I - Para efeito do cálculo da obrigação de indemnização, por força dos preceitos dos artigos 562º e 566º, nºs 1 e 2, do Código Civil, será de considerar o valor de reparação de um automóvel, mesmo que este seja superior ao seu valor comercial, se o custo daquela não for excessivamente oneroso para o devedor. II - Esta excessiva onerosidade resultará essencialmente do cotejo entre esses dois valores, não sendo de considerar um autónomo ónus de prova daquela, a cargo do responsável. III - A opção entre a restauração natural e a indemnização por equivalente deve ser ponderada casuisticamente. IV – Em princípio, não deve ser ordenada a reparação que importe em montante três vezes superior ao valor comercial do veículo.
3ª SECÇÃO – Processo nº 1942/12.6TJVNF.P1 Juízos de Competência Cível de Vila Nova de Famalicão - 1º Juízo Cível SUMÁRIO (artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil) I - Para efeito do cálculo da obrigação de indemnização, por força dos preceitos dos artigos 562º e 566º, nºs 1 e 2, do Código Civil, será de considerar o valor de reparação de um automóvel, mesmo que este seja superior ao seu valor comercial, se o custo daquela não for excessivamente oneroso para o devedor II - Esta excessiva onerosidade resultará essencialmente do cotejo entre esses dois valores, não sendo de considerar um autónomo ónus de prova daquela, a cargo do responsável III - A opção entre a restauração natural e a indemnização por equivalente deve ser ponderada casuisticamente IV – Em princípio, não deve ser ordenada a reparação que importe em montante três vezes superior ao valor comercial do veículo Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto I RELATÓRIOB… intentou acção de condenação sob a forma sumária contra a Companhia de Seguros C…, SA, pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia de 7.975,13 €, acrescida de IVA e juros, desde a citação, e de 10 € por dia, a título de paralisação, desde a data do acidente até que a ré assuma a reparação do veículo do autor. Fundamenta o seu pedido, em súmula, em responsabilidade civil do condutor e proprietário de veículo segurado na ré, que interveio em acidente do qual resultaram danos para o autor. A ré, regularmente citada, apresentou contestação, na qual não pôs em causa os factos atinentes à dinâmica do acidente mas impugnou os relativos ao montante dos danos. Saneado e instruído o processo, efectuou-se o julgamento, tendo sido proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a ré a pagar ao autor a quantia de 7.975,13 €, mais IVA à taxa legal, correspondente ao valor da reparação do veículo, acrescida de juros de mora legais desde a sua citação até efectivo e integral pagamento, no restante a absolvendo do pedido. Inconformada, veio a ré interpor recurso, o qual foi admitido como sendo de apelação, a subir imediatamente e com efeito devolutivo. O autor não contra-alegou. Foram colhidos os vistos legais.II FUNDAMENTAÇÃO1. Factos provados relevantes (…) 4º) O acidente ficou a dever-se à conduta da condutora do veículo de matrícula ..-AZ-.., D…, que infringiu regras estradais. 5º) Como consequência directa e necessária do acidente, o veículo JN sofreu danos. 6º) Foi declarada a perda total do veículo JN, e atribuído o valor venal de 3.266,00 €, ao veículo JN, à altura do sinistro, e ao salvado o montante de € 555,00 e a estimativa de reparação dos danos causados ascende ao montante de 7.975,13 € + IVA. 7º) No seu dia-a-dia, o autor opta por utilizar outro veículo para circular, trabalhar e realizar todas as demais tarefas que lhe incumbem diariamente. 8º) O autor está privado da utilização do veículo JN, desde a data do acidente – 16-08-2011. 9º) A ré é responsável pelas consequências do acidente por via do contrato de seguro titulado pela apólice nº ……., válido e eficaz à data do acidente, pelo qual, assumiu e aceitou a responsabilidade civil emergente da circulação do veículo ..-AZ-.., propriedade de E… e conduzido por D…, única causadora do acidente. 10º) O JN é estimado e cuidado pelo autor e encontrava-se em bom estado de conservação. 11º) O JN é do ano de 1991. 12º) A F… enviou ao autor uma carta onde o informou que uma vez que a reparação do JN era excessivamente onerosa, colocava à sua disposição a indemnização de 2.711,00 €, abatido o valor do salvado. 13º) O preço de mercado de um veículo com as características do JN situa-se em 3.266,00 €. 14º) A ré colocou nas mãos da F…, SA a regularização dos danos relativos ao acidente, ao abrigo da Convenção IDS. 2. Conclusões das alegações de recurso 1 - Resultou provado que a reparação do JN era no valor de 7.975,13 € e o valor venal era de 3.266,00 €. 2 - Resultou ainda provado que o “valor de mercado” do JN era € 3.266,00, provavelmente porque foi esse o valor que o comerciante de veículos automóveis usados G… indicou como sendo um valor aceitável de mercado (“3.000,00 €”). 3 - Resultou dos documentos juntos com a contestação, bem como do depoimento da testemunha G…, vendedor de automóveis sem conhecimento ou interesse no caso dos autos, e por isso, uma testemunha isenta, que é possível adquirir um veículo com as características do JN com o valor venal atribuído (“3.000,00 €”). 4 - Deste modo, a ora Recorrente logrou provar o que lhe era exigível, ou seja, provou que o valor de mercado de um veículo com características semelhantes ao JN e que atendendo ao valor da reparação, era possível ao autor adquirir no mercado um veículo semelhante ao JN com o valor venal atribuído. 5 - O valor da reparação é superior ao triplo do valor de mercado que resultou provado (já que o valor da reparação, na verdade, e já com IVA à taxa legal, ascende a 9.809,41 €). 6 - É evidente, assim, que a reparação é excessivamente onerosa, já que existe uma “manifesta desproporção entre o interesse do lesado, que importa recompor, e o custo que a reparação natural representa para o responsável” (de acordo com o Acórdão da RP de 25/06/2009, in www.dgsi.pt). 7 - Para além de que provado ficou que o Autor, com o valor que lhe foi proposto, a título de indemnização, poderia, como pode, adquirir um veículo da mesma marca, modelo e características do JN. 8 - Decidindo como decidiu, a douta sentença do tribunal a quo violou o disposto nos artigos 562º e 566º do Código Civil.***3. DISCUSSÃO Uma anotação prévia. A questão que a ré coloca em sede de recurso é estritamente de direito. Qual seja a de destrinçar se, no presente caso, cotejando o valor da reparação do veículo sinistrado e o valor comercial deste, se deve optar pela restauração natural ou pela indemnização por equivalente, face a uma possível excessiva onerosidade para o devedor da primeira opção. Curiosamente, já que dos comentários que tece sobre a prova nada aduz tendente à alteração dos factos, parece que a pretensão da recorrente é a de que aquele dissídio seja resolvido no sentido da opinião que sobre o mesmo foi expressada por uma das testemunhas inquiridas. Com o que se distancia intoleravelmente de um dos princípios jurídicos estruturantes do processo civil - jura novit curia -, aliás expressamente enfatizado no artigo 5º, nº 3, do Código de Processo Civil. A ré insurge-se contra a sentença, no que respeita à sua condenação a pagar ao autor a quantia de 7.975,13 €, acrescida de juros de mora, para a reparação do veículo sinistrado. Sustenta que, face à excessiva onerosidade desta, por referência ao valor de mercado do veículo, que é de 3.266,00 €, a indemnização se deveria reportar a este seu valor comercial. Vejamos. Concordamos com o que se aduz na sentença, no que concerne ao artigo 41º do DL nº 291/2007, de 21 de Agosto, não ser aplicável ao presente litígio, em fase judicial. Como se anota no acórdão desta Relação do Porto de 7.09.2010 (Henrique Araújo), in www.dgsi.pt, o referido preceito valerá para os “procedimentos a adoptar pelas empresas de seguros na fixação de prazos com vista à regularização rápida de litígios e do estabelecimento de princípios base na gestão de sinistros”. Assim “mediante a apresentação de uma proposta razoável de indemnização apresentada pela seguradora, fundada nos critérios estabelecidos nesse diploma (291/2007), pode o segurado ou o terceiro aceitá-la, resolvendo-se em definitivo o litígio”. No entanto, frisa-se nesse aresto, “se não houver acordo, e se houver necessidade de recorrer às vias judiciais, a determinação da espécie e do quantum da indemnização passam a ser regulados pelos regras e princípios gerais da responsabilidade civil e da obrigação de indemnização, entre os quais avultam, de um lado, o princípio da reparação in natura e, de outro, o princípio da reparação integral do dano, ficando afastada a aplicação dos critérios previstos no Capítulo III do DL 291/2007, designadamente o artigo 41º”. Analisemos, pois, a questão nos estritos termos do preceito do artigo 562º do Código Civil, no qual se consagra para a obrigação de indemnização o princípio da reposição natural - «quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação». Nomeadamente por referência ao artigo 566º, nº 1, do mesmo código quando especifica que «a indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor». Vem-se discutindo até que ponto se deve optar pela reparação, caso esta tenha um custo superior ao do valor do veículo a reparar. Refere-se no acórdão do STJ de 12.01.2006 (Salvador da Costa), in www.dgsi.pt, que “a reconstituição natural é inadequada se for manifesta a desproporção entre o interesse do lesado e o custo para o lesante que ela envolva, em termos de representar para o último um sacrifício manifestamente desproporcionado quando confrontado com o interesse do lesado na integridade do seu património”. E que “não basta para se aferir da onerosidade da reparação in natura de um veículo automóvel a consideração do seu valor venal ou de mercado, antes se impondo o seu confronto com o valor de uso que o lesado dele extrai pelo facto de dele dispor para a satisfação das suas necessidades”. Concluindo que se “justifica, por não ser inadequada, a reparação do veículo automóvel matriculado em 1983, melhorado, bem conservado, com 111.410 quilómetros andados, cujo custo excede o seu valor de mercado em 1.247,00 €”. Temos portanto que, se o valor da reparação exceder o do próprio veículo, se deverá ponderar até que ponto deva ser admitida essa reconstituição natural, como previsto no artigo 562º, ou se caberá antes optar pela fixação da indemnização em dinheiro, considerando-se nos termos do nº 1 do artigo 566º que aquela seja excessivamente onerosa para o devedor. Em princípio, concordamos com a jurisprudência do acórdão do STJ de 21.04.2010 (Garcia Calejo), ibidem, de que “em relação a um veículo automóvel acidentado, sendo a sua reparação integral possível, deve privilegiar-se a sua reconstituição natural, excepto se se revelar excessivamente onerosa, o que corresponde a que o encargo seja exagerado, desmedido, desajustado para o obrigado, transcendendo-se os limites de uma legítima indemnização”. Porquanto “um veículo de valor comercial reduzido pode estar em excelentes condições e satisfazer plenamente as necessidades do dono”. Já que “nestas circunstâncias a quantia equivalente ao valor de mercado do veículo (muitas vezes ínfima) não conduzirá à satisfação dessas mesmas necessidades, o que equivale a dizer-se que não reconstituirá o lesado na situação que teria se não fosse o acidente, pelo que a situação inicial do lesado só será reintegrada com a reparação do veículo”. Propugnando o princípio de que “a indagação sobre a restauração natural ou a indemnização equivalente, deve fazer-se casuisticamente, sem perder de vista que se deve atender à melhor forma de satisfazer o interesse do lesado, o qual deve prevalecer sobre o do lesante, sendo pouco relevante, para os fins em análise, que o valor da reparação do veículo seja superior ao seu valor comercial”. No mesmo sentido, os acórdãos desta Relação do Porto de 1.06.2010 (Ramos Lopes) e de 29.05.2012 (Márcia Portela), ainda ibidem. No artigo 41º, nºs 1, alínea c), e 2, do DL nº 291/2007, veio-se a considerar que se deve optar pela indemnização em dinheiro, reportada ao valor venal do veículo (valor de substituição do mesmo à data do acidente) sempre que “se constate que o valor estimado para a reparação dos danos sofridos, adicionado do valor do salvado, ultrapassa 100 % ou 120 % do valor venal do veículo consoante se trate respectivamente de um veículo com menos ou mais de dois anos”. Disciplina já anteriormente consagrada no artigo 20°- I do DL 83/2006, de 3 de Maio. Preceito que, como supra se deixou claro, não colhe no presente caso, por não se aplicar à fase judicial. Não podemos, todavia, ignorar, na ponderação casuística que se levar a efeito, as linhas que emanam do mesmo. Sendo nessa esteira que, no acórdão desta Relação do Porto de 28.06.2013 (Carlos Portela), in CJ, Tomo III, pág. 175, se afirmou que “a reparação de uma viatura automóvel será excessivamente onerosa, quando ultrapassar em 120% o seu valor comercial”. Já que, “também na situação em análise, demonstrada que está a excessiva onerosidade da reparação (por flagrante desproporção entre o custo da reparação e o custo de viatura idêntica à sinistrada, que pode ser adquirida no mercado de usados – o valor da reparação corresponde sensivelmente ao dobro do preço de um veículo idêntico ao acidentado no mercado dos usados), se impõe, que nos termos do artigo 566º, nº 1, do CC, se fixe a indemnização em dinheiro, cuja medida é a resultante da teoria da diferença, consagrada no nº 2 do mesmo preceito”. Do mesmo modo, no presente caso, o valor da reparação seria manifestamente superior ao do valor comercial do veículo (quase 3 vezes mais – 7.975,13 € e 3.266,00 €, respectivamente). Anotar-se-á, finalmente, que estando apurado o valor comercial do veículo, bem como o do custo da sua reparação, a excessiva onerosidade desta resultará essencialmente do cotejo entre esses dois valores, não nos parecendo adequado considerar um ónus de prova da mesma, a cargo do responsável, que se autonomize de tal comparação. III DISPOSITIVONa procedência do recurso, revoga-se a sentença recorrida, condenando-se a ré a pagar ao autor a quantia de 3.266,00 €, acrescida de juros de mora contados à taxa legal desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, no mais a absolvendo do pedido. Custas pelo recorrido - artigo 527º do Código de Processo Civil. Notifique e registe. Porto, 10 de Abril de 2014 José Manuel de Araújo Barros Pedro Martins (Voto favoravelmente o acórdão porque, sendo o valor de substituição de 3.226 €, não se justifica atribuir ao autor o valor da reparação, de mais do dobro daquele. Mas não utilizaria a expressão valor comercial ou de mercado para a questão do valor de substituição, pelas razões que já constam da declaração de voto anexa ao ac. do TRP de 16/01/2014 publicado sob o nº <a href="https://acordao.pt/decisoes/139669" target="_blank">4135/07.0TBVFR.P1</a> da base de dados do IGFEJ.) Judite Pires
3ª SECÇÃO – Processo nº 1942/12.6TJVNF.P1 Juízos de Competência Cível de Vila Nova de Famalicão - 1º Juízo Cível SUMÁRIO (artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil) I - Para efeito do cálculo da obrigação de indemnização, por força dos preceitos dos artigos 562º e 566º, nºs 1 e 2, do Código Civil, será de considerar o valor de reparação de um automóvel, mesmo que este seja superior ao seu valor comercial, se o custo daquela não for excessivamente oneroso para o devedor II - Esta excessiva onerosidade resultará essencialmente do cotejo entre esses dois valores, não sendo de considerar um autónomo ónus de prova daquela, a cargo do responsável III - A opção entre a restauração natural e a indemnização por equivalente deve ser ponderada casuisticamente IV – Em princípio, não deve ser ordenada a reparação que importe em montante três vezes superior ao valor comercial do veículo Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto I RELATÓRIOB… intentou acção de condenação sob a forma sumária contra a Companhia de Seguros C…, SA, pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia de 7.975,13 €, acrescida de IVA e juros, desde a citação, e de 10 € por dia, a título de paralisação, desde a data do acidente até que a ré assuma a reparação do veículo do autor. Fundamenta o seu pedido, em súmula, em responsabilidade civil do condutor e proprietário de veículo segurado na ré, que interveio em acidente do qual resultaram danos para o autor. A ré, regularmente citada, apresentou contestação, na qual não pôs em causa os factos atinentes à dinâmica do acidente mas impugnou os relativos ao montante dos danos. Saneado e instruído o processo, efectuou-se o julgamento, tendo sido proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a ré a pagar ao autor a quantia de 7.975,13 €, mais IVA à taxa legal, correspondente ao valor da reparação do veículo, acrescida de juros de mora legais desde a sua citação até efectivo e integral pagamento, no restante a absolvendo do pedido. Inconformada, veio a ré interpor recurso, o qual foi admitido como sendo de apelação, a subir imediatamente e com efeito devolutivo. O autor não contra-alegou. Foram colhidos os vistos legais.II FUNDAMENTAÇÃO1. Factos provados relevantes (…) 4º) O acidente ficou a dever-se à conduta da condutora do veículo de matrícula ..-AZ-.., D…, que infringiu regras estradais. 5º) Como consequência directa e necessária do acidente, o veículo JN sofreu danos. 6º) Foi declarada a perda total do veículo JN, e atribuído o valor venal de 3.266,00 €, ao veículo JN, à altura do sinistro, e ao salvado o montante de € 555,00 e a estimativa de reparação dos danos causados ascende ao montante de 7.975,13 € + IVA. 7º) No seu dia-a-dia, o autor opta por utilizar outro veículo para circular, trabalhar e realizar todas as demais tarefas que lhe incumbem diariamente. 8º) O autor está privado da utilização do veículo JN, desde a data do acidente – 16-08-2011. 9º) A ré é responsável pelas consequências do acidente por via do contrato de seguro titulado pela apólice nº ……., válido e eficaz à data do acidente, pelo qual, assumiu e aceitou a responsabilidade civil emergente da circulação do veículo ..-AZ-.., propriedade de E… e conduzido por D…, única causadora do acidente. 10º) O JN é estimado e cuidado pelo autor e encontrava-se em bom estado de conservação. 11º) O JN é do ano de 1991. 12º) A F… enviou ao autor uma carta onde o informou que uma vez que a reparação do JN era excessivamente onerosa, colocava à sua disposição a indemnização de 2.711,00 €, abatido o valor do salvado. 13º) O preço de mercado de um veículo com as características do JN situa-se em 3.266,00 €. 14º) A ré colocou nas mãos da F…, SA a regularização dos danos relativos ao acidente, ao abrigo da Convenção IDS. 2. Conclusões das alegações de recurso 1 - Resultou provado que a reparação do JN era no valor de 7.975,13 € e o valor venal era de 3.266,00 €. 2 - Resultou ainda provado que o “valor de mercado” do JN era € 3.266,00, provavelmente porque foi esse o valor que o comerciante de veículos automóveis usados G… indicou como sendo um valor aceitável de mercado (“3.000,00 €”). 3 - Resultou dos documentos juntos com a contestação, bem como do depoimento da testemunha G…, vendedor de automóveis sem conhecimento ou interesse no caso dos autos, e por isso, uma testemunha isenta, que é possível adquirir um veículo com as características do JN com o valor venal atribuído (“3.000,00 €”). 4 - Deste modo, a ora Recorrente logrou provar o que lhe era exigível, ou seja, provou que o valor de mercado de um veículo com características semelhantes ao JN e que atendendo ao valor da reparação, era possível ao autor adquirir no mercado um veículo semelhante ao JN com o valor venal atribuído. 5 - O valor da reparação é superior ao triplo do valor de mercado que resultou provado (já que o valor da reparação, na verdade, e já com IVA à taxa legal, ascende a 9.809,41 €). 6 - É evidente, assim, que a reparação é excessivamente onerosa, já que existe uma “manifesta desproporção entre o interesse do lesado, que importa recompor, e o custo que a reparação natural representa para o responsável” (de acordo com o Acórdão da RP de 25/06/2009, in www.dgsi.pt). 7 - Para além de que provado ficou que o Autor, com o valor que lhe foi proposto, a título de indemnização, poderia, como pode, adquirir um veículo da mesma marca, modelo e características do JN. 8 - Decidindo como decidiu, a douta sentença do tribunal a quo violou o disposto nos artigos 562º e 566º do Código Civil.***3. DISCUSSÃO Uma anotação prévia. A questão que a ré coloca em sede de recurso é estritamente de direito. Qual seja a de destrinçar se, no presente caso, cotejando o valor da reparação do veículo sinistrado e o valor comercial deste, se deve optar pela restauração natural ou pela indemnização por equivalente, face a uma possível excessiva onerosidade para o devedor da primeira opção. Curiosamente, já que dos comentários que tece sobre a prova nada aduz tendente à alteração dos factos, parece que a pretensão da recorrente é a de que aquele dissídio seja resolvido no sentido da opinião que sobre o mesmo foi expressada por uma das testemunhas inquiridas. Com o que se distancia intoleravelmente de um dos princípios jurídicos estruturantes do processo civil - jura novit curia -, aliás expressamente enfatizado no artigo 5º, nº 3, do Código de Processo Civil. A ré insurge-se contra a sentença, no que respeita à sua condenação a pagar ao autor a quantia de 7.975,13 €, acrescida de juros de mora, para a reparação do veículo sinistrado. Sustenta que, face à excessiva onerosidade desta, por referência ao valor de mercado do veículo, que é de 3.266,00 €, a indemnização se deveria reportar a este seu valor comercial. Vejamos. Concordamos com o que se aduz na sentença, no que concerne ao artigo 41º do DL nº 291/2007, de 21 de Agosto, não ser aplicável ao presente litígio, em fase judicial. Como se anota no acórdão desta Relação do Porto de 7.09.2010 (Henrique Araújo), in www.dgsi.pt, o referido preceito valerá para os “procedimentos a adoptar pelas empresas de seguros na fixação de prazos com vista à regularização rápida de litígios e do estabelecimento de princípios base na gestão de sinistros”. Assim “mediante a apresentação de uma proposta razoável de indemnização apresentada pela seguradora, fundada nos critérios estabelecidos nesse diploma (291/2007), pode o segurado ou o terceiro aceitá-la, resolvendo-se em definitivo o litígio”. No entanto, frisa-se nesse aresto, “se não houver acordo, e se houver necessidade de recorrer às vias judiciais, a determinação da espécie e do quantum da indemnização passam a ser regulados pelos regras e princípios gerais da responsabilidade civil e da obrigação de indemnização, entre os quais avultam, de um lado, o princípio da reparação in natura e, de outro, o princípio da reparação integral do dano, ficando afastada a aplicação dos critérios previstos no Capítulo III do DL 291/2007, designadamente o artigo 41º”. Analisemos, pois, a questão nos estritos termos do preceito do artigo 562º do Código Civil, no qual se consagra para a obrigação de indemnização o princípio da reposição natural - «quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação». Nomeadamente por referência ao artigo 566º, nº 1, do mesmo código quando especifica que «a indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor». Vem-se discutindo até que ponto se deve optar pela reparação, caso esta tenha um custo superior ao do valor do veículo a reparar. Refere-se no acórdão do STJ de 12.01.2006 (Salvador da Costa), in www.dgsi.pt, que “a reconstituição natural é inadequada se for manifesta a desproporção entre o interesse do lesado e o custo para o lesante que ela envolva, em termos de representar para o último um sacrifício manifestamente desproporcionado quando confrontado com o interesse do lesado na integridade do seu património”. E que “não basta para se aferir da onerosidade da reparação in natura de um veículo automóvel a consideração do seu valor venal ou de mercado, antes se impondo o seu confronto com o valor de uso que o lesado dele extrai pelo facto de dele dispor para a satisfação das suas necessidades”. Concluindo que se “justifica, por não ser inadequada, a reparação do veículo automóvel matriculado em 1983, melhorado, bem conservado, com 111.410 quilómetros andados, cujo custo excede o seu valor de mercado em 1.247,00 €”. Temos portanto que, se o valor da reparação exceder o do próprio veículo, se deverá ponderar até que ponto deva ser admitida essa reconstituição natural, como previsto no artigo 562º, ou se caberá antes optar pela fixação da indemnização em dinheiro, considerando-se nos termos do nº 1 do artigo 566º que aquela seja excessivamente onerosa para o devedor. Em princípio, concordamos com a jurisprudência do acórdão do STJ de 21.04.2010 (Garcia Calejo), ibidem, de que “em relação a um veículo automóvel acidentado, sendo a sua reparação integral possível, deve privilegiar-se a sua reconstituição natural, excepto se se revelar excessivamente onerosa, o que corresponde a que o encargo seja exagerado, desmedido, desajustado para o obrigado, transcendendo-se os limites de uma legítima indemnização”. Porquanto “um veículo de valor comercial reduzido pode estar em excelentes condições e satisfazer plenamente as necessidades do dono”. Já que “nestas circunstâncias a quantia equivalente ao valor de mercado do veículo (muitas vezes ínfima) não conduzirá à satisfação dessas mesmas necessidades, o que equivale a dizer-se que não reconstituirá o lesado na situação que teria se não fosse o acidente, pelo que a situação inicial do lesado só será reintegrada com a reparação do veículo”. Propugnando o princípio de que “a indagação sobre a restauração natural ou a indemnização equivalente, deve fazer-se casuisticamente, sem perder de vista que se deve atender à melhor forma de satisfazer o interesse do lesado, o qual deve prevalecer sobre o do lesante, sendo pouco relevante, para os fins em análise, que o valor da reparação do veículo seja superior ao seu valor comercial”. No mesmo sentido, os acórdãos desta Relação do Porto de 1.06.2010 (Ramos Lopes) e de 29.05.2012 (Márcia Portela), ainda ibidem. No artigo 41º, nºs 1, alínea c), e 2, do DL nº 291/2007, veio-se a considerar que se deve optar pela indemnização em dinheiro, reportada ao valor venal do veículo (valor de substituição do mesmo à data do acidente) sempre que “se constate que o valor estimado para a reparação dos danos sofridos, adicionado do valor do salvado, ultrapassa 100 % ou 120 % do valor venal do veículo consoante se trate respectivamente de um veículo com menos ou mais de dois anos”. Disciplina já anteriormente consagrada no artigo 20°- I do DL 83/2006, de 3 de Maio. Preceito que, como supra se deixou claro, não colhe no presente caso, por não se aplicar à fase judicial. Não podemos, todavia, ignorar, na ponderação casuística que se levar a efeito, as linhas que emanam do mesmo. Sendo nessa esteira que, no acórdão desta Relação do Porto de 28.06.2013 (Carlos Portela), in CJ, Tomo III, pág. 175, se afirmou que “a reparação de uma viatura automóvel será excessivamente onerosa, quando ultrapassar em 120% o seu valor comercial”. Já que, “também na situação em análise, demonstrada que está a excessiva onerosidade da reparação (por flagrante desproporção entre o custo da reparação e o custo de viatura idêntica à sinistrada, que pode ser adquirida no mercado de usados – o valor da reparação corresponde sensivelmente ao dobro do preço de um veículo idêntico ao acidentado no mercado dos usados), se impõe, que nos termos do artigo 566º, nº 1, do CC, se fixe a indemnização em dinheiro, cuja medida é a resultante da teoria da diferença, consagrada no nº 2 do mesmo preceito”. Do mesmo modo, no presente caso, o valor da reparação seria manifestamente superior ao do valor comercial do veículo (quase 3 vezes mais – 7.975,13 € e 3.266,00 €, respectivamente). Anotar-se-á, finalmente, que estando apurado o valor comercial do veículo, bem como o do custo da sua reparação, a excessiva onerosidade desta resultará essencialmente do cotejo entre esses dois valores, não nos parecendo adequado considerar um ónus de prova da mesma, a cargo do responsável, que se autonomize de tal comparação. III DISPOSITIVONa procedência do recurso, revoga-se a sentença recorrida, condenando-se a ré a pagar ao autor a quantia de 3.266,00 €, acrescida de juros de mora contados à taxa legal desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, no mais a absolvendo do pedido. Custas pelo recorrido - artigo 527º do Código de Processo Civil. Notifique e registe. Porto, 10 de Abril de 2014 José Manuel de Araújo Barros Pedro Martins (Voto favoravelmente o acórdão porque, sendo o valor de substituição de 3.226 €, não se justifica atribuir ao autor o valor da reparação, de mais do dobro daquele. Mas não utilizaria a expressão valor comercial ou de mercado para a questão do valor de substituição, pelas razões que já constam da declaração de voto anexa ao ac. do TRP de 16/01/2014 publicado sob o nº 4135/07.0TBVFR.P1 da base de dados do IGFEJ.) Judite Pires