Acórdão na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório1. BB, CC, esta por si e juntamente com DD em representação do seu filho menor EE, intentaram a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário contra FF e o Fundo de Garantia Automóvel, pedindo a condenação solidária dos RR. a pagar: a) À A. BB a quantia de 44.404,31 € acrescida de juros de mora a contar à taxa legal de 4% ao ano, desde a data de citação e até integral pagamento; b) À A. CC a quantia de 142.214,04 € acrescida de juros de mora a contar à taxa legal de 4% ao ano, desde a data de citação e até integral pagamento; c) Aos AA. CC e DD, na qualidade de pais e representantes legais do menor EE a quantia de 75.000,00 € acrescida de juros de mora a contar à taxa legal de 4% ao ano, desde a data de citação e até integral pagamento; d) À A. CC o custo da intervenção cirúrgica que esta ainda em consequência das lesões que sofreu com o acidente em causa terá de ser submetida; e) Aos AA. CC e DD, na qualidade de pais e representantes legais do menor EE uma indemnização pelas eventuais sequelas que ainda se venham a revelar no menor em consequência do acidente, remetendo-se para decisão ulterior a fixação do respectivo quantum indemnizatório; Tudo com a dedução, no que ao R. Fundo de Garantia Automóvel respeita, da franquia de 299,28 €. 2. Para tanto, alegaram, em síntese, que: - no dia no dia 17 de Dezembro de 2002, pelas 16h00, ocorreu um acidente de viação na E.N. 10 no sentido Setúbal Azeitão, num local denominado Alto das Necessidades, em que foram intervenientes o veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula 00-00-LB propriedade e conduzido pela A. BB e onde seguiam como passageiros CC e o filho menor desta, EE e o veículo ligeiro de passageiros de matrícula 00-00-RG propriedade e conduzido pela R. FF, que não tinha à data seguro automóvel de responsabilidade civil válido; - o acidente ocorreu porque o veículo RG, ao qual a condutora imprimia uma velocidade excessiva para o local, se despistou, ultrapassando o traço contínuo e invadindo a faixa de rodagem de sentido contrário, onde seguia o veículo LB; e - do acidente resultaram danos materiais no veículo da A. e danos na integridade física de todos os ocupantes do veículo LB. Em consequência: A A. BB, enfermeira, exercendo funções no Hospital Pulido valente e no Hospital da Cruz Vermelha, em Lisboa, reclama as diferenças salariais que deixou de auferir por se encontrar de baixa médica em consequência do acidente e indemnização pela perda do vestuário que trazia na altura do acidente, pela perda do veículo, pelo aluguer de um carro de substituição, pela despesa que suportou com o reboque do veículo sinistrado, pelas dores, angústias traumas e desgastes sofridos. A A. CC reclama indemnização por ferimentos, pela destruição de vestuário e da cadeira de bebé, por despesas médicas e medicamentosas, por diferenças salariais que deixou de auferir em consequência da baixa médica, que se prolongou por cinco meses e meio, o que também acarretou um prejuízo na sua progressão na carreira; por despesas decorrentes da situação de doença e incapacidade, pelas sequelas das lesões sofridas, por despesas com a prática de natação e intervenção cirúrgica a realizar no futuro; e por dano estético e de afirmação pessoal, dores, incómodos, preocupações, angústias e clausura hospitalar. Quanto ao menor EE peticiona-se uma indemnização pelas lesões e trauma que sofreu decorrente do acidente. 3. Citados os RR., contestou o FGA, alegando ter já efectuado diversos pagamentos a entidades hospitalares em virtude do acidente dos autos, cuja dinâmica aceita. Impugna alguns factos por não serem factos pessoais não sabendo se são reais ou verdadeiros e invoca que a A. CC recebeu da Segurança Social um subsídio diário no período de 12/3/2003 a 6/8/2003, desconhecendo qual o seu vencimento líquido mensal. Impugna ainda despesas e quanto a sequelas das lesões alega que deverá proceder-se a nova avaliação médica. Quanto à indemnização por danos morais impugna os valores peticionados por excessivos. A R. FF aceita a dinâmica do acidente e, quanto ao facto de não dispor de seguro, alega que tal deveu-se a atraso no pagamento do prémio de seguro. Impugna a restante matéria por desconhecer tais factos, considerando os montantes peticionados exagerados. 4. Foi proferido despacho de aperfeiçoamento da petição inicial, como consta de fls. 88, tendo os AA. apresentado o articulado de fls. 90 a 92. Deu-se cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 1º do Decreto-Lei n.º 59/89 de 22/2. Designou-se data para realização de audiência preliminar, onde foi tentada a conciliação das partes, sem sucesso, após o que foi proferido despacho saneador e seleccionou-se a matéria de facto, que não sofreu reclamação. 5. Instruído o processo e efectuada a perícia médico-legal requerida, procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, findo a qual se respondeu à matéria da Base Instrutória, como consta da acta de fls. 457 e segs., que não sofreu reclamação. Após, veio a ser proferida a sentença (ref.11755464), que consta de fls. 476 a 527, que, julgando parcialmente procedente a acção, condenou os RR. a pagar, solidariamente, com dedução da franquia de € 299,28 quanto ao R. FGA, por lesado: - À A. BB a quantia global de € 2.134,91 a título de indemnização por danos patrimoniais e a quantia de € 19.500,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais; - À A. CC a quantia global de € 25.572,80 € a título de indemnização por danos patrimoniais e a quantia de € 40.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais, bem como na quantia que se vier a apurar em liquidação de sentença correspondente aos custos da intervenção cirúrgica a que foi submetida em 28/2/2008 à perna. - Ao A. EE a quantia global de 15.000,00 € a título de indemnização por danos não patrimoniais. Mais se decidiu que todas estas quantias serão acrescidas de juros de mora, calculados à taxa legal de 4% anuais, desde 8/7/2004 e até efectivo e integral pagamento, absolvendo-se os RR. do demais peticionado. 6. Inconformado recorreu o Fundo de Garantia Automóvel, com os seguintes fundamentos [segue transcrição das conclusões do recurso]: 1.ª Vem o presente recurso de apelação interposto da douta sentença de fls__, decisão com a qual não se conforma o FGA. Porquanto, 2.ª II – Relativamente ao montante Indemnizatório atribuído à A BB, o douto Tribunal a quo condenou os RR. a pagar à A. BB, os valores seguintes: a) 2.134,91 Euros, a título de danos patrimoniais; b) 19.500,00 Euros, a título de danos não patrimoniais, assim distribuídos: - Pelas suas dores e 10 dias de doença: 2.500,00 Euros; - Pelos danos de terceiros correspondentes aos arts. 25.º a 31.º da base instrutória: 15.000 Euros; - Pela privação do uso do veículo: 2.000,00 Euros. 3.ª O FGA aceita os valores atribuídos a título de danos patrimoniais (2.134,91 Euros), a que, conforme sentença se deve reduzir a franquia de 299,28 Euros. 4.ª Já não são aceitáveis os valores atribuídos a título de danos não patrimoniais, porquanto, a A. BB, como provado está, teve apenas um período de doença de 18/12/2002 a 27/12/2002, correspondente a 10 dias; a A. BB não foi sujeita a exame pericial, não alegou quaisquer sequelas permanentes, nem danos estético, nem o seu quantum doloris foi valorizado em sede de qualquer perícia, o que significa que ficou absolutamente curada das pequenas lesões que terá sofrido. 5.ª As suas pequenas dores não são valorizáveis em sede indemnizatória e muito menos à razão diária de 250,00 Euros. 6.ª Se extrapolarmos para um ano de pequenas dores, o valor diário atribuído pelo Tribunal a quo, teríamos num ano, a quantia de 91.250,00 Euros. 7.ª Sendo a equidade a justiça do caso concreto, não pode a mesma ser livre arbítrio do julgador, devendo conter-se nos limites dos casos análogos e com extrema razoabilidade, sob pena de ser o Tribunal a favorecer o enriquecimento sem causa. 8.ª As dores da A. BB não podem ser valoradas em mais do que 500,00 Euros. 9.ª Atribuiu o douto Tribunal a quo, à mesma A. BB, uma indemnização de 15.000,00 Euros, que se funda nos factos da base instrutória, julgados provados de 25.º a 31.º. 10.ª Ora, entrar em pânico por julgar que a irmã e o sobrinho recém-nascido haviam morrido, viver momentos de desespero por isso, ficar perturbadíssima com as consequências para eles resultantes do acidente, ficar amargurada por a produção do acidente ter ocorrido com o seu carro, ficar incomodada e perturbada no seu dia a dia, pela memória do acidente, por isso com trauma psicológico, má disposição, irritação e angústia, tudo derivado das lesões sofridas por terceiros que são sua irmã CC e seu sobrinho EE, não são danos valorizáveis e que mereçam a tutela do Direito. 11.ª A A. BB apenas poderá ser indemnizada pelas suas próprias dores físicas, que já foram tratadas supra e nunca pelas consequências do acidente face a terceiros por si transportados, por mais fortes que sejam os laços. 12.ª Não encontramos qualquer fundamento de Direito, nem na douta sentença, nem no Direito constituído que justifique qualquer indemnização pelos danos que estão descritos nos arts. 25.º a 31.º da base instrutória, nem no art. 495.º, nem no art. 496.º, ambos do C.Civil. 13.ª Os terceiros que têm indemnização, nos termos do n.º 2 do art. 495.º, são aqueles que socorreram o lesado, os estabelecimentos hospitalares, médicos ou outras pessoas ou entidades que tenham contribuído para o tratamento ou assistência da vítima. 14.ª Como se disse supra, também não se enquadram esses danos no n.º 1 do art. 496.º, porque não sendo danos decorrentes das suas próprias lesões corporais, a simples dor pelas dores de terceiro não se enquadram e não merecem a tutela do Direito. 15.ª Existe, pois violação grosseira na sentença do disposto nos arts. 495.º e 496.º do C. Civil na atribuição à A. BB da quantia de 15.000,00 Euros, da qual devem os RR. ser absolvidos. 16.ª Essa indemnização de 15.000,00 Euros não está juridicamente fundamentada na sentença, o que configura a nulidade prevista no art. 668.º, n.º 1 al. b) do C.P.C., nem o poderia estar, pois não há, no direito constituído, norma que o suporte. 17.ª Falta ainda tratar, quanto à A. BB, da questão da indemnização de 2.000,00 Euros, atribuída pela privação do uso do veículo. 18.ª Está provado no art. 12.º da base instrutória que o veículo que a A. BB conduzia ficou danificado, sendo a reparação do mesmo inviável e ainda (art. 14.º da base instrutória) que os salvados do veículo foram vendidos por 350,00 Euros. 19.ª Só poderia haver lugar a indemnização por privação do uso se o veículo fosse reparável e, apenas durante o período que mediasse entre a comunicação ao FGA e ao prazo provável da reparação. 20.ª Sabendo a A. que o veículo era irreparável e tendo vendido os respectivos salvados, ela própria teria que ter arranjado uma solução mais rápida, não sendo imputável a qualquer terceiro a privação de uso de um veículo em estado de sucata. Não é devida qualquer indemnização a título de privação do uso do veículo. 21.ª Relativamente ao montante Indemnizatório atribuído à A CC, a douta sentença condena os RR. a pagar à A. CC a quantia de 25.572,80 a título de danos patrimoniais e a quantia de 40.000,00 Euros a título de danos não patrimoniais. Procuraremos demonstrar, salvo o devido respeito, a irrazoabilidade das indemnizações atribuídas a esta A. 22.ª O FGA conforma-se com a quantia de 572,80 Euros, atribuída a título de danos patrimoniais resultante de lesões em coisas, a que haverá que deduzir a franquia legal de 299,28 Euros. 23.ª Quanto à quantia de 25.000,00 Euros, de pretensa perda de capacidade de ganho, nota-se na douta sentença, e mais uma vez salvo o devido respeito, alguma confusão. 24.ª Se atentarmos na fundamentação de fls. 46 da douta sentença, verificamos que o julgador começa por fixar um valor patrimonial de 12.852,00 Euros (4.º parágrafo), para depois acrescer, com base no dano estético e no seu suposto condicionamento para o exercício da actividade, chegar a uma indemnização por equidade de 25.000,00 Euros “pelo dano biológico, traduzido na perda de ganho”, o que parece uma contradição nos seus próprios termos. 25.ª Não podemos olvidar que, aquando do acidente, a A. trabalhava na empresa GG – Gestão Hoteleira, SA, conforme resposta ao quesito 57, auferindo o vencimento mensal de 822,27 Euros. 26.ª Também não podemos olvidar a resposta ao quesito 61, indicando que, à data da entrada da acção em juízo, a A. CC trabalhava para a HH Tours, auferindo o vencimento mensal de 900,00 Euros e que, actualmente trabalha no JJ em Setúbal. 27.ª O facto de, aquando da entrada da petição inicial, ou seja, 2 anos após o acidente, a A. auferir vencimento mensal superior ao auferido na data do sinistro é demonstração cabal de que não houve qualquer perda da capacidade de ganho, pois, quando a petição inicial entrou em juízo, já a A. tinha consolidadas as suas lesões (o relatório pericial indica como data de consolidação das lesões a data de 05/06/2003), o que reforça a ideia – força de que o seu dano estético e os 3 pontos de défice funcional permanente não tiveram nem significam qualquer perda da capacidade de ganho. Razão pela qual, 28.ª Os 25.000,00 Euros atribuídos a esse título não são devidos, pois tal consubstanciaria enriquecimento sem causa, em violação do art. 473.º do C. Civil. 29.ª No 3.º parágrafo de fls. 46 da douta sentença, o julgador não atendeu ao vencimento na data do sinistro, fazendo uma média anómala entre o vencimento dessa data e o vencimento posterior, inclusive tomando por base o salário ilíquido, quando o art. 64.º, n.º 7 do D.L. 291/2007 de 21/08 dispõe que “O Tribunal deve basear-se nos rendimentos líquidos auferidos na data do acidente”, norma que a douta sentença violou. 30.ª É certo que se conhece a querela entre a aplicação ou não da tabela constante da Portaria n.º 679/2009 de 25/06, que alterou a Portaria n.º 377/2008. No entanto, o legislador entendeu adequada a aplicação desses valores, não apenas para efeitos extrajudiciais, mas como forma de salvaguardar uma aplicação semelhante em todos os tribunais, atendendo à evidente disparidade que temos notada na mais diversa jurisprudência, em relação a casos análogos. 31.ª O legislador da Portaria de Proposta Razoável, entendeu, com base em pareceres médico-legais, que uma incapacidade igual ou inferior a 10%, se não for absolutamente incapacitante do exercício da profissão habitual, não tem repercussão na capacidade de ganho. 32.ª Por essa razão, e atendendo à situação concreta da A. CC, que está plasmada nas conclusões do Relatório médico-legal e que foi vertido na resposta à matéria de facto, teremos: - período de repercussão temporária na actividade profissional total: 202 dias; - quantum doloris, grau 4, num escala crescente de 7. - défice funcional permanente de 3 pontos, compatíveis com exercício da actividade habitual, mas implicando esforços suplementares; - danos estético de grau 3, numa escala crescente de 7; - 18 dias de internamento hospitalar. 33.ª Atendo-nos a esta situação, teremos uma indemnização global devida à A. CC, já incluídos os danos patrimoniais de 572,80 Euros, no valor de 8.569,94 Euros, a que haverá que deduzir a franquia legal de 299,28 Euros, relativamente aos danos em coisas. 34.ª Se o julgador seguisse outro caminho, como parece que seguiu, não só não poderia fixar por equidade o dano patrimonial futuro, como haveria de ter corrigido um conjunto de pressupostos: 35.ª Para um salário ilíquido à data do sinistro de 822,27 Euros, e considerando um dependente, de acordo com a tabela de retenção na fonte do IRS para o ano de 2002, a A. CC haveria de descontar 8,5% de IRS e ainda 11% de taxa social única, num total mensal de descontos de 160,34 Euros. 36.ª Significa isto que o seu vencimento líquido mensal à data do sinistro era de 661,92 Euros. E, não sendo nenhum de nós matemático, tanto mais que fomos estudar Direito, a verdade é que, se o Tribunal pretendia considerar contra a decisão do legislador, uma perda de capacidade de ganho para 3% de IPP, então, o que se continua a dizer sem conceder ou transigir, poderia lançar mão da velha fórmula constante do Acórdão da Relação de Coimbra de 04/04/1995, in CJ II, pág. 23, ou utilizar o programa de cálculo, disponível em www.verbojuridico.net, o que daria um total de capital a pagar a título de dano patrimonial futuro de 7.267,45 Euros. 37.ª Reafirmamos que continuamos sem entender o salto lógico do pensamento do julgador do Tribunal a quo, entre o 4.º parágrafo de fls. 46 da douta sentença e o 5.º e 6.º, não só porque o dano estético é um dano moral, autonomizado pelo legislador na Portaria supra citada, como o mesmo volta a ser valorizado na sentença ora posta em crise, o que constitui uma clamorosa contradição. 38.ª Para além desse alegado dano patrimonial de 25.000,00 Euros, pela perda de capacidade de ganho, o Tribunal veio considerar que os danos não patrimoniais da A. CC deveriam ser valorados em 40.000,00 Euros. 39.ª Com um quantum doloris de 4/7, um dano estético de 3/7 e uma IPP de 3 pontos, ao atribuir danos não patrimoniais no valor de 40.000,00, quanto é que este Tribunal atribuiria a alguém que tivesse 20, 30 ou 40% de incapacidade? Ou se a A. tivesse falecido? 40.ª Para valores de dano da perda de vida de 60.000,00 é flagrantemente injusto, é absolutamente violador do art. 473.º do C. Civil, a atribuição dessa indemnização a título de dano moral. 41.ª Como dissemos supra, a indemnização total de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais a que a A. CC tem direito cifra-se na quantia de 8.569,94 Euros, devendo ser o FGA absolvido do restante que foi atribuído a esta A. 42.ª Relativamente ao montante Indemnizatório atribuído ao A. EE, este A. teve um período de doença de 43 dias, sendo 7 dias défice funcional temporário total e 36 de défice funcional temporário parcial, tendo-lhe sido atribuído um quantum doloris de grau 3 numa escala crescente de 7, sem qualquer indicação de dano estético e com expressa indicação de ausência de défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, tudo conforme as conclusões do Relatório médico legal de fls._, que foram tomadas em conta na decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo. 43.ª O menor EE teve um internamento hospitalar do dia 17/12 a 23/12, e, portanto, tirando esse período que já está considerado no período total de doença, não ficou com quaisquer sequelas do acidente, nem se encontra provado que venha a ter quaisquer sequelas no futuro. 44.ª É absolutamente constatável o exagero e a irrazoabilidade da indemnização de 15.000,00 Euros que lhe foi atribuída, o que mais uma vez, viola o art. 473.º do C. Civil, pois constitui elevado enriquecimento sem causa. 45.ª A ser valorada, para efeitos indemnizatórios, a situação sofrida pelo menor EE, não deve a indemnização exceder o montante de 1.500,00 Euros, sob pena de subverter completamente o equilíbrio que deve existir entre as indemnizações arbitradas pelos mais diversos Tribunais. 46.ª Mais uma vez se pergunta, sem qualquer ponta de ironia e com total respeito pela vida humana, quanto atribuiria este Tribunal a título de perda da vida, no caso de uma criança da mesma idade? Face ao que supra se deixou dito, não deve ser atribuída ao menor indemnização superior a 1.500,00 Euros. 47.ª A douta sentença condena ainda o FGA no pagamento aos AA. de juros, contados desde 08/07/2004 (data da citação), condenação com que se não conforma o FGA. 48.ª O douto Tribunal violou o Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 4/2002, pois tendo atribuído quantias tão exorbitantes ainda assim entendeu fixar o dies a quo em 08/07/2004 e não na data da sentença como deveria. 49.ª Sendo o pedido dos AA. no valor total de 261.618,35 Euros, sendo que o pedido da A. CC ascendia a 142.214,04 Euros, o pedido da A. BB, no valor de 44.404,31 Euros e o pedido do menor EE, no valor de 75.000,00 Euros, e tendo sido fixadas indemnizações inferiores a esse montante, tal significa que o Juiz tinha valor do pedido suficiente para actualizar o valor das indemnizações por danos não patrimoniais, nos termos do art. 566.º, n.º 2 do C.Civil. 50.ª Nos termos do supra referido Acórdão: “Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do artigo 566.º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artigos 805.º, n.º 3 (interpretado restritivamente), e 806.º, n.º 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação.” 51.ª Em obediência ao Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 4/2002, de 09-05-2002, publicado no Diário da República, I Série -A, n.º 146, de 27-06-2002, os juros relativos à indemnização pelos danos não patrimoniais devem contar-se apenas, desde a data da prolação da decisão, e não desde 08/07/2004.7. Não se mostram juntas contra-alegações. O recurso foi recebido como apelação, com subida imediata e efeito meramente devolutivo. Colhidos os vistos legais, cumpre agora apreciar e decidir.* II – Objecto do recursoO objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 660.º, n.º 2, 684.º, n.º3 e 685º-A, nº1, todos do Código de Processo Civil [redacção vigente à data da decisão recorrida, anterior à Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho]. Considerando o teor das conclusões apresentadas, importa decidir as seguintes questões: (i) Da nulidade da sentença; (ii) Da fixação dos montantes indemnizatórios atribuídos a cada um dos AA.; e (iii) Dos juros moratórios.* III – FundamentaçãoA) - Os Factos Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos, que não são impugnados no recurso:A) No dia 17 de Dezembro de 2002, cerca das 16.00 horas, a Autora BB conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros de marca FIAT, modelo Punto 55 SX, com a matrícula 00-00-LB, pela E.N. nº 10, no sentido Setúbal-Azeitão, num local denominado Alto das Necessidades B) No veículo com a matrícula 00-00-LB, para além da Autora BB, que conduzia, seguiam ainda como passageiros a Autora CC, sua irmã, e o filho menor desta, EE, que tinha ao tempo um mês e meio de idade. C) O veículo 00-00-LB conduzido pela BB, havia descrito uma curva à esquerda e iniciava uma descida. D) No local, a estrada encontrava-se dividida por um traço contínuo, separado a parte da faixa de rodagem destinada a cada um dos sentidos de trânsito. E) A Autora BB conduzia o veículo 00-00-LB na sua mão, pelo lado direito da faixa de rodagem, na via de trânsito reservada aos veículos que seguiam na direcção Setúbal - Azeitão. F) Nesse mesmo local, mas em sentido contrário, circulava um outro veículo automóvel ligeiro de passageiros, de marca RENAULT, modelo Megane, com a matrícula 00-00-RG conduzido pela ré FF. G) No momento em que os dois veículos se cruzavam, o veículo 00-00-RG despistou-se, ultrapassou o traço contínuo e invadiu a faixa de rodagem destinada ao trânsito em sentido contrário, por onde seguia o veículo 00-00-LB. H) O embate deu-se entre a frente do veículo 00-00-RG e a frente do lado esquerdo do veículo conduzido pela Autora BB. I) A ré FF circulava com o veículo 00-00-RG sem que a responsabilidade civil decorrente da sua circulação se mostrasse coberta por qualquer seguro. J) Do embate entre os dois veículos, resultaram para a Autora BB os seguintes ferimentos: escoriações nos membros superiores, na face, em ambos os joelhos e no pé esquerdo, tendo sido assistida no Hospital de São Bernardo, em Setúbal, para onde foi transportada. K) Pelo facto de não ter podido trabalhar durante os dez dias de baixa, a Autora BB deixou de auferir do Hospital Pulido Valente a quantia de € 56,17 (cinquenta e seis euros e dezassete cêntimos), correspondente ao desconto de uma sexta parte do vencimento durante dez dias, e de € 24,43 (vinte e quatro euros e quarenta e três cêntimos), de subsídio de alimentação, num total de € 80,60 (oitenta euros e sessenta cêntimos). L) Por não ter podido prestar serviços ao Hospital da Cruz Vermelha, a Autora BB deixou de auferir a quantia de € 263,56 (duzentos e sessenta e três euros e cinquenta e seis cêntimos), correspondente a uma terça parte do que recebia mensalmente. M) A Autora BB pagou à KK, da recolha do veículo 00-00-LB, a quantia de € 642,60 (seiscentos e quarenta e dois euros e sessenta cêntimos). * 1º) A Autora BB seguia atenta à condução e ao tráfego. 2º) Conduzindo o seu veículo a uma velocidade de cerca de 60km/h. 3º) A Autora BB ainda guinou o veículo que conduzia para a sua direita, mas não lhe foi possível evitar o embate. 4º) O acidente ocorreu por a ré circular com o seu veículo 00-00-RG a uma velocidade que não lhe permitiu controlar o veículo. 5º) A R. não conseguiu controlar a sua viatura. 6º) A Ré seguiu ao volante do veículo 00-00-RG com uma taxa de álcool no sangue de 1,12g/l. 7º) Em consequência dos ferimentos que sofreu e dos tratamentos a que teve de ser submetida, a Autora BB esteve ausente do trabalho por motivo de doença de 18/12/2002 a 27/12/2002. 8º) A Autora BB é enfermeira, exercendo funções no Hospital Pulido Valente, em Lisboa, como enfermeira graduada. 9º) E no hospital da Cruz Vermelha, também em Lisboa, como enfermeira prestadora de serviços em regime de meio horário. 10º) Devido ao impacto do choque, a camisola que a Autora BB envergava na altura do acidente rasgou-se e ficou sem uso. 11º) Sendo o valor dessa camisola de € 100,00 (cem euros. 12º) Ainda em consequência do embate, o veículo automóvel que a Autora BB conduzia ficou danificado sendo a reparação do mesmo inviável. 13º) Os salvados do veículo foram vendidos por € 350,00. 14º) A Autora BB utilizava o veículo 00-00-LB para se deslocar para os seus locais de trabalho. 15º) Ao ficar sem poder dispor do seu veículo, a Autora BB viu-se obrigada a alugar um outro veículo, de características semelhantes ao seu, para o substituir. 16º) A Autora BB pagou à LL, pelo aluguer de um veículo no período de 6/01/2003 a 5/02/2003, a quantia de € 1.048,15 (mil e quarenta e oito euros e quinze cêntimos). 17º) Após o acidente, o veículo da Autora BB foi removido para as oficinas da KK, em Setúbal, onde ficou a aguardar que fossem feitas as perícias necessárias para determinar se era ou não viável a sua reparação, tendo aí permanecido, durante dezoito dias. 18º) A Autora BB sofreu dores muito fortes com os ferimentos causados pelo acidente. 19º) E bem assim, com os tratamentos que lhe foram ministrados no Hospital de São Bernardo, em Setúbal. 20º) Durante os dias que se seguiram ao acidente, a Autora BB sentiu dores intensas em todo o corpo. 21º) Que a impediam de se movimentar com à-vontade e lhe causavam mau estar. 22º) A autora BB ficou com uma ferida no peito, provocada pela fricção do conto de segurança e com nódoas negras nessa região e joelhos. 23º) O que muito a incomodou. 24º) Logo após o acidente, a Autora BB entrou em pânico por ter julgado que a irmã e o sobrinho recém-nascido haviam morrido. 25º) Até se aperceber de que, afinal a irmã e o sobrinho não tinham morrido, a Autora BB viveu momentos de autêntico desespero e horror, como nunca tinha sentido na vida. 26º) Mesmo depois de saber a irmã e o sobrinho livres de perigo, a Autora BB ficou perturbadíssima com as consequências para eles resultantes das lesões sofridas com o acidente. 27º) A Autora BB ficou amargurada pela produção do acidente ter ocorrido com o seu carro. 28º) Ainda hoje, a memória do acidente e dos momentos que se seguiram não larga a Autora BB, incomodando-a, perturbando o seu dia-a-dia, angustiando-a e retirando-lhe conforto e bem estar psicológico. 29º) A autora BB era uma pessoa ligeira e bem disposta. 30º) Passou a ter, em resultado do trauma psicológico sofrido com o acidente, comportamentos de má disposição, irritação e angústia, que antes não se verificavam. 31º) A Autora BB só veio a comprar um carro novo em data indeterminada de Junho de 2003. 32º) De Fevereiro a Junho de 2003, inclusive, a Autora BB teve de utilizar os transportes públicos nas suas deslocações para os locais de trabalho, ao contrário do que sucedia anteriormente em que se deslocava sempre em veículo próprio. 33º) A Autora BB vivia, no período em questão (Fevereiro a Junho de 2003), em Setúbal. 34º) No Hospital de Pulido Valente, a Autora BB trabalhava por turnos rotativos, podendo entrar ao serviço às 8.00 horas e sair às 16.00 horas, ou entrar às 16.00 horas e sair às 23.00 horas. 35º) No Hospital da Cruz Vermelha, a Autora BB trabalhava igualmente por turnos rotativos, podendo entrar ao serviço às 8.00 horas e sair às 16.00 horas, ou entrar às 16.00 horas e sair às 23.00 horas. 36º) No período de Fevereiro a Junho de 2003, a Autora BB encontrava-se a frequentar o Curso de Complemento de Formação em Enfermagem, no Instituto Português de Oncologia, na Palhavã, em Lisboa, com aulas às 3ªs, 4ªs, 5ªs e 6ªs feiras, das 17,00 horas às 21.00 horas. 37º) No período de Fevereiro a Junho de 2003 a A. BB encontrava-se a frequentar o Curso de Complemento de Formação em Enfermagem, no Instituto Português de Oncologia, na Palhavã, em Lisboa, pelo menos três dias por semana, das 17h às 21h. 38º) Por ter de se deslocar em transportes públicos, a Autora BB passou a levar muito mais tempo nas deslocações que tinha de fazer. 39º) O que implicou que tivesse muito menos tempo para repousar. 40º) As deslocações que a Autora BB passou a ter de fazer em transportes públicos, mormente de Setúbal para Lisboa e de Lisboa para Setúbal, tornaram-se muito mais cansativas do que quando viajava em veículo próprio. 41º) A Autora BB estava sempre preocupada com a possibilidade de qualquer atraso que a impedisse de estar à hora ao serviço ou às aulas. 42º) A Autora BB sofreu, de Fevereiro a Junho de 2003, com a privação de veículo próprio, um desgaste físico e psicológico muito acentuado. 43º) Em consequência do acidente em causa a A. CC sofreu traumatismo craniano com perda de conhecimento e fractura cominutiva do terço proximal da tíbia direita. 44º) Tendo sido conduzida para o Hospital de São Bernardo, em Setúbal, onde ficou internada até 19/12/2002, tendo sido posteriormente transferida para o Hospital do Outão, onde permaneceu internada até 3/01/2003. 45º) A Autora CC foi submetida no Hospital do Outão a uma intervenção cirúrgica à perna direita no dia 20/12/2002. 46º) Mais tarde, em 18/11/2003, a Autora CC voltou a ser submetida a nova intervenção cirúrgica no Hospital do Outão. 47º) Devido ao impacto do choque, ficou completamente destruída a roupa que a Autora CC trazia vestida; um par de calças no valor de € 100,00 (cem euros); uma camisola de lã, no valor de € 80,00 (oitenta euros); um soutien (próprio para mães que estão a amamentar os filhos) no valor de € 50.00 (cinquenta euros) e um casaco, no valor de € 150,00 (cento e cinquenta euros). 48º) A cadeira de bebé em que seguia o menor ficou destruída, tendo sido necessário comprar outra que custou € 135,00 (cento e trinta e cinco euros). 49º) Após o período de internamento hospitalar, a Autora CC continuou a ser assistida no Hospital do Outão para tratamento das lesões sofridas com o acidente. 50º) De taxas moderadoras referentes a consultas médicas no Hospital do Outão nos dias 9/1/2003 e 5/6/2003 a A. CC pagou, cada dia, a quantia de 4,75 €, e no dia 7/8/2003 pagou a quantia de 3 €. 51º) No dia 6/11/2003 a A. CC pagou de taxas moderadoras no Hospital do Outão, por consulta e exame as quantias de 4,10 € e 1,20 €, respectivamente. 52º) Em medicamentos para tratamento das lesões sofridas com o acidente a mãe da A. CC pagou em 30/1/2003 a quantia de 39,01 €. 53º) Após ter recebido alta do primeiro período de internamento hospitalar, a A. CC teve de se socorrer, de um andarilho articulado para se movimentar, que a sua mãe adquiriu, no valor de 47,00 €. 54º) Quando pôde dispensar o andarilho, a A. CC teve de se socorrer de um par de canadianas articuladas com punho macio, que a sua mãe adquiriu no valor de 13,96 €. 55º) A A. CC efectuou tratamentos de fisioterapia na Clínica da Santa Casa da Misericórdia de Setúbal (que o R. Fundo de Garantia Automóvel pagou), tendo recorrido a uma consulta de fisiatria na mesma instituição, no dia 28/3/2003, pela qual pagou a quantia de 40,00 €. 56º) A A. CC foi funcionária da empresa GG – Gestão Hoteleira, SA de Dezembro de 1997 a Dezembro de 2002 com o vencimento mensal de 822,27 €. 57º) O filho de CC nasceu no dia 25/10/2002. 58º) A partir de 12/3/2003 a A. CC esteve de baixa por doença até 6/8/2003, em consequência das lesões sofridas com o acidente. 59º) A A. CC esteve com baixa por doença durante o período de 12/3/2003 a 6/8/2003, tendo recebido o subsídio diário de 18,64 €, no total de 2.702,80 €. 60º) A A. CC Trigueiros, à data da entrada da acção em juízo, trabalhava para a HH Tours, auferindo o vencimento mensal de 900,00 €, encontrando-se actualmente a trabalhar para o JJ, Setúbal. 61º) Durante o período inicial de internamento hospitalar e mesmo depois, quando mal se podia movimentar, a Autora CC deixou de poder tomar conta de si própria, de sua casa e do seu filho menor. 62º) A Autora CC teve de recorrer a familiares, sobretudo à sua mãe, para assegurar essas tarefas. 63º) A mãe da Autora CC teve de deixar o seu próprio trabalho para poder acorrer à filha e ao neto, deslocando-se diariamente vezes ao Hospital durante o período de internamento hospitalar e a casa da própria Autora quando esta recebeu alta hospitalar. 64º) A mãe da Autora CC exerce funções no Hospital de São Bernardo, em Setúbal, trabalhando em regime de turnos. 65º) Para acorrer à filha e ao neto, a mãe da A. CC pediu licença para assistência à família e findo esse período a marcar férias. 66º) Em resultado do sucedido, a mãe da Autora CC ficou sem qualquer descanso durante o período de férias, que passou a cuidar da filha e do neto. 67º) Perdeu, por trabalhar em regime de turnos, subsídio que receberia se tivesse trabalhado, mormente durante o período em que pediu dispensa do serviço para assistência à família. 68º) A Autora CC, vendo o sacrifício e as despesas que a mãe fez durante este período, comprometeu-se a compensá-la com a quantia de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros). 69º) Mesmo após a segunda intervenção cirúrgica a que foi submetida e depois de ter sido dada como consolidada a sua situação clínica, a Autora CC não ficou completamente restabelecida. 70º) A Autora CC, em resultado das lesões que sofreu com o acidente e ao contrário do que anteriormente sucedia, ficou a coxear da perna direita. 71º) Tem dores quando sujeita a referida perna direita a qualquer tipo de esforço. 72º) Não se consegue apoiar na perna direita quando tem de ficar algum tempo de pé. 73º) Agravando-se todas estas situações quando se verifica qualquer mudança de tempo. 74º) A A. CC sofreu: · Défice funcional temporário total entre 17/12/2002 e 3/1/2003 ao qual acrescem mais dois dias em que lhe foi retirado o material de osteossíntese em 18/11/2003 e em 28/2/2008, num total de 19 dias; · Défice Funcional Temporário Parcial entre 4/1/2003 e 5/6/2003; de 19/11/2003 a 3/1272003 e 29/2/2008 a 15/3/2008, num total de 181 dias; · Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-psíquica fixável em 3 pontos. 75º) A Autora CC submeteu-se, em 28/2/2008, por indicação médica, a nova intervenção cirúrgica à perna. 76º) A Autora CC sempre deu muita importância à sua aparência, gostando de se apresentar sempre muito bem arranjada e atraente. 77º) A Autora CC sempre cuidou do seu corpo com todo o cuidado e atenção. 78º) Na profissão de gestora hoteleira, a aparência física constitui um factor de valorização no desempenho de determinadas tarefas, mormente de atendimento ao público. 79º) Na sua profissão, a Autora CC sempre se sentiu muito segura na área das relações públicas, por saber ser a sua aparência muito agradável, o que a levava a sentir-se confiante em si própria, revelando o maior à - vontade no trabalho. 80º) Em resultado das lesões que sofreu e das intervenções cirúrgicas a que teve de ser submetida, a A. CC, para além de ter passado a coxear, ficou com uma cicatriz no couro cabeludo da região parietal esquerda, arciforme de concavidade posterior com 10 cm; Cicatriz na região nasogeniana, a cerca de 0,5 cm acima da comissura labial direita, linear, oblíqua para a direita e muito ligeiramente para baixo com 1,4 cm; Vestígio cicatriz na região geniana anterior, cerca da linha média, oblíqua para baixo e para a esquerda com 1,7 cm; cicatriz, muito ligeiramente hipertófica, na região mandibular esquerda, oblíqua para baixo e para a esquerda com 1,3 cm; cicatriz com marcas de sutura nas faces anteriores do joelho e terço superior da perna direita, hipopigmentada, vertical com 15 cm x 1,5 cm de largura máxima; duas cicatrizes na face Antero-interna do terço superior da perna direita, hipopigmentadas, verticais, sensivelmente verticais com cerca de 17 cm cada; cicatriz na face anterior do terço superior da perna direita, hipopigmentada, vertical com 2,2 cm; cicatriz vestigial na face anterior do terço médio da perna direita, de contornos irregulares e eixo maior oblíquo para baixo e ligeiramente para a direita com 4cm x 1cm de largura máxima; cicatriz na face antero-interna do terço inferior da perna direita, hipopigmentada, vertical com 2,5cm x 0,3 cm de largura máxima. 81º) A Autora CC passou, no seu dia-a-dia a comportar-se com menos naturalidade e menos confiança, por se sentir diminuída com as sequelas bem visíveis das lesões que sofreu. 82º) O que perturba o seu relacionamento com as outras pessoas e prejudica o seu desempenho profissional. 83º) A Autora CC deixou de ir à praia, de sair à noite e de conviver com amigos. 84º) Ao contrário do que sucedia anteriormente. 85º) A Autora CC sofre um grande desgosto por se ver esteticamente desvalorizada, sendo o dano estético permanente quantificável em 3/7. 86º) Com os graves ferimentos que sofreu em consequência do embate entre os dois veículos, a Autora CC sofreu dores muito intensas, sendo o quantum doloris quantificável em 5/7. 87º) Durante todo o período de internamento hospitalar, com os tratamentos que lhe foram ministrados, nos períodos pós operatórios e durante as sessões de fisioterapia a Autora CC sofreu igualmente dores muito intensas. 88º) A Autora CC, ao verificar que o seu filho de apenas um mês e meio de idade se encontrava ferido em consequência do acidente, entrou em pânico, temerosa de que o menor morresse ou ficasse incapacitado. 89º) O menor EE sofreu um défice funcional temporário total entre 17/12/2002 e 23/12/2002, num total de 7 dias e um défice Funcional temporário Parcial entre 24/12/2002 e 28/1/2003 num total de 36 dias, sem défice funcional permanente da integridade físico-psíquica. 90º) A Autora CC vive permanentemente angustiada com a possibilidade de se vir a revelar no menor EE qualquer sequela das lesões sofridas. 91º) Após o acidente, a Autora CC ficou seis dias sem poder ver o seu filho, muito angustiada com o estado de saúde deste. 92º) A Autora CC viveu no hospital momentos de desespero, ao pensar que o filho poderia morrer. 93º) Ainda em consequência das lesões sofridas com o acidente, a Autora CC deixou de poder amamentar o seu filho, como estava a fazer até aí. 94º) O que lhe causou um enorme desgosto. 95º) A Autora CC tornou-se uma pessoa sombria e triste. 96º) Quando era antes ligeira, optimista e despreocupada. 97º) A Autora CC, passou as quadras do Natal e Ano Novo sob internamento hospitalar, ficou privada do convívio, da festa e da celebração que caracterizam esses dias, o que lhe provocou contrariedade, desgosto e amargura. 98º) Em consequência do acidente o menor EE sofreu traumatismo crânio encefálico e pielonefrite aguda, tendo sido assistido no Hospital S. Bernardo em Setúbal. 99º) Atenta a gravidade do seu estado de saúdo o menor EE foi transferido, no próprio dia do acidente, para o Hospital de Santa Maria, em Lisboa onde permaneceu internado até 23/12/2002. 100º) O menor EE recebeu alta hospitalar em 23/12/2002 continuando medicado com Cefuroxime axetil até 28/12/2002. 101º) Durante o período de internamento hospitalar o menor EE foi submetido a uma transfusão de concentrado de eritrócitos devido à fractura parietal direita com hematoma epicraneano volumoso, responsável por queda do valor de hemoglobina (8,72 g). 102º) O menor EE sofreu dores muito intensas com a violência do embate e com os tratamentos que lhe ministraram sendo o quantum doloris fixável em 3/7. 103º) O menor EE sofreu com a separação da mãe. * Nos termos do art.º 659º, n.º 3 do Código de ProcessoCivil: a) A A. CC nasceu no dia 2 de Junho de 1974 (certidão de nascimento de fls. 105 dos autos). *B) – O Direito 1. Da nulidade da sentença A propósito da fixação na sentença da indemnização à Autora BB na quantia de € 15.000,00, a título de danos não patrimoniais, pelos padecimentos sofridos pela A. quando se apercebeu do estado em que se encontravam os seus familiares (irmã e sobrinho, pensando que tinham morrido no acidente), pelas perturbações que lhe trazem a memória do acidente e pelo trauma psicológico, o Recorrente, alegando existir “grosseira violação” dos artigos 495º e 496º do Código Civil, invoca que a sentença enferma da nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 668º do Código de Processo Civil, no caso por falta de fundamentação jurídica. Como resulta claro dos termos em que a questão é colocada, não se trata de um caso de falta de fundamentação jurídica da decisão, mas antes uma divergência quanto à valoração das lesões sofridas pela Autora em sede das normas legais aplicáveis e dos critérios jurisprudências tidos por relevantes na matéria, pois, o Recorrente, ao contrário do julgador, entende que tais lesões não merecem a tutela do direito. Basta uma simples leitura da sentença para, com facilidade, se apreenderem quais os critérios legais utilizados pelo julgador na valoração dos danos não patrimoniais em causa. Improcede, pois a arguida nulidade da sentença. 2. Como resulta das alegações e, concretamente, das conclusões do recurso, este tem apenas por objecto o montante das indemnizações atribuído na sentença a cada um dos autores, porquanto o recorrente – Fundo de Garantia Automóvel – não questiona que, face à factualidade provada, a R., condutora do veículo “RG”, foi a única responsável pela produção do acidente de viação em causa nos autos, estando reunidos os pressupostos legais da responsabilidade civil extracontratual, e que, por circular sem seguro válido ou eficaz, compete ao Fundo de Garantia Automóvel o ressarcimento das indemnizações devidas, nos termos do artigo 21º, n.º 1 e 2, alínea a), do Decreto-Lei n.º 522/85, na redacção do Decreto-Lei n.º 122-A/86, de 30 de Maio, e do Decreto-Lei n.º 130/94, de 19 de Maio, em vigor à data dos factos (cf., actualmente, os artigos 48º, n.º 1, e 49º, n.º 1, alíneas a) e b), do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto). Cumpre assim apurar se se mostra correctamente fixada a quantificação do montante indemnizatório devido a cada um dos autores, na parte questionada no recurso, tendo em conta a factualidade provada e os critérios legais previstos para a reparação dos danos sofridos, tendo igualmente em conta a jurisprudência existente nesta matéria. 3. Da indemnização devida A. BB 3.1. Quanto a esta A. atribuiu-se na sentença a quantia de € 2.134,91, a título de indemnização por danos patrimoniais, e € 19.500, a título de danos não patrimoniais. No que se reporta aos primeiros, englobou-se naquele montante as despesas efectuadas com a recolha do veículo sinistrado, o valor de bens pessoais inutilizados no acidente, montantes salariais não auferidos e descontos efectuados por via da baixa médica, e ainda o valor de € 1.048,15, pelas despesas suportadas com o aluguer de um veículo semelhante ao seu, que ficou destruído no acidente, no período compreendido entre 06/01/2003 e 05/02/2003, necessário para se deslocar para os locais onde trabalhava. Em relação aos danos não patrimoniais, o valor arbitrado resulta da soma da quantia de € 2.500 referente às lesões corporais sofridas no acidente, € 15.000 devidos pelo sofrimento da A. pela situação dos seus familiares acidentados no veículo que conduzia e pelas angústias sofridas, e € 2.000 a título de privação do uso do veículo. O recorrente aceita o valor atribuído na sentença quanto aos danos patrimoniais, apenas questionando o quanto indemnizatório a título de danos não patrimoniais. 3.2. Começa o recorrente por discordar do valor de € 2.500 pelas lesões e sofrimentos causados à A. BBem consequência do acidente, invocando a este respeito que apenas teve 10 dias de baixa, não foi sujeita a exame pericial, não alegou sequelas permanentes, não foi valorizado em sede de perícia o seu quantum doloris, e que ficou curada das lesões sofridas, concluindo que as pequenas dores da A. não são valorizáveis em sede indemnização, aceitando, no entanto, o valor de € 500. É certo que, nos termos do n.º 1 do artigo 496º, só relevam os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, “mereçam tutela do direito”. Porém, tal não significa que os danos apurados em relação a esta A., ainda que de menor gravidade, careçam de relevância jurídica. Como salientam Pires de Lima-Antunes Varela, (Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª ed., pág. 499) “[a] gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada), e “[o]s simples incómodos ou contrariedades não justificam a indemnização por danos não patrimoniais (cf. os acórdãos do STJ, de 12 de Outubro de 1973 e de 18 de Novembro de 1975, respectivamente no BMJ n.º 230, págs. 107 e segs. e n.º 251, págs. 148 e segs.)”. Ora, no caso em apreço apurou-se com relevância que: · Do embate entre os dois veículos, resultaram para a Autora BB os seguintes ferimentos: escoriações nos membros superiores, na face, em ambos os joelhos e no pé esquerdo, tendo sido assistida no Hospital de São Bernardo, em Setúbal, para onde foi transportada; a Autora BB sofreu dores muito fortes com os ferimentos causados pelo acidente e bem assim, com os tratamentos que lhe foram ministrados no Hospital de São Bernardo, em Setúbal. · Durante os dias que se seguiram ao acidente, a Autora BB sentiu dores intensas em todo o corpo, que a impediam de se movimentar com à-vontade e lhe causavam mau estar. · A autora BB ficou com uma ferida no peito, provocada pela fricção do conto de segurança e com nódoas negras nessa região e joelhos, o que muito a incomodou. Contrariamente ao defendido pela recorrente não estão aqui em causa danos que devam ser desconsiderados de tutela jurídica, pois, embora as lesões sofridas não tenham deixado sequelas, implicaram sofrimento para a A., traduzido nas “dores muito fortes” que sofreu com o acidente e com os tratamentos efectuados, que implicaram 10 dias de baixa, bem como pelas dores intensas que sentiu em todo o corpo nos dias seguintes ao acidente, e demais incómodos. Face a esta matéria factual a qual não foi impugnada, não se nos afigura desajustada, mas antes adequada, a indemnização fixada de € 2.500 fixada na sentença. 3.3. Insurge-se ainda o recorrente pelo facto de ter sido fixada indemnização, no caso de € 15.000, por danos não patrimoniais decorrentes dos sofrimentos padecidos pela A. quando se apercebeu do estado em que se encontravam os seus familiares (irmã e sobrinho), pensando que tinham morrido no acidente, pelas perturbações que lhe trazem a memória do acidente e pelo trauma psicológico que lhe trazem as lesões por estes sofridas, alegando que são lesões sofridas por terceiros, e que não são danos valorizáveis e que mereçam a tutela do direito, concluindo que a A. só pode ser indemnizável pelas suas próprias dores físicas e nunca pelas consequências do acidente face a terceiros por si, por mais fortes que sejam os laços. Porém, não tem razão o recorrente, porquanto não está em causa a atribuição de indemnização por danos de terceiros e a mesma tem fundamento no n.º 1 do artigo 496º do Código Civil. Efectivamente, deste preceito não resulta que sejam apenas indemnizáveis a título de danos não patrimoniais os decorrentes de lesões corporais sofridas pelo próprio, nele também cabem os danos psicológicos sofridos pelo próprio, como é o caso, em consequência de lesões e sofrimentos causados a terceiros próximos, designadamente familiares, ainda mais quando essas lesões decorrem de acto (o acidente) em que o reclamante da indemnização foi interveniente (ainda que sem culpa). Os factos em causa, a demandar indemnização, são os constantes dos artigos 24.º a 30.º do elenco dos factos provados, dos quais resulta que: · Logo após o acidente, a Autora BB entrou em pânico por ter julgado que a irmã e o sobrinho recém-nascido haviam morrido e até se aperceber de que, afinal a irmã e o sobrinho não tinham morrido, a Autora BB viveu momentos de autêntico desespero e horror, como nunca tinha sentido na vida. · Mesmo depois de saber a irmã e o sobrinho livres de perigo, a Autora BB ficou perturbadíssima com as consequências para eles resultantes das lesões sofridas com o acidente. · A Autora BB ficou amargurada pela produção do acidente ter ocorrido com o seu carro. · Ainda hoje, a memória do acidente e dos momentos que se seguiram não larga a Autora BB, incomodando-a, perturbando o seu dia-a-dia, angustiando-a e retirando-lhe conforto e bem estar psicológico. · A autora BB era uma pessoa ligeira e bem disposta e passou a ter, em resultado do trauma psicológico sofrido com o acidente, comportamentos de má disposição, irritação e angústia, que antes não se verificavam. Esta situação não traduz um caso de pequena gravidade que desmereça a tutela do direito. Repare-se que no veículo conduzido pela A. seguiam a sua irmã e sobrinho, a primeira que, além do mais, sofreu traumatismo craniano com perda de conhecimento e fractura da tíbia direita, e o menor, que também sofreu ferimentos, ainda não tinha 2 meses de idade. Neste contexto, parece-nos aceitável que a A. tenha entrado em pânico e vivido momentos de desespero e horror, o que lhe causou sofrimentos, e que tenha ficado traumatizada e viva angustiada com as memórias do acidente, bem como tenha passado a ter comportamentos de má disposição, irritação e angústia, que antes não tinha. Aliás tais factos não foram impugnados. Assim, tais danos psicológicos sofridos pela A. em consequência do acidente não podem deixar de ser valorizáveis e quantificáveis, à luz do previsto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 496º do Código Civil, afigurando-se-nos, no entanto, que o montante fixado é exagerado, devendo, por isso, ser reduzido para metade, ou seja, € 7.500. 3.4. Discorda também o recorrente do facto de se ter atribuído à Autora indemnização pela privação do uso do veículo entre Fevereiro e Junho de 2003, no montante de € 2.000, argumentando que só haveria lugar a indemnização por privação de uso se o veículo fosse reparável, o que não era o caso, pois a reparação era inviável, e apenas pelo tempo que mediasse entre a comunicação ao FGA e o prazo provável da reparação. Daqui decorre que o fundamento da impugnação da indemnização não reside na discordância do valor atribuído, mas antes no facto de se entender que, pura e simplesmente, nas circunstâncias do caso não há lugar a indemnização. Porém, com o devido respeito, a posição do recorrente não é de acolher, pois não se concebe que em caso de perda total do veículo o lesado não possa ser indemnizado pelo tempo decorrido entre a comunicação ao FGA e o pagamento do valor do veículo, ou na falta deste pagamento, como sucedeu os autos, até ao momento em que possa adquirir um veículo em substituição do anterior. Se assim fosse, estrar-se-ia a premiar o devedor, que apesar de retardar o pagamento, não indemnizava pelos prejuízos causados. Em conclusão, há lugar à indemnização pela privação de uso de veículo, não só no caso em que o lesado está privado daquele uso enquanto não ocorre a reparação do mesmo, como na situação de perda total do veículo, enquanto o responsável pelo ressarcimento dos danos não pague o valor do bem destruído ou, na falta deste pagamento, pelo tempo razoável para que o lesado possa adquirir um veículo em substituição do anterior. Ora, independentemente da posição que se tenha quanto à problemática dos pressupostos necessários ao ressarcimento da “privação de uso”, designadamente saber se basta a simples alegação dessa privação ou se é essencial que se aleguem e provem factos concretos de onde resultem os prejuízos causados por essa privação, no caso dos autos, como resulta da matéria de facto provada, tal discussão é inócua, posto que a Autora alegou e demonstrou que teve prejuízos com a privação do uso do veículo. A necessidade da Autora no uso do veículo e os transtornos que a falta do mesmo lhe causaram estão bem evidenciados nos factos provados, constantes dos pontos 31.º a 42.º, de onde resulta que: · A Autora BB só veio a comprar um carro novo em data indeterminada de Junho de 2003. · De Fevereiro a Junho de 2003, inclusive, a Autora BB teve de utilizar os transportes públicos nas suas deslocações para os locais de trabalho, ao contrário do que sucedia anteriormente em que se deslocava sempre em veículo próprio. · Por ter de se deslocar em transportes públicos, a Autora BB passou a levar muito mais tempo nas deslocações que tinha de fazer. · O que implicou que tivesse muito menos tempo para repousar. · As deslocações que a Autora BB passou a ter de fazer em transportes públicos, mormente de Setúbal para Lisboa e de Lisboa para Setúbal, tornaram-se muito mais cansativas do que quando viajava em veículo próprio. · A Autora BB estava sempre preocupada com a possibilidade de qualquer atraso que a impedisse de estar à hora ao serviço ou às aulas. · A Autora BB sofreu, de Fevereiro a Junho de 2003, com a privação de veículo próprio, um desgaste físico e psicológico muito acentuado. Deste modo, é devida e mostra-se adequadamente fixada a indemnização pela privação do uso do veículo em € 2.000. 3.5. Deste modo, fixa-se a indemnização global devida à Autora BB, a título de danos não patrimoniais na quantia de € 12.000,00. 4. Da indemnização devida à A. CC 4.1. Na sentença recorrida atribuiu-se à Autora CC a quantia global de € 25.572,80 a título de danos patrimoniais e a quantia de € 40.000 a título de indemnização por danos não patrimoniais, bem como a quantia que se vier a apurar em liquidação de sentença correspondente aos custos da intervenção cirúrgica a que foi submetida em 28/02/2008 à perna. Quanto aos danos patrimoniais o montante apurado de € 25.572,80, inclui a quantia de € 572,80, correspondente aos bens destruídos no acidente, às taxas moderadoras pagas e consulta de fisiatria, e o valor de € 25.000,00, “pelo dano biológico, traduzido na perda de ganho”, sendo que neste valor se integra a quantia de € 12.852,00 por frustração de ganho em função da incapacidade funcional permanente de 3%, e o restante por dano estético, com repercussão na vida profissional futura da A.. No que se reporta aos danos não patrimoniais, consideraram-se as lesões sofridas, dores e angustia da A., bem como o dano estético, na vertente da sua repercussão na vida social e de lazer da A.. 4.2. Quanto aos danos patrimoniais, o Recorrente aceita a quantia de € 572,80 atribuída pelo valor das coisas destruídas ou danificadas no acidente, mas contesta o montante de € 25.000,00 atribuído pela perda da capacidade de ganho, argumentando que não houve perda de capacidade de ganho e questionando a forma de cálculo, bem como a existência de dano estético relevante. 4.3. A este respeito releva a seguinte factualidade dada como provada: · Em consequência do acidente em causa a A. CC sofreu traumatismo craniano com perda de conhecimento e fractura cominutiva do terço proximal da tíbia direita. · A A. CC sofreu: - Défice funcional temporário total entre 17/12/2002 e 3/1/2003 ao qual acrescem mais dois dias em que lhe foi retirado o material de osteossíntese em 18/11/2003 e em 28/2/2008, num total de 19 dias; - Défice Funcional Temporário Parcial entre 4/1/2003 e 5/6/2003; de 19/11/2003 a 3/12/2003 e 29/2/2008 a 15/3/2008, num total de 181 dias; - Défice Funcional Permanente da Integridade Fisico-Psíquica fixável em 3 pontos. · Na profissão de gestora hoteleira, a aparência física constitui um factor de valorização no desempenho de determinadas tarefas, mormente de atendimento ao público. · Na sua profissão, a Autora CC sempre se sentiu muito segura na área das relações públicas, por saber ser a sua aparência muito agradável, o que a levava a sentir-se confiante em si própria, revelando o maior à - vontade no trabalho. · Em resultado das lesões que sofreu e das intervenções cirúrgicas a que teve de ser submetida, a A. CC T, para além de ter passado a coxear, ficou com uma cicatriz no couro cabeludo da região parietal esquerda, arciforme de concavidade posterior com 10 cm; Cicatriz na região nasogeniana, a cerca de 0,5 cm acima da comissura labial direita, linear, oblíqua para a direita e muito ligeiramente para baixo com 1,4 cm; Vestígio cicatriz na região geniana anterior, cerca da linha média, oblíqua para baixo e para a esquerda com 1,7 cm; cicatriz, muito ligeiramente hipertófica, na região mandibular esquerda, oblíqua para baixo e para a esquerda com 1,3 cm; cicatriz com marcas de sutura nas faces anteriores do joelho e terço superior da perna direita, hipopigmentada, vertical com 15 cm x 1,5 cm de largura máxima; duas cicatrizes na face Antero-interna do terço superior da perna direita, hipopigmentadas, verticais, sensivelmente verticais com cerca de 17 cm cada; cicatriz na face anterior do terço superior da perna direita, hipopigmentada, vertical com 2,2 cm; cicatriz vestigial na face anterior do terço médio da perna direita, de contornos irregulares e eixo maior oblíquo para baixo e ligeiramente para a direita com 4cm x 1cm de largura máxima; cicatriz na face antero-interna do terço inferior da perna direita, hipopigmentada, vertical com 2,5cm x 0,3 cm de largura máxima, sendo o dano estético permanente quantificável em 3/7. · A Autora CC passou, no seu dia-a-dia a comportar-se com menos naturalidade e menos confiança, por se sentir diminuída com as sequelas bem visíveis das lesões que sofreu. · O que perturba o seu relacionamento com as outras pessoas e prejudica o seu desempenho profissional. Tal como se decidiu na sentença e ao contrário do propugnado pelo Recorrente, entendemos que esta factualidade sustenta a atribuição de uma indemnização pelo dano biológico sofrido, traduzido na perda da capacidade de ganho da lesada, incluindo-se nesta o dano estético com repercussão no desempenho da actividade profissional. 4.4. Como bem nos dá conta a sentença (que cita diversos arestos do Supremo Tribunal de Justiça, que nos dispensamos de referir, e para onde remetemos), a questão do dano biológico vem sendo de há algum tempo tratada na jurisprudência e doutrina, quer na vertente do respectivo enquadramento jurídico quer na da sua ressarcibilidade, retirando-se a conclusão de que o chamado dano biológico tanto pode ser ressarcido como dano patrimonial, como compensado a título de dano moral, tendo a situação que ser apreciada casuisticamente, verificando-se se a lesão originou, no futuro, durante o período activo do lesado ou da vida e, só por si, uma perda da capacidade de ganho ou se traduz, apenas, uma afectação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, para além do agravamento natural resultante da idade (cf. neste sentido, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17/05/2011 – Proc. n.º <a href="https://acordao.pt/decisoes/143881" target="_blank">7449/05.0TBVFR.P1</a>.S1 -, disponível como os demais citado sem outra referência em: www.dgsi.pt). Como dano de natureza autónoma e específica por envolver prioritariamente uma afectação da saúde e plena integridade física do lesado, a sua compensação, como se afirma, por exemplo, no Acórdão do Supremo Tribunal de 11/11/2010 (proc. n.º 270/04.5 TBOFR.C1.S1) “(…) tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades exercício de uma profissão e de futura mudança ou reconversão de emprego pelo lesado, enquanto fonte actual de possíveis e eventuais acréscimos patrimoniais, frustrada irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar, quer da acrescida penosidade e esforço no exercício da sua actividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas. Na verdade, a perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediatamente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira «capitis deminutio» num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe, de forma relevante e substancial, as possibilidades exercício profissional e de escolha de profissão, eliminando ou restringindo seriamente qualquer mudança ou reconversão de emprego e, nessa medida, o leque de oportunidades profissionais à sua disposição, erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuros lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais.” Tal indemnização tem plena autonomia relativamente à compensação pelos danos não patrimoniais sofridos e visa reparar a perda de capacidade de trabalho e de ganho, tal que, conforme prescreve o artigo 562.º do Código Civil, se reconstitua a situação patrimonial que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, e a circunstância de não se ter demonstrado que, no imediato, a Autora tivesse sofrido qualquer redução salarial, ao contrário do que defende ao Recorrente, também não exclui ou faz esvaziar o seu direito à reparação, que o é de um dano futuro, que vai projectar-se ao longo de toda uma vida activa de produtividade limitada. 4.5. Quanto ao cálculo da indemnização, também concordamos com a sentença, no sentido de que a indemnização a atribuir à Autora há-de ser encontrada com recurso à equidade e dentro da factualidade que resultou provada, sendo que a jurisprudência tem considerado que uma justa indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que a vítima não irá auferir e que se extinguirá no final do período provável da sua vida (não a vida activa do lesado, já que não é razoável ficcionar-se que a vida física desaparece no mesmo momento e com ela todas as suas necessidades), posto que só assim se logrará, na verdade, reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (cf., neste sentido, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 19/02/2004 – proc. n.º 03A4282 - e de 25/09/2007 – proc. n.º 07A2727). A equidade intervém, necessariamente, na medida em que há que assentar no tempo provável de vida da vítima, na diferença que, em cada época futura, existirá entre o rendimento auferido e o que auferiria se não tivesse sido a lesão e, por fim, na evolução da unidade monetária que a indemnização se irá exprimir (cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25/06/2002, CJ/STJ, Tomo 2º, pág. 128). Contudo, quanto à concretização do montante indemnizatório rejeita-se a posição defendida pela Recorrente, adoptando-se a posição maioritária da doutrina, que considera que o recurso a fórmulas matemáticas não constitui um critério absoluto, devendo as mesmas ser aplicadas como meros índices ou parâmetros, que carecem de ser temperados mediante o recurso a um juízo de equidade, uma vez que na avaliação dos prejuízos, o juiz deve atender sempre à multiplicidade e à especificidade das circunstâncias que concorrem no caso concreto e que o tornam único e diferente, além de que não se pode desvincular do critério da equidade que é erigido pelo legislador no artigo 566º, n.º 3 como critério a seguir na fixação deste tipo de indemnização. O cálculo da frustração do ganho deverá conduzir a um capital que produza um rendimento durante todo o tempo de vida da Autora adequado ao que auferiria se não fora a lesão sofrida correspondente ao grau de incapacidade, desde que tal seja previsível (cf. artigo 564º, n.º 2 do Código Civil) Deste modo, tendo em conta que à data do acidente a Autora tinha 28 anos de idade, que, por conseguinte, ainda tinha 42 anos de vida activa (posto que no cálculo da frustração da capacidade de ganho deverá ter-se em conta a idade de 70 anos, como o limite da vida activa), correspondente a 504 meses, que à data do acidente auferia de salário o valor de € 822,27 (que é o valor a considerar e não a média dos salários auferidos entre a data do acidente e a entrada da petição inicial, como se fez na sentença), e que ficou com um “défice funcional permanente da integridade físico-psíquica” de 3 pontos percentuais, apura-se o montante indemnizatório de € 12.433,00. Porém, importa ponderar, por um lado, que a Autora recebe de imediato este valor, mas, por outro, que há ainda a considerar o dano estético permanente de que a Autora ficou a padecer, quantificável em 3/7, (com cicatrizes visíveis na cara), que, embora seja um dano moderado, atenta a profissão da Autora, de gestora hoteleira, em que a aparência física constitui um factor de valorização no desempenho de determinadas tarefas, mormente de atendimento ao público, adquire particular relevância, e que, por isso, tem necessária repercussão na sua vida profissional. Assim, julga-se adequado e equitativo, nas circunstâncias do caso concreto acima enunciadas, atribuir a título de indemnização pela perda de rendimentos em função da incapacidade funcional da Autora e do dano estético sofrido, com repercussão na actividade profissional, a quantia de € 20.000,00, reduzindo o valor fixado na sentença a este título. Deste modo, a indemnização global por danos patrimoniais fica fixada em € 20.572,80. 4.6. No que se reporta aos danos não patrimoniais, respeitantes à Autora CC, na sentença, como se disse, foram os mesmos fixados em € 40.000,00, no qual se incluiu o correspondente ao dano estético, na vertente da sua repercussão na vida social e do lazer da Autora. O Recorrente discorda deste valor, por o considerar exagerado, e cremos que tem razão. Senão vejamos: 4.7. Com referência a danos não patrimoniais, como já se referiu, dispõe o artigo 496º do Código Civil, no seu n.º 1 que na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. Segundo o n.º 3 deste preceito, o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º do Código Civil, que, por sua vez, alude ao grau de culpabilidade do agente, à situação económica deste e do lesado e às demais circunstâncias do caso justificativas, sendo que a indemnização por danos não patrimoniais tem por finalidade compensar o lesado, da ofensa imerecida. A lei não dá qualquer conceito de equidade, mas, tem-se aceite a mesma como a consideração prudente e acomodatícia do caso, e, em particular, a ponderação das prestações, vantagens e inconvenientes que concorram naquele. Equidade não é sinónimo de arbitrariedade, mas sim, um critério para a correcção do direito, em ordem a que se tenham em consideração, fundamentalmente, as circunstâncias do caso concreto. Por sua vez, “demais circunstâncias do caso” é uma expressão genérica que se pretende referir a todos os elementos concretos caracterizadores da gravidade do dano, incluindo a desvalorização da moeda. Na atribuição dessa indemnização deve respeitar-se todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida (Cf. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. 1.º, 4.ª edição, pág. 501). Constitui jurisprudência sedimentada do Supremo Tribunal de Justiça que a indemnização por danos não patrimoniais, para responder, actualizadamente, ao comando do artigo 496º do Código Civil, e porque visa oferecer ao lesado uma compensação que contrabalance o mal sofrido, deve ser significativa, e não meramente simbólica, devendo o juiz, ao fixá-la segundo critérios de equidade, procurar um justo grau de “compensação” (cf., já neste sentido, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11/09/1994, in CJ-STJ, 1994,Tomo III, pág. 89 e segs.). 4.8. Tendo por base os critérios legais e jurisprudenciais referidos, importa, agora considerar a factualidade apurada relevante para a fixação da indemnização por danos não patrimoniais, a que se reportam, designadamente, os pontos 43º a 46º, 49º, 53º a 55º (na parte respeitante aos tratamentos), 61º, 69º a 77º, e 80º a 97º, dos quais se destaca, o seguinte: · Com os graves ferimentos que sofreu em consequência do embate entre os dois veículos, a Autora CC sofreu dores muito intensas, sendo o quantum doloris quantificável em 5/7. · Durante todo o período de internamento hospitalar, com os tratamentos que lhe foram ministrados, nos períodos pós operatórios e durante as sessões de fisioterapia a Autora CC sofreu igualmente dores muito intensas. · O filho de CC nasceu no dia 25/10/2002 e durante o período inicial de internamento hospitalar e mesmo depois, quando mal se podia movimentar, a Autora CC deixou de poder tomar conta de si própria, de sua casa e do seu filho menor e teve de recorrer a familiares, sobretudo à sua mãe, para assegurar essas tarefas. · Mesmo após a segunda intervenção cirúrgica a que foi submetida e depois de ter sido dada como consolidada a sua situação clínica, a Autora CC não ficou completamente restabelecida e, em resultado das lesões que sofreu com o acidente e ao contrário do que anteriormente sucedia, ficou a coxear da perna direita, tendo dores quando sujeita a referida perna direita a qualquer tipo de esforço, não se conseguindo apoiar na perna direita quando tem de ficar algum tempo de pé, sendo que todas estas situações se agravam quando se verifica qualquer mudança de tempo. · A Autora CC sempre deu muita importância à sua aparência, gostando de se apresentar sempre muito bem arranjada e atraente, sempre cuidou do seu corpo com todo o cuidado e atenção. · A Autora CC deixou de ir à praia, de sair à noite e de conviver com amigos, ao contrário do que sucedia anteriormente, sofrendo um grande desgosto por se ver esteticamente desvalorizada (o dano estético foi quantificado em 3/7). · A Autora CC, ao verificar que o seu filho de apenas um mês e meio de idade se encontrava ferido em consequência do acidente, entrou em pânico, temerosa de que o menor morresse ou ficasse incapacitado e vive permanentemente angustiada com a possibilidade de se vir a revelar no menor EE qualquer sequela das lesões sofridas. · Após o acidente, a Autora CC ficou seis dias sem poder ver o seu filho, muito angustiada com o estado de saúde deste e viveu no hospital momentos de desespero, ao pensar que o filho poderia morrer. · Ainda em consequência das lesões sofridas com o acidente, a Autora CC deixou de poder amamentar o seu filho, como estava a fazer até aí, o que lhe causou um enorme desgosto. · A Autora CC tornou-se uma pessoa sombria e triste, quando era antes ligeira, optimista e despreocupada. · A Autora CC, passou as quadras do Natal e Ano Novo sob internamento hospitalar, ficou privada do convívio, da festa e da celebração que caracterizam esses dias, o que lhe provocou contrariedade, desgosto e amargura. 4.9. Deste modo, considerando os factos provados e as circunstâncias acima referidas, designadamente, as dores (quantum doloris de 5/7); o tempo de incapacidade (com défice funcional temporário total de 19 dias, e parcial de 181 dias); as intervenções cirúrgicas a que se submeteu, a angústia sofrida pela preocupação com o estado do seu filho de um mês e meio de idade; a interrupção do aleitamento materno; o internamento, que abarcou a quadra natalícia e ano novo, sendo a primeira vez que as passaria com o seu filho; o incómodo decorrente da incapacidade de cuidar de si e do seu filho após o acidente e a duração do mesmo, a preocupação mantida com as possíveis sequelas para o seu filho; e ainda o dano estético sofrido (quantificável em 3/7), aqui considerado na vertente da sua repercussão na vida social e de lazer da Autora, bem evidenciado nos factos descritos sob ao pontos 81º a 85º doa factos provados, julga-se adequado atribuir à Autora, a título de danos não patrimoniais a quantia de € 30.000,00, reduzindo-se, assim a indemnização fixada na sentença para este valor. E, não se diga que se está a proceder a dupla valoração do “dano estético”, porquanto, conforme resulta do que acima se expos, entende-se que o dano estético pode/deve ser valorado na dupla vertente de dano não patrimonial e patrimonial, quando, como é o caso, para além da repercussão que tem na vida social, de lazer e estima pessoal do lesado, tem também repercussão na sua capacidade de ganho. 5. Da indemnização ao menor EE Quanto ao menor EE, foi peticionada a quantia de 75.000,00 € para o compensar das dores, do choque, do sofrimento com a separação da mãe, da perda de alimentação por amamentação da mãe, dos tratamentos, das transfusões de sangue e do trauma profundo que sofreu, bem como o pagamento de indemnização a fixar em momento ulterior por eventuais sequelas que se podem ainda revelar. Na sentença, considerando-se não ter resultado provada a probabilidade de ocorrência de sequelas e de, nos termos do n.º 2 do artigo 564º do Código Civil, apenas ser possível atender a danos futuros no cálculo da indemnização se estes forem previsíveis, nada se atribuiu a este título. Quanto aos danos não patrimoniais, atenta a factualidade provada fixou-se a indemnização em € 15.000. Discorda a recorrente, alegando que a atribuição deste montante constitui elevado enriquecimento sem causa, pugnando pela fixação de valor que não exceda os € 1.500. Vejamos: Os factos a considerar a este título são os que constam dos pontos 98.º a 103.º dos factos provados. Assim, importa considerar que: · Em consequência do acidente o menor EE sofreu traumatismo crânio encefálico e pielonefrite aguda, tendo sido assistido no Hospital S. Bernardo em Setúbal. · Atenta a gravidade do seu estado de saúde o menor foi transferido, no próprio dia do acidente, para o Hospital de Santa Maria, em Lisboa onde permaneceu internado até 23/12/2002. · Recebeu alta hospitalar em 23/12/2002 continuando medicado com Cefuroxime até 28/12/2002. · Durante o período de internamento hospitalar o menor foi submetido a uma transfusão de concentrado de eritrócitos devido à fractura parietal direita com hematoma epicraneano volumoso, responsável por queda do valor de hemoglobina (8,72 g). · Sofreu dores muito intensas com a violência do embate e com os tratamentos que lhe ministraram sendo o quantum doloris fixável em 3/7 e sofreu com a separação da mãe. · O menor EE sofreu um défice funcional temporário total entre 17/12/2002 e 23/12/2002, num total de 7 dias e um défice Funcional temporário Parcial entre 24/12/2002 e 28/1/2003 num total de 36 dias, sem défice funcional permanente da integridade físico-psíquica. Perante esta factualidade concordamos com a recorrente de que o montante indemnizatório fixado é exagerado. Na verdade, não obstante o menor ter sofrido traumatismo crânio encefálico e pielnefrite aguda de ter estado internado de 17/12/200, data do acidente, a 23/12/2002, com um défice funcional temporário total de 7 dias e um défice temporário parcial de 36 dias, recuperou sem qualquer défice funcional permanente da sua integridade físico-psíquica. Teve, no entanto, um quantum doloris fixável em 3/7. Por outro lado, não se pode deixar de considerar que, atenta a sua tenra idade – menos de 2 meses à data do acidente -, o sofrimento que se diz ter sofrido pela separação da mãe, não tem especial relevância, pois não se recordará deste facto nem do acidente. Neste contexto, julga-se adequando reduzir a indemnização quanto a danos não patrimoniais para a quantia de € 10.000,00. 6. Dos juros Na sentença condenou-se ainda os RR. a pagarem juros de mora à taxa legal de 4%, a contar da citação. Discorda a recorrente desta condenação, no que toca à indemnização por danos não patrimoniais, enquanto fixa o dies a quo à data da citação – 08/07/2004 – e não à data da sentença, como deveria ser face ao Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 4/2002, de 9 de Maio (publicado no Diário da República, I Série-A, de 27 de Junho de 2002), que fixou jurisprudência no sentido de: “[s]empre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do artigo 566.º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artigos 805.º, n.º 3 (interpretado restritivamente), e 806.º, n.º 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação.” Com fundamento neste aresto e considerando que os montantes arbitrados a título de danos não patrimoniais se têm que considerar actualizados à data da sentença, pois o tribunal podia/devia atender a esta data, face ao disposto no n.º 2 do artigo 566º do Código Civil, e tinha margem para o fazer por os valores peticionados serem muito superiores aos sentenciados, pede o recorrente que os juros relativos à indemnização por estes danos se conte apenas a partir da sentença, e não da citação. De facto, não se pode considerar que o pedido de indemnização formulado pelos AA. a este título esteja desactualizado, tendo em conta os valores que foram fixados na sentença e que agora foram revistos. Assim, e porque na atribuição dos valores de indemnização a título de danos não patrimoniais se ponderaram os referenciais quantitativos normalmente atendíveis na jurisprudência para indemnização deste tipo de danos à data da sentença, há que concluir que os montantes atribuídos, que ficaram bastante aquém dos peticionados, estão actualizados a esta data, pelo que sobre eles, em aplicação da doutrina do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 4/2002, que se segue, incidem juros moratórios à taxa legal a contar da data da sentença, e não da citação. 7. Deste modo, procede parcialmente a apelação e, em consequência, revoga-se parcialmente a sentença recorrida, em face do que acima se decidiu.*C) - Sumário I - Merecem a tutela do direito, sendo, por isso, indemnizáveis a título de danos não patrimoniais, não só os danos sofridos pelo lesado pelas lesões corporais e dores físicas em consequência do acidente de viação de que foi vítima, mas também pelos danos por este sofridos decorrentes do pânico, desespero e trauma psicológico, com o receio de perda da sua irmã e sobrinho menor, este com menos de 2 meses de idade, que seguiam consigo no veículo acidentado por aquele conduzido. II - O montante da indemnização deve ser fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção as circunstâncias referidas no artigo 494º do Código Civil, que alude ao grau de culpabilidade do agente, à situação económica deste e do lesado e às demais circunstâncias do caso justificativas, sendo que a indemnização por danos não patrimoniais tem por finalidade compensar o lesado, da ofensa imerecida. III - Há lugar à indemnização pela privação de uso de veículo, não só no caso em que o lesado está privado daquele uso enquanto não ocorre a reparação do mesmo, como na situação de perda total do veículo, enquanto o responsável pelo ressarcimento dos danos não pague o valor do bem destruído ou, na falta deste pagamento, pelo tempo razoável para que o lesado possa adquirir um veículo em substituição do anterior. IV - O “dano biológico” tanto pode ser ressarcido como dano patrimonial, como compensado a título de dano moral, tendo a situação que ser apreciada casuisticamente, verificando-se se a lesão originou, no futuro, durante o período activo do lesado ou da vida e, só por si, uma perda da capacidade de ganho ou se traduz, apenas, uma afectação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, para além do agravamento natural resultante da idade. V - Na concretização do montante indemnizatório pela perda da capacidade de ganho, deve adoptar-se a posição maioritária da doutrina, que considera que o recurso a fórmulas matemáticas não constitui um critério absoluto, devendo as mesmas ser aplicadas como meros índices ou parâmetros, que carecem de ser temperados mediante o recurso a um juízo de equidade, uma vez que na avaliação dos prejuízos, o juiz deve atender sempre à multiplicidade e à especificidade das circunstâncias que concorrem no caso concreto e que o tornam único e diferente, além de que não se pode desvincular do critério da equidade que é erigido pelo legislador no artigo 566º, n.º 3 como critério a seguir na fixação deste tipo de indemnização. VI - O dano estético pode/deve ser valorado na dupla vertente de dano não patrimonial e patrimonial, quando, para além da repercussão que tem na vida social, de lazer e estima pessoal do lesado, tem também repercussão na sua capacidade de ganho.* IV – DecisãoNestes termos e com tais fundamentos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência, revogar, nessa parte, a sentença recorrida, condenando os Réus a pagar, solidariamente, com dedução da franquia de € 299, 28 por lesado, quanto ao Réu Fundo de Garantia automóvel: a) À Autora BB, a quantia de € 12.000,00 (doze mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais; b) À Autora CC, a quantia de € 20.572,80 (vinte mil quinhentos e setenta e dois euros e oitenta cêntimos), a título de indemnização por danos patrimoniais, e a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais; c) Ao Autor EE, a quantia de € 10.000,00 (dez mil euros) de indemnização a título de danos não patrimoniais. d) Sobre as quantias atribuídas a título de danos não patrimoniais incidem juros moratórios, à taxa legal, a contar da prolação da sentença em 1ª instância. No mais, permanece inalterada a sentença recorrida, designadamente, quanto aos danos patrimoniais fixados à 1ª Autora, aos juros moratórios incidentes sobre as quantias fixadas a título de danos patrimoniais, e quanto às despesas que se vierem a apurar em liquidação correspondente aos custos da intervenção cirúrgica a que foi submetida a 2ª Autora, que não foram impugnados. Custas a cargo de ambas as partes, na proporção do decaimento.* Évora, 26 de Março de 2015 (Francisco Xavier) (Elisabete Valente) (Cristina Cerdeira)
Acórdão na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório1. BB, CC, esta por si e juntamente com DD em representação do seu filho menor EE, intentaram a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário contra FF e o Fundo de Garantia Automóvel, pedindo a condenação solidária dos RR. a pagar: a) À A. BB a quantia de 44.404,31 € acrescida de juros de mora a contar à taxa legal de 4% ao ano, desde a data de citação e até integral pagamento; b) À A. CC a quantia de 142.214,04 € acrescida de juros de mora a contar à taxa legal de 4% ao ano, desde a data de citação e até integral pagamento; c) Aos AA. CC e DD, na qualidade de pais e representantes legais do menor EE a quantia de 75.000,00 € acrescida de juros de mora a contar à taxa legal de 4% ao ano, desde a data de citação e até integral pagamento; d) À A. CC o custo da intervenção cirúrgica que esta ainda em consequência das lesões que sofreu com o acidente em causa terá de ser submetida; e) Aos AA. CC e DD, na qualidade de pais e representantes legais do menor EE uma indemnização pelas eventuais sequelas que ainda se venham a revelar no menor em consequência do acidente, remetendo-se para decisão ulterior a fixação do respectivo quantum indemnizatório; Tudo com a dedução, no que ao R. Fundo de Garantia Automóvel respeita, da franquia de 299,28 €. 2. Para tanto, alegaram, em síntese, que: - no dia no dia 17 de Dezembro de 2002, pelas 16h00, ocorreu um acidente de viação na E.N. 10 no sentido Setúbal Azeitão, num local denominado Alto das Necessidades, em que foram intervenientes o veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula 00-00-LB propriedade e conduzido pela A. BB e onde seguiam como passageiros CC e o filho menor desta, EE e o veículo ligeiro de passageiros de matrícula 00-00-RG propriedade e conduzido pela R. FF, que não tinha à data seguro automóvel de responsabilidade civil válido; - o acidente ocorreu porque o veículo RG, ao qual a condutora imprimia uma velocidade excessiva para o local, se despistou, ultrapassando o traço contínuo e invadindo a faixa de rodagem de sentido contrário, onde seguia o veículo LB; e - do acidente resultaram danos materiais no veículo da A. e danos na integridade física de todos os ocupantes do veículo LB. Em consequência: A A. BB, enfermeira, exercendo funções no Hospital Pulido valente e no Hospital da Cruz Vermelha, em Lisboa, reclama as diferenças salariais que deixou de auferir por se encontrar de baixa médica em consequência do acidente e indemnização pela perda do vestuário que trazia na altura do acidente, pela perda do veículo, pelo aluguer de um carro de substituição, pela despesa que suportou com o reboque do veículo sinistrado, pelas dores, angústias traumas e desgastes sofridos. A A. CC reclama indemnização por ferimentos, pela destruição de vestuário e da cadeira de bebé, por despesas médicas e medicamentosas, por diferenças salariais que deixou de auferir em consequência da baixa médica, que se prolongou por cinco meses e meio, o que também acarretou um prejuízo na sua progressão na carreira; por despesas decorrentes da situação de doença e incapacidade, pelas sequelas das lesões sofridas, por despesas com a prática de natação e intervenção cirúrgica a realizar no futuro; e por dano estético e de afirmação pessoal, dores, incómodos, preocupações, angústias e clausura hospitalar. Quanto ao menor EE peticiona-se uma indemnização pelas lesões e trauma que sofreu decorrente do acidente. 3. Citados os RR., contestou o FGA, alegando ter já efectuado diversos pagamentos a entidades hospitalares em virtude do acidente dos autos, cuja dinâmica aceita. Impugna alguns factos por não serem factos pessoais não sabendo se são reais ou verdadeiros e invoca que a A. CC recebeu da Segurança Social um subsídio diário no período de 12/3/2003 a 6/8/2003, desconhecendo qual o seu vencimento líquido mensal. Impugna ainda despesas e quanto a sequelas das lesões alega que deverá proceder-se a nova avaliação médica. Quanto à indemnização por danos morais impugna os valores peticionados por excessivos. A R. FF aceita a dinâmica do acidente e, quanto ao facto de não dispor de seguro, alega que tal deveu-se a atraso no pagamento do prémio de seguro. Impugna a restante matéria por desconhecer tais factos, considerando os montantes peticionados exagerados. 4. Foi proferido despacho de aperfeiçoamento da petição inicial, como consta de fls. 88, tendo os AA. apresentado o articulado de fls. 90 a 92. Deu-se cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 1º do Decreto-Lei n.º 59/89 de 22/2. Designou-se data para realização de audiência preliminar, onde foi tentada a conciliação das partes, sem sucesso, após o que foi proferido despacho saneador e seleccionou-se a matéria de facto, que não sofreu reclamação. 5. Instruído o processo e efectuada a perícia médico-legal requerida, procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, findo a qual se respondeu à matéria da Base Instrutória, como consta da acta de fls. 457 e segs., que não sofreu reclamação. Após, veio a ser proferida a sentença (ref.11755464), que consta de fls. 476 a 527, que, julgando parcialmente procedente a acção, condenou os RR. a pagar, solidariamente, com dedução da franquia de € 299,28 quanto ao R. FGA, por lesado: - À A. BB a quantia global de € 2.134,91 a título de indemnização por danos patrimoniais e a quantia de € 19.500,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais; - À A. CC a quantia global de € 25.572,80 € a título de indemnização por danos patrimoniais e a quantia de € 40.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais, bem como na quantia que se vier a apurar em liquidação de sentença correspondente aos custos da intervenção cirúrgica a que foi submetida em 28/2/2008 à perna. - Ao A. EE a quantia global de 15.000,00 € a título de indemnização por danos não patrimoniais. Mais se decidiu que todas estas quantias serão acrescidas de juros de mora, calculados à taxa legal de 4% anuais, desde 8/7/2004 e até efectivo e integral pagamento, absolvendo-se os RR. do demais peticionado. 6. Inconformado recorreu o Fundo de Garantia Automóvel, com os seguintes fundamentos [segue transcrição das conclusões do recurso]: 1.ª Vem o presente recurso de apelação interposto da douta sentença de fls__, decisão com a qual não se conforma o FGA. Porquanto, 2.ª II – Relativamente ao montante Indemnizatório atribuído à A BB, o douto Tribunal a quo condenou os RR. a pagar à A. BB, os valores seguintes: a) 2.134,91 Euros, a título de danos patrimoniais; b) 19.500,00 Euros, a título de danos não patrimoniais, assim distribuídos: - Pelas suas dores e 10 dias de doença: 2.500,00 Euros; - Pelos danos de terceiros correspondentes aos arts. 25.º a 31.º da base instrutória: 15.000 Euros; - Pela privação do uso do veículo: 2.000,00 Euros. 3.ª O FGA aceita os valores atribuídos a título de danos patrimoniais (2.134,91 Euros), a que, conforme sentença se deve reduzir a franquia de 299,28 Euros. 4.ª Já não são aceitáveis os valores atribuídos a título de danos não patrimoniais, porquanto, a A. BB, como provado está, teve apenas um período de doença de 18/12/2002 a 27/12/2002, correspondente a 10 dias; a A. BB não foi sujeita a exame pericial, não alegou quaisquer sequelas permanentes, nem danos estético, nem o seu quantum doloris foi valorizado em sede de qualquer perícia, o que significa que ficou absolutamente curada das pequenas lesões que terá sofrido. 5.ª As suas pequenas dores não são valorizáveis em sede indemnizatória e muito menos à razão diária de 250,00 Euros. 6.ª Se extrapolarmos para um ano de pequenas dores, o valor diário atribuído pelo Tribunal a quo, teríamos num ano, a quantia de 91.250,00 Euros. 7.ª Sendo a equidade a justiça do caso concreto, não pode a mesma ser livre arbítrio do julgador, devendo conter-se nos limites dos casos análogos e com extrema razoabilidade, sob pena de ser o Tribunal a favorecer o enriquecimento sem causa. 8.ª As dores da A. BB não podem ser valoradas em mais do que 500,00 Euros. 9.ª Atribuiu o douto Tribunal a quo, à mesma A. BB, uma indemnização de 15.000,00 Euros, que se funda nos factos da base instrutória, julgados provados de 25.º a 31.º. 10.ª Ora, entrar em pânico por julgar que a irmã e o sobrinho recém-nascido haviam morrido, viver momentos de desespero por isso, ficar perturbadíssima com as consequências para eles resultantes do acidente, ficar amargurada por a produção do acidente ter ocorrido com o seu carro, ficar incomodada e perturbada no seu dia a dia, pela memória do acidente, por isso com trauma psicológico, má disposição, irritação e angústia, tudo derivado das lesões sofridas por terceiros que são sua irmã CC e seu sobrinho EE, não são danos valorizáveis e que mereçam a tutela do Direito. 11.ª A A. BB apenas poderá ser indemnizada pelas suas próprias dores físicas, que já foram tratadas supra e nunca pelas consequências do acidente face a terceiros por si transportados, por mais fortes que sejam os laços. 12.ª Não encontramos qualquer fundamento de Direito, nem na douta sentença, nem no Direito constituído que justifique qualquer indemnização pelos danos que estão descritos nos arts. 25.º a 31.º da base instrutória, nem no art. 495.º, nem no art. 496.º, ambos do C.Civil. 13.ª Os terceiros que têm indemnização, nos termos do n.º 2 do art. 495.º, são aqueles que socorreram o lesado, os estabelecimentos hospitalares, médicos ou outras pessoas ou entidades que tenham contribuído para o tratamento ou assistência da vítima. 14.ª Como se disse supra, também não se enquadram esses danos no n.º 1 do art. 496.º, porque não sendo danos decorrentes das suas próprias lesões corporais, a simples dor pelas dores de terceiro não se enquadram e não merecem a tutela do Direito. 15.ª Existe, pois violação grosseira na sentença do disposto nos arts. 495.º e 496.º do C. Civil na atribuição à A. BB da quantia de 15.000,00 Euros, da qual devem os RR. ser absolvidos. 16.ª Essa indemnização de 15.000,00 Euros não está juridicamente fundamentada na sentença, o que configura a nulidade prevista no art. 668.º, n.º 1 al. b) do C.P.C., nem o poderia estar, pois não há, no direito constituído, norma que o suporte. 17.ª Falta ainda tratar, quanto à A. BB, da questão da indemnização de 2.000,00 Euros, atribuída pela privação do uso do veículo. 18.ª Está provado no art. 12.º da base instrutória que o veículo que a A. BB conduzia ficou danificado, sendo a reparação do mesmo inviável e ainda (art. 14.º da base instrutória) que os salvados do veículo foram vendidos por 350,00 Euros. 19.ª Só poderia haver lugar a indemnização por privação do uso se o veículo fosse reparável e, apenas durante o período que mediasse entre a comunicação ao FGA e ao prazo provável da reparação. 20.ª Sabendo a A. que o veículo era irreparável e tendo vendido os respectivos salvados, ela própria teria que ter arranjado uma solução mais rápida, não sendo imputável a qualquer terceiro a privação de uso de um veículo em estado de sucata. Não é devida qualquer indemnização a título de privação do uso do veículo. 21.ª Relativamente ao montante Indemnizatório atribuído à A CC, a douta sentença condena os RR. a pagar à A. CC a quantia de 25.572,80 a título de danos patrimoniais e a quantia de 40.000,00 Euros a título de danos não patrimoniais. Procuraremos demonstrar, salvo o devido respeito, a irrazoabilidade das indemnizações atribuídas a esta A. 22.ª O FGA conforma-se com a quantia de 572,80 Euros, atribuída a título de danos patrimoniais resultante de lesões em coisas, a que haverá que deduzir a franquia legal de 299,28 Euros. 23.ª Quanto à quantia de 25.000,00 Euros, de pretensa perda de capacidade de ganho, nota-se na douta sentença, e mais uma vez salvo o devido respeito, alguma confusão. 24.ª Se atentarmos na fundamentação de fls. 46 da douta sentença, verificamos que o julgador começa por fixar um valor patrimonial de 12.852,00 Euros (4.º parágrafo), para depois acrescer, com base no dano estético e no seu suposto condicionamento para o exercício da actividade, chegar a uma indemnização por equidade de 25.000,00 Euros “pelo dano biológico, traduzido na perda de ganho”, o que parece uma contradição nos seus próprios termos. 25.ª Não podemos olvidar que, aquando do acidente, a A. trabalhava na empresa GG – Gestão Hoteleira, SA, conforme resposta ao quesito 57, auferindo o vencimento mensal de 822,27 Euros. 26.ª Também não podemos olvidar a resposta ao quesito 61, indicando que, à data da entrada da acção em juízo, a A. CC trabalhava para a HH Tours, auferindo o vencimento mensal de 900,00 Euros e que, actualmente trabalha no JJ em Setúbal. 27.ª O facto de, aquando da entrada da petição inicial, ou seja, 2 anos após o acidente, a A. auferir vencimento mensal superior ao auferido na data do sinistro é demonstração cabal de que não houve qualquer perda da capacidade de ganho, pois, quando a petição inicial entrou em juízo, já a A. tinha consolidadas as suas lesões (o relatório pericial indica como data de consolidação das lesões a data de 05/06/2003), o que reforça a ideia – força de que o seu dano estético e os 3 pontos de défice funcional permanente não tiveram nem significam qualquer perda da capacidade de ganho. Razão pela qual, 28.ª Os 25.000,00 Euros atribuídos a esse título não são devidos, pois tal consubstanciaria enriquecimento sem causa, em violação do art. 473.º do C. Civil. 29.ª No 3.º parágrafo de fls. 46 da douta sentença, o julgador não atendeu ao vencimento na data do sinistro, fazendo uma média anómala entre o vencimento dessa data e o vencimento posterior, inclusive tomando por base o salário ilíquido, quando o art. 64.º, n.º 7 do D.L. 291/2007 de 21/08 dispõe que “O Tribunal deve basear-se nos rendimentos líquidos auferidos na data do acidente”, norma que a douta sentença violou. 30.ª É certo que se conhece a querela entre a aplicação ou não da tabela constante da Portaria n.º 679/2009 de 25/06, que alterou a Portaria n.º 377/2008. No entanto, o legislador entendeu adequada a aplicação desses valores, não apenas para efeitos extrajudiciais, mas como forma de salvaguardar uma aplicação semelhante em todos os tribunais, atendendo à evidente disparidade que temos notada na mais diversa jurisprudência, em relação a casos análogos. 31.ª O legislador da Portaria de Proposta Razoável, entendeu, com base em pareceres médico-legais, que uma incapacidade igual ou inferior a 10%, se não for absolutamente incapacitante do exercício da profissão habitual, não tem repercussão na capacidade de ganho. 32.ª Por essa razão, e atendendo à situação concreta da A. CC, que está plasmada nas conclusões do Relatório médico-legal e que foi vertido na resposta à matéria de facto, teremos: - período de repercussão temporária na actividade profissional total: 202 dias; - quantum doloris, grau 4, num escala crescente de 7. - défice funcional permanente de 3 pontos, compatíveis com exercício da actividade habitual, mas implicando esforços suplementares; - danos estético de grau 3, numa escala crescente de 7; - 18 dias de internamento hospitalar. 33.ª Atendo-nos a esta situação, teremos uma indemnização global devida à A. CC, já incluídos os danos patrimoniais de 572,80 Euros, no valor de 8.569,94 Euros, a que haverá que deduzir a franquia legal de 299,28 Euros, relativamente aos danos em coisas. 34.ª Se o julgador seguisse outro caminho, como parece que seguiu, não só não poderia fixar por equidade o dano patrimonial futuro, como haveria de ter corrigido um conjunto de pressupostos: 35.ª Para um salário ilíquido à data do sinistro de 822,27 Euros, e considerando um dependente, de acordo com a tabela de retenção na fonte do IRS para o ano de 2002, a A. CC haveria de descontar 8,5% de IRS e ainda 11% de taxa social única, num total mensal de descontos de 160,34 Euros. 36.ª Significa isto que o seu vencimento líquido mensal à data do sinistro era de 661,92 Euros. E, não sendo nenhum de nós matemático, tanto mais que fomos estudar Direito, a verdade é que, se o Tribunal pretendia considerar contra a decisão do legislador, uma perda de capacidade de ganho para 3% de IPP, então, o que se continua a dizer sem conceder ou transigir, poderia lançar mão da velha fórmula constante do Acórdão da Relação de Coimbra de 04/04/1995, in CJ II, pág. 23, ou utilizar o programa de cálculo, disponível em www.verbojuridico.net, o que daria um total de capital a pagar a título de dano patrimonial futuro de 7.267,45 Euros. 37.ª Reafirmamos que continuamos sem entender o salto lógico do pensamento do julgador do Tribunal a quo, entre o 4.º parágrafo de fls. 46 da douta sentença e o 5.º e 6.º, não só porque o dano estético é um dano moral, autonomizado pelo legislador na Portaria supra citada, como o mesmo volta a ser valorizado na sentença ora posta em crise, o que constitui uma clamorosa contradição. 38.ª Para além desse alegado dano patrimonial de 25.000,00 Euros, pela perda de capacidade de ganho, o Tribunal veio considerar que os danos não patrimoniais da A. CC deveriam ser valorados em 40.000,00 Euros. 39.ª Com um quantum doloris de 4/7, um dano estético de 3/7 e uma IPP de 3 pontos, ao atribuir danos não patrimoniais no valor de 40.000,00, quanto é que este Tribunal atribuiria a alguém que tivesse 20, 30 ou 40% de incapacidade? Ou se a A. tivesse falecido? 40.ª Para valores de dano da perda de vida de 60.000,00 é flagrantemente injusto, é absolutamente violador do art. 473.º do C. Civil, a atribuição dessa indemnização a título de dano moral. 41.ª Como dissemos supra, a indemnização total de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais a que a A. CC tem direito cifra-se na quantia de 8.569,94 Euros, devendo ser o FGA absolvido do restante que foi atribuído a esta A. 42.ª Relativamente ao montante Indemnizatório atribuído ao A. EE, este A. teve um período de doença de 43 dias, sendo 7 dias défice funcional temporário total e 36 de défice funcional temporário parcial, tendo-lhe sido atribuído um quantum doloris de grau 3 numa escala crescente de 7, sem qualquer indicação de dano estético e com expressa indicação de ausência de défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, tudo conforme as conclusões do Relatório médico legal de fls._, que foram tomadas em conta na decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo. 43.ª O menor EE teve um internamento hospitalar do dia 17/12 a 23/12, e, portanto, tirando esse período que já está considerado no período total de doença, não ficou com quaisquer sequelas do acidente, nem se encontra provado que venha a ter quaisquer sequelas no futuro. 44.ª É absolutamente constatável o exagero e a irrazoabilidade da indemnização de 15.000,00 Euros que lhe foi atribuída, o que mais uma vez, viola o art. 473.º do C. Civil, pois constitui elevado enriquecimento sem causa. 45.ª A ser valorada, para efeitos indemnizatórios, a situação sofrida pelo menor EE, não deve a indemnização exceder o montante de 1.500,00 Euros, sob pena de subverter completamente o equilíbrio que deve existir entre as indemnizações arbitradas pelos mais diversos Tribunais. 46.ª Mais uma vez se pergunta, sem qualquer ponta de ironia e com total respeito pela vida humana, quanto atribuiria este Tribunal a título de perda da vida, no caso de uma criança da mesma idade? Face ao que supra se deixou dito, não deve ser atribuída ao menor indemnização superior a 1.500,00 Euros. 47.ª A douta sentença condena ainda o FGA no pagamento aos AA. de juros, contados desde 08/07/2004 (data da citação), condenação com que se não conforma o FGA. 48.ª O douto Tribunal violou o Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 4/2002, pois tendo atribuído quantias tão exorbitantes ainda assim entendeu fixar o dies a quo em 08/07/2004 e não na data da sentença como deveria. 49.ª Sendo o pedido dos AA. no valor total de 261.618,35 Euros, sendo que o pedido da A. CC ascendia a 142.214,04 Euros, o pedido da A. BB, no valor de 44.404,31 Euros e o pedido do menor EE, no valor de 75.000,00 Euros, e tendo sido fixadas indemnizações inferiores a esse montante, tal significa que o Juiz tinha valor do pedido suficiente para actualizar o valor das indemnizações por danos não patrimoniais, nos termos do art. 566.º, n.º 2 do C.Civil. 50.ª Nos termos do supra referido Acórdão: “Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do artigo 566.º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artigos 805.º, n.º 3 (interpretado restritivamente), e 806.º, n.º 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação.” 51.ª Em obediência ao Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 4/2002, de 09-05-2002, publicado no Diário da República, I Série -A, n.º 146, de 27-06-2002, os juros relativos à indemnização pelos danos não patrimoniais devem contar-se apenas, desde a data da prolação da decisão, e não desde 08/07/2004.7. Não se mostram juntas contra-alegações. O recurso foi recebido como apelação, com subida imediata e efeito meramente devolutivo. Colhidos os vistos legais, cumpre agora apreciar e decidir.* II – Objecto do recursoO objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 660.º, n.º 2, 684.º, n.º3 e 685º-A, nº1, todos do Código de Processo Civil [redacção vigente à data da decisão recorrida, anterior à Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho]. Considerando o teor das conclusões apresentadas, importa decidir as seguintes questões: (i) Da nulidade da sentença; (ii) Da fixação dos montantes indemnizatórios atribuídos a cada um dos AA.; e (iii) Dos juros moratórios.* III – FundamentaçãoA) - Os Factos Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos, que não são impugnados no recurso:A) No dia 17 de Dezembro de 2002, cerca das 16.00 horas, a Autora BB conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros de marca FIAT, modelo Punto 55 SX, com a matrícula 00-00-LB, pela E.N. nº 10, no sentido Setúbal-Azeitão, num local denominado Alto das Necessidades B) No veículo com a matrícula 00-00-LB, para além da Autora BB, que conduzia, seguiam ainda como passageiros a Autora CC, sua irmã, e o filho menor desta, EE, que tinha ao tempo um mês e meio de idade. C) O veículo 00-00-LB conduzido pela BB, havia descrito uma curva à esquerda e iniciava uma descida. D) No local, a estrada encontrava-se dividida por um traço contínuo, separado a parte da faixa de rodagem destinada a cada um dos sentidos de trânsito. E) A Autora BB conduzia o veículo 00-00-LB na sua mão, pelo lado direito da faixa de rodagem, na via de trânsito reservada aos veículos que seguiam na direcção Setúbal - Azeitão. F) Nesse mesmo local, mas em sentido contrário, circulava um outro veículo automóvel ligeiro de passageiros, de marca RENAULT, modelo Megane, com a matrícula 00-00-RG conduzido pela ré FF. G) No momento em que os dois veículos se cruzavam, o veículo 00-00-RG despistou-se, ultrapassou o traço contínuo e invadiu a faixa de rodagem destinada ao trânsito em sentido contrário, por onde seguia o veículo 00-00-LB. H) O embate deu-se entre a frente do veículo 00-00-RG e a frente do lado esquerdo do veículo conduzido pela Autora BB. I) A ré FF circulava com o veículo 00-00-RG sem que a responsabilidade civil decorrente da sua circulação se mostrasse coberta por qualquer seguro. J) Do embate entre os dois veículos, resultaram para a Autora BB os seguintes ferimentos: escoriações nos membros superiores, na face, em ambos os joelhos e no pé esquerdo, tendo sido assistida no Hospital de São Bernardo, em Setúbal, para onde foi transportada. K) Pelo facto de não ter podido trabalhar durante os dez dias de baixa, a Autora BB deixou de auferir do Hospital Pulido Valente a quantia de € 56,17 (cinquenta e seis euros e dezassete cêntimos), correspondente ao desconto de uma sexta parte do vencimento durante dez dias, e de € 24,43 (vinte e quatro euros e quarenta e três cêntimos), de subsídio de alimentação, num total de € 80,60 (oitenta euros e sessenta cêntimos). L) Por não ter podido prestar serviços ao Hospital da Cruz Vermelha, a Autora BB deixou de auferir a quantia de € 263,56 (duzentos e sessenta e três euros e cinquenta e seis cêntimos), correspondente a uma terça parte do que recebia mensalmente. M) A Autora BB pagou à KK, da recolha do veículo 00-00-LB, a quantia de € 642,60 (seiscentos e quarenta e dois euros e sessenta cêntimos). * 1º) A Autora BB seguia atenta à condução e ao tráfego. 2º) Conduzindo o seu veículo a uma velocidade de cerca de 60km/h. 3º) A Autora BB ainda guinou o veículo que conduzia para a sua direita, mas não lhe foi possível evitar o embate. 4º) O acidente ocorreu por a ré circular com o seu veículo 00-00-RG a uma velocidade que não lhe permitiu controlar o veículo. 5º) A R. não conseguiu controlar a sua viatura. 6º) A Ré seguiu ao volante do veículo 00-00-RG com uma taxa de álcool no sangue de 1,12g/l. 7º) Em consequência dos ferimentos que sofreu e dos tratamentos a que teve de ser submetida, a Autora BB esteve ausente do trabalho por motivo de doença de 18/12/2002 a 27/12/2002. 8º) A Autora BB é enfermeira, exercendo funções no Hospital Pulido Valente, em Lisboa, como enfermeira graduada. 9º) E no hospital da Cruz Vermelha, também em Lisboa, como enfermeira prestadora de serviços em regime de meio horário. 10º) Devido ao impacto do choque, a camisola que a Autora BB envergava na altura do acidente rasgou-se e ficou sem uso. 11º) Sendo o valor dessa camisola de € 100,00 (cem euros. 12º) Ainda em consequência do embate, o veículo automóvel que a Autora BB conduzia ficou danificado sendo a reparação do mesmo inviável. 13º) Os salvados do veículo foram vendidos por € 350,00. 14º) A Autora BB utilizava o veículo 00-00-LB para se deslocar para os seus locais de trabalho. 15º) Ao ficar sem poder dispor do seu veículo, a Autora BB viu-se obrigada a alugar um outro veículo, de características semelhantes ao seu, para o substituir. 16º) A Autora BB pagou à LL, pelo aluguer de um veículo no período de 6/01/2003 a 5/02/2003, a quantia de € 1.048,15 (mil e quarenta e oito euros e quinze cêntimos). 17º) Após o acidente, o veículo da Autora BB foi removido para as oficinas da KK, em Setúbal, onde ficou a aguardar que fossem feitas as perícias necessárias para determinar se era ou não viável a sua reparação, tendo aí permanecido, durante dezoito dias. 18º) A Autora BB sofreu dores muito fortes com os ferimentos causados pelo acidente. 19º) E bem assim, com os tratamentos que lhe foram ministrados no Hospital de São Bernardo, em Setúbal. 20º) Durante os dias que se seguiram ao acidente, a Autora BB sentiu dores intensas em todo o corpo. 21º) Que a impediam de se movimentar com à-vontade e lhe causavam mau estar. 22º) A autora BB ficou com uma ferida no peito, provocada pela fricção do conto de segurança e com nódoas negras nessa região e joelhos. 23º) O que muito a incomodou. 24º) Logo após o acidente, a Autora BB entrou em pânico por ter julgado que a irmã e o sobrinho recém-nascido haviam morrido. 25º) Até se aperceber de que, afinal a irmã e o sobrinho não tinham morrido, a Autora BB viveu momentos de autêntico desespero e horror, como nunca tinha sentido na vida. 26º) Mesmo depois de saber a irmã e o sobrinho livres de perigo, a Autora BB ficou perturbadíssima com as consequências para eles resultantes das lesões sofridas com o acidente. 27º) A Autora BB ficou amargurada pela produção do acidente ter ocorrido com o seu carro. 28º) Ainda hoje, a memória do acidente e dos momentos que se seguiram não larga a Autora BB, incomodando-a, perturbando o seu dia-a-dia, angustiando-a e retirando-lhe conforto e bem estar psicológico. 29º) A autora BB era uma pessoa ligeira e bem disposta. 30º) Passou a ter, em resultado do trauma psicológico sofrido com o acidente, comportamentos de má disposição, irritação e angústia, que antes não se verificavam. 31º) A Autora BB só veio a comprar um carro novo em data indeterminada de Junho de 2003. 32º) De Fevereiro a Junho de 2003, inclusive, a Autora BB teve de utilizar os transportes públicos nas suas deslocações para os locais de trabalho, ao contrário do que sucedia anteriormente em que se deslocava sempre em veículo próprio. 33º) A Autora BB vivia, no período em questão (Fevereiro a Junho de 2003), em Setúbal. 34º) No Hospital de Pulido Valente, a Autora BB trabalhava por turnos rotativos, podendo entrar ao serviço às 8.00 horas e sair às 16.00 horas, ou entrar às 16.00 horas e sair às 23.00 horas. 35º) No Hospital da Cruz Vermelha, a Autora BB trabalhava igualmente por turnos rotativos, podendo entrar ao serviço às 8.00 horas e sair às 16.00 horas, ou entrar às 16.00 horas e sair às 23.00 horas. 36º) No período de Fevereiro a Junho de 2003, a Autora BB encontrava-se a frequentar o Curso de Complemento de Formação em Enfermagem, no Instituto Português de Oncologia, na Palhavã, em Lisboa, com aulas às 3ªs, 4ªs, 5ªs e 6ªs feiras, das 17,00 horas às 21.00 horas. 37º) No período de Fevereiro a Junho de 2003 a A. BB encontrava-se a frequentar o Curso de Complemento de Formação em Enfermagem, no Instituto Português de Oncologia, na Palhavã, em Lisboa, pelo menos três dias por semana, das 17h às 21h. 38º) Por ter de se deslocar em transportes públicos, a Autora BB passou a levar muito mais tempo nas deslocações que tinha de fazer. 39º) O que implicou que tivesse muito menos tempo para repousar. 40º) As deslocações que a Autora BB passou a ter de fazer em transportes públicos, mormente de Setúbal para Lisboa e de Lisboa para Setúbal, tornaram-se muito mais cansativas do que quando viajava em veículo próprio. 41º) A Autora BB estava sempre preocupada com a possibilidade de qualquer atraso que a impedisse de estar à hora ao serviço ou às aulas. 42º) A Autora BB sofreu, de Fevereiro a Junho de 2003, com a privação de veículo próprio, um desgaste físico e psicológico muito acentuado. 43º) Em consequência do acidente em causa a A. CC sofreu traumatismo craniano com perda de conhecimento e fractura cominutiva do terço proximal da tíbia direita. 44º) Tendo sido conduzida para o Hospital de São Bernardo, em Setúbal, onde ficou internada até 19/12/2002, tendo sido posteriormente transferida para o Hospital do Outão, onde permaneceu internada até 3/01/2003. 45º) A Autora CC foi submetida no Hospital do Outão a uma intervenção cirúrgica à perna direita no dia 20/12/2002. 46º) Mais tarde, em 18/11/2003, a Autora CC voltou a ser submetida a nova intervenção cirúrgica no Hospital do Outão. 47º) Devido ao impacto do choque, ficou completamente destruída a roupa que a Autora CC trazia vestida; um par de calças no valor de € 100,00 (cem euros); uma camisola de lã, no valor de € 80,00 (oitenta euros); um soutien (próprio para mães que estão a amamentar os filhos) no valor de € 50.00 (cinquenta euros) e um casaco, no valor de € 150,00 (cento e cinquenta euros). 48º) A cadeira de bebé em que seguia o menor ficou destruída, tendo sido necessário comprar outra que custou € 135,00 (cento e trinta e cinco euros). 49º) Após o período de internamento hospitalar, a Autora CC continuou a ser assistida no Hospital do Outão para tratamento das lesões sofridas com o acidente. 50º) De taxas moderadoras referentes a consultas médicas no Hospital do Outão nos dias 9/1/2003 e 5/6/2003 a A. CC pagou, cada dia, a quantia de 4,75 €, e no dia 7/8/2003 pagou a quantia de 3 €. 51º) No dia 6/11/2003 a A. CC pagou de taxas moderadoras no Hospital do Outão, por consulta e exame as quantias de 4,10 € e 1,20 €, respectivamente. 52º) Em medicamentos para tratamento das lesões sofridas com o acidente a mãe da A. CC pagou em 30/1/2003 a quantia de 39,01 €. 53º) Após ter recebido alta do primeiro período de internamento hospitalar, a A. CC teve de se socorrer, de um andarilho articulado para se movimentar, que a sua mãe adquiriu, no valor de 47,00 €. 54º) Quando pôde dispensar o andarilho, a A. CC teve de se socorrer de um par de canadianas articuladas com punho macio, que a sua mãe adquiriu no valor de 13,96 €. 55º) A A. CC efectuou tratamentos de fisioterapia na Clínica da Santa Casa da Misericórdia de Setúbal (que o R. Fundo de Garantia Automóvel pagou), tendo recorrido a uma consulta de fisiatria na mesma instituição, no dia 28/3/2003, pela qual pagou a quantia de 40,00 €. 56º) A A. CC foi funcionária da empresa GG – Gestão Hoteleira, SA de Dezembro de 1997 a Dezembro de 2002 com o vencimento mensal de 822,27 €. 57º) O filho de CC nasceu no dia 25/10/2002. 58º) A partir de 12/3/2003 a A. CC esteve de baixa por doença até 6/8/2003, em consequência das lesões sofridas com o acidente. 59º) A A. CC esteve com baixa por doença durante o período de 12/3/2003 a 6/8/2003, tendo recebido o subsídio diário de 18,64 €, no total de 2.702,80 €. 60º) A A. CC Trigueiros, à data da entrada da acção em juízo, trabalhava para a HH Tours, auferindo o vencimento mensal de 900,00 €, encontrando-se actualmente a trabalhar para o JJ, Setúbal. 61º) Durante o período inicial de internamento hospitalar e mesmo depois, quando mal se podia movimentar, a Autora CC deixou de poder tomar conta de si própria, de sua casa e do seu filho menor. 62º) A Autora CC teve de recorrer a familiares, sobretudo à sua mãe, para assegurar essas tarefas. 63º) A mãe da Autora CC teve de deixar o seu próprio trabalho para poder acorrer à filha e ao neto, deslocando-se diariamente vezes ao Hospital durante o período de internamento hospitalar e a casa da própria Autora quando esta recebeu alta hospitalar. 64º) A mãe da Autora CC exerce funções no Hospital de São Bernardo, em Setúbal, trabalhando em regime de turnos. 65º) Para acorrer à filha e ao neto, a mãe da A. CC pediu licença para assistência à família e findo esse período a marcar férias. 66º) Em resultado do sucedido, a mãe da Autora CC ficou sem qualquer descanso durante o período de férias, que passou a cuidar da filha e do neto. 67º) Perdeu, por trabalhar em regime de turnos, subsídio que receberia se tivesse trabalhado, mormente durante o período em que pediu dispensa do serviço para assistência à família. 68º) A Autora CC, vendo o sacrifício e as despesas que a mãe fez durante este período, comprometeu-se a compensá-la com a quantia de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros). 69º) Mesmo após a segunda intervenção cirúrgica a que foi submetida e depois de ter sido dada como consolidada a sua situação clínica, a Autora CC não ficou completamente restabelecida. 70º) A Autora CC, em resultado das lesões que sofreu com o acidente e ao contrário do que anteriormente sucedia, ficou a coxear da perna direita. 71º) Tem dores quando sujeita a referida perna direita a qualquer tipo de esforço. 72º) Não se consegue apoiar na perna direita quando tem de ficar algum tempo de pé. 73º) Agravando-se todas estas situações quando se verifica qualquer mudança de tempo. 74º) A A. CC sofreu: · Défice funcional temporário total entre 17/12/2002 e 3/1/2003 ao qual acrescem mais dois dias em que lhe foi retirado o material de osteossíntese em 18/11/2003 e em 28/2/2008, num total de 19 dias; · Défice Funcional Temporário Parcial entre 4/1/2003 e 5/6/2003; de 19/11/2003 a 3/1272003 e 29/2/2008 a 15/3/2008, num total de 181 dias; · Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-psíquica fixável em 3 pontos. 75º) A Autora CC submeteu-se, em 28/2/2008, por indicação médica, a nova intervenção cirúrgica à perna. 76º) A Autora CC sempre deu muita importância à sua aparência, gostando de se apresentar sempre muito bem arranjada e atraente. 77º) A Autora CC sempre cuidou do seu corpo com todo o cuidado e atenção. 78º) Na profissão de gestora hoteleira, a aparência física constitui um factor de valorização no desempenho de determinadas tarefas, mormente de atendimento ao público. 79º) Na sua profissão, a Autora CC sempre se sentiu muito segura na área das relações públicas, por saber ser a sua aparência muito agradável, o que a levava a sentir-se confiante em si própria, revelando o maior à - vontade no trabalho. 80º) Em resultado das lesões que sofreu e das intervenções cirúrgicas a que teve de ser submetida, a A. CC, para além de ter passado a coxear, ficou com uma cicatriz no couro cabeludo da região parietal esquerda, arciforme de concavidade posterior com 10 cm; Cicatriz na região nasogeniana, a cerca de 0,5 cm acima da comissura labial direita, linear, oblíqua para a direita e muito ligeiramente para baixo com 1,4 cm; Vestígio cicatriz na região geniana anterior, cerca da linha média, oblíqua para baixo e para a esquerda com 1,7 cm; cicatriz, muito ligeiramente hipertófica, na região mandibular esquerda, oblíqua para baixo e para a esquerda com 1,3 cm; cicatriz com marcas de sutura nas faces anteriores do joelho e terço superior da perna direita, hipopigmentada, vertical com 15 cm x 1,5 cm de largura máxima; duas cicatrizes na face Antero-interna do terço superior da perna direita, hipopigmentadas, verticais, sensivelmente verticais com cerca de 17 cm cada; cicatriz na face anterior do terço superior da perna direita, hipopigmentada, vertical com 2,2 cm; cicatriz vestigial na face anterior do terço médio da perna direita, de contornos irregulares e eixo maior oblíquo para baixo e ligeiramente para a direita com 4cm x 1cm de largura máxima; cicatriz na face antero-interna do terço inferior da perna direita, hipopigmentada, vertical com 2,5cm x 0,3 cm de largura máxima. 81º) A Autora CC passou, no seu dia-a-dia a comportar-se com menos naturalidade e menos confiança, por se sentir diminuída com as sequelas bem visíveis das lesões que sofreu. 82º) O que perturba o seu relacionamento com as outras pessoas e prejudica o seu desempenho profissional. 83º) A Autora CC deixou de ir à praia, de sair à noite e de conviver com amigos. 84º) Ao contrário do que sucedia anteriormente. 85º) A Autora CC sofre um grande desgosto por se ver esteticamente desvalorizada, sendo o dano estético permanente quantificável em 3/7. 86º) Com os graves ferimentos que sofreu em consequência do embate entre os dois veículos, a Autora CC sofreu dores muito intensas, sendo o quantum doloris quantificável em 5/7. 87º) Durante todo o período de internamento hospitalar, com os tratamentos que lhe foram ministrados, nos períodos pós operatórios e durante as sessões de fisioterapia a Autora CC sofreu igualmente dores muito intensas. 88º) A Autora CC, ao verificar que o seu filho de apenas um mês e meio de idade se encontrava ferido em consequência do acidente, entrou em pânico, temerosa de que o menor morresse ou ficasse incapacitado. 89º) O menor EE sofreu um défice funcional temporário total entre 17/12/2002 e 23/12/2002, num total de 7 dias e um défice Funcional temporário Parcial entre 24/12/2002 e 28/1/2003 num total de 36 dias, sem défice funcional permanente da integridade físico-psíquica. 90º) A Autora CC vive permanentemente angustiada com a possibilidade de se vir a revelar no menor EE qualquer sequela das lesões sofridas. 91º) Após o acidente, a Autora CC ficou seis dias sem poder ver o seu filho, muito angustiada com o estado de saúde deste. 92º) A Autora CC viveu no hospital momentos de desespero, ao pensar que o filho poderia morrer. 93º) Ainda em consequência das lesões sofridas com o acidente, a Autora CC deixou de poder amamentar o seu filho, como estava a fazer até aí. 94º) O que lhe causou um enorme desgosto. 95º) A Autora CC tornou-se uma pessoa sombria e triste. 96º) Quando era antes ligeira, optimista e despreocupada. 97º) A Autora CC, passou as quadras do Natal e Ano Novo sob internamento hospitalar, ficou privada do convívio, da festa e da celebração que caracterizam esses dias, o que lhe provocou contrariedade, desgosto e amargura. 98º) Em consequência do acidente o menor EE sofreu traumatismo crânio encefálico e pielonefrite aguda, tendo sido assistido no Hospital S. Bernardo em Setúbal. 99º) Atenta a gravidade do seu estado de saúdo o menor EE foi transferido, no próprio dia do acidente, para o Hospital de Santa Maria, em Lisboa onde permaneceu internado até 23/12/2002. 100º) O menor EE recebeu alta hospitalar em 23/12/2002 continuando medicado com Cefuroxime axetil até 28/12/2002. 101º) Durante o período de internamento hospitalar o menor EE foi submetido a uma transfusão de concentrado de eritrócitos devido à fractura parietal direita com hematoma epicraneano volumoso, responsável por queda do valor de hemoglobina (8,72 g). 102º) O menor EE sofreu dores muito intensas com a violência do embate e com os tratamentos que lhe ministraram sendo o quantum doloris fixável em 3/7. 103º) O menor EE sofreu com a separação da mãe. * Nos termos do art.º 659º, n.º 3 do Código de ProcessoCivil: a) A A. CC nasceu no dia 2 de Junho de 1974 (certidão de nascimento de fls. 105 dos autos). *B) – O Direito 1. Da nulidade da sentença A propósito da fixação na sentença da indemnização à Autora BB na quantia de € 15.000,00, a título de danos não patrimoniais, pelos padecimentos sofridos pela A. quando se apercebeu do estado em que se encontravam os seus familiares (irmã e sobrinho, pensando que tinham morrido no acidente), pelas perturbações que lhe trazem a memória do acidente e pelo trauma psicológico, o Recorrente, alegando existir “grosseira violação” dos artigos 495º e 496º do Código Civil, invoca que a sentença enferma da nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 668º do Código de Processo Civil, no caso por falta de fundamentação jurídica. Como resulta claro dos termos em que a questão é colocada, não se trata de um caso de falta de fundamentação jurídica da decisão, mas antes uma divergência quanto à valoração das lesões sofridas pela Autora em sede das normas legais aplicáveis e dos critérios jurisprudências tidos por relevantes na matéria, pois, o Recorrente, ao contrário do julgador, entende que tais lesões não merecem a tutela do direito. Basta uma simples leitura da sentença para, com facilidade, se apreenderem quais os critérios legais utilizados pelo julgador na valoração dos danos não patrimoniais em causa. Improcede, pois a arguida nulidade da sentença. 2. Como resulta das alegações e, concretamente, das conclusões do recurso, este tem apenas por objecto o montante das indemnizações atribuído na sentença a cada um dos autores, porquanto o recorrente – Fundo de Garantia Automóvel – não questiona que, face à factualidade provada, a R., condutora do veículo “RG”, foi a única responsável pela produção do acidente de viação em causa nos autos, estando reunidos os pressupostos legais da responsabilidade civil extracontratual, e que, por circular sem seguro válido ou eficaz, compete ao Fundo de Garantia Automóvel o ressarcimento das indemnizações devidas, nos termos do artigo 21º, n.º 1 e 2, alínea a), do Decreto-Lei n.º 522/85, na redacção do Decreto-Lei n.º 122-A/86, de 30 de Maio, e do Decreto-Lei n.º 130/94, de 19 de Maio, em vigor à data dos factos (cf., actualmente, os artigos 48º, n.º 1, e 49º, n.º 1, alíneas a) e b), do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto). Cumpre assim apurar se se mostra correctamente fixada a quantificação do montante indemnizatório devido a cada um dos autores, na parte questionada no recurso, tendo em conta a factualidade provada e os critérios legais previstos para a reparação dos danos sofridos, tendo igualmente em conta a jurisprudência existente nesta matéria. 3. Da indemnização devida A. BB 3.1. Quanto a esta A. atribuiu-se na sentença a quantia de € 2.134,91, a título de indemnização por danos patrimoniais, e € 19.500, a título de danos não patrimoniais. No que se reporta aos primeiros, englobou-se naquele montante as despesas efectuadas com a recolha do veículo sinistrado, o valor de bens pessoais inutilizados no acidente, montantes salariais não auferidos e descontos efectuados por via da baixa médica, e ainda o valor de € 1.048,15, pelas despesas suportadas com o aluguer de um veículo semelhante ao seu, que ficou destruído no acidente, no período compreendido entre 06/01/2003 e 05/02/2003, necessário para se deslocar para os locais onde trabalhava. Em relação aos danos não patrimoniais, o valor arbitrado resulta da soma da quantia de € 2.500 referente às lesões corporais sofridas no acidente, € 15.000 devidos pelo sofrimento da A. pela situação dos seus familiares acidentados no veículo que conduzia e pelas angústias sofridas, e € 2.000 a título de privação do uso do veículo. O recorrente aceita o valor atribuído na sentença quanto aos danos patrimoniais, apenas questionando o quanto indemnizatório a título de danos não patrimoniais. 3.2. Começa o recorrente por discordar do valor de € 2.500 pelas lesões e sofrimentos causados à A. BBem consequência do acidente, invocando a este respeito que apenas teve 10 dias de baixa, não foi sujeita a exame pericial, não alegou sequelas permanentes, não foi valorizado em sede de perícia o seu quantum doloris, e que ficou curada das lesões sofridas, concluindo que as pequenas dores da A. não são valorizáveis em sede indemnização, aceitando, no entanto, o valor de € 500. É certo que, nos termos do n.º 1 do artigo 496º, só relevam os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, “mereçam tutela do direito”. Porém, tal não significa que os danos apurados em relação a esta A., ainda que de menor gravidade, careçam de relevância jurídica. Como salientam Pires de Lima-Antunes Varela, (Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª ed., pág. 499) “[a] gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada), e “[o]s simples incómodos ou contrariedades não justificam a indemnização por danos não patrimoniais (cf. os acórdãos do STJ, de 12 de Outubro de 1973 e de 18 de Novembro de 1975, respectivamente no BMJ n.º 230, págs. 107 e segs. e n.º 251, págs. 148 e segs.)”. Ora, no caso em apreço apurou-se com relevância que: · Do embate entre os dois veículos, resultaram para a Autora BB os seguintes ferimentos: escoriações nos membros superiores, na face, em ambos os joelhos e no pé esquerdo, tendo sido assistida no Hospital de São Bernardo, em Setúbal, para onde foi transportada; a Autora BB sofreu dores muito fortes com os ferimentos causados pelo acidente e bem assim, com os tratamentos que lhe foram ministrados no Hospital de São Bernardo, em Setúbal. · Durante os dias que se seguiram ao acidente, a Autora BB sentiu dores intensas em todo o corpo, que a impediam de se movimentar com à-vontade e lhe causavam mau estar. · A autora BB ficou com uma ferida no peito, provocada pela fricção do conto de segurança e com nódoas negras nessa região e joelhos, o que muito a incomodou. Contrariamente ao defendido pela recorrente não estão aqui em causa danos que devam ser desconsiderados de tutela jurídica, pois, embora as lesões sofridas não tenham deixado sequelas, implicaram sofrimento para a A., traduzido nas “dores muito fortes” que sofreu com o acidente e com os tratamentos efectuados, que implicaram 10 dias de baixa, bem como pelas dores intensas que sentiu em todo o corpo nos dias seguintes ao acidente, e demais incómodos. Face a esta matéria factual a qual não foi impugnada, não se nos afigura desajustada, mas antes adequada, a indemnização fixada de € 2.500 fixada na sentença. 3.3. Insurge-se ainda o recorrente pelo facto de ter sido fixada indemnização, no caso de € 15.000, por danos não patrimoniais decorrentes dos sofrimentos padecidos pela A. quando se apercebeu do estado em que se encontravam os seus familiares (irmã e sobrinho), pensando que tinham morrido no acidente, pelas perturbações que lhe trazem a memória do acidente e pelo trauma psicológico que lhe trazem as lesões por estes sofridas, alegando que são lesões sofridas por terceiros, e que não são danos valorizáveis e que mereçam a tutela do direito, concluindo que a A. só pode ser indemnizável pelas suas próprias dores físicas e nunca pelas consequências do acidente face a terceiros por si, por mais fortes que sejam os laços. Porém, não tem razão o recorrente, porquanto não está em causa a atribuição de indemnização por danos de terceiros e a mesma tem fundamento no n.º 1 do artigo 496º do Código Civil. Efectivamente, deste preceito não resulta que sejam apenas indemnizáveis a título de danos não patrimoniais os decorrentes de lesões corporais sofridas pelo próprio, nele também cabem os danos psicológicos sofridos pelo próprio, como é o caso, em consequência de lesões e sofrimentos causados a terceiros próximos, designadamente familiares, ainda mais quando essas lesões decorrem de acto (o acidente) em que o reclamante da indemnização foi interveniente (ainda que sem culpa). Os factos em causa, a demandar indemnização, são os constantes dos artigos 24.º a 30.º do elenco dos factos provados, dos quais resulta que: · Logo após o acidente, a Autora BB entrou em pânico por ter julgado que a irmã e o sobrinho recém-nascido haviam morrido e até se aperceber de que, afinal a irmã e o sobrinho não tinham morrido, a Autora BB viveu momentos de autêntico desespero e horror, como nunca tinha sentido na vida. · Mesmo depois de saber a irmã e o sobrinho livres de perigo, a Autora BB ficou perturbadíssima com as consequências para eles resultantes das lesões sofridas com o acidente. · A Autora BB ficou amargurada pela produção do acidente ter ocorrido com o seu carro. · Ainda hoje, a memória do acidente e dos momentos que se seguiram não larga a Autora BB, incomodando-a, perturbando o seu dia-a-dia, angustiando-a e retirando-lhe conforto e bem estar psicológico. · A autora BB era uma pessoa ligeira e bem disposta e passou a ter, em resultado do trauma psicológico sofrido com o acidente, comportamentos de má disposição, irritação e angústia, que antes não se verificavam. Esta situação não traduz um caso de pequena gravidade que desmereça a tutela do direito. Repare-se que no veículo conduzido pela A. seguiam a sua irmã e sobrinho, a primeira que, além do mais, sofreu traumatismo craniano com perda de conhecimento e fractura da tíbia direita, e o menor, que também sofreu ferimentos, ainda não tinha 2 meses de idade. Neste contexto, parece-nos aceitável que a A. tenha entrado em pânico e vivido momentos de desespero e horror, o que lhe causou sofrimentos, e que tenha ficado traumatizada e viva angustiada com as memórias do acidente, bem como tenha passado a ter comportamentos de má disposição, irritação e angústia, que antes não tinha. Aliás tais factos não foram impugnados. Assim, tais danos psicológicos sofridos pela A. em consequência do acidente não podem deixar de ser valorizáveis e quantificáveis, à luz do previsto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 496º do Código Civil, afigurando-se-nos, no entanto, que o montante fixado é exagerado, devendo, por isso, ser reduzido para metade, ou seja, € 7.500. 3.4. Discorda também o recorrente do facto de se ter atribuído à Autora indemnização pela privação do uso do veículo entre Fevereiro e Junho de 2003, no montante de € 2.000, argumentando que só haveria lugar a indemnização por privação de uso se o veículo fosse reparável, o que não era o caso, pois a reparação era inviável, e apenas pelo tempo que mediasse entre a comunicação ao FGA e o prazo provável da reparação. Daqui decorre que o fundamento da impugnação da indemnização não reside na discordância do valor atribuído, mas antes no facto de se entender que, pura e simplesmente, nas circunstâncias do caso não há lugar a indemnização. Porém, com o devido respeito, a posição do recorrente não é de acolher, pois não se concebe que em caso de perda total do veículo o lesado não possa ser indemnizado pelo tempo decorrido entre a comunicação ao FGA e o pagamento do valor do veículo, ou na falta deste pagamento, como sucedeu os autos, até ao momento em que possa adquirir um veículo em substituição do anterior. Se assim fosse, estrar-se-ia a premiar o devedor, que apesar de retardar o pagamento, não indemnizava pelos prejuízos causados. Em conclusão, há lugar à indemnização pela privação de uso de veículo, não só no caso em que o lesado está privado daquele uso enquanto não ocorre a reparação do mesmo, como na situação de perda total do veículo, enquanto o responsável pelo ressarcimento dos danos não pague o valor do bem destruído ou, na falta deste pagamento, pelo tempo razoável para que o lesado possa adquirir um veículo em substituição do anterior. Ora, independentemente da posição que se tenha quanto à problemática dos pressupostos necessários ao ressarcimento da “privação de uso”, designadamente saber se basta a simples alegação dessa privação ou se é essencial que se aleguem e provem factos concretos de onde resultem os prejuízos causados por essa privação, no caso dos autos, como resulta da matéria de facto provada, tal discussão é inócua, posto que a Autora alegou e demonstrou que teve prejuízos com a privação do uso do veículo. A necessidade da Autora no uso do veículo e os transtornos que a falta do mesmo lhe causaram estão bem evidenciados nos factos provados, constantes dos pontos 31.º a 42.º, de onde resulta que: · A Autora BB só veio a comprar um carro novo em data indeterminada de Junho de 2003. · De Fevereiro a Junho de 2003, inclusive, a Autora BB teve de utilizar os transportes públicos nas suas deslocações para os locais de trabalho, ao contrário do que sucedia anteriormente em que se deslocava sempre em veículo próprio. · Por ter de se deslocar em transportes públicos, a Autora BB passou a levar muito mais tempo nas deslocações que tinha de fazer. · O que implicou que tivesse muito menos tempo para repousar. · As deslocações que a Autora BB passou a ter de fazer em transportes públicos, mormente de Setúbal para Lisboa e de Lisboa para Setúbal, tornaram-se muito mais cansativas do que quando viajava em veículo próprio. · A Autora BB estava sempre preocupada com a possibilidade de qualquer atraso que a impedisse de estar à hora ao serviço ou às aulas. · A Autora BB sofreu, de Fevereiro a Junho de 2003, com a privação de veículo próprio, um desgaste físico e psicológico muito acentuado. Deste modo, é devida e mostra-se adequadamente fixada a indemnização pela privação do uso do veículo em € 2.000. 3.5. Deste modo, fixa-se a indemnização global devida à Autora BB, a título de danos não patrimoniais na quantia de € 12.000,00. 4. Da indemnização devida à A. CC 4.1. Na sentença recorrida atribuiu-se à Autora CC a quantia global de € 25.572,80 a título de danos patrimoniais e a quantia de € 40.000 a título de indemnização por danos não patrimoniais, bem como a quantia que se vier a apurar em liquidação de sentença correspondente aos custos da intervenção cirúrgica a que foi submetida em 28/02/2008 à perna. Quanto aos danos patrimoniais o montante apurado de € 25.572,80, inclui a quantia de € 572,80, correspondente aos bens destruídos no acidente, às taxas moderadoras pagas e consulta de fisiatria, e o valor de € 25.000,00, “pelo dano biológico, traduzido na perda de ganho”, sendo que neste valor se integra a quantia de € 12.852,00 por frustração de ganho em função da incapacidade funcional permanente de 3%, e o restante por dano estético, com repercussão na vida profissional futura da A.. No que se reporta aos danos não patrimoniais, consideraram-se as lesões sofridas, dores e angustia da A., bem como o dano estético, na vertente da sua repercussão na vida social e de lazer da A.. 4.2. Quanto aos danos patrimoniais, o Recorrente aceita a quantia de € 572,80 atribuída pelo valor das coisas destruídas ou danificadas no acidente, mas contesta o montante de € 25.000,00 atribuído pela perda da capacidade de ganho, argumentando que não houve perda de capacidade de ganho e questionando a forma de cálculo, bem como a existência de dano estético relevante. 4.3. A este respeito releva a seguinte factualidade dada como provada: · Em consequência do acidente em causa a A. CC sofreu traumatismo craniano com perda de conhecimento e fractura cominutiva do terço proximal da tíbia direita. · A A. CC sofreu: - Défice funcional temporário total entre 17/12/2002 e 3/1/2003 ao qual acrescem mais dois dias em que lhe foi retirado o material de osteossíntese em 18/11/2003 e em 28/2/2008, num total de 19 dias; - Défice Funcional Temporário Parcial entre 4/1/2003 e 5/6/2003; de 19/11/2003 a 3/12/2003 e 29/2/2008 a 15/3/2008, num total de 181 dias; - Défice Funcional Permanente da Integridade Fisico-Psíquica fixável em 3 pontos. · Na profissão de gestora hoteleira, a aparência física constitui um factor de valorização no desempenho de determinadas tarefas, mormente de atendimento ao público. · Na sua profissão, a Autora CC sempre se sentiu muito segura na área das relações públicas, por saber ser a sua aparência muito agradável, o que a levava a sentir-se confiante em si própria, revelando o maior à - vontade no trabalho. · Em resultado das lesões que sofreu e das intervenções cirúrgicas a que teve de ser submetida, a A. CC T, para além de ter passado a coxear, ficou com uma cicatriz no couro cabeludo da região parietal esquerda, arciforme de concavidade posterior com 10 cm; Cicatriz na região nasogeniana, a cerca de 0,5 cm acima da comissura labial direita, linear, oblíqua para a direita e muito ligeiramente para baixo com 1,4 cm; Vestígio cicatriz na região geniana anterior, cerca da linha média, oblíqua para baixo e para a esquerda com 1,7 cm; cicatriz, muito ligeiramente hipertófica, na região mandibular esquerda, oblíqua para baixo e para a esquerda com 1,3 cm; cicatriz com marcas de sutura nas faces anteriores do joelho e terço superior da perna direita, hipopigmentada, vertical com 15 cm x 1,5 cm de largura máxima; duas cicatrizes na face Antero-interna do terço superior da perna direita, hipopigmentadas, verticais, sensivelmente verticais com cerca de 17 cm cada; cicatriz na face anterior do terço superior da perna direita, hipopigmentada, vertical com 2,2 cm; cicatriz vestigial na face anterior do terço médio da perna direita, de contornos irregulares e eixo maior oblíquo para baixo e ligeiramente para a direita com 4cm x 1cm de largura máxima; cicatriz na face antero-interna do terço inferior da perna direita, hipopigmentada, vertical com 2,5cm x 0,3 cm de largura máxima, sendo o dano estético permanente quantificável em 3/7. · A Autora CC passou, no seu dia-a-dia a comportar-se com menos naturalidade e menos confiança, por se sentir diminuída com as sequelas bem visíveis das lesões que sofreu. · O que perturba o seu relacionamento com as outras pessoas e prejudica o seu desempenho profissional. Tal como se decidiu na sentença e ao contrário do propugnado pelo Recorrente, entendemos que esta factualidade sustenta a atribuição de uma indemnização pelo dano biológico sofrido, traduzido na perda da capacidade de ganho da lesada, incluindo-se nesta o dano estético com repercussão no desempenho da actividade profissional. 4.4. Como bem nos dá conta a sentença (que cita diversos arestos do Supremo Tribunal de Justiça, que nos dispensamos de referir, e para onde remetemos), a questão do dano biológico vem sendo de há algum tempo tratada na jurisprudência e doutrina, quer na vertente do respectivo enquadramento jurídico quer na da sua ressarcibilidade, retirando-se a conclusão de que o chamado dano biológico tanto pode ser ressarcido como dano patrimonial, como compensado a título de dano moral, tendo a situação que ser apreciada casuisticamente, verificando-se se a lesão originou, no futuro, durante o período activo do lesado ou da vida e, só por si, uma perda da capacidade de ganho ou se traduz, apenas, uma afectação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, para além do agravamento natural resultante da idade (cf. neste sentido, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 17/05/2011 – Proc. n.º 7449/05.0TBVFR.P1.S1 -, disponível como os demais citado sem outra referência em: www.dgsi.pt). Como dano de natureza autónoma e específica por envolver prioritariamente uma afectação da saúde e plena integridade física do lesado, a sua compensação, como se afirma, por exemplo, no Acórdão do Supremo Tribunal de 11/11/2010 (proc. n.º 270/04.5 TBOFR.C1.S1) “(…) tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades exercício de uma profissão e de futura mudança ou reconversão de emprego pelo lesado, enquanto fonte actual de possíveis e eventuais acréscimos patrimoniais, frustrada irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar, quer da acrescida penosidade e esforço no exercício da sua actividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas. Na verdade, a perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediatamente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira «capitis deminutio» num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe, de forma relevante e substancial, as possibilidades exercício profissional e de escolha de profissão, eliminando ou restringindo seriamente qualquer mudança ou reconversão de emprego e, nessa medida, o leque de oportunidades profissionais à sua disposição, erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuros lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais.” Tal indemnização tem plena autonomia relativamente à compensação pelos danos não patrimoniais sofridos e visa reparar a perda de capacidade de trabalho e de ganho, tal que, conforme prescreve o artigo 562.º do Código Civil, se reconstitua a situação patrimonial que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, e a circunstância de não se ter demonstrado que, no imediato, a Autora tivesse sofrido qualquer redução salarial, ao contrário do que defende ao Recorrente, também não exclui ou faz esvaziar o seu direito à reparação, que o é de um dano futuro, que vai projectar-se ao longo de toda uma vida activa de produtividade limitada. 4.5. Quanto ao cálculo da indemnização, também concordamos com a sentença, no sentido de que a indemnização a atribuir à Autora há-de ser encontrada com recurso à equidade e dentro da factualidade que resultou provada, sendo que a jurisprudência tem considerado que uma justa indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que a vítima não irá auferir e que se extinguirá no final do período provável da sua vida (não a vida activa do lesado, já que não é razoável ficcionar-se que a vida física desaparece no mesmo momento e com ela todas as suas necessidades), posto que só assim se logrará, na verdade, reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (cf., neste sentido, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 19/02/2004 – proc. n.º 03A4282 - e de 25/09/2007 – proc. n.º 07A2727). A equidade intervém, necessariamente, na medida em que há que assentar no tempo provável de vida da vítima, na diferença que, em cada época futura, existirá entre o rendimento auferido e o que auferiria se não tivesse sido a lesão e, por fim, na evolução da unidade monetária que a indemnização se irá exprimir (cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25/06/2002, CJ/STJ, Tomo 2º, pág. 128). Contudo, quanto à concretização do montante indemnizatório rejeita-se a posição defendida pela Recorrente, adoptando-se a posição maioritária da doutrina, que considera que o recurso a fórmulas matemáticas não constitui um critério absoluto, devendo as mesmas ser aplicadas como meros índices ou parâmetros, que carecem de ser temperados mediante o recurso a um juízo de equidade, uma vez que na avaliação dos prejuízos, o juiz deve atender sempre à multiplicidade e à especificidade das circunstâncias que concorrem no caso concreto e que o tornam único e diferente, além de que não se pode desvincular do critério da equidade que é erigido pelo legislador no artigo 566º, n.º 3 como critério a seguir na fixação deste tipo de indemnização. O cálculo da frustração do ganho deverá conduzir a um capital que produza um rendimento durante todo o tempo de vida da Autora adequado ao que auferiria se não fora a lesão sofrida correspondente ao grau de incapacidade, desde que tal seja previsível (cf. artigo 564º, n.º 2 do Código Civil) Deste modo, tendo em conta que à data do acidente a Autora tinha 28 anos de idade, que, por conseguinte, ainda tinha 42 anos de vida activa (posto que no cálculo da frustração da capacidade de ganho deverá ter-se em conta a idade de 70 anos, como o limite da vida activa), correspondente a 504 meses, que à data do acidente auferia de salário o valor de € 822,27 (que é o valor a considerar e não a média dos salários auferidos entre a data do acidente e a entrada da petição inicial, como se fez na sentença), e que ficou com um “défice funcional permanente da integridade físico-psíquica” de 3 pontos percentuais, apura-se o montante indemnizatório de € 12.433,00. Porém, importa ponderar, por um lado, que a Autora recebe de imediato este valor, mas, por outro, que há ainda a considerar o dano estético permanente de que a Autora ficou a padecer, quantificável em 3/7, (com cicatrizes visíveis na cara), que, embora seja um dano moderado, atenta a profissão da Autora, de gestora hoteleira, em que a aparência física constitui um factor de valorização no desempenho de determinadas tarefas, mormente de atendimento ao público, adquire particular relevância, e que, por isso, tem necessária repercussão na sua vida profissional. Assim, julga-se adequado e equitativo, nas circunstâncias do caso concreto acima enunciadas, atribuir a título de indemnização pela perda de rendimentos em função da incapacidade funcional da Autora e do dano estético sofrido, com repercussão na actividade profissional, a quantia de € 20.000,00, reduzindo o valor fixado na sentença a este título. Deste modo, a indemnização global por danos patrimoniais fica fixada em € 20.572,80. 4.6. No que se reporta aos danos não patrimoniais, respeitantes à Autora CC, na sentença, como se disse, foram os mesmos fixados em € 40.000,00, no qual se incluiu o correspondente ao dano estético, na vertente da sua repercussão na vida social e do lazer da Autora. O Recorrente discorda deste valor, por o considerar exagerado, e cremos que tem razão. Senão vejamos: 4.7. Com referência a danos não patrimoniais, como já se referiu, dispõe o artigo 496º do Código Civil, no seu n.º 1 que na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. Segundo o n.º 3 deste preceito, o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º do Código Civil, que, por sua vez, alude ao grau de culpabilidade do agente, à situação económica deste e do lesado e às demais circunstâncias do caso justificativas, sendo que a indemnização por danos não patrimoniais tem por finalidade compensar o lesado, da ofensa imerecida. A lei não dá qualquer conceito de equidade, mas, tem-se aceite a mesma como a consideração prudente e acomodatícia do caso, e, em particular, a ponderação das prestações, vantagens e inconvenientes que concorram naquele. Equidade não é sinónimo de arbitrariedade, mas sim, um critério para a correcção do direito, em ordem a que se tenham em consideração, fundamentalmente, as circunstâncias do caso concreto. Por sua vez, “demais circunstâncias do caso” é uma expressão genérica que se pretende referir a todos os elementos concretos caracterizadores da gravidade do dano, incluindo a desvalorização da moeda. Na atribuição dessa indemnização deve respeitar-se todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida (Cf. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. 1.º, 4.ª edição, pág. 501). Constitui jurisprudência sedimentada do Supremo Tribunal de Justiça que a indemnização por danos não patrimoniais, para responder, actualizadamente, ao comando do artigo 496º do Código Civil, e porque visa oferecer ao lesado uma compensação que contrabalance o mal sofrido, deve ser significativa, e não meramente simbólica, devendo o juiz, ao fixá-la segundo critérios de equidade, procurar um justo grau de “compensação” (cf., já neste sentido, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 11/09/1994, in CJ-STJ, 1994,Tomo III, pág. 89 e segs.). 4.8. Tendo por base os critérios legais e jurisprudenciais referidos, importa, agora considerar a factualidade apurada relevante para a fixação da indemnização por danos não patrimoniais, a que se reportam, designadamente, os pontos 43º a 46º, 49º, 53º a 55º (na parte respeitante aos tratamentos), 61º, 69º a 77º, e 80º a 97º, dos quais se destaca, o seguinte: · Com os graves ferimentos que sofreu em consequência do embate entre os dois veículos, a Autora CC sofreu dores muito intensas, sendo o quantum doloris quantificável em 5/7. · Durante todo o período de internamento hospitalar, com os tratamentos que lhe foram ministrados, nos períodos pós operatórios e durante as sessões de fisioterapia a Autora CC sofreu igualmente dores muito intensas. · O filho de CC nasceu no dia 25/10/2002 e durante o período inicial de internamento hospitalar e mesmo depois, quando mal se podia movimentar, a Autora CC deixou de poder tomar conta de si própria, de sua casa e do seu filho menor e teve de recorrer a familiares, sobretudo à sua mãe, para assegurar essas tarefas. · Mesmo após a segunda intervenção cirúrgica a que foi submetida e depois de ter sido dada como consolidada a sua situação clínica, a Autora CC não ficou completamente restabelecida e, em resultado das lesões que sofreu com o acidente e ao contrário do que anteriormente sucedia, ficou a coxear da perna direita, tendo dores quando sujeita a referida perna direita a qualquer tipo de esforço, não se conseguindo apoiar na perna direita quando tem de ficar algum tempo de pé, sendo que todas estas situações se agravam quando se verifica qualquer mudança de tempo. · A Autora CC sempre deu muita importância à sua aparência, gostando de se apresentar sempre muito bem arranjada e atraente, sempre cuidou do seu corpo com todo o cuidado e atenção. · A Autora CC deixou de ir à praia, de sair à noite e de conviver com amigos, ao contrário do que sucedia anteriormente, sofrendo um grande desgosto por se ver esteticamente desvalorizada (o dano estético foi quantificado em 3/7). · A Autora CC, ao verificar que o seu filho de apenas um mês e meio de idade se encontrava ferido em consequência do acidente, entrou em pânico, temerosa de que o menor morresse ou ficasse incapacitado e vive permanentemente angustiada com a possibilidade de se vir a revelar no menor EE qualquer sequela das lesões sofridas. · Após o acidente, a Autora CC ficou seis dias sem poder ver o seu filho, muito angustiada com o estado de saúde deste e viveu no hospital momentos de desespero, ao pensar que o filho poderia morrer. · Ainda em consequência das lesões sofridas com o acidente, a Autora CC deixou de poder amamentar o seu filho, como estava a fazer até aí, o que lhe causou um enorme desgosto. · A Autora CC tornou-se uma pessoa sombria e triste, quando era antes ligeira, optimista e despreocupada. · A Autora CC, passou as quadras do Natal e Ano Novo sob internamento hospitalar, ficou privada do convívio, da festa e da celebração que caracterizam esses dias, o que lhe provocou contrariedade, desgosto e amargura. 4.9. Deste modo, considerando os factos provados e as circunstâncias acima referidas, designadamente, as dores (quantum doloris de 5/7); o tempo de incapacidade (com défice funcional temporário total de 19 dias, e parcial de 181 dias); as intervenções cirúrgicas a que se submeteu, a angústia sofrida pela preocupação com o estado do seu filho de um mês e meio de idade; a interrupção do aleitamento materno; o internamento, que abarcou a quadra natalícia e ano novo, sendo a primeira vez que as passaria com o seu filho; o incómodo decorrente da incapacidade de cuidar de si e do seu filho após o acidente e a duração do mesmo, a preocupação mantida com as possíveis sequelas para o seu filho; e ainda o dano estético sofrido (quantificável em 3/7), aqui considerado na vertente da sua repercussão na vida social e de lazer da Autora, bem evidenciado nos factos descritos sob ao pontos 81º a 85º doa factos provados, julga-se adequado atribuir à Autora, a título de danos não patrimoniais a quantia de € 30.000,00, reduzindo-se, assim a indemnização fixada na sentença para este valor. E, não se diga que se está a proceder a dupla valoração do “dano estético”, porquanto, conforme resulta do que acima se expos, entende-se que o dano estético pode/deve ser valorado na dupla vertente de dano não patrimonial e patrimonial, quando, como é o caso, para além da repercussão que tem na vida social, de lazer e estima pessoal do lesado, tem também repercussão na sua capacidade de ganho. 5. Da indemnização ao menor EE Quanto ao menor EE, foi peticionada a quantia de 75.000,00 € para o compensar das dores, do choque, do sofrimento com a separação da mãe, da perda de alimentação por amamentação da mãe, dos tratamentos, das transfusões de sangue e do trauma profundo que sofreu, bem como o pagamento de indemnização a fixar em momento ulterior por eventuais sequelas que se podem ainda revelar. Na sentença, considerando-se não ter resultado provada a probabilidade de ocorrência de sequelas e de, nos termos do n.º 2 do artigo 564º do Código Civil, apenas ser possível atender a danos futuros no cálculo da indemnização se estes forem previsíveis, nada se atribuiu a este título. Quanto aos danos não patrimoniais, atenta a factualidade provada fixou-se a indemnização em € 15.000. Discorda a recorrente, alegando que a atribuição deste montante constitui elevado enriquecimento sem causa, pugnando pela fixação de valor que não exceda os € 1.500. Vejamos: Os factos a considerar a este título são os que constam dos pontos 98.º a 103.º dos factos provados. Assim, importa considerar que: · Em consequência do acidente o menor EE sofreu traumatismo crânio encefálico e pielonefrite aguda, tendo sido assistido no Hospital S. Bernardo em Setúbal. · Atenta a gravidade do seu estado de saúde o menor foi transferido, no próprio dia do acidente, para o Hospital de Santa Maria, em Lisboa onde permaneceu internado até 23/12/2002. · Recebeu alta hospitalar em 23/12/2002 continuando medicado com Cefuroxime até 28/12/2002. · Durante o período de internamento hospitalar o menor foi submetido a uma transfusão de concentrado de eritrócitos devido à fractura parietal direita com hematoma epicraneano volumoso, responsável por queda do valor de hemoglobina (8,72 g). · Sofreu dores muito intensas com a violência do embate e com os tratamentos que lhe ministraram sendo o quantum doloris fixável em 3/7 e sofreu com a separação da mãe. · O menor EE sofreu um défice funcional temporário total entre 17/12/2002 e 23/12/2002, num total de 7 dias e um défice Funcional temporário Parcial entre 24/12/2002 e 28/1/2003 num total de 36 dias, sem défice funcional permanente da integridade físico-psíquica. Perante esta factualidade concordamos com a recorrente de que o montante indemnizatório fixado é exagerado. Na verdade, não obstante o menor ter sofrido traumatismo crânio encefálico e pielnefrite aguda de ter estado internado de 17/12/200, data do acidente, a 23/12/2002, com um défice funcional temporário total de 7 dias e um défice temporário parcial de 36 dias, recuperou sem qualquer défice funcional permanente da sua integridade físico-psíquica. Teve, no entanto, um quantum doloris fixável em 3/7. Por outro lado, não se pode deixar de considerar que, atenta a sua tenra idade – menos de 2 meses à data do acidente -, o sofrimento que se diz ter sofrido pela separação da mãe, não tem especial relevância, pois não se recordará deste facto nem do acidente. Neste contexto, julga-se adequando reduzir a indemnização quanto a danos não patrimoniais para a quantia de € 10.000,00. 6. Dos juros Na sentença condenou-se ainda os RR. a pagarem juros de mora à taxa legal de 4%, a contar da citação. Discorda a recorrente desta condenação, no que toca à indemnização por danos não patrimoniais, enquanto fixa o dies a quo à data da citação – 08/07/2004 – e não à data da sentença, como deveria ser face ao Acórdão de Fixação de Jurisprudência n.º 4/2002, de 9 de Maio (publicado no Diário da República, I Série-A, de 27 de Junho de 2002), que fixou jurisprudência no sentido de: “[s]empre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do artigo 566.º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artigos 805.º, n.º 3 (interpretado restritivamente), e 806.º, n.º 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação.” Com fundamento neste aresto e considerando que os montantes arbitrados a título de danos não patrimoniais se têm que considerar actualizados à data da sentença, pois o tribunal podia/devia atender a esta data, face ao disposto no n.º 2 do artigo 566º do Código Civil, e tinha margem para o fazer por os valores peticionados serem muito superiores aos sentenciados, pede o recorrente que os juros relativos à indemnização por estes danos se conte apenas a partir da sentença, e não da citação. De facto, não se pode considerar que o pedido de indemnização formulado pelos AA. a este título esteja desactualizado, tendo em conta os valores que foram fixados na sentença e que agora foram revistos. Assim, e porque na atribuição dos valores de indemnização a título de danos não patrimoniais se ponderaram os referenciais quantitativos normalmente atendíveis na jurisprudência para indemnização deste tipo de danos à data da sentença, há que concluir que os montantes atribuídos, que ficaram bastante aquém dos peticionados, estão actualizados a esta data, pelo que sobre eles, em aplicação da doutrina do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 4/2002, que se segue, incidem juros moratórios à taxa legal a contar da data da sentença, e não da citação. 7. Deste modo, procede parcialmente a apelação e, em consequência, revoga-se parcialmente a sentença recorrida, em face do que acima se decidiu.*C) - Sumário I - Merecem a tutela do direito, sendo, por isso, indemnizáveis a título de danos não patrimoniais, não só os danos sofridos pelo lesado pelas lesões corporais e dores físicas em consequência do acidente de viação de que foi vítima, mas também pelos danos por este sofridos decorrentes do pânico, desespero e trauma psicológico, com o receio de perda da sua irmã e sobrinho menor, este com menos de 2 meses de idade, que seguiam consigo no veículo acidentado por aquele conduzido. II - O montante da indemnização deve ser fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção as circunstâncias referidas no artigo 494º do Código Civil, que alude ao grau de culpabilidade do agente, à situação económica deste e do lesado e às demais circunstâncias do caso justificativas, sendo que a indemnização por danos não patrimoniais tem por finalidade compensar o lesado, da ofensa imerecida. III - Há lugar à indemnização pela privação de uso de veículo, não só no caso em que o lesado está privado daquele uso enquanto não ocorre a reparação do mesmo, como na situação de perda total do veículo, enquanto o responsável pelo ressarcimento dos danos não pague o valor do bem destruído ou, na falta deste pagamento, pelo tempo razoável para que o lesado possa adquirir um veículo em substituição do anterior. IV - O “dano biológico” tanto pode ser ressarcido como dano patrimonial, como compensado a título de dano moral, tendo a situação que ser apreciada casuisticamente, verificando-se se a lesão originou, no futuro, durante o período activo do lesado ou da vida e, só por si, uma perda da capacidade de ganho ou se traduz, apenas, uma afectação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, para além do agravamento natural resultante da idade. V - Na concretização do montante indemnizatório pela perda da capacidade de ganho, deve adoptar-se a posição maioritária da doutrina, que considera que o recurso a fórmulas matemáticas não constitui um critério absoluto, devendo as mesmas ser aplicadas como meros índices ou parâmetros, que carecem de ser temperados mediante o recurso a um juízo de equidade, uma vez que na avaliação dos prejuízos, o juiz deve atender sempre à multiplicidade e à especificidade das circunstâncias que concorrem no caso concreto e que o tornam único e diferente, além de que não se pode desvincular do critério da equidade que é erigido pelo legislador no artigo 566º, n.º 3 como critério a seguir na fixação deste tipo de indemnização. VI - O dano estético pode/deve ser valorado na dupla vertente de dano não patrimonial e patrimonial, quando, para além da repercussão que tem na vida social, de lazer e estima pessoal do lesado, tem também repercussão na sua capacidade de ganho.* IV – DecisãoNestes termos e com tais fundamentos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência, revogar, nessa parte, a sentença recorrida, condenando os Réus a pagar, solidariamente, com dedução da franquia de € 299, 28 por lesado, quanto ao Réu Fundo de Garantia automóvel: a) À Autora BB, a quantia de € 12.000,00 (doze mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais; b) À Autora CC, a quantia de € 20.572,80 (vinte mil quinhentos e setenta e dois euros e oitenta cêntimos), a título de indemnização por danos patrimoniais, e a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais; c) Ao Autor EE, a quantia de € 10.000,00 (dez mil euros) de indemnização a título de danos não patrimoniais. d) Sobre as quantias atribuídas a título de danos não patrimoniais incidem juros moratórios, à taxa legal, a contar da prolação da sentença em 1ª instância. No mais, permanece inalterada a sentença recorrida, designadamente, quanto aos danos patrimoniais fixados à 1ª Autora, aos juros moratórios incidentes sobre as quantias fixadas a título de danos patrimoniais, e quanto às despesas que se vierem a apurar em liquidação correspondente aos custos da intervenção cirúrgica a que foi submetida a 2ª Autora, que não foram impugnados. Custas a cargo de ambas as partes, na proporção do decaimento.* Évora, 26 de Março de 2015 (Francisco Xavier) (Elisabete Valente) (Cristina Cerdeira)