seu recurso, indicando o início e termo do(s) excerto(s) dos depoimentos das partes e/ou testemunhas que impõem essa solução diversa ou proceda à transcrição desse(s) excerto(s)”. In casu, impõe-se concluir que a recorrente não cumpriu o ónus de proceder à análise especificada dos factos, que impugnou em blocos e não cumpriu o consagrado na al. a) do n.º 2 daquele artigo, pois que nas conclusões se limitou a referir “depoimento de testemunhas” que, na sua perspetiva, impunham decisão diversa da proferida, sem sequer as mencionar e sem fazer a associação detalhada e especificada a cada facto e no corpo das alegações indicou, tão somente, o início e o fim de depoimentos de testemunhas (cf., desde logo, referências feitas no corpo das alegações com as referências feitas nas atas da audiência de julgamento à gravação do depoimento de cada testemunha), o que não cumpre, como acima sustentamos, o ónus enunciado no preceito anteriormente referido. Assim, analisado o corpo das alegações e as respetivas conclusões, verifica-se que a Recorrente, que impugna a decisão da matéria de facto, não deu cumprimento aos ónus impostos pelo artigo 640.º, nº 1, pois que não indica, especificadamente para cada facto, os elementos probatórios que conduziriam à alteração dos pontos da matéria de facto nos termos por ela propugnados e não indica as passagens da gravação em que funda o recurso (como imposto pelo nº 2, al. a) do citado normativo), pois que nada referindo nas conclusões, no corpo das alegações, quanto à pretendida “alteração da matéria de facto”, a Ré reporta-se aos depoimento das testemunhas, referindo apenas as horas de início e fim dos depoimentos prestados, citando partes dos depoimentos. Ora, como vimos, tal não basta para que se possa considerar cumprido aquele ónus, o que obsta ao conhecimento do objeto de recurso, pois que nesta 2ª Instância não se realiza novo julgamento sendo, tão só, de reapreciar os concretos meios probatórios relativamente aos pontos de facto impugnados. A falta de indicação por parte do apelante quer dos elementos probatórios que conduziriam à alteração dos pontos nos termos por ele propugnados, quer das passagens da gravação em que funda o recurso (nº 2 al. a) do citado normativo), situação que se verifica in casu, têm, como consequência, a imediata rejeição do recurso, na parte respeitante aos pontos da matéria de facto relativamente aos quais se verifica a omissão. Na esteira do que acima se deixou dito, perante a impugnação em bloco, com falta de indicação, especificada, de prova e da análise crítica da mesma e omissão pela recorrente do cumprimento do ónus estatuído no art. 640º, n.º 2, al. a), impõe-se rejeitar o recurso da matéria de facto interposto pela mesma. A indicação “com exatidão das passagens da gravação em que se funda” concretiza-se mencionando o minuto em que cada uma de tais “passagens” tem início. A “transcrição” das “passagens” não constitui uma alternativa à indicação “com exatidão das passagens da gravação” e esta indicação não se pode ter por feita quando somente se menciona a hora de início e do fim de cada depoimento (52) Assim, não obstante o NCPC proceder, como vimos, ao alargamento e reforço dos poderes da Relação no domínio da reapreciação da matéria de facto, deve ser rejeitado o recurso, no atinente a tal ponto, quando o recorrente não cumpra os ónus impostos pelos nº1 e 2, a), do art. 640º (53). Pelo exposto, por falta de observância do disposto no nº1 e 2 a), do art. 640º, do CPC, nos termos supra expostos, rejeita-se o recurso, na parte respeitante à reapreciação da matéria de facto, nenhuma alteração havendo a fazer à decisão da matéria de facto.*5ª- Da nova fundamentação jurídica Analisou o Tribunal a quo da verificação dos pressupostos da simulação relativamente aos, apelidados pelas partes, reconhecimento de obrigação pecuniária, acordo de pagamento e constituição de garantia, contrato de arrendamento com prazo certo para fins não habitacionais com fiança e cessão de posição contratual em contrato de trabalho e da invalidade do negócio celebrado entre elas, considerando, em face da matéria de facto provada que não mereceu alteração que“Prescreve o artigo 240º, nº 1 do Código Civil que “se, por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado”. E, no seu nº 2 “o negócio simulado é nulo”. “Exige este artigo três requisitos para que haja simulação: divergência entre a vontade real e a vontade declarada, o intuito de enganar terceiros e o acordo simulatório. (…). Pode existir simulação nos simples actos jurídicos (vide artigo 295º) e em negócios unilaterais (vide, quanto aos testamentos, o artigo 2200º). (…) Consagrando a nulidade do negócio simulado a lei quer dizer portanto: a) que a simulação pode ser invocada por qualquer interessado e ser oficiosamente declarada; b) que o vício do negócio pode ser arguido a todo o tempo, tanto por meio de acção como por via de excepção; c) que o vício não pode ser sanado, mediante confirmação da declaração” (54). Há que distinguir a simulação absoluta da simulação relativa. Na primeira, as partes fingem celebrar um negócio jurídico e na realidade não querem nenhum negócio jurídico. Há apenas o negócio simulado e, por detrás dele, nada mais. Na simulação relativa as partes fingem celebrar um certo negócio jurídico e na realidade querem um outro negócio jurídico de tipo ou conteúdo diverso. Por detrás do negócio simulado ou aparente ou fictício ou ostensivo há um negócio dissimulado ou real ou latente ou oculto (55). “I. Para que haja um negócio simulado é necessária a verificação simultânea de três requisitos: a intencionalidade da divergência entre a vontade e a declaração, o acordo simulatório (pactum simulationis) e o intuito de enganar terceiros, que não se deve confundir com o intuito de prejudicar. II. O ónus da prova de tais requisitos, porque constitutivos do respectivo direito, cabe, segundo as regras gerais nesta matéria, a quem invoca a simulação” (56). Em face do acervo factual dado por provado, deveremos concluir que apesar de as partes não terem querido realmente celebrar os acordos elencados, o que é certo, é que não logramos extrair daquele acervo factos ou circunstâncias que nos permitam afirmar ter havido um acordo simulatório. Com efeito, os factos demonstram-nos que a Autora deixou que fosse a Ré a conduzir os preparativos do negócio, em face da confiança que nela depositava, pelo que assinou os acordos sem uma prévia combinação e sem ter noção que podia enganar terceiros, designadamente, a Fazenda Nacional. Inexistem, pois, factos que nos permitam afirmar ter existido simulação, nos termos previstos no artigo 240º, do Código Civil, claudicando, por isso, o primeiro dos pedidos formulados pela Autora. No entanto, sendo certo que o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito – cfr. artigo 5º, nº 3, do Código de Processo Civil -, cumpre apreciar a matéria de facto dada por provada de molde a interpretar correctamente a vontade das partes. E interpretados tais factos parece-nos indubitável que as partes quiseram trespassar os três estabelecimentos em causa. Segundo Coutinho de Abreu, “o trespasse é definível como transmissão da propriedade de um estabelecimento por negócio entre vivos” (57). “O estabelecimento comercial é a estrutura material e jurídica integrante, em regra, de uma pluralidade de coisas corpóreas e incorpóreas – coisas móveis e ou imóveis, incluindo as próprias instalações, direitos de crédito, direitos reais e a própria clientela ou aviamento – organizados com vista à realização do respectivo fim, designado, na doutrina tradicional, de universalidade de direito. (…) A referida estrutura varia, como é natural, em função de circunstâncias diversas, desde logo em razão dos diversos ramos de actividade que operem. (…) Para que esta exista não é forçoso que estejam todos os elementos, bastando que se encontrem reunidos os elementos essenciais que individualizam e dão consistência ao estabelecimento - que seja reconhecível o núcleo essencial do estabelecimento mercantil, o qual traduz a sua capacidade lucrativa ou o seu aviamento. (…) Assim, o conjunto dos elementos de determinado estabelecimento comercial ou industrial, incluindo o humano, é variável ao longo do tempo, consoante a vontade do respectivo titular, segundo os seus interesses, em regra condicionados, além do mais, pela evolução da tendência de mercado, pelas necessidades de reestruturação, de especialização ou de economia de meios” (58). “Para se estar perante um trespasse é fundamental que se esteja, sem dúvida perante a transmissão do estabelecimento, mas nada obsta que não sejam transmitidos todos os elementos que o componham desde que, observado o transmitido, ainda se verifique claro que o que foi transferido para a esfera patrimonial do adquirente foi um conjunto de elementos organizado para a exploração de determinada actividade económica. Enfim, desde que, não obstante a retirada de um ou outro elemento que o compunham anteriormente, o objecto (conjunto de direitos e bens) transmitido ainda contenha a estrutura organizada destinada ao desenvolvimento daquela actividade económica, não há qualquer razão para afastar a sua transmissão do conceito de trespasse. (…) Exige-se que o objecto da transmissão se possa considerar um estabelecimento comercial (não teria qualquer sentido que a retirada de algum dos bens sem qualquer valor no conjunto impedisse que se considerasse o contrato de transmissão como trespasse, pelo que a pedra de toque tem que ser obtida no conceito central de estabelecimento comercial: se o que é transferido ainda é um estabelecimento comercial, mesmo que o mesmo esteja desfalcado de algum elemento que cumpre ainda preencher para o exercício da actividade, temos trespasse).” (59) No nosso caso, tendo presente a matéria de facto constante das alíneas g) a n), r) e s) e t) a z), do ponto II.1., podemos assumir uma inequívoca vontade das partes em querer transmitir os estabelecimentos comerciais referidos nas alíneas c) e d), do mesmo ponto, aliás, intenção que as partes acabaram por referir nos documentos referidos na alínea j), do mesmo ponto. O trespasse celebrado, e cujo pagamento do preço surge regulado nos referidos documentos mencionados na alínea j), do ponto II.1., surge coligado com o contrato de arrendamento com prazo certo para fins não habitacionais com fiança e com o contrato de cessão de posição contratual em contrato de trabalho, atento o fim unitário e conjunto que presidiu à celebração dos mesmos (60). Vício de forma? Nos termos do artigo 1112º, nº 3, do Código Civil, a transmissão do estabelecimento comercial deve ser celebrada por escrito (61). A inobservância da forma legal inquina o negócio de vício de forma, sendo as respectivas declarações negociais nulas – cf. artigo 220º, do Código Civil. A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal – cf. artigo 286º, do Código Civil. É, pois, dever do Tribunal declarar a nulidade do negócio de trespasse celebrado entre as partes. A declaração de nulidade afecta, inevitavelmente, os documentos referidos na alínea j), do ponto II.1., pois que os mesmos têm por objecto apenas um dos elementos do contrato de trespasse, a saber, o preço, não se retirando dos mesmos, formal e expressamente, o encontro de vontades necessário à assunção formal da validade do negócio. E tal declaração afecta, necessariamente, os contratos de arrendamento com prazo certo para fins não habitacionais com fiança e de cessão de posição contratual em contrato de trabalho porque coligados com o formalmente inválido contrato de trespasse. Com efeito, quer o contrato de arrendamento, quer a cessão, só foram celebrados por causa do trespasse, ligando todos eles uma interdependência funcional que preenche a figura da coligação de contratos. Nestes casos, entende-se, na impossibilidade de redução do negócio, nos termos do artigo 292º do Código Civil, atenta aquela interdependência, que a declaração de nulidade deve afectar toda a unitária composição de interesses, não tendo sentido fazer subsistir na ordem jurídica obrigações que ficaram sem objecto (62). Nos termos do disposto no artigo 289º, nº 1, do Código Civil, “tanto a declaração de nulidade como a anulação do negócio têm efeito retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente”. Portanto, as partes devem restituir reciprocamente o que prestaram. No entanto, tem sido entendido que o caso de contratos nulos que envolvem a concessão onerosa do gozo de coisas, porque o gozo não é passível de ser restituído, a contrapartida do gozo convencionada pelas partes deve ser retida por aquela que concede o gozo e como sucedâneo da impossível restituição do gozo da coisa por aquela que fruiu a coisa (63). Deste modo, a Autora está obrigada a restituir à Ré o arrendado mencionado em b) e os estabelecimentos comerciais mencionados nas alíneas c) e d), com todo os móveis e existências à data da celebração do trespasse, ou o respectivo valor à mesma data. E a Ré está obrigada a entregar à Autora todas as quantias recebidas, deduzidas do valor recebido a título de rendas pela ocupação do espaço mencionado em b). Quantias estas cujo apuramento se relega para execução de sentença, nos termos do disposto no artigo 609º, nº 2, do Código de Processo Civil. Em face da invalidade formal do negócio celebrado pelas partes, fica prejudicado o conhecimento do restante peticionado – cf. artigo 608º, nº 2, do Código de Processo Civil”. Dependendo o pedido de alteração do decidido na sentença proferida nos autos, no que à interpretação e aplicação do direito respeita, na sua totalidade, da procedência da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, a qual, porém, se mantém inalterada, fica necessariamente afastada nova subsunção jurídica, sendo de manter, pelas razões de direito expostas, a decisão do tribunal a quo, que bem qualificou o contrato celebrado entre as partes como trespasse, nulo por falta de forma e bem extraiu as consequências de tal vício de forma. Termos em que, improcede, na sua totalidade, a apelação em presença.*III. DECISÃO Pelos fundamentos expostos, os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em: a)- rejeitar o recurso de apelação interposto pela Autora por efetiva, real e absoluta falta de conclusões na alegação de recurso; b) rejeitar a impugnação de matéria de facto feita pela Ré e julgar improcedente o recurso de apelação por ela interposto.*Custas de cada um dos recursos pela respetiva apelante, pois que ficou vencida – art. 527º, nº1 e 2, do CPC.* Guimarães, 24 de janeiro de 2019 Assinado digitalmente pelos Senhores Juízes Desembargadores Eugénia Cunha, José Flores e Sandra Melo, a qual vota de vencida, apresentando a seguinte declaração de voto: Voto de vencida No presente caso, não rejeitaria o recurso interposto pela Autora, com fundamento na falta de conclusões, por força do princípio da colaboração, a preponderância da matéria sobre a forma, no âmbito dos deveres de gestão processual do Tribunal, atendendo ao disposto no artigo 6º, nº 2 do CPC, conforme aflorei no acórdão em que fui relatora, de 15/3/2018, proferido no processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/192481" target="_blank">3226/15.9T8BRG.G1</a>, publicado no portal dgsi.pt. Mais entendo que a questão deveria ser precedida da audição das partes, nos termos do artigo 655º nº 1 do CPC, porque o impõe o respeito do contraditório, princípio constitucional e enformador de um processo civil justo. Entendo, por outro lado, que, no presente caso, a admissão liminar, por ambas as instâncias, criou expetativas e, em consequência, a presente é uma decisão surpresa; se a rejeição fosse decidida na primeira instância, as partes sempre poderiam reclamar para este tribunal, o que implicaria a sua audição. Sandra Melo 1. Ac. da Relação do Porto de 23/4/2018, processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/135872" target="_blank">6818/14.0YIPRT.P1</a>, in dg si 2. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, O Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 2018, Almedina, pág767 3. Ibidem, pág. 767-768 4. Ac. do STJ de 5/4/2016, Processo 1407/09: Sumários, Abril/2016, p.5, citado in Abílio Neto, Novo Código de Processo Civil Anotado, 4ª Edição Revista e Ampliada, 2017, Ediforum, pág 997 5. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Idem, pág 768 6. Ibidem, pág 768 7. Ibidem, pág. 768, onde se refere que no Ac. do Trib. Const. Nº 536/2011concluiu-se pela não inconstitucionalidade da norma correspondente à al. b), do nº2, do art. 641º, quando interpretada no sentido de que a falta de conclusões determina logo a não apreciação do recurso, sem necessidade de prévia prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento. 8. cf. Acórdão do STJ de 9/7/2015, Processo 818/07.3TBAMD.L1.S1 (relator Abrantes Geraldes), in dgsi,net, relativamente ao qual se refere no Ac de 7/12/2016, processo 141/14.7T8SXL.L1-26, in dgsi “E, não se argumente com o que foi decidido no Ac. STJ de 09.07.2015 (Pº 818/07.3TBAMD.L1.S1), no qual se defendeu a prolação de um despacho de aperfeiçoamento, já que a questão aqui retractada não é igual à referida no aludido Acórdão, no qual se refere que nas conclusões se repetiu praticamente tudo o que se alegara na motivação.In casu, o corpo das alegações está totalmente reproduzido no que o apelante designa de conclusões, para além que, no citado acórdão do STJ, o convite ao aperfeiçoamento estará justificado por se tratar de um processo instaurado em data anterior a 01.01.2008, encontrando-se a aplicação da lei nova sujeita ao regime do artigo 3º da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho". 9. Ibidem 10. Cfr. Ac. do STJ de 13/10/2016, 5048/14.5TENT-A. E1. S1, in dgsi.net onde se decidiu do facto de as conclusões serem uma repetição das alegações do recurso não se pode retirar que aquelas conclusões não existem, mas apenas que não assumem a forma sintética legalmente imposta pelo art. 639º, nº1, do CPC. Perante tal irregularidade, deve o tribunal convidar o recorrente a aperfeiçoar as conclusões no sentido de proceder à sua sintetização, com respeito pelo objeto do recurso que ficou definido nas alegações originais, nos termos do nº3 do citado normativo. 11. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Idem, pág 768-769 12. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª edição, 2017, págs. 145-146 13. Acórdão do STJ de 18/6/2013, processo 483/08.0TBLNH.L1. S1, in dgsi.net 14. Acórdão do STJ de 13/7/2017, processo 6322/11.8TBLRA-A.C2. S1, in dgsi.net 15. cf. ainda Ac. do STJ, de 13-10-16, citado em nota de rodapé por António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª edição, 2017, págs. 148, “A repetição no recurso de revista das alegações e conclusões apresentadas no recurso de apelação deverá ser ultrapassada mediante despacho de aperfeiçoamento, não existindo fundamento legal para o despacho de rejeição imediato”. 16. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª edição, 2017, págs. 148 17. Acórdão do STJ de 26/5/2015, processo 1426/08.7TCSNT.L1. S1in dgsi.net 18. Ac. da Rel de Guimarães de 9/6/2016, processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/194169" target="_blank">314698/11.1YIPRT.G1</a>, in dgsi.net 19. Ac. da Rel de Lisboa de 7/12/2016, processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/108936" target="_blank">141/14.7T8SXL.L1-2</a>, in dg si 20. Acórdão da Relação do Porto de 24/1/2018 Processo 131/16.5T8MAI-A. P1(relator Madeira Pinto) in dgsi.net 21. cf., nesse sentido, inúmera jurisprudência de todas as Relações, designadamente o recente Ac. da Relação do Porto de 23/4/2018, processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/135872" target="_blank">6818/14.0YIPRT.P1</a>(relator Manuel Domingos Fernandes) onde muito bem se considerou “Há casos em que as alegações, sucintas e bem fundamentadas, valem como conclusões. O Tribunal assim o pode entender salvo se houver alguma razão justificada, invocada nas contra-alegações, que o não permita. Mas o contrário também se pode dar e infelizmente é caso frequente: a parte, sob a designação “conclusões”, reproduz integralmente a minuta. Se nada se conclui, só formalmente estamos diante de conclusões. A prática é a de, em benefício do direito ao recurso, considerar que estamos diante de conclusões, seguindo-se, assim, um critério estritamente formal. O critério estritamente formal vale, portanto, para se considerar a existência de conclusões e também a inexistência. No entanto, o rigor que o critério pode originar em determinados casos leva a que o Tribunal releve as conclusões que inequivocamente decorram da minuta ainda que não baptizadas pelo recorrente.” Mas também, para que se considere verificada a existência de conclusões, não será suficiente que o apelante nas suas alegações de recurso utilize a palavra “conclusões”, sendo ainda necessário que a mesma seja seguida de algo que, de algum modo, se assemelhe a um sintetizar das questões por si anteriormente expostas (ainda que deficientes, obscuras ou complexas). Ora, a referida reprodução integral do que está vertido no corpo das suas alegações de recurso, não pode ser considerada para o efeito do cumprimento do dever de apresentar conclusões. Do que se trata aqui não é de aferir da qualidade das conclusões, nomeadamente se as mesmas são mais extensas ou menos concisas do que podiam ou deviam ser, mas de determinar se as mesmas contêm em si aquele mínimo do qual se possa extrair que o recorrente, embora de modo deficiente, através delas tentou enunciar as questões a submeter ao conhecimento do tribunal de recurso. No caso em apreço, tal esforço é absolutamente inexistente, uma vez que a apelante nem sequer se deu ao trabalho de apagar a parte da sua motivação em que reproduz os excertos do depoimento de cada uma das testemunhas que invoca em favor da sua discordância com o decidido. (…) o despacho de aperfeiçoamento traduz um reflexo ou corolário do dever de cooperação, princípio estruturante do processo civil português. Mas esse dever de cooperação impõe a colaboração de todos os intervenientes processuais com vista a alcançar com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio, sendo certo que a lei não quis impasses e tergiversações, impondo no domínio dos ónus a cargo do recorrente um rigor e auto-responsabilidade por parte deste. Todavia, nesta situação tal convite não encontra justificação, já que, quem, sabendo da obrigação legal de apresentar conclusões, não se deu, sequer, ao trabalho de tentar sintetizar os fundamentos do seu recurso, optando pelo tal “copy/paste”: o convite ao aperfeiçoamento existe actualmente na nossa lei adjectiva, e só aí encontra a sua razão de ser, para aquelas situações em que parte, de facto, tentou efectuar uma síntese do que por si foi dito na motivação, mas em que a falta de clareza ou de outro vício que afecta a sua compreensibilidade num ponto ou noutro, ou até na sua totalidade. Mas se não há lugar a qualquer esforço de síntese, ainda que mínima ou com deficiências, não será o facto de o apelante a apelidar de “conclusões” que atribui tal natureza à reprodução do por si alegado na motivação. Como tem sido, de resto, sobejamente evidenciado pela jurisprudência do Tribunal Constitucional, quando estejam em causa normas que impõem ónus processuais às partes e em que a li prevê uma determinada cominação ou consequência processual para o incumprimento de tal ónus, as exigências decorrentes da garantia constitucional de acesso ao direito e à justiça, não afasta a liberdade de conformação do legislador não compatível com a imposição de ónus processuais às partes. E, como se alertou no recente aresto do mesmo Tribunal “o convite ao aperfeiçoamento de deficiências formais não pode ser instrumentalizado pelo respectivo destinatário, de forma a permitir-lhe, de modo enviesado, obter um novo prazo para, reformulando substancialmente a pretensão ou impugnação que optou por deduzir, obter um prazo processual adicional para alterar o objecto do pedido ou impugnação deduzida, só então cumprindo os ónus que a lei de processo justificadamente coloca a seu cargo”, Acs. RL de 15.02.2013, processo 827/09.3PDAMD.L1-5, de 21.03.2013, processo 14217/02.0TDLSB-AM. L1-9, de 17/3/2016, processo 459/15.1T8MTA-L1-2, de 17/3/2016, Processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/108514" target="_blank">147733/14.4YIPRT.L1-2</a>, de 12.10.2016, processo 1607/15.7YRLSB-4, de 7/12/2016, processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/108936" target="_blank">141/14.7T8SXL.L1-2</a>, Acs. R.C. de 05.05.2015, processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/119381" target="_blank">568/11.6TBCN.C1</a>, de 10.11.2015, processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/119118" target="_blank">158/11.3TBSJP.C1</a>, de 14/3/2017, processo 6322/11.8TBLRA-A.C2, Acs da Rel de Évora de 29/9/2016, processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/206766" target="_blank">1358/15.2T8VFX.E1</a>, acessíveis em www.dgsi.pt. 22. Ac. da Rel. de Lisboa de 17/3/2016, Processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/108514" target="_blank">147733/14.4YIPRT.L1-2</a>.dgsi.net 23. Ac. do STJ de 1/12/2015, Processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/119302" target="_blank">324/09.1TBSRT.C2</a>.S1.dgsi.net 24. Ac. do STJ de 18/6/13, processo 483/08.0TBLNH.L1. S1, in dg si 25. António Santos Abrantes Geraldes, Idem, págs. 148 26. O ónus de concluir nas alegações de recurso em processo civil DESEMBARGADOR DOUTOR JOÃO AVEIRO PEREIRA acessível no site http://www.trl.mj.pt/PDF/Joao%20Aveiro.pdf consultado no dia 10.11.2018 27. António Santos Abrantes Geraldes, Idem, pág 169 28. Ibidem, pág 171 29. Ibidem, pág 171 30. Ibidem, pág 232 31. cf., Ac. da Rel. De Coimbra de 14/9/2006, Processo 1557/06.dgsi.net, citado in Abílio Neto, Novo Código de Processo Civil Anotado, 4ª Edição, 2017, Ediforum, pág. 1018, onde se decidiu que A decisão que admite o recurso não vincula o Tribunal superior e, como é também jurisprudência uniforme e pacífica, como o despacho do Relator não constitui caso julgado formal, já que tal despacho, sendo provisório, visa apenas assegurar o prosseguimento do processo para ulterior sujeição/apreciação do coletivo de juízes. 32. cf. ainda Ac. do STJ de 21/10/2014, Processo 417/06, Sumários, Outubro /2014, p.71, citado in Abílio Neto ob cit, pág 1019, Não tendo os recorrentes junto ao requerimento de interposição de recurso as suas alegações (o mesmo se passando com as conclusões), justifica-se a não admissão do recurso, solução que não contende com o direito a um processo equitativo nem viola o princípio da proporcionalidade. 33. cf. Ac do STJ de 24/2/2015, processo 116/14.dgsi.net, onde se decidiu que “A decisão surpresa faz supor que a parte possa ser apanhada em falta por uma decisão que embora pudesse ser juridicamente possível, não esteja prevista nem tivesse sido por si configurada”. 34. cf. o decidido nos dois citados recentes Acórdãos da Relação do Porto 35. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª Edição, págs. 155-156 36. Ac. STJ. de 14/02/2012, Proc. 6823/09.3TBRG.G1. S1, in base de dados da DGSI. 37. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª Edição, 2017, pag. 153 38. Ibidem, pág. 153. 39. Ibidem, págs. 155 e seg. e 159 40. Ac. da Relação do Porto de 18/12/2013, Processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/139724" target="_blank">7571/11.4TBMAI.P1</a>.dgsi.Net 41. Abrantes Geraldes, idem, págs. 155-156 42. cf. Acórdãos de 18/11/2008, Proc. 08A3406; de 15/09/2011, Proc. 1079/07.0TVPRT.P. S1; de 04/03/2015, Proc. 2180/09.0TTLSB.L1. S2; de 01/10/2015, Proc. 824/11.3TTLSB. L1. S1; de 26/11/2015, Proc. 291/12.4TTLRA.C1; de 03/03/2016, Proc. 861/13.3TTVIS.C1. S1; 11/02/2016; Proc. 157/12.8TUGMR.G1. S1, de 12/5/2016: Processo 324/10.9TTALM.L1: S1; de 31/5/2016: Processo 1184/10.5TTMTS.P1: S1, todos in dgsi.net 43. cf. Acs. do STJ de 27/10/2016, Processo 110/08.6TTGM.P2. S1 e Processo 3176/11.8TBBCL.G1. S1, in dgsi.net 44. Abrantes Geraldes, in ob. cit., págs. 160 e sgs. 45. Ac. do STJ de 3/5/2016, Processo 17482/13: Sumários, Maio/2016, p 2 46. Ac. da Relação de Lisboa de 13/3/2014, Processo 569/12.dgsi.net citado in Abílio Neto, Código de Processo Civil anotado, 4ª Ed. 2017, Ediforum, Edições Jurídicas, Lda. pag 999 47. Ac. da Relação de Guimarães de 3/3/2016, Processo 283/08 e de 4/2/2016: Processo 283/08.8TBCHV.A. G1, ambos in dgsi.net 48. cf. Ac. da Relação de Évora de 3/11/2016, processo 1070/13. dgsi.net 49. Ac. Do STJ de 3/5/2016, Processo 145/11, Sumários, Maio/2016, p.3 50. Ac. STJ. 29/10/2015, Proc. n.º 233/09.4TBVNG.G1. S1, in base de dados. 51. Base de dados da DGSI, pronunciando o Ac. STJ, de 29/10/2015, Proc. 233/09.4TBVNG.G1. S1, 52. cf. Ac. Da Relação de Guimarães de 30/1/2014, Processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/195580" target="_blank">273733/11.1YIPRT.G1</a>. e Ac. Da Relação de Coimbra de 24/2/2015, Processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/119566" target="_blank">145/12.4TBPBL.C1</a>, in dgsi.Net 53. Ac. da Relação do Porto de 18/12/2013, Processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/139724" target="_blank">7571/11.4TBMAI.P1</a>.dgsi.Net 54. cf. Pires Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, volume I, 4ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, Limitada, 1987, página 227. 55. cf. Carlos Alberto da Mota Pinto, in Teoria Geral do Direito Civil, Coimbra Editora, limitada, 3ª edição actualizada, 1990, páginas 471 e seguintes. 56. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09-05-2002, JSTJ00000417, in www.dgsi.pt. 57. Curso de Direito Comercial, Vol. I, 4ª Ed., Almedina, 2003, p. 279. 58. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.10.2013, relatado por Bettencourt de Faria, in www.dgsi.pt. 59. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 14.06.2018, relatado por Sandra Melo, in www.dgsi.pt. 60. cf., neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.02.1999, relatado por Quirino Soares, in www.dgsi.pt. 61. cf., neste sentido, Ricardo Costa e Carolina Cunha, A Simplificação Formal do Trespasse de Estabelecimento Comercial e o Novo Regime do Arrendamento Urbano, Almedina, 2006, em especial ponto 3., e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12.05.2011, relatado por João Bernardo, in www.dgsi.pt. 62. cf., neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.02.1999, relatado por Quirino Soares, in www.dgsi.pt. 63. cf., neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.10.2002, relatado por Eduardo Baptista, e Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12.09.2016, relatado por Carlos Gil, in www.dgsi.pt.
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO 1º recurso Recorrente: Susana ... (…) Recorrida: Maria ... (…) 2º recurso Recorrente: Maria ... (…) Recorrida: Susana ... (…) Susana ... (…) veio propor a presente ação declarativa de condenação contra Maria ... (..), peticionando que: (i) se declare a nulidade das duas declarações de reconhecimento de obrigação pecuniária, acordo de pagamento e constituição de garantia, do contrato de arrendamento e da cessão da posição contratual da trabalhadora, por simulados, nos termos do artigo 240º, nº 2, do Código Civil, ou anuláveis, nos termos dos artigos 247º e 251º do Código Civil, com as devidas consequências legais; (ii) se declare nulo o contrato de trespasse dissimulado, nos termos do artigo 241º, nº 1, e do artigo 220º, do Código Civil, com as devidas consequências legais; (iii) se condene a Ré no pagamento à Autora de uma indemnização no valor de € 50.000,00 por abuso de direito, nos termos do artigo 334º do Código Civil; (iv) se condene a Ré no pagamento à Autora de uma indemnização no valor de € 79.895,93, por danos patrimoniais, nos termos dos artigos 562º e 564º, nº 1, do Código Civil; e (v) se condene a Ré no pagamento à Autora de uma indemnização no valor de € 40.000,00 por danos não patrimoniais, nos termos do artigo 496º do Código Civil. Alega, para tanto e em síntese, que a Ré trespassou para si três estabelecimentos comerciais ((…) – Acessórios de Moda, Ala (…) e In (…)) que funcionam em espaços sitos na Avenida (…), em Viana do Castelo, tendo as partes, para concretizarem tal intenção, celebrado um contrato de arrendamento para fins não habitacionais, um contrato de cessão da posição contratual, em que a Ré lhe cedeu a sua posição de entidade patronal relativamente à empregada da primeira dos mencionados estabelecimentos, e tendo, para o mesmo efeito, a Autora assinado dois documentos intitulados reconhecimento de obrigação pecuniária, acordo de pagamento e constituição de garantia. Mais alega que, tendo entregado à Ré a quantia de € 78.354,37 e faltando, de acordo com aqueles dois últimos documentos, pagar a quantia de € 56.550,00, a Ré a passou impedir de explorar normalmente os negócios trespassados, fazendo queixas à ASAE, proibindo-a de usar a marca (...) – Acessórios de Moda, registada a seu favor, facto que desconhecia, e tentando que os fornecedores deixassem de a fornecer e passassem a fornecer uma nova loja que, entretanto, abriu a 30 metros da loja principal da Autora, o que fez com que tivesse sido obrigada a mudar o nome da sua loja e a clientela ficado confusa, motivando a diminuição das receitas. Alega, ainda, os danos patrimoniais, ao nível do seu negócio, e não patrimoniais que a conduta da Ré lhe provocou. A Ré contestou, defendendo-se por impugnação. Em sede de audiência prévia, foi o processo saneado, definido o objeto do litígio e selecionados os temas de prova. *Realizou-se audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais. *Foi proferida sentença com a seguinte parte dispositiva: “Em face do exposto, julgo a acção proposta por Susana ... (…) contra Maria ... (…) parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente, declarando a nulidade do contrato de trespasse celebrado entre as partes em 28 de Janeiro de 2015, dos acordos de reconhecimento de obrigação pecuniária, acordo de pagamento e constituição de garantia, assinados na mesma data, do contrato de arrendamento com prazo certo para fins não habitacionais com fiança, celebrado em 1 de Janeiro de 2015, e do contrato de cessão da posição contratual em contrato de trabalho, celebrado em 28 de Janeiro de 2015: Condeno a Autora a restituir à Ré o arrendado mencionado em b) e os estabelecimentos comerciais mencionados nas alíneas c) e d), com todo os móveis e existências à data da celebração do trespasse, ou, quanto a estas últimas, o respectivo valor à mesma data; Condeno a Ré a restituir à Autora todas as quantias recebidas, em consequências dos acordos supra referidos, deduzidas do valor recebido a título de rendas pela ocupação do espaço mencionado em b); Relego para execução de sentença o apuramento dos valores supra referidos, ao abrigo do disposto no artigo 609º, nº 2, do Código de Processo Civil. Custas por Autora e Ré, em partes iguais”. *A Autora apresentou recurso de apelação, pugnando por que seja dado provimento ao recurso, proferindo-se acórdão a suprir a nulidade parcial da sentença por violação do artigo 608º, n. º2 e do artigo 615º, n. º1, al. d), ambos do CPC, na parte em que o julgador decide não se pronunciar sobre os pedidos indemnizatórios, aproveitando-se todo o demais e a conhecer e decidir os pedidos indemnizatórios formulados na petição inicial, a saber: A) condenar a recorrida no pagamento à recorrente de uma indemnização no valor de € 50.000,00 por abuso de direito, nos termos do artigo 334º do CC; B) condenar a recorrida no pagamento à recorrente de uma indemnização no valor de €79.895,93 por danos patrimoniais, nos termos do artigo 562º e 564º, n. º1 do CC; C) condenar a recorrida no pagamento à recorrente de uma indemnização no valor de €40.000,00 por danos não patrimoniais, nos termos do artigo 496º do CC”. Após o corpo das alegações escreve o seguinte: “CONCLUSÕES: A) A douta sentença, datada de 19 de junho de 2018, julgou parcialmente procedente a ação de processo comum que correu seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de (…), Juízo Central Cível, Juiz 4, sob o n.º 3113/17.6T8VCT, da qual é autora a ora recorrente. B). Na sua petição inicial, a recorrente peticionou a procedência da ação e em consequência, dos seguintes pedidos: “a) Declarar a nulidade das duas declarações de “reconhecimento de obrigação pecuniária acordo de pagamento e constituição de garantia”, do contrato de arrendamento e da cessão de posição contratual da trabalhadora, por simulados, nos termos do artigo 240º, n.º 2 do CC, ou anuláveis nos termos dos artigos 247º e 251º do CC, com as devidas consequências legais; b). Declarar nulo o contrato de trespasse dissimulado, nos termos do artigo do artigo 241º, n. º1 como, nos termos do artigo 220º, com as devidas consequências legais; c). Condenar a ré no pagamento a autora de uma indemnização no valor de 50.000,00€ por abuso de direito nos termos do artigo 334º do CC; d). Condenar a ré no pagamento a autora de uma indemnização no valor de 79.895,93€ por danos patrimoniais nos termos do artigo 562º e 564º, n. º1 do CC; e). Condenar a ré no pagamento a autora de uma indemnização no valor de 40.000,00€ por danos não patrimoniais nos termos do artigo 496º do CC.” C). Procederam, com as demais consequências legais, as alíneas a) e b), provando-se a existência de um negócio simulado e de um negócio dissimulado, o primeiro nulo por simulção e o segundo por falta de forma. D). Contudo, o meritíssimo juiz a quo não se pronunciou relativamente aos três pedidos indemnizatórios contidos nas alíneas c), d) e e), recaindo nessa omissão o objeto do presente recurso. E). Pois, por muito respeito que mereça o vertido na douta sentença de que se recorre, a recorrente não pode, de modo algum, deixar passar em branco a questão da indemnização que merece ser aprofundada de forma atenta e prudente. Apreciemos, pois, o problema em causa: F) Entendeu o tribunal a quo que, julgadas as alíneas a) e b) e face a “invalidade formal do negócio celebrado pelas partes, fica prejudicado o conhecimento do restante peticionado”, isto nos termos do artigo 608º, n.º 2 do CPC. G). Ora, o normativo invocado para descartar o conhecimento destes pedidos diz que o julgador só não terá de se pronunciar sobre TODAS as questões que as partes tenham submetido se a solução dada a uma ou umas das questões prejudicar a decisão de outras. H) O meritíssimo juiz a quo considerou que a invalidade formal do trespasse celebrado entre as partes impossibilita o conhecimento dos pedidos indemnizatórios. Mas não explica em que medida.... Pois, qual é a relação de prejudicialidade existente entre essas questões? I) A existir, essa conexão deveria ter sido muito bem fundamentada na sentença na medida em que abre a porta ao julgador para se inibir de se pronunciar sobre questões formuladas. J) A recorrente entende e irá demonstrar (coisa que não foi feita na sentença), que inexiste qualquer conexão de prejudicialidade entre as questões decididas e as questões por decidir. K). Sobre esta questão o Supremo Tribunal de Justiça pronunciou-se dizendo que “A nulidade consistente na omissão de pronúncia ou no desrespeito pelo objecto do recurso, em directa conexão com os comandos ínsitos nos artºs. 608.º e 609.º do CPC, só se verifica quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões ou pretensões que devesse apreciar e cuja apreciação lhe foi colocada. A expressão «questões» prende-se com as pretensões que os litigantes submetem à apreciação do tribunal e as respectivas causas de pedir e não se confunde com as razões (de facto ou de direito), os argumentos, os fundamentos, os motivos, os juízos de valor ou os pressupostos em que as partes fundam a sua posição na controvérsia.” – Cf. Acórdão do STJ de 03/10/2017, no âmbito do processo n.º 2200/10.6TVLSB.P1. S1 (nosso negrito). L). De facto, não estão aqui em causa argumentos ou juízos de valores, mas sim, questões levantadas na causa de pedir e concretizadas no pedido. M) E quanto a esses pedidos, a petição inicial não os apresenta de forma subsidiária em que requer que, caso não vençam os dois primeiros pedidos sobre a declaração de nulidade do contrato então se aprecie a procedência dos três pedidos indemnizatórios. N). Pois, a petição inicial apresenta cinco pedidos, todos eles cumulativos que podem ser apreciados de forma isolada e individual na medida em que a decisão aplicada numa das alíneas não influenciará nem fará depender a decisão aplicada nas outras. O). De facto, quer o tribunal tivesse decidido pela validade do trespasse ou não, tal não condicionava os pedidos indemnizatórios que devem ter em conta mais do que o contrato em si, mas também toda a conduta da ré e as consequências da mesma na esfera jurídica da autora. Analisando um por um: P). Relativamente ao primeiro pedido indemnizatório, este visa ressarcir a autora devido a má-fé, ao dolo e ao abuso de direito na modalidade de venire contra facum próprium da ré – cf. Artigos 153º a 178º da PI. Q) “O abuso do direito é de conhecimento oficioso, pelo que deve ser objecto de apreciação e decisão, ainda que não invocado.” – cf. Acórdão do STJ de 11/12/2012, no âmbito do processo nº 116/07.2TBMCN.P1. S1 R). Assim, mesmo que a questão não tivesse sido levantada pelas partes, o tribunal deveria pronunciar-se sobre ela. S). Sendo que, in casus, não só a questão foi levantada como o tribunal considerou não poder dela conhecer, na medida em que, no seu entender, a invalidade do trepasse prejudicava a decisão sobre esta questão. T). Ora, independentemente do trespasse ser válido ou inválido por vício de forma, tal não obsta a que seja respeitado o valor da confiança e da boa-fé nas relações jurídicas. U). Ou seja, não é pelo negócio dissimulado ser nulo por vício de forma que a recorrida pode agir à revelia dos princípios gerais de boa fé, impune à prática de qualquer tipo de dolo, só porque o negócio é inválido. V) Assim, apesar de invalidade do trespasse, nada impede ao conhecimento do pedido na alínea c) do artigo 2º do presente recurso, que até deveria ser de conhecimento oficioso, na medida em que a solução dada àquela primeira questão não prejudica a decisão desta segunda. W). Continuando e no que toca ao segundo pedido indemnizatório, este refere-se aos danos patrimoniais sofridos pela recorrente em consequência das atitudes desleais da recorrida, nomeadamente, e entre outros, em termos de lucro cessante – cf. artigos 179º a 192º da PI. X). De facto, as atitudes da recorrida com o intuito de arruinar o negócio da recorrente (abrindo uma loja idêntica ao lado, denegrindo a imagem da recorrente junto de fornecedores e clientes...) tiveram como consequência a queda da faturação da recorrente. Y). Nesse ponto também, a validade ou invalidade do trepasse pouco ou nada importa para o conhecimento e para a decisão da questão, pois, a assim não ser, estaríamos a considerar que pelo negócio ser inválido, tudo é permitido e que a recorrida podia, na impunidade total, causar prejuízos patrimoniais à recorrente. Z). Ou seja, apesar de invalidade do trespasse, nada impede ao conhecimento do pedido na alínea d) do artigo 2º do presente recurso, na medida em que a solução dada àquela primeira questão não prejudica a decisão desta segunda. AA). Por fim, quanto ao último pedido de indemnização relacionado com danos não patrimoniais sofridos pela recorrente em consequência das atitudes da recorrida, aqui também, não se compreende o motivo do não conhecimento da questão – cf. artigos 193º a 202º da PI. AB) A verdade é que, negócio válido ou não, a recorrente foi vítima da recorrida, sofreu perseguição, difamação, traição, e devido a isso caiu no desânimo e na tristeza, influenciando o seu bem estar físico e moral. AC) Isso também deverá ficar inapreciado, ou melhor, impune, porque houve invalidade formal do contrato de trespasse? O que é que uma coisa tem a ver com a outra?... NADA. AD) Não parece ser esse o intuito do legislador ao abrir o desvio do artigo 608º, n.º 2 do CPC. AE) Mais uma vez, apesar de invalidade do trespasse, nada impede ao conhecimento do pedido da alínea e) do artigo 2º do presente recurso, na medida em que a solução dada àquela primeira questão não prejudica a decisão desta segunda. EM SUMA, AF). Poderiam até tais pedidos ser improcedentes por falta de requisitos (o que não se admite, mas simplesmente se poderá), mas nunca por nunca, poderia o julgador deixar de se pronunciar sobre eles. AG). In casus, não se verifica a tal relação de prejudicialidade de que depende a abertura estabelecida no artigo 608º, n.º 2 do CPC e que permitiria a legítima não pronuncia do julgador sobre estas questões. AH) O pedido sobre a invalidade do negócio e o pedido de indemnização decorrente dessa relação contratual (válida ou inválida), são questões que devem ser apreciadas de forma autónoma, sendo que todos os quadros decisórios poderiam ter acontecido (negócio válido e procedência do pedido indemnizatório, ou negócio inválido e improcedência do pedido indemnizatório, ou negócio válido e improcedência do pedido indemnizatório, ou ainda negócio inválido e procedência do pedido indemnizatório), mas em caso algum se pode dizer que “em face da invalidade formal do negócio celebrado entre as partes, fica prejudicado o conhecimento do restante pedido peticionado”. AI). Por certo, e no que toca à declaração de nulidade por falta de forma do contrato de trespasse, essa nulidade não afeta, nem pode afetar a decisão sobre a indemnização. AJ) Pois a suceder, estaríamos a abrir um precedente que permitiria a quem realiza contratos ilegais, beneficiar da “proteção” do artigo 608º, n.º 2, do CPC, entendido no sentido de que a decisão sobre a nulidade do negócio impossibilita o conhecimento da questão sobre o direito a indemnização. AK). Também não se pode dizer que a consequência da nulidade ser a restituição de tudo quanto foi prestado impossibilita o conhecimento das questões indemnizatórias, pois uma coisa é a consequência da nulidade e outras coisas são as consequências da má fé, do abuso de direito, dos danos patrimoniais e não patrimoniais. AL) A restituição de tudo quanto se prestou não invalida nem impede a censurabilidade de tais condutas e a proteção e ressarcimento de quem foi lesado. AM) Não foi, de todo, esse o alcance que o legislador pretendeu dar à excepção contida na norma do artigo 608º, n.º 2 que como se demonstrou, não pode aqui ser invocada. AN) Nos dizeres de Lebre de Freitas (in Código de Processo Civil Anotado), sobre o Juiz recai a obrigação de apreciar/conhecer “todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (…) , sendo que, ao ocorrer uma tal omissão de apreciação/conhecimento (…), então o não conhecimento do pedido, causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outras questões, constitui nulidade”. AO) O Meritíssimo juiz a quo não podia abster-se de se pronunciar sobre os pedidos indemnizatórios, quer seja pela procedência, quer seja pela improcedência dos mesmos. AP) Impõe-se a apreciação e decisão sobre os pedidos indemnizatórios formulados na PI, sob pena de nulidade parcial da sentença por violação do artigo 608º, n. º2 e do artigo 615º, n. º1, al. d), ambos do CPC, na parte em que o julgador decide não se pronunciar sobre os pedidos indemnizatórios, aproveitando-se todo o demais. AQ). Tal nulidade fica aqui desde já arguida, requerendo a este Venerando Tribunal o suprimento da mesma, apreciando e decidindo os pedidos indemnizatórios formulados na PI e transcritos no artigo 2º, alíneas c), d) e e) supra do presente recurso. Para uma justa decisão sobre os mesmos deverá atender-se, para além do vertido nos artigos 153º a 202º da petição inicial, em relação a cada um deles, e face aos factos provados em primeira instância, ao que infra se irá expor: AR) O princípio da confiança é um princípio ético fundamental de que a ordem jurídica em momento algum se alheia. AS). Está presente, desde logo, na norma do art. 334.º do CC: “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.” AT) O venire contra factum proprium é uma das modalidades de abuso de direito, que obsta a que alguém possa contradizer o seu próprio comportamento, após ter produzido, em outra pessoa, uma determinada expectativa. AU). Ora, ficou como matéria provada que quando a recorrente celebrou os contratos simulados com a recorrida, a primeira, de boa-fé e dado o discurso e comportamento da segunda, pressupôs a manutenção da marca (…) – Acessórios de Moda no estabelecimento negociado, bem como a sua utilização posterior, só tendo aceitado o preço proposto naquele pressuposto – cf. alínea pp) da sentença de que se recorre. AV). Ficou provado também, que durante as negociações, a recorrida nunca disse à recorrente que a marca em questão e o logótipo associado estavam registados a favor da recorrida no Instituto Nacional da Propriedade Industrial – cf. alínea dd) da sentença recorrida. AW). Provou-se que a recorrida vendeu à recorrente sacos, autocolantes, cartões de visita e etiquetas com os dizeres (…) – Acessórios de moda e respectivo logótipo – cf. alínea hh) da sentença recorrida. AX). Provou-se que após a celebração do negócio com a recorrida, a recorrente iniciou a exploração das lojas mantendo a fisionomia exterior e interior do estabelecimento, tal como era quando a recorrida os explorava – cf. alíneas t) e u) da sentença recorrida. AY). Mantendo o mesmo programa informático (alínea v), o mesmo endereço eletrónico (alínea w), o mesmo toldo com inscrição da marca (alínea x), os mesmos sacos, envelopes, etiquetas com indicação da marca (…) – Acessórios de Moda (alínea y) e tendo até a recorrente celebrado contratos de publicidade para promover a referida marca (alínea z). AZ) Isso tudo com o conhecimento e consentimento da recorrida que continuou a frequentar o espaço durante pelo menos o ano de 2015 – cf. alíneas aa), cc) e bb) da sentença recorrida. BA) Só depois da zanga entre as partes (em que a recorrente cansada de passar por mera empregada no seu próprio negócio, proibiu a entrada da recorrida no estabelecimento) é que a recorrida veio levantar a questão da proibição do uso da marca, até lá nunca censurado - cf. alínea ee) da sentença recorrida. BB). Obrigando a recorrente a desistir da prestigiada e conceituada marca (…) – Acessórios de Moda, causando-lhe graves prejuízos e frustrando as expetativas que a recorrida lhe permitiu, inicialmente, criar. BC). Há “venire contra factum proprium” quando uma pessoa declare avançar com certa atuação e depois se negue (cf. entendimento do Tribunal da Relação de Lisboa no Acórdão 9081/2005-7 de 12/07/2006). BD) De facto, a proibição do “venire contra factum proprium” é a consagração de que ninguém pode se opor a um facto a que ele próprio deu causa. BE). Ora, os factos dados como provados em primeira instância refletem bem esse exato comportamento da recorrida que durante as negociações e por mais de um ano deixou a recorrente acreditar e fez com que acreditasse, que podia usar a marca. BF). Para um belo dia se lembrar, sem mais nem menos, de tirar o tapete, proibindo, o uso da dita marca. BG). Pois caso a recorrente não estivesse plenamente convencida que tinha adquirido também o direito ao uso da marca, a mesma poderia ter logo iniciado a sua atividade explorando a sua própria marca, o que lhe poderia ter evitado muitos prejuízos. BH) São elementos essenciais do venire contra factum proprium: i) uma conduta inicial; ii) a legítima confiança despertada por conta dessa conduta inicial; iii) um comportamento contraditório em relação à conduta inicial; iv) um prejuízo, concreto ou potencial, decorrente da contradição. BI). Como já se elencou supra, todos esses pressupostos figuram na sentença recorrida como matéria provada em sede de primeira instância. BJ). Pois, a recorrente, estando de boa fé e com base na situação de confiança criada pela contraparte, tomou disposições e organizou planos de vida de onde lhe resultaram danos pela frustração da sua legítima confiança. BK) Assim, as atitudes da recorrida, todas elas com contornos de malvadez, deslealdade, má-fé e até crueldade, manifestam claramente abuso de direito na sua modalidade de “venire contra factum proprium” o qual é absolutamente proibido por lei. BL) Uma das consequências do abuso de direito consiste na obrigação de indemnizar nos termos do artigo 483º, n.º 1 do CC (Cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24/04/2008). BM). Pelo que tendo em conta os factos provados em sede de primeira instância e apesar de o trespasse celebrado ter sido decretado nulo com restituição de tudo quanto foi prestado, uma vez verificados os pressupostos do abuso de direito nos termos do artigo 334º do CC, a recorrida deverá pagar a recorrente uma indemnização de montante nunca inferior a 50.000,00€. BN). Para além disso, as atitudes desleais da recorrida que foram descritas supras e dadas como provadas causaram e causam um prejuízo real na esfera jurídica da recorrente. BO) Não bastante a proibição do uso da marca, para arruinar ainda mais o negócio da recorrente, a recorrida abriu, em 01/06/2017, a menos de 50 metros do mesmo, um estabelecimento de nome (…) – Acessórios de Moda, que comercializa o mesmo tipo de produtos – cf. alínea kk) dos factos provados constantes da sentença recorrida. BP) E ainda tentou (e conseguiu) desviar fornecedores e clientes da loja da recorrente, dizendo que o estabelecimento desta última era “de baixo nível” – cf. alínea mm) dos factos provados constantes da sentença recorrida. BQ). Relativamente ao negócio in (…) também trespassado, e que a recorrente não pude explorar por não ser possível legalizá-lo, apesar de não se ter provado que as fiscalizações de que foi alvo foram fruto de denuncias da recorrida, a verdade é que as mesmas ocorreram após a zanga entre partes – cf. alínea nn) da sentença recorrida. BR). Sendo convicção da recorrente, não só que a recorrida sabia perfeitamente da impossibilidade de legalizar o negócio quando o vendeu e deliberadamente ocultou essa informação à recorrente como também está convicta de que as fiscalizações da ASAE a loja In (…) são obra de denuncias feitas pela recorrida. BS) De qualquer forma, o artigo 483º do Código Civil fixa o princípio geral da responsabilidade civil por factos ilícitos dispondo que “aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou de qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes de violação”. BT). Ora quanto ao requisito da culpa, como se demonstrou supra, está bem presente nas atitudes da recorrente que longe de inocente, está carregada de desejo de vingança, orgulho e maldade. BU) A recorrida não aceitou perder o controle do negócio, apesar de o ter vendido. BV). Esta sabia muito bem o que fazia, pois, ao contrário da recorrente que lhe fez inteira confiança, a recorrida sempre foi aconselhada e assessorada por advogados e contabilistas – cf. alíneas p) e q) dos factos provados constantes da sentença recorrida. BW). Com os desvios de clientela e fornecedores e com a proibição do uso da marca, a recorrida tinha consciência que iria provocar prejuízos à recorrente e era essa a sua real intenção. BX) Para além de violar os princípios de boa-fé nas relações comerciais e de frustrar as expetativas da recorrente, a recorrida incorreu em concorrência desleal, violando o artigo 317º do Código da Propriedade Industrial. BY) “Constitui concorrência desleal todo o acto de concorrência contrário às normas e usos honestos de qualquer ramo de actividade económica, nomeadamente: a) Os actos susceptíveis de criar confusão com a empresa, o estabelecimento, os produtos ou os serviços dos concorrentes, qualquer que seja o meio empregue; b) As falsas afirmações feitas no exercício de uma actividade económica, com o fim de desacreditar os concorrentes (...)”. BZ). De tudo isto decorre que a recorrida violou, com culpa, os direitos da recorrente legalmente protegidos, causando-lhe diversos prejuízos patrimoniais que devem ser indemnizados por verificação dos pressupostos do supracitado artigo 483º, n.º 1 do CC. CA). Nomeadamente: - 1.200,00€ gastos em multas (cf. comprovativos de pagamentos juntos a PI como doc n.º 19); - 2.500,00€ gastos em sacos e etiquetas da marca (…) - Acessórios de Moda, adquiridos a recorrida; - 2.114,93€ gastos em sacos e etiquetas da marca (cf. faturas juntas à PI como doc. n.º 25); - 5.867,11€ gastos com a aquisição do stock de mercadorias para a loja “In (…)” e que não conseguiu revender pelo facto de a loja ter sido encerrada por desconformidade legal (cf. doc. n.º 26 junto à PI); - 1.200,77€ gastos em publicidade (cf. recibos de pagamento juntos à PI como doc n.º 27); - 416,79€ gastos em software e hardware adquiridos pela recorrente (cf. recibos de pagamentos juntos à PI como doc n.º 28); - 248,46€ pelo custo anual do alojamento do site da loja. In (…) (cf. recibo de pagamento junto à PI como doc n.º 29); - 18.200,00€ a título de rendas pagas pela recorrente pelo arrendamento da loja “(…) – Acessórios de Moda” (cf. recibos de renda juntos à PI como doc. n.º 30); - 3.000,00€ a título de rendas pagas pela recorrente pelo arrendamento das lojas “In (…)” e “Ala (…) s”, entretanto encerradas; - 28.147,87€ a título de encargos com a funcionária cedida pelo recorrida a recorrente (cfr. recibos de vencimentos juntos à PI como doc n.º 31). Esses valores atingem o valor global, nunca inferior a 62.895,93€. CB). Para além desses valores, mas sempre na perspetiva patrimonial, há ainda que ter em consideração no cálculo da indemnização, o chamado lucro cessante, ou mais certeiramente, a frustração do ganho, cuja reparação está prevista no artigo 564º, n.º 1 do CC. CC) “O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão.” CD) E, embora não ficasse provado em sede de primeira instância, porque o tribunal decidiu não conhecer esta questão, a consequência da proibição do uso da marca, a abertura da outra loja a menos de 50 metros, o encerramento da loja ..., e todas as artimanhas levadas a cabo para desviar a clientela, é óbvia e lógica. CE). Por certo, aquando da celebração dos trespasses, e atendendo ao investimento feito, a perspetiva de negócio ia bem mais além do que um ano de exploração, vislumbrando-se um crescimento gradual dos lucros do negócio, por vários e longos anos. CF). As ações da recorrida fizeram com que o negócio da recorrente tivesse um lucro inferior aquele que poderia ter tido, não fossem aquelas ações. CG) Assim, tendo por referência o volume de faturação apurado em janeiro 2015, quando se celebrou o trespasse e o lucro apurado em janeiro 2016, quando deixou de poder usar a marca “(…) – Acessórios de Moda” existe uma diferença de 6.300,00€ (cf. relatórios contabilísticos juntos à PI como doc. n.º 32). CH). Sendo que este valor ainda se agravou em 2017, com a abertura da nova loja da recorrida, para uma redução de faturação apurado até agosto de 10.700,00€ em relação a 2015 (cf. doc. n.º 33 junto à PI). CI). Tendo em conta a média do lucro mensal da loja em tempos de laboração, até a data, a recorrente já perdeu de ganhar a quantia de 17.000,00€. CJ). Quantia essa que teria ganho se a recorrida não tivesse agido da forma que fez, consciente e deliberada, com o intuito de prejudicar a recorrente. CK) Todos esses valores, no montante global de 79.895,93€, constituem danos patrimoniais causados pela recorrida à recorrente, devendo ser indemnizados, por força do artigo 562º e 564º do CC. CL). Por outro lado, dispõe o artigo 496º n.º 1 do CC que “na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.” CM) A recorrente tem sido vítima de difamação na praça pública, perante os seus clientes e fornecedores. CN) Ficou provado que a recorrida tentou que um dos fornecedores deixasse de vender a recorrente dizendo que a loja desta era “de baixo nível”, denegrindo a imagem da recorrente e da sua marca no mercado - cf. alínea mm) da sentença recorrida. CO). É claro que, dado o investimento feito e sendo esse o seu sustento e o do seu agregado familiar, essas ocorrências afetaram o bem-estar psicológico da recorrente que se sente traída e engana por aquela a quem sempre se dedicou. CP). Cumulando a isso todos os embaraços judiciais nas quais a recorrente nunca pensou se ver implicada e que lhe causam, para além da perda de tempo e de dinheiro, uma enorme tristeza. CQ) Toda esta situação tem causado grandes dores de cabeça à recorrente, noites sem dormir e graves preocupações posto que está prestes a ver ruir todo o seu investimento. CR). Pelo que tendo em conta os factos provados em sede de primeira instância e apesar de o trespasse celebrado ter sido decretado nulo com restituição de tudo quanto foi prestado, os danos não patrimoniais aqui descritos e causados à recorrente por culpa da recorrida, devem ser indemnizados, nos termos do artigo 496º do CC, num montante não inferior a 40.000,00€”.*A Ré/Apelada apresentou contra-alegações, onde pugna por que seja mantida a decisão recorrida, na parte ora submetida a recurso, (ou seja na questão da prejudicialidade e pedidos indemnizatórios) para tanto Concluindo: “1ª A recorrida perfilha o entendimento, salvo melhor opinião, de que a sentença recorrida não padece da invocada nulidade ao declarar, na sequência da decisão que tomou, a prejudicialidade dos pedidos indemnizatórios; 2ª Com efeito ao qualificar juridicamente o negócio como trespasse e declarando a sua nulidade (aliás pedido formulado pela Autora), o julgador aplicou, consequentemente, os efeitos legais da nulidade negocial – 286 e 289 do Código Civil. 3 º Ora independentemente, da maior ou menor concordância com a decisão da primeira instância, no que especificamente se reporta a esta questão – da prejudicialidade – a decisão integra em si um raciocínio lógico correcto, dado que respeita integralmente o preceituado no artigo 608/2 do Código Civil. 4º – Apesar de deduzidos pedidos autónomos e não subsidiários entre si, tal não significa que os mesmos não sejam legalmente incompatíveis. 5 º – O Sr. Juiz ao conferir procedência ao pedido formulado em B, entrou em linha de “colisão” com os demais pedidos formulados, dado que os efeitos da nulidade negocial se circunscrevem à restituição de tudo o que foi prestado, balizado pela possibilidade de restituição, ou o seu respectivo valor (não sendo restituível o gozo da coisa); 6º – Pelo que quanto à questão da prejudicialidade, nos termos da sentença proferida, a mesma afigura-se correcta. 7º - No que se reporta à parte II do recurso instaurado pela recorrente, ou seja quanto à sua pretensão indemnizatória, entende a recorrida que a mesma não merece procedência. 8º – A recorrente pretende sustentar as indemnizações que peticiona em factos que não conseguiu provar, que não constam, por isso dos factos provados, mas que constam dos factos considerados não provados. 9º– Como se pode verificar, pelas presentes alegações, a recorrente não procedeu à impugnação da prova, ou seja: não diz que factos pretende ver reconhecidos como provados e porquê, de modo a sustentar os seus pedidos indemnizatórios. 10º – Conformou-se com os factos considerados provados, sendo que dos mesmos, não se extraem quaisquer danos ou prejuízos tal como invocado pela recorrente e supra rebatido no corpo contra-alegatório. 11º – Quem invoca um direito tem a seu cargo o ónus probatório dos factos constitutivos do direito alegado – artigo 342 do Código Civil . 12º– Estes factos têm de ser concretizados em sede de prova, não podem fundamentar-se em abstracções, convicções, presunções … tem de haver sustentação. E essa prova a autora recorrente não fez. Não viu provados os factos com os quais fundamentava os seus pedidos indemnizatórios, na sua petição inicial. 13º– Pelo que entende a recorrida, deverem improceder os pedidos indemnizatórios formulados pela recorrente, sendo a recorrida absolvida de tais pedidos”.*A Ré apresentou, também, recurso de apelação, pugnando por que seja revogada a decisão recorrida, julgando-se o pedido deduzido pela Autora totalmente improcedente por não provado. Após o corpo das alegações escreve o seguinte: “CONCLUSÕES: 1ª A recorrente perfilha o entendimento, salvo melhor opinião, de que a douta sentença não terá decidido de forma acertada, atendendo a todos os factos que foram transpostos para os autos e submetidos a julgamento, assim como, ainda, atendendo aos normativos legais aplicáveis neste caso. 2ª Antes de mais, e desde logo, impugnando o recorrente a decisão proferida sobre a matéria de facto, como previsto, aliás, no artigo 690º-A, nº 1, do C.P.Civil, porquanto existe nos autos gravação da prova testemunhal em causa. 3ª De facto, o Tribunal "a quo", deveria ter considerado provada a seguinte factualidade, conforme transcrição das gravações supra (constante dos minutos identificados de acordo com o CD audio, disponibilizado pelo Tribunal, tudo melhor identificado acima por referência a cada testemunha) conjugada com os documentos juntos aos autos: Que este negócio teve como fundamento o precário estado de saúde da ré. Que a morosidade na obtenção de um interessado para um trespasse não era compatível com a pressa que a ré tinha em deixar de trabalhar (naquela altura); Que uma das possibilidades seria liquidar/vender – ainda que em saldo, a mercadoria e existências e fechar a loja ou arrendá-la. Que em conversa com a Autora, esta mostrou-se interessada por esta hipótese. Mas ainda assim não tinha sequer meios financeiros para fazer face ao negócio. Acordaram fazer um inventário de todos os bens: existiam bens contabilizados informaticamente e bens não contabilizados nestes moldes. Quanto aos bens informatizados contabilisticamente seria mais fácil o inventário, pois só seria necessário confirmar a existências. Acordaram que os valores seriam os valores a preço de custo. Quanto aos outros bens – que estavam no armazém, havia também um inventário no computador, mas era necessária a sua conferência. Contabilizado também o seu valor (igualmente a preço de custo) a autora que interveio activamente nas respectivas inventariações, apresentou à ré um documento por si manuscrito no qual discriminava todos os bens e respectivos valores. Acordaram num pagamento diluído num espaço temporal de cinco anos. Os bens tratados contabilisticamente foram processados na sua transmissão por emissão de facturas; assim como do imobilizado em amortização. Quanto aos outros seria necessária a elaboração de um documento onde ficasse a constar o montante da dívida e o modo de pagamento. Como a autora também iria pagar os bens facturados em prestações, acordaram as partes que seriam feitos dois documentos: um para os bens facturados e outro para os demais bens. Foram estes os documentos “titulados de Reconhecimento de obrigação pecuniária, acordo de pagamento e obrigação de garantia” que foram assinados e autenticados”. O primeiro por João (…) o (documento 14 junto com a contestação, visto a autora, quando juntou o doc. 2 à sua PI, não ter fuito a junção integral do documento), o segundo por Rui ... (conforme identificação do respectivo advogado autenticador). Os sacos não entraram nestas contas, porque inicialmente nem entrariam no negócio. E só entraram porque a autora não tinha condições financeiras para mandar fazer sacos e porque se comprometeu a tapar o logótipo com auto-adesivo. Foram pagos à parte em três acordadas prestações. Este o cerne negocial. Compra e venda de stock e imobilizado. Foi isto que as partes negociaram e quiseram. Os demais documentos surgem como acessórios à vida da Autora. Quis ela arrendar a fracção autónoma da ré. Nada obsta a essa possibilidade. Aliás a ré, com o fecho da loja já pensara nessa possibilidade. Quis a Autora arrendar, numa fase inicial a loja onde funcionava o anterior estabelecimento “...” e que a ré já tinha procedido à entrega do arrendado ao senhorio. Posteriormente a ré mudou-se para outra loja. Quis a autora contratar a trabalhadora que trabalhou para a ré no estabelecimento ..., porque já conhecia os produtos. Aqui, para obviar, celebraram uma cessão da trabalhadora. Mas todos os acordos negociais nos revelam como primeiro foco a aquisição da mercadoria das lojas pertencentes à Teresa ..., aqui Ré. Nunca a autora ou a ré, equacionaram entre si um trespasse de estabelecimentos comerciais. Nunca sequer verbalizaram perante as pessoas que acompanharam de perto este negócio essa eventualidade. A marca, que a autora alega ser elemento incorpóreo de alto valor, não foi contabilizado em nenhum documento, não foi processado, negociado ou pago por qualquer modo. Assim como a carteira de clientes, volume de negócios, posição de mercado, todos estes elementos que compõem um estabelecimento comercial, não foram sequer representados pelas partes. 4ª. Daí se retirando um conteúdo útil e relevante para a decisão a proferir no caso dos presentes autos. 5ª Entendendo a recorrente que em conformidade com o teor dos depoimentos prestados em audiência de julgamento conjugados pelo documentos juntos aos autos que deveria ter sido considerado provado que não houve trespasse de qualquer estabelecimento; que o que houve foi a compra e venda de mercadoria e imobilizado dos estabelecimentos que foram explorados pela ré, e que devido ao pagamento destes bens num espaço temporal de 5 anos, foram outorgados dois documentos de reconhecimento de obrigação pecuniária, com plano de pagamentos. 6ª Que esses dois documentos de reconhecimentos de dívida se fundamentam no seguinte: O de 92.954,13Euros, no facto de pagamento prestacional, já que a transmissão da mercadoria e imobilizado em amortização foi objecto da competente facturação a favor da Autora; O de 34.790,24Euros. no facto de não poder ser objecto de facturação (era material não contabilizado informaticamente) e por isso ambas as partes pretendiam um documento onde ficasse plasmada a quantia em dívida. a) o primeiro foi autenticado por João ... (..) b) o segundo foi autenticado por Rui (…), advogado; 7ª Não existem nos autos quaisquer elementos que nos permitam assim concluir, mas existem elementos que a ré alegou e invocou a seu favor, que nos permitem concluir que pretenderam, ambas as partes um contrato de compra e venda do stock da loja … acessórios de moda e das loja “...” e “...” pelo que como tal deverá ser tratado o negócio celebrado entre autora e ré. 8ª Devem ser considerados não provados: a) todos os factos considerados provados, pelo sr. Juiz do Tribunal recorrido, no qual se refere à transmissão ou negócio incidente sobre o(s)estabelecimento(s) comercial(ais), ou seja, as alíneas g), h), i), j), p) r) ,s), bb) e pp), vão impugnadas. O facto vertido em q) vai também impugnado dado que segundo a testemunha A., quer a autora quer esta com o seu marido, falaram do negócio várias vezes com ele sem a presença da ré. b) os factos considerados provados vertidos em r) e ii), porquanto: Ambas as partes assumiram nas suas peças processuais que foi celebrado um contrato de arrendamento para fins não habitacionais com fiança, e que celebraram também na mesma data um aditamento a esse contrato. Assim, no contrato de arrendamento referido ficou a constar uma renda mensal de 350,00Euros (o montante que a Autora solicitou à ré que vigorasse no primeiro ano de Contrato. No aditamento, ficou a constar a renda a vigorar a partir do segundo ano de contrato, ou seja 700,00Euros. Para além da assumpção deste facto pelas partes, também foram juntos aos autos os respectivos documentos – desde logo pela Autora – sob os nºs 4 e 5 da petição inicial e ainda os recibos de renda – docs 30 e seguintes juntos pela Autora. Pelo que, o facto considerado provado em r) padece de erro. Este facto tem importante relevância (caso V/Exas., Srs. Desembargadores, considerem pertinente a qualificação jurídica de trespasse, porquanto o gozo não é passível de restituição, sendo a respectiva contrapartida objecto de retenção- conferir ainda os citados recibos de renda juntos aos autos pela própria Autora). Em face do ora exposto, não se percebe o raciocíonio lógico-matemático que o Sr, Juiz do Tribunal recorrido verteu em ii) É que o arrendamento da fracção H, titulada registralmente pela ré, nada tem que ver com o valor do negócio, ou seja, com os valor de 134.754,37Euros- este é como se referiu, à saciedade, o valor somado da mercadoria e imobilizado. Quanto a este valor de 134.734,37Euros, chega-se, facilmente através do documento junto na contestação sob o nº 3. Nesse documento a Autora, pelo seu próprio punho (como assumido na sentença recorrida) esquematiza todos os montantes sobre os quais incidiu o negócio. Artigos sem factura da loja té --------------------------- 16.369,65Euros Artigos sem factura da loja in (..)/ala ------------------------ 7.598,16Euros restante imobilizado --------------------------------------- 1.375,00Euros artigos vários ------------------------------------------------ 151,98Euros 10% inventário computador ------------------------------------------ 9.295,45Euros sub total: 34.790,24Euros Este montante encontra paralelo em algum documento de reconhecimento de obrigação pecuniária, junto a estes autos? Efectivamente trata-se do documento junto pela Autora sob o número 3 e que a ré aceita na sua contestação. Mas nesse mesmo documento manuscrito pela Autora (doc 3 da contestação) podemos ainda constatar o montante dos produtos inventariados informaticamente (designado pela Autora inventário computadores), ou seja: da mercadoria da loja in (…) --------------------------- 16.405,68Euros da mercadoria da loja Gift ---------------------------- 76.548,45Euros sub total ---------------------------------------------------- 92.954,13Euros Estes montantes e respectiva referência estão devidamente identificados no documento nº 8, junto pela Autora na sua petição inicial. A contabilidade operou, inclusivamente, as respectivas facturas, ambas com data de 31-12-2014. Estes montantes, quer do documento 3 da contestação, quer do documento 8 da petição inicial encontram paralelo em algum documento de reconhecimento de obrigação pecuniária, junto a estes autos? Efectivamente trata-se do documento junto pela Autora sob o nº 2, e que a ré aceita na sua contestação. o referido documento nº 3 da contestação (e também o nº 16), não padece da invocada ausência de outros elementos, para afirmar o seu teor. Por conseguinte, deve ser valorizado na produção de prova destes autos. É um documento importante, não só para pôr em causa o raciocínio do julgador vertido na al. ii) dos factos provados, como para consolidar que o objecto do negócio foi a liquidação do stock/imobilizado/existências de mercadorias. Em parte alguma dos citados documentos se pode chegar à conclusão de que os montantes assumidos como divida, pela Autora, se reportam à transmissão de dois/três estabelecimentos comerciais. c) O facto vertido em p) deverá ser rectificado, dado que não foi o filho da ré quem autenticou o documento onde se previa o pagamento de 92.954,13 Euros. Foi um outro advogado – conforme documento 14 junto com a Contestação. O filho da ré apenas autenticou o documento que titulava a quantia de 34.790,24Euros, apesar de contrariado, mas a pedido da autora e seu marido ( e bem assim da sua mãe); 9ª Em oposição e decorrentemente da prova supra apreciada nos documentos e supra transcrita - depoimentos, devem ser considerados provados os factos vertidos nos artigos 12 a 24 , 31 a 36, 44 a 46, 48, 70 da contestação apresentada. 10ª a)Em face de todo o supra exposto, entende a ré recorrente que todos os contratos em discussão foram efectuados ao abrigo das normas do direito civil, e assim sendo, regulados pelos artigos 405º, art. 1112/2 e a contrário, nºs 3 e 4, 358/2, 1022 e 1069, todos do Código Civil, 11ª Posto o que, entende a recorrente, com o devido respeito, que a decisão da matéria de facto deverá, nos termos supra expostos, ser alterada em conformidade com os depoimentos daquelas testemunhas, e documentos referidos, passando assim a integrar a factualidade apurada a supra identificada na conclusão 3ª. 12ª Devendo, em consequência ser julgada não provada e improcedente a presente acção. 13ª Sendo essa decisão a que mais ajustada e correcta resulta, no entender da recorrente, no caso dos autos, impondo-se, pois, por tais motivos e com aqueles fundamentos, a revogação da sentença proferida. 14ª A sentença recorrida, por incorrecta interpretação e aplicação dos normativos legais, terá violado, salvo melhor opinião, o disposto nos artigos 405º, art. 1112/2 e a contrário, nºs 3 e 4, 358/2, 1022 e 1069, todos do Código Civil, artigo 304 – p, nº 2 do Código da Propriedade Industrial).*Pronunciou-se o Tribunal a quo pelo indeferimento da nulidade invocada pela Autora, imputada à sentença e escudada no art. 615º, nº1, alínea d), do Código de Processo Civil, que apreciou ao abrigo do nº1, do art. 617º, do CPC, pois que “Na sentença recorrida se afirma que “em face da invalidade formal do negócio celebrado pelas partes, fica prejudicado o conhecimento do restante peticionado – cf. art. 608º nº2, do Código de Processo Civil”. Como se compreenderá não há que conhecer dos restantes pedidos quando o Tribunal, depois de analisar o primeiro dos pedidos deduzidos pela Autora (o de declaração de nulidade das duas declarações de “reconhecimento de obrigações pecuniárias acordo de pagamento e constituição de garantia”, do contrato de arrendamento e de cessão da posição contratual da trabalhadora, por simulados, nos termos do art. 240º, do Código Civil), conclui que o que as partes pretenderam, de facto e efectivamente, foi trespassar os três estabelecimentos e sanciona tal encontro de vontades com a nulidade com fundamento em omissão da forma legalmente exigida por lei. Se não há simulação e se o negócio efectivamente celebrado é formalmente inválido, não há que conhecer do restante peticionado porque estruturado à volta de comportamento da Ré relacionado com os vícios alegados e que, em face do decidido, não cumpre conhecer”. *Após os vistos, cumpre apreciar e decidir os recursos interposto.*II. FUNDAMENTAÇÃO - OBJETO DO RECURSO Apontemos as questões objeto do presente recurso, tendo presente que o mesmo é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil. Assim, as questões decidendas são as seguintes: A- 1º recurso (apelação da Autora) 1. Da rejeição do recurso por incumprimento pela apelante do ónus de apresentação de conclusões de recurso, 2. Da oportunidade da rejeição.*B - 2º recurso (apelação da Ré) 1. Do incumprimento pela Apelante dos ónus impostos para a impugnação da decisão da matéria de facto (falta de indicação da prova - facto por facto - em que se fundamenta o erro, falta de análise crítica da prova de cada um dos concretos pontos de facto considerados incorretamente julgados e falta de indicação das passagens da gravação em que funda o recurso quanto a cada questão de facto impugnada) e, caso o mesmo se não verifique, se cumpre proceder à alteração da factualidade dada como provada e não provada pelo tribunal nos termos preconizados pela apelante; 2. Da modificabilidade da decisão de mérito (saber se se deverá realizar nova interpretação e aplicação do direito à nova factualidade apurada). *II. A - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Foram os seguintes os factos considerados provados pelo Tribunal de 1ª instância (transcrição): a) A autora é empresária por conta própria; b) A aquisição do direito de propriedade da fração autónoma designada pela letra(…), correspondente ao estabelecimento comercial com entrada pelo nº (…), da Avenida (…), que faz parte do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na Avenida (…),e Rua (…), freguesia de (…), concelho de (…), descrito na Conservatória de Registo Predial de (…), sob o nº (…), encontra-se inscrita a favor da Ré; c) Durante 28 anos, o estabelecimento de venda de produtos ao público denominado (…) – Acessórios de Moda, a funcionar na supra referida fração, foi explorado pela Ré; d) Paralelamente, a mesma também explorou os estabelecimentos de venda de produtos ao público designados por Ala (…) e In (…) ambos localizados em (…), na referida Av. (…); e) (…) – Acessórios de Moda é o estabelecimento/loja mais rentável, uma vez que representa cerca de 70% da globalidade dos negócios; f) Nessas lojas, a Autora trabalhou ao serviço da ré, por mais de 20 anos, exercendo as suas funções principalmente na loja referida na alínea c), mas também, ocasionalmente, nos outros espaços explorados pela Ré; g) Por causa de problemas de saúde de que veio a padecer, designadamente, por ter sofrido um acidente vascular cerebral, a Ré propôs à Autora a transmissão, a título definitivo, dos estabelecimentos mencionados nas alíneas c) e d); h) O que a Autora aceitou, depois de negociar com a Autora o preço da transmissão, que acordaram que fosse fixado em € 134.754,37; i) A negociação foi conduzida pela Ré, em quem a Autora confiava; j) Para a concretização do negócio referido em g), a Ré apresentou à Autora dois escritos elaborados a seu mando, intitulados de reconhecimento de obrigação pecuniária, acordo de pagamento e constituição de garantia, ambos datados de 28 de Janeiro de 2015, para que esta os assinasse juntamente consigo e com o fiador, Joel (…), cujas cópias se encontram juntas aos autos de fls. 157 a 162 e cujos teores se dão aqui por integralmente reproduzidos; k) Um dos escritos prevê a forma de pagamento da quantia de € 92.954,13 e o outro a quantia de € 34.790,24; l) De acordo com a cláusula segunda, nº 5, do primeiro dos referidos escritos, “para pagamento do sobredito preço do trespasse, e de modo a cumprir pontualmente o pagamento das parcelas anuais referidas no número anterior, a Primeira Contraente compromete-se a fazer entregas mensais, no último dia de cada mês, à Segunda Contraente, que delas dará quitação, com o montante mínimo de € 1.000,00”; m) De acordo com a cláusula quinta, do primeiro dos referidos escritos, “como garantia de cumprimento do pagamento da quantia em causa e até integral pagamento da mesma, a Primeira Outorgante dá como garantia à Segunda Outorgante o estabelecimento comercial CAE: (…) – “Comércio a retalho de outros produtos novos em estabelecimentos n. e.”, denominado por “Loja (…)/Gift” instalado e a funcionar no rés-do-chão, com entrada pelo nº (…), do prédio urbano, sito na Avenida (…)”; n) Os escritos em causa foram assinados pela Autora, pela Ré e por Joel (…) em 28 de … de …; o) Ainda nesse dia, foi também emitida uma fatura de 4.510,00€, correspondente à venda de parte do imobilizado daqueles estabelecimentos, tendo naquela mesma data a Autora pago à Ré, por cheque, aquele valor; p) A Ré, para além de ter conduzido a negociação com a Autora, foi assessorada pelos seus contabilistas, que se encontravam presentes na reunião em que os escritos mencionados na alínea j) foram assinados, juntamente com o filho da Ré, advogado, que autenticou as assinaturas dos mesmos, e o marido desta; q) A Autora, antes de assinar os escritos mencionados na alínea j), não se aconselhou com advogado ou contabilista; r) Por causa do acordo mencionado nas alíneas g) e h), no dia 1 de Janeiro de 2015, Autora e Ré celebraram um acordo, por elas apelidado de contrato de arrendamento com prazo certo para fins não habitacionais com fiança, nos termos do qual a segunda cedeu à primeira o gozo da fracção autónoma designada pela letra “(…)”, correspondente ao estabelecimento com entrada pelo número (…) da Avenida (…), que faz parte do prédio urbano em regime de propriedade horizontal sito na Avenida (…), número v(…) e Rua … de (…), número (…), em (…), pelo valor mensal de € 350,00, nos termos que melhor surgem descritos na cópia junta aos autos de fls. 23v a 27 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido; s) Por causa do acordo mencionado nas alíneas g) e h), em 28 de Janeiro de 2015, Autora, Ré e Paula (…), celebraram um acordo, por escrito, apelidado de Cessão de Posição Contratual em Contrato de Trabalho, nos termos que melhor surgem reproduzidos na cópia de fls. 28 a 29 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido; t) Após a celebração dos acordos supra descritos, a Autora iniciou a exploração dos estabelecimentos/lojas supra descritos; u) A fisionomia exterior e interior dos estabelecimentos, sob a exploração da Autora, manteve-se tal como era quando era a Ré a explorá-los; v) A Autora, depois de começar a explorar os estabelecimentos/lojas, continuou a usar o programa informático de faturação que a Ré utilizava; w) A Autora, depois de começar a explorar os estabelecimentos/lojas, continuou a usar o endereço eletrónico que a Ré usava – (…) hotmail.com – designadamente, para fazer encomendas a fornecedores; x) A Autora, depois de começar a explorar os estabelecimentos/lojas, manteve o toldo da loja (…) é – Acessórios de Moda com a inscrição (…) – Acessórios de Moda; y) A Autora, depois de começar a explorar os estabelecimentos/lojas, continuou a usar no giro comercial da loja (…) – Acessórios de Moda, designadamente, na venda de produtos aos clientes, sacos, envelopes e autocolantes nos quais se encontravam apostos os dizeres (…) – Acessórios de Moda; z) A Autora, depois de começar a explorar os estabelecimentos/lojas, passou a fazer publicidade aos mesmos, designadamente, em rádios locais e em panfletos de eventos locais, sendo que quanto à loja (…) utilizou os dizeres (…) – Acessórios de Moda; aa) A Ré teve conhecimento, logo depois de a Autora dar início à exploração das lojas, do que se menciona nas alíneas v) a z); bb) Logo depois de a Autora dar início à exploração das lojas, a Ré passou a aparecer ocasionalmente no espaço onde funcionava a loja (…) – Acessórios de Moda, comportando-se perante os clientes como se fosse a dona do estabelecimento; cc) Não mostrando a Ré vontade de fazer cessar o seu comportamento, que se prolongou durante pelo menos o ano de 2015, com a tolerância da Autora, esta proibiu expressamente a Ré de entrar na loja; dd) Durante as negociações para a transmissão dos estabelecimentos/lojas, a Ré não disse à Autora que as marcas (…) – Acessórios de Moda, (…) Gift e o logótipo (…) Acessórios de Moda se encontravam registados a seu favor no Instituto Nacional da Propriedade Industrial; ee) Por missiva datada de 20 de Dezembro de 2016 e recebida pela Autora em 22 do mesmo mês e ano, a Ré escreveu que “não detendo V. Exa. qualquer título válido que legitime o uso das referidas marcas e logótipo (quer na loja, quer nas redes sociais, sacos, vinhetas, papel timbrado, etiquetas, toldo placa, entre outros), fica, de imediato, proibida dessa atitude abusiva”, conforme se retira das cópias juntas aos autos de procedimento cautelar (apenso A) a fls. 48v e 49 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido; ff) A partir desse momento, a Autora deixou de utilizar aquelas marcas e logótipos no giro comercial da loja; gg) E mudou o nome da loja mais para (…) – Acessórios de Moda; hh) O recheio de produtos da loja (…) – Acessórios de Moda incluía, à data da transmissão, sacos, autocolantes, envelopes, cartões-de-visita e etiquetas com os dizeres (…) – Acessórios de Moda e respetivo logótipo; ii) O valor global de € 134.754,37 da acordada transmissão das lojas/estabelecimentos seria realizado em cinco anos, com um pagamento inicial de € 5.000,00 e o pagamento de € 24.548,88 até ao final de cada ano, correspondendo o referido valor de pagamento anual à soma da quantia de € 6.958,04 (relativa à parte do imobilizado) com a quantia de € 17.590,84 [relativa ao valor da ocupação do espaço decorrente do acordo referido em r)]; jj) Do valor global foi já pago pela Autora a quantia de € 78.354,37, encontrando-se ainda por pagar a quantia de € 56.550,00; kk) Em 01.06.2017, a Ré abriu uma loja a menos de 50 metros da loja explorada pela Autora com o nome de (…) – Acessórios de Moda; ll) Autora e Ré trocaram a correspondência consubstanciada nas missivas cujas cópias se encontram juntas aos autos de fls. 57v a 61 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido; mm) Após o momento referido em cc), a Ré tentou que um dos fornecedores da loja explorada pela Autora, representada por Edouard (…), deixasse de vender produtos à Autora, dizendo-lhe que ia abrir outra loja e que a Autora era “de baixo nível”; nn) Após o momento referido em cc), a loja da Autora, In (…), foi fiscalizada pela ASAE (Autoridade de Segurança Alimentar e Económica); oo) A marca (…) – Acessórios de Moda é, no seu ramo (moda, design e decoração), uma marca prestigiada no comércio local, assentando na experiência de um estabelecimento que esteve aberto ao público durante 28 anos; pp) Quando a Autora celebrou os acordos mencionados nas alíneas j), r) e s) pressupôs a manutenção da marca (…) – Acessórios de Moda no estabelecimento/loja negociado, bem como a sua utilização posterior, só tendo aceitado o preço proposto naquele pressuposto. *Foram os seguintes os factos considerados não provados pelo Tribunal de 1ª instância (transcrição): Da petição inicial: artigos 16º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea u) a z), 23º a 29º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea bb), 30º a 36º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas mm) e nn), 38º a 40º, 41º, parte final, a 44º, 51º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea pp), 52º a 61º, sem prejuízo do que se deu por provado nas alíneas w) a z)e pp), 63º, 66º, sem prejuízo do que se deu por provado na alínea kk) e 67º a 72º. Da contestação da Ré: artigos 12º a 24º, 31º a 36º, 44º a 46º, 48º, parte final, 55º e 70º. *II. B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO A- 1º recurso (apelação da Autora) 1. Da rejeição do recurso 1.1. Por incumprimento, pela Autora/Apelante, do ónus de apresentação de conclusões de recurso Cumpre, antes de mais, analisar se a apelante observou os ónus legalmente impostos, enunciados nos artºs 639º e 640º, do Código de Processo Civil, diploma a que pertencem todos os artigos a citar sem outra referência, que constituem requisitos habilitadores ao conhecimento, por este tribunal, da impugnação e, no caso afirmativo, uma vez fixada a matéria de facto, apreciar da modificabilidade da fundamentação jurídica. Desde logo, o nº1, daquele artigo, consagrando o ónus de alegar e formular conclusões, estabelece que “O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”, sendo as conclusões das alegações de recurso que balizam a pronúncia do tribunal (negrito e sublinhado nosso). O referido ónus subdivide-se: - no da apresentação das alegações; - no de formulação de conclusões. As alegações destinam-se à apresentação dos argumentos pelos quais se sustenta a alteração da decisão. As conclusões são proposições que, de forma sintética, condensem o exposto na motivação do recurso, cabendo sublinhar que as especificações que a lei manda enunciar nas conclusões, têm a essencial função de definir e delimitar o objeto do recurso, circunscrevendo o campo de intervenção do tribunal superior. Assim, devem as conclusões corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que se pretende obter do Tribunal de 2ª instância, em contraposição com o que foi decidido pelo tribunal a quo, incluindo, na parte final, aquilo que o recorrente efetivamente pretende obter – revogação, anulação ou modificação da decisão recorrida (1). A lei exige que o recorrente condense em conclusões os fundamentos por que pede a revogação, a modificação ou a anulação da decisão. Com as necessárias distâncias, tal como a motivação do recurso pode ser associada à causa de pedir, também as conclusões, como proposições sintéticas, encontram paralelo na formulação do pedido que deve integrar a petição inicial. Rigorosamente, as conclusões devem (deveriam) corresponder a fundamentos que, com o objetivo de obter a revogação, alteração ou anulação da decisão recorrida, se traduzam na enunciação de verdadeiras questões de direito (ou de facto) cujas respostas interfiram com a decisão recorrida e com o resultado pretendido, sem que jamais se possam confundir com os argumentos de ordem jurisprudencial ou doutrinário, os quais não devem ultrapassar o setor da motivação (2). Como decorre do nº3, do art. 639º, as conclusões exercem a função de delimitar o objeto do recurso, sendo que, como ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que o recorrente pretende obter do tribunal superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo. Incluindo, na parte final, o resultado procurado, devem respeitar na sua essência cada uma das alíneas do nº2, integrando-se as respostas a tais premissas essenciais no encadeamento lógico da decisão pretendida. Se, para atingir o resultado declarado, o tribunal a quo assentou em determinada motivação, dando respostas às diversas questões, as conclusões devem elencar os passos fundamentais que, na perspetiva do recorrente, deveriam ter sido dados para atingir um resultado diverso (3). O ónus de formular conclusões, no final das alegações, só pode considerar-se satisfeito quando o recorrente termina a sua minuta com a enunciação de proposições que sintetizem, com clareza, precisão e concisão, os fundamentos ou razões jurídicas pelas quais pretende obter o provimento do recurso (anulação, alteração ou revogação da decisão do tribunal a quo) (4), sendo frequentes situações irregulares: alegações deficientes, obscuras, complexas ou sem as especificações exigidas pelo nº2, ocorrendo situações em que as conclusões são reprodução (total ou parcial) dos argumentos anteriormente apresentados, sem qualquer preocupação de síntese, como se o volume ou a quantidade das conclusões fosse sinónimo de qualidade ou como se houvesse necessidade de assegurar, por essa via, a delimitação do objeto do processo e a apreciação pelo tribunal ad quem de todas as questões suscitadas (5). Quanto a tal ónus prevê a lei a possibilidade de supressão de certas falhas que podem traduzir-se em deficiências, insuficiências, contradição, excesso, obscuridade, complexidade, prolixidade ou inocuidade, sendo suscetíveis de superação por via da resposta a um despacho de convite ao aperfeiçoamento (6). Na verdade, o nº3, daquele artigo, estatui que “Quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o número anterior, o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afetada”. E, com a reforma do regime dos recursos introduzida pelo DL nº 303/2007, de 24 de Agosto, a falta de conclusões passou, a par da ausência de alegações, a constituir fundamento de rejeição de recurso - cf. artigo 685.º-C, nº 2, al. b), do CPC, na redação anterior à Lei nº 41/2013 - e, deste modo, quando antes se admitia o convite ao recorrente a suprir a falta de conclusões, com a nova lei o convite passou a ter lugar, apenas, quando as conclusões sejam deficientes, obscuras complexas ou quando nelas se não tenha procedido às especificações previstas no nº 2 do citado artigo 639.º, sendo que, para a falta de conclusões dispõe, presentemente, a al. b), do nº2, do art. 641º (rejeição de recurso). Como se analisa no Acórdão da Relação do Porto supra citado, o cerne da questão, face às diferentes consequências que a lei atribui - rejeição do recurso para a falta de conclusões (7) e convite ao aperfeiçoamento para situações de conclusões com vícios: deficientes, obscuras, complexas ou quando nelas se não tenha procedido às especificações previstas no nº 2, do citado artigo 639º -, “consiste em distinguir o que sejam conclusões “deficientes, obscuras e complexas” e que situações integram a “ausência de conclusões”. Aí se refere, “para isso, fazemos apelo à delimitação proposta no Acórdão do STJ de 09/07/2015 (8) já citado: “As conclusões são deficientes designadamente quando não retractem todas as questões sugeridas pela motivação (insuficiência), quando não revelem incompatibilidade com o teor da motivação (contradição), quando não encontrem apoio na motivação, surgindo desgarradas (excessivas), quando não correspondam a proposições logicamente adequadas às premissas (incongruentes), ou quando surjam amalgamadas, sem a necessária discriminação, questões ligas à matéria de facto e questões de direito. Obscuras serão as conclusões formuladas de tal modo que se revelem ininteligíveis, de difícil inteligibilidade ou que razoavelmente não permitam ao recorrido ou ao tribunal percepcionar o trilho seguido pelo recorrente para atingir o resultado que proclama. As conclusões serão complexas quando não cumpram as exigências de sintetização a que se refere o nº1 (prolixidade) ou quando, a par das verdadeiras questões que interferem na decisão do caso, surjam outras sem qualquer interesse (inoquidade) ou que constituem mera repetição de argumentos anteriormente apresentados. Complexidade que também deverá decorrer do fato de se transferirem para o segmento que deve integrar as conclusões, argumentos, referências doutrinais ou jurisprudências propícias ao segmento da motivação. Ou ainda, quando se mostre desrespeitada a regra que aponta para a necessidade de a cada conclusão corresponder uma proposição, evitando amalgamar diversas questões.” No que tange ao sentido a dar à “omissão absoluta” de conclusões, para o efeito de o juiz proceder ao convite ao aperfeiçoamento ou, desde logo, à pura e simples rejeição do recurso, afirma António Abrantes Geraldes: “Estabelecendo o paralelismo com a petição inicial, tal como esta está ferida de ineptidão quando falta a indicação do pedido, também as alegações destituídas em absoluto de conclusões são “ineptas”, determinando a rejeição do recurso, sem que se justifique a prolação de qualquer despacho de convite à sua apresentação.” (9). (negrito nosso). Respondendo à questão de saber se a repetição em sede de conclusões da motivação vertida na alegação propriamente dita - que se verifica in casu - configura ou não um caso de falta de conclusões: - Uma corrente jurisprudencial (cf. Acs do STJ de 6/4/17, 297/13, de 9/7/2015, 818/07 e, ainda, de 13/10/2016, 5048/14.5TENT-A.E1.S1 (10)) e doutrinária (v. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa) vem considerando que “Apesar de constituir uma técnica manifestamente errada e violadora das exigências de sistematização impostas pelo preceito, a circunstância de, em sede de conclusões, o recorrente reproduzir a motivação vertida na alegação propriamente dita não configura um caso de falta de conclusões”, não podendo, por isso, o recurso ser rejeitado de imediato, devendo ser proferido despacho de convite ao aperfeiçoamento, com fundamento na apresentação de conclusões complexas ou prolixas (11). - Outra corrente, que adiante se aprofundará e que é por nós perfilhada, considera nenhum valor ter o puro ato inútil de mera repetição do já dito, intitulado de “conclusões”, estando as mesmas, na formulação da lei adjetiva, em real e efetiva falta, pois que para além do dito nada se acrescenta e nada se sintetiza, a motivar a rejeição do recurso, consequência legalmente estatuída, e que se impõe ao aplicador da lei, para a falta de cumprimento de tal ónus. Ora, analisando, em pormenor, a alegação de recurso apresentada pela apelante, verifica-se que a Recorrente, no que faz constar sob “concluindo”, limita-se a reproduzir, integralmente e ipsis verbis, o extenso corpo das suas alegações, aí “colando” o que, já havia escrito anteriormente, com insignificantes alterações de pormenor na redação e agrupamento. Consideramos, por isso, e porque nada de novo (a sintetizar) foi feito, mas, mero ato inútil, de repetição do já dito, não cumprido o ónus de apresentação de conclusões, o que não pode deixar de conduzir à rejeição do recurso, por aplicação da al. b), do nº2, do artigo 641º. Vejamos mais em pormenor a lei, a Doutrina e a Jurisprudência e a razão de assim considerarmos. Estabelece o referido preceito que: 2. “O requerimento é indeferido quando: a) … b) Não contenha ou junte a alegação do recorrente ou quando esta não tenha conclusões”. Ora, “O art. 639º, nº3, em conjugação com o art. 641º, nº2, al. b), não deixa margem para dúvidas, devendo o indeferimento do recurso com fundamento na falta de conclusões ser assumido logo no tribunal a quo, sem embargo de oportuna intervenção do tribunal ad quem” (12). Como se referiu, o nº1, do art. 639º, impõe que, na alegação, se conclua, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que se pede a alteração ou anulação da decisão e que o recorrente deve terminar as suas alegações de recurso com conclusões sintéticas (onde indicará os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida). Essas conclusões devem ser idóneas para delimitar de forma clara, inteligível e concludente o objecto do recurso, permitindo apreender as questões de facto ou de direito que o recorrente pretende suscitar na impugnação que deduz e que ao tribunal superior cumpre solucionar. Não devem valer como conclusões arrazoados longos e confusos em que se não discriminam com facilidade as questões invocadas (13). Como considerámos no Ac. desta Relação de 3/5/2018, proferido na Apelação nº 276/11.8TBTMC.G1, por, ainda assim se revelar ter existido espírito de síntese, “o facto de os Recorrentes, nas “conclusões”, reproduzirem parte do corpo das suas alegações, não impõe a rejeição do recurso apenas podendo haver lugar ao convite a que alude o nº3, do referido artigo, caso se considere serem as mesmas “deficientes, obscuras ou complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o número anterior”. E, na verdade, como se decidiu no Acórdão do STJ de 13/7/2017, processo 6322/11.8TBLRA-A.C2. S1, relatado pelo Senhor Juiz Conselheiro Fonseca Ramos, as “conclusões das alegações que reproduzem o texto das alegações, dão a conhecer o objeto do recurso - art. 635º, nº3, do Código de Processo Civil - o que não pode deixar de ser tido em consideração no juízo de ponderação que importa convocar quanto a saber se, por tal procedimento, é como se não existissem. A equivalência que o Acórdão recorrido faz, considerando não haver conclusões, pelo facto delas serem a reprodução das alegações, parece excessivo. Cumpre ao Tribunal recorrido convidar o recorrente ao aperfeiçoamento das alegações, assinalando a incorreção formal que, drasticamente, serviu para rejeitar o recurso” (14) (15). Como refere Abrantes Geraldes, “Ainda que algumas das situações exemplificadas (como é o caso da anteriormente referida) justificassem efeitos mais gravosos, foi adoptada uma solução paliativa que possibilita a supressão das deficiências através de despacho de convite ao aperfeiçoamento. Ao invés do que ocorre quando faltam pura e simplesmente as conclusões, em que o juiz a quo profere despacho de rejeição imediata do recurso, qualquer intervenção no sentido do aperfeiçoamento das irregularidades passíveis de superação foi guardada para o relator no tribunal ad quem, como se extrai, com toda a clareza, do nº3 do art. 639º e da al. a) do nº 3 do art. 652º” (16) (negrito nosso). Efetivamente, “se o recorrente não alegar, ou alegando, não concluir, o requerimento de interposição do recurso é indeferido, nos termos do estipulado pelo artigo 641º, nº 2, b), do CPC, mas se alegar e concluir faltando as especificações quanto à exatidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso, o mesmo é, imediatamente, rejeitado, mas se, apenas, faltar a indicação (…) sobre o sentido da decisão que defende ou a indicação das normas jurídicas violadas, o sentido em que as mesmas deveriam ser interpretadas e aplicadas ou, em caso de erro, a norma jurídica que deveria ser aplicável, a rejeição do recurso só pode ser determinada, atento o estipulado pelos artigos 640º, nºs 1 e 2 e 639º, nºs 1, 2 e 3, do CPC, após prévio convite inconclusivo quanto ao aperfeiçoamento das alegações, exceto se o Tribunal «ad quem» e a parte contrária conseguem apreender as questões suscitadas pelo recorrente (17). Porém, no caso concreto, apesar da falsa aparência, meramente formal, de apresentação de conclusões (extensas), nenhumas conclusões foram apresentadas, mesmo que por reprodução de algo já dito, tendo, sim, ocorrido mero e integral copiar do anteriormente escrito (e mero colar de todo o corpo das alegações), o que de conclusões se não trata e nunca podendo tratar, pois que assim não podem ser entendidas, dada a ausência de síntese. “Em boa verdade, o recurso a este expediente de copy paste, para duplicar as alegações como se fosse para concluir, revela um uso abusivo dos meios automáticos de processamento de texto e conduz à inexistência material de conclusões, pois se, sob este título, apenas se derrama (…) o teor da parte analítica e argumentativa, o que de facto se oferece ao tribunal de recurso é uma fraude” (18), com o que se não pode pactuar por, desde logo, criar entraves, acrescidos esforços, custos, dificuldades e prejuízos para a celeridade processual e, consequentemente, para a realização da justiça, que se impõe que seja exercida em prazo razoável, o que se não compagina com atuações como a dos autos. A reprodução integral do anteriormente alegado no corpo das alegações, ainda que apelidada pela apelante de conclusões, não pode ser considerada para efeito do cumprimento do dever de apresentação das conclusões do recurso, nem podem ser consideradas deficientes (motivação insuficiente, contraditória, incongruente ou mesmo excessiva), obscuras ou complexas, equivalendo, ao invés, à ausência de conclusões, o que sempre dará lugar à rejeição do recurso (19). No recente Acórdão da Relação do Porto de 24/1/2018, bem se decidiu que as “conclusões são a enumeração clara e enxuta dos fundamentos expostos no corpo das alegações pelos quais a parte entende que se justifica a revogação, alteração ou anulação da decisão recorrida, com eventual resumo sintético das preposições que configuram a exposição dos argumentos relativos a cada uma dessas questões invocadas. A mera repetição de argumentos nas conclusões das alegações de recurso configura uma actuação processual inútil e prejudicial ao fim visado, e violadora das regras processuais” (20). Mais aí se considerou que a “ausência de conclusões – enquanto indicação sintética das questões colocadas pelos recorrentes – implica que o recurso deva ser rejeitado, ao abrigo do disposto no art. 641º, nº2, al. b), do CPC”, citando abundante doutrina e jurisprudência (21). Ora, in casu, independentemente da análise da verificação de deficiências, de repetições e de falta de espírito de síntese e, até, de análise sobre se o referido dá ou não a conhecer o objeto do recurso, verifica-se que ocorre mera e integral repetição do corpo das alegações, com total e absoluta falta de conclusões, pois que síntese dos fundamentos invocados não houve nenhuma. A recorrente apresentou a sua alegação e esta não contém conclusões, pois que o dito, em completa, absoluta e extensa repetição, não pode ser tido como conclusões, em cumprimento do ónus imposto no nº1, do art. 639º, do CPC – o de formular conclusões -, justificando, plenamente, os efeitos mais gravosos de que fala Abrantes Geraldes e que estão associados ao absoluto incumprimento de tal ónus sem que tal se mostre desproporcional ou excessivo, pois que tendo a parte o ónus de formular conclusões, sem o que se extrai automaticamente os efeitos gravosos da rejeição do recurso, nem sequer um esboço de esforço nesse sentido revelou ter feito (meramente “colando”), pelo que sofre as consequências da sua falta de rigor, por imperativo do princípio da auto-responsabilização das partes. Acresce que, tendo a interpretação da lei de ser feita com um sentido que na letra da mesma tenha o mínimo de correspondência e não podendo o seu aplicador ser visto como legislador, tem de se observar na aplicação da lei o sentido que da sua letra, aberta, ostensiva e claramente, decorre. Impondo a lei uma determinada consequência para a inobservância de um ónus, afigura-se-nos não poder o aplicador buscar “solução paliativa” e aplicar um outro procedimento e consequência diverso do estatuído. O “propiciar a obtenção de decisões que privilegiem o mérito ou a substância sobre a forma”, referido na exposição de motivos constante do preâmbulo do novo CPC, não implicou a derrogação dos princípios da preclusão e da autorresponsabilidade das partes. A deficiência, obscuridade ou complexidade das conclusões das alegações de recurso são vícios que afetam conclusões, supondo, assim, pelo menos, um ensaio de síntese dos fundamentos do recurso. Tal esboço não se verifica em nominadas “conclusões” que apenas repetem – com cosméticas e minudentes alterações de pormenor na redação e agrupamento – o teor integral do corpo das alegações, não sendo, assim, passíveis de despacho de aperfeiçoamento (22). E apesar de se privilegiarem as decisões de mérito relativamente às de forma, o certo é que nenhuma substância conclusiva foi apresentada e os ónus impostos têm de ser cumpridos, tendo de ser respeitadas as regras adjetivas, sob pena de a parte se sujeitar às consequências de tal incumprimento. Havendo norma expressa a regular a questão, nenhum dever de colaboração do juiz com a apelante e nenhum dever no âmbito de gestão processual do Tribunal se impondo a esse nível atenta a consequência diretamente consagrada, que cabe aplicar, sob pena de cairmos, adjetivamente, no reino onde vale tudo, impondo-se um processo equitativo, “de forma, materialmente, adequada a uma tutela efetiva, sendo a forma um meio de proporcionar às partes o acesso à justiça, com a finalidade de ser obtido o justo equilíbrio de interesses” (23). O STJ já considerou, com inteira apropriação para o caso, que: - O recorrente deve terminar as suas alegações de recurso com conclusões sintéticas (onde indicará os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida); - Essas conclusões devem ser idóneas para delimitar de forma clara, inteligível e concludente o objecto do recurso, permitindo apreender as questões de facto ou de direito que o recorrente pretende suscitar na impugnação que deduz e que o tribunal superior cumpre solucionar; - Não devem valer como conclusões arrazoadas longas e confusas em que se não discriminam com facilidade as questões invocadas; - No caso, o recorrente não reduziu a complexidade nem a inteligibilidade das alegações e porque não cumpriu o ónus que lhe é imposto o acórdão recorrido, que não apreciou o recurso por o recorrente não realizar conclusões juridicamente válidas, merece confirmação (24). E, tal como, até conclui Abrantes Geraldes, ao referir justificarem algumas das situações, que exemplifica, “efeitos mais gravosos” que o despacho de convite ao aperfeiçoamento (25) - logo rejeição do recurso –, vem sendo entendido por forte corrente jurisprudencial de todas as Relações e vem sendo considerado por alguns que jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem lidado com diversas anomalias conclusivas de uma forma, por vezes, benevolente, “flexível”, entendendo estes que “Este laisser faire, laisser passer em relação, não só à prolixidade das conclusões, mas também quanto a outras irregularidades na elaboração das conclusões das alegações de recurso, pode evitar alguma morosidade pontual, mas tem um assinalável efeito perverso que é a instalação de uma certa indisciplina no cumprimento do ónus de concluir, de repercussões dilatórias gerais. Isto porque a sucessão de decisões permissivas vai cimentando uma rotina de cedência (…). O exarar juízos reprovadores (…) sobre a prolixidade ou outras anomalias das conclusões, e depois não adoptar as consequências lógicas e legais (…) dá a imagem de uma justiça que, embora veja o que está mal, não é capaz de se impor” (26). No caso, perante a gravosa irregularidade dos autos (total repetição da extensa alegação do recurso), nenhum convite a aperfeiçoamento de conclusões no sentido de sintetização pode ser feito, pois que, por total falta das conclusões impostas por lei (forma sintética legalmente imposta pelo nº1, do art. 639º), não podem os apelantes deixar de sofrer a consequência do incumprimento do ónus em causa, o de formular as ditas conclusões, definidas legalmente, - a rejeição do recurso (al. b), do nº2, do art. 641º). *2. Da oportunidade da rejeição Para efeito de ser proferido despacho liminar sobre o requerimento de interposição de recurso, o julgador, após exercício do contraditório, “conhece, oficiosamente ou mediante iniciativa do recorrido, das questões ligadas à admissibilidade, designadamente a recorribilidade, a tempestividade, a legitimidade, a competência ou o patrocínio judiciário. O facto de a pronúncia se concretizar quando a parte contrária já teve a oportunidade de contra-alegar amplia as possibilidades de uma decisão mais correta e completa quanto aos diversos aspetos que devem ser observados na fase introdutória do recurso (27). E, se nada vir que obste à admissibilidade do recurso, o juiz fixa o seu efeito e ordena a subida. In casu, o juiz a quo emitiu despacho liminar sobre o requerimento de interposição do recurso, admitindo-o, sendo que “O despacho de rejeição imediata do recurso deve ser reservado para casos em que a mera leitura do requerimento e das alegações torne manifesta a ausência do requisito da recorribilidade da decisão. É este critério que permite cindir a mera admissão ou rejeição liminar do recurso da apreciação dos seus fundamentos materiais que fica reservada para momento posterior” (28), não se encontrando prevista a possibilidade de introdução de despacho de convite às partes a pronunciar-se sobre aspeto que fundamente rejeição, sendo que, desde logo, “A falta de alegações ou de conclusões impõe a rejeição imediata do recurso, sem que se admita despacho de aperfeiçoamento, tendo em conta o que se encontra previsto no art. 641º, nº2, al. b)” (29). Ora, o despacho liminar de admissão do recurso não é vinculativo, cabendo, sempre, nos termos do nº5, do art. 641º, ao Tribunal Superior decidir da admissão ou rejeição do recurso. E a apreciação genérica e tabelar por parte do Relator dos aspetos formais relacionados com a admissibilidade do recurso não produz efeitos de caso julgado formal, não precludindo a possibilidade de posterior pronúncia de sentido diverso, seja por iniciativa própria do Relator, seja por sugestão dos Adjuntos (30) (31) (32), não constituindo a decisão, sem audição prévia das partes, decisão-surpresa, pois que quem tem o poder de admitir liminarmente também tem o de rejeitar (33) e é a própria lei a prevenir, até, expressamente este fundamento específico de rejeição. Acresce que, como vimos, o coletivo de juízes, que não está vinculado nem ao decidido pelo juiz a quo nem ao decidido pelo Relator, podendo ao apreciar decidir livremente pela rejeição do recurso, que vem admitido. Tal solução sempre se impõe, até, por um argumento de maioria de razão, pois que podendo o recurso ser rejeitado por um juiz só, por maioria de razão não poderia deixar de ser permitido o conhecimento imediato a um coletivo de juízes (que é quem tudo definitiva, livre e autonomamente decide neste Tribunal Superior). Assim, não sendo o despacho a admitir o recurso vinculativo para o Tribunal da Relação (artigo 641.º, nº 5, do CPC), nem fazendo o despacho do Relator caso julgado, cabendo ao coletivo de juízes, também, conhecer da admissibilidade do recurso e verificando-se - não obstante a ilusória aparência formal em contrário - a falta, como supra exposto, do objeto do recurso - “conclusões” - prejudicado fica o conhecimento do mérito do mesmo (34). *B- 2º recurso (apelação da Ré) 1. Rejeição do recurso quanto à impugnação da decisão sobre a matéria de facto 1.1. Por incumprimento, pela Ré/Apelante, dos ónus (primários e secundários) impostos para a impugnação decisão sobre a matéria de facto Conclui a Ré/Apelante dever a decisão da matéria de facto ser alterada em conformidade com os depoimentos das testemunhas e documentos referidos, passando a integrar a factualidade apurada a supra identificada na conclusão 3ª, devendo, em consequência ser julgada não provada e improcedente a presente ação. Ora, analisando as alegações da Ré Apelante, verifica-se que a mesma não especifica separadamente cada facto que impugna, com indicação dos concretos meios de prova que, no seu entender, levariam a uma decisão divergente da tomada quanto a cada facto e, ainda, em que sentido é que esta prova deveria ser interpretada, efetuando análise crítica da mesma, com indicação da relevância e do específico momento da gravação onde é tratado, tudo fazendo em bloco e pedindo que, na procedência da impugnação da matéria de facto, se proceda à nova qualificação jurídica e se julgue totalmente improcedente a ação. A fim de fixar, definitivamente, a matéria de facto e de analisar da modificabilidade da fundamentação jurídica, antes de mais, cumpre decidir se a apelante impugnante observou os ónus legalmente impostos em sede de impugnação da decisão da matéria de facto, e que vêm enunciados no art. 640º, os quais constituem requisitos habilitadores a que o tribunal ad quem possa conhecer da impugnação e decidi-la. Na verdade, no que se reporta à atividade jurisdicional que, quanto a tal, deve ser levada a cabo por este Tribunal de Segunda Instância, o nº1, do art. 640º, consagra que, quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a)- os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b)- os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c)- a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (negrito nosso). O n.º 2, do referido artigo acrescenta que: a) … quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (negrito nosso). Como resulta do referido preceito, e seguindo a lição de Abrantes Geraldes, quando o recurso verse a impugnação da decisão da matéria de facto deve o recorrente observar as seguintes regras: a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; (negrito nosso) b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos; c) Relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exactidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos;(…) e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar a interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente (35) (negrito nosso, por revelar relevância para o caso). Com a reforma introduzida ao Código de Processo Civil pelos Decretos-Leis n.ºs 39/95, de 15/02 e 329-A/95, de 12/12, o legislador consagrou o registo da audiência de discussão e julgamento, com a gravação integral da prova produzida, e conferiu às partes duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto. O tribunal de segunda instância passou a fazer um novo julgamento da matéria impugnada, assegurando um efetivo duplo grau de jurisdição, sendo isto que resulta do estatuído no art. 662º, n.º 1, do CPC, quando nele se expressa que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Comparando o anterior regime com o atual (cf. o art. 712º, do anterior CPC, com o art. 662º do atual), verificamos que a possibilidade de alteração da matéria de facto, que era excecional, passou a ser função normal do Tribunal da Relação, elevado a verdadeiro Tribunal de substituição, verificados os referidos requisitos legais. Conferiu-se, assim, às partes um duplo grau de jurisdição, por forma a poderem reagir contra eventuais e hipotéticos erros de julgamento, com vista a alcançar uma maior certeza e segurança jurídicas e a, desse modo, obter decisões mais justas, alcançando-se, assim, uma maior equidade e paz social, sempre buscadas pelo Estado, verdadeiro interessado na realização da justiça. O duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto pressupõe novo julgamento quanto à matéria de facto impugnada e “somente será alcançado se a Relação, perante o exame e análise crítica das provas produzidas, a respeito dos pontos de facto impugnados, puder formar a sua própria convicção, no gozo pleno do princípio da livre apreciação das prova, sem estar limitada pela convicção que serviu de base à decisão recorrida, em função do princípio da imediação da prova, princípio este que tido por absoluto transformaria este duplo grau de jurisdição em matéria de facto, numa garantia praticamente inútil” (36). Tendo o recurso por objeto a impugnação da matéria de facto, a Relação deve proceder a um novo julgamento, limitado à matéria de facto impugnada, procedendo à efetiva reapreciação da prova produzida, devendo nessa tarefa considerar os meios de prova indicados no recurso, assim como, ao abrigo do princípio do inquisitório, outros que entenda relevantes, apreciando livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto impugnado, exceto no que respeita a factos para cuja prova a lei exija formalidades especiais ou que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados por documento, acordo ou confissão (art. 607º, n.º 5 do Cód. Proc. Civil). Contudo, o legislador, ao impor ao recorrente o cumprimento das referidas regras, visou afastar soluções que pudessem reconduzir-nos a uma repetição dos julgamentos, tal como foi rejeitada a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, tendo o legislador optado por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências pelo recorrente. (37) Não se consagra a possibilidade de repetição do julgamento e de reapreciação de todos os pontos de facto, mas, apenas e só, a reapreciação pelo tribunal superior e, consequente, formação da sua própria convicção (à luz das mesmas regras de direito probatório a que está sujeito o tribunal recorrido) quanto a concretos pontos de facto julgados provados e/ou não provados pelo tribunal recorrido. A possibilidade de reapreciação da prova produzida em 1ª instância, enquanto garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, nunca poderá envolver a reapreciação global de toda a prova produzida, impondo-se, por isso, ao impugnante, no respeito dos princípios estruturantes da cooperação e da lealdade e boa-fé processuais, a observância das citadas regras. O Tribunal da Relação, sendo de 2ª instância, continua a ter competência residual em sede de reponderação ou reapreciação da matéria de facto (38), estando subtraída ao seu campo de cognição a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo que não seja alvo de impugnação. Em suma, deve, assim, o recorrente, sob cominação de rejeição do recurso, para além de delimitar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, deixar expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, sendo que, como refere Abrantes Geraldes, esta última exigência (plasmada na transcrita alínea c) do nº 1 do art. 640º) vem reforçar o ónus de alegação imposto ao recorrente (…) por forma a obviar a interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente, devendo ser apreciada à luz de um critério de rigor enquanto decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo (39). É entendimento doutrinal e jurisprudencial uniforme que, nas conclusões das alegações, que têm como finalidade delimitar o objeto do recurso (cf. nº4, do art. 635º, do CPC) e fixar as questões a conhecer pelo tribunal ad quem, o recorrente tem de delimitar o objeto da impugnação de forma rigorosa, indicando os concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados, sob pena de rejeição do recurso, como a lei adjetiva comina no nº1, do art. 640º. Não obstante o NCPC proceder, como vimos, ao alargamento e reforço dos poderes da Relação no domínio da reapreciação da matéria de facto, deve ser rejeitado o recurso, no atinente a tal ponto, quando o recorrente não cumpra os ónus impostos pelos nº1 e 2, a), do art. 640º (40). E impõe-se a rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto quando ocorra: a) falta de conclusões sobre a impugnação da matéria de facto (art. 635º, n.º 4 e 641º, n.º 2, al. b); b) falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (art. 640º, n.º 1, al. a)); c) falta de especificação (que pode constar apenas na motivação), dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.); d) falta de indicação exata, (que pode constar apenas na motivação), das passagens da gravação em que o recorrente se funda; e) falta de posição expressa, (que pode constar apenas na motivação), sobre o resultado pretendido a cada segmento da impugnação” (41). Tais critérios têm sido aplicados pelo Supremo Tribunal de Justiça (42), que tem vindo a distinguir, quanto aos ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, entre: - ónus primários, que se reportam ao mérito da pretensão; - ónus secundários, que respeitam a requisitos formais. Quanto aos ónus primários, onde inclui a obrigação do recorrente de formular conclusões e nestas especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e a falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados e falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação, requisitos estes sobre que versa o n.º 1, do art. 640º, do CPC, a jurisprudência tem considerado que aquele critério é de aplicar de forma rigorosa, pelo que sempre que se verifique o incumprimento de algum desses ónus por parte do recorrente se impõe rejeitar o recurso (43). Quanto aos ónus secundários, os enunciados no n.º 2, do referido artigo, em que se consagra a obrigação do recorrente, quando os meios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas que tenha sido gravada, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes, a jurisprudência considera que embora a observância desse ónus deva ser apreciada à luz de um critério de rigor, não convém exponenciar esse critério ao ponto de ser violado o princípio da proporcionalidade e denegada a reapreciação da decisão da matéria de facto com invocação de fundamentos que não encontram sustentação clara na letra ou no espírito do legislador (44). Assim, e como decidiu o STJ, o apelante pretendendo que o Tribunal da Relação reaprecie o julgamento da matéria de facto, para dar cabal cumprimento ao preceituado na al. c) do nº1, do art. 640º, do NCPC (2013), deve ser claro e inequívoco, afirmando que os pontos da matéria de facto impugnados deveriam ter as respostas que segundo a sua apreciação deveriam ter tido, indicando-as, de harmonia com as provas que indicou. Tal ónus não se satisfaz expressando o recorrente meras apreciações discordantes do julgamento e juízos de valor críticos, referidos aos depoimentos das testemunhas indicadas. A mera indicação de que certos pontos da matéria de facto, que são indicados, não deveriam ter tido as respostas que tiveram, sem se dizer quais as respostas que numa correta apreciação deviam merecer, não cumpre aquele ónus (45). A delimitação tem de ser concreta e específica e o recorrente tem de indicar, com clareza e precisão, os meios de prova em que fundamenta a sua impugnação, bem como as concretas razões de censura. Tal tem de ser especificado quanto a cada concreto facto. Não pode ser efetuado em termos latos, genéricos e em bloco. Analisado as conclusões das alegações da Apelante, entendemos que a Recorrente, que impugna a decisão da matéria de facto, não faz referência aos concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados indicando, justificadamente, os elementos probatórios que conduziriam à alteração de cada concreto ponto e a decisão que devia ter sido proferida quanto a cada concreto facto, procedendo a uma análise critica das provas e indicando a decisão que devia ser proferida sobre as concretas questões de facto impugnadas, em obediência às três alíneas do nº1, do referido art. 640º. Na verdade, e após o que refere no corpo das alegações, formula a Ré as conclusões supra referidas, que, como se referiu, delimitam o objeto do seu recurso. E, efetivamente, verifica-se que a recorrente, nas conclusões, não indica especificadamente os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, não especifica os meios probatórios que determinariam decisão diversa da tomada em Primeira Instância para cada um dos factos que pretende impugnar. Ora, como vimos, tal não basta para que se possa considerar cumprido aquele ónus, o que obsta ao conhecimento do objeto de recurso, pois que nesta Segunda Instância não se realiza novo julgamento sendo, tão só, de reapreciar os concretos meios probatórios relativamente aos pontos de facto impugnados e não em bloco. A falta de indicação por parte da apelante quer dos elementos probatórios que conduziriam à alteração de cada um dos pontos nos termos por ela propugnados, quer da decisão que, no seu entender, deveria sobre eles ter sido proferida, relativamente a cada facto concreto, e não em bloco, situação esta que se verifica in casu, têm, como consequência, a imediata rejeição do recurso, na parte respeitante aos pontos da matéria de facto relativamente aos quais se verifica a omissão, pois que quanto ao recurso da matéria de facto não existe despacho de aperfeiçoamento ao contrário do que sucede quanto ao recurso em matéria de direito, por aplicação do disposto no art. 639º, nº3, do CPC. Acresce que a recorrente não fez, também, qualquer apreciação crítica dos meios de prova produzidos, quanto a cada concreto facto, a justificar o erro de julgamento que invoca em termos genéricos, tendo de o fazer, pois que só assim cumpriria a exigência de obrigatória especificação imposta pelo nº1, do art. 640º. E, como se decidiu no Ac. da Relação de Lisboa de 13/3/2014 “Ao impugnar a decisão de facto, à luz do NCPC, cabe ao recorrente, em sede conclusiva, expressar o sentido da decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica, de que não poderá demitir-se, dos meios de prova produzidos/invocados – exigência nova de reforço do ónus de alegação e conclusão, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente – sob pena de rejeição da impugnação, por insuficiência ou obscuridade, na parte não fundamentada em exame crítico das provas. Tais exigências devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor, em decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão de facto se transforme em simples manifestação de inconsequente inconformismo (46). No mesmo sentido se orienta toda a jurisprudência – v., designadamente Ac. da Relação de Guimarães de 3/3/2016, Processo 283/08 e de 4/2/2016:Processo 283/08.8TBCHV.A.G1 (47) – onde se refere que “Tal como se impõe, por mor do preceituado no nº4, do art. 607º, do CPC, que o tribunal de 1ª instância faça a análise crítica das provas (de todas as provas que se tenham revelado decisivas) também o recorrente, ao enunciar os concretos meios de prova que devem conduzir a uma decisão diversa, deve fundamentar tal pretensão numa análise (crítica) dos meios de prova, não bastando reproduzir um ou outro segmento descontextualizado dos depoimentos. (…) Não cumpre o ónus de impugnação da decisão relativa à matéria de facto a que se refere a al. b), do nº1, do art. 640º, do NCPC, o recorrente que se limita a transcrever uma parte … do depoimento, aí partindo para a formulação da sua pretensão de modificação de diversos pontos da matéria de facto que indicou em bloco”. E, servindo as conclusões para delimitar o objeto do recurso, nelas devem ser identificados com precisão os pontos de facto que são objeto de impugnação (quanto aos demais previstos no art. 640º, é suficiente que constem de forma explícita na motivação do recurso) (48). Sendo função das conclusões do recurso indicar, embora de forma sintética, os fundamentos porque se pede a alteração (seja de facto seja de direito) da decisão, nelas tem o recorrente, que impugna a matéria de facto, de especificar os concretos factos que entende estarem mal julgados. A aferição deste mau julgamento é a questão colocada à decisão do tribunal de 2ª instância e, como tal, tem de constar das conclusões ou estará fora do objeto do recurso. Já a especificação dos concretos meios de prova que impunham decisão diversa e o cumprimento da exigência indicada na al. a), do nº2, do art. 640º, do NCPC, têm a sua sede própria no corpo da alegação. Acresce, ainda, que cabe ter em conta, que, quanto ao recurso da decisão da matéria de facto, não existe a possibilidade de despacho de convite ao aperfeiçoamento, sendo este tipo de despacho reservado somente aos recursos em matéria de direito. A falta de especificação nas conclusões dos factos concretos que se consideram mal julgados não dá lugar a despacho de aperfeiçoamento no quadro do nº3, do art. 639º, do NCPC (49). Como se decidiu no Acórdão desta Secção, em que a ora relatora foi adjunta, proferido na apelação nº 3361/12.5TBBCL.G1, no que respeita aos ónus da impugnação secundários, está-se “perante meros requisitos de forma, destinados a facilitar a localização dos depoimentos relevantes no suporte técnico que contém a gravação da audiência, pelo que o cumprimento desse ónus tem de ser “interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não se justificando a imediata e liminar rejeição do recurso quando, apesar de a indicação do recorrente não for totalmente exata e precisa, não exista dificuldade relevante na localização pelo tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento” (50). Conforme se lê no acórdão do STJ, cujo excerto se acaba de transcrever e infra identificado, “na interpretação da norma que consagra este ónus de indicação exata a cargo do recorrente que impugna prova gravada, não pode deixar de se ter em consideração a filosofia subjacente ao atual CPC, acentuando a prevalência do mérito e da substância sobre os requisitos ou exigências puramente formais, carecidos de uma interpretação funcionalmente adequada e compaginável com as exigências resultantes do princípio da proporcionalidade e da adequação – evitando que deficiências ou irregularidades puramente adjetivas impeçam a composição do litígio ou acabem por distorcer o conteúdo da sentença de mérito, condicionado pelo funcionamento de desproporcionadas cominações ou preclusões processuais”. Acontece que não obstante ser entendimento unânime do STJ no sentido de que aquele ónus de impugnação secundário tem de ser apreciado à luz de um critério da proporcionalidade, sendo de rejeitar a impugnação da matéria de facto quando não exista dificuldade relevante na localização pelo tribunal dos excertos da gravação em que a parte tenha fundado a sua impugnação, já existe discordância sobre as concretas condições que têm de se encontrar observadas para que à luz do enunciado critério de proporcionalidade se considere estar cumprido minimamente esse critério, de modo a não levar à rejeição do recurso quanto à impugnação da matéria de facto. Assim, enquanto no Ac. do STJ. de 09/07/2015, proferido no Proc. 284040/11.0YIPRT.G1.S1, se considerou que “tendo o apelante, nas suas conclusões de recurso (i) identificado os pontos de facto que considerava mal julgados, por referência aos quesitos da base instrutória, (ii) indicado o depoimento das testemunhas, que entendeu mal valorados, (iii) fornecido a indicação da sessão no qual foram prestados e do início e termo dos mesmos, apresentado a sua transcrição, (iv), bem como referido qual o resultado probatório que no seu entender deveria ter tido lugar, relativamente a cada quesito e meio de prova, tanto bastava para que a Relação tivesse procedido à reapreciação da matéria de facto, ao invés de a rejeitar” (51), outros entendem que o cumprimento daquele ónus por referência ao princípio da proporcionalidade não se basta com a indicação do início e termo dos depoimentos em que se funda o recurso, sequer com a apresentação da transcrição integral desses depoimentos, mas exige a indicação da concreta passagem ou passagens da gravação em que se funda o recurso (início e termo do excerto ou excertos em relação aos depoimentos que o recorrente considere relevantes) ou a transcrição desse excerto ou excertos. Neste último sentido pronunciou-se o Ac. STJ. de 14/09/2006, Proc. n.º 06B1998, onde se lê que: “Deve ser rejeitado o pedido de alteração da matéria de facto formulado na apelação que se refira unicamente aos depoimentos de determinadas testemunhas, mas omita os concretos pontos gravação das declarações daquelas que impunham uma decisão diversa sobre os trechos da matéria de facto impugnada”. Também no Ac. do STJ. de 19/01/2016, Proc. n.º 3326/10.4TBLRA.C1. S1, pondera-se que “ a falta de indicação exata e precisa do segmento da gravação em que se fundamenta o recurso, nos termos da alínea a) do n.º 2 do art. 640º do CPC não implica, só por si a rejeição do pedido de impugnação sobre a decisão da matéria de facto, desde que o recorrente se reporte à fixação eletrónica/digital e transcreve os excertos que entenda relevantes de forma a permitir a reanálise dos factos e o contraditório. Ainda no Ac. do STJ. de 19/02/2015, Proc. 405/09.1TMCBR.C1.S1, escreve-se que “… a apresentação das transcrições globais dos depoimentos não satisfaz a exigência determinada pela al. a) do n.º 2 do art. 640º do Cód. Proc. Civil”. Sem se perder de vista que o ónus enunciado no n.º 2 do art. 640º é meramente processual, destinando-se a facilitar a localização pelo tribunal ad quem, mas também pelo recorrido, dos depoimentos relevantes no suporte técnico que contém a gravação, habilitando o último a exercer cabalmente o seu direito de defesa em sede de contra-alegações e a apreender o raciocínio seguido nessa impugnação pelo recorrente por referência a esses concretos elementos probatórios, e que a filosofia subjacente ao atual CPC acentua a prevalência do mérito e da substância sobre os requisitos ou exigências meramente formais, reclamando que se interprete o art. 640º, n.º 2, al. a) de forma funcionalmente adequada atento o fim a que se destina, o que reclama o recurso ao princípio da proporcionalidade na apreciação do cumprimento daquele ónus, sendo de rejeitar toda e qualquer interpretação do enunciado normativo no sentido de impor o indeferimento do recurso da matéria de facto como decorrência automática do incumprimento do ónus que prescreve, propendemos para este segundo entendimento. É que, de contrário, não só estaríamos a fazer tábua rasa daquele preceito legal, que é expresso no sentido de impor ao recorrente a indicação com exatidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso, ou em alternativa, proceder à transcrição das mesmas, falando, aliás, em “transcrição de enxertos” de depoimento ou depoimentos que o recorrente “considere relevantes”, como se estaria a minorar os princípios da auto-responsabilidade das partes que, em sede de recurso, independentemente do valor da causa, têm de estar sempre representadas por técnico habilitado com os indispensáveis conhecimentos jurídicos – advogado -, além de se estar a restringir, minorando-os, os deveres de cooperação, lealdade e boa-fé processuais a que se encontram adstritas e, inclusivamente, se poder fazer perigar os direitos de defesa do recorrido, que desconheceria quais os concretos e específicos fundamentos probatórios em que o recorrente funda a sua impugnação e o raciocínio por ele seguido a partir desses fundamentos, por forma a poder cabalmente defender-se, em sede de contra-alegações, carreando para os autos outros excertos do depoimento daquela ou de outras testemunhas ou partes que sustentariam, na sua perspetiva, o julgamento feito pelo tribunal a quo. Resulta do que se vem dizendo, que não pudemos deixar de sufragar a posição jurisprudencial que sustenta que ao cumprimento do ónus enunciado no art. 640º, n.º 2, al. a), não basta ao recorrente que pretende atacar a decisão quanto aos concretos pontos da matéria de facto dados como provados e/ou não provados pelo tribunal a quo indicar o início e o termos dos depoimentos que, na sua perspetiva, impõem solução diversa, sequer a transcrição integral desses depoimentos, mas antes reclama que o recorrente indique a concreta passagem em que se funda o seu recurso, indicando o início e termo do(s) excerto(s) dos depoimentos das partes e/ou testemunhas que impõem essa solução diversa ou proceda à transcrição desse(s) excerto(s)”. In casu, impõe-se concluir que a recorrente não cumpriu o ónus de proceder à análise especificada dos factos, que impugnou em blocos e não cumpriu o consagrado na al. a) do n.º 2 daquele artigo, pois que nas conclusões se limitou a referir “depoimento de testemunhas” que, na sua perspetiva, impunham decisão diversa da proferida, sem sequer as mencionar e sem fazer a associação detalhada e especificada a cada facto e no corpo das alegações indicou, tão somente, o início e o fim de depoimentos de testemunhas (cf., desde logo, referências feitas no corpo das alegações com as referências feitas nas atas da audiência de julgamento à gravação do depoimento de cada testemunha), o que não cumpre, como acima sustentamos, o ónus enunciado no preceito anteriormente referido. Assim, analisado o corpo das alegações e as respetivas conclusões, verifica-se que a Recorrente, que impugna a decisão da matéria de facto, não deu cumprimento aos ónus impostos pelo artigo 640.º, nº 1, pois que não indica, especificadamente para cada facto, os elementos probatórios que conduziriam à alteração dos pontos da matéria de facto nos termos por ela propugnados e não indica as passagens da gravação em que funda o recurso (como imposto pelo nº 2, al. a) do citado normativo), pois que nada referindo nas conclusões, no corpo das alegações, quanto à pretendida “alteração da matéria de facto”, a Ré reporta-se aos depoimento das testemunhas, referindo apenas as horas de início e fim dos depoimentos prestados, citando partes dos depoimentos. Ora, como vimos, tal não basta para que se possa considerar cumprido aquele ónus, o que obsta ao conhecimento do objeto de recurso, pois que nesta 2ª Instância não se realiza novo julgamento sendo, tão só, de reapreciar os concretos meios probatórios relativamente aos pontos de facto impugnados. A falta de indicação por parte do apelante quer dos elementos probatórios que conduziriam à alteração dos pontos nos termos por ele propugnados, quer das passagens da gravação em que funda o recurso (nº 2 al. a) do citado normativo), situação que se verifica in casu, têm, como consequência, a imediata rejeição do recurso, na parte respeitante aos pontos da matéria de facto relativamente aos quais se verifica a omissão. Na esteira do que acima se deixou dito, perante a impugnação em bloco, com falta de indicação, especificada, de prova e da análise crítica da mesma e omissão pela recorrente do cumprimento do ónus estatuído no art. 640º, n.º 2, al. a), impõe-se rejeitar o recurso da matéria de facto interposto pela mesma. A indicação “com exatidão das passagens da gravação em que se funda” concretiza-se mencionando o minuto em que cada uma de tais “passagens” tem início. A “transcrição” das “passagens” não constitui uma alternativa à indicação “com exatidão das passagens da gravação” e esta indicação não se pode ter por feita quando somente se menciona a hora de início e do fim de cada depoimento (52) Assim, não obstante o NCPC proceder, como vimos, ao alargamento e reforço dos poderes da Relação no domínio da reapreciação da matéria de facto, deve ser rejeitado o recurso, no atinente a tal ponto, quando o recorrente não cumpra os ónus impostos pelos nº1 e 2, a), do art. 640º (53). Pelo exposto, por falta de observância do disposto no nº1 e 2 a), do art. 640º, do CPC, nos termos supra expostos, rejeita-se o recurso, na parte respeitante à reapreciação da matéria de facto, nenhuma alteração havendo a fazer à decisão da matéria de facto.*5ª- Da nova fundamentação jurídica Analisou o Tribunal a quo da verificação dos pressupostos da simulação relativamente aos, apelidados pelas partes, reconhecimento de obrigação pecuniária, acordo de pagamento e constituição de garantia, contrato de arrendamento com prazo certo para fins não habitacionais com fiança e cessão de posição contratual em contrato de trabalho e da invalidade do negócio celebrado entre elas, considerando, em face da matéria de facto provada que não mereceu alteração que“Prescreve o artigo 240º, nº 1 do Código Civil que “se, por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado”. E, no seu nº 2 “o negócio simulado é nulo”. “Exige este artigo três requisitos para que haja simulação: divergência entre a vontade real e a vontade declarada, o intuito de enganar terceiros e o acordo simulatório. (…). Pode existir simulação nos simples actos jurídicos (vide artigo 295º) e em negócios unilaterais (vide, quanto aos testamentos, o artigo 2200º). (…) Consagrando a nulidade do negócio simulado a lei quer dizer portanto: a) que a simulação pode ser invocada por qualquer interessado e ser oficiosamente declarada; b) que o vício do negócio pode ser arguido a todo o tempo, tanto por meio de acção como por via de excepção; c) que o vício não pode ser sanado, mediante confirmação da declaração” (54). Há que distinguir a simulação absoluta da simulação relativa. Na primeira, as partes fingem celebrar um negócio jurídico e na realidade não querem nenhum negócio jurídico. Há apenas o negócio simulado e, por detrás dele, nada mais. Na simulação relativa as partes fingem celebrar um certo negócio jurídico e na realidade querem um outro negócio jurídico de tipo ou conteúdo diverso. Por detrás do negócio simulado ou aparente ou fictício ou ostensivo há um negócio dissimulado ou real ou latente ou oculto (55). “I. Para que haja um negócio simulado é necessária a verificação simultânea de três requisitos: a intencionalidade da divergência entre a vontade e a declaração, o acordo simulatório (pactum simulationis) e o intuito de enganar terceiros, que não se deve confundir com o intuito de prejudicar. II. O ónus da prova de tais requisitos, porque constitutivos do respectivo direito, cabe, segundo as regras gerais nesta matéria, a quem invoca a simulação” (56). Em face do acervo factual dado por provado, deveremos concluir que apesar de as partes não terem querido realmente celebrar os acordos elencados, o que é certo, é que não logramos extrair daquele acervo factos ou circunstâncias que nos permitam afirmar ter havido um acordo simulatório. Com efeito, os factos demonstram-nos que a Autora deixou que fosse a Ré a conduzir os preparativos do negócio, em face da confiança que nela depositava, pelo que assinou os acordos sem uma prévia combinação e sem ter noção que podia enganar terceiros, designadamente, a Fazenda Nacional. Inexistem, pois, factos que nos permitam afirmar ter existido simulação, nos termos previstos no artigo 240º, do Código Civil, claudicando, por isso, o primeiro dos pedidos formulados pela Autora. No entanto, sendo certo que o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito – cfr. artigo 5º, nº 3, do Código de Processo Civil -, cumpre apreciar a matéria de facto dada por provada de molde a interpretar correctamente a vontade das partes. E interpretados tais factos parece-nos indubitável que as partes quiseram trespassar os três estabelecimentos em causa. Segundo Coutinho de Abreu, “o trespasse é definível como transmissão da propriedade de um estabelecimento por negócio entre vivos” (57). “O estabelecimento comercial é a estrutura material e jurídica integrante, em regra, de uma pluralidade de coisas corpóreas e incorpóreas – coisas móveis e ou imóveis, incluindo as próprias instalações, direitos de crédito, direitos reais e a própria clientela ou aviamento – organizados com vista à realização do respectivo fim, designado, na doutrina tradicional, de universalidade de direito. (…) A referida estrutura varia, como é natural, em função de circunstâncias diversas, desde logo em razão dos diversos ramos de actividade que operem. (…) Para que esta exista não é forçoso que estejam todos os elementos, bastando que se encontrem reunidos os elementos essenciais que individualizam e dão consistência ao estabelecimento - que seja reconhecível o núcleo essencial do estabelecimento mercantil, o qual traduz a sua capacidade lucrativa ou o seu aviamento. (…) Assim, o conjunto dos elementos de determinado estabelecimento comercial ou industrial, incluindo o humano, é variável ao longo do tempo, consoante a vontade do respectivo titular, segundo os seus interesses, em regra condicionados, além do mais, pela evolução da tendência de mercado, pelas necessidades de reestruturação, de especialização ou de economia de meios” (58). “Para se estar perante um trespasse é fundamental que se esteja, sem dúvida perante a transmissão do estabelecimento, mas nada obsta que não sejam transmitidos todos os elementos que o componham desde que, observado o transmitido, ainda se verifique claro que o que foi transferido para a esfera patrimonial do adquirente foi um conjunto de elementos organizado para a exploração de determinada actividade económica. Enfim, desde que, não obstante a retirada de um ou outro elemento que o compunham anteriormente, o objecto (conjunto de direitos e bens) transmitido ainda contenha a estrutura organizada destinada ao desenvolvimento daquela actividade económica, não há qualquer razão para afastar a sua transmissão do conceito de trespasse. (…) Exige-se que o objecto da transmissão se possa considerar um estabelecimento comercial (não teria qualquer sentido que a retirada de algum dos bens sem qualquer valor no conjunto impedisse que se considerasse o contrato de transmissão como trespasse, pelo que a pedra de toque tem que ser obtida no conceito central de estabelecimento comercial: se o que é transferido ainda é um estabelecimento comercial, mesmo que o mesmo esteja desfalcado de algum elemento que cumpre ainda preencher para o exercício da actividade, temos trespasse).” (59) No nosso caso, tendo presente a matéria de facto constante das alíneas g) a n), r) e s) e t) a z), do ponto II.1., podemos assumir uma inequívoca vontade das partes em querer transmitir os estabelecimentos comerciais referidos nas alíneas c) e d), do mesmo ponto, aliás, intenção que as partes acabaram por referir nos documentos referidos na alínea j), do mesmo ponto. O trespasse celebrado, e cujo pagamento do preço surge regulado nos referidos documentos mencionados na alínea j), do ponto II.1., surge coligado com o contrato de arrendamento com prazo certo para fins não habitacionais com fiança e com o contrato de cessão de posição contratual em contrato de trabalho, atento o fim unitário e conjunto que presidiu à celebração dos mesmos (60). Vício de forma? Nos termos do artigo 1112º, nº 3, do Código Civil, a transmissão do estabelecimento comercial deve ser celebrada por escrito (61). A inobservância da forma legal inquina o negócio de vício de forma, sendo as respectivas declarações negociais nulas – cf. artigo 220º, do Código Civil. A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal – cf. artigo 286º, do Código Civil. É, pois, dever do Tribunal declarar a nulidade do negócio de trespasse celebrado entre as partes. A declaração de nulidade afecta, inevitavelmente, os documentos referidos na alínea j), do ponto II.1., pois que os mesmos têm por objecto apenas um dos elementos do contrato de trespasse, a saber, o preço, não se retirando dos mesmos, formal e expressamente, o encontro de vontades necessário à assunção formal da validade do negócio. E tal declaração afecta, necessariamente, os contratos de arrendamento com prazo certo para fins não habitacionais com fiança e de cessão de posição contratual em contrato de trabalho porque coligados com o formalmente inválido contrato de trespasse. Com efeito, quer o contrato de arrendamento, quer a cessão, só foram celebrados por causa do trespasse, ligando todos eles uma interdependência funcional que preenche a figura da coligação de contratos. Nestes casos, entende-se, na impossibilidade de redução do negócio, nos termos do artigo 292º do Código Civil, atenta aquela interdependência, que a declaração de nulidade deve afectar toda a unitária composição de interesses, não tendo sentido fazer subsistir na ordem jurídica obrigações que ficaram sem objecto (62). Nos termos do disposto no artigo 289º, nº 1, do Código Civil, “tanto a declaração de nulidade como a anulação do negócio têm efeito retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente”. Portanto, as partes devem restituir reciprocamente o que prestaram. No entanto, tem sido entendido que o caso de contratos nulos que envolvem a concessão onerosa do gozo de coisas, porque o gozo não é passível de ser restituído, a contrapartida do gozo convencionada pelas partes deve ser retida por aquela que concede o gozo e como sucedâneo da impossível restituição do gozo da coisa por aquela que fruiu a coisa (63). Deste modo, a Autora está obrigada a restituir à Ré o arrendado mencionado em b) e os estabelecimentos comerciais mencionados nas alíneas c) e d), com todo os móveis e existências à data da celebração do trespasse, ou o respectivo valor à mesma data. E a Ré está obrigada a entregar à Autora todas as quantias recebidas, deduzidas do valor recebido a título de rendas pela ocupação do espaço mencionado em b). Quantias estas cujo apuramento se relega para execução de sentença, nos termos do disposto no artigo 609º, nº 2, do Código de Processo Civil. Em face da invalidade formal do negócio celebrado pelas partes, fica prejudicado o conhecimento do restante peticionado – cf. artigo 608º, nº 2, do Código de Processo Civil”. Dependendo o pedido de alteração do decidido na sentença proferida nos autos, no que à interpretação e aplicação do direito respeita, na sua totalidade, da procedência da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, a qual, porém, se mantém inalterada, fica necessariamente afastada nova subsunção jurídica, sendo de manter, pelas razões de direito expostas, a decisão do tribunal a quo, que bem qualificou o contrato celebrado entre as partes como trespasse, nulo por falta de forma e bem extraiu as consequências de tal vício de forma. Termos em que, improcede, na sua totalidade, a apelação em presença.*III. DECISÃO Pelos fundamentos expostos, os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em: a)- rejeitar o recurso de apelação interposto pela Autora por efetiva, real e absoluta falta de conclusões na alegação de recurso; b) rejeitar a impugnação de matéria de facto feita pela Ré e julgar improcedente o recurso de apelação por ela interposto.*Custas de cada um dos recursos pela respetiva apelante, pois que ficou vencida – art. 527º, nº1 e 2, do CPC.* Guimarães, 24 de janeiro de 2019 Assinado digitalmente pelos Senhores Juízes Desembargadores Eugénia Cunha, José Flores e Sandra Melo, a qual vota de vencida, apresentando a seguinte declaração de voto: Voto de vencida No presente caso, não rejeitaria o recurso interposto pela Autora, com fundamento na falta de conclusões, por força do princípio da colaboração, a preponderância da matéria sobre a forma, no âmbito dos deveres de gestão processual do Tribunal, atendendo ao disposto no artigo 6º, nº 2 do CPC, conforme aflorei no acórdão em que fui relatora, de 15/3/2018, proferido no processo 3226/15.9T8BRG.G1, publicado no portal dgsi.pt. Mais entendo que a questão deveria ser precedida da audição das partes, nos termos do artigo 655º nº 1 do CPC, porque o impõe o respeito do contraditório, princípio constitucional e enformador de um processo civil justo. Entendo, por outro lado, que, no presente caso, a admissão liminar, por ambas as instâncias, criou expetativas e, em consequência, a presente é uma decisão surpresa; se a rejeição fosse decidida na primeira instância, as partes sempre poderiam reclamar para este tribunal, o que implicaria a sua audição. Sandra Melo 1. Ac. da Relação do Porto de 23/4/2018, processo 6818/14.0YIPRT.P1, in dg si 2. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, O Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 2018, Almedina, pág767 3. Ibidem, pág. 767-768 4. Ac. do STJ de 5/4/2016, Processo 1407/09: Sumários, Abril/2016, p.5, citado in Abílio Neto, Novo Código de Processo Civil Anotado, 4ª Edição Revista e Ampliada, 2017, Ediforum, pág 997 5. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Idem, pág 768 6. Ibidem, pág 768 7. Ibidem, pág. 768, onde se refere que no Ac. do Trib. Const. Nº 536/2011concluiu-se pela não inconstitucionalidade da norma correspondente à al. b), do nº2, do art. 641º, quando interpretada no sentido de que a falta de conclusões determina logo a não apreciação do recurso, sem necessidade de prévia prolação de despacho de convite ao aperfeiçoamento. 8. cf. Acórdão do STJ de 9/7/2015, Processo 818/07.3TBAMD.L1.S1 (relator Abrantes Geraldes), in dgsi,net, relativamente ao qual se refere no Ac de 7/12/2016, processo 141/14.7T8SXL.L1-26, in dgsi “E, não se argumente com o que foi decidido no Ac. STJ de 09.07.2015 (Pº 818/07.3TBAMD.L1.S1), no qual se defendeu a prolação de um despacho de aperfeiçoamento, já que a questão aqui retractada não é igual à referida no aludido Acórdão, no qual se refere que nas conclusões se repetiu praticamente tudo o que se alegara na motivação.In casu, o corpo das alegações está totalmente reproduzido no que o apelante designa de conclusões, para além que, no citado acórdão do STJ, o convite ao aperfeiçoamento estará justificado por se tratar de um processo instaurado em data anterior a 01.01.2008, encontrando-se a aplicação da lei nova sujeita ao regime do artigo 3º da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho". 9. Ibidem 10. Cfr. Ac. do STJ de 13/10/2016, 5048/14.5TENT-A. E1. S1, in dgsi.net onde se decidiu do facto de as conclusões serem uma repetição das alegações do recurso não se pode retirar que aquelas conclusões não existem, mas apenas que não assumem a forma sintética legalmente imposta pelo art. 639º, nº1, do CPC. Perante tal irregularidade, deve o tribunal convidar o recorrente a aperfeiçoar as conclusões no sentido de proceder à sua sintetização, com respeito pelo objeto do recurso que ficou definido nas alegações originais, nos termos do nº3 do citado normativo. 11. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Idem, pág 768-769 12. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª edição, 2017, págs. 145-146 13. Acórdão do STJ de 18/6/2013, processo 483/08.0TBLNH.L1. S1, in dgsi.net 14. Acórdão do STJ de 13/7/2017, processo 6322/11.8TBLRA-A.C2. S1, in dgsi.net 15. cf. ainda Ac. do STJ, de 13-10-16, citado em nota de rodapé por António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª edição, 2017, págs. 148, “A repetição no recurso de revista das alegações e conclusões apresentadas no recurso de apelação deverá ser ultrapassada mediante despacho de aperfeiçoamento, não existindo fundamento legal para o despacho de rejeição imediato”. 16. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª edição, 2017, págs. 148 17. Acórdão do STJ de 26/5/2015, processo 1426/08.7TCSNT.L1. S1in dgsi.net 18. Ac. da Rel de Guimarães de 9/6/2016, processo 314698/11.1YIPRT.G1, in dgsi.net 19. Ac. da Rel de Lisboa de 7/12/2016, processo 141/14.7T8SXL.L1-2, in dg si 20. Acórdão da Relação do Porto de 24/1/2018 Processo 131/16.5T8MAI-A. P1(relator Madeira Pinto) in dgsi.net 21. cf., nesse sentido, inúmera jurisprudência de todas as Relações, designadamente o recente Ac. da Relação do Porto de 23/4/2018, processo 6818/14.0YIPRT.P1(relator Manuel Domingos Fernandes) onde muito bem se considerou “Há casos em que as alegações, sucintas e bem fundamentadas, valem como conclusões. O Tribunal assim o pode entender salvo se houver alguma razão justificada, invocada nas contra-alegações, que o não permita. Mas o contrário também se pode dar e infelizmente é caso frequente: a parte, sob a designação “conclusões”, reproduz integralmente a minuta. Se nada se conclui, só formalmente estamos diante de conclusões. A prática é a de, em benefício do direito ao recurso, considerar que estamos diante de conclusões, seguindo-se, assim, um critério estritamente formal. O critério estritamente formal vale, portanto, para se considerar a existência de conclusões e também a inexistência. No entanto, o rigor que o critério pode originar em determinados casos leva a que o Tribunal releve as conclusões que inequivocamente decorram da minuta ainda que não baptizadas pelo recorrente.” Mas também, para que se considere verificada a existência de conclusões, não será suficiente que o apelante nas suas alegações de recurso utilize a palavra “conclusões”, sendo ainda necessário que a mesma seja seguida de algo que, de algum modo, se assemelhe a um sintetizar das questões por si anteriormente expostas (ainda que deficientes, obscuras ou complexas). Ora, a referida reprodução integral do que está vertido no corpo das suas alegações de recurso, não pode ser considerada para o efeito do cumprimento do dever de apresentar conclusões. Do que se trata aqui não é de aferir da qualidade das conclusões, nomeadamente se as mesmas são mais extensas ou menos concisas do que podiam ou deviam ser, mas de determinar se as mesmas contêm em si aquele mínimo do qual se possa extrair que o recorrente, embora de modo deficiente, através delas tentou enunciar as questões a submeter ao conhecimento do tribunal de recurso. No caso em apreço, tal esforço é absolutamente inexistente, uma vez que a apelante nem sequer se deu ao trabalho de apagar a parte da sua motivação em que reproduz os excertos do depoimento de cada uma das testemunhas que invoca em favor da sua discordância com o decidido. (…) o despacho de aperfeiçoamento traduz um reflexo ou corolário do dever de cooperação, princípio estruturante do processo civil português. Mas esse dever de cooperação impõe a colaboração de todos os intervenientes processuais com vista a alcançar com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio, sendo certo que a lei não quis impasses e tergiversações, impondo no domínio dos ónus a cargo do recorrente um rigor e auto-responsabilidade por parte deste. Todavia, nesta situação tal convite não encontra justificação, já que, quem, sabendo da obrigação legal de apresentar conclusões, não se deu, sequer, ao trabalho de tentar sintetizar os fundamentos do seu recurso, optando pelo tal “copy/paste”: o convite ao aperfeiçoamento existe actualmente na nossa lei adjectiva, e só aí encontra a sua razão de ser, para aquelas situações em que parte, de facto, tentou efectuar uma síntese do que por si foi dito na motivação, mas em que a falta de clareza ou de outro vício que afecta a sua compreensibilidade num ponto ou noutro, ou até na sua totalidade. Mas se não há lugar a qualquer esforço de síntese, ainda que mínima ou com deficiências, não será o facto de o apelante a apelidar de “conclusões” que atribui tal natureza à reprodução do por si alegado na motivação. Como tem sido, de resto, sobejamente evidenciado pela jurisprudência do Tribunal Constitucional, quando estejam em causa normas que impõem ónus processuais às partes e em que a li prevê uma determinada cominação ou consequência processual para o incumprimento de tal ónus, as exigências decorrentes da garantia constitucional de acesso ao direito e à justiça, não afasta a liberdade de conformação do legislador não compatível com a imposição de ónus processuais às partes. E, como se alertou no recente aresto do mesmo Tribunal “o convite ao aperfeiçoamento de deficiências formais não pode ser instrumentalizado pelo respectivo destinatário, de forma a permitir-lhe, de modo enviesado, obter um novo prazo para, reformulando substancialmente a pretensão ou impugnação que optou por deduzir, obter um prazo processual adicional para alterar o objecto do pedido ou impugnação deduzida, só então cumprindo os ónus que a lei de processo justificadamente coloca a seu cargo”, Acs. RL de 15.02.2013, processo 827/09.3PDAMD.L1-5, de 21.03.2013, processo 14217/02.0TDLSB-AM. L1-9, de 17/3/2016, processo 459/15.1T8MTA-L1-2, de 17/3/2016, Processo 147733/14.4YIPRT.L1-2, de 12.10.2016, processo 1607/15.7YRLSB-4, de 7/12/2016, processo 141/14.7T8SXL.L1-2, Acs. R.C. de 05.05.2015, processo 568/11.6TBCN.C1, de 10.11.2015, processo 158/11.3TBSJP.C1, de 14/3/2017, processo 6322/11.8TBLRA-A.C2, Acs da Rel de Évora de 29/9/2016, processo 1358/15.2T8VFX.E1, acessíveis em www.dgsi.pt. 22. Ac. da Rel. de Lisboa de 17/3/2016, Processo 147733/14.4YIPRT.L1-2.dgsi.net 23. Ac. do STJ de 1/12/2015, Processo 324/09.1TBSRT.C2.S1.dgsi.net 24. Ac. do STJ de 18/6/13, processo 483/08.0TBLNH.L1. S1, in dg si 25. António Santos Abrantes Geraldes, Idem, págs. 148 26. O ónus de concluir nas alegações de recurso em processo civil DESEMBARGADOR DOUTOR JOÃO AVEIRO PEREIRA acessível no site http://www.trl.mj.pt/PDF/Joao%20Aveiro.pdf consultado no dia 10.11.2018 27. António Santos Abrantes Geraldes, Idem, pág 169 28. Ibidem, pág 171 29. Ibidem, pág 171 30. Ibidem, pág 232 31. cf., Ac. da Rel. De Coimbra de 14/9/2006, Processo 1557/06.dgsi.net, citado in Abílio Neto, Novo Código de Processo Civil Anotado, 4ª Edição, 2017, Ediforum, pág. 1018, onde se decidiu que A decisão que admite o recurso não vincula o Tribunal superior e, como é também jurisprudência uniforme e pacífica, como o despacho do Relator não constitui caso julgado formal, já que tal despacho, sendo provisório, visa apenas assegurar o prosseguimento do processo para ulterior sujeição/apreciação do coletivo de juízes. 32. cf. ainda Ac. do STJ de 21/10/2014, Processo 417/06, Sumários, Outubro /2014, p.71, citado in Abílio Neto ob cit, pág 1019, Não tendo os recorrentes junto ao requerimento de interposição de recurso as suas alegações (o mesmo se passando com as conclusões), justifica-se a não admissão do recurso, solução que não contende com o direito a um processo equitativo nem viola o princípio da proporcionalidade. 33. cf. Ac do STJ de 24/2/2015, processo 116/14.dgsi.net, onde se decidiu que “A decisão surpresa faz supor que a parte possa ser apanhada em falta por uma decisão que embora pudesse ser juridicamente possível, não esteja prevista nem tivesse sido por si configurada”. 34. cf. o decidido nos dois citados recentes Acórdãos da Relação do Porto 35. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª Edição, págs. 155-156 36. Ac. STJ. de 14/02/2012, Proc. 6823/09.3TBRG.G1. S1, in base de dados da DGSI. 37. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª Edição, 2017, pag. 153 38. Ibidem, pág. 153. 39. Ibidem, págs. 155 e seg. e 159 40. Ac. da Relação do Porto de 18/12/2013, Processo 7571/11.4TBMAI.P1.dgsi.Net 41. Abrantes Geraldes, idem, págs. 155-156 42. cf. Acórdãos de 18/11/2008, Proc. 08A3406; de 15/09/2011, Proc. 1079/07.0TVPRT.P. S1; de 04/03/2015, Proc. 2180/09.0TTLSB.L1. S2; de 01/10/2015, Proc. 824/11.3TTLSB. L1. S1; de 26/11/2015, Proc. 291/12.4TTLRA.C1; de 03/03/2016, Proc. 861/13.3TTVIS.C1. S1; 11/02/2016; Proc. 157/12.8TUGMR.G1. S1, de 12/5/2016: Processo 324/10.9TTALM.L1: S1; de 31/5/2016: Processo 1184/10.5TTMTS.P1: S1, todos in dgsi.net 43. cf. Acs. do STJ de 27/10/2016, Processo 110/08.6TTGM.P2. S1 e Processo 3176/11.8TBBCL.G1. S1, in dgsi.net 44. Abrantes Geraldes, in ob. cit., págs. 160 e sgs. 45. Ac. do STJ de 3/5/2016, Processo 17482/13: Sumários, Maio/2016, p 2 46. Ac. da Relação de Lisboa de 13/3/2014, Processo 569/12.dgsi.net citado in Abílio Neto, Código de Processo Civil anotado, 4ª Ed. 2017, Ediforum, Edições Jurídicas, Lda. pag 999 47. Ac. da Relação de Guimarães de 3/3/2016, Processo 283/08 e de 4/2/2016: Processo 283/08.8TBCHV.A. G1, ambos in dgsi.net 48. cf. Ac. da Relação de Évora de 3/11/2016, processo 1070/13. dgsi.net 49. Ac. Do STJ de 3/5/2016, Processo 145/11, Sumários, Maio/2016, p.3 50. Ac. STJ. 29/10/2015, Proc. n.º 233/09.4TBVNG.G1. S1, in base de dados. 51. Base de dados da DGSI, pronunciando o Ac. STJ, de 29/10/2015, Proc. 233/09.4TBVNG.G1. S1, 52. cf. Ac. Da Relação de Guimarães de 30/1/2014, Processo 273733/11.1YIPRT.G1. e Ac. Da Relação de Coimbra de 24/2/2015, Processo 145/12.4TBPBL.C1, in dgsi.Net 53. Ac. da Relação do Porto de 18/12/2013, Processo 7571/11.4TBMAI.P1.dgsi.Net 54. cf. Pires Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, volume I, 4ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, Limitada, 1987, página 227. 55. cf. Carlos Alberto da Mota Pinto, in Teoria Geral do Direito Civil, Coimbra Editora, limitada, 3ª edição actualizada, 1990, páginas 471 e seguintes. 56. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09-05-2002, JSTJ00000417, in www.dgsi.pt. 57. Curso de Direito Comercial, Vol. I, 4ª Ed., Almedina, 2003, p. 279. 58. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.10.2013, relatado por Bettencourt de Faria, in www.dgsi.pt. 59. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 14.06.2018, relatado por Sandra Melo, in www.dgsi.pt. 60. cf., neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.02.1999, relatado por Quirino Soares, in www.dgsi.pt. 61. cf., neste sentido, Ricardo Costa e Carolina Cunha, A Simplificação Formal do Trespasse de Estabelecimento Comercial e o Novo Regime do Arrendamento Urbano, Almedina, 2006, em especial ponto 3., e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12.05.2011, relatado por João Bernardo, in www.dgsi.pt. 62. cf., neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03.02.1999, relatado por Quirino Soares, in www.dgsi.pt. 63. cf., neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.10.2002, relatado por Eduardo Baptista, e Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12.09.2016, relatado por Carlos Gil, in www.dgsi.pt.