I- O mediador, no contrato de mediação imobiliária, só tem direito à remuneração convencionada com o comitente/cliente se o negócio visado vier a ser concluído/concretizado e desde que a celebração deste tenha sido o corolário ou a consequência da sua actividade. II- Compete ao mediador-autor a alegação e prova dos pressupostos do seu direito, particularmente da verificação do nexo causal entre a sua actuação (no âmbito da mediação) e a outorga do contrato visado.
Pc. 5408/06.5TBVFR.P1 – 2ª S. (apelação) _________________________ Relator: Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Ramos Lopes Des. Cândido Lemos* * * Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B………………, residente em Sta. Maria de Lamas, instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo sumário, contra C………….. e D………….., residentes em Sta. Maria da Feira, pedindo a condenação destes a pagarem-lhe a quantia de 4 200,00€ (quatro mil e duzentos euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, a partir da citação. Para tal, alegou que: • no exercício da sua actividade de mediação imobiliária é coadjuvada pelo seu pai, E……………, • este foi contactado pelo réu para que conseguisse comprador para o prédio urbano que identifica no art. 2º da p. i., mediante o pagamento de uma comissão de 3% sobre o preço da transacção, • por intermédio de seu pai, obteve comprador para o referido prédio, negociou com ele a respectiva venda e mostrou-lhe o mesmo, • no final das negociações foi celebrado o contrato de compra e venda do imóvel pelo preço de 140 000,00€, • os réus, contudo, não lhe pagaram o preço devido (4 200,00€), • o dito prédio pertencia a ambos os demandados e ambos beneficiaram dos seus (da autora) serviços. Os réus contestaram a acção negando, no essencial, que alguma vez tenham solicitado os serviços da autora e/ou do seu pai para a (ou com vista à) realização do contrato de compra e venda indicado na p. i., ou que algum deles tenha tido qualquer intervenção de mediação na celebração desse mesmo contrato. Pugnaram, por isso, pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido. Saneado o processo, sem selecção, por manifesta simplicidade, da factualidade assente e da base instrutória, realizou-se a audiência de discussão e julgamento e no seu termo, após produção da prova, foi proferido despacho de fixação da matéria de facto considerada provada, sem reclamação das partes. Foi depois proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu os réus do pedido. A autora, inconformada, apelou de tal sentença, tendo concluído as suas alegações do seguinte modo (que se transcrevem, à excepção dos dois primeiros números que aludem à p. i. e aos factos provados na sentença): “1. (…). 2. (…). De Facto: 3. (…) a Autora, neste recurso, nos termos do disposto no art. 685º-B do Código de Processo Civil, impugna a selecção da matéria de facto dada como provada sustentando a sua ampliação, pois considera que, em sede de audiência de discussão e julgamento, as testemunhas E…………, F………… e G………… produziram testemunhos passíveis de, isolada e conjuntamente, corroborarem os factos enunciados pela Autora na sua petição inicial (artigos 4 e 5, invocáveis atenta ao facto de no saneador não se ter quesitado a matéria), leia-se para o efeito as transcrições efectuadas a folhas 4 a 8 deste recurso: - E………..: prova gravada (file:///F:/20090512105224_162199_65097.html#) onde no dia 12-05-2009, pelas 10:46:20, minutos 02:04; 02:55; 03:48; 03:57 e 07:16, conforme transcrições que se reproduziram a fls. 5, 5 e 6 destas alegações; - F……………: prova gravada (file:///F:/20090512105224_162199_65097.html#) onde no dia 12-05-2009, pelas 11:40:47, a minutos 04:20; 12:24; 13:10, conforme transcrições que se reproduziram a fls. 7 destas alegações; - G…………..: prova gravada (file:///F:20090707112939_162199_65097.html#) onde no dia 07-07-2009, pelas 11:29:41, a minutos 07:50 e ss, conforme transcrições que se reproduziram a fls. 7 e 8 destas alegações. 4. Testemunhos que são passíveis de sustentar, portanto, que: - O Sr. E………. levou o Sr. H…………. a ver o imóvel indicado no ponto 3, assim como outros potenciais interessados. - O Sr. E………… propôs a realização de uma permuta de imóveis e conduziu o negócio que se veio a concretizar conforme descrito em 6 e na outorga de uma procuração por parte dos compradores daquele imóvel (H…………. e F…………..) ao seu vendedor, o Réu C……………. 5. Devendo ter sido incluídos na matéria de facto dada como assente e que, por isso, agora se requer a consequente correcção do seu julgamento pois, além do mais, os argumentos invocados pela distinta Juíza do Tribunal a quo para desvalorizar o depoimento da testemunha E………… (“a agência referida em 1 [da matéria assente] a si pertence”) não atenderam ao que se deu como provado no ponto 2 da matéria de facto dada como provada nem ao documento apresentado em sede de audiência que claramente indica a Autora como a proprietária da agência, tudo nos termos do disposto nos artigos 685º-B e 712º do Código do Processo Civil. De Direito: 6. Ademais, sustenta a recorrente que mesmo que assim não fosse, o tribunal, ao contrário do que fez, só com os factos dados por si como provados (…) poderia ter sustentado o preenchimento dos preceitos legais e jurisprudenciais invocados em sede de sentença, dando vencimento às pretensões deduzidas pela Autora, ao contrário do que fez. Situação que sairia reforçada com a matéria de facto que agora se requereu fosse aditada em sede de impugnação, conforme supra enunciado (…). 7. Pois subsumem-se ao disposto nos arts. 19º/1 do DL 77/99, 18º/1 do DL 211/99, de 20/08 e Ac. TRP de 19/2(?), todos os factos que constam dos pontos 1 a 6 da matéria dada como provada e da que por impugnação se requereu a adição, visto que foi E…………., como representante da Autora, quem contactou o R. C………….. dizendo-lhe que tinha um interessado, H……………, para visitar o prédio urbano dos RR., constituído por casa de habitação com anexo e logradouro, inscrito na matriz sob o art. 4264 da freguesia de S. João de Ver, área da comarca de Santa Maria da Feira, que lhe disse que cobrava uma comissão de 3%, ao que o Réu anuiu a que E………. levasse à sua casa o aludido interessado, tendo o referido H………… acabado por celebrar com os RR. escritura pública de compra e venda do referido imóvel, declarando que o preço era de € 140.000. 8. Sustentou, no entanto, o tribunal a quo que não se logrou provar o nexo de causalidade entre a actividade do mediador e a conclusão do negócio visado com a mediação, no entanto, (…) nos pontos 3 a 6 da matéria dada como provada e da que por impugnação se requereu a adição foi o Sr. E…………., representante da Autora, que contactou o Réu marido que, anuindo com o pagamento de uma comissão de 3%, lhe indicou o futuro comprador do imóvel e o levou a visitá-lo. 9. Ora, se colocarmos a clássica questão: - quem é que deu causa ao negócio enunciado no ponto 6 dos factos assentes? Entendemos que a resposta deverá ser: - o Sr. E…………. em representação da Autora! Pois, tendo sido este que apresentou o Sr. H………. ao Réu marido e tendo estes e as respectivas esposas acabado por concluir o negócio por ele descrito em 3 da matéria assente. O facto dos réus terem sido contactados pelo comprador apresentado pela Autora para visitar o imóvel, entendemos mais não ser do que um corolário lógico das actividades prévias à conclusão de um negócio imobiliário. 10. Resposta que resulta reforçada se atendermos à matéria cuja adição se requereu em sede de impugnação no presente recurso. 11. Indicamos, no entanto, que o facto descrito no ponto 8 da matéria dada como provada, ao invés de sustentar a posição sentenciada é, isso sim, um corolário do enunciado no Ac. do TRP de 19/2/2009, publicado em www.dgsi.pt, proc. nº 0837768, sobre a actuação do mediador. Pois esta consistindo “em aproximar duas ou mais partes que desejam realizar um negócio, actuando em nome próprio, e não em representação daquelas, o mediador limita-se a facilitar a conclusão do negócio pretendido”, isto é, os mediadores não (se) substituem aos mediados, limitam-se a facilitar a conclusão do negócio, concedendo, portanto, margem para que estes negoceiem entre si. Nada impedindo, portanto, que estes se contactem e visitem entre si. 12. Razão pela qual também se pugna pelo cumprimento, por parte da Autora, representada pelo Sr. E………. na sua função de mediadora, pois aproximou as duas partes (vide ponto 3 da matéria dada como provada) que acabaram por concretizar o negócio (vide ponto 6 da matéria dada como provada) e actuou em nome próprio e não em representação das partes (facto que possibilitou a situação descrita no ponto 8 da matéria dada como provada). 13. Também como corolário do enunciado supra em ponto 6 e na esteira do que se sublinha no Ac. TRP de 3/3/2009, publicado em www.dgsi.pt, proc. nº 0827745 e no Decreto-Lei nº 211/2004, de 20/08: “a prestação do mediador só fica integralmente realizada e só lhe confere o direito à totalidade da remuneração, se o negócio visado pelo contrato de mediação vier a ser concluído por acção exclusiva do mediador”. Devemos portanto, em consequência, concluir ser devido à Autora todo o valor peticionado pois, como resulta dos factos constantes da matéria dada como provada nos seus pontos 3 a 6, actuando compradores e vendedores do imóvel livremente e de per si não podem ser considerados eles próprios como mediadores. Como as partes se aproximaram por acção do Sr. E……….., representante da Autora, em acto de mediação (cfr. artigo 3º/1 do DL 77/99, de 16/3 e artigo 2º/1 e 2 do actual DL 211/94, de 20/8) e não tendo os Réus logrado provar que a Autora nada fez, deve-se desde logo dar como provada a exclusividade da acção da Autora. 14. Termos em que se deve concluir que o Tribunal a quo julgou mal quando sustentou que “a matéria de facto apurada não é bastante para nos permitir concluir que a actividade da A., por intermédio do seu pai, levou à conclusão do negócio de compra e venda entre H……….. e esposa e os ora RR.. O que vele por dizer que não ficou demonstrada a existência de nexo de causalidade entre a actividade do pai da A. e a celebração do negócio, muito menos se tendo demonstrado que H…………. e esposa adquiriram o imóvel dos RR. em virtude da actividade exclusiva do pai da A., pelo que a pretensão da A. terá necessariamente que soçobrar”. 15. Sentença que, salvo melhor e fundamentada opinião, nos parece padecer de um lapso manifesto atendendo (a) que constam do processo elementos que, só por si, implicam necessariamente uma decisão diversa da proferida e que o juiz do tribunal a quo não tomou em consideração. Nestes termos e (…) face ao exposto se requer que: - Se dê por procedente a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto provada aditando-se a esta os seguintes factos: • O Sr. E………… levou o Sr. H………… a ver o imóvel indicado no ponto 3, assim como outros potenciais interessados. • O Sr. E……….. propôs a realização de uma permuta de imóveis e conduziu o negócio que se veio a concretizar conforme descrito em 6 e na outorga de uma procuração por parte dos compradores daquele imóvel (H………… e F…………) ao seu vendedor, o Réu C………….. (…) - Deve a presente impugnação da decisão relativa à matéria de facto e recurso merecer total provimento e como tal ser a decisão do tribunal de primeira instância alterada em conformidade com o alegado ou ordenada a sua reapreciação/reforma com as legais consequências (…)”. Os réus não apresentaram contra-alegações. Foram colhidos os vistos legais.* * *II. Questões a apreciar e decidir: Sabendo-se que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente (art. 684º nº 3 e 690º nºs 1 e 3 do C.Proc.Civ., na redacção, aqui aplicável, atenta a data da propositura da acção, anterior à entrada em vigor das alterações introduzidas pelo DL 303/2007, de 24/08 – cfr. arts. 11º nº 1, «a contrario» e 12º nº 1 deste DL) e que este Tribunal não pode conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser em situações excepcionais, as questões que importa apreciar e decidir neste acórdão são as seguintes: - Saber se a matéria de facto considerada provada pela 1ª instância deve ser ampliada, com o aditamento dos dois factos indicados pela apelante; - E saber se a sentença recorrida deve ser revogada, julgando-se procedente a pretensão deduzida pela autora, aqui apelante, na petição inicial, por verificação dos pressupostos do contrato de mediação imobiliária.* * *III. Factos provados: Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos: 1) A autora tem uma agência onde, para além do mais, exerce actividade de intermediação de compra e venda de imóveis. 2) Nessa agência trabalha o pai da autora, E…………. 3) E………… contactou o réu C………… dizendo-lhe que tinha um interessado, H…………., para visitar o prédio urbano dos réus, constituído por casa de habitação com anexo e logradouro, inscrito na matriz sob o art. 4264 da freguesia de S. João de Ver, área desta comarca. 4) Mais lhe disse que cobrava uma comissão de 3%. 5) O réu anuiu a que E………… levasse à sua casa o aludido interessado. 6) O referido H……….. acabou por celebrar com os réus escritura pública de compra e venda do imóvel referido em 3, declarando que o preço era de 140 000€. 7) Os réus tinham posto um letreiro no imóvel referido em 3, com a menção “vende-se”. 8) E foram contactados, para além do referido em 3, por H………… para que este visitasse o imóvel.* * *IV. Apreciação das questões indicadas em II: 1. Se a matéria de facto fixada na 1ª instância deve ser ampliada, com aditamento dos dois factos indicados na conclusão nº 4 das alegações da apelante. A autora-apelante, nas primeiras cinco conclusões das suas alegações, impugna a matéria de facto que vem dada como provada, sustentando que a 1ª instância também devia ter considerado provada a factualidade que menciona na conclusão 4 e pretende, por isso, que este Tribunal de 2ª instância a adite ao elenco factológico que vem fixado. Mostram-se cumpridos - considerando em conjunto o corpo da motivação e as conclusões - os ónus impostos pelas als. a) e b) do nº 1 e pelo nº 2 do art. 690º-A do CPC (na dita redacção aqui aplicável), pois a recorrente indicou os concretos factos que considera incorrectamente julgados e quer ver reapreciados, referiu os concretos meios de prova em que assenta a sua discordância com o que foi decidido, fundamentou a sua dissensão e mencionou os segmentos dos registos (cd’s) onde estão gravados os depoimentos em que se estriba. Antes de abordarmos directamente a questão enunciada, importa recordar que o nº 1 do art. 712º do CPC estabelece que “a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação: a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 690º-A, a decisão com base neles proferida; b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas; c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou”. E o nº 2 acrescenta, ainda, que “no caso a que se refere a segunda parte da alínea a) do número anterior, a Relação reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados”. Quanto aos concretos poderes de reapreciação da prova na 2ª instância, particularmente quando está em questão a reapreciação da prova gravada (em sistema vídeo ou áudio), dominou, até há pouco tempo, uma tese restritiva que sustentava que os Tribunais da Relação não podiam procurar uma nova convicção, antes deviam limitar-se a apreciar se a do julgador «a quo», vertida nos factos provados e não provados e na fundamentação desse seu juízo valorativo, tinha suporte razoável no que a gravação permitiria percepcionar e em conjugação com os demais elementos probatórios que os autos fornecessem. Ou seja, o Tribunal da Relação teria que cingir a sua actividade (de reapreciação da matéria de facto) ao apuramento da razoabilidade da convicção do julgador da 1ª instância, restringindo os poderes de alteração da matéria fáctica aos casos de flagrante desconformidade com os elementos de prova disponíveis [neste sentido, cfr., i. a., os Acs. desta Relação do Porto de 10/07/2006, proc. 0653629 e de 29/05/2006, proc. 0650899, publicados in www.dgsi.pt/jtrp; no primeiro decidiu-se que “a apreciação da prova na Relação envolve riscos de valoração de grau mais elevado que os que se correm em 1ª instância, onde são observados os princípios da imediação, da concentração e da oralidade, (…) já que a transcrição dos depoimentos e até a sua audição, quando gravados, não permite colher, por intuição, tudo aquilo que o julgador alcança quando tem a testemunha ou o depoente diante de si”, pois neste caso “pode apreciar as suas reacções, apercebe-se da sua convicção e da espontaneidade ou não do depoimento, do perfil psicológico de quem depõe; em suma, daqueles factores que são decisivos para a convicção de quem julga, que afinal é fundada no juízo que faz acerca da credibilidade dos depoimentos”; no segundo sentenciou-se que “existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencie e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por qualquer outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores”; em sentido idêntico vejam-se, ainda, os Acs. desta Relação de 04/04/2005, proc. 0446934, in www.dgsi.pt/jtrp e do STJ de 20/09/2005, de 27/09/2005 e de 29/11/2005, todos in www.dgsi.pt/jstj]. Mais recentemente formou-se uma tese mais ampla que, embora reconheça que “a gravação dos depoimentos áudio ou vídeo não consegue traduzir tudo quanto pôde ser observado no tribunal «a quo»”, designadamente, o modo como as declarações são prestadas, “as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória” e que existem “aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas são percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia”, entende, ainda assim, que na reapreciação da prova as Relações têm “a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância, devendo proceder à audição dos depoimentos ou fazer incidir as regras da experiência, como efectiva garantia de um segundo grau de jurisdição”. E quando um Tribunal de 2ª instância, ao reapreciar a prova ali produzida, valorando-a de acordo com o princípio da livre convicção (a que também está sujeito), “conseguir formar, relativamente aos concretos pontos impugnados, uma convicção segura acerca da existência de erro de julgamento da matéria de facto, deve proceder à modificação da decisão, fazendo «jus» ao reforço dos poderes que lhe foram atribuídos enquanto tribunal de instância que garante um segundo grau de jurisdição” [assim, Abrantes Geraldes, in “Reforma dos Recursos em Processo Civil”, Revista Julgar, nº 4, Janeiro-Abril/2008, pgs. 69 a 76; idem, mesmo Autor in “Recursos em Processo Civil – Novo Regime”, 2008, pgs. 279 a 286, Amâncio Ferreira, in “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 2008, pg. 228, e Acs. do STJ de 01/07/2008, proc. 08A191, de 25/11/2008, proc. 08A3334, de 12/03/2009, proc. 08B3684 e de 28/05/2009, proc. 4303/05.0TBTVD.S1, todos in www.dgsi.pt/jstj]. Cremos, com o devido respeito pelos defensores da primeira, que é esta segunda orientação que deve ser seguida, pelos mais amplos poderes de reapreciação da prova que confere à 2ª instância, sem descurar, contudo, as limitações atrás referenciadas face ao mais favorável posicionamento do julgador da 1ª instância perante a prova produzida oralmente em julgamento. A apelante entende que o Tribunal «a quo» devia ter dado como provado, além dos que ora estão descritos em III deste acórdão, também os seguintes factos: • que “o Sr. E………. (pai da autora) levou o Sr. H………… (que adquiriu o prédio em questão) a ver o imóvel indicado no ponto 3 (dos factos provados), assim como outros potenciais interessados”; • e que “o Sr. E………. propôs a realização de uma permuta de imóveis e conduziu o negócio que se veio a concretizar conforme descrito em 6 e na outorga de uma procuração por parte dos compradores daquele imóvel (H……….. e F………….) ao seu vendedor, o réu C………….”. O primeiro facto só em parte foi alegado pela autora na petição inicial (único articulado que apresentou), mais propriamente no segmento em que diz ter mostrado o imóvel ao Sr. H………… – cfr. parte final do art. 4º daquela peça processual. O segundo não foi alegado em parte alguma da p. i.. Da contestação dos réus não consta qualquer referência aos factos em questão (não houve outros articulados). Segundo o art. 264º nº 2 do CPC – que concretiza o princípio processual básico do dispositivo -, “o juiz só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes, sem prejuízo do disposto nos arts. 514º e 665 e da consideração, mesmo oficiosa, dos factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa”. Além disso e de acordo com o nº 3 do mesmo preceito, “serão ainda considerados na decisão os factos essenciais à procedência das pretensões formuladas (…) que sejam complemento ou concretização de outros que as partes hajam oportunamente alegado e resultem da instrução e discussão da causa, desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado o exercício do contraditório”. Na mesma linha, estabelece o art. 664º daquele corpo de normas que “o juiz (…) só pode servir-se dos factos articulados pelas partes, sem prejuízo do disposto no artigo 264º”. A regra imposta pelo aludido princípio do dispositivo é, pois, a de que o Juiz só pode, no despacho (ou no acórdão, se o julgamento decorrer perante tribunal colectivo) de fixação da matéria de facto (com ou sem elaboração prévia da base instrutória) e na sentença, ter em conta os factos alegados pelas partes nos articulados. As excepções (ou limitações) a tal princípio são as que constam da 2ª parte do nº 2 e do nº 3 do citado art. 264º. No caso, porém, não está em causa a verificação de nenhuma dessas excepções/limitações. Não está em causa o disposto no art. 514º, por os factos em questão não se reconduzirem a “factos notórios” nem a “factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções” (sendo certo que esta segunda situação demandaria a verificação do pressuposto indicado na parte final do mesmo normativo). Também não está em causa o disposto no art. 665º que se reporta a casos de “uso anormal do processo”. Igualmente não ocorre a excepção prevista na parte final do nº 2 do art. 264º, já que os factos em apreço seriam fundamentais (e não meramente instrumentais) para a procedência da pretensão da demandante, por traduzirem efectiva e relevante concretização do conteúdo do próprio contrato (de mediação imobiliária) em que ela estriba o seu pedido de condenação dos réus a pagarem-lhe a remuneração a que se acha com direito. Finalmente, não se verifica a excepção enunciada no nº 3 do art. 264º na medida em que mesmo que os factos em questão tivessem resultado da instrução/discussão da causa [o que até nem aconteceu, já que tivemos o ensejo de ouvir toda a prova gravada – e não apenas a mencionada pela apelante nas conclusões das suas alegações – e só o pai da autora, E…………., aludiu a parte deles, sendo certo que tal testemunho não podia, nem pode, ser atendido pelo Tribunal – pelo de 1ª instância e, ora, por este Tribunal da Relação –, pelo menos quando não acompanhado pelos depoimentos de outras testemunhas, ante o particular interesse do mesmo no desfecho da acção e pela sua menor isenção daí decorrente, já que muitas vezes, no seu depoimento, se referiu ao escritório/agência de mediação como a “minha empresa”], o Tribunal só poderia tê-los em conta se tivesse sido atempadamente observado o exigido na parte final do referido preceito, ou seja, se a autora tivesse manifestado vontade de deles se aproveitar, o que deveria ter sido feito no decurso da audiência de discussão e julgamento (aquando da produção da prova) mediante requerimento ditado para a acta - e das actas da audiência de julgamento de fls. 85 a 89 e 92 nada consta em tal sentido -, e se a parte contrária (os réus) tivesse, ou pudesse ter, exercido o contraditório. Por não se verificar nenhuma das apontadas excepções (ou limitações), os factos em questão (se o E……….. “levou outros potenciais interessados a ver o imóvel” e se “propôs a realização de uma permuta de imóveis e conduziu o negócio que se veio a concretizar conforme descrito em 6 e na outorga de uma procuração por parte dos compradores daquele imóvel … ao seu vendedor, o réu C…………..”) não podiam ser atendidos pelo Tribunal «a quo», nem o podem ser agora por este Tribunal de 2ª instância, pelo que não pode a apelante querer ver dada como provada factologia que não alegou e que não pode ser considerada. Resta o segmento do facto referido em primeiro lugar pela apelante, na parte em que pretende ver dado como provado que “o Sr. E………… levou o Sr. H……….. a ver o imóvel indicado no ponto 3”. Ouvidos todos os depoimentos prestados em julgamento (e gravados nos dois CD’s juntos à contracapa do processo) – e não apenas os das três testemunhas indicadas pela apelante nas suas alegações -, constatámos o seguinte: • A testemunha E……….. (pai da autora e de cujo depoimento resultaram fundadas dúvidas acerca de quem é o verdadeiro titular do escritório/agência de mediação imobiliária que ele gere sob o nome daquela) começou por dizer que na sequência de conversa que teve com a testemunha G…………. (pai da testemunha H…………… e sogro da testemunha F………….) e após contacto com o réu C…………., foi com aquele (G…………), com os réus e com a testemunha F…………. (mulher de H…………..) ver o prédio urbano em questão, que “eles” (certamente referindo-se ao G………….. e à F………….) depois de o verem logo ficaram com vontade em comprá-lo e que dois dias depois o negócio ficou fechado numa reunião em que intervieram, além dele, os réus e os compradores H………… e F…………. • A testemunha F………… declarou que foi uma primeira vez, com o marido (H………..), ao imóvel dos autos e que foram lá por sua própria iniciativa, pois tinham visto um letreiro, no prédio, a anunciar a sua venda e telefonaram aos réus, cujo número de telefone constava daquele letreiro, tendo combinado directamente com eles essa visita; que nesta estiveram presentes apenas eles e os réus. Acrescentou que numa visita posterior ao imóvel esteve também presente o E………….., a pedido da testemunha G…………, de quem era amigo há mais de oito anos, mas que a intervenção do mesmo se cingiu à questão do preço do prédio, mais propriamente a informar os (então potenciais e depois efectivos) adquirentes da justeza do preço pedido pelos réus pela venda da casa. • A testemunha G………… declarou que o filho (H………..) queria comprar uma casa e que passou pela dos autos que tinha um letreiro (com o número do telefone dos vendedores) a anunciar a sua venda; que logo deu conta disso ao seu filho; que depois (não disse quanto tempo depois, assim como também não referiu que o tivesse feito a pedido ou com conhecimento do filho, nem que este tivesse ficado à espera das diligências dele junto do pai da autora) falou com o E………… (no escritório/agência onde este exerce a sua actividade), de quem era amigo há mais de oito anos, pedindo-lhe para telefonar para o número de telefone que tinha “retirado” do referido anúncio para saber qual era o “preço da casa”; que o E…………. telefonou imediatamente ao réu e perguntou-lhe pelo preço por que estava a vender a dita casa e que tinha um comprador para ela (também lhe disse que estava a ligar de uma agência e que cobrava pela mediação imobiliária 3% do preço da venda); que o réu respondeu ao E………. “traga-me o homem”; que depois comunicou ao seu filho (H…………) que podia ir ao imóvel com o E……….. e que lá se encontraria com os réus; e por aqui terminou o conhecimento directo da testemunha em apreço, pois de seguida limitou-se a dizer que sabe que o filho (e a nora) foi(ram) ao prédio (mas não soube quantas vezes), que pensa que ele se encontrou lá com o E…………. e com os réus (mas não disse que foi o E………….. que o levou, nem que o encontro/visita tenha sido marcado por este último junto dos demandados, assim como desconhece se esse encontro aconteceu na primeira vez que o filho foi ao imóvel ou se numa ida posterior, tendo admitido que o filho possa ter falado directamente com os réus, antes da entrada em cena do E…………, e tenha estado com eles no imóvel antes de aí se encontrar também com este último, face ao que afirmou no início do seu depoimento) e que ele (depoente) não foi ao prédio nenhuma vez (sozinho ou acompanhado de quem quer que fosse, nomeadamente do E…………). Quanto às outras duas testemunhas inquiridas em julgamento: • A testemunha I…………. (que colabora há oito anos com o E………… na actividade de mediação imobiliária) nada demonstrou saber acerca do assunto em referência, pois limitou-se a dizer que viu uma vez o réu C………., no escritório do E…………, a pedir a este que lhe tratasse da venda de uma casa. • E a testemunha H………….. prestou um depoimento em tudo idêntico ao da sua cônjuge, F…………... Joeirando esta prova – e outra não existe nos autos - parece-nos evidente que não podia ter sido dado como provado, nem o pode ser agora, que tenha sido o pai da autora que levou os adquirentes H………. e F………….. ao imóvel ou que tenha sido por intermédio dele que estes chegaram «à fala» com os réus e visitaram o prédio, pois tal circunstancialismo não encontrou acolhimento, directo ou indirecto, nos depoimentos das indicadas testemunhas, à excepção do do próprio pai da autora, mas quanto a este já tivemos ensejo de afirmar, por um lado, as fortes dúvidas com que ficámos acerca da sua isenção enquanto testemunha e, por outro, a menor credibilidade do seu depoimento, pois depôs como que em causa própria, com os perigos daí decorrentes e que demandavam e demandam que a prova não pudesse, nem possa, assentar exclusivamente no seu depoimento. Como tal e sem necessidade de outros considerandos, entendemos não poder deferir a primeira pretensão recursória da apelante, não havendo que aditar ao elenco dos factos provados nenhum dos factos descritos na conclusão 4 das suas alegações, o que significa que se mantém intacta a descrição exarada no ponto III deste acórdão. Improcede, pois, nesta parte, a apelação. * *2. Se a sentença recorrida deve ser revogada, julgando-se procedente a pretensão da autora, por verificação dos pressupostos do contrato de mediação imobiliária. Nas restantes conclusões das suas alegações, a autora-apelante põe em causa a solução jurídica proclamada na sentença recorrida, pretendendo, outrossim, a sua revogação, por considerar que fez incorrecta interpretação dos preceitos legais que indica, atinentes ao contrato de mediação imobiliária, face à factualidade apurada. A autora assentou o seu pedido na celebração de um contrato de mediação imobiliária que diz ter celebrado com os réus (mais propriamente com o réu marido), por intermédio de seu pai (E…………), e no incumprimento, por estes, da obrigação que ficou a cargo deles, de lhe pagarem, de remuneração, 3% do preço por que o imóvel em questão foi vendido pelos demandados aos adquirentes. Embora a autora não tenha situado temporalmente a celebração de tal contrato, podemos facilmente concluir que, face à sua versão, isso ocorreu muito perto da data em que foi celebrada a escritura de compra e venda do imóvel a que os autos aludem, entre os réus e os compradores H……….. e F………….. Como esta foi outorgada a 03/12/2004, conforme se afere do doc. junto a fls. 4 a 8, não haverá grandes dúvidas de que ao caso é aplicável o regime previsto no DL 211/2004, de 20/08 que entrou em vigor, de acordo com o seu art. 58º, a 19/09/2004. Deste diploma importa ter em atenção, para a solução do presente pleito, os seguintes preceitos: • O art. 2º, que dispõe que: “1. A actividade de mediação imobiliária é aquela em que, por contrato, uma empresa se obriga a diligenciar no sentido de conseguir interessado na realização de negócio que vise a constituição ou aquisição de direitos reais sobre imóveis, a permuta, o trespasse ou arrendamento dos mesmos ou a cessão de posição em contratos cujo objecto seja um bem imóvel. 2. A actividade de mediação consubstancia-se no desenvolvimento de: a) Acções de prospecção e recolha de informações que visem encontrar o bem imóvel pretendido pelo cliente; b) Acções de promoção dos bens imóveis sobre os quais o cliente pretenda realizar negócio jurídico, designadamente através da sua divulgação, publicitação ou da realização de leilões. 3. As empresas podem ainda prestar serviços de obtenção de documentação e de informação necessários à concretização dos negócios objecto do contrato de mediação imobiliária, que não estejam legalmente atribuídos, em exclusivo, a outras profissões”. • O art. 18º, que estabelece que “a remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação” (nº 1), excepto nos casos previstos nas duas alíneas do nº 2 que para aqui não interessam (numa das alíneas prescreve-se o direito à remuneração quando o negócio/contrato visado pela mediação (e sendo esta em regime de exclusividade) não se concretiza por causa imputável ao cliente da empresa mediadora, e na outra alínea confere-se igual direito quando a mediação logre a celebração de um contrato-promessa relativo ao negócio visado e as partes tenham previsto o pagamento em tal situação). • E o art. 19º nºs 1 e 8, que estatui que “o contrato de mediação imobiliária está sujeito à forma escrita” (nº 1) e que o incumprimento desta exigência formal “gera a nulidade do contrato, não podendo esta, contudo, ser invocada pela empresa de mediação” (nº 8). Destes normativos decorre, por um lado, que a mediação, em sentido técnico ou estrito, é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a conseguir interessado para determinado negócio (os previstos no primeiro dos citados artigos) incidente sobre bens imóveis e a aproximar esse interessado da outra parte e, por outro, que a função do mediador (que é apenas um intermediário e desenvolve uma actividade meramente material e preparatória – as previstas nas alíneas do nº 2 e no nº 3 do art. 2º) consiste em aproximar duas ou mais partes que desejam realizar um negócio, actuando em nome próprio (e não em representação daquelas), facilitando-lhes a conclusão do negócio pretendido. Mais resulta que o mediador, devido ao risco/álea inerente à actividade comercial da mediação, apenas tem direito a ser remunerado quando a sua actuação determine a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação, o que significa que tem que existir um nexo de causalidade adequada entre a sua actividade e a realização do negócio pretendido, de modo a que possa afirmar-se que a concretização deste foi o corolário ou a consequência daquela actuação [quanto ao que fica exposto, cfr., i. a., Ac. do STJ de 03/04/2008, proc. 07B4498, disponível in www.dgsi.pt/jstj e Acs. desta Relação do Porto de 19/02/2009, proc. 0837769, de 15/07/2009, proc. <a href="https://acordao.pt/decisoes/145268" target="_blank">2187/07.2TBVRL.P1</a> e de 02/11/2009, proc. <a href="https://acordao.pt/decisoes/144971" target="_blank">1913/08.7TJPRT.P1</a>, todos disponíveis in www.dgsi.pt/jtrp e, ainda, Meneses Cordeiro, in “Do Contrato de Mediação”, O Direito, ano 139, III, pgs. 516 e segs.]. Finalmente, o último dos apontados dispositivos impõe, no seu nº 1, a forma escrita para a celebração do contrato de mediação imobiliária, e comina, no nº 8, a nulidade para a inobservância deste formalismo, embora consagrando aí uma modalidade híbrida de tal figura, pois que a mesma não pode ser invocada pelo mediador, nem pode ser oficiosamente declarada pelo Tribunal [como sustenta o Ac. do STJ de 03/04/2008 supra referenciado], apenas podendo ser arguida pelo cliente do mediador, ou seja, pelo comitente, já que [como refere o mesmo douto aresto do STJ] o legislador visou “garantir a melhor protecção do comitente face à entidade mediadora, que exerce profissionalmente a mediação e que tem, por isso, um melhor conhecimento das regras e procedimentos a esta ligados, podendo delas colher vantagens” e visou “estimular e compelir o mediador à observância da forma legal”. No caso, o contrato de mediação imobiliária invocado pela autora não foi reduzido a escrito, o que geraria a sua nulidade formal. Esta, porém, não pode ser declarada já que os réus não a arguíram – só eles poderiam fazê-lo, como se disse – e o Tribunal não pode conhecê-la «ex officio». Não será, pois, pela inobservância da forma legalmente prescrita que a pretensão da autora deixará de proceder. Há, então, que averiguar se os factos provados permitem concluir pela efectiva existência de um contrato de mediação imobiliária celebrado entre a autora e os réus (ou algum deles), pela verificação dos pressupostos legais desse contrato e pelo direito da autora ser remunerada a título de mediadora, sendo certo, como não pode deixar de ser, face ao princípio consagrado no nº 1 do art. 342º do CCiv., que lhe competia a ela (demandante, ora recorrente) a alegação e prova da factualidade integradora do direito que reclama. A sentença recorrida fundamentou a improcedência da acção no entendimento de que “a matéria de facto apurada não é bastante para nos permitir concluir que a actividade da A., por intermédio do seu pai, levou à conclusão do negócio de compra e venda entre H………… e esposa e os ora RR.” (cfr. última folha daquela sentença, correspondente a fls. 98 dos autos). A apelante sustenta, no entanto, que mesmo com a factualidade dada como provada na 1ª instância (sem, portanto, os factos que pretendia ver aditados ao respectivo elenco, apreciados no item anterior deste ponto IV), o Tribunal «a quo» devia ter chegado a solução jurídica diversa, julgando procedente a sua pretensão, por considerar demonstrado o nexo de causalidade entre a actividade que levou a cabo e o negócio/contrato que foi realizado entre os réus e os ditos H………… e mulher. A recorrente, contudo, não tem razão, pois a acção não podia deixar de ser julgada improcedente, como o foi na 1ª instância. Em primeiro lugar – questão que não foi expressamente analisada na sentença recorrida -, por não ser sequer inequívoco que a autora tenha sido parte (tenha celebrado), por intermédio de seu pai, E……….., em qualquer contrato de mediação imobiliária celebrado com os réus (ou apenas com o réu marido), já que apesar de ter ficado provado que o E………….. trabalha na agência (de mediação imobiliária) da demandante (nºs 1 e 2 do ponto III), não ficou, porém, demonstrado que ao actuar pela forma indicada nos nºs 3 a 5 do mesmo ponto III este o tenha feito por sua conta e ao seu serviço (da autora) ou em sua representação. E a autora tinha que fazer prova de que o seu pai agiu em seu nome ou em sua representação. Sem isso ela é estranha ao eventual contrato em discussão nos autos e não tem legitimidade substantiva para reclamar dos réus qualquer remuneração por mediação em que não foi interveniente. Em segundo lugar – admitindo que o seu pai agiu em sua representação -, porque a factologia apurada não permite concluir que o contrato de compra e venda celebrado entre os réus e o casal H……….. e F…………, relativo ao imóvel mencionado em 3 dos factos provados, tenha resultado da actuação desenvolvida pelo E………….. ou, dito de outro modo, permita afirmar-se que a outorga de tal contrato tenha sido o corolário ou a consequência da actividade deste. Isto porque os adquirentes entraram em contacto com os réus (e visitaram o prédio em questão) não só por intermédio dele (E…………), mas também por sua própria iniciativa (por os terem contactado directamente), desconhecendo-se em absoluto se foi devido às diligências que eles levaram a cabo que o contrato de compra e venda do imóvel veio a ser celebrado ou se a efectivação deste se deveu à actuação do pai da demandante (cfr. os nºs 3 a 5, 7 e 8 dos factos provados). E como era a autora que tinha que fazer a prova do nexo causal entre a actividade do seu pai e a outorga do aludido contrato de compra e venda, não podia a acção ter outro desfecho senão o que teve na 1ª instância, de improcedência da pretensão da ora apelante, solução que, por isso, é, aqui e agora, de manter integralmente. Improcede, assim, «in totum, a apelação.* *Síntese do que fica exposto: • O mediador, no contrato de mediação imobiliária, só tem direito à remuneração convencionada com o comitente/cliente se o negócio visado vier a ser concluído/concretizado e desde que a celebração deste tenha sido o corolário ou a consequência da sua actividade. • Compete ao mediador-autor a alegação e prova dos pressupostos do seu direito, particularmente da verificação do nexo causal entre a sua actuação (no âmbito da mediação) e a outorga do contrato visado. • Sem essa prova, a pretensão do mediador tem que improceder.* * *V. Decisão: Nestes termos, os Juízes desta secção cível da Relação do Porto acordam em: 1º) Julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida. 2º) Condenar a apelante nas custas.* * *Porto, 2010/04/13 Manuel Pinto dos Santos João Manuel Araújo Ramos Lopes Cândido Pelágio Castro de Lemos
Pc. 5408/06.5TBVFR.P1 – 2ª S. (apelação) _________________________ Relator: Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Ramos Lopes Des. Cândido Lemos* * * Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B………………, residente em Sta. Maria de Lamas, instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo sumário, contra C………….. e D………….., residentes em Sta. Maria da Feira, pedindo a condenação destes a pagarem-lhe a quantia de 4 200,00€ (quatro mil e duzentos euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, a partir da citação. Para tal, alegou que: • no exercício da sua actividade de mediação imobiliária é coadjuvada pelo seu pai, E……………, • este foi contactado pelo réu para que conseguisse comprador para o prédio urbano que identifica no art. 2º da p. i., mediante o pagamento de uma comissão de 3% sobre o preço da transacção, • por intermédio de seu pai, obteve comprador para o referido prédio, negociou com ele a respectiva venda e mostrou-lhe o mesmo, • no final das negociações foi celebrado o contrato de compra e venda do imóvel pelo preço de 140 000,00€, • os réus, contudo, não lhe pagaram o preço devido (4 200,00€), • o dito prédio pertencia a ambos os demandados e ambos beneficiaram dos seus (da autora) serviços. Os réus contestaram a acção negando, no essencial, que alguma vez tenham solicitado os serviços da autora e/ou do seu pai para a (ou com vista à) realização do contrato de compra e venda indicado na p. i., ou que algum deles tenha tido qualquer intervenção de mediação na celebração desse mesmo contrato. Pugnaram, por isso, pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido. Saneado o processo, sem selecção, por manifesta simplicidade, da factualidade assente e da base instrutória, realizou-se a audiência de discussão e julgamento e no seu termo, após produção da prova, foi proferido despacho de fixação da matéria de facto considerada provada, sem reclamação das partes. Foi depois proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu os réus do pedido. A autora, inconformada, apelou de tal sentença, tendo concluído as suas alegações do seguinte modo (que se transcrevem, à excepção dos dois primeiros números que aludem à p. i. e aos factos provados na sentença): “1. (…). 2. (…). De Facto: 3. (…) a Autora, neste recurso, nos termos do disposto no art. 685º-B do Código de Processo Civil, impugna a selecção da matéria de facto dada como provada sustentando a sua ampliação, pois considera que, em sede de audiência de discussão e julgamento, as testemunhas E…………, F………… e G………… produziram testemunhos passíveis de, isolada e conjuntamente, corroborarem os factos enunciados pela Autora na sua petição inicial (artigos 4 e 5, invocáveis atenta ao facto de no saneador não se ter quesitado a matéria), leia-se para o efeito as transcrições efectuadas a folhas 4 a 8 deste recurso: - E………..: prova gravada (file:///F:/20090512105224_162199_65097.html#) onde no dia 12-05-2009, pelas 10:46:20, minutos 02:04; 02:55; 03:48; 03:57 e 07:16, conforme transcrições que se reproduziram a fls. 5, 5 e 6 destas alegações; - F……………: prova gravada (file:///F:/20090512105224_162199_65097.html#) onde no dia 12-05-2009, pelas 11:40:47, a minutos 04:20; 12:24; 13:10, conforme transcrições que se reproduziram a fls. 7 destas alegações; - G…………..: prova gravada (file:///F:20090707112939_162199_65097.html#) onde no dia 07-07-2009, pelas 11:29:41, a minutos 07:50 e ss, conforme transcrições que se reproduziram a fls. 7 e 8 destas alegações. 4. Testemunhos que são passíveis de sustentar, portanto, que: - O Sr. E………. levou o Sr. H…………. a ver o imóvel indicado no ponto 3, assim como outros potenciais interessados. - O Sr. E………… propôs a realização de uma permuta de imóveis e conduziu o negócio que se veio a concretizar conforme descrito em 6 e na outorga de uma procuração por parte dos compradores daquele imóvel (H…………. e F…………..) ao seu vendedor, o Réu C……………. 5. Devendo ter sido incluídos na matéria de facto dada como assente e que, por isso, agora se requer a consequente correcção do seu julgamento pois, além do mais, os argumentos invocados pela distinta Juíza do Tribunal a quo para desvalorizar o depoimento da testemunha E………… (“a agência referida em 1 [da matéria assente] a si pertence”) não atenderam ao que se deu como provado no ponto 2 da matéria de facto dada como provada nem ao documento apresentado em sede de audiência que claramente indica a Autora como a proprietária da agência, tudo nos termos do disposto nos artigos 685º-B e 712º do Código do Processo Civil. De Direito: 6. Ademais, sustenta a recorrente que mesmo que assim não fosse, o tribunal, ao contrário do que fez, só com os factos dados por si como provados (…) poderia ter sustentado o preenchimento dos preceitos legais e jurisprudenciais invocados em sede de sentença, dando vencimento às pretensões deduzidas pela Autora, ao contrário do que fez. Situação que sairia reforçada com a matéria de facto que agora se requereu fosse aditada em sede de impugnação, conforme supra enunciado (…). 7. Pois subsumem-se ao disposto nos arts. 19º/1 do DL 77/99, 18º/1 do DL 211/99, de 20/08 e Ac. TRP de 19/2(?), todos os factos que constam dos pontos 1 a 6 da matéria dada como provada e da que por impugnação se requereu a adição, visto que foi E…………., como representante da Autora, quem contactou o R. C………….. dizendo-lhe que tinha um interessado, H……………, para visitar o prédio urbano dos RR., constituído por casa de habitação com anexo e logradouro, inscrito na matriz sob o art. 4264 da freguesia de S. João de Ver, área da comarca de Santa Maria da Feira, que lhe disse que cobrava uma comissão de 3%, ao que o Réu anuiu a que E………. levasse à sua casa o aludido interessado, tendo o referido H………… acabado por celebrar com os RR. escritura pública de compra e venda do referido imóvel, declarando que o preço era de € 140.000. 8. Sustentou, no entanto, o tribunal a quo que não se logrou provar o nexo de causalidade entre a actividade do mediador e a conclusão do negócio visado com a mediação, no entanto, (…) nos pontos 3 a 6 da matéria dada como provada e da que por impugnação se requereu a adição foi o Sr. E…………., representante da Autora, que contactou o Réu marido que, anuindo com o pagamento de uma comissão de 3%, lhe indicou o futuro comprador do imóvel e o levou a visitá-lo. 9. Ora, se colocarmos a clássica questão: - quem é que deu causa ao negócio enunciado no ponto 6 dos factos assentes? Entendemos que a resposta deverá ser: - o Sr. E…………. em representação da Autora! Pois, tendo sido este que apresentou o Sr. H………. ao Réu marido e tendo estes e as respectivas esposas acabado por concluir o negócio por ele descrito em 3 da matéria assente. O facto dos réus terem sido contactados pelo comprador apresentado pela Autora para visitar o imóvel, entendemos mais não ser do que um corolário lógico das actividades prévias à conclusão de um negócio imobiliário. 10. Resposta que resulta reforçada se atendermos à matéria cuja adição se requereu em sede de impugnação no presente recurso. 11. Indicamos, no entanto, que o facto descrito no ponto 8 da matéria dada como provada, ao invés de sustentar a posição sentenciada é, isso sim, um corolário do enunciado no Ac. do TRP de 19/2/2009, publicado em www.dgsi.pt, proc. nº 0837768, sobre a actuação do mediador. Pois esta consistindo “em aproximar duas ou mais partes que desejam realizar um negócio, actuando em nome próprio, e não em representação daquelas, o mediador limita-se a facilitar a conclusão do negócio pretendido”, isto é, os mediadores não (se) substituem aos mediados, limitam-se a facilitar a conclusão do negócio, concedendo, portanto, margem para que estes negoceiem entre si. Nada impedindo, portanto, que estes se contactem e visitem entre si. 12. Razão pela qual também se pugna pelo cumprimento, por parte da Autora, representada pelo Sr. E………. na sua função de mediadora, pois aproximou as duas partes (vide ponto 3 da matéria dada como provada) que acabaram por concretizar o negócio (vide ponto 6 da matéria dada como provada) e actuou em nome próprio e não em representação das partes (facto que possibilitou a situação descrita no ponto 8 da matéria dada como provada). 13. Também como corolário do enunciado supra em ponto 6 e na esteira do que se sublinha no Ac. TRP de 3/3/2009, publicado em www.dgsi.pt, proc. nº 0827745 e no Decreto-Lei nº 211/2004, de 20/08: “a prestação do mediador só fica integralmente realizada e só lhe confere o direito à totalidade da remuneração, se o negócio visado pelo contrato de mediação vier a ser concluído por acção exclusiva do mediador”. Devemos portanto, em consequência, concluir ser devido à Autora todo o valor peticionado pois, como resulta dos factos constantes da matéria dada como provada nos seus pontos 3 a 6, actuando compradores e vendedores do imóvel livremente e de per si não podem ser considerados eles próprios como mediadores. Como as partes se aproximaram por acção do Sr. E……….., representante da Autora, em acto de mediação (cfr. artigo 3º/1 do DL 77/99, de 16/3 e artigo 2º/1 e 2 do actual DL 211/94, de 20/8) e não tendo os Réus logrado provar que a Autora nada fez, deve-se desde logo dar como provada a exclusividade da acção da Autora. 14. Termos em que se deve concluir que o Tribunal a quo julgou mal quando sustentou que “a matéria de facto apurada não é bastante para nos permitir concluir que a actividade da A., por intermédio do seu pai, levou à conclusão do negócio de compra e venda entre H……….. e esposa e os ora RR.. O que vele por dizer que não ficou demonstrada a existência de nexo de causalidade entre a actividade do pai da A. e a celebração do negócio, muito menos se tendo demonstrado que H…………. e esposa adquiriram o imóvel dos RR. em virtude da actividade exclusiva do pai da A., pelo que a pretensão da A. terá necessariamente que soçobrar”. 15. Sentença que, salvo melhor e fundamentada opinião, nos parece padecer de um lapso manifesto atendendo (a) que constam do processo elementos que, só por si, implicam necessariamente uma decisão diversa da proferida e que o juiz do tribunal a quo não tomou em consideração. Nestes termos e (…) face ao exposto se requer que: - Se dê por procedente a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto provada aditando-se a esta os seguintes factos: • O Sr. E………… levou o Sr. H………… a ver o imóvel indicado no ponto 3, assim como outros potenciais interessados. • O Sr. E……….. propôs a realização de uma permuta de imóveis e conduziu o negócio que se veio a concretizar conforme descrito em 6 e na outorga de uma procuração por parte dos compradores daquele imóvel (H………… e F…………) ao seu vendedor, o Réu C………….. (…) - Deve a presente impugnação da decisão relativa à matéria de facto e recurso merecer total provimento e como tal ser a decisão do tribunal de primeira instância alterada em conformidade com o alegado ou ordenada a sua reapreciação/reforma com as legais consequências (…)”. Os réus não apresentaram contra-alegações. Foram colhidos os vistos legais.* * *II. Questões a apreciar e decidir: Sabendo-se que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente (art. 684º nº 3 e 690º nºs 1 e 3 do C.Proc.Civ., na redacção, aqui aplicável, atenta a data da propositura da acção, anterior à entrada em vigor das alterações introduzidas pelo DL 303/2007, de 24/08 – cfr. arts. 11º nº 1, «a contrario» e 12º nº 1 deste DL) e que este Tribunal não pode conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser em situações excepcionais, as questões que importa apreciar e decidir neste acórdão são as seguintes: - Saber se a matéria de facto considerada provada pela 1ª instância deve ser ampliada, com o aditamento dos dois factos indicados pela apelante; - E saber se a sentença recorrida deve ser revogada, julgando-se procedente a pretensão deduzida pela autora, aqui apelante, na petição inicial, por verificação dos pressupostos do contrato de mediação imobiliária.* * *III. Factos provados: Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos: 1) A autora tem uma agência onde, para além do mais, exerce actividade de intermediação de compra e venda de imóveis. 2) Nessa agência trabalha o pai da autora, E…………. 3) E………… contactou o réu C………… dizendo-lhe que tinha um interessado, H…………., para visitar o prédio urbano dos réus, constituído por casa de habitação com anexo e logradouro, inscrito na matriz sob o art. 4264 da freguesia de S. João de Ver, área desta comarca. 4) Mais lhe disse que cobrava uma comissão de 3%. 5) O réu anuiu a que E………… levasse à sua casa o aludido interessado. 6) O referido H……….. acabou por celebrar com os réus escritura pública de compra e venda do imóvel referido em 3, declarando que o preço era de 140 000€. 7) Os réus tinham posto um letreiro no imóvel referido em 3, com a menção “vende-se”. 8) E foram contactados, para além do referido em 3, por H………… para que este visitasse o imóvel.* * *IV. Apreciação das questões indicadas em II: 1. Se a matéria de facto fixada na 1ª instância deve ser ampliada, com aditamento dos dois factos indicados na conclusão nº 4 das alegações da apelante. A autora-apelante, nas primeiras cinco conclusões das suas alegações, impugna a matéria de facto que vem dada como provada, sustentando que a 1ª instância também devia ter considerado provada a factualidade que menciona na conclusão 4 e pretende, por isso, que este Tribunal de 2ª instância a adite ao elenco factológico que vem fixado. Mostram-se cumpridos - considerando em conjunto o corpo da motivação e as conclusões - os ónus impostos pelas als. a) e b) do nº 1 e pelo nº 2 do art. 690º-A do CPC (na dita redacção aqui aplicável), pois a recorrente indicou os concretos factos que considera incorrectamente julgados e quer ver reapreciados, referiu os concretos meios de prova em que assenta a sua discordância com o que foi decidido, fundamentou a sua dissensão e mencionou os segmentos dos registos (cd’s) onde estão gravados os depoimentos em que se estriba. Antes de abordarmos directamente a questão enunciada, importa recordar que o nº 1 do art. 712º do CPC estabelece que “a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação: a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 690º-A, a decisão com base neles proferida; b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas; c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou”. E o nº 2 acrescenta, ainda, que “no caso a que se refere a segunda parte da alínea a) do número anterior, a Relação reaprecia as provas em que assentou a parte impugnada da decisão, tendo em atenção o conteúdo das alegações de recorrente e recorrido, sem prejuízo de oficiosamente atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados”. Quanto aos concretos poderes de reapreciação da prova na 2ª instância, particularmente quando está em questão a reapreciação da prova gravada (em sistema vídeo ou áudio), dominou, até há pouco tempo, uma tese restritiva que sustentava que os Tribunais da Relação não podiam procurar uma nova convicção, antes deviam limitar-se a apreciar se a do julgador «a quo», vertida nos factos provados e não provados e na fundamentação desse seu juízo valorativo, tinha suporte razoável no que a gravação permitiria percepcionar e em conjugação com os demais elementos probatórios que os autos fornecessem. Ou seja, o Tribunal da Relação teria que cingir a sua actividade (de reapreciação da matéria de facto) ao apuramento da razoabilidade da convicção do julgador da 1ª instância, restringindo os poderes de alteração da matéria fáctica aos casos de flagrante desconformidade com os elementos de prova disponíveis [neste sentido, cfr., i. a., os Acs. desta Relação do Porto de 10/07/2006, proc. 0653629 e de 29/05/2006, proc. 0650899, publicados in www.dgsi.pt/jtrp; no primeiro decidiu-se que “a apreciação da prova na Relação envolve riscos de valoração de grau mais elevado que os que se correm em 1ª instância, onde são observados os princípios da imediação, da concentração e da oralidade, (…) já que a transcrição dos depoimentos e até a sua audição, quando gravados, não permite colher, por intuição, tudo aquilo que o julgador alcança quando tem a testemunha ou o depoente diante de si”, pois neste caso “pode apreciar as suas reacções, apercebe-se da sua convicção e da espontaneidade ou não do depoimento, do perfil psicológico de quem depõe; em suma, daqueles factores que são decisivos para a convicção de quem julga, que afinal é fundada no juízo que faz acerca da credibilidade dos depoimentos”; no segundo sentenciou-se que “existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencie e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por qualquer outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores”; em sentido idêntico vejam-se, ainda, os Acs. desta Relação de 04/04/2005, proc. 0446934, in www.dgsi.pt/jtrp e do STJ de 20/09/2005, de 27/09/2005 e de 29/11/2005, todos in www.dgsi.pt/jstj]. Mais recentemente formou-se uma tese mais ampla que, embora reconheça que “a gravação dos depoimentos áudio ou vídeo não consegue traduzir tudo quanto pôde ser observado no tribunal «a quo»”, designadamente, o modo como as declarações são prestadas, “as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória” e que existem “aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas são percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia”, entende, ainda assim, que na reapreciação da prova as Relações têm “a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância, devendo proceder à audição dos depoimentos ou fazer incidir as regras da experiência, como efectiva garantia de um segundo grau de jurisdição”. E quando um Tribunal de 2ª instância, ao reapreciar a prova ali produzida, valorando-a de acordo com o princípio da livre convicção (a que também está sujeito), “conseguir formar, relativamente aos concretos pontos impugnados, uma convicção segura acerca da existência de erro de julgamento da matéria de facto, deve proceder à modificação da decisão, fazendo «jus» ao reforço dos poderes que lhe foram atribuídos enquanto tribunal de instância que garante um segundo grau de jurisdição” [assim, Abrantes Geraldes, in “Reforma dos Recursos em Processo Civil”, Revista Julgar, nº 4, Janeiro-Abril/2008, pgs. 69 a 76; idem, mesmo Autor in “Recursos em Processo Civil – Novo Regime”, 2008, pgs. 279 a 286, Amâncio Ferreira, in “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 2008, pg. 228, e Acs. do STJ de 01/07/2008, proc. 08A191, de 25/11/2008, proc. 08A3334, de 12/03/2009, proc. 08B3684 e de 28/05/2009, proc. 4303/05.0TBTVD.S1, todos in www.dgsi.pt/jstj]. Cremos, com o devido respeito pelos defensores da primeira, que é esta segunda orientação que deve ser seguida, pelos mais amplos poderes de reapreciação da prova que confere à 2ª instância, sem descurar, contudo, as limitações atrás referenciadas face ao mais favorável posicionamento do julgador da 1ª instância perante a prova produzida oralmente em julgamento. A apelante entende que o Tribunal «a quo» devia ter dado como provado, além dos que ora estão descritos em III deste acórdão, também os seguintes factos: • que “o Sr. E………. (pai da autora) levou o Sr. H………… (que adquiriu o prédio em questão) a ver o imóvel indicado no ponto 3 (dos factos provados), assim como outros potenciais interessados”; • e que “o Sr. E………. propôs a realização de uma permuta de imóveis e conduziu o negócio que se veio a concretizar conforme descrito em 6 e na outorga de uma procuração por parte dos compradores daquele imóvel (H……….. e F………….) ao seu vendedor, o réu C………….”. O primeiro facto só em parte foi alegado pela autora na petição inicial (único articulado que apresentou), mais propriamente no segmento em que diz ter mostrado o imóvel ao Sr. H………… – cfr. parte final do art. 4º daquela peça processual. O segundo não foi alegado em parte alguma da p. i.. Da contestação dos réus não consta qualquer referência aos factos em questão (não houve outros articulados). Segundo o art. 264º nº 2 do CPC – que concretiza o princípio processual básico do dispositivo -, “o juiz só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes, sem prejuízo do disposto nos arts. 514º e 665 e da consideração, mesmo oficiosa, dos factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa”. Além disso e de acordo com o nº 3 do mesmo preceito, “serão ainda considerados na decisão os factos essenciais à procedência das pretensões formuladas (…) que sejam complemento ou concretização de outros que as partes hajam oportunamente alegado e resultem da instrução e discussão da causa, desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado o exercício do contraditório”. Na mesma linha, estabelece o art. 664º daquele corpo de normas que “o juiz (…) só pode servir-se dos factos articulados pelas partes, sem prejuízo do disposto no artigo 264º”. A regra imposta pelo aludido princípio do dispositivo é, pois, a de que o Juiz só pode, no despacho (ou no acórdão, se o julgamento decorrer perante tribunal colectivo) de fixação da matéria de facto (com ou sem elaboração prévia da base instrutória) e na sentença, ter em conta os factos alegados pelas partes nos articulados. As excepções (ou limitações) a tal princípio são as que constam da 2ª parte do nº 2 e do nº 3 do citado art. 264º. No caso, porém, não está em causa a verificação de nenhuma dessas excepções/limitações. Não está em causa o disposto no art. 514º, por os factos em questão não se reconduzirem a “factos notórios” nem a “factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções” (sendo certo que esta segunda situação demandaria a verificação do pressuposto indicado na parte final do mesmo normativo). Também não está em causa o disposto no art. 665º que se reporta a casos de “uso anormal do processo”. Igualmente não ocorre a excepção prevista na parte final do nº 2 do art. 264º, já que os factos em apreço seriam fundamentais (e não meramente instrumentais) para a procedência da pretensão da demandante, por traduzirem efectiva e relevante concretização do conteúdo do próprio contrato (de mediação imobiliária) em que ela estriba o seu pedido de condenação dos réus a pagarem-lhe a remuneração a que se acha com direito. Finalmente, não se verifica a excepção enunciada no nº 3 do art. 264º na medida em que mesmo que os factos em questão tivessem resultado da instrução/discussão da causa [o que até nem aconteceu, já que tivemos o ensejo de ouvir toda a prova gravada – e não apenas a mencionada pela apelante nas conclusões das suas alegações – e só o pai da autora, E…………., aludiu a parte deles, sendo certo que tal testemunho não podia, nem pode, ser atendido pelo Tribunal – pelo de 1ª instância e, ora, por este Tribunal da Relação –, pelo menos quando não acompanhado pelos depoimentos de outras testemunhas, ante o particular interesse do mesmo no desfecho da acção e pela sua menor isenção daí decorrente, já que muitas vezes, no seu depoimento, se referiu ao escritório/agência de mediação como a “minha empresa”], o Tribunal só poderia tê-los em conta se tivesse sido atempadamente observado o exigido na parte final do referido preceito, ou seja, se a autora tivesse manifestado vontade de deles se aproveitar, o que deveria ter sido feito no decurso da audiência de discussão e julgamento (aquando da produção da prova) mediante requerimento ditado para a acta - e das actas da audiência de julgamento de fls. 85 a 89 e 92 nada consta em tal sentido -, e se a parte contrária (os réus) tivesse, ou pudesse ter, exercido o contraditório. Por não se verificar nenhuma das apontadas excepções (ou limitações), os factos em questão (se o E……….. “levou outros potenciais interessados a ver o imóvel” e se “propôs a realização de uma permuta de imóveis e conduziu o negócio que se veio a concretizar conforme descrito em 6 e na outorga de uma procuração por parte dos compradores daquele imóvel … ao seu vendedor, o réu C…………..”) não podiam ser atendidos pelo Tribunal «a quo», nem o podem ser agora por este Tribunal de 2ª instância, pelo que não pode a apelante querer ver dada como provada factologia que não alegou e que não pode ser considerada. Resta o segmento do facto referido em primeiro lugar pela apelante, na parte em que pretende ver dado como provado que “o Sr. E………… levou o Sr. H……….. a ver o imóvel indicado no ponto 3”. Ouvidos todos os depoimentos prestados em julgamento (e gravados nos dois CD’s juntos à contracapa do processo) – e não apenas os das três testemunhas indicadas pela apelante nas suas alegações -, constatámos o seguinte: • A testemunha E……….. (pai da autora e de cujo depoimento resultaram fundadas dúvidas acerca de quem é o verdadeiro titular do escritório/agência de mediação imobiliária que ele gere sob o nome daquela) começou por dizer que na sequência de conversa que teve com a testemunha G…………. (pai da testemunha H…………… e sogro da testemunha F………….) e após contacto com o réu C…………., foi com aquele (G…………), com os réus e com a testemunha F…………. (mulher de H…………..) ver o prédio urbano em questão, que “eles” (certamente referindo-se ao G………….. e à F………….) depois de o verem logo ficaram com vontade em comprá-lo e que dois dias depois o negócio ficou fechado numa reunião em que intervieram, além dele, os réus e os compradores H………… e F…………. • A testemunha F………… declarou que foi uma primeira vez, com o marido (H………..), ao imóvel dos autos e que foram lá por sua própria iniciativa, pois tinham visto um letreiro, no prédio, a anunciar a sua venda e telefonaram aos réus, cujo número de telefone constava daquele letreiro, tendo combinado directamente com eles essa visita; que nesta estiveram presentes apenas eles e os réus. Acrescentou que numa visita posterior ao imóvel esteve também presente o E………….., a pedido da testemunha G…………, de quem era amigo há mais de oito anos, mas que a intervenção do mesmo se cingiu à questão do preço do prédio, mais propriamente a informar os (então potenciais e depois efectivos) adquirentes da justeza do preço pedido pelos réus pela venda da casa. • A testemunha G………… declarou que o filho (H………..) queria comprar uma casa e que passou pela dos autos que tinha um letreiro (com o número do telefone dos vendedores) a anunciar a sua venda; que logo deu conta disso ao seu filho; que depois (não disse quanto tempo depois, assim como também não referiu que o tivesse feito a pedido ou com conhecimento do filho, nem que este tivesse ficado à espera das diligências dele junto do pai da autora) falou com o E………… (no escritório/agência onde este exerce a sua actividade), de quem era amigo há mais de oito anos, pedindo-lhe para telefonar para o número de telefone que tinha “retirado” do referido anúncio para saber qual era o “preço da casa”; que o E…………. telefonou imediatamente ao réu e perguntou-lhe pelo preço por que estava a vender a dita casa e que tinha um comprador para ela (também lhe disse que estava a ligar de uma agência e que cobrava pela mediação imobiliária 3% do preço da venda); que o réu respondeu ao E………. “traga-me o homem”; que depois comunicou ao seu filho (H…………) que podia ir ao imóvel com o E……….. e que lá se encontraria com os réus; e por aqui terminou o conhecimento directo da testemunha em apreço, pois de seguida limitou-se a dizer que sabe que o filho (e a nora) foi(ram) ao prédio (mas não soube quantas vezes), que pensa que ele se encontrou lá com o E…………. e com os réus (mas não disse que foi o E………….. que o levou, nem que o encontro/visita tenha sido marcado por este último junto dos demandados, assim como desconhece se esse encontro aconteceu na primeira vez que o filho foi ao imóvel ou se numa ida posterior, tendo admitido que o filho possa ter falado directamente com os réus, antes da entrada em cena do E…………, e tenha estado com eles no imóvel antes de aí se encontrar também com este último, face ao que afirmou no início do seu depoimento) e que ele (depoente) não foi ao prédio nenhuma vez (sozinho ou acompanhado de quem quer que fosse, nomeadamente do E…………). Quanto às outras duas testemunhas inquiridas em julgamento: • A testemunha I…………. (que colabora há oito anos com o E………… na actividade de mediação imobiliária) nada demonstrou saber acerca do assunto em referência, pois limitou-se a dizer que viu uma vez o réu C………., no escritório do E…………, a pedir a este que lhe tratasse da venda de uma casa. • E a testemunha H………….. prestou um depoimento em tudo idêntico ao da sua cônjuge, F…………... Joeirando esta prova – e outra não existe nos autos - parece-nos evidente que não podia ter sido dado como provado, nem o pode ser agora, que tenha sido o pai da autora que levou os adquirentes H………. e F………….. ao imóvel ou que tenha sido por intermédio dele que estes chegaram «à fala» com os réus e visitaram o prédio, pois tal circunstancialismo não encontrou acolhimento, directo ou indirecto, nos depoimentos das indicadas testemunhas, à excepção do do próprio pai da autora, mas quanto a este já tivemos ensejo de afirmar, por um lado, as fortes dúvidas com que ficámos acerca da sua isenção enquanto testemunha e, por outro, a menor credibilidade do seu depoimento, pois depôs como que em causa própria, com os perigos daí decorrentes e que demandavam e demandam que a prova não pudesse, nem possa, assentar exclusivamente no seu depoimento. Como tal e sem necessidade de outros considerandos, entendemos não poder deferir a primeira pretensão recursória da apelante, não havendo que aditar ao elenco dos factos provados nenhum dos factos descritos na conclusão 4 das suas alegações, o que significa que se mantém intacta a descrição exarada no ponto III deste acórdão. Improcede, pois, nesta parte, a apelação. * *2. Se a sentença recorrida deve ser revogada, julgando-se procedente a pretensão da autora, por verificação dos pressupostos do contrato de mediação imobiliária. Nas restantes conclusões das suas alegações, a autora-apelante põe em causa a solução jurídica proclamada na sentença recorrida, pretendendo, outrossim, a sua revogação, por considerar que fez incorrecta interpretação dos preceitos legais que indica, atinentes ao contrato de mediação imobiliária, face à factualidade apurada. A autora assentou o seu pedido na celebração de um contrato de mediação imobiliária que diz ter celebrado com os réus (mais propriamente com o réu marido), por intermédio de seu pai (E…………), e no incumprimento, por estes, da obrigação que ficou a cargo deles, de lhe pagarem, de remuneração, 3% do preço por que o imóvel em questão foi vendido pelos demandados aos adquirentes. Embora a autora não tenha situado temporalmente a celebração de tal contrato, podemos facilmente concluir que, face à sua versão, isso ocorreu muito perto da data em que foi celebrada a escritura de compra e venda do imóvel a que os autos aludem, entre os réus e os compradores H……….. e F………….. Como esta foi outorgada a 03/12/2004, conforme se afere do doc. junto a fls. 4 a 8, não haverá grandes dúvidas de que ao caso é aplicável o regime previsto no DL 211/2004, de 20/08 que entrou em vigor, de acordo com o seu art. 58º, a 19/09/2004. Deste diploma importa ter em atenção, para a solução do presente pleito, os seguintes preceitos: • O art. 2º, que dispõe que: “1. A actividade de mediação imobiliária é aquela em que, por contrato, uma empresa se obriga a diligenciar no sentido de conseguir interessado na realização de negócio que vise a constituição ou aquisição de direitos reais sobre imóveis, a permuta, o trespasse ou arrendamento dos mesmos ou a cessão de posição em contratos cujo objecto seja um bem imóvel. 2. A actividade de mediação consubstancia-se no desenvolvimento de: a) Acções de prospecção e recolha de informações que visem encontrar o bem imóvel pretendido pelo cliente; b) Acções de promoção dos bens imóveis sobre os quais o cliente pretenda realizar negócio jurídico, designadamente através da sua divulgação, publicitação ou da realização de leilões. 3. As empresas podem ainda prestar serviços de obtenção de documentação e de informação necessários à concretização dos negócios objecto do contrato de mediação imobiliária, que não estejam legalmente atribuídos, em exclusivo, a outras profissões”. • O art. 18º, que estabelece que “a remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação” (nº 1), excepto nos casos previstos nas duas alíneas do nº 2 que para aqui não interessam (numa das alíneas prescreve-se o direito à remuneração quando o negócio/contrato visado pela mediação (e sendo esta em regime de exclusividade) não se concretiza por causa imputável ao cliente da empresa mediadora, e na outra alínea confere-se igual direito quando a mediação logre a celebração de um contrato-promessa relativo ao negócio visado e as partes tenham previsto o pagamento em tal situação). • E o art. 19º nºs 1 e 8, que estatui que “o contrato de mediação imobiliária está sujeito à forma escrita” (nº 1) e que o incumprimento desta exigência formal “gera a nulidade do contrato, não podendo esta, contudo, ser invocada pela empresa de mediação” (nº 8). Destes normativos decorre, por um lado, que a mediação, em sentido técnico ou estrito, é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a conseguir interessado para determinado negócio (os previstos no primeiro dos citados artigos) incidente sobre bens imóveis e a aproximar esse interessado da outra parte e, por outro, que a função do mediador (que é apenas um intermediário e desenvolve uma actividade meramente material e preparatória – as previstas nas alíneas do nº 2 e no nº 3 do art. 2º) consiste em aproximar duas ou mais partes que desejam realizar um negócio, actuando em nome próprio (e não em representação daquelas), facilitando-lhes a conclusão do negócio pretendido. Mais resulta que o mediador, devido ao risco/álea inerente à actividade comercial da mediação, apenas tem direito a ser remunerado quando a sua actuação determine a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação, o que significa que tem que existir um nexo de causalidade adequada entre a sua actividade e a realização do negócio pretendido, de modo a que possa afirmar-se que a concretização deste foi o corolário ou a consequência daquela actuação [quanto ao que fica exposto, cfr., i. a., Ac. do STJ de 03/04/2008, proc. 07B4498, disponível in www.dgsi.pt/jstj e Acs. desta Relação do Porto de 19/02/2009, proc. 0837769, de 15/07/2009, proc. 2187/07.2TBVRL.P1 e de 02/11/2009, proc. 1913/08.7TJPRT.P1, todos disponíveis in www.dgsi.pt/jtrp e, ainda, Meneses Cordeiro, in “Do Contrato de Mediação”, O Direito, ano 139, III, pgs. 516 e segs.]. Finalmente, o último dos apontados dispositivos impõe, no seu nº 1, a forma escrita para a celebração do contrato de mediação imobiliária, e comina, no nº 8, a nulidade para a inobservância deste formalismo, embora consagrando aí uma modalidade híbrida de tal figura, pois que a mesma não pode ser invocada pelo mediador, nem pode ser oficiosamente declarada pelo Tribunal [como sustenta o Ac. do STJ de 03/04/2008 supra referenciado], apenas podendo ser arguida pelo cliente do mediador, ou seja, pelo comitente, já que [como refere o mesmo douto aresto do STJ] o legislador visou “garantir a melhor protecção do comitente face à entidade mediadora, que exerce profissionalmente a mediação e que tem, por isso, um melhor conhecimento das regras e procedimentos a esta ligados, podendo delas colher vantagens” e visou “estimular e compelir o mediador à observância da forma legal”. No caso, o contrato de mediação imobiliária invocado pela autora não foi reduzido a escrito, o que geraria a sua nulidade formal. Esta, porém, não pode ser declarada já que os réus não a arguíram – só eles poderiam fazê-lo, como se disse – e o Tribunal não pode conhecê-la «ex officio». Não será, pois, pela inobservância da forma legalmente prescrita que a pretensão da autora deixará de proceder. Há, então, que averiguar se os factos provados permitem concluir pela efectiva existência de um contrato de mediação imobiliária celebrado entre a autora e os réus (ou algum deles), pela verificação dos pressupostos legais desse contrato e pelo direito da autora ser remunerada a título de mediadora, sendo certo, como não pode deixar de ser, face ao princípio consagrado no nº 1 do art. 342º do CCiv., que lhe competia a ela (demandante, ora recorrente) a alegação e prova da factualidade integradora do direito que reclama. A sentença recorrida fundamentou a improcedência da acção no entendimento de que “a matéria de facto apurada não é bastante para nos permitir concluir que a actividade da A., por intermédio do seu pai, levou à conclusão do negócio de compra e venda entre H………… e esposa e os ora RR.” (cfr. última folha daquela sentença, correspondente a fls. 98 dos autos). A apelante sustenta, no entanto, que mesmo com a factualidade dada como provada na 1ª instância (sem, portanto, os factos que pretendia ver aditados ao respectivo elenco, apreciados no item anterior deste ponto IV), o Tribunal «a quo» devia ter chegado a solução jurídica diversa, julgando procedente a sua pretensão, por considerar demonstrado o nexo de causalidade entre a actividade que levou a cabo e o negócio/contrato que foi realizado entre os réus e os ditos H………… e mulher. A recorrente, contudo, não tem razão, pois a acção não podia deixar de ser julgada improcedente, como o foi na 1ª instância. Em primeiro lugar – questão que não foi expressamente analisada na sentença recorrida -, por não ser sequer inequívoco que a autora tenha sido parte (tenha celebrado), por intermédio de seu pai, E……….., em qualquer contrato de mediação imobiliária celebrado com os réus (ou apenas com o réu marido), já que apesar de ter ficado provado que o E………….. trabalha na agência (de mediação imobiliária) da demandante (nºs 1 e 2 do ponto III), não ficou, porém, demonstrado que ao actuar pela forma indicada nos nºs 3 a 5 do mesmo ponto III este o tenha feito por sua conta e ao seu serviço (da autora) ou em sua representação. E a autora tinha que fazer prova de que o seu pai agiu em seu nome ou em sua representação. Sem isso ela é estranha ao eventual contrato em discussão nos autos e não tem legitimidade substantiva para reclamar dos réus qualquer remuneração por mediação em que não foi interveniente. Em segundo lugar – admitindo que o seu pai agiu em sua representação -, porque a factologia apurada não permite concluir que o contrato de compra e venda celebrado entre os réus e o casal H……….. e F…………, relativo ao imóvel mencionado em 3 dos factos provados, tenha resultado da actuação desenvolvida pelo E………….. ou, dito de outro modo, permita afirmar-se que a outorga de tal contrato tenha sido o corolário ou a consequência da actividade deste. Isto porque os adquirentes entraram em contacto com os réus (e visitaram o prédio em questão) não só por intermédio dele (E…………), mas também por sua própria iniciativa (por os terem contactado directamente), desconhecendo-se em absoluto se foi devido às diligências que eles levaram a cabo que o contrato de compra e venda do imóvel veio a ser celebrado ou se a efectivação deste se deveu à actuação do pai da demandante (cfr. os nºs 3 a 5, 7 e 8 dos factos provados). E como era a autora que tinha que fazer a prova do nexo causal entre a actividade do seu pai e a outorga do aludido contrato de compra e venda, não podia a acção ter outro desfecho senão o que teve na 1ª instância, de improcedência da pretensão da ora apelante, solução que, por isso, é, aqui e agora, de manter integralmente. Improcede, assim, «in totum, a apelação.* *Síntese do que fica exposto: • O mediador, no contrato de mediação imobiliária, só tem direito à remuneração convencionada com o comitente/cliente se o negócio visado vier a ser concluído/concretizado e desde que a celebração deste tenha sido o corolário ou a consequência da sua actividade. • Compete ao mediador-autor a alegação e prova dos pressupostos do seu direito, particularmente da verificação do nexo causal entre a sua actuação (no âmbito da mediação) e a outorga do contrato visado. • Sem essa prova, a pretensão do mediador tem que improceder.* * *V. Decisão: Nestes termos, os Juízes desta secção cível da Relação do Porto acordam em: 1º) Julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida. 2º) Condenar a apelante nas custas.* * *Porto, 2010/04/13 Manuel Pinto dos Santos João Manuel Araújo Ramos Lopes Cândido Pelágio Castro de Lemos