Processo:4135/07.0TBVFR.P1
Data do Acordão: 15/01/2014Relator: JOSÉ MANUEL DE ARAÚJO BARROSTribunal:trp
Decisão: Meio processual:

I - Para efeito do cálculo da obrigação de indemnização, por força dos preceitos dos artigos 562º e 566º, nºs 1 e 2, do Código Civil, será de considerar o valor de reparação de um automóvel, mesmo que este seja superior ao seu valor comercial, se o custo daquela não for excessivamente oneroso para o devedor. II - Tal opção, entre a restauração natural ou a indemnização por equivalente, deve ser ponderada casuisticamente. III – Em princípio, não deve ser ordenada a reparação que importe em montante três vezes superior ao valor comercial do veículo IV - Se o lesado não pretender repará-lo, a indemnização nunca se deverá pautar pelo valor da hipotética reparação, mas sim pelo do veículo.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
JOSÉ MANUEL DE ARAÚJO BARROS
Descritores
RESPONSABILIDADE CIVIL A FAVOR DO FINANCIADOR VALOR
No do documento
Data do Acordão
01/16/2014
Votação
UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO
Decisão
REVOGADA
Sumário
I - Para efeito do cálculo da obrigação de indemnização, por força dos preceitos dos artigos 562º e 566º, nºs 1 e 2, do Código Civil, será de considerar o valor de reparação de um automóvel, mesmo que este seja superior ao seu valor comercial, se o custo daquela não for excessivamente oneroso para o devedor. II - Tal opção, entre a restauração natural ou a indemnização por equivalente, deve ser ponderada casuisticamente. III – Em princípio, não deve ser ordenada a reparação que importe em montante três vezes superior ao valor comercial do veículo IV - Se o lesado não pretender repará-lo, a indemnização nunca se deverá pautar pelo valor da hipotética reparação, mas sim pelo do veículo.
Decisão integral
3ª SECÇÃO – Processo nº 4135/07.0TBVFR.P1
Tribunal Judicial de Santa Maria da Feira – 2º Juízo Cível

SUMÁRIO
(artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil)
I - Para efeito do cálculo da obrigação de indemnização, por força dos preceitos dos artigos 562º e 566º, nºs 1 e 2, do Código Civil, será de considerar o valor de reparação de um automóvel, mesmo que este seja superior ao seu valor comercial, se o custo daquela não for excessivamente oneroso para o devedor
II - Tal opção, entre a restauração natural ou a indemnização por equivalente, deve ser ponderada casuisticamente
III – Em princípio, não deve ser ordenada a reparação que importe em montante três vezes superior ao valor comercial do veículo
IV - Se o lesado não pretender repará-lo, a indemnização nunca se deverá pautar pelo valor da hipotética reparação, mas sim pelo do veículo 

Acordam em conferência no Tribunal da Relação do PortoI
RELATÓRIOO Estado Português intentou a presente acção declarativa, sob a forma ordinária, contra B… – Companhia de Seguros, SA, pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia de 38.825,01 €, quantia acrescida de juros de mora contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.
Fundamenta o seu pedido, em súmula, em responsabilidade civil do condutor de veículo seguro na ré, que interveio em acidente do qual resultaram danos para o autor.
A ré, regularmente citada, apresentou contestação, na qual impugnou a versão do acidente apresentada pelo autor, alegando que a culpa do embate se deveu ao condutor do veículo do Estado.
Saneado e instruído o processo, efectuou-se o julgamento, tendo sido proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a ré a pagar ao autor 29.535,68 €, quantia acrescida de juros de mora contados desde a data da citação, à taxa de 4%, até efectivo e integral pagamento, absolvendo a ré do demais pedido.
Inconformada, veio a ré interpor recurso, o qual foi admitido como sendo de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
O autor contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.
Foram colhidos os vistos legais.II
FUNDAMENTAÇÃO1. PEÇAS PROCESSUAIS
1.1. Factos provados relevantes para o recurso
a) No dia 25 de Setembro de 2004, pelas 17.45 horas, na E.N. nº 1, ao km 279,450 em …, …, área desta comarca, ocorreu um embate, no qual foram intervenientes os veículos com as matrículas GNR E - …. (viatura militar) e ..-..-VU (viatura civil).
b) A viatura militar pertencia ao Autor (GNR), e era conduzida, em serviço, por C…, cabo da GNR, a exercer funções no Posto Territorial de Santa de Maria de Lamas, o qual transportava consigo o também cabo da GNR, que se encontrava igualmente em exercício de funções, D….
c) (…) no mesmo veículo eram transportados também dois solípedes, pertencentes ao Autor.
d) A viatura civil pertencia a E… e era conduzida pelo próprio.
e) À data do embate, a responsabilidade civil por danos causados a terceiros pelo veículo VU encontrava-se transferida para a B… Companhia de Seguros, SA, ora Ré, através do contrato de seguro do ramo automóvel titulado pela apólice nº ……….
(…)
ff) Os solípedes transportados na viatura militar, em consequência da colisão, sofreram mazelas, pelo que tiveram de receber assistência médico-veterinária no montante de 45,78 €, quantia essa também suportada pela GNR.
gg) A viatura militar interveniente na colisão sofreu diversos estragos, orçamentados em 35.004,61 €, para o caso de ser reparado em oficina – e em vinte e cinco mil, setecentos e quinze euros e vinte e oito cêntimos (25.715, 28 €), para o caso de ser reparado nas oficinas da GNR.
hh) A viatura em causa não foi reparada sendo que, antes do acidente, tinha o valor comercial de, pelo menos, 8.500,00 € e, após esse acidente, passou a ter o valor de cerca de 700,00 €.
(…)
1.2. Conclusões das alegações de recurso 
1. A ora apelante não se pode conformar com a douta sentença, no que respeita à sua condenação a pagar ao autor a quantia de 25.715,28 €, acrescida de juros de mora a título de reparação do veículo sinistrado.
2. Considera a ora apelante que, a sentença ora objecto de recurso fez errada aplicação do direito aos factos dados como provados sob os artigos gg) e hh) da referida sentença.
3. O veículo tinha, à data do acidente, o valor comercial de 8.500,00 €. 
4. A sua reparação foi orçada em 35.004,61 €, em oficina civil, e em 25.715,28 €, em oficinas do autor.
5. Existe um diferencial de cerca 17.000,00 € entre o valor do veículo à data do acidente e o valor estimado para a sua reparação nas oficinas do autor.
6. Acresce que também resultou provado que o veículo em causa não foi reparado e, conforme confessado pelo autor no artigo 28º da sua PI foi o mesmo abatido.
7. A decisão ora recorrida configura clara e inequivocamente uma situação de agravamento excessivo e desmesurado do credor perante o alegado devedor, ora recorrente e de enriquecimento sem causa do autor.
8. A reparação do veículo acidentado é impossível de concretizar uma vez que o mesmo foi abatido.
9. Ao caso tem aplicação o artigo 41º do Decreto-Lei 291/2007, o qual estabelece que o veículo acidentado se encontra numa situação de perda total.
10. Nestes termos, pugna a ora recorrente pela alteração da douta sentença ora recorrida, por uma que condene a recorrente em valor não superior a 8.500,00 € no que respeita à perda total do veículo acidentado.
11. Pelo que fica supra alegado, decidido como ficou, o douto tribunal “a quo”, afrontou o disposto na lei, desde logo, o disposto no artigo 41º do Decreto-Lei 291/2007.***2. DISCUSSÃO
A ré insurge-se contra a sentença, no que respeita à sua condenação a pagar ao autor a quantia de 25.715,28 €, acrescida de juros de mora a título de reparação do veículo sinistrado. Sustenta que, por força do disposto no artigo 41º do Decreto-Lei 291/2007, de 21 de Agosto, face à perda total do veículo acidentado, a indemnização se deveria reportar ao valor comercial do mesmo à data do acidente, que não ao valor do custo da sua reparação.
2.1. Vejamos.
Como é bem referido pelo senhor procurador nas suas alegações, o DL nº 291/2007 não é aplicável in casu, concernente a sinistro ocorrido antes da sua entrada em vigor. Bem como o artigo 20º-I do DL nº 522/85, de 31 de Dezembro, preceito idêntico àqueloutro, que só foi introduzido pelo DL nº 83/06, de 3 de Maio, em data também posterior ao acidente ora em discussão.
De qualquer modo, tais normas nunca se aplicariam ao presente litígio, em fase judicial. Como se anota no acórdão desta Relação do Porto de 7.09.2010 (Henrique Araújo), in dgsi.pt, tal disciplina vale para os “procedimentos a adoptar pelas empresas de seguros e da fixação de prazos com vista à regularização rápida de litígios e do estabelecimento de princípios base na gestão de sinistros”. Assim “mediante a apresentação de uma proposta razoável de indemnização apresentada pela seguradora, fundada nos critérios estabelecidos nesse diploma (291/2007), pode o segurado ou o terceiro aceitá-la, resolvendo-se em definitivo o litígio”. No entanto, frisa-se nesse aresto, “se não houver acordo, e se houver necessidade de recorrer às vias judiciais, a determinação da espécie e o quantum da indemnização passam a ser regulados pelos regras e princípios gerais da responsabilidade civil e da obrigação de indemnização, entre os quais avultam, de um lado, o princípio da reparação in natura e, de outro, o princípio da reparação integral do dano, ficando afastada a aplicação dos critérios previstos no Capítulo III do DL 291/2007, designadamente o artigo 41º”.
2.2. Analisemos, pois, a questão nos estritos termos do preceito do artigo 562º do Código Civil, no qual se consagra para a obrigação de indemnização o princípio da reposição natural - «quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação». Nomeadamente por referência ao artigo 566º, nº 1, do mesmo código quando especifica que «a indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor». 
A primeira questão que se coloca tem a ver o facto de o autor ter abatido o veículo, arredando a hipótese de o reparar. Pelo que nunca se deverá eleger o valor de reparação como medida da indemnização em dinheiro. Na verdade, aquele valor apenas deverá ser considerado com o fito de proceder à reparação. E nunca para calcular o valor do que está irrecuperavelmente perdido. 
O que se vem discutindo é tão só até que ponto se deve optar pela reparação, caso esta tenha um custo superior ao do valor do veículo a reparar. É nessa linha, aliás, que se enquadra o acórdão do STJ de 12.01.2006 (Salvador da Costa), in dgsi.pt, no qual indevidamente se apoiou a decisão que ora se põe em crise. Em cujo sumário se refere que “a reconstituição natural é inadequada se for manifesta a desproporção entre o interesse do lesado e o custo para o lesante que ela envolva, em termos de representar para o último um sacrifício manifestamente desproporcionado quando confrontado com o interesse do lesado na integridade do seu património”. E que “não basta para se aferir da onerosidade da reparação in natura de um veículo automóvel a consideração do seu valor venal ou de mercado, antes se impondo o seu confronto com o valor de uso que o lesado dele extrai pelo facto de dele dispor para a satisfação das suas necessidades”. Concluindo que se “justifica, por não ser inadequada, a reparação do veículo automóvel matriculado em 1983, melhorado, bem conservado, com 111.410 quilómetros andados, cujo custo excede o seu valor de mercado em 1.247 €”.
Temos portanto que, se o valor da reparação exceder o do próprio veículo, se deverá ponderar até que ponto deva ser admitida essa reconstituição natural, como previsto no artigo 562º, ou se caberá antes optar pela fixação da indemnização em dinheiro, considerando-se nos termos do nº 1 do artigo 566º que aquela seja excessivamente onerosa para o devedor.
E neste ponto concordamos com a jurisprudência do acórdão do STJ de 21.04.2010 (Garcia Calejo), ibidem, de que “em relação a um veículo automóvel acidentado, sendo a sua reparação integral possível, deve privilegiar-se a sua reconstituição natural, excepto se se revelar excessivamente onerosa, o que corresponde a que o encargo seja exagerado, desmedido, desajustado para o obrigado, transcendendo-se os limites de uma legítima indemnização”. Porquanto “um veículo de valor comercial reduzido pode estar em excelentes condições e satisfazer plenamente as necessidades do dono”. Já que “nestas circunstâncias a quantia equivalente ao valor de mercado do veículo (muitas vezes ínfima) não conduzirá à satisfação dessas mesmas necessidades, o que equivale a dizer-se que não reconstituirá o lesado na situação que teria se não fosse o acidente, pelo que a situação inicial do lesado só será reintegrada com a reparação do veículo”. Propugnando o princípio de que “a indagação sobre a restauração natural ou a indemnização equivalente, deve fazer-se casuisticamente, sem perder de vista que se deve atender à melhor forma de satisfazer o interesse do lesado, o qual deve prevalecer sobre o do lesante, sendo pouco relevante, para os fins em análise, que o valor da reparação do veículo seja superior ao seu valor comercial”. No mesmo sentido, os acórdãos desta Relação do Porto de 1.06.2010 e de 29.05.2012.
No artigo 41º, nºs 1, alínea c), e 2, do DL nº 291/2007, veio-se a considerar que se deve optar pela indemnização em dinheiro, reportada ao valor venal do veículo (valor de substituição do mesmo à data do acidente) sempre que “se constate que o valor estimado para a reparação dos danos sofridos, adicionado do valor do salvado, ultrapassa 100 % ou 120 % do valor venal do veículo consoante se trate respectivamente de um veículo com menos ou mais de dois anos”. Disciplina já anteriormente consagrada no artigo 20°- I do DL 83/2006. Preceitos que, como supra se deixou claro, não colhem no presente caso, quer por serem posteriores aos factos, quer por não se aplicarem à fase judicial.
Não podemos, todavia, ignorar, na ponderação casuística que se levar a efeito, as linhas que emanam dos mesmos. Sendo nessa esteira que, no acórdão desta Relação do Porto de 28.06.2013 (Carlos Portela), in CJ, Tomo III, pág. 175, se afirmou que “a reparação de uma viatura automóvel será excessivamente onerosa, quando ultrapassar em 120% o seu valor comercial”. Já que, “também na situação em análise, demonstrada que está a excessiva onerosidade da reparação (por flagrante desproporção entre o custo da reparação e o custo de viatura idêntica à sinistrada, que pode ser adquirida no mercado de usados – o valor da reparação corresponde sensivelmente ao dobro do preço de um veículo idêntico ao acidentado no mercado dos usados), se impõe, que nos termos do artigo 566º, nº 1, do CC, se fixe a indemnização em dinheiro, cuja medida é a resultante da teoria da diferença, consagrada no nº 2 do mesmo preceito”. 
Do mesmo modo, no presente caso, o valor da reparação seria manifestamente superior ao do valor comercial do veículo (3 vezes mais – 25.715,28 € e 8.500,000 €, respectivamente). O que o próprio autor reconheceu. Pois, ciente da inutilidade da reparação, optou por abater o veículo.
Não colheria, assim, como se fez na sentença recorrida, eleger o custo dessa hipotética reparação como critério para o apuramento da indemnização. O que apenas caberia ponderar se se optasse pela reconstituição natural (com efectiva reparação), que não pela indemnização por equivalente (em dinheiro).
Não questionaremos se o valor de substituição do veículo será ou não superior ao seu valor comercial, porque tal não foi sequer equacionado. Devendo a indemnização ser estimada com base no valor comercial do veículo – 8.500,00 €. O que, considerando os restantes danos, não postos em causa no presente recurso, no montante de 3.820,40 €, perfaz um cômputo indemnizatório global de 12.320,40 €.III
DISPOSITIVORevoga-se a sentença recorrida, condenando-se a ré a pagar ao autor a quantia de 12,320,40 €, acrescida de juros de mora contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, à taxa de 4%, no mais a absolvendo do pedido.
Custas pelo recorrido - artigo 446º do Código de Processo Civil.

Notifique e registe.

Porto, 16 de Janeiro de 2014
José Manuel deAraújo Barros
Pedro Martins (Declaração de voto)
Judite Pires
____________
Voto favoravelmente o acórdão, com a seguinte declaração em dois pontos:ISe A compra um automóvel num stand pelo preço de 30.000€ e ao sair de lá tem um acidente que leva à perda total do veículo, o valor comercial do veículo é de 25.000€ (o valor que é dado a um carro que foi comprado e saiu de um stand, sendo considerado de 2º mão, usado e por isso desvalorizado), mas o valor de substituição é de 30.000€, porque é esse o preço que A tem que pagar para comprar de novo esse mesmo veículo.
Aquilo que A perde e de que deve ser indemnizado são os 30.000€ (valor de substituição) e não os 25.000€ (valor comercial ou valor venal ou valor de mercado, conforme as formulações).
Assim sendo, não usaria a expressão valor venal nem valor comercial nem valor de mercado para referir aquilo a que A tem direito, mas sim valor de substituição (conceito que a jurisprudência e a doutrina muito custosamente foram impondo e que não se pode deixar cair: veja-se o sugestivo título da anotação de Júlio Gomes referido abaixo).
Ou seja, não é de ter em conta o valor venal (= de mercado ou comercial) do objecto, no caso, do veículo sinistrado, mas sim o valor de substituição do veículo, ou seja, o valor necessário à compra de um veículo da mesma marca, tipo, idade e estado de conservação idêntico ao do sinistrado e, acrescente-se, com os mesmos extras não integrados de série, que normalmente será superior ao valor de mercado/comercial/venal do veículo sinistrado (tudo isto tem em conta os ensinamentos que se tiram da anotação do Prof. Júlio Manuel Vieira Gomes, com ampla fundamentação e referências ao direito inglês, francês, italiano e alemão, ao ac. do STJ de 27/02/2003, Rev. 4016/02, publicada sob o título custo das reparações, valor venal ou valor de substituição? nos Cadernos de Direito Privado, nº. 3, Julho / Setembro 2003, e do próprio acórdão, publicado no ITIJ sob 02B4016); no mesmo sentido, de valor de substituição, vejam-se os acórdãos do STJ de 16/11/2000, CJ.STJ.2000, III, págs. 124/125, 07/07/1999, CJ.STJ.99, III, págs. 16/19, e de 21/02/2006, CJ.STJ.2006, págs. 83/85, e do TRL de 09/02/2006, CJ.2006.I, págs. 98/101 – todos citados pelo Prof. Paulo Mota Pinto, no seu Interesse contratual negativo e interesse contratual positivo, Coimbra Editora, Dez2008, nota 1641, págs. 569 a 571, que segue a mesma posição e ainda cita no mesmo sentido uma anotação de Vaz Serra, a um ac. do STJ, publicada na RLJ. Sempre no mesmo sentido, veja-se também a posição de Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. I, 2010, 9ª edição, Almedina, pág. 420 e respectiva nota, que por sua vez lembra, ainda no mesmo sentido, a anotação de Calvão da Silva, ao anotação do STJ de 04/10/2007, Concorrência entre risco do veículo e facto do lesado: o virar de página?, RLJ 137/3946 – Setembro-Outubro de 2007, especialmente a pág, 64).
Aliás, o entendimento contrário, que foi permitido durante uns tempos pelo art. 20-I/2 introduzido no Dec.-Lei 522/85, de 31/12, pelo Dec.-Lei 83/2006, de 03/05 (revogado pelo Dec.-Lei 291/2007, de 21/08, cujo art. 41 fala agora em valor de substituição, mistura com o valor venal), ou seja, o entendimento do valor do bem como o valor de venda no mercado, deve ser considerado inconstitucional (neste sentido, por exemplo, Paulo Mota Pinto, obra citada, notas 1639 a 1641, págs. 568/571: “Como não se vê que a alteração introduzida pelo Dec-Lei n.º 83/2006 seja adequada à renovação do parque automóvel […], e não pode assim deixar de concluir-se que estamos perante uma mal disfarçada (ou "contrabandeada" a pretexto da transposição de uma Directiva) medida de claro favorecimento das seguradoras em prejuízo dos lesados. Tem de concluir-se que as soluções em causa suscitam as mais sérias reservas, não só no plano da escandalosa injustiça material que comportam (pare­cendo necessário recordar a este propósito que o proprietário do veículo lesado, a ressarcir, não é o culpado pelo acidente), como, mesmo, eventualmente, no plano da constitucionalidade, pela violação da garantia constitucional contra uma privação forçada da propriedade (falando do direito do lesado a dispor do seu próprio património, v. L. Menezes Leitão, Direito das obrigações, I, cit. [5ª edição, 2006], p. 396) e pela manifesta desproporcionalidade e injustiça das soluções consagradas. 
Daí que Menezes Cordeiro, Direito dos Seguros, Almedina, Janeiro de 2013, pág. 749, diga [falando em relação a seguros de bens e não de responsabilidade, pelo que aqui tem que ser lido com as devidas adaptações]: 
“O princípio do indemnizatório deve ser entendido em termos materiais: o que, em regra, não sucede. Há que ponderar e validar o dano concreto, no sentido de precisas desvantagens sofridas pelo lesado. 
“Num exemplo infelizmente corrente: num sinistro, é destruído o automóvel do segurado: um modelo corrente que, novo, valerá € 20.000 e, usado com um ano, € 15.000; ao abrigo do artigo 128.°, o segurador irá pagar os € 15.000; mas com essa quantia, o segurado não vai comprar o modelo equivalente em condições (um automóvel com um ano de uso, em bom estado); provavelmente terá de optar ou por um modelo pior, ou por um automóvel novo, perdendo € 5.000. Outro: o lesado restaura um modelo de automóvel corrente mas antigo, com fins de coleção; é destruído num sinistro; o segurador, invocando o montante do dano, não considera o custo do restauro; vai pagar uma quantia mínima, invocando o valor do mercado. 
Tudo isto passa impune, uma vez que o cidadão normal não vai intentar azardosas ações contra seguradores, para reaver, ao fim de anos e eventualmente, o valor em falta.”II Por outro lado, o que A faz com a indemnização que lhe for atribuída como valor necessário à reparação do veículo, ou seja, se repara ou não o veículo, é indiferente (neste sentido, expressamente, Lebre de Freitas, A acção executiva depois da reforma da reforma, 5ª edição, nota 18, da pág. 386, do ponto 23.2.1 B da parte III: “[…] o seu proprietário, recebida a indemnização que lhe faculta fazê-lo reparar por terceiro, pode, se quiser, optar pela venda do carro”).
Pelo que, o único obstáculo que se pode opor ao valor da reparação é o ele ser excessivamente oneroso em relação ao valor de substituição, caso em que o lesado apenas terá direito a este. 
No caso dos autos podendo-se concluir que o valor da reparação é excessivamente oneroso em comparação com o valor de substituição, o lesado apenas terá direito a este, que terá de ser o valor comercial do veículo no caso de não se ter alegado ou provado que o valor de substituição é superior ao valor comercial e não for possível condenar no valor de substituição que for fixado em liquidação posterior.

Pedro Martins

3ª SECÇÃO – Processo nº 4135/07.0TBVFR.P1 Tribunal Judicial de Santa Maria da Feira – 2º Juízo Cível SUMÁRIO (artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil) I - Para efeito do cálculo da obrigação de indemnização, por força dos preceitos dos artigos 562º e 566º, nºs 1 e 2, do Código Civil, será de considerar o valor de reparação de um automóvel, mesmo que este seja superior ao seu valor comercial, se o custo daquela não for excessivamente oneroso para o devedor II - Tal opção, entre a restauração natural ou a indemnização por equivalente, deve ser ponderada casuisticamente III – Em princípio, não deve ser ordenada a reparação que importe em montante três vezes superior ao valor comercial do veículo IV - Se o lesado não pretender repará-lo, a indemnização nunca se deverá pautar pelo valor da hipotética reparação, mas sim pelo do veículo Acordam em conferência no Tribunal da Relação do PortoI RELATÓRIOO Estado Português intentou a presente acção declarativa, sob a forma ordinária, contra B… – Companhia de Seguros, SA, pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia de 38.825,01 €, quantia acrescida de juros de mora contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento. Fundamenta o seu pedido, em súmula, em responsabilidade civil do condutor de veículo seguro na ré, que interveio em acidente do qual resultaram danos para o autor. A ré, regularmente citada, apresentou contestação, na qual impugnou a versão do acidente apresentada pelo autor, alegando que a culpa do embate se deveu ao condutor do veículo do Estado. Saneado e instruído o processo, efectuou-se o julgamento, tendo sido proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, condenando a ré a pagar ao autor 29.535,68 €, quantia acrescida de juros de mora contados desde a data da citação, à taxa de 4%, até efectivo e integral pagamento, absolvendo a ré do demais pedido. Inconformada, veio a ré interpor recurso, o qual foi admitido como sendo de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo. O autor contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso. Foram colhidos os vistos legais.II FUNDAMENTAÇÃO1. PEÇAS PROCESSUAIS 1.1. Factos provados relevantes para o recurso a) No dia 25 de Setembro de 2004, pelas 17.45 horas, na E.N. nº 1, ao km 279,450 em …, …, área desta comarca, ocorreu um embate, no qual foram intervenientes os veículos com as matrículas GNR E - …. (viatura militar) e ..-..-VU (viatura civil). b) A viatura militar pertencia ao Autor (GNR), e era conduzida, em serviço, por C…, cabo da GNR, a exercer funções no Posto Territorial de Santa de Maria de Lamas, o qual transportava consigo o também cabo da GNR, que se encontrava igualmente em exercício de funções, D…. c) (…) no mesmo veículo eram transportados também dois solípedes, pertencentes ao Autor. d) A viatura civil pertencia a E… e era conduzida pelo próprio. e) À data do embate, a responsabilidade civil por danos causados a terceiros pelo veículo VU encontrava-se transferida para a B… Companhia de Seguros, SA, ora Ré, através do contrato de seguro do ramo automóvel titulado pela apólice nº ………. (…) ff) Os solípedes transportados na viatura militar, em consequência da colisão, sofreram mazelas, pelo que tiveram de receber assistência médico-veterinária no montante de 45,78 €, quantia essa também suportada pela GNR. gg) A viatura militar interveniente na colisão sofreu diversos estragos, orçamentados em 35.004,61 €, para o caso de ser reparado em oficina – e em vinte e cinco mil, setecentos e quinze euros e vinte e oito cêntimos (25.715, 28 €), para o caso de ser reparado nas oficinas da GNR. hh) A viatura em causa não foi reparada sendo que, antes do acidente, tinha o valor comercial de, pelo menos, 8.500,00 € e, após esse acidente, passou a ter o valor de cerca de 700,00 €. (…) 1.2. Conclusões das alegações de recurso 1. A ora apelante não se pode conformar com a douta sentença, no que respeita à sua condenação a pagar ao autor a quantia de 25.715,28 €, acrescida de juros de mora a título de reparação do veículo sinistrado. 2. Considera a ora apelante que, a sentença ora objecto de recurso fez errada aplicação do direito aos factos dados como provados sob os artigos gg) e hh) da referida sentença. 3. O veículo tinha, à data do acidente, o valor comercial de 8.500,00 €. 4. A sua reparação foi orçada em 35.004,61 €, em oficina civil, e em 25.715,28 €, em oficinas do autor. 5. Existe um diferencial de cerca 17.000,00 € entre o valor do veículo à data do acidente e o valor estimado para a sua reparação nas oficinas do autor. 6. Acresce que também resultou provado que o veículo em causa não foi reparado e, conforme confessado pelo autor no artigo 28º da sua PI foi o mesmo abatido. 7. A decisão ora recorrida configura clara e inequivocamente uma situação de agravamento excessivo e desmesurado do credor perante o alegado devedor, ora recorrente e de enriquecimento sem causa do autor. 8. A reparação do veículo acidentado é impossível de concretizar uma vez que o mesmo foi abatido. 9. Ao caso tem aplicação o artigo 41º do Decreto-Lei 291/2007, o qual estabelece que o veículo acidentado se encontra numa situação de perda total. 10. Nestes termos, pugna a ora recorrente pela alteração da douta sentença ora recorrida, por uma que condene a recorrente em valor não superior a 8.500,00 € no que respeita à perda total do veículo acidentado. 11. Pelo que fica supra alegado, decidido como ficou, o douto tribunal “a quo”, afrontou o disposto na lei, desde logo, o disposto no artigo 41º do Decreto-Lei 291/2007.***2. DISCUSSÃO A ré insurge-se contra a sentença, no que respeita à sua condenação a pagar ao autor a quantia de 25.715,28 €, acrescida de juros de mora a título de reparação do veículo sinistrado. Sustenta que, por força do disposto no artigo 41º do Decreto-Lei 291/2007, de 21 de Agosto, face à perda total do veículo acidentado, a indemnização se deveria reportar ao valor comercial do mesmo à data do acidente, que não ao valor do custo da sua reparação. 2.1. Vejamos. Como é bem referido pelo senhor procurador nas suas alegações, o DL nº 291/2007 não é aplicável in casu, concernente a sinistro ocorrido antes da sua entrada em vigor. Bem como o artigo 20º-I do DL nº 522/85, de 31 de Dezembro, preceito idêntico àqueloutro, que só foi introduzido pelo DL nº 83/06, de 3 de Maio, em data também posterior ao acidente ora em discussão. De qualquer modo, tais normas nunca se aplicariam ao presente litígio, em fase judicial. Como se anota no acórdão desta Relação do Porto de 7.09.2010 (Henrique Araújo), in dgsi.pt, tal disciplina vale para os “procedimentos a adoptar pelas empresas de seguros e da fixação de prazos com vista à regularização rápida de litígios e do estabelecimento de princípios base na gestão de sinistros”. Assim “mediante a apresentação de uma proposta razoável de indemnização apresentada pela seguradora, fundada nos critérios estabelecidos nesse diploma (291/2007), pode o segurado ou o terceiro aceitá-la, resolvendo-se em definitivo o litígio”. No entanto, frisa-se nesse aresto, “se não houver acordo, e se houver necessidade de recorrer às vias judiciais, a determinação da espécie e o quantum da indemnização passam a ser regulados pelos regras e princípios gerais da responsabilidade civil e da obrigação de indemnização, entre os quais avultam, de um lado, o princípio da reparação in natura e, de outro, o princípio da reparação integral do dano, ficando afastada a aplicação dos critérios previstos no Capítulo III do DL 291/2007, designadamente o artigo 41º”. 2.2. Analisemos, pois, a questão nos estritos termos do preceito do artigo 562º do Código Civil, no qual se consagra para a obrigação de indemnização o princípio da reposição natural - «quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação». Nomeadamente por referência ao artigo 566º, nº 1, do mesmo código quando especifica que «a indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor». A primeira questão que se coloca tem a ver o facto de o autor ter abatido o veículo, arredando a hipótese de o reparar. Pelo que nunca se deverá eleger o valor de reparação como medida da indemnização em dinheiro. Na verdade, aquele valor apenas deverá ser considerado com o fito de proceder à reparação. E nunca para calcular o valor do que está irrecuperavelmente perdido. O que se vem discutindo é tão só até que ponto se deve optar pela reparação, caso esta tenha um custo superior ao do valor do veículo a reparar. É nessa linha, aliás, que se enquadra o acórdão do STJ de 12.01.2006 (Salvador da Costa), in dgsi.pt, no qual indevidamente se apoiou a decisão que ora se põe em crise. Em cujo sumário se refere que “a reconstituição natural é inadequada se for manifesta a desproporção entre o interesse do lesado e o custo para o lesante que ela envolva, em termos de representar para o último um sacrifício manifestamente desproporcionado quando confrontado com o interesse do lesado na integridade do seu património”. E que “não basta para se aferir da onerosidade da reparação in natura de um veículo automóvel a consideração do seu valor venal ou de mercado, antes se impondo o seu confronto com o valor de uso que o lesado dele extrai pelo facto de dele dispor para a satisfação das suas necessidades”. Concluindo que se “justifica, por não ser inadequada, a reparação do veículo automóvel matriculado em 1983, melhorado, bem conservado, com 111.410 quilómetros andados, cujo custo excede o seu valor de mercado em 1.247 €”. Temos portanto que, se o valor da reparação exceder o do próprio veículo, se deverá ponderar até que ponto deva ser admitida essa reconstituição natural, como previsto no artigo 562º, ou se caberá antes optar pela fixação da indemnização em dinheiro, considerando-se nos termos do nº 1 do artigo 566º que aquela seja excessivamente onerosa para o devedor. E neste ponto concordamos com a jurisprudência do acórdão do STJ de 21.04.2010 (Garcia Calejo), ibidem, de que “em relação a um veículo automóvel acidentado, sendo a sua reparação integral possível, deve privilegiar-se a sua reconstituição natural, excepto se se revelar excessivamente onerosa, o que corresponde a que o encargo seja exagerado, desmedido, desajustado para o obrigado, transcendendo-se os limites de uma legítima indemnização”. Porquanto “um veículo de valor comercial reduzido pode estar em excelentes condições e satisfazer plenamente as necessidades do dono”. Já que “nestas circunstâncias a quantia equivalente ao valor de mercado do veículo (muitas vezes ínfima) não conduzirá à satisfação dessas mesmas necessidades, o que equivale a dizer-se que não reconstituirá o lesado na situação que teria se não fosse o acidente, pelo que a situação inicial do lesado só será reintegrada com a reparação do veículo”. Propugnando o princípio de que “a indagação sobre a restauração natural ou a indemnização equivalente, deve fazer-se casuisticamente, sem perder de vista que se deve atender à melhor forma de satisfazer o interesse do lesado, o qual deve prevalecer sobre o do lesante, sendo pouco relevante, para os fins em análise, que o valor da reparação do veículo seja superior ao seu valor comercial”. No mesmo sentido, os acórdãos desta Relação do Porto de 1.06.2010 e de 29.05.2012. No artigo 41º, nºs 1, alínea c), e 2, do DL nº 291/2007, veio-se a considerar que se deve optar pela indemnização em dinheiro, reportada ao valor venal do veículo (valor de substituição do mesmo à data do acidente) sempre que “se constate que o valor estimado para a reparação dos danos sofridos, adicionado do valor do salvado, ultrapassa 100 % ou 120 % do valor venal do veículo consoante se trate respectivamente de um veículo com menos ou mais de dois anos”. Disciplina já anteriormente consagrada no artigo 20°- I do DL 83/2006. Preceitos que, como supra se deixou claro, não colhem no presente caso, quer por serem posteriores aos factos, quer por não se aplicarem à fase judicial. Não podemos, todavia, ignorar, na ponderação casuística que se levar a efeito, as linhas que emanam dos mesmos. Sendo nessa esteira que, no acórdão desta Relação do Porto de 28.06.2013 (Carlos Portela), in CJ, Tomo III, pág. 175, se afirmou que “a reparação de uma viatura automóvel será excessivamente onerosa, quando ultrapassar em 120% o seu valor comercial”. Já que, “também na situação em análise, demonstrada que está a excessiva onerosidade da reparação (por flagrante desproporção entre o custo da reparação e o custo de viatura idêntica à sinistrada, que pode ser adquirida no mercado de usados – o valor da reparação corresponde sensivelmente ao dobro do preço de um veículo idêntico ao acidentado no mercado dos usados), se impõe, que nos termos do artigo 566º, nº 1, do CC, se fixe a indemnização em dinheiro, cuja medida é a resultante da teoria da diferença, consagrada no nº 2 do mesmo preceito”. Do mesmo modo, no presente caso, o valor da reparação seria manifestamente superior ao do valor comercial do veículo (3 vezes mais – 25.715,28 € e 8.500,000 €, respectivamente). O que o próprio autor reconheceu. Pois, ciente da inutilidade da reparação, optou por abater o veículo. Não colheria, assim, como se fez na sentença recorrida, eleger o custo dessa hipotética reparação como critério para o apuramento da indemnização. O que apenas caberia ponderar se se optasse pela reconstituição natural (com efectiva reparação), que não pela indemnização por equivalente (em dinheiro). Não questionaremos se o valor de substituição do veículo será ou não superior ao seu valor comercial, porque tal não foi sequer equacionado. Devendo a indemnização ser estimada com base no valor comercial do veículo – 8.500,00 €. O que, considerando os restantes danos, não postos em causa no presente recurso, no montante de 3.820,40 €, perfaz um cômputo indemnizatório global de 12.320,40 €.III DISPOSITIVORevoga-se a sentença recorrida, condenando-se a ré a pagar ao autor a quantia de 12,320,40 €, acrescida de juros de mora contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, à taxa de 4%, no mais a absolvendo do pedido. Custas pelo recorrido - artigo 446º do Código de Processo Civil. Notifique e registe. Porto, 16 de Janeiro de 2014 José Manuel deAraújo Barros Pedro Martins (Declaração de voto) Judite Pires ____________ Voto favoravelmente o acórdão, com a seguinte declaração em dois pontos:ISe A compra um automóvel num stand pelo preço de 30.000€ e ao sair de lá tem um acidente que leva à perda total do veículo, o valor comercial do veículo é de 25.000€ (o valor que é dado a um carro que foi comprado e saiu de um stand, sendo considerado de 2º mão, usado e por isso desvalorizado), mas o valor de substituição é de 30.000€, porque é esse o preço que A tem que pagar para comprar de novo esse mesmo veículo. Aquilo que A perde e de que deve ser indemnizado são os 30.000€ (valor de substituição) e não os 25.000€ (valor comercial ou valor venal ou valor de mercado, conforme as formulações). Assim sendo, não usaria a expressão valor venal nem valor comercial nem valor de mercado para referir aquilo a que A tem direito, mas sim valor de substituição (conceito que a jurisprudência e a doutrina muito custosamente foram impondo e que não se pode deixar cair: veja-se o sugestivo título da anotação de Júlio Gomes referido abaixo). Ou seja, não é de ter em conta o valor venal (= de mercado ou comercial) do objecto, no caso, do veículo sinistrado, mas sim o valor de substituição do veículo, ou seja, o valor necessário à compra de um veículo da mesma marca, tipo, idade e estado de conservação idêntico ao do sinistrado e, acrescente-se, com os mesmos extras não integrados de série, que normalmente será superior ao valor de mercado/comercial/venal do veículo sinistrado (tudo isto tem em conta os ensinamentos que se tiram da anotação do Prof. Júlio Manuel Vieira Gomes, com ampla fundamentação e referências ao direito inglês, francês, italiano e alemão, ao ac. do STJ de 27/02/2003, Rev. 4016/02, publicada sob o título custo das reparações, valor venal ou valor de substituição? nos Cadernos de Direito Privado, nº. 3, Julho / Setembro 2003, e do próprio acórdão, publicado no ITIJ sob 02B4016); no mesmo sentido, de valor de substituição, vejam-se os acórdãos do STJ de 16/11/2000, CJ.STJ.2000, III, págs. 124/125, 07/07/1999, CJ.STJ.99, III, págs. 16/19, e de 21/02/2006, CJ.STJ.2006, págs. 83/85, e do TRL de 09/02/2006, CJ.2006.I, págs. 98/101 – todos citados pelo Prof. Paulo Mota Pinto, no seu Interesse contratual negativo e interesse contratual positivo, Coimbra Editora, Dez2008, nota 1641, págs. 569 a 571, que segue a mesma posição e ainda cita no mesmo sentido uma anotação de Vaz Serra, a um ac. do STJ, publicada na RLJ. Sempre no mesmo sentido, veja-se também a posição de Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. I, 2010, 9ª edição, Almedina, pág. 420 e respectiva nota, que por sua vez lembra, ainda no mesmo sentido, a anotação de Calvão da Silva, ao anotação do STJ de 04/10/2007, Concorrência entre risco do veículo e facto do lesado: o virar de página?, RLJ 137/3946 – Setembro-Outubro de 2007, especialmente a pág, 64). Aliás, o entendimento contrário, que foi permitido durante uns tempos pelo art. 20-I/2 introduzido no Dec.-Lei 522/85, de 31/12, pelo Dec.-Lei 83/2006, de 03/05 (revogado pelo Dec.-Lei 291/2007, de 21/08, cujo art. 41 fala agora em valor de substituição, mistura com o valor venal), ou seja, o entendimento do valor do bem como o valor de venda no mercado, deve ser considerado inconstitucional (neste sentido, por exemplo, Paulo Mota Pinto, obra citada, notas 1639 a 1641, págs. 568/571: “Como não se vê que a alteração introduzida pelo Dec-Lei n.º 83/2006 seja adequada à renovação do parque automóvel […], e não pode assim deixar de concluir-se que estamos perante uma mal disfarçada (ou "contrabandeada" a pretexto da transposição de uma Directiva) medida de claro favorecimento das seguradoras em prejuízo dos lesados. Tem de concluir-se que as soluções em causa suscitam as mais sérias reservas, não só no plano da escandalosa injustiça material que comportam (pare­cendo necessário recordar a este propósito que o proprietário do veículo lesado, a ressarcir, não é o culpado pelo acidente), como, mesmo, eventualmente, no plano da constitucionalidade, pela violação da garantia constitucional contra uma privação forçada da propriedade (falando do direito do lesado a dispor do seu próprio património, v. L. Menezes Leitão, Direito das obrigações, I, cit. [5ª edição, 2006], p. 396) e pela manifesta desproporcionalidade e injustiça das soluções consagradas. Daí que Menezes Cordeiro, Direito dos Seguros, Almedina, Janeiro de 2013, pág. 749, diga [falando em relação a seguros de bens e não de responsabilidade, pelo que aqui tem que ser lido com as devidas adaptações]: “O princípio do indemnizatório deve ser entendido em termos materiais: o que, em regra, não sucede. Há que ponderar e validar o dano concreto, no sentido de precisas desvantagens sofridas pelo lesado. “Num exemplo infelizmente corrente: num sinistro, é destruído o automóvel do segurado: um modelo corrente que, novo, valerá € 20.000 e, usado com um ano, € 15.000; ao abrigo do artigo 128.°, o segurador irá pagar os € 15.000; mas com essa quantia, o segurado não vai comprar o modelo equivalente em condições (um automóvel com um ano de uso, em bom estado); provavelmente terá de optar ou por um modelo pior, ou por um automóvel novo, perdendo € 5.000. Outro: o lesado restaura um modelo de automóvel corrente mas antigo, com fins de coleção; é destruído num sinistro; o segurador, invocando o montante do dano, não considera o custo do restauro; vai pagar uma quantia mínima, invocando o valor do mercado. Tudo isto passa impune, uma vez que o cidadão normal não vai intentar azardosas ações contra seguradores, para reaver, ao fim de anos e eventualmente, o valor em falta.”II Por outro lado, o que A faz com a indemnização que lhe for atribuída como valor necessário à reparação do veículo, ou seja, se repara ou não o veículo, é indiferente (neste sentido, expressamente, Lebre de Freitas, A acção executiva depois da reforma da reforma, 5ª edição, nota 18, da pág. 386, do ponto 23.2.1 B da parte III: “[…] o seu proprietário, recebida a indemnização que lhe faculta fazê-lo reparar por terceiro, pode, se quiser, optar pela venda do carro”). Pelo que, o único obstáculo que se pode opor ao valor da reparação é o ele ser excessivamente oneroso em relação ao valor de substituição, caso em que o lesado apenas terá direito a este. No caso dos autos podendo-se concluir que o valor da reparação é excessivamente oneroso em comparação com o valor de substituição, o lesado apenas terá direito a este, que terá de ser o valor comercial do veículo no caso de não se ter alegado ou provado que o valor de substituição é superior ao valor comercial e não for possível condenar no valor de substituição que for fixado em liquidação posterior. Pedro Martins