I)– Não se deverá proceder à reapreciação da matéria de facto quando os factos objecto de impugnação não forem susceptíveis, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação, de ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe ser inútil, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processuais (arts. 2º, nº 1, 137º e 138º, todos do C.P.C.). II)– Na impugnação da matéria de facto, ao recorrente não basta fazer uma apreciação geral de toda a prova, fazendo dela a sua interpretação e tirar a conclusão de que todos os factos impugnados devem ser dados como provados na forma por si apontada. III)– A nulidade do artº 615º nº 1, al. d) do Código de Processo Civil ocorre quando o Juiz, na Sentença, não resolve todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Além disso, o Juiz não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. IV)– A decisão que ultrapassa o pedido formulado, sem modificação objectiva da instância, passando a abranger matéria distinta, está eivada de nulidade prevista na consignada alínea e) do art.º 615º do Código de Processo Civil. V)– A promessa de liberação, assunção interna de dívida ou assunção de cumprimento é uma figura muito próxima da assunção de dívida. Nela se afasta a figura do credor, obrigando-se o terceiro apenas perante o devedor. Na falta de ratificação do credor, a assunção será apenas uma promessa de liberação. VI)– Os Reconvintes poderiam recusar a celebração do negócio até lhes serem fornecidas as informações que entendiam determinantes para a sua vinculação nos termos em que a mesma ocorreu, ao invés de confiarem - sem se provar que essa confiança foi gerada pelos Reconvindos – em que as informações alegadamente em falta lhes seriam mais favoráveis do que se vieram a revelar. (Sumário elaborado pelo relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº7 do CPC).
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: * 1.–Relatório: CS e MN intentaram a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra M… M… – BERÇÁRIO, CRECHE E ATL, LDA., VC e LC, todos identificados nos autos, peticionando a condenação dos RR. no pagamento dos valores em dívida resultantes do contrato de abertura de crédito em conta corrente Nº PT 003………….2 celebrado entre a Caixa Geral de Depósitos S.A. e a “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.”, até ao montante de € 30.000,00 e, bem assim, dos juros vencidos, acrescidos dos juros vincendos até efectivo e integral pagamento. Alegaram em síntese, que no dia 07/02/2014, os Autores e a “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.” celebraram com os RR. um acordo denominado de “Assunção de dívida”, nos termos do qual estes assumiram solidariamente os valores em dívida resultantes do contrato de abertura de crédito em conta corrente n.º PT 003………….2 celebrado entre a Caixa Geral de Depósitos S.A. e a H… M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda., até ao montante de € 30.000,00, exonerando os AA. até esse montante. Mais referiram que o acordo de assunção de dívida não foi até à presente data ratificado expressamente pelo credor CGD. Acrescentaram que os RR. não cumpriram o assumido perante os Autores e a Happy M… – cuja intervenção principal provocada requereram - e que interpelados para pagamento, não o fizeram. * Contestaram os RR. sustentando, em síntese, que o acordo foi celebrado na sequência de negociações tendentes à aquisição do “colégio” onde funcionava o estabelecimento designado de Happy S…, designadamente o goodwill do negócio, ou seja, a clientela e os bens móveis, tendo no âmbito das mesmas os AA. transmitido aos RR. a ideia que estavam munidos de poderes para tomar decisões acerca de tudo (não obstante a sociedade Happy M… se encontrar em processo de insolvência), menos do imóvel que pertencia a uma entidade financeira. Mais alegaram que os AA. sugeriram aos RR. que o montante de € 30.000,00 referentes ao goodwill (clientela) e bens móveis fosse pago pelo assumir de uma dívida que os Autores tinham perante a Caixa Geral de Depósitos (CGD), o que aceitaram mediante duas condições: 1) que fosse apurado o valor adiantadamente pago pelos clientes, que seria a deduzir naquele montante; 2) que o valor que os RR. viessem a pagar pela aquisição do recheio (pois os bens móveis haviam sido apreendidos a favor da massa insolvente) seria também a deduzir naquele montante, condições que os AA. aceitaram. Sucede que, o valor dos adiantamentos dos clientes se cifrava em € 17.627,81, tendo além disso os Réus pago € 15.375,00 pelos bens móveis e € 1.537,50 a título de despesas da empresa Avalibérica, que promoveu a venda, tudo perfazendo o total de € 34.540,31. Mais aduziram que, em face de tal, contactaram a Autora mulher a fim de proceder ao distrate do documento assinado, para o que esta se mostrou indisponível, pelo que os Réus deram conhecimento desta situação aos Autores, ao Dr. LT (Caixa Geral de Depósitos) e ao Dr. RG (Administrador de Insolvência Happy M… Lda.), na sequência do que surge a presente acção. Sustentaram verificar-se uma situação de má-fé dos AA. durante e na conclusão do contrato de assunção de dívida em causa nestes autos e de vício na formação da vontade. Terminaram peticionando a improcedência da acção e a procedência das excepções deduzidas, com a consequente absolvição dos pedidos e deduziram reconvenção, peticionando a condenação dos AA. no pagamento da quantia de € 7.950,31, sendo a quantia de € 4.540,31 por referência à diferença entre o valor que suportaram e o valor de € 30.000,00 acordado, a quantia de € 910,00 relativa aos encargos suportados com um mútuo que tiveram que contrair para o pagamento das referidas quantias, e a quantia de € 2.500,00 a título de danos não patrimoniais sofridos pelos 2.º e 3.º Réus, quantia esta acrescida de juros até efectivo e integral pagamento, bem como nas quantias que se vierem a apurar em liquidação de sentença, relativa aos custos que ainda tenham que suportar com o empréstimo que contraíram, e nos juros moratórios que se vencerem após a citação. * Replicaram os AA. dizendo que a assunção de dívida se destinou apenas a compensá-los pela manutenção do estabelecimento em funcionamento e, por essa via, do aviamento ou goodwill do mesmo, sendo alheios às despesas suportadas pelos RR. e a qualquer dano moral que os mesmos possam ter sofrido. Na mesma sede, pronunciaram-se ainda quanto à ocorrência do vício de litigância de má-fé, suscitado pelos Réus na contestação, impugnando igualmente a factualidade a esse nível alegada. Concluíram pela improcedência da reconvenção com a sua absolvição de tal pedido. * Por despacho de fls. 275, veio a ser indeferida a requerida intervenção principal provocada da “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.”. * Realizada audiência prévia, na mesma foi admitida liminarmente a reconvenção e fixado o objecto do litígio e os temas da prova. * Realizou-se audiência de discussão e julgamento vindo a ser proferida sentença julgando a acção procedente e a reconvenção improcedente, condenando os RR. no pagamento dos valores em dívida resultantes do contrato de abertura de crédito em conta corrente Nº PT 003………….2 celebrado entre a Caixa Geral de Depósitos S.A. e a “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.”, até ao montante de € 30.000,00 (trinta mil euros), e dos juros vencidos a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A. após 31 de Julho de 2014, sobre aquele montante e absolvendo os AA. do pedido reconvencional. * Não se conformando com a decisão, dela apelaram os RR., formulando as seguintes conclusões: “1)- O ponto 10 dos factos provados deverá ser alterado aditando-lhe o seguinte: “Cartório Notarial de Lisboa perante a Notária Dra. AP”, situação esta que deriva expressamente do doc. 4 constante a fls..., facto esse que é pacifico entre as partes. 2)- Assim, o ponto 10 deverá ser alterado passando a ter a seguinte redacção: “10) Em 7 de Fevereiro de 2014, a Ré “M… M… – Berçário, Creche e ATL, Lda.”, na qualidade de locatária, e a Caixa Leasing e Factoring – Instituição Financeira de Crédito, S.A., na qualidade de locadora, outorgaram no Cartório Notarial de Lisboa perante a Notária Dra. AP escrito denominado “Contrato de Locação Financeira Imobiliária n.º 1…….4”, tendo por objecto o imóvel onde funcionava o dito estabelecimento.” 3)- Ao ponto 11 dos factos provados deverá incluir-se o seguinte: “no interior do Cartório Notarial de Lisboa da Dra. AP, mas sem o reconhecimento presencial das assinaturas” situação essa que resulta do próprio documento de fls. 10 e do depoimento da própria Autora CS.. 4)- O ponto 11) deverá ser alterado passando a ter a seguinte redacção: 11) Nesse mesmo dia 7 de Fevereiro de 2014, no interior do Cartório Notarial de Lisboa da Dra. AP, sem o reconhecimento presencial das assinaturas, os Autores (…). 5)- Os pontos E) e F) foram dados como não provados e deviam ter sido dado como provados, pois que, o doc. de fls. 10 tinha duas condicionantes, as quais ficaram demonstradas. 6)- No documento de fls. 10 ficou a ressalva com a palavra “até” que o valor dos 30.000€ que demonstrava que o valor podia ser inferior em função do montante que viesse a ser apurado dos pagamentos efectuados adiantadamente pelos clientes (mensalidades dos pais que pagavam anualmente, semestralmente e trimestralmente __facto este dado como provado no ponto 14 e 15. 7)- Com a inclusão da palavra “até” pretendiam as partes deixar ilíquido o valor que os RR. Iriam assumir em consideração àquelas duas condicionantes, sendo que, esse valor tanto podia ser de 0€ como de 10.0000€ como de 12.000€ como de 30.000€, tudo dependeria daquelas duas condições ainda incertas. 8)- Todos os documentos foram assinados no mesmo dia à mesma hora no Cartório Notarial de Lisboa da Dra. AP, com o reconhecimento presencial das assinaturas. 9)- Só um documento não o foi com reconhecimento de assinaturas: O documento de assunção de divida de fls. 10 em causa nestes autos. 10)- Se aquele negócio não tivesse aquelas duas condicionantes também teria sido feito o reconhecimento de assinaturas do mesmo. 11)- A testemunha NS foi peremptório ao afirmar que existiam condicionantes no negócio conforme se alcança da gravação áudio. 12)- A testemunha HA, ex-financeiro da empresa M… M…, acompanhou o negócio e cujo depoimento e confirmou a existência de “variáveis” (assim lhe chamou a testemunha) e que eram os adiantamentos pagos pelos pais e a incerteza do montante que os RR. iam pagar pela aquisição do recheio. 13)- A testemunha HA referiu expressamente que por existirem condicionantes ao documento de assunção de divida de fls. 10 e que por esse motivo não o inscreveu na contabilidade porque haviam “variáveis” e o valor não era pacifico. 14)- Situação esta claramente demonstrativa da existência das duas condições. 15)- O depoimento da testemunha PM o qual o tribunal a quo entendeu merecer a confiança do tribunal, temos que salientar que o mesmo referiu os AA. e os RR. compareceram na sede da CGD para darem a conhecer o ponto da situação e informaram que não sabiam se o valor viria a ser de 25, 15 ou 10. Ou seja, queria com isto dizer a testemunha que poderia existir oscilação no valor do documento de fls. 10 em função das variáveis que estavam ainda em aberto. 16)- E isto foi dito perante a testemunha na sede da CGD. Facto este que o tribunal ignorou por completo apesar de ter caracterizado o depoimento desta testemunha como credível. 17)- O tribunal a quo errou na conclusão a que chegou quanto ao documento de assunção de divida de fls. 10, pois que, efectivamente aquele documento de assunção de divida tinha aquelas duas condicionantes, e pelos montantes que se veio a apurar em sede de julgamento e que foram 100% coincidentes com o alegado na contestação, ao que acresce o depoimento das testemunhas PM (Caixa Geral de Depósitos), NS e HA, tudo conforme transcrições dos seus depoimentos supra transcritos na motivação. 18)- O depoimento da testemunha NS contrariamente ao que decidiu o tribunal a quo, deveria ter merecido a credibilidade perante o tribunal. 19)- Os RR. não pretendem em sede de recurso uma “repetição integral do julgamento” da matéria de facto porém, à luz das regras da experiencia comum, parece-nos que sem grande esforço se constará a existência de um erro grave na valoração da prova testemunhal, pelo que, requerem uma reapreciação da mesma. 20)- A testemunha HA, foi sempre espontânea na forma como depôs e isso é notório pelo uso de expressões e palavras correntes de senso comum, sem grande preocupação de vocabulário técnico. 21)- Foi financeiro na empresa e já não trabalhava na empresa desde Julho de 2014, sendo totalmente imparcial, o que se denota na forma coerente e escorreita como prestou o seu depoimento. 22)- HA, pelo cargo de financeiro que ocupava mostrou ter conhecimento directo dos factos e relatou-os ao tribunal de forma imparcial e sem hesitações. Foi peremptório perante a questão principal em causa nos autos, ou seja, saber se o documento de assunção de divida tinha ou não duas condicionantes e, nesse aspecto foi igualmente esclarecedor e afirmativo ao confirmar que a existência da condicionante dos valores adiantamentos pagos pelos pais e ainda a questão do montante que viesse a ser pago pela aquisição do recheio do colégio. 23)- A testemunha PM, funcionário da Caixa Geral de Depósitos que acompanhou todo este processo, entendeu o tribunal a quo que o mesmo mereceu a confiança do tribunal, porém não deu como provados os factos que o mesmo depôs, sobretudo no que diz respeito há existência de duas condições no doc. de fls. 10. 24)- A CGD sabe e sabia do documento de fls. 10, porém nunca ratificou o documento de assunção de divida porque sabia de antemão, da existência de duas condicionantes subjacentes ao documento, e sabendo posteriormente que estando verificadas essas condicionantes que traduziam um saldo 0€ a favor dos AA. sabia perfeitamente que os RR. não tinham que garantir coisa nenhuma. 25)- O Tribunal a quo fez uma incorrecta subsunção dos factos ao direito concluindo que estamos perante uma promessa de liberação. 26)- Para ocorrer uma assunção liberatória, a lei impõe que haja um consentimento expresso do credor. O que não aconteceu no caso em apreço conforme refere a própria sentença proferida pelo Tribunal a quo (leia-se na parte final da pág. 23 da sentença, fls…. e inicio da página 24, fls... “No caso de que ora cuidamos, como se referiu, da factualidade apurada nos autos em momento algum se retira a existência de qualquer envolvimento do credor Caixa Geral de Depósitos S.A. no negócio gizado pelas partes, surgindo pois aquele credor assim como absolutamente alheio ao mesmo”). 27)- O documento de fls. 10 tinha duas condicionantes: A) Que fosse apurado o valor adiantadamente pago pelos clientes que seria a deduzir naquele montante ; B) Que o valor que os RR. viessem a pagar pela aquisição do recheio que seria também a deduzir naquele montante. 28)- A razão de ser da estipulação condicional radicou na incerteza sobre as circunstâncias futuras que as partes não dominavam no momento da assinatura do documento de fls. 10 e se lhe afiguravam de verificação incerta. 29)- Facto este que ficou demonstrado pelo depoimento das testemunhas HS, HA e PM.. 30)- A testemunha PM afirmou que sabia existirem situações em “aberto” facto esse do seu conhecimento directo, pois que, AA. e RR. compareceram pessoalmente na sede da CGD em Lisboa e onde lhe fizeram um ponto de situação, tendo esta testemunha referido peremptóriamente em sede de julgamento que não sabiam se o valor era 20, 25, 15 ou 10 era ilíquido ainda. 31)- Uma das provas de que a assunção de divida tinha duas condicionantes e que se verificaram, foi o facto de o credor Caixa Geral de Depósitos ter conhecimento da existência deste documento de fls. 10 (conforme depoimento da testemunha PM – Funcionário da CGD) e não ter executado os Réus o que também fica demonstrado com o próprio requerimento executivo intentado pelo credor CGD apenas contra os autores conforme se alcança de fls. 380 a 382. 32)- A CGD não executou os RR. porque sabia de antemão que o documento estava condicionado, palavras da testemunha Paulo Marques, e mais, sabia que nada era devido pelos Réus aos Autores. 33)- O documento de fls. 10 é contrário à lei, pois que, a clientela e as funcionárias pertenciam à empresa Happy M… e eram um activo desta, daqui facilmente se conclui que não faz sentido a Sra. CS vir dizer que aquela quantia de “até 30.000€” ser uma forma de retribuição pela clientela existente já que esse seria também um bem da massa falida da sociedade Happy M… Lda insolvente. 34)- O negócio seria sempre contrário à lei na medida em que os credores da insolvente estariam a ser prejudicados em 30.000€ o que também seria ilegal e geraria a nulidade do negócio (art.º 281º e 286º do Código Civil) 35)- Na petição inicial vieram os autores, recorridos, peticionar o seguinte: “Serem os RR. condenados a pagar todos os juros vencidos, acrescidos de juros vincendos até efectivo e integral pagamento”. 36)- Na sentença condenaram-se os recorrentes a: “ (…) e dos juros vencidos a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A. após 31 de Julho de 2014, sobre aquele montante.” 37)- Não se vislumbra de que modo poderiam os recorrentes ser condenados ao pagamento de juros ao credor Caixa Geral de Depósitos quando isso não é pedido pelos autores, e por outro lado, quando nem sequer consta do documento de assunção de divida que os réus assumiriam os juros ou qualquer outra quantia perante a CGD que excedesse os 30.000€. 38)- Se atentarmos no documento de assunção de divida só ali constam “até 30.000€”, nem sequer é feita qualquer menção aos juros, daí que a sentença tenha extravasado o pedido dos autores recorridos, estamos perante uma condenação ultra petitum . 39)- Nos termos do disposto no art.º 609 n.º 1 do CPC, o tribunal está também impedido de condenar em quantia superior ou em objecto diverso do que for pedido, pelo que, a sentença é nula (art. 615.º n.º 1, alíneas d) e e), do CPC). 40)- Foram assim violados os artigos 5º n.º 1, 608º n.º 2, 609.º n.º 1, 615.º n.º 1, alíneas d) e e) do Código de Processo Civil, e ainda o art.º 281º e 286º do Código Civil”. * Foram apresentadas contra-alegações concluindo pela improcedência do recurso e manutenção da decisão recorrida. * 2.–Questões a decidir: Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, nos termos preceituados pelos artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC, as questões a decidir são: 1)–Impugnação da matéria de facto: a)- Se deve ser alterado o ponto 10 dos factos provados, aditando-lhe o seguinte: “Cartório Notarial de Lisboa perante a Notária Dra. AP” e se deve ser alterado o ponto 11 dos factos provados, aditando-lhe o seguinte: “no interior do Cartório Notarial de Lisboa da Dra. AP, mas sem o reconhecimento presencial das assinaturas”? b)- Se devem ser considerados como provados os pontos E) e F) (dados na sentença recorrida como não provados)? 2)– Se a sentença é nula nos termos do artigo 615º, nº 1, als. d) e e) do CPC? 3)– Se deve ser alterada a decisão de mérito? * 3.–Fundamentação de facto: A SENTENÇA RECORRIDA CONSIDEROU COMO PROVADA A SEGUINTE FACTUALIDADE: 1)- A “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.” era uma sociedade comercial que se dedicava designadamente à prestação de cuidados de educação para a primeira infância, educação pré-escolar e primeiro ciclo do ensino básico, organização e apoio a actividades extracurriculares, extra escolares e sócio-educativas, organização de actividades de âmbito sócio-cultural, lúdico, desportivo e de lazer. 2)- No desenvolvimento da actividade referida em 1) a sociedade “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.” explorava um estabelecimento com as valências de creche, infantário e ensino pré-escolar. 3)- A gerência da sociedade “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.” era exercida pelos Autores. 4)- Pela Ap. 1 de 24/09/2013 foi inscrita no registo comercial a insolvência da sociedade “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.”. 5)- Em data não concretamente apurada, mas anterior a 27 de Novembro de Novembro de 2013, Autores e Réus encetaram negociações com vista à aquisição por parte destes últimos do estabelecimento explorado pela “Happy M… – Ensino, Educação e Lazer Lda.”, incluindo instalações, bens móveis e carteira de clientes. 6)- No decurso dessas negociações os Autores informaram os Réus que a gestão corrente da sociedade “Happy M… – Ensino, Educação e Lazer Lda.” lhes pertencia, o que havia sido judicialmente decretado. 7)- Além disso, os Autores informaram os Réus que o imóvel onde funcionava o estabelecimento referido em 2) pertencia à Caixa Leasing e Factoring – Instituição Financeira de Crédito, S.A., no âmbito de um contrato de leasing entre ambos celebrado. 8)- Os Autores informaram os Réus que pretendiam receber o valor de € 30.000,00 pela sua intervenção no negócio referido em 5), valor que incluía a transmissão da carteira de clientes do estabelecimento referido em 2), a ser pago mediante a assunção de uma dívida que os primeiros tinham perante a Caixa Geral de Depósitos, S.A., ao que os Réus acederam. 9)- No decurso das negociações indicadas em 5), os Autores remeteram aos Réus o balancete constante de fls. 72 a 78, para cujo teor se remete e aqui se dá por integralmente reproduzido. 10)- Em 7 de Fevereiro de 2014, a Ré “M… M… – Berçário, Creche e ATL, Lda.”, na qualidade de locatária, e a Caixa Leasing e Factoring – Instituição Financeira de Crédito, S.A., na qualidade de locadora, outorgaram escrito denominado “Contrato de Locação Financeira Imobiliária n.º 1…….4”, tendo por objecto o imóvel onde funcionava o dito estabelecimento. 11)- Nesse mesmo dia 7 de Fevereiro de 2014, os Autores CS e MN e a “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.”, conjuntamente identificados como Antigos Devedores, e os Réus M… M… – Berçário, Creche e ATL, Lda., VC e LC, conjuntamente identificados como Novos Devedores, celebraram acordo escrito, denominado de “assunção de dívida”, designadamente com o seguinte teor: “Artigo único Pelo presente documento os Novos Devedores assumem solidariamente os valores em dívida resultantes do Contrato de abertura de crédito em conta corrente N.º PT 003………….2 celebrado entre a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS S.A. e a HAPPY M…, ENSINO, EDUCAÇÃO, LAZER, LDA, até ao montante de 30.000€, exonerando os Antigos Devedores até esse montante. Todas as restantes quantias que possam ser devidas à CGD, além dos 30.000€ ora assumidos, mantém-se a responsabilidade pelo seu pagamento por parte dos Antigos Devedores supra identificados.”. 12)- Com data de 16 de Julho de 2014, os Autores remeteram a cada um dos Réus, que a receberam, a missiva de fls. 476, designadamente com o seguinte teor: “(…) Exmos. Senhores, Nos termos de declaração de assunção de dívida datada de 7 de Fevereiro de 20014, a M… M… – BERÇÁRIO, CRECHE E ATL, LDA, o Senhor Dr. VC, e a Senhora Dra. LC, assumiram solidariamente os valores em dívida resultantes do Contrato de abertura de crédito em conta corrente Nº PT 003………….2 celebrado entre a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS S.A. e a HAPPY M…, ENSINO, EDUCAÇÃO, LAZER, LDA, até ao montante de 30.000€, exonerando os Antigos Devedores até esse montante. Até à presente data, Vexas não honraram o V. compromisso, permanece o saldo da referida conta-corrente por liquidar, acumulando juros remuneratórios e moratórios. Serve a presente para interpelar Vexas ao pagamento valores em dívida resultantes do Contrato de abertura de crédito em conta corrente Nº PT 003………….2 celebrado entre a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS S.A. e a HAPPY M…, ENSINO, EDUCAÇÃO, LAZER, LDA, até ao montante de 30.000€, no prazo de uma semana a contar da recepção desta carta, sob pena de, não o fazendo sermos obrigados a obter o cumprimento coercivo da obrigação assumida por Vexa.(…).”. 13)- No dia 25 de Julho de 2014, na sequência da recepção da carta a que se alude em 12), os Réus remeteram aos Autores, ao Dr. LT, da Caixa Geral de Depósitos, e ao Dr. RG, administrador da insolvência da sociedade “Happy M…”, que o receberam, documento escrito com o teor constante de fls. 16 e 17, que aqui se dá por integralmente reproduzido, e designadamente com o seguinte: “(…)Assunto: Assunção de dívida Exmos. Senhores, Conforme é do vosso conhecimento a forma como V. Ex.ªs conduziram as negociações da empresa Happy M… Lda que se encontrava num processo judicial de falência nem sempre se pautou pelo cumprimento dos princípios da boa-fé e da transparência, tendo-nos sido ocultados diversos factos importantes. Por outro lado, e conforme também é do vosso conhecimento, ficou acordado que o assumir da dívida que o Happy M… Lda. e os seus gerentes tinham junto da Caixa Geral de Depósitos seria a forma de pagar o preço pela aquisição de todo o recheio e know-how/goodwill da empresa Happy M… em processo de falência. Sendo que, para tal, V. Exas sempre nos informaram que podiam fazê-lo, pois que, a posse dos bens que compunham todo o recheio do estabelecimento e o goodwill era apenas vosso. Acresce que sempre vos transmitimos que pretendíamos que fosse apurado o valor exacto pago adiantadamente pelos pais das crianças que frequentavam aquele estabelecimento, pois que, esse valor que viesse a ser apurado seria deduzido aos 30.000,00€ que estávamos a assumir. Daí que o documento de assunção de dívida não tenha um valor exacto e tenha sido feita essa ressalva de comum acordo entre todos. No entanto, todo o circunstancialismo em que assentou a assunção de dívida deixou de fazer sentido, a partir do momento em que soubemos que o recheio, o goodwill e todo o estabelecimento não podia ser transmitido por vós mas tinha que passar por uma negociação judicial e com todos os credores, pois que, afinal vós não tínheis a posse daqueles bens móveis nem legitimidade para efectivar o negócio tal como tínhamos acordado inicialmente. Não podíamos assim compactuar com essa situação na medida em que isso constituía um benefício directo a vosso em detrimento dos restantes credores da falência, também por esse motivo informámos que pretendíamos imprescindivelmente que fosse tudo feito dentro da legalidade. E tanto assim é que viemos a adquirir os referidos bens e o imóvel através de um processo de negociação no âmbito do processo judicial de falência e com o respectivo Senhor Administrador e a empresa encarregue da venda dos bens. E com esta situação deixou de existir qualquer fundamento para a citada assunção de dívida. Aproveitamos ainda a presente carta para vos reiterar que somos pessoas cuja palavra ainda constitui um ponto de honra, pelo que, lamentamos e rejeitamos que V. Ex.ªs venham agora querer receber abusivamente uma quantia que bem sabem que não vos é devida, tanto mais que já foi paga à ordem do tribunal, querendo passar por cima de tudo e de todo distorcendo a verdade. Assim, entendemos não vos ser devida qualquer quantia, pelo que, caso seja necessário, iremos tomar as medidas judiciais que entendermos mais adequadas à resolução do problema aos vários níveis(…)”. 14)- No mês de Fevereiro de 2014 encontravam-se inscritas e a frequentar o estabelecimento supra referido 42 crianças, mediante o pagamento de uma mensalidade. 15)- Em 7 de Fevereiro de 2014, encontravam-se pagas as mensalidades vencidas até Agosto desse ano de quatro crianças, as mensalidades vencidas até Abril de uma criança e, bem assim, as mensalidades vencidas até Maio de outra das crianças que frequentavam o estabelecimento, conforme tabela de fls. 98, para cujo teor se remete e aqui se dá por integralmente reproduzida. 16)- No dia 7 de Fevereiro 2014, pelas 12h18m, antes da formalização dos escritos referidos em 10) e em 11), a Autora CS enviou um e-mail à Ré LC a remeter uma informação sobre valores de mensalidades dos alunos e a informar que na 2ª feira seguinte, dia 10/02/2014, informaria “o que se passa quanto aos pagamentos anuais”. 17)- No dia 10 de Fevereiro de 2014, tal como já havia sido acordado anteriormente entre os Autores e os Réus, realizou-se uma reunião geral conjunta (antiga e nova gerência) nas instalações do estabelecimento referido em 2) com todos os encarregados de educação dos alunos, para apresentação da nova locatária do imóvel e informar que a mesma iria continuar com a actividade do mencionado estabelecimento. 18)- Nessa reunião foi suscitada por diversos pais a questão de saber como iria ser tratado o facto de já terem pago as mensalidades do ano 2014 por inteiro, tendo o Autor MN respondido que “Não se preocupem com essa situação, isso já está tudo resolvido entre nós”. 19)- No dia 11 de Fevereiro de 2014, a Autora CS enviou um e-mail à Ré LC, o qual continha uma tabela com os ditos pagamentos anuais adiantadamente recebidos. 20)- Pouco tempo depois de tomarem a posse do imóvel, os Réus tiveram conhecimento do anúncio que veio a publicitar a venda dos bens móveis da “Happy M…” através da empresa Avalibérica, cujas propostas poderiam ser apresentadas até ao dia 29 de Abril de 2014. 21)- Àquela data o estabelecimento referido em 2) mantinha-se em funcionamento, encontrando-se os alunos, as respectivas educadoras, auxiliares e demais pessoal a servir-se dos referidos bens móveis. 22)- A Ré “M… M…” apresentou uma proposta para aquisição daqueles bens móveis, os quais lhe foram adjudicados no âmbito do processo de insolvência pelo montante de € 12.500,00 (doze mil e quinhentos euros) acrescidos de IVA, o que tudo perfez o valor global de € 15.375,00 (quinze mil trezentos e setenta e cinco euros). 23)- A Ré “M… M…” pagou à empresa Avalibérica Lda. a quantia de € 1.537,50 (mil quinhentos e trinta e sete euros e cinquenta cêntimos) a título de despesas pela venda dos referidos bens móveis. 24)- A sociedade “LVC – Gestão de Empresas, SGPS” transferiu para a Ré “M… M…” a quantia de € 18.000,00 (dezoito mil euros) para pagamento das quantias referidas em 22) e 23). 25)- Para o efeito, a sociedade “LVC – Gestão de Empresas, SGPS” socorreu-se de uma conta corrente caucionada de que é detentora na Caixa Geral de Depósitos. * A SENTENÇA RECORRIDA CONSIDEROU COMO NÃO PROVADA A SEGUINTE FACTUALIDADE: A)– Nas circunstâncias descritas em 5) do elenco de factos provados, os Autores tenham dito aos Réus que a sociedade “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.” se encontrava em Processo Especial de Revitalização. B)– Nas circunstâncias descritas em 5) e 6) da matéria de facto provada os Autores tenham dito aos Réus que os bens móveis do estabelecimento indicado em 2) poderiam ser negociados directamente com aqueles. C)– Os Autores tenham dito aos Réus que no valor de € 30.000,00 a que se alude sob 8) do elenco de factos provados estavam contemplados os bens móveis do estabelecimento indicado em 2). D)– No decurso das negociações a que se alude em 5), os Autores tenham dito aos Réus que o valor dos adiantamentos dos clientes do estabelecimento a que se alude em 2) reflectido no balancete da sociedade referida em 1) que lhes foi apresentado podia ser nulo. E)– Os Réus tenham fixado como condições ao pagamento da quantia indicada em 8), que fosse apurado o valor adiantadamente pago pelos clientes, que seria a deduzir naquele montante, e que o valor que os Réus viessem a pagar pela aquisição do recheio seria também a deduzir naquele montante, o que os Autores aceitaram. F)– Com a inclusão da palavra “até” no escrito referido em 11), as partes pretendiam deixar ilíquido o valor que os Réus iriam assumir por força da dedução ao assinalado montante do valor adiantadamente pago pelos clientes e do valor de aquisição do recheio do estabelecimento. G)– Os Réus manifestaram diversas vezes aos Autores que o seu “tecto” máximo para a realização de todo o negócio seria de € 420.000,00, em que cerca de € 400.000,00 seriam para o imóvel pertencente à CLF e cerca de € 20.000,00 para o recheio do colégio e carteira de clientes. H)– Os Réus ficaram surpreendidos com a resposta dada pelo Autor MN nas circunstâncias descritas em 18). I)– Na sequência do e-mail a que se alude em 19), por não conseguir entender o conteúdo da tabela remetida, a Ré LC voltou a insistir junto da Autora CS para que esta a ajudasse a apurar exactamente qual o valor que tinha sido adiantado pelos clientes. J)– Após o referido em 19), a Autora CS deixou de atender o telemóvel à Ré LC.. K)– A proposta a que se alude em 22) tenha sido também efectuada pelos Réus VC e LC, tendo os bens aí indicados sido adjudicados também aos mesmos. L)– As quantias referidas em 22) e 23) tenham sido pagas pelos Réus VC e LC.. M)– Perante o descrito em 22), a Ré LC voltou a tentar contactar a Autora CS no sentido de se reunirem a fim de “cancelar” o documento a que alude em 11), a qual sempre se mostrou indisponível para tal. N)– Se os Réus soubessem o valor dos pagamentos anuais feitos pelos clientes e que os Autores não poderiam alienar os bens móveis do estabelecimento indicado em 2) não teriam assinado o documento indicado em 11). O)– À data em que a Ré “M… M…” procedeu aos pagamentos referidos em 22) e 23), a mesma não dispunha de capitais próprios o efeito. P)– Os juros anuais decorrentes do uso da conta caucionada indicada em 25) pelo valor mencionado em 24) cifram-se em € 930,00, a comissão de gestão anual cifra-se em € 330,00 e a comissão de prorrogação em € 105,00. Q)– Desde o dia 16/07/2014 até 24/03/2015 (data da apresentação da contestação), a utilização da quantia de € 18.000,00 da conta caucionada a que se alude em 25) venceu juros no montante de € 620,00, tendo sido debitados € 220,00 em comissões de gestão de conta e € 70,00 de comissão de prorrogação. R)– Os Réus terão que entregar à sociedade indicada em 25) as quantias que a mesma venha a suportar junto da entidade bancária a título de juros, comissão de gestão e comissão de prorrogação, por referência à quantia mencionada em 24). S)– Durante vários dias, os Réus VC e LC não pensavam noutra coisa senão no modo como iriam obter a quantia indicada em 24), receando não a conseguir obter ou obter em tempo útil, o que os deixou ansiosos e inseguros. T)– Durante pelo menos um mês os Réus VC e LC andaram nervosos, apreensivos e angustiados, tendo dificuldade em pensar noutras coisas que não fosse esta situação. U)– Pelo facto dos Autores terem ocultado informação aos Réus VC e LC, estes sentiram as suas expectativas defraudadas, sentindo-se enganados e atraiçoados, andavam tristes e apáticos, pouco ou nada conviviam com os amigos e quando estavam com amigos ou familiares só se falava no sucedido, tendo dificuldades em dormir, o que levou a que tivessem necessidade de tomar medicamentos naturais para os ajudar a adormecer. * 4.–Fundamentação de Direito: * 1)–Impugnação da matéria de facto: Alegam os recorrentes que devem ser alterados os pontos 10 e 11 dos factos provados e considerada como provada a factualidade que consta dada como não provada nas alíneas E) e F) dos factos não provados. Dispõe o artigo 640º, nº 1, do Código de Processo Civil que: «Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a)- Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b)- Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c)- A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas». No que toca à especificação dos meios probatórios, «quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes» (Artigo 640º, nº 2, al. a) do Código de Processo Civil). Quanto ao cumprimento deste ónus impugnatório, o mesmo deve, tendencialmente, fazer-se nos seguintes moldes: «(…) enquanto a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações, posto que estas não têm por função delimitar o objeto do recurso nessa parte, constituindo antes elementos de apoio à argumentação probatória.» (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-02-2015, Processo 299/05.6TBMGD.P2.S1, relator TOMÉ GOMES). Aos concretos pontos de facto, concretos meios probatórios e à decisão deve o recorrente aludir na motivação do recurso (de forma mais desenvolvida), sintetizando-os nas conclusões. As exigências legais referidas têm uma dupla função: Delimitar o âmbito do recurso e tornar efectivo o exercício do contraditório pela parte contrária (pois só na medida em que se sabe especificamente o que se impugna, e qual a lógica de raciocínio expendido na valoração/conjugação deste ou daquele meio de prova, é que se habilita a contraparte a poder contrariá-lo). O recorrente deverá apresentar «um discurso argumentativo onde, em primeiro lugar, alinhe as provas, identificando-as, ou seja, localizando-as no processo e tratando-se de depoimentos a respectiva passagem e, em segundo lugar, produza uma análise crítica relativa a essas provas, mostrando minimamente por que razão se “impunha” a formação de uma convicção no sentido pretendido» (Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 17-03-2014, Processo nº <a href="https://acordao.pt/decisoes/139436" target="_blank">3785/11.5TBVFR.P1</a>, relator ALBERTO RUÇO). Os aspectos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade (cfr. Ac. do STJ de 28-04-2014, P.º nº 1006/12.2TBPRD.P1.S1, relator ABRANTES GERALDES). Não cumprindo o recorrente os ónus do artigo 640º, nº 1 do C.P.C., dever-se-á rejeitar o seu recurso sobre a matéria de facto, uma vez que a lei não admite aqui despacho de aperfeiçoamento, ao contrário do que sucede quanto ao recurso em matéria de direito, face ao disposto no art. 639º, nº 3 do C.P.C. (cfr. Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães de 19-06-2014, P.º n.º <a href="https://acordao.pt/decisoes/195295" target="_blank">1458/10.5TBEPS.G1</a>, relator MANUEL BARGADO). A cominação da rejeição do recurso, prevista para a falta das especificações quanto à matéria das alíneas a), b), e c) do n.º 1, ao contrário do que acontece quanto à matéria do n.º 2 do art. 640.º do CPC (a propósito da «exatidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso»), não funciona automaticamente, devendo o Tribunal convidar o recorrente a suprir a falta de especificação daqueles elementos ou a sua deficiente indicação (cfr. Ac. do STJ de 26-05-2015, P.º n.º 1426/08.7CSNT.L1.S1, relator HÉLDER ROQUE). Dever-se-á usar de maior rigor na apreciação da observância do ónus previsto no n.º 1 do art. 640.º (de delimitação do objecto do recuso e de fundamentação concludente do mesmo), face ao ónus do n.º 2 (destinado a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado pela Relação aos meios de prova gravados relevantes, que tem oscilado em exigência ao longo do tempo, indo desde a transcrição obrigatória dos depoimentos até uma mera indicação e localização exacta das passagens da gravação relevantes) (neste sentido, Ac. do STJ de 29-10-2015, P.º n.º 233/09.4TBVNG.G1.S1, relator LOPES DO REGO). O ónus atinente à indicação exacta das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, pelo que a falta de indicção, com exactidão, só será idónea a fundamentar a rejeição liminar se dificultar, de forma substancial e relevante, o exercício do contraditório, ou o exame pelo tribunal, sob pena de ser uma solução excessivamente formal, rigorosa e sem justificação razoável (cfr. Acs. do STJ, de 26-05-2015, P.º nº 1426/08.7CSNT.L1.S1, relator HÉLDER ROQUE, de 22-09-2015, P-º nº 29/12.6TBFAF.G1.S1, relator PINTO DE ALMEIDA, de 29-10-2015, P.º n.º 233/09.4TBVNG.G1.S1, relator LOPES DO REGO e de 19-01-2016, P.º nº 3316/10.4TBLRA-C1-S1, relator SEBASTIÃO PÓVOAS). A apresentação de transcrições globais dos depoimentos das testemunhas não satisfaz a exigência determinada pela al. a) do n.º 2 do art. 640.º do CPC (neste sentido, Ac. do STJ de 19-02-2015, P.º nº <a href="https://acordao.pt/decisoes/119983" target="_blank">405/09.1TMCBR.C1</a>.S1, relatora MARIA DOS PRAZERES BELEZA), o mesmo sucedendo com o recorrente que procede a uma referência genérica aos depoimentos das testemunhas considerados relevantes pelo tribunal para a prova de quesitos, sem única alusão às passagens dos depoimentos de onde é depreendida a insuficiência dos mesmos para formar a convicção do juiz (cfr. Ac. do STJ de 28-05-2015, P.º n.º 460/11.4TVLSB.L1.S1, relator GRANJA DA FONSECA). Nas conclusões do recurso devem ser identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação, bastando quanto aos demais requisitos que constem de forma explícita da motivação (neste sentido, Acs. do STJ de 19-02-2015, P.º nº 299/05.6TBMGD.P2.S1, relator TOMÉ GOMES, de 01-10-2015, P.º nº 824/11.3TTLRS.L1.S1, relatora ANA LUÍSA GERALDES, de 11-02-2016, P.º nº 157/12-8TVGMR.G1.S1, relator MÁRIO BELO MORGADO). A insuficiência da fundamentação probatória do recorrente não releva como requisito formal do ónus de impugnação, mas, quando muito, como parâmetro da reapreciação da decisão de facto, na valoração das provas, exigindo maior ou menor grau de fundamentação, por parte do tribunal de recurso, consoante a densidade ou consistência daquela fundamentação (neste sentido, Ac. do STJ de 19-02-2015, P.º nº 299/05.6TBMGD.P2.S1, relator TOMÉ GOMES). Por seu turno, em termos substanciais, a impugnação da matéria de facto traduz-se no meio de sindicar a decisão que sobre ela proferiu a primeira instância, procurando-se que a Relação reaprecie e repondere os elementos probatórios produzidos, averiguando se a decisão da primeira instância relativa aos pontos de facto impugnados se mostra conforme às regras e princípios do direito probatório, impondo-se se proceda à apreciação não só da valia intrínseca de cada um dos elementos probatórios, da sua consistência e coerência, à luz das regras da normalidade e da experiência da vida, mas também da sua valia extrínseca, ou seja, da sua consistência e compatibilidade com os demais elementos. Como refere Abrantes Geraldes (Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, pág. 127): “Consistindo o processo jurisdicional num conjunto não arbitrário de actos jurídicos ordenados em função de determinados fins, as partes devem deduzir os meios necessários para fazer valer os seus direitos na altura/fase própria, sob pena de sofrerem as consequências da sua inactividade, numa lógica precisamente assente, em larga medida, na autorresponsabilidade das partes e, conexamente, num sistema de ónus, poderes, faculdades, deveres, cominações e preclusões”. Assim, ressalvadas as modificações que podem ser oficiosamente operadas relativamente a determinados factos cuja decisão esteja eivada de erro de direito, por violação de regras imperativas, à Relação não é exigido que, de motu proprio, se confronte com a generalidade dos meios de prova sujeitos a livre apreciação e valorados pelo tribunal de 1ª instância, para deles extrair, como se se tratasse de um novo julgamento, uma decisão inteiramente nova. Pelo contrário, as modificações a operar devem respeitar em primeiro lugar o que o recorrente, no exercício do seu direito de impugnação da decisão da matéria de facto, indicou nas respectivas alegações que servem para delimitar o objecto do recurso. Os meios probatórios têm por função a demonstração da realidade dos factos, sendo que, através da sua produção não se pretende criar no espírito do julgador uma certeza absoluta da realidade dos factos, o que, obviamente implica que a realização da justiça se tenha de bastar com um grau de probabilidade bastante, em face das circunstâncias do caso, das regras da experiência da comum e dos conhecimentos obtidos pela ciência. A prova não visa “(...) a certeza absoluta (a irrefragável exclusão da possibilidade de o facto não ter ocorrido ou ter ocorrido de modo diferente) (...)”, mas tão só, “(...) de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto” (assim, Antunes Varela, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1984, págs. 419 e 420). A apreciação das provas resolve-se, assim, em formação de juízos, em elaboração de raciocínios, juízos e raciocínios estes que surgem no espírito do julgador “(...) segundo as aquisições que a experiência tenha acumulado na mentalidade do juiz segundo os processos psicológicos que presidem ao exercício da actividade intelectual, e portanto segundo as máximas de experiência e as regras da lógica (...)” (assim, Alberto dos Reis; Código de Processo Civil Anotado, vol. III, pág. 245). Nessa actividade de livre apreciação da prova deve o tribunal especificar os fundamentos que foram decisivos para a convicção adquirida (art. 653º, nº 2 do CPC), permitindo, dessa forma, que se “possa controlar a razoabilidade da convicção sobre o julgamento do facto como provado ou não provado” (cfr. Teixeira de Sousa; Estudos Sobre o Novo Processo Civil, p. 348) e exercer um controle externo e geral do fundamento de facto da decisão. Mas, não deverá esquecer-se que a função da Relação não é a de realizar um novo julgamento de facto: “Quando o Tribunal da Relação é chamado a pronunciar-se sobre a reapreciação da prova, no caso de se mostrarem gravados os depoimentos ou estando em causa a análise de meios prova reduzidos a escrito e constantes do processo, deve o mesmo considerar os meios de prova indicados pela partes e confrontá-los com outros meios de prova que se mostrem acessíveis, a fim de verificar se foi cometido ou não erro de apreciação que deva ser corrigido, seja no sentido de decidir em sentido oposto ou, num plano intermédio, alterar a decisão no sentido restritivo ou explicativo; Importa, porém, não esquecer que se mantêm-se em vigor os princípios de imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, pelo que o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados. Assim, em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira instância, em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 30-11-2017, Processo 1426/15.0T8BGC-A.G1, relator ANTÓNIO JOSÉ SAÚDE BARROCA PENHA). Estas as linhas gerais em que se baliza a reapreciação da matéria de facto na Relação. Vejamos os pontos invocados a este respeito pelos recorrentes. * a)- Se deve ser alterado o ponto 10 dos factos provados, aditando-lhe o seguinte: “Cartório Notarial de Lisboa perante a Notária Dra. AP” e se deve ser alterado o ponto 11 dos factos provados, aditando-lhe o seguinte: “no interior do Cartório Notarial de Lisboa da Dra. AP, mas sem o reconhecimento presencial das assinaturas”? Consideram os recorrentes, a respeito do ponto 10 dos factos provados, que “como se alcança do documento de fls. 79, o contrato de locação financeira foi outorgado no Cartório Notarial de Lisboa perante a Notária Dra. AP. Aliás, esse facto não é controverso entre as partes, sempre foi pacifico. Certamente por mero lapso a Mm.ª Juiz não fez constar que aquele documento foi assinado perante um notário com o reconhecimento presencial das assinaturas. Todavia, esse facto é de extrema importância (…)”. Por seu turno, a respeito do ponto 11 dos factos provados referem os recorrentes que “deveria a Mm.ª Juiz ter feito constar que esse mesmo documento de assunção de divida foi assinado no mesmo dia e no mesmo local que o mencionado no ponto 10), ou seja, no interior do Cartório Notarial de Lisboa da Dra. AP. Porém só mencionou que foi no mesmo dia e não no mesmo local. Facto este de extrema importância conforme abaixo se demonstrará atenta a solenidade dada a alguns actos e não a outros não obstante os intervenientes (Autores e Reús) se encontrarem, no mesmo momento e em conjunto, perante um Notário”. De acordo com o disposto no artigo 552.º do CPC, o autor deve expor os factos e as razões de direito que servem de fundamento à acção, como lógico antecedente da pretensão que pretende formular, o que constitui uma decorrência lógica do funcionamento do princípio do dispositivo, sendo sobre aquele que invoca a titularidade de um direito - autor - que recai o ónus de alegação dos factos de cuja prova seja possível concluir pela existência desse direito - art. 5.º, n.º 1, do CPC. Assim, não cabe ao Tribunal a função de recolha de factos com interesse para a resolução de qualquer litígio que seja incumbido de resolver (art. 5º, nº 3, CPC), embora tal não prejudique a atendibilidade de factos instrumentais advenientes da discussão da causa (art. 5º, nº2). Neste sentido, a narrativa em que se consubstancia a petição inicial há-de conter, pelo menos, os factos pertinentes à causa e que sejam indispensáveis para a solução que o Autor quer obter: os factos necessários e suficientes para justificar o pedido. É evidente que não é exigível que o autor faça uma exposição completa do elemento factual, mas não deixar de considerar-se que uma indicação de qualquer um dos elementos integradores da causa de pedir em termos genéricos pode importar uma individualização da causa de pedir que não constitui especificação suficiente do facto jurídico de que procede a pretensão e que leva à ineptidão da petição inicial. De harmonia com o disposto no artigo 5.º, nºs 1 e 2, als a), b) e c) do CPC, “às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas”, sendo que, além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz: os factos instrumentais que resultem da instrução da causa; os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciarem; os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções. Assim, podem ser considerados na decisão final os factos essenciais à procedência das pretensões formuladas ou das excepções deduzidas que sejam complemento ou concretização de outros que as partes hajam oportunamente alegado e resultem da instrução e discussão da causa, desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado o exercício do contraditório. O juiz pode assim, por sua iniciativa ou a requerimento da parte, coligir factos complementares ou concretizadores dos factos principais ou essenciais, ou seja, factos substanciadores da causa de pedir ou da excepção, havendo, contudo, de realçar-se que este poder inquisitório do juiz está limitado aos factos que sejam complemento ou concretização de outros, o que, obviamente, implica necessariamente que as partes tenham alegado satisfatoriamente nos articulados os factos que preenchem e integram os fundamentos da acção e da defesa. Ora, no caso, compulsada a petição inicial não se divisa na mesma qualquer referência ao local de outorga do documento de fls. 79 - contrato de locação financeira – no Cartório Notarial de Lisboa perante a Notária Dra. AP. E a mesma conclusão se retira perante a leitura dos demais articulados produzidos nos autos. O mesmo é, igualmente, de referir a respeito do documento referido no ponto 11 dos factos provados. Mas, os depoimentos invocados pelos recorrentes, designadamente o de CS, não permitem corroborar a conclusão pretendida no sentido da demonstração probatória que se pretende incluir nos factos provados em 10 e 11. Em particular, a mencionada CS, quanto a saber se houve documentos foram assinados na presença do notário ou não, apenas referiu – sem esclarecer de que documentos falava - o seguinte: “Estivemos todos numa sala a assinar papéis. Se quer que lhe diga, já foi também há algum tempo, não tenho todos os dados precisos de memória, mas estávamos todos numa sala a assinar papéis. Estavam também os representantes da CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS. Não me lembro bem os nomes, mas lembro-me de que estavam também representantes da CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS”. Por outro lado, ao contrário do invocado pelos recorrentes, não se vislumbra existir alguma pertinência para a apreciação da causa, na inclusão dos aludidos excertos, não se divisando a mesma da invocada diferente forma de conclusão dos documentos referenciados nos pontos 10 e 11 dos factos provados. Ora, “não se deverá proceder à reapreciação da matéria de facto quando os factos objecto de impugnação não forem susceptíveis, face às circunstância próprias do caso em apreciação, de ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe ser inútil, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processuais (arts. 2º, nº 1, 137º e 138º, todos do C.P.C.)” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 15-12-2016, Processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/193822" target="_blank">86/14.0T8AMR.G1</a>, relatora MARIA JOÃO MATOS). Improcede, pois, a alteração pretendida pelos recorrentes a respeito dos mencionados factos provados em 10 e 11. * b)- Se devem ser considerados como provados os pontos E) e F) (dados na sentença recorrida como não provados)? Invocam os recorrentes que a matéria de facto dos pontos E) e F) – que foi considerada como não provada – deve transitar para a matéria de facto provada. Resulta dos mencionados pontos E) e F) que não se provou que: “E) Os Réus tenham fixado como condições ao pagamento da quantia indicada em 8), que fosse apurado o valor adiantadamente pago pelos clientes, que seria a deduzir naquele montante, e que o valor que os Réus viessem a pagar pela aquisição do recheio seria também a deduzir naquele montante, o que os Autores aceitaram” e que: “F) Com a inclusão da palavra “até” no escrito referido em 11), as partes pretendiam deixar ilíquido o valor que os Réus iriam assumir por força da dedução ao assinalado montante do valor adiantadamente pago pelos clientes e do valor de aquisição do recheio do estabelecimento”. Consideram os recorrentes que os diversos meios de provam que especificam justificariam a inserção nos factos provados de tal factualidade. Vejamos. Desde logo, o alegado pelos recorrentes a respeito do documento de fls. 469, assim como, a interessante construção gramatical a respeito da palavra “até” ou a lucubração a respeito do reconhecimento/falta de reconhecimento de assinaturas sobre os documentos dos autos, também nada permite concluir, designadamente, que fossem claramente patente e notórias “as oscilações provocadas pelas incertezas que existiam em cada um daqueles momentos, e foi por isso mesmo que as partes pretenderam deixar ilíquida aquela quantia ao escreverem “até 30.000€”. Até porque se assim não fosse teriam escrito algo como “assume a quantia de 30.000€”, ou seja, não colocavam a palavra até”. Independentemente disso, certo é que, não demonstram tais elementos probatórios a verificação da concretas condições a que se alude na alínea E) dos factos não provados, nem qual tenha sido a razão da inserção da palavra “até” como mencionado na alínea F) dos factos não provados. Mas, o mesmo se diga relativamente ao conteúdo dos depoimentos referenciados pelos recorrentes. RB afirmou que havia uma “dúvida se o IEFP seria ou não credor particularmente privilegiado relativamente ao recheio”, mas daí não se pode concluir, ipso facto – ao contrário do que fazem os recorrentes (“… existia uma dúvida em saber se o IEFP tinha uma reserva de propriedade sobre aqueles bens, pois que, os mesmos terão sido adquiridos pelos AA. com recurso a financiamento daquela instituição. Ora, existia uma dúvida sobre a legitimidade e/ou privilégio que o IEFP poderia ter quanto àqueles bens… facto esse que era do conhecimento dos AA. recorridos e dos RR. recorrentes, daí que, também por esse motivo tenham deixado em aberto o documento de assunção de divida de fls. 10 com o uso da expressão “até 30.000€””) – de que tal comprova a existência das invocadas “condições” no negócio de assunção de dívida. Considerando o depoimento do mencionado RB verifica-se plenamente acertada a conclusão – constante da motivação da decisão de facto da sentença recorrida - de que o mesmo não revelou “conhecer em pormenor os contornos do negócio sob apreço, em termos de permitir um cabal esclarecimento dos factos”. Relativamente aos depoimentos de NS, HA e PM entendem os recorrentes que ocorreu um erro notório do Tribunal na apreciação de tais meios de prova, designadamente por o Tribunal ter mencionado que só as duas primeiras testemunhas mencionaram ter conhecimento das “variáveis” do negócio que culminou com a subscrição do documento denominado de “assunção de dívida”. Ora, desde logo se diga que estamos a abordar matéria que não logrou ficar demonstrada na perspectiva do Tribunal, por ausência de prova suficiente para o efeito e por não se ter o tribunal fiado na credibilidade das declarações que presenciou, ponderando também as regras de distribuição do ónus da prova. Como se refere na decisão recorrida: “a matéria de facto não provada foi assim considerada pelas razões já acima assinaladas, ponderando designadamente a falta de credibilidade dos depoimentos a que supra se aludiu e, bem assim, a ausência de prova capaz de suportar semelhante factualidade, tendo em vista as regras de distribuição do ónus da prova, sendo certo que competia aos Réus provar que o escrito de fls. 10 tinha um sentido distinto (ou mais abrangente) do que aquele que resultava do seu teor literal. Refira-se, ainda a este nível, que a certidão judicial de fls. 160 a 165 apenas documenta a prévia existência de um PER, não permitindo suportar a convicção de que os Autores transmitiram aos Réus que o mesmo ainda se encontrava pendente quando encetaram negociações, e que a factualidade descrita sob G) resulta contraditória e pouco consistente em si mesma, posto que o imóvel veio a ser adquirido por valor ligeiramente superior a € 400.000,00, conforme documenta o contrato de locação financeira de fls. 79 a 85, sendo que, ainda que viesse a lograr provada a versão dos Réus (o que, como se referiu, não ocorreu), do documento de fls. 10 resulta claramente ultrapassado o indicado “tecto” máximo”. Mas, para além disso, “na impugnação da matéria de facto, ao recorrente não basta fazer uma apreciação geral de toda a prova, fazendo dela a sua interpretação e tirar a conclusão de que todos os factos impugnados devem ser dados como provados na forma por si apontada. (…) [E]sta não é manifestamente a forma de alterar a matéria de facto, pela via da impugnação ampla, ou seja com base em erro de julgamento, em que na reapreciação da concreta prova se vai constatar se a testemunha disse ou não o que foi vertido na sentença, que não tem a ver com a valoração que o tribunal dá ao depoimento. Quando a atribuição de credibilidade ou falta de credibilidade a uma fonte de prova pelo julgador se basear em opção assente na imediação e na oralidade, o tribunal de recurso só a poderá criticar se ficar demonstrado que essa opção não tem uma justificação lógica e é inadmissível face às regras da experiência comum. Não se verifica o vício do erro quando o tribunal, face às versões contraditórias, justifica devidamente a sua opção” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 13-09-2017, Processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/118051" target="_blank">390/14.8PCLRA.C1</a>, relator INÁCIO MONTEIRO). Ora, ouvido e reapreciado o depoimento de PM dele não se retira a conclusão almejada pelos recorrentes sobre as “variáveis” do negócio: O que a testemunha menciona – depois de ter detidamente explicado o vínculo que tinha com a CLF (do grupo económico da CGD), numa fase em que o contrato entre a Happy M… e a CLF se encontraria em incumprimento, depois da formalização da cessão da posição contratual da Happy M… para os M… M… - é que, numa reunião na CGD onde se começou a discutir como se iriam financiar os tais ditos € 30.000,00, não seria um valor certo, mas haveria ali questões a fixar entre as partes…”Não sei se a compra do equipamento…se era da Happy M..., ou se era dos sócios…isso depois na altura não ficou bem definido…entre eles não se fixou um valor determinado. Houve um conjunto de circunstâncias…Ok. A CGD estaria disponível para financiar até 30.000 €….mas nessa altura não ficou fixado…vamos lá a ver…havia um valor referência, um topo, 30 000,00 €. Agora se era 25, se era 28, se era 24, se era 10, se era 9, esse valor não se sabia…”; “É assim: Na altura também se falou que teria de se apurar exactamente na contabilidade…Porque isso já nas negociações, na fase inicial ainda com o Happy M… Lembro-me perfeitamente que os seus representantes falavam, para além de fechar uma escola com os alunos…, havia alguns pais…, eles sempre mencionaram isso…, que todos os pais que tinham lá as crianças sabiam da situação em que estava a Happy M… e da possibilidade de a Happy M…, de um dia para o outro, ter de fechar as instalações. Mas sempre uma das circunstâncias que, tanto uns como depois já as partes todas, os intervenientes todos…, porque havia lá alguns pais que já teriam pago a mensalidade, a anuidade total, e que esse valor poderia, quando apurado, ser deduzido. Basicamente seriam essas duas questões que estariam em aberto…mas qual foi o acordo entre as partes, isso não sei!”. Destas singelas afirmações, da forma dubitativa e imprecisa, aliás, confluindo na afirmação final, de que não soube a testemunha qual o acordo firmado entre as partes, pode-se inferir, com a necessária e suficiente consistência, qual a determinação das condições de pagamento da quantia de € 30.000,00 que os autos pretendiam receber dos réus pela sua intervenção no negócio? Resulta deste depoimento se a tal valor de € 30.000,00 haveria que apurar o valor pago por clientes e o da aquisição do recheio do colégio? Resultam deste depoimento qual o motivo da inserção no documento de assunção de dívida da palavra “até”? A todas estas questões a conclusão que se retira do aludido depoimento de PM é, como aquela a que se alcançou no tribunal recorrido, negativa. Não se vislumbra, pois, qualquer erro de apreciação da prova. Tal erro ou lapso também não deriva da motivação de facto da sentença recorrida, ao contrário do que pugnam os recorrentes. Na realidade, o que se escreveu na sentença recorrida foi, tão-só, que as testemunhas NS e HA foram as “únicas testemunhas que sustentaram ter conhecimento das “variáveis” a que os Réus referem ter ficado subordinado o pagamento dos valores a que se reporta o escrito constante de fls. 10 (…)”. Ora, não foi, manifestamente, afirmado por Paulo Marques ter algum efectivo conhecimento sobre as aludidas “variáveis”. Como se viu, o mencionado PM referiu expressamente desconhecer quais foram as condicionantes do negócio de assunção de dívida celebrado entre as partes, sendo que, aliás, na parte final do mesmo depoimento, respondendo a questões do Tribunal, o mesmo foi também claro em salientar que, na mencionada reunião, “na altura foi-nos apresentado um documento assinado por eles a fixar… ou a determinar o valor máximo de 30.000€” (daqui se inferindo já estar celebrado e concluído o negócio entre os outorgantes da mencionada assunção de dívida). Relativamente aos depoimentos de NS e HA a conclusão alcançada pelo Tribunal também não merece qualquer censura, não se mostrando ter existido qualquer erro na apreciação de tais meios de prova, sendo que, ao contrário do que alegam os recorrentes, não ocorreu omissão de valoração de tais testemunhos: os mesmos não permitiram foi ao Tribunal formar positiva convicção sobre a “realidade” que asseveraram. Consta elucidativamente da decisão recorrida: “as testemunhas NS, amigo dos Réus VC e LC, sendo ainda sócio do primeiro noutras sociedades, e HA, que foi até meados de 2014 funcionário de um grupo de empresas que integra a Ré “M… M…”, únicas testemunhas que sustentaram ter conhecimento das “variáveis” a que os Réus referem ter ficado subordinado o pagamento dos valores a que se reporta o escrito constante de fls. 10, não obstante a segurança que procuraram imprimir aos respectivos depoimentos, não lograram convencer o Tribunal do seu efectivo conhecimento relativamente a esses factos. Desde logo, a imagem de ingenuidade que a testemunha NS procurou passar do Réu VC, para justificar a alegada atenção com que seguiu as reuniões havidas entre as partes no escritório onde trabalhava (as quais, note-se, estariam a ter lugar numa outra sala), revela-se pouco consistente. Com efeito, o Réu VC, além de antigo funcionário bancário, como esclareceu a testemunha PM, funcionário do mesmo grupo, é um empresário, sendo, aliás, sócio de NS em várias empresas, como o próprio referiu, pelo que será alguém habituado aos meandros dos negócios, de tal modo que dispunha de uma estrutura organizativa de apoio, na qual se integrava desde logo a testemunha HA, à data financeiro do grupo. Acresce que nenhum dos Réus tinha qualquer relação prévia com os Autores que justificasse que depositassem nos mesmos um acrescido grau de confiança, obliterando as cautelas que um negócio com as características e importância do vertente impunham. Ora, neste contexto não faz qualquer sentido que os Réus, para mais quando confrontados com os alertas que as referidas testemunhas sustentaram ter-lhes dirigido relativamente aos termos do negócio, e sendo certo que dispunham de uma estrutura organizativa de apoio, incluindo ao nível jurídico (tendo-se revelado, neste circunspecto, credíveis as declarações da Autora, no sentido de que o negócio foi sempre acompanhado por advogados de ambas as partes, o que é compatível quer com a sua importância, quer com a referida estrutura organizativa de que os Réus, como se referiu, dispunham), não tenham tido o cuidado de se salvaguardar de modo efectivo, deixando plasmado de modo expresso no escrito de fls. 10, o teor das condições aludidas, bastando-se com a inclusão da palavra “até € 30.000,00” para suportar a subordinação a semelhante condicionalismo. De resto, ademais do referido acompanhar de uma reunião entre Autores e Réus a partir de outra sala, de que, pelas razões assinaladas, o Tribunal não ficou minimamente persuadido (estranhando-se, aliás, o excessivo grau de segurança com que a testemunha relatou tal factualidade, atenta a posição em que se encontrava, seja fisicamente, seja em relação ao negócio, a que era totalmente alheio), a testemunha NS estribou o seu conhecimento tão só no que alegadamente ouviu dizer ao Réu VC, depoimento indirecto que, neste circunstancialismo, merece as maiores reservas, e em opiniões pessoais, sem efectivo suporte factual. De resto, também a testemunha HA revelou um conhecimento meramente indirecto dos factos, proveniente unicamente do alegadamente transmitido pelos Réus, o que é de todo insuficiente para sustentar uma convicção minimamente segura relativamente a semelhante factualidade. Sob outra perspectiva, ainda a este nível, não pode deixar de atentar-se na flutuação da versão dos Réus que perpassa a própria contestação, a retirar consistência à mesma. Com efeito, os Réus tanto alegam que os Autores sempre lhes transmitiram que poderiam transaccionar tudo com excepção das instalações, designadamente os bens móveis, motivo pelo qual foi com surpresa que se depararam com o anúncio de venda de tais bens no âmbito da insolvência, tendo-se sentido enganados (o que alicerça, aliás, parcialmente o pedido reconvencional que aduzem), como sustentam que a expressão “até € 30.000,00” foi incluída no escrito de fls. 10 para permitir abater o valor pelo qual viesse a ser realizada tal aquisição ao montante então assumido. Ademais nem mesmo se afigura consistente a alegação dos Réus de que assinaram o documento de fls. 10 por estarem convictos de que os Autores poderiam alienar os mencionados bens móveis, pois que não só já haviam apresentado uma proposta tendente à sua aquisição ao Sr. Administrador da Insolvência, como resulta de fls. 469, como este último se encontrava presente na data da assinatura de tal documento, conforme se extrai sem margem para dúvidas da documentação de fls. 190 a 193, que consubstancia o auto de restituição da posse do imóvel, em que aquele também interveio. Donde, pelo menos naquele momento poderiam os Réus inteirar-se cabalmente da efectiva situação de tais bens, pelo que não é minimamente crível que tenham assinado tal documento em erro quanto à mesma. Mais, se a mencionada expressão visou também salvaguardar o valor dos adiantamentos feitos por clientes, como também sustentam, qual a razão para terem ficado “boquiabertos” quando o Autor marido transmitiu aos pais dos alunos que não tinham que se preocupar com os valores antecipadamente pagos por estes? De outra banda, os próprios Réus assumem que lhes havia sido disponibilizado o balancete da sociedade “Happy M…”, que reflectia a existência de adiantamentos de clientes, sob a conta 218, pagamentos anuais a que a Autora faz igualmente alusão no e-mail de fls. 90, remetido, de acordo com os Réus, antes da formalização dos acordos em apreço, pelo que, também por esse motivo, e atenta desde logo a experiência profissional do Réu marido, resulta pouco plausível que o pretenso abatimento de tal montante não ficasse expresso no documento de fls. 10 caso existisse um efectivo acordo das partes nesse sentido. E se é assim quanto aos pagamentos anuais, mais o será quanto aos pagamentos daquele próprio mês Fevereiro, já em curso, pelo que seria normal que as mensalidades respectivas já se encontrassem, pelo menos parcialmente, pagas. Por assim ser, é ainda menos consistente que as partes pretendessem abater ao indicado montante de € 30.000,00 também as mensalidades daquele próprio mês, que os Réus igualmente computam no valor atinente aos pagamentos antecipados que indicam e pretendem que seja objecto de abatimento. Acresce que é um dado incontornável do senso comum que a clientela tem um valor económico em si mesmo, que, em princípio, não se esgota naquele ano lectivo, antes se protela no tempo, nisso mesmo residindo o seu valor intrínseco, o que justifica que o interesse dos Réus não se cingisse às instalações e aos bens móveis que compunham o estabelecimento, os quais, efectivamente, poderiam ter adquirido sem a colaboração dos Autores, ao contrário do que sucede com aquela, para cuja manutenção ou transferência tal colaboração se revelaria essencial, permitindo transmitir aos utentes do estabelecimento uma ideia de confiança e continuidade, com vista à sua fidelização. Ora, a versão dos Réus, secundada pelas indicadas testemunhas NS e HA, oblitera por completo, e de modo pouco plausível, o valor de tal clientela, que os mesmos, atenta a actividade exercida, não desconsiderariam, pois que só assim se justifica que tenham encetado negociações com os próprios Autores (quando poderiam ter-se limitado a negociar com a financeira proprietária do imóvel e com o Sr. Administrador da Insolvência), tendo ainda subscrito o documento de fls. 10. Refira-se ainda que os depoimentos das testemunhas AC, funcionária da “Happy M…” que transitou para a “M… M…”, da qual ainda é funcionária, e CR, funcionária da sociedade Ré, em nada permitem afastar o que se deixou dito, pois que não só se revelaram pouco concretizados, como denotaram um reduzido conhecimento dos factos sob apreço, em particular dos termos do negócio realizado entre as partes, limitando-se a referir terem assistido a conversas, posteriores à assinatura do escrito de fls. 10: a primeira uma conversa presencial entre os Autores e os Réus VC e LC, e a segunda uma conversa telefónica entre a Autora e a Ré mulher, atinentes à questão dos valores adiantadamente pagos pelos utentes do estabelecimento, sem que do que conseguiram transmitir dessas conversas seja possível extrair qualquer facto, ainda que meramente indiciário, que corrobore a existência de um acordo com contornos alegados pelos Réus. É que, como se referiu, que existiam valores adiantadamente pagos por clientes é um dado incontestável e que os Réus conheciam, de tal modo que se encontrava reflectido, ainda que sem exactidão ou rigor no que tange ao respectivo valor, no balancete de fls. 72 a 78, a que os mesmos tiveram acesso, sendo ainda mencionado no e-mail de fls. 90, remetido em momento anterior à assinatura do escrito de fls. 10. Por outro lado, a testemunha CR, administrativa da sociedade Ré, a desempenhar funções no departamento financeiro, se bem que tenha confirmado a existência do empréstimo documentado a fls. 131 e 133, efectuado por outra empresa do grupo à sociedade Ré, revelou desconhecer os custos efectivos de tal operação, de que não foi apresentada qualquer prova. Idêntica ausência de prova se detectou, aliás, quanto à alegada ausência de capitais próprios por parte da sociedade Ré para pagamento dos valores atinentes à aquisição dos bens móveis, posto que o extracto bancário apresentado apenas permite concluir que naquela conta (que se desconhece se era ou não a única de que a sociedade Ré era titular) não existia saldo suficiente para esse efeito. Ora, nem o depoimento da testemunha CR nem o facto da sociedade Ré se ter socorrido de um empréstimo de outra empresa do grupo são bastantes para concluir com um mínimo de segurança nesse sentido, uma vez que tal operação bem pode ter decorrido de uma mera opção financeira, de gestão, o que se desconhece. Já a testemunha AG, amiga dos Réus LC e VC desde há vários, que depôs quanto às alegadas repercussões que a situação vertente teve nos mesmos, a título pessoal, prestou um depoimento parcial e nada consistente, suscitando sérias reservas quanto ao conhecimento que tinha da situação vertente, do que é paradigmática a referência à circunstância da Ré mulher ter ficado particularmente abalada por ver colocado em causa o seu sonho de ter um “colégio”, quando da própria contestação resulta que os Réus, à data em que se concretizou o negócio vertente, já exploravam um outro estabelecimento de idênticas características. Aliás, a própria testemunha assume que apenas esporadicamente contactava com os Réus, revelando desconhecer em concreto quais os contornos dos negócios por estes celebrados, limitando-se a fazer alusões vagas, desconexas e pouco concretizadas, que, por isso, não lograram convencer o Tribunal. Isto posto, temos que apenas os depoimentos das testemunhas PM, funcionário da Caixa Geral de Depósitos, e RB, administrador da insolvência da sociedade “Happy M…”, mereceram valoração positiva, os quais, não obstante tenham revelado um conhecimento meramente parcelar dos factos e, de algum modo, já esbatido pelo decurso do tempo, a conduzir a um natural enfraquecimento da memória [posto que não se tratam de factos que directamente lhes digam respeito e com as quais apenas contactaram no âmbito das respectivas funções], prestaram depoimentos que, evidenciando distanciamento relativamente aos interesses das partes, mereceram a confiança do Tribunal. Sucede que nenhuma das referidas testemunhas revelou conhecer em pormenor os contornos do negócio sob apreço, em termos de permitir um cabal esclarecimento dos factos. Neste circunstancialismo, assumiu-se, pois, como particularmente relevante para a formação da convicção do Tribunal a prova documental pré-constituída constante dos autos, intercruzada entre si, bem como a ponderação da posição expressa pelas partes nos respectivos articulados. Concretizando (…): - a matéria de facto a que se alude sob o ponto 5) resultou da ponderação do teor do e-mail de fls. 67, documento que não foi impugnado e do qual é possível extrair que a essa data já estavam em curso as negociações vertentes, resultando ademais dos actos praticados (contrato de locação financeira imobiliária, de fls. 79 a 85, e compra dos bens móveis no processo de insolvência da sociedade, documentada de fls. 127 a 129) que os Réus pretendiam adquirir não apenas o imóvel onde se encontrava instalado o estabelecimento explorado pela sociedade “Happy M…”, mas o próprio estabelecimento em si mesmo, integrado designadamente pelos bens móveis e pela respectiva carteira de clientes, o que justifica que, em anexo ao mencionado e-mail, tenham sido remetidos não só o “plano de negócios” acima indicado, como o balancete da sociedade, de fls. 72 a 78. Acresce que a inclusão da carteira de clientes no negócio em apreço é assumida de forma uníssona pelas partes nos respectivos articulados, de tal modo que, conforme documentam os e-mails de fls. 90 a 97, os clientes da sociedade “Happy M…” transitaram para a sociedade “ M… M…” após a outorga dos escritos a que se alude sob os pontos 10) e 11) da matéria de facto provada, o que, aliás, justificou a realização de uma reunião de apresentação desta nova sociedade aos pais das crianças que frequentavam o estabelecimento àquela data, com os antigos e os novos sócios (cfr. e-mail de fls. 93), como esclareceu, neste particular de modo espontâneo e seguro, a testemunha AC, funcionária do estabelecimento já àquela data; - a factualidade a que se reporta o ponto 6) da matéria de facto provada é consonante com o teor da certidão judicial extraída dos autos de insolvência da sociedade “ Happy M…” de fls. 170 a 177 e decorre das próprias regras da normalidade social e da experiência comum, posto que só isso justifica que os Réus tenham encetado negociações com os Autores, nos termos documentados nos e-mails acima aludidos. De resto, nas declarações que prestou, a Autora CS assumiu ter gerido o mesmo até 7 de Fevereiro, sustentando, de resto, que o escrito de fls. 10 visou compensar tal facto. Donde, apesar da pendência do processo de insolvência, a justificar que esta gestão fosse uma gestão corrente e sujeita a controlo externo, não teve o Tribunal dúvidas em considerar semelhante factualidade provada; - a matéria de facto descrita em 7) extrai-se da própria circunstância da sociedade Ré ter vindo a adquirir o imóvel em apreço a esta entidade, negócio que se concretizou na mesma data da assinatura do documento de fls. 10, conforme documenta o contrato de fls. 79 a 85, em que igualmente se estriba a prova da factualidade descrita em 10); - a prova da factualidade a que reporta o ponto 8) resulta do teor do próprio escrito de fls. 10, justificando a sua outorga por ambas as partes. Acresce que Autores e Réus assumem que a transmissão da carteira de clientes se encontrava contemplada no negócio, centrando-se a divergência tão só na inclusão dos bens móveis e na existência de acordo no sentido do abatimento dos valores indicados pelos Réus; - a matéria de facto descrita em 9) resultou provada com base no teor do e-mail de fls. 67, integrado por fls. 72 a 78, o qual não foi impugnado (…); Por contraponto, a matéria de facto não provada foi assim considerada pelas razões já acima assinaladas, ponderando designadamente a falta de credibilidade dos depoimentos a que supra se aludiu e, bem assim, a ausência de prova capaz de suportar semelhante factualidade, tendo em vista as regras de distribuição do ónus da prova, sendo certo que competia aos Réus provar que o escrito de fls. 10 tinha um sentido distinto (ou mais abrangente) do que aquele que resultava do seu teor literal. Refira-se, ainda a este nível, que a certidão judicial de fls. 160 a 165 apenas documenta a prévia existência de um PER, não permitindo suportar a convicção de que os Autores transmitiram aos Réus que o mesmo ainda se encontrava pendente quando encetaram negociações, e que a factualidade descrita sob G) resulta contraditória e pouco consistente em si mesma, posto que o imóvel veio a ser adquirido por valor ligeiramente superior a € 400.000,00, conforme documenta o contrato de locação financeira de fls. 79 a 85, sendo que, ainda que viesse a lograr provada a versão dos Réus (o que, como se referiu, não ocorreu), do documento de fls. 10 resulta claramente ultrapassado o indicado “tecto” máximo (…)”. Perante esta motivação – com particular enfoque para os trechos acima sublinhados - vê-se de forma, clara e transparente, qual o iter lógico desenvolvido pelo Tribunal, expresso de forma coerente, objectivo e detalhado, pontuado com pertinentes referências resultantes de regras de experiência e concluindo, em particular, quanto às testemunhas referenciadas pelos recorrentes – NS e HA – que, o primeiro revela um conhecimento no que ouviu dizer ao réu VC, o que mereceu, no seu circunstancialismo, as maiores reservas (por exemplo, aludiu a que, em sala contígua a reunião tida entre as partes, assistiu ao negócio celebrado, mas acabando por referir que percebeu que “…30.000€ pelo valor do infantário, que não seriam pagos à entidade, mas pelo assumir de uma dívida que existia…”, revelando claro desconhecimento sobre os precisos contornos do negócio de assunção de dívida) e em opiniões pessoais, sem efectivo suporte factual, enquanto que, o segundo, revelou um testemunho indirecto dos factos, proveniente unicamente do alegadamente transmitido pelos Réus, factos que determinaram a insuficiência da sustentação de uma convicção minimamente segura. Tudo visto, inexiste motivo para a alteração pretendida a respeito da factualidade vertida nas alíneas E) e F). * 2)– Se a sentença é nula nos termos do artigo 615º, nº 1, als. d) e e) do CPC? Alegam os recorrentes que na petição inicial vieram os autores, recorridos, peticionar o seguinte: “Serem os RR. condenados a pagar todos os juros vencidos, acrescidos de juros vincendos até efectivo e integral pagamento”, mas na sentença condenaram-se os recorrentes a: “ (…) e dos juros vencidos a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A. após 31 de Julho de 2014, sobre aquele montante” e que, no documento de assunção de divida não é feita qualquer menção aos juros, daí que a sentença tenha extravasado o pedido dos autores recorridos, estamos perante uma condenação ultra petitum, sendo que, nos termos do disposto no art.º 609 n.º 1 do CPC, o tribunal está impedido de condenar em quantia superior ou em objecto diverso do que for pedido, pelo que, a sentença é nula (art. 615.º n.º 1, alíneas d) e e), do CPC). Vejamos se ocorrem as nulidades arguidas. Nos termos do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, relativo às causas de nulidade da sentença uma sentença é nula quando: a)- Não contenha a assinatura do juiz; b)- Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c)- Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d)- O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e)- O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido. Vejamos se o Tribunal se pronunciou indevidamente sobre uma questão de que não podia tomar conhecimento ou se condenou em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido. Importa referir que é «frequente a enunciação nas alegações de recurso de nulidades da sentença, numa tendência que se instalou e que a racionalidade não consegue explicar, desviando-se do verdadeiro objecto do recurso que deve ser centrado nos aspectos de ordem substancial. Com não menos frequência a arguição de nulidades da sentença acaba por ser indeferida, e com toda a justeza, dado que é corrente confundir-se o inconformismo quanto ao teor da sentença com algum dos vícios que determinam tais nulidades», (assim, Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, pág. 132). “A nulidade referida no artº 615º nº 1, al. d) do Código de Processo Civil ocorre quando o Juiz, na Sentença, não resolve todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Além disso, o Juiz não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 09-07-2014, Processo 1021/09.3 T2AMD.L1-1, relator PEDRO BRIGHTON). Por seu turno, “a decisão que ultrapassa o pedido formulado, sem modificação objectiva da instância, passando a abranger matéria distinta, está eivada de nulidade prevista na consignada alínea e) do art.º 615º do Código de Processo Civil. A nulidade do acórdão quando o Tribunal condene em objecto diverso do pedido colhe o seu fundamento no princípio dispositivo que atribui às partes, a iniciativa e o impulso processual, e no princípio do contraditório, segundo o qual o Tribunal não pode resolver o conflito de interesses, que a demanda pressupõe, sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja chamada para se opor” (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21-03-2019, Processo 2827/14.7T8LSB.L1.S1, relator OLIVEIRA ABREU). No caso em apreço, como consta da petição inicial, os autores demandam os réus pedindo, em particular: “1.- Serem os RR. condenados ao pagamento dos valores em dívida resultantes do Contrato de abertura de crédito em conta corrente Nº PT 003………….2 celebrado entre a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS S.A. e a HAPPY M…, ENSINO, EDUCAÇÃO, LAZER, LDA, até ao montante de 30.000€. 2.- Serem os RR. condenados a pagar todos os juros vencidos, acrescidos dos juros vincendos até efectivo e integral pagamento”. No dispositivo da sentença consta: “A)- CONDENO os Réus “M… M… – Berçário, Creche e ATL, Lda.”, VC e LC no pagamento dos valores em dívida resultantes do contrato de abertura de crédito em conta corrente Nº PT 003………….2 celebrado entre a Caixa Geral de Depósitos S.A. e a “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.”, até ao montante de € 30.000,00 (trinta mil euros), e dos juros vencidos a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A. após 31 de Julho de 2014, sobre aquele montante; B)- ABSOLVO os Reconvindos CS e MN do pedido reconvencional contra si formulado pelos Reconvintes “M… M… – Berçário, Creche e ATL, Lda.”, VC e LC”. Na fundamentação da sentença recorrida lê-se a propósito da resolução da questão em apreço, o seguinte: “No caso vertente, o documento identificado em 11) foi subscrito por Autores e Réus sem qualquer intervenção do credor da dívida, a Caixa Geral de Depósitos, não havendo notícia de qualquer ratificação posterior. Daí que nenhuma obrigação seja assumida pelos ora Réus perante o credor daquela dívida, mas tão só perante os primitivos devedores, entre os quais avultam os aqui Autores. (…) No caso de que ora cuidamos, como se referiu, da factualidade apurada nos autos em momento algum se retira a existência de qualquer envolvimento do credor Caixa Geral de Depósitos, S.A. no negócio gizado pelas partes, surgindo pois aquele credor assim como absolutamente alheio ao mesmo. (…) Configurando assim o acordo alcançado entre as partes uma promessa liberatória, apenas aos promissários, aqui Autores, é lícito exigir o seu cumprimento, conforme decorre do disposto no artigo 444.º, n.º 3 do Código Civil. É que, como se refere no Ac. do STJ de 1/07/2004 (proc. n.º 04B1845, acessível em www.dgsi.pt), com pertinência para a hipótese de que ora cuidamos, “(…) o promissário deverá ter-se como credor até ao momento de adesão do terceiro, podendo, até esse "momentum" agir contra o promitente para o obrigar a cumprir em benefício desse terceiro, assim actuando no seu próprio interesse, que é o de (na circunstância) assegurar o cumprimento a favor do terceiro. Pelo que disporá assim o promissário - até ao momento da adesão - de meios coercitivos, como seja o de exigir o cumprimento da obrigação para com o terceiro (cfr. Diogo Leite Campos, in ob. cit., pág 89). Seja como for, a hipótese vertente encontra-se precisamente contemplada na ressalva do nº. 3 do art. 444º do Cód. Civil, pelo que só ao promissário (que não já a terceiro) assiste o direito de exigir o cumprimento da promessa (…). Donde, tendo resultado provado que, mediante prévio acordo negocial os ora Réus assumiram perante os Autores (e, bem assim, a sociedade “Happy M…”) a obrigação (individual e solidária) de exonerar os mesmos do pagamento da dívida resultante do Contrato de abertura de crédito em conta corrente N.º PT 003………….2 celebrado entre a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS S.A. e a HAPPY M…, ENSINO, EDUCAÇÃO, LAZER, LDA, até ao montante de € 30.000, é para nós inequívoco que, à luz do disposto no artigo 444.º, n.º 3 do Código Civil, assiste a estes últimos de exigirem dos primeiros o cumprimento do contrato, no que se refere à prestação em benefício de terceiro”(…). Peticionam ainda os Autores a condenação dos Réus nos juros vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento. Perante a factualidade dada como provada, os Réus incorreram em incumprimento temporário, por não terem cumprido atempadamente a obrigação assumida, mas apesar disso, ela não se tornou impossível, nem tão pouco deixou de ter interesse para os Autores. Como princípio geral subjacente a qualquer situação de inadimplência, dispõe o artigo 798.º do Código Civil “o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor”. Versando o caso em apreço sobre uma situação de simples atraso no cumprimento da obrigação, de acordo com o preceituado no artigo 804.º, n.º 1 do Código Civil, o Réu encontra-se constituído na obrigação de reparar os danos causados ao Autor. Sendo a obrigação em referência uma obrigação pecuniária, a indemnização corresponde aos juros de mora. Assim, os juros moratórios são devidos desde o dia da constituição em mora (cfr. artigo 806.º, n.º1 do Código Civil). Relativamente ao momento da constituição em mora, rege o artigo 805.º do Código Civil, que estabelece no seu n.º 1 que o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir, prevenindo o n.º 2 as situações em que a constituição em mora é independente de interpelação. No caso vertente, verifica-se que no documento constitutivo da obrigação, indicado em 11), as partes não fixaram qualquer prazo para cumprimento. Provou-se, porém, que no dia 16 de Julho de 2014 os Autores remeteram carta a interpelar os Réus para cumprirem a obrigação assumida por via daquele documento no prazo de uma semana. Esta declaração tornou-se eficaz no momento em que chegou ao conhecimento dos destinatários, nos termos do disposto no artigo 224.º, n.º 1 do Código Civil. Ora, não obstante os Autores não tenham alegado a data em que a mencionada carta foi recepcionada pelos Réus, resulta da factualidade descrita em 13) que tal ocorreu em data anterior a 25 de Julho de 2014, pelo que, considerando que por via daquele escrito lhes era concedido o prazo de uma semana para cumprimento da obrigação, pode concluir-se com segurança que o prazo para cumprimento terminou no limite no dia 31 de Julho de 2014, data a partir da qual os Réus se constituíram em mora. Assim, devem os Réus ser ainda condenados no pagamento dos juros que a dívida que se comprometeram a pagar venceu a favor do credor Caixa Geral de Depósitos, S.A. após a referida data de 31 de Julho de 2014, ou seja, computados sobre a quantia em dívida, até ao montante de € 30.000,00, por ter sido esse o prejuízo a que a sua conduta relapsa deu lugar”. Ou seja: Pelo trecho ora referido da fundamentação da sentença percebe-se, claramente, qual foi o sentido do decidido, a saber: A condenação reporta-se à pessoa dos réus, não tendo sido os réus condenados a pagar juros à Caixa Geral de Depósitos, S.A., tanto mais que, como se viu, o acordo firmado não a vincula, nem foi pela mesma ratificado, mas é atinente aos juros da dívida que estes se comprometeram a pagar e que beneficiou, em primeira linha, enquanto credor, a Caixa Geral de Depósitos, S.A. e sobre os quais o incumprimento dos réus, fez sobre eles recair a respectiva responsabilização quanto ao seu pagamento. Não se mostra, pois, qualquer condenação em pedido diverso ao formulado, nem o mesmo o foi em quantidade superior à pretendida. Do mesmo modo, dúvidas não há que, atenta a pretensão formulada, ao Tribunal cabia decidir, como o fez, relativamente à questão dos juros. A sentença recorrida não padece, pois, das nulidades que contra ela foram invocadas. * 3)– Se deve ser alterada a decisão de mérito? Consideram, por fim, os recorrentes que a sentença recorrida fez uma errada aplicação do Direito aos factos. Desde já se diga que, mantendo-se inalterada a factualidade provada, necessariamente improcedem as questões suscitadas pelos recorrentes que tinham como pressuposto a aludida alteração da matéria de facto. Mas, para além disso, a sentença não merece qualquer censura. Como se refere na sentença recorrida, com sólidos fundamentos, considerações que se subscrevem, perante o documento a que se refere o ponto 11) dos factos provados conclui-se que, “não obstante o negócio tenha sido denominado pelas partes de “assunção de dívida”, não estamos perante uma típica assunção de dívida, nos termos do disposto no artigo 595.º do Código Civil”, a qual implicava a intervenção do credor CGD, S.A., o que não sucedeu, mas sim, perante uma simples promessa de liberação ou assunção de cumprimento. “A promessa de liberação, assunção interna de dívida ou assunção de cumprimento é uma figura muito próxima da assunção de dívida. Nela se afasta a figura do credor, obrigando-se o terceiro apenas perante o devedor. Na falta de ratificação do credor, a assunção será apenas uma promessa de liberação” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11-03-2013, Processo 7237/05.4TBMTS-A.P1, relator JOSÉ EUSÉBIO ALMEIDA). Ora, apurando-se que mediante prévio acordo negocial os ora Réus assumiram perante os Autores (e, bem assim, a sociedade “Happy M…”) a obrigação (individual e solidária) de exonerar os mesmos do pagamento da dívida resultante do Contrato de abertura de crédito em conta corrente N.º PT 003………….2 celebrado entre a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS S.A. e a HAPPY M…, ENSINO, EDUCAÇÃO, LAZER, LDA, até ao montante de € 30.000, nos termos do disposto no artigo 444.º, n.º 3 do Código Civil, assiste a estes últimos de exigirem dos primeiros o cumprimento do contrato, no que se refere à prestação em benefício de terceiro. A sentença enquadra correctamente o acordo celebrado entre as partes como promessa liberatória, nos termos do artigo 444º nº 3 CC, De facto, ao contrário do invocado pelos recorrentes, o Tribunal não afirmou que tenha ocorrido assunção liberatória, que tenha desonerado os autores de dívida para com o credor. Assim, não têm qualquer pertinência as considerações dos recorrentes sobre a assunção cumulativa de dívida. Como concluem os apelados: “Não vinculado o título pelo qual o acordo foi designado, apenas se terá de ler o que foi convencionado entre as partes, e tal convenção é clara: os Recorrentes assumem a dívida resultante da conta-corrente até ao montante de 30.000€. Neste processo, a posição do credor CGD é irrelevante, porquanto não estamos a discutir a transmissão da dívida e os direitos da CGD sobre antigos e novos devedores, mas tão somente a obrigação assumida pelos Recorrentes perante os Recorridos de satisfazerem tal crédito. Neste contexto, a discussão conceptual entre promessa liberatória e assunção cumulativa de dívida é perfeitamente espúria”. Não sendo a CGD, S.A. interveniente no presente processo, nem tendo tomado posição quanto ao acordo, não se discute a existência de transmissão de divida nem se pretende determinar em que termos os antigos devedores ficam ou não exonerados. A falta de ratificação, que na verdade não é sequer referida no acordo, não impede que o mesmo produza efeitos entre as partes, apenas impedindo que a dívida se transmita. Não merece, pois, qualquer censura, nesta parte, a sentença recorrida. Relativamente à contrariedade à lei – invocando os recorrentes que o negócio seria contrário à lei na medida em que os credores da insolvente estariam a ser prejudicados em 30.000€ - , cumpre referir que, como salientam os apelados, tal questão não consta da contestação, nem de qualquer peça processual apresentada precedentemente nos autos pelos Recorrentes. Não obstante, com fundamento no depoimento de CS, os recorrentes vêm dizer que a quantia de “até 30.000€” plasmada no documento de fls. 10 era uma forma de retribuição da clientela, concluindo que ocorreu um negócio jurídico celebrado entre quem ainda detinha a administração da empresa Happy M… em desfavorecimento dos credores, contrariedade à lei que também consideram derivar do facto provado em 8), “por violação do disposto no art.º 120.º e ss do CIRE, o que consubstancia a nulidade do documento de assunção de divida celebrado entre as partes, a qual deverá ser declarada nos termos do art.º 286º Código Civil”. Deriva do disposto no artigo 120.º do CIRE (com a epigrafe “Resolução em benefício da massa insolvente”) que podem ser resolvidos em benefício da massa insolvente os atos prejudiciais à massa praticados dentro dos dois anos anteriores à data do início do processo de insolvência. Presumem-se prejudiciais à massa, sem admissão de prova em contrário, os actos de: a)- Partilha celebrada menos de um ano antes da data do início do processo de insolvência em que o quinhão do insolvente haja sido essencialmente preenchido com bens de fácil sonegação, cabendo aos co-interessados a generalidade dos imóveis e dos valores nominativos; b)- Actos celebrados pelo devedor a título gratuito dentro dos dois anos anteriores à data do início do processo de insolvência, incluindo o repúdio de herança ou legado, com excepção dos donativos conformes aos usos sociais; c)- Constituição pelo devedor de garantias reais relativas a obrigações preexistentes ou de outras que as substituam, nos seis meses anteriores à data de início do processo de insolvência; d)- Fiança, subfiança, aval e mandatos de crédito, em que o insolvente haja outorgado no período referido na alínea anterior e que não respeitem a operações negociais com real interesse para ele; e)- Constituição pelo devedor de garantias reais em simultâneo com a criação das obrigações garantidas, dentro dos 60 dias anteriores à data do início do processo de insolvência; f)- Pagamento ou outros actos de extinção de obrigações cujo vencimento fosse posterior à data do início do processo de insolvência, ocorridos nos seis meses anteriores à data do início do processo de insolvência, ou depois desta mas anteriormente ao vencimento; g)- Pagamento ou outra forma de extinção de obrigações efectuados dentro dos seis meses anteriores à data do início do processo de insolvência em termos não usuais no comércio jurídico e que o credor não pudesse exigir; h)- Actos a título oneroso realizados pelo insolvente dentro do ano anterior à data do início do processo de insolvência em que as obrigações por ele assumidas excedam manifestamente as da contraparte; i)- Reembolso de suprimentos, quando tenha lugar dentro do mesmo período referido na alínea anterior. Salvo nos casos a que respeita o artigo 121.º do CIRE, a resolução pressupõe a má fé (o conhecimento, à data do acto, de que o devedor se encontrava em situação de insolvência, do carácter prejudicial do acto e de que o devedor se encontrava à data em situação de insolvência iminente e do início do processo de insolvência) do terceiro, a qual se presume quanto a actos cuja prática ou omissão tenha ocorrido dentro dos dois anos anteriores ao início do processo de insolvência e em que tenha participado ou de que tenha aproveitado pessoa especialmente relacionada com o insolvente, ainda que a relação especial não existisse a essa data. São insuscetíveis de resolução os negócios jurídicos celebrados no âmbito de processo especial de revitalização ou de processo especial para acordo de pagamento regulados no presente diploma, de providência de recuperação ou saneamento, ou de adoção de medidas de resolução previstas no título VIII do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro, bem como os realizados no âmbito do Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas ou de outro procedimento equivalente previsto em legislação especial, cuja finalidade seja prover o devedor com meios de financiamento suficientes para viabilizar a sua recuperação. Ora, relativamente ao acordo dos autos a que se refere o documento de fls. 10 dos autos, não se vislumbra em que medida o mesmo seja contrário à lei, pois, na realidade, os réus assumiam a realização de uma prestação em benefício dos demais outorgantes, incluindo, logicamente, a insolvente, não derivando de tal negócio qualquer prejuízo para os credores da insolvente. Não se vislumbra, pois, qualquer violação das normas legais mencionadas pelos recorrentes, nem ela deriva da demonstração factual vertida no facto provado em 8). Finalmente, quanto à reconvenção, consideram os recorrentes que a mesma deveria ter sido parcialmente julgada procedente, o que decorreria da matéria provada nos pontos 14), 15), 22) e 23) e do pagamento pelos réus de €16.912,50, sendo que, consideram os recorrentes que o total é de €34.540,31 (€17.627,81 + €16.912,50), pelo que pagaram a mais €4.540,31 além de €30.000,00. Ora, conforme consta, de forma clara, correcta e perfeitamente inteligível, da decisão recorrida, a pretensão reconvencional alicerçou-se “no instituto da responsabilidade pré-contratual, sustentando terem os Reconvindos transmitido informações inexactas quanto à situação financeira/contabilística da sociedade “Happy M…” e quanto aos poderes de disposição do imobilizado, o que fizeram de má fé, violando a confiança que os Reconvintes depositaram nos mesmos, com o que lhes causaram danos patrimoniais e no peticionado montante”. Na realidade, “no caso sub judice, não obstante os Reconvintes tenham alegado que os Reconvindos, no âmbito das negociações que encetaram, violaram os deveres de informação e lealdade que sobre si impendiam, transmitindo-lhes informações erradas, tendo em vista a conclusão do contrato – circunstância que seria efectivamente susceptível de os fazer incorrem em responsabilidade pré-contratual, nos termos sumariamente expendidos –, da análise da factualidade apurada resulta patente que os mesmos não lograram provar os factos em que se consubstanciava tal alegação. Atente-se que não está aqui em causa sindicar ou sancionar se os Reconvintes, ao abrigo da liberdade contratual que a lei lhes reconhece, celebraram um bom ou um mau negócio, mas tão só se o fizeram por a tanto terem sido conduzidos por informações inexactas dos Reconvindos, o que, como se viu, não provar. Acresce que não basta uma mera incompletude da informação transmitida para, sem mais, fazer os Reconvindos incorrerem em responsabilidade pré-contratual. Na verdade, neste caso sempre poderiam os Reconvintes recusar a celebração do negócio até lhes serem fornecidas as informações que entendiam determinantes para a sua vinculação nos termos em que a mesma ocorreu, ao invés de confiarem, sem que se tenha provado que essa confiança foi gerada pelos Reconvindos, que as informações alegadamente em falta lhes seriam mais favoráveis do que se vieram a revelar, como sustentam. Donde, inexiste justificação para a peticionada condenação dos Reconvindos no pagamento da indemnização peticionada, seja por danos patrimoniais (diga-se, aliás, que nem se encontra qualquer base legal, mesmo na tese dos Reconvintes, para fazer recair sobre os Reconvindos os custos de um empréstimo no valor de € 18.000,00 quando os próprios assumem terem aceite a vinculação no pagamento de uma quantia que poderia ascender até € 30.000,00), seja por danos não patrimoniais (que, em todo o caso, também não provaram ter sofrido). Em face do exposto, e sem necessidade de maiores considerações, há que julgar a reconvenção improcedente, por não provada, com a consequente absolvição dos Reconvindos do pedido contra si formulado pelos Reconvintes” (cfr. sentença recorrida). Não podendo ser os autores responsabilizados pelos valores mencionados na reconvenção pelos réus, a apelação soçobrará integralmente, confirmando-se a sentença recorrida. * 5.–Decisão: Em face do exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente e em confirmar a sentença recorrida. Custas a cargo dos apelantes. Notifique e registe. * Lisboa, 26 de Setembro de 2019. (Carlos Castelo Branco - Relator) (Lúcia Celeste da Fonseca Sousa -1.ª Adjunta) (Magda Espinho Geraldes - 2.ª Adjunta)
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: * 1.–Relatório: CS e MN intentaram a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra M… M… – BERÇÁRIO, CRECHE E ATL, LDA., VC e LC, todos identificados nos autos, peticionando a condenação dos RR. no pagamento dos valores em dívida resultantes do contrato de abertura de crédito em conta corrente Nº PT 003………….2 celebrado entre a Caixa Geral de Depósitos S.A. e a “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.”, até ao montante de € 30.000,00 e, bem assim, dos juros vencidos, acrescidos dos juros vincendos até efectivo e integral pagamento. Alegaram em síntese, que no dia 07/02/2014, os Autores e a “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.” celebraram com os RR. um acordo denominado de “Assunção de dívida”, nos termos do qual estes assumiram solidariamente os valores em dívida resultantes do contrato de abertura de crédito em conta corrente n.º PT 003………….2 celebrado entre a Caixa Geral de Depósitos S.A. e a H… M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda., até ao montante de € 30.000,00, exonerando os AA. até esse montante. Mais referiram que o acordo de assunção de dívida não foi até à presente data ratificado expressamente pelo credor CGD. Acrescentaram que os RR. não cumpriram o assumido perante os Autores e a Happy M… – cuja intervenção principal provocada requereram - e que interpelados para pagamento, não o fizeram. * Contestaram os RR. sustentando, em síntese, que o acordo foi celebrado na sequência de negociações tendentes à aquisição do “colégio” onde funcionava o estabelecimento designado de Happy S…, designadamente o goodwill do negócio, ou seja, a clientela e os bens móveis, tendo no âmbito das mesmas os AA. transmitido aos RR. a ideia que estavam munidos de poderes para tomar decisões acerca de tudo (não obstante a sociedade Happy M… se encontrar em processo de insolvência), menos do imóvel que pertencia a uma entidade financeira. Mais alegaram que os AA. sugeriram aos RR. que o montante de € 30.000,00 referentes ao goodwill (clientela) e bens móveis fosse pago pelo assumir de uma dívida que os Autores tinham perante a Caixa Geral de Depósitos (CGD), o que aceitaram mediante duas condições: 1) que fosse apurado o valor adiantadamente pago pelos clientes, que seria a deduzir naquele montante; 2) que o valor que os RR. viessem a pagar pela aquisição do recheio (pois os bens móveis haviam sido apreendidos a favor da massa insolvente) seria também a deduzir naquele montante, condições que os AA. aceitaram. Sucede que, o valor dos adiantamentos dos clientes se cifrava em € 17.627,81, tendo além disso os Réus pago € 15.375,00 pelos bens móveis e € 1.537,50 a título de despesas da empresa Avalibérica, que promoveu a venda, tudo perfazendo o total de € 34.540,31. Mais aduziram que, em face de tal, contactaram a Autora mulher a fim de proceder ao distrate do documento assinado, para o que esta se mostrou indisponível, pelo que os Réus deram conhecimento desta situação aos Autores, ao Dr. LT (Caixa Geral de Depósitos) e ao Dr. RG (Administrador de Insolvência Happy M… Lda.), na sequência do que surge a presente acção. Sustentaram verificar-se uma situação de má-fé dos AA. durante e na conclusão do contrato de assunção de dívida em causa nestes autos e de vício na formação da vontade. Terminaram peticionando a improcedência da acção e a procedência das excepções deduzidas, com a consequente absolvição dos pedidos e deduziram reconvenção, peticionando a condenação dos AA. no pagamento da quantia de € 7.950,31, sendo a quantia de € 4.540,31 por referência à diferença entre o valor que suportaram e o valor de € 30.000,00 acordado, a quantia de € 910,00 relativa aos encargos suportados com um mútuo que tiveram que contrair para o pagamento das referidas quantias, e a quantia de € 2.500,00 a título de danos não patrimoniais sofridos pelos 2.º e 3.º Réus, quantia esta acrescida de juros até efectivo e integral pagamento, bem como nas quantias que se vierem a apurar em liquidação de sentença, relativa aos custos que ainda tenham que suportar com o empréstimo que contraíram, e nos juros moratórios que se vencerem após a citação. * Replicaram os AA. dizendo que a assunção de dívida se destinou apenas a compensá-los pela manutenção do estabelecimento em funcionamento e, por essa via, do aviamento ou goodwill do mesmo, sendo alheios às despesas suportadas pelos RR. e a qualquer dano moral que os mesmos possam ter sofrido. Na mesma sede, pronunciaram-se ainda quanto à ocorrência do vício de litigância de má-fé, suscitado pelos Réus na contestação, impugnando igualmente a factualidade a esse nível alegada. Concluíram pela improcedência da reconvenção com a sua absolvição de tal pedido. * Por despacho de fls. 275, veio a ser indeferida a requerida intervenção principal provocada da “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.”. * Realizada audiência prévia, na mesma foi admitida liminarmente a reconvenção e fixado o objecto do litígio e os temas da prova. * Realizou-se audiência de discussão e julgamento vindo a ser proferida sentença julgando a acção procedente e a reconvenção improcedente, condenando os RR. no pagamento dos valores em dívida resultantes do contrato de abertura de crédito em conta corrente Nº PT 003………….2 celebrado entre a Caixa Geral de Depósitos S.A. e a “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.”, até ao montante de € 30.000,00 (trinta mil euros), e dos juros vencidos a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A. após 31 de Julho de 2014, sobre aquele montante e absolvendo os AA. do pedido reconvencional. * Não se conformando com a decisão, dela apelaram os RR., formulando as seguintes conclusões: “1)- O ponto 10 dos factos provados deverá ser alterado aditando-lhe o seguinte: “Cartório Notarial de Lisboa perante a Notária Dra. AP”, situação esta que deriva expressamente do doc. 4 constante a fls..., facto esse que é pacifico entre as partes. 2)- Assim, o ponto 10 deverá ser alterado passando a ter a seguinte redacção: “10) Em 7 de Fevereiro de 2014, a Ré “M… M… – Berçário, Creche e ATL, Lda.”, na qualidade de locatária, e a Caixa Leasing e Factoring – Instituição Financeira de Crédito, S.A., na qualidade de locadora, outorgaram no Cartório Notarial de Lisboa perante a Notária Dra. AP escrito denominado “Contrato de Locação Financeira Imobiliária n.º 1…….4”, tendo por objecto o imóvel onde funcionava o dito estabelecimento.” 3)- Ao ponto 11 dos factos provados deverá incluir-se o seguinte: “no interior do Cartório Notarial de Lisboa da Dra. AP, mas sem o reconhecimento presencial das assinaturas” situação essa que resulta do próprio documento de fls. 10 e do depoimento da própria Autora CS.. 4)- O ponto 11) deverá ser alterado passando a ter a seguinte redacção: 11) Nesse mesmo dia 7 de Fevereiro de 2014, no interior do Cartório Notarial de Lisboa da Dra. AP, sem o reconhecimento presencial das assinaturas, os Autores (…). 5)- Os pontos E) e F) foram dados como não provados e deviam ter sido dado como provados, pois que, o doc. de fls. 10 tinha duas condicionantes, as quais ficaram demonstradas. 6)- No documento de fls. 10 ficou a ressalva com a palavra “até” que o valor dos 30.000€ que demonstrava que o valor podia ser inferior em função do montante que viesse a ser apurado dos pagamentos efectuados adiantadamente pelos clientes (mensalidades dos pais que pagavam anualmente, semestralmente e trimestralmente __facto este dado como provado no ponto 14 e 15. 7)- Com a inclusão da palavra “até” pretendiam as partes deixar ilíquido o valor que os RR. Iriam assumir em consideração àquelas duas condicionantes, sendo que, esse valor tanto podia ser de 0€ como de 10.0000€ como de 12.000€ como de 30.000€, tudo dependeria daquelas duas condições ainda incertas. 8)- Todos os documentos foram assinados no mesmo dia à mesma hora no Cartório Notarial de Lisboa da Dra. AP, com o reconhecimento presencial das assinaturas. 9)- Só um documento não o foi com reconhecimento de assinaturas: O documento de assunção de divida de fls. 10 em causa nestes autos. 10)- Se aquele negócio não tivesse aquelas duas condicionantes também teria sido feito o reconhecimento de assinaturas do mesmo. 11)- A testemunha NS foi peremptório ao afirmar que existiam condicionantes no negócio conforme se alcança da gravação áudio. 12)- A testemunha HA, ex-financeiro da empresa M… M…, acompanhou o negócio e cujo depoimento e confirmou a existência de “variáveis” (assim lhe chamou a testemunha) e que eram os adiantamentos pagos pelos pais e a incerteza do montante que os RR. iam pagar pela aquisição do recheio. 13)- A testemunha HA referiu expressamente que por existirem condicionantes ao documento de assunção de divida de fls. 10 e que por esse motivo não o inscreveu na contabilidade porque haviam “variáveis” e o valor não era pacifico. 14)- Situação esta claramente demonstrativa da existência das duas condições. 15)- O depoimento da testemunha PM o qual o tribunal a quo entendeu merecer a confiança do tribunal, temos que salientar que o mesmo referiu os AA. e os RR. compareceram na sede da CGD para darem a conhecer o ponto da situação e informaram que não sabiam se o valor viria a ser de 25, 15 ou 10. Ou seja, queria com isto dizer a testemunha que poderia existir oscilação no valor do documento de fls. 10 em função das variáveis que estavam ainda em aberto. 16)- E isto foi dito perante a testemunha na sede da CGD. Facto este que o tribunal ignorou por completo apesar de ter caracterizado o depoimento desta testemunha como credível. 17)- O tribunal a quo errou na conclusão a que chegou quanto ao documento de assunção de divida de fls. 10, pois que, efectivamente aquele documento de assunção de divida tinha aquelas duas condicionantes, e pelos montantes que se veio a apurar em sede de julgamento e que foram 100% coincidentes com o alegado na contestação, ao que acresce o depoimento das testemunhas PM (Caixa Geral de Depósitos), NS e HA, tudo conforme transcrições dos seus depoimentos supra transcritos na motivação. 18)- O depoimento da testemunha NS contrariamente ao que decidiu o tribunal a quo, deveria ter merecido a credibilidade perante o tribunal. 19)- Os RR. não pretendem em sede de recurso uma “repetição integral do julgamento” da matéria de facto porém, à luz das regras da experiencia comum, parece-nos que sem grande esforço se constará a existência de um erro grave na valoração da prova testemunhal, pelo que, requerem uma reapreciação da mesma. 20)- A testemunha HA, foi sempre espontânea na forma como depôs e isso é notório pelo uso de expressões e palavras correntes de senso comum, sem grande preocupação de vocabulário técnico. 21)- Foi financeiro na empresa e já não trabalhava na empresa desde Julho de 2014, sendo totalmente imparcial, o que se denota na forma coerente e escorreita como prestou o seu depoimento. 22)- HA, pelo cargo de financeiro que ocupava mostrou ter conhecimento directo dos factos e relatou-os ao tribunal de forma imparcial e sem hesitações. Foi peremptório perante a questão principal em causa nos autos, ou seja, saber se o documento de assunção de divida tinha ou não duas condicionantes e, nesse aspecto foi igualmente esclarecedor e afirmativo ao confirmar que a existência da condicionante dos valores adiantamentos pagos pelos pais e ainda a questão do montante que viesse a ser pago pela aquisição do recheio do colégio. 23)- A testemunha PM, funcionário da Caixa Geral de Depósitos que acompanhou todo este processo, entendeu o tribunal a quo que o mesmo mereceu a confiança do tribunal, porém não deu como provados os factos que o mesmo depôs, sobretudo no que diz respeito há existência de duas condições no doc. de fls. 10. 24)- A CGD sabe e sabia do documento de fls. 10, porém nunca ratificou o documento de assunção de divida porque sabia de antemão, da existência de duas condicionantes subjacentes ao documento, e sabendo posteriormente que estando verificadas essas condicionantes que traduziam um saldo 0€ a favor dos AA. sabia perfeitamente que os RR. não tinham que garantir coisa nenhuma. 25)- O Tribunal a quo fez uma incorrecta subsunção dos factos ao direito concluindo que estamos perante uma promessa de liberação. 26)- Para ocorrer uma assunção liberatória, a lei impõe que haja um consentimento expresso do credor. O que não aconteceu no caso em apreço conforme refere a própria sentença proferida pelo Tribunal a quo (leia-se na parte final da pág. 23 da sentença, fls…. e inicio da página 24, fls... “No caso de que ora cuidamos, como se referiu, da factualidade apurada nos autos em momento algum se retira a existência de qualquer envolvimento do credor Caixa Geral de Depósitos S.A. no negócio gizado pelas partes, surgindo pois aquele credor assim como absolutamente alheio ao mesmo”). 27)- O documento de fls. 10 tinha duas condicionantes: A) Que fosse apurado o valor adiantadamente pago pelos clientes que seria a deduzir naquele montante ; B) Que o valor que os RR. viessem a pagar pela aquisição do recheio que seria também a deduzir naquele montante. 28)- A razão de ser da estipulação condicional radicou na incerteza sobre as circunstâncias futuras que as partes não dominavam no momento da assinatura do documento de fls. 10 e se lhe afiguravam de verificação incerta. 29)- Facto este que ficou demonstrado pelo depoimento das testemunhas HS, HA e PM.. 30)- A testemunha PM afirmou que sabia existirem situações em “aberto” facto esse do seu conhecimento directo, pois que, AA. e RR. compareceram pessoalmente na sede da CGD em Lisboa e onde lhe fizeram um ponto de situação, tendo esta testemunha referido peremptóriamente em sede de julgamento que não sabiam se o valor era 20, 25, 15 ou 10 era ilíquido ainda. 31)- Uma das provas de que a assunção de divida tinha duas condicionantes e que se verificaram, foi o facto de o credor Caixa Geral de Depósitos ter conhecimento da existência deste documento de fls. 10 (conforme depoimento da testemunha PM – Funcionário da CGD) e não ter executado os Réus o que também fica demonstrado com o próprio requerimento executivo intentado pelo credor CGD apenas contra os autores conforme se alcança de fls. 380 a 382. 32)- A CGD não executou os RR. porque sabia de antemão que o documento estava condicionado, palavras da testemunha Paulo Marques, e mais, sabia que nada era devido pelos Réus aos Autores. 33)- O documento de fls. 10 é contrário à lei, pois que, a clientela e as funcionárias pertenciam à empresa Happy M… e eram um activo desta, daqui facilmente se conclui que não faz sentido a Sra. CS vir dizer que aquela quantia de “até 30.000€” ser uma forma de retribuição pela clientela existente já que esse seria também um bem da massa falida da sociedade Happy M… Lda insolvente. 34)- O negócio seria sempre contrário à lei na medida em que os credores da insolvente estariam a ser prejudicados em 30.000€ o que também seria ilegal e geraria a nulidade do negócio (art.º 281º e 286º do Código Civil) 35)- Na petição inicial vieram os autores, recorridos, peticionar o seguinte: “Serem os RR. condenados a pagar todos os juros vencidos, acrescidos de juros vincendos até efectivo e integral pagamento”. 36)- Na sentença condenaram-se os recorrentes a: “ (…) e dos juros vencidos a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A. após 31 de Julho de 2014, sobre aquele montante.” 37)- Não se vislumbra de que modo poderiam os recorrentes ser condenados ao pagamento de juros ao credor Caixa Geral de Depósitos quando isso não é pedido pelos autores, e por outro lado, quando nem sequer consta do documento de assunção de divida que os réus assumiriam os juros ou qualquer outra quantia perante a CGD que excedesse os 30.000€. 38)- Se atentarmos no documento de assunção de divida só ali constam “até 30.000€”, nem sequer é feita qualquer menção aos juros, daí que a sentença tenha extravasado o pedido dos autores recorridos, estamos perante uma condenação ultra petitum . 39)- Nos termos do disposto no art.º 609 n.º 1 do CPC, o tribunal está também impedido de condenar em quantia superior ou em objecto diverso do que for pedido, pelo que, a sentença é nula (art. 615.º n.º 1, alíneas d) e e), do CPC). 40)- Foram assim violados os artigos 5º n.º 1, 608º n.º 2, 609.º n.º 1, 615.º n.º 1, alíneas d) e e) do Código de Processo Civil, e ainda o art.º 281º e 286º do Código Civil”. * Foram apresentadas contra-alegações concluindo pela improcedência do recurso e manutenção da decisão recorrida. * 2.–Questões a decidir: Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, nos termos preceituados pelos artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC, as questões a decidir são: 1)–Impugnação da matéria de facto: a)- Se deve ser alterado o ponto 10 dos factos provados, aditando-lhe o seguinte: “Cartório Notarial de Lisboa perante a Notária Dra. AP” e se deve ser alterado o ponto 11 dos factos provados, aditando-lhe o seguinte: “no interior do Cartório Notarial de Lisboa da Dra. AP, mas sem o reconhecimento presencial das assinaturas”? b)- Se devem ser considerados como provados os pontos E) e F) (dados na sentença recorrida como não provados)? 2)– Se a sentença é nula nos termos do artigo 615º, nº 1, als. d) e e) do CPC? 3)– Se deve ser alterada a decisão de mérito? * 3.–Fundamentação de facto: A SENTENÇA RECORRIDA CONSIDEROU COMO PROVADA A SEGUINTE FACTUALIDADE: 1)- A “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.” era uma sociedade comercial que se dedicava designadamente à prestação de cuidados de educação para a primeira infância, educação pré-escolar e primeiro ciclo do ensino básico, organização e apoio a actividades extracurriculares, extra escolares e sócio-educativas, organização de actividades de âmbito sócio-cultural, lúdico, desportivo e de lazer. 2)- No desenvolvimento da actividade referida em 1) a sociedade “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.” explorava um estabelecimento com as valências de creche, infantário e ensino pré-escolar. 3)- A gerência da sociedade “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.” era exercida pelos Autores. 4)- Pela Ap. 1 de 24/09/2013 foi inscrita no registo comercial a insolvência da sociedade “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.”. 5)- Em data não concretamente apurada, mas anterior a 27 de Novembro de Novembro de 2013, Autores e Réus encetaram negociações com vista à aquisição por parte destes últimos do estabelecimento explorado pela “Happy M… – Ensino, Educação e Lazer Lda.”, incluindo instalações, bens móveis e carteira de clientes. 6)- No decurso dessas negociações os Autores informaram os Réus que a gestão corrente da sociedade “Happy M… – Ensino, Educação e Lazer Lda.” lhes pertencia, o que havia sido judicialmente decretado. 7)- Além disso, os Autores informaram os Réus que o imóvel onde funcionava o estabelecimento referido em 2) pertencia à Caixa Leasing e Factoring – Instituição Financeira de Crédito, S.A., no âmbito de um contrato de leasing entre ambos celebrado. 8)- Os Autores informaram os Réus que pretendiam receber o valor de € 30.000,00 pela sua intervenção no negócio referido em 5), valor que incluía a transmissão da carteira de clientes do estabelecimento referido em 2), a ser pago mediante a assunção de uma dívida que os primeiros tinham perante a Caixa Geral de Depósitos, S.A., ao que os Réus acederam. 9)- No decurso das negociações indicadas em 5), os Autores remeteram aos Réus o balancete constante de fls. 72 a 78, para cujo teor se remete e aqui se dá por integralmente reproduzido. 10)- Em 7 de Fevereiro de 2014, a Ré “M… M… – Berçário, Creche e ATL, Lda.”, na qualidade de locatária, e a Caixa Leasing e Factoring – Instituição Financeira de Crédito, S.A., na qualidade de locadora, outorgaram escrito denominado “Contrato de Locação Financeira Imobiliária n.º 1…….4”, tendo por objecto o imóvel onde funcionava o dito estabelecimento. 11)- Nesse mesmo dia 7 de Fevereiro de 2014, os Autores CS e MN e a “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.”, conjuntamente identificados como Antigos Devedores, e os Réus M… M… – Berçário, Creche e ATL, Lda., VC e LC, conjuntamente identificados como Novos Devedores, celebraram acordo escrito, denominado de “assunção de dívida”, designadamente com o seguinte teor: “Artigo único Pelo presente documento os Novos Devedores assumem solidariamente os valores em dívida resultantes do Contrato de abertura de crédito em conta corrente N.º PT 003………….2 celebrado entre a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS S.A. e a HAPPY M…, ENSINO, EDUCAÇÃO, LAZER, LDA, até ao montante de 30.000€, exonerando os Antigos Devedores até esse montante. Todas as restantes quantias que possam ser devidas à CGD, além dos 30.000€ ora assumidos, mantém-se a responsabilidade pelo seu pagamento por parte dos Antigos Devedores supra identificados.”. 12)- Com data de 16 de Julho de 2014, os Autores remeteram a cada um dos Réus, que a receberam, a missiva de fls. 476, designadamente com o seguinte teor: “(…) Exmos. Senhores, Nos termos de declaração de assunção de dívida datada de 7 de Fevereiro de 20014, a M… M… – BERÇÁRIO, CRECHE E ATL, LDA, o Senhor Dr. VC, e a Senhora Dra. LC, assumiram solidariamente os valores em dívida resultantes do Contrato de abertura de crédito em conta corrente Nº PT 003………….2 celebrado entre a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS S.A. e a HAPPY M…, ENSINO, EDUCAÇÃO, LAZER, LDA, até ao montante de 30.000€, exonerando os Antigos Devedores até esse montante. Até à presente data, Vexas não honraram o V. compromisso, permanece o saldo da referida conta-corrente por liquidar, acumulando juros remuneratórios e moratórios. Serve a presente para interpelar Vexas ao pagamento valores em dívida resultantes do Contrato de abertura de crédito em conta corrente Nº PT 003………….2 celebrado entre a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS S.A. e a HAPPY M…, ENSINO, EDUCAÇÃO, LAZER, LDA, até ao montante de 30.000€, no prazo de uma semana a contar da recepção desta carta, sob pena de, não o fazendo sermos obrigados a obter o cumprimento coercivo da obrigação assumida por Vexa.(…).”. 13)- No dia 25 de Julho de 2014, na sequência da recepção da carta a que se alude em 12), os Réus remeteram aos Autores, ao Dr. LT, da Caixa Geral de Depósitos, e ao Dr. RG, administrador da insolvência da sociedade “Happy M…”, que o receberam, documento escrito com o teor constante de fls. 16 e 17, que aqui se dá por integralmente reproduzido, e designadamente com o seguinte: “(…)Assunto: Assunção de dívida Exmos. Senhores, Conforme é do vosso conhecimento a forma como V. Ex.ªs conduziram as negociações da empresa Happy M… Lda que se encontrava num processo judicial de falência nem sempre se pautou pelo cumprimento dos princípios da boa-fé e da transparência, tendo-nos sido ocultados diversos factos importantes. Por outro lado, e conforme também é do vosso conhecimento, ficou acordado que o assumir da dívida que o Happy M… Lda. e os seus gerentes tinham junto da Caixa Geral de Depósitos seria a forma de pagar o preço pela aquisição de todo o recheio e know-how/goodwill da empresa Happy M… em processo de falência. Sendo que, para tal, V. Exas sempre nos informaram que podiam fazê-lo, pois que, a posse dos bens que compunham todo o recheio do estabelecimento e o goodwill era apenas vosso. Acresce que sempre vos transmitimos que pretendíamos que fosse apurado o valor exacto pago adiantadamente pelos pais das crianças que frequentavam aquele estabelecimento, pois que, esse valor que viesse a ser apurado seria deduzido aos 30.000,00€ que estávamos a assumir. Daí que o documento de assunção de dívida não tenha um valor exacto e tenha sido feita essa ressalva de comum acordo entre todos. No entanto, todo o circunstancialismo em que assentou a assunção de dívida deixou de fazer sentido, a partir do momento em que soubemos que o recheio, o goodwill e todo o estabelecimento não podia ser transmitido por vós mas tinha que passar por uma negociação judicial e com todos os credores, pois que, afinal vós não tínheis a posse daqueles bens móveis nem legitimidade para efectivar o negócio tal como tínhamos acordado inicialmente. Não podíamos assim compactuar com essa situação na medida em que isso constituía um benefício directo a vosso em detrimento dos restantes credores da falência, também por esse motivo informámos que pretendíamos imprescindivelmente que fosse tudo feito dentro da legalidade. E tanto assim é que viemos a adquirir os referidos bens e o imóvel através de um processo de negociação no âmbito do processo judicial de falência e com o respectivo Senhor Administrador e a empresa encarregue da venda dos bens. E com esta situação deixou de existir qualquer fundamento para a citada assunção de dívida. Aproveitamos ainda a presente carta para vos reiterar que somos pessoas cuja palavra ainda constitui um ponto de honra, pelo que, lamentamos e rejeitamos que V. Ex.ªs venham agora querer receber abusivamente uma quantia que bem sabem que não vos é devida, tanto mais que já foi paga à ordem do tribunal, querendo passar por cima de tudo e de todo distorcendo a verdade. Assim, entendemos não vos ser devida qualquer quantia, pelo que, caso seja necessário, iremos tomar as medidas judiciais que entendermos mais adequadas à resolução do problema aos vários níveis(…)”. 14)- No mês de Fevereiro de 2014 encontravam-se inscritas e a frequentar o estabelecimento supra referido 42 crianças, mediante o pagamento de uma mensalidade. 15)- Em 7 de Fevereiro de 2014, encontravam-se pagas as mensalidades vencidas até Agosto desse ano de quatro crianças, as mensalidades vencidas até Abril de uma criança e, bem assim, as mensalidades vencidas até Maio de outra das crianças que frequentavam o estabelecimento, conforme tabela de fls. 98, para cujo teor se remete e aqui se dá por integralmente reproduzida. 16)- No dia 7 de Fevereiro 2014, pelas 12h18m, antes da formalização dos escritos referidos em 10) e em 11), a Autora CS enviou um e-mail à Ré LC a remeter uma informação sobre valores de mensalidades dos alunos e a informar que na 2ª feira seguinte, dia 10/02/2014, informaria “o que se passa quanto aos pagamentos anuais”. 17)- No dia 10 de Fevereiro de 2014, tal como já havia sido acordado anteriormente entre os Autores e os Réus, realizou-se uma reunião geral conjunta (antiga e nova gerência) nas instalações do estabelecimento referido em 2) com todos os encarregados de educação dos alunos, para apresentação da nova locatária do imóvel e informar que a mesma iria continuar com a actividade do mencionado estabelecimento. 18)- Nessa reunião foi suscitada por diversos pais a questão de saber como iria ser tratado o facto de já terem pago as mensalidades do ano 2014 por inteiro, tendo o Autor MN respondido que “Não se preocupem com essa situação, isso já está tudo resolvido entre nós”. 19)- No dia 11 de Fevereiro de 2014, a Autora CS enviou um e-mail à Ré LC, o qual continha uma tabela com os ditos pagamentos anuais adiantadamente recebidos. 20)- Pouco tempo depois de tomarem a posse do imóvel, os Réus tiveram conhecimento do anúncio que veio a publicitar a venda dos bens móveis da “Happy M…” através da empresa Avalibérica, cujas propostas poderiam ser apresentadas até ao dia 29 de Abril de 2014. 21)- Àquela data o estabelecimento referido em 2) mantinha-se em funcionamento, encontrando-se os alunos, as respectivas educadoras, auxiliares e demais pessoal a servir-se dos referidos bens móveis. 22)- A Ré “M… M…” apresentou uma proposta para aquisição daqueles bens móveis, os quais lhe foram adjudicados no âmbito do processo de insolvência pelo montante de € 12.500,00 (doze mil e quinhentos euros) acrescidos de IVA, o que tudo perfez o valor global de € 15.375,00 (quinze mil trezentos e setenta e cinco euros). 23)- A Ré “M… M…” pagou à empresa Avalibérica Lda. a quantia de € 1.537,50 (mil quinhentos e trinta e sete euros e cinquenta cêntimos) a título de despesas pela venda dos referidos bens móveis. 24)- A sociedade “LVC – Gestão de Empresas, SGPS” transferiu para a Ré “M… M…” a quantia de € 18.000,00 (dezoito mil euros) para pagamento das quantias referidas em 22) e 23). 25)- Para o efeito, a sociedade “LVC – Gestão de Empresas, SGPS” socorreu-se de uma conta corrente caucionada de que é detentora na Caixa Geral de Depósitos. * A SENTENÇA RECORRIDA CONSIDEROU COMO NÃO PROVADA A SEGUINTE FACTUALIDADE: A)– Nas circunstâncias descritas em 5) do elenco de factos provados, os Autores tenham dito aos Réus que a sociedade “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.” se encontrava em Processo Especial de Revitalização. B)– Nas circunstâncias descritas em 5) e 6) da matéria de facto provada os Autores tenham dito aos Réus que os bens móveis do estabelecimento indicado em 2) poderiam ser negociados directamente com aqueles. C)– Os Autores tenham dito aos Réus que no valor de € 30.000,00 a que se alude sob 8) do elenco de factos provados estavam contemplados os bens móveis do estabelecimento indicado em 2). D)– No decurso das negociações a que se alude em 5), os Autores tenham dito aos Réus que o valor dos adiantamentos dos clientes do estabelecimento a que se alude em 2) reflectido no balancete da sociedade referida em 1) que lhes foi apresentado podia ser nulo. E)– Os Réus tenham fixado como condições ao pagamento da quantia indicada em 8), que fosse apurado o valor adiantadamente pago pelos clientes, que seria a deduzir naquele montante, e que o valor que os Réus viessem a pagar pela aquisição do recheio seria também a deduzir naquele montante, o que os Autores aceitaram. F)– Com a inclusão da palavra “até” no escrito referido em 11), as partes pretendiam deixar ilíquido o valor que os Réus iriam assumir por força da dedução ao assinalado montante do valor adiantadamente pago pelos clientes e do valor de aquisição do recheio do estabelecimento. G)– Os Réus manifestaram diversas vezes aos Autores que o seu “tecto” máximo para a realização de todo o negócio seria de € 420.000,00, em que cerca de € 400.000,00 seriam para o imóvel pertencente à CLF e cerca de € 20.000,00 para o recheio do colégio e carteira de clientes. H)– Os Réus ficaram surpreendidos com a resposta dada pelo Autor MN nas circunstâncias descritas em 18). I)– Na sequência do e-mail a que se alude em 19), por não conseguir entender o conteúdo da tabela remetida, a Ré LC voltou a insistir junto da Autora CS para que esta a ajudasse a apurar exactamente qual o valor que tinha sido adiantado pelos clientes. J)– Após o referido em 19), a Autora CS deixou de atender o telemóvel à Ré LC.. K)– A proposta a que se alude em 22) tenha sido também efectuada pelos Réus VC e LC, tendo os bens aí indicados sido adjudicados também aos mesmos. L)– As quantias referidas em 22) e 23) tenham sido pagas pelos Réus VC e LC.. M)– Perante o descrito em 22), a Ré LC voltou a tentar contactar a Autora CS no sentido de se reunirem a fim de “cancelar” o documento a que alude em 11), a qual sempre se mostrou indisponível para tal. N)– Se os Réus soubessem o valor dos pagamentos anuais feitos pelos clientes e que os Autores não poderiam alienar os bens móveis do estabelecimento indicado em 2) não teriam assinado o documento indicado em 11). O)– À data em que a Ré “M… M…” procedeu aos pagamentos referidos em 22) e 23), a mesma não dispunha de capitais próprios o efeito. P)– Os juros anuais decorrentes do uso da conta caucionada indicada em 25) pelo valor mencionado em 24) cifram-se em € 930,00, a comissão de gestão anual cifra-se em € 330,00 e a comissão de prorrogação em € 105,00. Q)– Desde o dia 16/07/2014 até 24/03/2015 (data da apresentação da contestação), a utilização da quantia de € 18.000,00 da conta caucionada a que se alude em 25) venceu juros no montante de € 620,00, tendo sido debitados € 220,00 em comissões de gestão de conta e € 70,00 de comissão de prorrogação. R)– Os Réus terão que entregar à sociedade indicada em 25) as quantias que a mesma venha a suportar junto da entidade bancária a título de juros, comissão de gestão e comissão de prorrogação, por referência à quantia mencionada em 24). S)– Durante vários dias, os Réus VC e LC não pensavam noutra coisa senão no modo como iriam obter a quantia indicada em 24), receando não a conseguir obter ou obter em tempo útil, o que os deixou ansiosos e inseguros. T)– Durante pelo menos um mês os Réus VC e LC andaram nervosos, apreensivos e angustiados, tendo dificuldade em pensar noutras coisas que não fosse esta situação. U)– Pelo facto dos Autores terem ocultado informação aos Réus VC e LC, estes sentiram as suas expectativas defraudadas, sentindo-se enganados e atraiçoados, andavam tristes e apáticos, pouco ou nada conviviam com os amigos e quando estavam com amigos ou familiares só se falava no sucedido, tendo dificuldades em dormir, o que levou a que tivessem necessidade de tomar medicamentos naturais para os ajudar a adormecer. * 4.–Fundamentação de Direito: * 1)–Impugnação da matéria de facto: Alegam os recorrentes que devem ser alterados os pontos 10 e 11 dos factos provados e considerada como provada a factualidade que consta dada como não provada nas alíneas E) e F) dos factos não provados. Dispõe o artigo 640º, nº 1, do Código de Processo Civil que: «Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a)- Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b)- Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c)- A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas». No que toca à especificação dos meios probatórios, «quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes» (Artigo 640º, nº 2, al. a) do Código de Processo Civil). Quanto ao cumprimento deste ónus impugnatório, o mesmo deve, tendencialmente, fazer-se nos seguintes moldes: «(…) enquanto a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações, posto que estas não têm por função delimitar o objeto do recurso nessa parte, constituindo antes elementos de apoio à argumentação probatória.» (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19-02-2015, Processo 299/05.6TBMGD.P2.S1, relator TOMÉ GOMES). Aos concretos pontos de facto, concretos meios probatórios e à decisão deve o recorrente aludir na motivação do recurso (de forma mais desenvolvida), sintetizando-os nas conclusões. As exigências legais referidas têm uma dupla função: Delimitar o âmbito do recurso e tornar efectivo o exercício do contraditório pela parte contrária (pois só na medida em que se sabe especificamente o que se impugna, e qual a lógica de raciocínio expendido na valoração/conjugação deste ou daquele meio de prova, é que se habilita a contraparte a poder contrariá-lo). O recorrente deverá apresentar «um discurso argumentativo onde, em primeiro lugar, alinhe as provas, identificando-as, ou seja, localizando-as no processo e tratando-se de depoimentos a respectiva passagem e, em segundo lugar, produza uma análise crítica relativa a essas provas, mostrando minimamente por que razão se “impunha” a formação de uma convicção no sentido pretendido» (Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 17-03-2014, Processo nº 3785/11.5TBVFR.P1, relator ALBERTO RUÇO). Os aspectos de ordem formal devem ser modelados em função dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade (cfr. Ac. do STJ de 28-04-2014, P.º nº 1006/12.2TBPRD.P1.S1, relator ABRANTES GERALDES). Não cumprindo o recorrente os ónus do artigo 640º, nº 1 do C.P.C., dever-se-á rejeitar o seu recurso sobre a matéria de facto, uma vez que a lei não admite aqui despacho de aperfeiçoamento, ao contrário do que sucede quanto ao recurso em matéria de direito, face ao disposto no art. 639º, nº 3 do C.P.C. (cfr. Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães de 19-06-2014, P.º n.º 1458/10.5TBEPS.G1, relator MANUEL BARGADO). A cominação da rejeição do recurso, prevista para a falta das especificações quanto à matéria das alíneas a), b), e c) do n.º 1, ao contrário do que acontece quanto à matéria do n.º 2 do art. 640.º do CPC (a propósito da «exatidão das passagens da gravação em que se funda o seu recurso»), não funciona automaticamente, devendo o Tribunal convidar o recorrente a suprir a falta de especificação daqueles elementos ou a sua deficiente indicação (cfr. Ac. do STJ de 26-05-2015, P.º n.º 1426/08.7CSNT.L1.S1, relator HÉLDER ROQUE). Dever-se-á usar de maior rigor na apreciação da observância do ónus previsto no n.º 1 do art. 640.º (de delimitação do objecto do recuso e de fundamentação concludente do mesmo), face ao ónus do n.º 2 (destinado a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado pela Relação aos meios de prova gravados relevantes, que tem oscilado em exigência ao longo do tempo, indo desde a transcrição obrigatória dos depoimentos até uma mera indicação e localização exacta das passagens da gravação relevantes) (neste sentido, Ac. do STJ de 29-10-2015, P.º n.º 233/09.4TBVNG.G1.S1, relator LOPES DO REGO). O ónus atinente à indicação exacta das passagens relevantes dos depoimentos gravados deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, pelo que a falta de indicção, com exactidão, só será idónea a fundamentar a rejeição liminar se dificultar, de forma substancial e relevante, o exercício do contraditório, ou o exame pelo tribunal, sob pena de ser uma solução excessivamente formal, rigorosa e sem justificação razoável (cfr. Acs. do STJ, de 26-05-2015, P.º nº 1426/08.7CSNT.L1.S1, relator HÉLDER ROQUE, de 22-09-2015, P-º nº 29/12.6TBFAF.G1.S1, relator PINTO DE ALMEIDA, de 29-10-2015, P.º n.º 233/09.4TBVNG.G1.S1, relator LOPES DO REGO e de 19-01-2016, P.º nº 3316/10.4TBLRA-C1-S1, relator SEBASTIÃO PÓVOAS). A apresentação de transcrições globais dos depoimentos das testemunhas não satisfaz a exigência determinada pela al. a) do n.º 2 do art. 640.º do CPC (neste sentido, Ac. do STJ de 19-02-2015, P.º nº 405/09.1TMCBR.C1.S1, relatora MARIA DOS PRAZERES BELEZA), o mesmo sucedendo com o recorrente que procede a uma referência genérica aos depoimentos das testemunhas considerados relevantes pelo tribunal para a prova de quesitos, sem única alusão às passagens dos depoimentos de onde é depreendida a insuficiência dos mesmos para formar a convicção do juiz (cfr. Ac. do STJ de 28-05-2015, P.º n.º 460/11.4TVLSB.L1.S1, relator GRANJA DA FONSECA). Nas conclusões do recurso devem ser identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação, bastando quanto aos demais requisitos que constem de forma explícita da motivação (neste sentido, Acs. do STJ de 19-02-2015, P.º nº 299/05.6TBMGD.P2.S1, relator TOMÉ GOMES, de 01-10-2015, P.º nº 824/11.3TTLRS.L1.S1, relatora ANA LUÍSA GERALDES, de 11-02-2016, P.º nº 157/12-8TVGMR.G1.S1, relator MÁRIO BELO MORGADO). A insuficiência da fundamentação probatória do recorrente não releva como requisito formal do ónus de impugnação, mas, quando muito, como parâmetro da reapreciação da decisão de facto, na valoração das provas, exigindo maior ou menor grau de fundamentação, por parte do tribunal de recurso, consoante a densidade ou consistência daquela fundamentação (neste sentido, Ac. do STJ de 19-02-2015, P.º nº 299/05.6TBMGD.P2.S1, relator TOMÉ GOMES). Por seu turno, em termos substanciais, a impugnação da matéria de facto traduz-se no meio de sindicar a decisão que sobre ela proferiu a primeira instância, procurando-se que a Relação reaprecie e repondere os elementos probatórios produzidos, averiguando se a decisão da primeira instância relativa aos pontos de facto impugnados se mostra conforme às regras e princípios do direito probatório, impondo-se se proceda à apreciação não só da valia intrínseca de cada um dos elementos probatórios, da sua consistência e coerência, à luz das regras da normalidade e da experiência da vida, mas também da sua valia extrínseca, ou seja, da sua consistência e compatibilidade com os demais elementos. Como refere Abrantes Geraldes (Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, pág. 127): “Consistindo o processo jurisdicional num conjunto não arbitrário de actos jurídicos ordenados em função de determinados fins, as partes devem deduzir os meios necessários para fazer valer os seus direitos na altura/fase própria, sob pena de sofrerem as consequências da sua inactividade, numa lógica precisamente assente, em larga medida, na autorresponsabilidade das partes e, conexamente, num sistema de ónus, poderes, faculdades, deveres, cominações e preclusões”. Assim, ressalvadas as modificações que podem ser oficiosamente operadas relativamente a determinados factos cuja decisão esteja eivada de erro de direito, por violação de regras imperativas, à Relação não é exigido que, de motu proprio, se confronte com a generalidade dos meios de prova sujeitos a livre apreciação e valorados pelo tribunal de 1ª instância, para deles extrair, como se se tratasse de um novo julgamento, uma decisão inteiramente nova. Pelo contrário, as modificações a operar devem respeitar em primeiro lugar o que o recorrente, no exercício do seu direito de impugnação da decisão da matéria de facto, indicou nas respectivas alegações que servem para delimitar o objecto do recurso. Os meios probatórios têm por função a demonstração da realidade dos factos, sendo que, através da sua produção não se pretende criar no espírito do julgador uma certeza absoluta da realidade dos factos, o que, obviamente implica que a realização da justiça se tenha de bastar com um grau de probabilidade bastante, em face das circunstâncias do caso, das regras da experiência da comum e dos conhecimentos obtidos pela ciência. A prova não visa “(...) a certeza absoluta (a irrefragável exclusão da possibilidade de o facto não ter ocorrido ou ter ocorrido de modo diferente) (...)”, mas tão só, “(...) de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais à prática do Direito, criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto” (assim, Antunes Varela, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1984, págs. 419 e 420). A apreciação das provas resolve-se, assim, em formação de juízos, em elaboração de raciocínios, juízos e raciocínios estes que surgem no espírito do julgador “(...) segundo as aquisições que a experiência tenha acumulado na mentalidade do juiz segundo os processos psicológicos que presidem ao exercício da actividade intelectual, e portanto segundo as máximas de experiência e as regras da lógica (...)” (assim, Alberto dos Reis; Código de Processo Civil Anotado, vol. III, pág. 245). Nessa actividade de livre apreciação da prova deve o tribunal especificar os fundamentos que foram decisivos para a convicção adquirida (art. 653º, nº 2 do CPC), permitindo, dessa forma, que se “possa controlar a razoabilidade da convicção sobre o julgamento do facto como provado ou não provado” (cfr. Teixeira de Sousa; Estudos Sobre o Novo Processo Civil, p. 348) e exercer um controle externo e geral do fundamento de facto da decisão. Mas, não deverá esquecer-se que a função da Relação não é a de realizar um novo julgamento de facto: “Quando o Tribunal da Relação é chamado a pronunciar-se sobre a reapreciação da prova, no caso de se mostrarem gravados os depoimentos ou estando em causa a análise de meios prova reduzidos a escrito e constantes do processo, deve o mesmo considerar os meios de prova indicados pela partes e confrontá-los com outros meios de prova que se mostrem acessíveis, a fim de verificar se foi cometido ou não erro de apreciação que deva ser corrigido, seja no sentido de decidir em sentido oposto ou, num plano intermédio, alterar a decisão no sentido restritivo ou explicativo; Importa, porém, não esquecer que se mantêm-se em vigor os princípios de imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, pelo que o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados. Assim, em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira instância, em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 30-11-2017, Processo 1426/15.0T8BGC-A.G1, relator ANTÓNIO JOSÉ SAÚDE BARROCA PENHA). Estas as linhas gerais em que se baliza a reapreciação da matéria de facto na Relação. Vejamos os pontos invocados a este respeito pelos recorrentes. * a)- Se deve ser alterado o ponto 10 dos factos provados, aditando-lhe o seguinte: “Cartório Notarial de Lisboa perante a Notária Dra. AP” e se deve ser alterado o ponto 11 dos factos provados, aditando-lhe o seguinte: “no interior do Cartório Notarial de Lisboa da Dra. AP, mas sem o reconhecimento presencial das assinaturas”? Consideram os recorrentes, a respeito do ponto 10 dos factos provados, que “como se alcança do documento de fls. 79, o contrato de locação financeira foi outorgado no Cartório Notarial de Lisboa perante a Notária Dra. AP. Aliás, esse facto não é controverso entre as partes, sempre foi pacifico. Certamente por mero lapso a Mm.ª Juiz não fez constar que aquele documento foi assinado perante um notário com o reconhecimento presencial das assinaturas. Todavia, esse facto é de extrema importância (…)”. Por seu turno, a respeito do ponto 11 dos factos provados referem os recorrentes que “deveria a Mm.ª Juiz ter feito constar que esse mesmo documento de assunção de divida foi assinado no mesmo dia e no mesmo local que o mencionado no ponto 10), ou seja, no interior do Cartório Notarial de Lisboa da Dra. AP. Porém só mencionou que foi no mesmo dia e não no mesmo local. Facto este de extrema importância conforme abaixo se demonstrará atenta a solenidade dada a alguns actos e não a outros não obstante os intervenientes (Autores e Reús) se encontrarem, no mesmo momento e em conjunto, perante um Notário”. De acordo com o disposto no artigo 552.º do CPC, o autor deve expor os factos e as razões de direito que servem de fundamento à acção, como lógico antecedente da pretensão que pretende formular, o que constitui uma decorrência lógica do funcionamento do princípio do dispositivo, sendo sobre aquele que invoca a titularidade de um direito - autor - que recai o ónus de alegação dos factos de cuja prova seja possível concluir pela existência desse direito - art. 5.º, n.º 1, do CPC. Assim, não cabe ao Tribunal a função de recolha de factos com interesse para a resolução de qualquer litígio que seja incumbido de resolver (art. 5º, nº 3, CPC), embora tal não prejudique a atendibilidade de factos instrumentais advenientes da discussão da causa (art. 5º, nº2). Neste sentido, a narrativa em que se consubstancia a petição inicial há-de conter, pelo menos, os factos pertinentes à causa e que sejam indispensáveis para a solução que o Autor quer obter: os factos necessários e suficientes para justificar o pedido. É evidente que não é exigível que o autor faça uma exposição completa do elemento factual, mas não deixar de considerar-se que uma indicação de qualquer um dos elementos integradores da causa de pedir em termos genéricos pode importar uma individualização da causa de pedir que não constitui especificação suficiente do facto jurídico de que procede a pretensão e que leva à ineptidão da petição inicial. De harmonia com o disposto no artigo 5.º, nºs 1 e 2, als a), b) e c) do CPC, “às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas”, sendo que, além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz: os factos instrumentais que resultem da instrução da causa; os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciarem; os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções. Assim, podem ser considerados na decisão final os factos essenciais à procedência das pretensões formuladas ou das excepções deduzidas que sejam complemento ou concretização de outros que as partes hajam oportunamente alegado e resultem da instrução e discussão da causa, desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado o exercício do contraditório. O juiz pode assim, por sua iniciativa ou a requerimento da parte, coligir factos complementares ou concretizadores dos factos principais ou essenciais, ou seja, factos substanciadores da causa de pedir ou da excepção, havendo, contudo, de realçar-se que este poder inquisitório do juiz está limitado aos factos que sejam complemento ou concretização de outros, o que, obviamente, implica necessariamente que as partes tenham alegado satisfatoriamente nos articulados os factos que preenchem e integram os fundamentos da acção e da defesa. Ora, no caso, compulsada a petição inicial não se divisa na mesma qualquer referência ao local de outorga do documento de fls. 79 - contrato de locação financeira – no Cartório Notarial de Lisboa perante a Notária Dra. AP. E a mesma conclusão se retira perante a leitura dos demais articulados produzidos nos autos. O mesmo é, igualmente, de referir a respeito do documento referido no ponto 11 dos factos provados. Mas, os depoimentos invocados pelos recorrentes, designadamente o de CS, não permitem corroborar a conclusão pretendida no sentido da demonstração probatória que se pretende incluir nos factos provados em 10 e 11. Em particular, a mencionada CS, quanto a saber se houve documentos foram assinados na presença do notário ou não, apenas referiu – sem esclarecer de que documentos falava - o seguinte: “Estivemos todos numa sala a assinar papéis. Se quer que lhe diga, já foi também há algum tempo, não tenho todos os dados precisos de memória, mas estávamos todos numa sala a assinar papéis. Estavam também os representantes da CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS. Não me lembro bem os nomes, mas lembro-me de que estavam também representantes da CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS”. Por outro lado, ao contrário do invocado pelos recorrentes, não se vislumbra existir alguma pertinência para a apreciação da causa, na inclusão dos aludidos excertos, não se divisando a mesma da invocada diferente forma de conclusão dos documentos referenciados nos pontos 10 e 11 dos factos provados. Ora, “não se deverá proceder à reapreciação da matéria de facto quando os factos objecto de impugnação não forem susceptíveis, face às circunstância próprias do caso em apreciação, de ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe ser inútil, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processuais (arts. 2º, nº 1, 137º e 138º, todos do C.P.C.)” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 15-12-2016, Processo 86/14.0T8AMR.G1, relatora MARIA JOÃO MATOS). Improcede, pois, a alteração pretendida pelos recorrentes a respeito dos mencionados factos provados em 10 e 11. * b)- Se devem ser considerados como provados os pontos E) e F) (dados na sentença recorrida como não provados)? Invocam os recorrentes que a matéria de facto dos pontos E) e F) – que foi considerada como não provada – deve transitar para a matéria de facto provada. Resulta dos mencionados pontos E) e F) que não se provou que: “E) Os Réus tenham fixado como condições ao pagamento da quantia indicada em 8), que fosse apurado o valor adiantadamente pago pelos clientes, que seria a deduzir naquele montante, e que o valor que os Réus viessem a pagar pela aquisição do recheio seria também a deduzir naquele montante, o que os Autores aceitaram” e que: “F) Com a inclusão da palavra “até” no escrito referido em 11), as partes pretendiam deixar ilíquido o valor que os Réus iriam assumir por força da dedução ao assinalado montante do valor adiantadamente pago pelos clientes e do valor de aquisição do recheio do estabelecimento”. Consideram os recorrentes que os diversos meios de provam que especificam justificariam a inserção nos factos provados de tal factualidade. Vejamos. Desde logo, o alegado pelos recorrentes a respeito do documento de fls. 469, assim como, a interessante construção gramatical a respeito da palavra “até” ou a lucubração a respeito do reconhecimento/falta de reconhecimento de assinaturas sobre os documentos dos autos, também nada permite concluir, designadamente, que fossem claramente patente e notórias “as oscilações provocadas pelas incertezas que existiam em cada um daqueles momentos, e foi por isso mesmo que as partes pretenderam deixar ilíquida aquela quantia ao escreverem “até 30.000€”. Até porque se assim não fosse teriam escrito algo como “assume a quantia de 30.000€”, ou seja, não colocavam a palavra até”. Independentemente disso, certo é que, não demonstram tais elementos probatórios a verificação da concretas condições a que se alude na alínea E) dos factos não provados, nem qual tenha sido a razão da inserção da palavra “até” como mencionado na alínea F) dos factos não provados. Mas, o mesmo se diga relativamente ao conteúdo dos depoimentos referenciados pelos recorrentes. RB afirmou que havia uma “dúvida se o IEFP seria ou não credor particularmente privilegiado relativamente ao recheio”, mas daí não se pode concluir, ipso facto – ao contrário do que fazem os recorrentes (“… existia uma dúvida em saber se o IEFP tinha uma reserva de propriedade sobre aqueles bens, pois que, os mesmos terão sido adquiridos pelos AA. com recurso a financiamento daquela instituição. Ora, existia uma dúvida sobre a legitimidade e/ou privilégio que o IEFP poderia ter quanto àqueles bens… facto esse que era do conhecimento dos AA. recorridos e dos RR. recorrentes, daí que, também por esse motivo tenham deixado em aberto o documento de assunção de divida de fls. 10 com o uso da expressão “até 30.000€””) – de que tal comprova a existência das invocadas “condições” no negócio de assunção de dívida. Considerando o depoimento do mencionado RB verifica-se plenamente acertada a conclusão – constante da motivação da decisão de facto da sentença recorrida - de que o mesmo não revelou “conhecer em pormenor os contornos do negócio sob apreço, em termos de permitir um cabal esclarecimento dos factos”. Relativamente aos depoimentos de NS, HA e PM entendem os recorrentes que ocorreu um erro notório do Tribunal na apreciação de tais meios de prova, designadamente por o Tribunal ter mencionado que só as duas primeiras testemunhas mencionaram ter conhecimento das “variáveis” do negócio que culminou com a subscrição do documento denominado de “assunção de dívida”. Ora, desde logo se diga que estamos a abordar matéria que não logrou ficar demonstrada na perspectiva do Tribunal, por ausência de prova suficiente para o efeito e por não se ter o tribunal fiado na credibilidade das declarações que presenciou, ponderando também as regras de distribuição do ónus da prova. Como se refere na decisão recorrida: “a matéria de facto não provada foi assim considerada pelas razões já acima assinaladas, ponderando designadamente a falta de credibilidade dos depoimentos a que supra se aludiu e, bem assim, a ausência de prova capaz de suportar semelhante factualidade, tendo em vista as regras de distribuição do ónus da prova, sendo certo que competia aos Réus provar que o escrito de fls. 10 tinha um sentido distinto (ou mais abrangente) do que aquele que resultava do seu teor literal. Refira-se, ainda a este nível, que a certidão judicial de fls. 160 a 165 apenas documenta a prévia existência de um PER, não permitindo suportar a convicção de que os Autores transmitiram aos Réus que o mesmo ainda se encontrava pendente quando encetaram negociações, e que a factualidade descrita sob G) resulta contraditória e pouco consistente em si mesma, posto que o imóvel veio a ser adquirido por valor ligeiramente superior a € 400.000,00, conforme documenta o contrato de locação financeira de fls. 79 a 85, sendo que, ainda que viesse a lograr provada a versão dos Réus (o que, como se referiu, não ocorreu), do documento de fls. 10 resulta claramente ultrapassado o indicado “tecto” máximo”. Mas, para além disso, “na impugnação da matéria de facto, ao recorrente não basta fazer uma apreciação geral de toda a prova, fazendo dela a sua interpretação e tirar a conclusão de que todos os factos impugnados devem ser dados como provados na forma por si apontada. (…) [E]sta não é manifestamente a forma de alterar a matéria de facto, pela via da impugnação ampla, ou seja com base em erro de julgamento, em que na reapreciação da concreta prova se vai constatar se a testemunha disse ou não o que foi vertido na sentença, que não tem a ver com a valoração que o tribunal dá ao depoimento. Quando a atribuição de credibilidade ou falta de credibilidade a uma fonte de prova pelo julgador se basear em opção assente na imediação e na oralidade, o tribunal de recurso só a poderá criticar se ficar demonstrado que essa opção não tem uma justificação lógica e é inadmissível face às regras da experiência comum. Não se verifica o vício do erro quando o tribunal, face às versões contraditórias, justifica devidamente a sua opção” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 13-09-2017, Processo 390/14.8PCLRA.C1, relator INÁCIO MONTEIRO). Ora, ouvido e reapreciado o depoimento de PM dele não se retira a conclusão almejada pelos recorrentes sobre as “variáveis” do negócio: O que a testemunha menciona – depois de ter detidamente explicado o vínculo que tinha com a CLF (do grupo económico da CGD), numa fase em que o contrato entre a Happy M… e a CLF se encontraria em incumprimento, depois da formalização da cessão da posição contratual da Happy M… para os M… M… - é que, numa reunião na CGD onde se começou a discutir como se iriam financiar os tais ditos € 30.000,00, não seria um valor certo, mas haveria ali questões a fixar entre as partes…”Não sei se a compra do equipamento…se era da Happy M..., ou se era dos sócios…isso depois na altura não ficou bem definido…entre eles não se fixou um valor determinado. Houve um conjunto de circunstâncias…Ok. A CGD estaria disponível para financiar até 30.000 €….mas nessa altura não ficou fixado…vamos lá a ver…havia um valor referência, um topo, 30 000,00 €. Agora se era 25, se era 28, se era 24, se era 10, se era 9, esse valor não se sabia…”; “É assim: Na altura também se falou que teria de se apurar exactamente na contabilidade…Porque isso já nas negociações, na fase inicial ainda com o Happy M… Lembro-me perfeitamente que os seus representantes falavam, para além de fechar uma escola com os alunos…, havia alguns pais…, eles sempre mencionaram isso…, que todos os pais que tinham lá as crianças sabiam da situação em que estava a Happy M… e da possibilidade de a Happy M…, de um dia para o outro, ter de fechar as instalações. Mas sempre uma das circunstâncias que, tanto uns como depois já as partes todas, os intervenientes todos…, porque havia lá alguns pais que já teriam pago a mensalidade, a anuidade total, e que esse valor poderia, quando apurado, ser deduzido. Basicamente seriam essas duas questões que estariam em aberto…mas qual foi o acordo entre as partes, isso não sei!”. Destas singelas afirmações, da forma dubitativa e imprecisa, aliás, confluindo na afirmação final, de que não soube a testemunha qual o acordo firmado entre as partes, pode-se inferir, com a necessária e suficiente consistência, qual a determinação das condições de pagamento da quantia de € 30.000,00 que os autos pretendiam receber dos réus pela sua intervenção no negócio? Resulta deste depoimento se a tal valor de € 30.000,00 haveria que apurar o valor pago por clientes e o da aquisição do recheio do colégio? Resultam deste depoimento qual o motivo da inserção no documento de assunção de dívida da palavra “até”? A todas estas questões a conclusão que se retira do aludido depoimento de PM é, como aquela a que se alcançou no tribunal recorrido, negativa. Não se vislumbra, pois, qualquer erro de apreciação da prova. Tal erro ou lapso também não deriva da motivação de facto da sentença recorrida, ao contrário do que pugnam os recorrentes. Na realidade, o que se escreveu na sentença recorrida foi, tão-só, que as testemunhas NS e HA foram as “únicas testemunhas que sustentaram ter conhecimento das “variáveis” a que os Réus referem ter ficado subordinado o pagamento dos valores a que se reporta o escrito constante de fls. 10 (…)”. Ora, não foi, manifestamente, afirmado por Paulo Marques ter algum efectivo conhecimento sobre as aludidas “variáveis”. Como se viu, o mencionado PM referiu expressamente desconhecer quais foram as condicionantes do negócio de assunção de dívida celebrado entre as partes, sendo que, aliás, na parte final do mesmo depoimento, respondendo a questões do Tribunal, o mesmo foi também claro em salientar que, na mencionada reunião, “na altura foi-nos apresentado um documento assinado por eles a fixar… ou a determinar o valor máximo de 30.000€” (daqui se inferindo já estar celebrado e concluído o negócio entre os outorgantes da mencionada assunção de dívida). Relativamente aos depoimentos de NS e HA a conclusão alcançada pelo Tribunal também não merece qualquer censura, não se mostrando ter existido qualquer erro na apreciação de tais meios de prova, sendo que, ao contrário do que alegam os recorrentes, não ocorreu omissão de valoração de tais testemunhos: os mesmos não permitiram foi ao Tribunal formar positiva convicção sobre a “realidade” que asseveraram. Consta elucidativamente da decisão recorrida: “as testemunhas NS, amigo dos Réus VC e LC, sendo ainda sócio do primeiro noutras sociedades, e HA, que foi até meados de 2014 funcionário de um grupo de empresas que integra a Ré “M… M…”, únicas testemunhas que sustentaram ter conhecimento das “variáveis” a que os Réus referem ter ficado subordinado o pagamento dos valores a que se reporta o escrito constante de fls. 10, não obstante a segurança que procuraram imprimir aos respectivos depoimentos, não lograram convencer o Tribunal do seu efectivo conhecimento relativamente a esses factos. Desde logo, a imagem de ingenuidade que a testemunha NS procurou passar do Réu VC, para justificar a alegada atenção com que seguiu as reuniões havidas entre as partes no escritório onde trabalhava (as quais, note-se, estariam a ter lugar numa outra sala), revela-se pouco consistente. Com efeito, o Réu VC, além de antigo funcionário bancário, como esclareceu a testemunha PM, funcionário do mesmo grupo, é um empresário, sendo, aliás, sócio de NS em várias empresas, como o próprio referiu, pelo que será alguém habituado aos meandros dos negócios, de tal modo que dispunha de uma estrutura organizativa de apoio, na qual se integrava desde logo a testemunha HA, à data financeiro do grupo. Acresce que nenhum dos Réus tinha qualquer relação prévia com os Autores que justificasse que depositassem nos mesmos um acrescido grau de confiança, obliterando as cautelas que um negócio com as características e importância do vertente impunham. Ora, neste contexto não faz qualquer sentido que os Réus, para mais quando confrontados com os alertas que as referidas testemunhas sustentaram ter-lhes dirigido relativamente aos termos do negócio, e sendo certo que dispunham de uma estrutura organizativa de apoio, incluindo ao nível jurídico (tendo-se revelado, neste circunspecto, credíveis as declarações da Autora, no sentido de que o negócio foi sempre acompanhado por advogados de ambas as partes, o que é compatível quer com a sua importância, quer com a referida estrutura organizativa de que os Réus, como se referiu, dispunham), não tenham tido o cuidado de se salvaguardar de modo efectivo, deixando plasmado de modo expresso no escrito de fls. 10, o teor das condições aludidas, bastando-se com a inclusão da palavra “até € 30.000,00” para suportar a subordinação a semelhante condicionalismo. De resto, ademais do referido acompanhar de uma reunião entre Autores e Réus a partir de outra sala, de que, pelas razões assinaladas, o Tribunal não ficou minimamente persuadido (estranhando-se, aliás, o excessivo grau de segurança com que a testemunha relatou tal factualidade, atenta a posição em que se encontrava, seja fisicamente, seja em relação ao negócio, a que era totalmente alheio), a testemunha NS estribou o seu conhecimento tão só no que alegadamente ouviu dizer ao Réu VC, depoimento indirecto que, neste circunstancialismo, merece as maiores reservas, e em opiniões pessoais, sem efectivo suporte factual. De resto, também a testemunha HA revelou um conhecimento meramente indirecto dos factos, proveniente unicamente do alegadamente transmitido pelos Réus, o que é de todo insuficiente para sustentar uma convicção minimamente segura relativamente a semelhante factualidade. Sob outra perspectiva, ainda a este nível, não pode deixar de atentar-se na flutuação da versão dos Réus que perpassa a própria contestação, a retirar consistência à mesma. Com efeito, os Réus tanto alegam que os Autores sempre lhes transmitiram que poderiam transaccionar tudo com excepção das instalações, designadamente os bens móveis, motivo pelo qual foi com surpresa que se depararam com o anúncio de venda de tais bens no âmbito da insolvência, tendo-se sentido enganados (o que alicerça, aliás, parcialmente o pedido reconvencional que aduzem), como sustentam que a expressão “até € 30.000,00” foi incluída no escrito de fls. 10 para permitir abater o valor pelo qual viesse a ser realizada tal aquisição ao montante então assumido. Ademais nem mesmo se afigura consistente a alegação dos Réus de que assinaram o documento de fls. 10 por estarem convictos de que os Autores poderiam alienar os mencionados bens móveis, pois que não só já haviam apresentado uma proposta tendente à sua aquisição ao Sr. Administrador da Insolvência, como resulta de fls. 469, como este último se encontrava presente na data da assinatura de tal documento, conforme se extrai sem margem para dúvidas da documentação de fls. 190 a 193, que consubstancia o auto de restituição da posse do imóvel, em que aquele também interveio. Donde, pelo menos naquele momento poderiam os Réus inteirar-se cabalmente da efectiva situação de tais bens, pelo que não é minimamente crível que tenham assinado tal documento em erro quanto à mesma. Mais, se a mencionada expressão visou também salvaguardar o valor dos adiantamentos feitos por clientes, como também sustentam, qual a razão para terem ficado “boquiabertos” quando o Autor marido transmitiu aos pais dos alunos que não tinham que se preocupar com os valores antecipadamente pagos por estes? De outra banda, os próprios Réus assumem que lhes havia sido disponibilizado o balancete da sociedade “Happy M…”, que reflectia a existência de adiantamentos de clientes, sob a conta 218, pagamentos anuais a que a Autora faz igualmente alusão no e-mail de fls. 90, remetido, de acordo com os Réus, antes da formalização dos acordos em apreço, pelo que, também por esse motivo, e atenta desde logo a experiência profissional do Réu marido, resulta pouco plausível que o pretenso abatimento de tal montante não ficasse expresso no documento de fls. 10 caso existisse um efectivo acordo das partes nesse sentido. E se é assim quanto aos pagamentos anuais, mais o será quanto aos pagamentos daquele próprio mês Fevereiro, já em curso, pelo que seria normal que as mensalidades respectivas já se encontrassem, pelo menos parcialmente, pagas. Por assim ser, é ainda menos consistente que as partes pretendessem abater ao indicado montante de € 30.000,00 também as mensalidades daquele próprio mês, que os Réus igualmente computam no valor atinente aos pagamentos antecipados que indicam e pretendem que seja objecto de abatimento. Acresce que é um dado incontornável do senso comum que a clientela tem um valor económico em si mesmo, que, em princípio, não se esgota naquele ano lectivo, antes se protela no tempo, nisso mesmo residindo o seu valor intrínseco, o que justifica que o interesse dos Réus não se cingisse às instalações e aos bens móveis que compunham o estabelecimento, os quais, efectivamente, poderiam ter adquirido sem a colaboração dos Autores, ao contrário do que sucede com aquela, para cuja manutenção ou transferência tal colaboração se revelaria essencial, permitindo transmitir aos utentes do estabelecimento uma ideia de confiança e continuidade, com vista à sua fidelização. Ora, a versão dos Réus, secundada pelas indicadas testemunhas NS e HA, oblitera por completo, e de modo pouco plausível, o valor de tal clientela, que os mesmos, atenta a actividade exercida, não desconsiderariam, pois que só assim se justifica que tenham encetado negociações com os próprios Autores (quando poderiam ter-se limitado a negociar com a financeira proprietária do imóvel e com o Sr. Administrador da Insolvência), tendo ainda subscrito o documento de fls. 10. Refira-se ainda que os depoimentos das testemunhas AC, funcionária da “Happy M…” que transitou para a “M… M…”, da qual ainda é funcionária, e CR, funcionária da sociedade Ré, em nada permitem afastar o que se deixou dito, pois que não só se revelaram pouco concretizados, como denotaram um reduzido conhecimento dos factos sob apreço, em particular dos termos do negócio realizado entre as partes, limitando-se a referir terem assistido a conversas, posteriores à assinatura do escrito de fls. 10: a primeira uma conversa presencial entre os Autores e os Réus VC e LC, e a segunda uma conversa telefónica entre a Autora e a Ré mulher, atinentes à questão dos valores adiantadamente pagos pelos utentes do estabelecimento, sem que do que conseguiram transmitir dessas conversas seja possível extrair qualquer facto, ainda que meramente indiciário, que corrobore a existência de um acordo com contornos alegados pelos Réus. É que, como se referiu, que existiam valores adiantadamente pagos por clientes é um dado incontestável e que os Réus conheciam, de tal modo que se encontrava reflectido, ainda que sem exactidão ou rigor no que tange ao respectivo valor, no balancete de fls. 72 a 78, a que os mesmos tiveram acesso, sendo ainda mencionado no e-mail de fls. 90, remetido em momento anterior à assinatura do escrito de fls. 10. Por outro lado, a testemunha CR, administrativa da sociedade Ré, a desempenhar funções no departamento financeiro, se bem que tenha confirmado a existência do empréstimo documentado a fls. 131 e 133, efectuado por outra empresa do grupo à sociedade Ré, revelou desconhecer os custos efectivos de tal operação, de que não foi apresentada qualquer prova. Idêntica ausência de prova se detectou, aliás, quanto à alegada ausência de capitais próprios por parte da sociedade Ré para pagamento dos valores atinentes à aquisição dos bens móveis, posto que o extracto bancário apresentado apenas permite concluir que naquela conta (que se desconhece se era ou não a única de que a sociedade Ré era titular) não existia saldo suficiente para esse efeito. Ora, nem o depoimento da testemunha CR nem o facto da sociedade Ré se ter socorrido de um empréstimo de outra empresa do grupo são bastantes para concluir com um mínimo de segurança nesse sentido, uma vez que tal operação bem pode ter decorrido de uma mera opção financeira, de gestão, o que se desconhece. Já a testemunha AG, amiga dos Réus LC e VC desde há vários, que depôs quanto às alegadas repercussões que a situação vertente teve nos mesmos, a título pessoal, prestou um depoimento parcial e nada consistente, suscitando sérias reservas quanto ao conhecimento que tinha da situação vertente, do que é paradigmática a referência à circunstância da Ré mulher ter ficado particularmente abalada por ver colocado em causa o seu sonho de ter um “colégio”, quando da própria contestação resulta que os Réus, à data em que se concretizou o negócio vertente, já exploravam um outro estabelecimento de idênticas características. Aliás, a própria testemunha assume que apenas esporadicamente contactava com os Réus, revelando desconhecer em concreto quais os contornos dos negócios por estes celebrados, limitando-se a fazer alusões vagas, desconexas e pouco concretizadas, que, por isso, não lograram convencer o Tribunal. Isto posto, temos que apenas os depoimentos das testemunhas PM, funcionário da Caixa Geral de Depósitos, e RB, administrador da insolvência da sociedade “Happy M…”, mereceram valoração positiva, os quais, não obstante tenham revelado um conhecimento meramente parcelar dos factos e, de algum modo, já esbatido pelo decurso do tempo, a conduzir a um natural enfraquecimento da memória [posto que não se tratam de factos que directamente lhes digam respeito e com as quais apenas contactaram no âmbito das respectivas funções], prestaram depoimentos que, evidenciando distanciamento relativamente aos interesses das partes, mereceram a confiança do Tribunal. Sucede que nenhuma das referidas testemunhas revelou conhecer em pormenor os contornos do negócio sob apreço, em termos de permitir um cabal esclarecimento dos factos. Neste circunstancialismo, assumiu-se, pois, como particularmente relevante para a formação da convicção do Tribunal a prova documental pré-constituída constante dos autos, intercruzada entre si, bem como a ponderação da posição expressa pelas partes nos respectivos articulados. Concretizando (…): - a matéria de facto a que se alude sob o ponto 5) resultou da ponderação do teor do e-mail de fls. 67, documento que não foi impugnado e do qual é possível extrair que a essa data já estavam em curso as negociações vertentes, resultando ademais dos actos praticados (contrato de locação financeira imobiliária, de fls. 79 a 85, e compra dos bens móveis no processo de insolvência da sociedade, documentada de fls. 127 a 129) que os Réus pretendiam adquirir não apenas o imóvel onde se encontrava instalado o estabelecimento explorado pela sociedade “Happy M…”, mas o próprio estabelecimento em si mesmo, integrado designadamente pelos bens móveis e pela respectiva carteira de clientes, o que justifica que, em anexo ao mencionado e-mail, tenham sido remetidos não só o “plano de negócios” acima indicado, como o balancete da sociedade, de fls. 72 a 78. Acresce que a inclusão da carteira de clientes no negócio em apreço é assumida de forma uníssona pelas partes nos respectivos articulados, de tal modo que, conforme documentam os e-mails de fls. 90 a 97, os clientes da sociedade “Happy M…” transitaram para a sociedade “ M… M…” após a outorga dos escritos a que se alude sob os pontos 10) e 11) da matéria de facto provada, o que, aliás, justificou a realização de uma reunião de apresentação desta nova sociedade aos pais das crianças que frequentavam o estabelecimento àquela data, com os antigos e os novos sócios (cfr. e-mail de fls. 93), como esclareceu, neste particular de modo espontâneo e seguro, a testemunha AC, funcionária do estabelecimento já àquela data; - a factualidade a que se reporta o ponto 6) da matéria de facto provada é consonante com o teor da certidão judicial extraída dos autos de insolvência da sociedade “ Happy M…” de fls. 170 a 177 e decorre das próprias regras da normalidade social e da experiência comum, posto que só isso justifica que os Réus tenham encetado negociações com os Autores, nos termos documentados nos e-mails acima aludidos. De resto, nas declarações que prestou, a Autora CS assumiu ter gerido o mesmo até 7 de Fevereiro, sustentando, de resto, que o escrito de fls. 10 visou compensar tal facto. Donde, apesar da pendência do processo de insolvência, a justificar que esta gestão fosse uma gestão corrente e sujeita a controlo externo, não teve o Tribunal dúvidas em considerar semelhante factualidade provada; - a matéria de facto descrita em 7) extrai-se da própria circunstância da sociedade Ré ter vindo a adquirir o imóvel em apreço a esta entidade, negócio que se concretizou na mesma data da assinatura do documento de fls. 10, conforme documenta o contrato de fls. 79 a 85, em que igualmente se estriba a prova da factualidade descrita em 10); - a prova da factualidade a que reporta o ponto 8) resulta do teor do próprio escrito de fls. 10, justificando a sua outorga por ambas as partes. Acresce que Autores e Réus assumem que a transmissão da carteira de clientes se encontrava contemplada no negócio, centrando-se a divergência tão só na inclusão dos bens móveis e na existência de acordo no sentido do abatimento dos valores indicados pelos Réus; - a matéria de facto descrita em 9) resultou provada com base no teor do e-mail de fls. 67, integrado por fls. 72 a 78, o qual não foi impugnado (…); Por contraponto, a matéria de facto não provada foi assim considerada pelas razões já acima assinaladas, ponderando designadamente a falta de credibilidade dos depoimentos a que supra se aludiu e, bem assim, a ausência de prova capaz de suportar semelhante factualidade, tendo em vista as regras de distribuição do ónus da prova, sendo certo que competia aos Réus provar que o escrito de fls. 10 tinha um sentido distinto (ou mais abrangente) do que aquele que resultava do seu teor literal. Refira-se, ainda a este nível, que a certidão judicial de fls. 160 a 165 apenas documenta a prévia existência de um PER, não permitindo suportar a convicção de que os Autores transmitiram aos Réus que o mesmo ainda se encontrava pendente quando encetaram negociações, e que a factualidade descrita sob G) resulta contraditória e pouco consistente em si mesma, posto que o imóvel veio a ser adquirido por valor ligeiramente superior a € 400.000,00, conforme documenta o contrato de locação financeira de fls. 79 a 85, sendo que, ainda que viesse a lograr provada a versão dos Réus (o que, como se referiu, não ocorreu), do documento de fls. 10 resulta claramente ultrapassado o indicado “tecto” máximo (…)”. Perante esta motivação – com particular enfoque para os trechos acima sublinhados - vê-se de forma, clara e transparente, qual o iter lógico desenvolvido pelo Tribunal, expresso de forma coerente, objectivo e detalhado, pontuado com pertinentes referências resultantes de regras de experiência e concluindo, em particular, quanto às testemunhas referenciadas pelos recorrentes – NS e HA – que, o primeiro revela um conhecimento no que ouviu dizer ao réu VC, o que mereceu, no seu circunstancialismo, as maiores reservas (por exemplo, aludiu a que, em sala contígua a reunião tida entre as partes, assistiu ao negócio celebrado, mas acabando por referir que percebeu que “…30.000€ pelo valor do infantário, que não seriam pagos à entidade, mas pelo assumir de uma dívida que existia…”, revelando claro desconhecimento sobre os precisos contornos do negócio de assunção de dívida) e em opiniões pessoais, sem efectivo suporte factual, enquanto que, o segundo, revelou um testemunho indirecto dos factos, proveniente unicamente do alegadamente transmitido pelos Réus, factos que determinaram a insuficiência da sustentação de uma convicção minimamente segura. Tudo visto, inexiste motivo para a alteração pretendida a respeito da factualidade vertida nas alíneas E) e F). * 2)– Se a sentença é nula nos termos do artigo 615º, nº 1, als. d) e e) do CPC? Alegam os recorrentes que na petição inicial vieram os autores, recorridos, peticionar o seguinte: “Serem os RR. condenados a pagar todos os juros vencidos, acrescidos de juros vincendos até efectivo e integral pagamento”, mas na sentença condenaram-se os recorrentes a: “ (…) e dos juros vencidos a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A. após 31 de Julho de 2014, sobre aquele montante” e que, no documento de assunção de divida não é feita qualquer menção aos juros, daí que a sentença tenha extravasado o pedido dos autores recorridos, estamos perante uma condenação ultra petitum, sendo que, nos termos do disposto no art.º 609 n.º 1 do CPC, o tribunal está impedido de condenar em quantia superior ou em objecto diverso do que for pedido, pelo que, a sentença é nula (art. 615.º n.º 1, alíneas d) e e), do CPC). Vejamos se ocorrem as nulidades arguidas. Nos termos do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, relativo às causas de nulidade da sentença uma sentença é nula quando: a)- Não contenha a assinatura do juiz; b)- Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c)- Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d)- O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e)- O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido. Vejamos se o Tribunal se pronunciou indevidamente sobre uma questão de que não podia tomar conhecimento ou se condenou em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido. Importa referir que é «frequente a enunciação nas alegações de recurso de nulidades da sentença, numa tendência que se instalou e que a racionalidade não consegue explicar, desviando-se do verdadeiro objecto do recurso que deve ser centrado nos aspectos de ordem substancial. Com não menos frequência a arguição de nulidades da sentença acaba por ser indeferida, e com toda a justeza, dado que é corrente confundir-se o inconformismo quanto ao teor da sentença com algum dos vícios que determinam tais nulidades», (assim, Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, pág. 132). “A nulidade referida no artº 615º nº 1, al. d) do Código de Processo Civil ocorre quando o Juiz, na Sentença, não resolve todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Além disso, o Juiz não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 09-07-2014, Processo 1021/09.3 T2AMD.L1-1, relator PEDRO BRIGHTON). Por seu turno, “a decisão que ultrapassa o pedido formulado, sem modificação objectiva da instância, passando a abranger matéria distinta, está eivada de nulidade prevista na consignada alínea e) do art.º 615º do Código de Processo Civil. A nulidade do acórdão quando o Tribunal condene em objecto diverso do pedido colhe o seu fundamento no princípio dispositivo que atribui às partes, a iniciativa e o impulso processual, e no princípio do contraditório, segundo o qual o Tribunal não pode resolver o conflito de interesses, que a demanda pressupõe, sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja chamada para se opor” (assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21-03-2019, Processo 2827/14.7T8LSB.L1.S1, relator OLIVEIRA ABREU). No caso em apreço, como consta da petição inicial, os autores demandam os réus pedindo, em particular: “1.- Serem os RR. condenados ao pagamento dos valores em dívida resultantes do Contrato de abertura de crédito em conta corrente Nº PT 003………….2 celebrado entre a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS S.A. e a HAPPY M…, ENSINO, EDUCAÇÃO, LAZER, LDA, até ao montante de 30.000€. 2.- Serem os RR. condenados a pagar todos os juros vencidos, acrescidos dos juros vincendos até efectivo e integral pagamento”. No dispositivo da sentença consta: “A)- CONDENO os Réus “M… M… – Berçário, Creche e ATL, Lda.”, VC e LC no pagamento dos valores em dívida resultantes do contrato de abertura de crédito em conta corrente Nº PT 003………….2 celebrado entre a Caixa Geral de Depósitos S.A. e a “Happy M…, Ensino, Educação, Lazer, Lda.”, até ao montante de € 30.000,00 (trinta mil euros), e dos juros vencidos a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A. após 31 de Julho de 2014, sobre aquele montante; B)- ABSOLVO os Reconvindos CS e MN do pedido reconvencional contra si formulado pelos Reconvintes “M… M… – Berçário, Creche e ATL, Lda.”, VC e LC”. Na fundamentação da sentença recorrida lê-se a propósito da resolução da questão em apreço, o seguinte: “No caso vertente, o documento identificado em 11) foi subscrito por Autores e Réus sem qualquer intervenção do credor da dívida, a Caixa Geral de Depósitos, não havendo notícia de qualquer ratificação posterior. Daí que nenhuma obrigação seja assumida pelos ora Réus perante o credor daquela dívida, mas tão só perante os primitivos devedores, entre os quais avultam os aqui Autores. (…) No caso de que ora cuidamos, como se referiu, da factualidade apurada nos autos em momento algum se retira a existência de qualquer envolvimento do credor Caixa Geral de Depósitos, S.A. no negócio gizado pelas partes, surgindo pois aquele credor assim como absolutamente alheio ao mesmo. (…) Configurando assim o acordo alcançado entre as partes uma promessa liberatória, apenas aos promissários, aqui Autores, é lícito exigir o seu cumprimento, conforme decorre do disposto no artigo 444.º, n.º 3 do Código Civil. É que, como se refere no Ac. do STJ de 1/07/2004 (proc. n.º 04B1845, acessível em www.dgsi.pt), com pertinência para a hipótese de que ora cuidamos, “(…) o promissário deverá ter-se como credor até ao momento de adesão do terceiro, podendo, até esse "momentum" agir contra o promitente para o obrigar a cumprir em benefício desse terceiro, assim actuando no seu próprio interesse, que é o de (na circunstância) assegurar o cumprimento a favor do terceiro. Pelo que disporá assim o promissário - até ao momento da adesão - de meios coercitivos, como seja o de exigir o cumprimento da obrigação para com o terceiro (cfr. Diogo Leite Campos, in ob. cit., pág 89). Seja como for, a hipótese vertente encontra-se precisamente contemplada na ressalva do nº. 3 do art. 444º do Cód. Civil, pelo que só ao promissário (que não já a terceiro) assiste o direito de exigir o cumprimento da promessa (…). Donde, tendo resultado provado que, mediante prévio acordo negocial os ora Réus assumiram perante os Autores (e, bem assim, a sociedade “Happy M…”) a obrigação (individual e solidária) de exonerar os mesmos do pagamento da dívida resultante do Contrato de abertura de crédito em conta corrente N.º PT 003………….2 celebrado entre a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS S.A. e a HAPPY M…, ENSINO, EDUCAÇÃO, LAZER, LDA, até ao montante de € 30.000, é para nós inequívoco que, à luz do disposto no artigo 444.º, n.º 3 do Código Civil, assiste a estes últimos de exigirem dos primeiros o cumprimento do contrato, no que se refere à prestação em benefício de terceiro”(…). Peticionam ainda os Autores a condenação dos Réus nos juros vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento. Perante a factualidade dada como provada, os Réus incorreram em incumprimento temporário, por não terem cumprido atempadamente a obrigação assumida, mas apesar disso, ela não se tornou impossível, nem tão pouco deixou de ter interesse para os Autores. Como princípio geral subjacente a qualquer situação de inadimplência, dispõe o artigo 798.º do Código Civil “o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor”. Versando o caso em apreço sobre uma situação de simples atraso no cumprimento da obrigação, de acordo com o preceituado no artigo 804.º, n.º 1 do Código Civil, o Réu encontra-se constituído na obrigação de reparar os danos causados ao Autor. Sendo a obrigação em referência uma obrigação pecuniária, a indemnização corresponde aos juros de mora. Assim, os juros moratórios são devidos desde o dia da constituição em mora (cfr. artigo 806.º, n.º1 do Código Civil). Relativamente ao momento da constituição em mora, rege o artigo 805.º do Código Civil, que estabelece no seu n.º 1 que o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir, prevenindo o n.º 2 as situações em que a constituição em mora é independente de interpelação. No caso vertente, verifica-se que no documento constitutivo da obrigação, indicado em 11), as partes não fixaram qualquer prazo para cumprimento. Provou-se, porém, que no dia 16 de Julho de 2014 os Autores remeteram carta a interpelar os Réus para cumprirem a obrigação assumida por via daquele documento no prazo de uma semana. Esta declaração tornou-se eficaz no momento em que chegou ao conhecimento dos destinatários, nos termos do disposto no artigo 224.º, n.º 1 do Código Civil. Ora, não obstante os Autores não tenham alegado a data em que a mencionada carta foi recepcionada pelos Réus, resulta da factualidade descrita em 13) que tal ocorreu em data anterior a 25 de Julho de 2014, pelo que, considerando que por via daquele escrito lhes era concedido o prazo de uma semana para cumprimento da obrigação, pode concluir-se com segurança que o prazo para cumprimento terminou no limite no dia 31 de Julho de 2014, data a partir da qual os Réus se constituíram em mora. Assim, devem os Réus ser ainda condenados no pagamento dos juros que a dívida que se comprometeram a pagar venceu a favor do credor Caixa Geral de Depósitos, S.A. após a referida data de 31 de Julho de 2014, ou seja, computados sobre a quantia em dívida, até ao montante de € 30.000,00, por ter sido esse o prejuízo a que a sua conduta relapsa deu lugar”. Ou seja: Pelo trecho ora referido da fundamentação da sentença percebe-se, claramente, qual foi o sentido do decidido, a saber: A condenação reporta-se à pessoa dos réus, não tendo sido os réus condenados a pagar juros à Caixa Geral de Depósitos, S.A., tanto mais que, como se viu, o acordo firmado não a vincula, nem foi pela mesma ratificado, mas é atinente aos juros da dívida que estes se comprometeram a pagar e que beneficiou, em primeira linha, enquanto credor, a Caixa Geral de Depósitos, S.A. e sobre os quais o incumprimento dos réus, fez sobre eles recair a respectiva responsabilização quanto ao seu pagamento. Não se mostra, pois, qualquer condenação em pedido diverso ao formulado, nem o mesmo o foi em quantidade superior à pretendida. Do mesmo modo, dúvidas não há que, atenta a pretensão formulada, ao Tribunal cabia decidir, como o fez, relativamente à questão dos juros. A sentença recorrida não padece, pois, das nulidades que contra ela foram invocadas. * 3)– Se deve ser alterada a decisão de mérito? Consideram, por fim, os recorrentes que a sentença recorrida fez uma errada aplicação do Direito aos factos. Desde já se diga que, mantendo-se inalterada a factualidade provada, necessariamente improcedem as questões suscitadas pelos recorrentes que tinham como pressuposto a aludida alteração da matéria de facto. Mas, para além disso, a sentença não merece qualquer censura. Como se refere na sentença recorrida, com sólidos fundamentos, considerações que se subscrevem, perante o documento a que se refere o ponto 11) dos factos provados conclui-se que, “não obstante o negócio tenha sido denominado pelas partes de “assunção de dívida”, não estamos perante uma típica assunção de dívida, nos termos do disposto no artigo 595.º do Código Civil”, a qual implicava a intervenção do credor CGD, S.A., o que não sucedeu, mas sim, perante uma simples promessa de liberação ou assunção de cumprimento. “A promessa de liberação, assunção interna de dívida ou assunção de cumprimento é uma figura muito próxima da assunção de dívida. Nela se afasta a figura do credor, obrigando-se o terceiro apenas perante o devedor. Na falta de ratificação do credor, a assunção será apenas uma promessa de liberação” (assim, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11-03-2013, Processo 7237/05.4TBMTS-A.P1, relator JOSÉ EUSÉBIO ALMEIDA). Ora, apurando-se que mediante prévio acordo negocial os ora Réus assumiram perante os Autores (e, bem assim, a sociedade “Happy M…”) a obrigação (individual e solidária) de exonerar os mesmos do pagamento da dívida resultante do Contrato de abertura de crédito em conta corrente N.º PT 003………….2 celebrado entre a CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS S.A. e a HAPPY M…, ENSINO, EDUCAÇÃO, LAZER, LDA, até ao montante de € 30.000, nos termos do disposto no artigo 444.º, n.º 3 do Código Civil, assiste a estes últimos de exigirem dos primeiros o cumprimento do contrato, no que se refere à prestação em benefício de terceiro. A sentença enquadra correctamente o acordo celebrado entre as partes como promessa liberatória, nos termos do artigo 444º nº 3 CC, De facto, ao contrário do invocado pelos recorrentes, o Tribunal não afirmou que tenha ocorrido assunção liberatória, que tenha desonerado os autores de dívida para com o credor. Assim, não têm qualquer pertinência as considerações dos recorrentes sobre a assunção cumulativa de dívida. Como concluem os apelados: “Não vinculado o título pelo qual o acordo foi designado, apenas se terá de ler o que foi convencionado entre as partes, e tal convenção é clara: os Recorrentes assumem a dívida resultante da conta-corrente até ao montante de 30.000€. Neste processo, a posição do credor CGD é irrelevante, porquanto não estamos a discutir a transmissão da dívida e os direitos da CGD sobre antigos e novos devedores, mas tão somente a obrigação assumida pelos Recorrentes perante os Recorridos de satisfazerem tal crédito. Neste contexto, a discussão conceptual entre promessa liberatória e assunção cumulativa de dívida é perfeitamente espúria”. Não sendo a CGD, S.A. interveniente no presente processo, nem tendo tomado posição quanto ao acordo, não se discute a existência de transmissão de divida nem se pretende determinar em que termos os antigos devedores ficam ou não exonerados. A falta de ratificação, que na verdade não é sequer referida no acordo, não impede que o mesmo produza efeitos entre as partes, apenas impedindo que a dívida se transmita. Não merece, pois, qualquer censura, nesta parte, a sentença recorrida. Relativamente à contrariedade à lei – invocando os recorrentes que o negócio seria contrário à lei na medida em que os credores da insolvente estariam a ser prejudicados em 30.000€ - , cumpre referir que, como salientam os apelados, tal questão não consta da contestação, nem de qualquer peça processual apresentada precedentemente nos autos pelos Recorrentes. Não obstante, com fundamento no depoimento de CS, os recorrentes vêm dizer que a quantia de “até 30.000€” plasmada no documento de fls. 10 era uma forma de retribuição da clientela, concluindo que ocorreu um negócio jurídico celebrado entre quem ainda detinha a administração da empresa Happy M… em desfavorecimento dos credores, contrariedade à lei que também consideram derivar do facto provado em 8), “por violação do disposto no art.º 120.º e ss do CIRE, o que consubstancia a nulidade do documento de assunção de divida celebrado entre as partes, a qual deverá ser declarada nos termos do art.º 286º Código Civil”. Deriva do disposto no artigo 120.º do CIRE (com a epigrafe “Resolução em benefício da massa insolvente”) que podem ser resolvidos em benefício da massa insolvente os atos prejudiciais à massa praticados dentro dos dois anos anteriores à data do início do processo de insolvência. Presumem-se prejudiciais à massa, sem admissão de prova em contrário, os actos de: a)- Partilha celebrada menos de um ano antes da data do início do processo de insolvência em que o quinhão do insolvente haja sido essencialmente preenchido com bens de fácil sonegação, cabendo aos co-interessados a generalidade dos imóveis e dos valores nominativos; b)- Actos celebrados pelo devedor a título gratuito dentro dos dois anos anteriores à data do início do processo de insolvência, incluindo o repúdio de herança ou legado, com excepção dos donativos conformes aos usos sociais; c)- Constituição pelo devedor de garantias reais relativas a obrigações preexistentes ou de outras que as substituam, nos seis meses anteriores à data de início do processo de insolvência; d)- Fiança, subfiança, aval e mandatos de crédito, em que o insolvente haja outorgado no período referido na alínea anterior e que não respeitem a operações negociais com real interesse para ele; e)- Constituição pelo devedor de garantias reais em simultâneo com a criação das obrigações garantidas, dentro dos 60 dias anteriores à data do início do processo de insolvência; f)- Pagamento ou outros actos de extinção de obrigações cujo vencimento fosse posterior à data do início do processo de insolvência, ocorridos nos seis meses anteriores à data do início do processo de insolvência, ou depois desta mas anteriormente ao vencimento; g)- Pagamento ou outra forma de extinção de obrigações efectuados dentro dos seis meses anteriores à data do início do processo de insolvência em termos não usuais no comércio jurídico e que o credor não pudesse exigir; h)- Actos a título oneroso realizados pelo insolvente dentro do ano anterior à data do início do processo de insolvência em que as obrigações por ele assumidas excedam manifestamente as da contraparte; i)- Reembolso de suprimentos, quando tenha lugar dentro do mesmo período referido na alínea anterior. Salvo nos casos a que respeita o artigo 121.º do CIRE, a resolução pressupõe a má fé (o conhecimento, à data do acto, de que o devedor se encontrava em situação de insolvência, do carácter prejudicial do acto e de que o devedor se encontrava à data em situação de insolvência iminente e do início do processo de insolvência) do terceiro, a qual se presume quanto a actos cuja prática ou omissão tenha ocorrido dentro dos dois anos anteriores ao início do processo de insolvência e em que tenha participado ou de que tenha aproveitado pessoa especialmente relacionada com o insolvente, ainda que a relação especial não existisse a essa data. São insuscetíveis de resolução os negócios jurídicos celebrados no âmbito de processo especial de revitalização ou de processo especial para acordo de pagamento regulados no presente diploma, de providência de recuperação ou saneamento, ou de adoção de medidas de resolução previstas no título VIII do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 298/92, de 31 de dezembro, bem como os realizados no âmbito do Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas ou de outro procedimento equivalente previsto em legislação especial, cuja finalidade seja prover o devedor com meios de financiamento suficientes para viabilizar a sua recuperação. Ora, relativamente ao acordo dos autos a que se refere o documento de fls. 10 dos autos, não se vislumbra em que medida o mesmo seja contrário à lei, pois, na realidade, os réus assumiam a realização de uma prestação em benefício dos demais outorgantes, incluindo, logicamente, a insolvente, não derivando de tal negócio qualquer prejuízo para os credores da insolvente. Não se vislumbra, pois, qualquer violação das normas legais mencionadas pelos recorrentes, nem ela deriva da demonstração factual vertida no facto provado em 8). Finalmente, quanto à reconvenção, consideram os recorrentes que a mesma deveria ter sido parcialmente julgada procedente, o que decorreria da matéria provada nos pontos 14), 15), 22) e 23) e do pagamento pelos réus de €16.912,50, sendo que, consideram os recorrentes que o total é de €34.540,31 (€17.627,81 + €16.912,50), pelo que pagaram a mais €4.540,31 além de €30.000,00. Ora, conforme consta, de forma clara, correcta e perfeitamente inteligível, da decisão recorrida, a pretensão reconvencional alicerçou-se “no instituto da responsabilidade pré-contratual, sustentando terem os Reconvindos transmitido informações inexactas quanto à situação financeira/contabilística da sociedade “Happy M…” e quanto aos poderes de disposição do imobilizado, o que fizeram de má fé, violando a confiança que os Reconvintes depositaram nos mesmos, com o que lhes causaram danos patrimoniais e no peticionado montante”. Na realidade, “no caso sub judice, não obstante os Reconvintes tenham alegado que os Reconvindos, no âmbito das negociações que encetaram, violaram os deveres de informação e lealdade que sobre si impendiam, transmitindo-lhes informações erradas, tendo em vista a conclusão do contrato – circunstância que seria efectivamente susceptível de os fazer incorrem em responsabilidade pré-contratual, nos termos sumariamente expendidos –, da análise da factualidade apurada resulta patente que os mesmos não lograram provar os factos em que se consubstanciava tal alegação. Atente-se que não está aqui em causa sindicar ou sancionar se os Reconvintes, ao abrigo da liberdade contratual que a lei lhes reconhece, celebraram um bom ou um mau negócio, mas tão só se o fizeram por a tanto terem sido conduzidos por informações inexactas dos Reconvindos, o que, como se viu, não provar. Acresce que não basta uma mera incompletude da informação transmitida para, sem mais, fazer os Reconvindos incorrerem em responsabilidade pré-contratual. Na verdade, neste caso sempre poderiam os Reconvintes recusar a celebração do negócio até lhes serem fornecidas as informações que entendiam determinantes para a sua vinculação nos termos em que a mesma ocorreu, ao invés de confiarem, sem que se tenha provado que essa confiança foi gerada pelos Reconvindos, que as informações alegadamente em falta lhes seriam mais favoráveis do que se vieram a revelar, como sustentam. Donde, inexiste justificação para a peticionada condenação dos Reconvindos no pagamento da indemnização peticionada, seja por danos patrimoniais (diga-se, aliás, que nem se encontra qualquer base legal, mesmo na tese dos Reconvintes, para fazer recair sobre os Reconvindos os custos de um empréstimo no valor de € 18.000,00 quando os próprios assumem terem aceite a vinculação no pagamento de uma quantia que poderia ascender até € 30.000,00), seja por danos não patrimoniais (que, em todo o caso, também não provaram ter sofrido). Em face do exposto, e sem necessidade de maiores considerações, há que julgar a reconvenção improcedente, por não provada, com a consequente absolvição dos Reconvindos do pedido contra si formulado pelos Reconvintes” (cfr. sentença recorrida). Não podendo ser os autores responsabilizados pelos valores mencionados na reconvenção pelos réus, a apelação soçobrará integralmente, confirmando-se a sentença recorrida. * 5.–Decisão: Em face do exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente e em confirmar a sentença recorrida. Custas a cargo dos apelantes. Notifique e registe. * Lisboa, 26 de Setembro de 2019. (Carlos Castelo Branco - Relator) (Lúcia Celeste da Fonseca Sousa -1.ª Adjunta) (Magda Espinho Geraldes - 2.ª Adjunta)