Processo:
Relator: Tribunal:
Decisão: Meio processual:

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Relator
FRANCISCO MATOS
Descritores
PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO REPETIÇÃO
No do documento
Data do Acordão
08/17/2016
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
Decisão
REVOGADA
Sumário
O encerramento do processo de revitalização devido à não homologação judicial do plano de recuperação, não impede o devedor, que se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas suscetível de recuperação, a que dê inicio a novo processo de revitalização, sem a observância do limite temporal a que se reporta o nº6 do artº 17º-G, do CIRE, exceto nos casos em que a recusa de homologação se fundar na inobservância das regras aplicáveis à votação e aprovação do plano de recuperação.
Decisão integral
I. Relatório.
1. AA S.A. instaurou na secção de comércio processo especial de revitalização.

2. Liminarmente apreciado, o requerimento inicial veio a ser indeferido, na consideração que “(…) enquanto não decorrer o prazo de dois anos contados do encerramento primeiro especial de revitalização, a aqui Requerente não poderá requerer a um segundo processo especial de revitalização (…)”.

3. É desta decisão que a Requerente interpõe recurso, formulando as seguintes conclusões: 
a) O Recorrente vem interpor recurso da decisão que indeferiu liminarmente o requerimento inicial de interposição de processo especial de revitalização, por considerar que um segundo PER não podia ser interposto no prazo de dois anos após encerramento de um primeiro PER, por interpretação extensiva do nº 6 do artigo 17º G do CIRE.
b) O Meritíssimo Juiz do douto Tribunal a quo interpretou o artº 17º-G n.º 6 do CIRE extensivamente, de forma a incluir os casos em que o plano de revitalização é aprovado mas não judicialmente homologado, consequentemente, entendeu que o Recorrente “estava concretamente impedida de recorrer ao PER pelo prazo de dois anos, prazo esse que, de acordo com o que vimos referindo e por questões de coerência, teria de contar-se forçosamente do termo do processo especial de revitalização anterior”. Conclui decidindo indeferir liminarmente o requerimento inicial.
c) O Recorrente não concorda com tal interpretação, por não ser o que decorre da lei, bastando ler o artigo 17º G nº 1, para afastar a aplicação do número 6 a casos não incluídos em tal artigo.
d) Existe jurisprudência do Tribunal da Relação de Coimbra, entre outra, que lhe dá razão, entendendo que o prazo de dois anos previsto no artigo 17º G n.º 6 não se aplica a casos em que tenha havido aprovação do plano de recuperação, mas não homologação pelo Meritíssimo Juiz
e) No caso em apreço, houve homologação do plano de recuperação em primeira instância, que só numa fase posterior, na sequência da impugnação efetuada, foi revogado o despacho de homologação pelos tribunais superiores.
f) Em casos em que o plano especial de recuperação é aprovado pelos credores, mas não homologado pelo Meritíssimo Juiz, não se aplica o prazo de dois anos do artigo 17º G n.º 6 do CIRE, por esta situação não constar das elencadas no artigo 17º G do CIRE.
g) A decisão do Tribunal a quo viola o artigo 17.º G n.º 1 e 6 do CIRE, onde se aplica a impossibilidade de interposição de um novo processo especial de revitalização antes de decorridos dois anos da interposição do requerimento de um processo especial de revitalização anterior, fora dos casos legalmente previstos.
h) Deve ser revogada a decisão do douto tribunal a quo, sendo substituída por outra que mande os autos prosseguir, com nomeação do administrador, prosseguindo-se o mais que for de direito.
Nestes termos, e nos mais de direito aplicável, deve ser revogada a decisão do douto tribunal a quo, sendo substituída por outra que mande os autos prosseguir, com nomeação do administrador, prosseguindo-se o mais que for de direito. ASSIM SE FARÁ JUSTIÇA”
Não houve lugar a resposta.
Atenta a simplicidade da questão a decidir, profere-se decisão sumária (artº 656º, do CPC). 

II. Objeto do recurso.
Considerando as conclusões da motivação do recurso e sendo estas que delimitam o seu objeto, sem prejuízo da liberdade do juiz quanto à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (artºs. 635º, nº4, 639º, nº1, 608º, nº2 e 5º nº3, todos do Código de Processo Civil), importa decidir se o impedimento temporal (2 anos) para a propositura do (novo) processo especial de revitalização, previsto no nº6 do artº 17º-G, do CIRE se aplica aos casos em que o plano de recuperação, não obstante aprovado pelos credores, não foi homologado pelo juiz.

III. Fundamentação. 
1. Factos.
Sem impugnação, a decisão recorrida fundamentou-se no seguinte circunstancialismo de facto:
a) correu termos nesta Secção de Comércio- J2, sob o n.º 2.468/12.3TBLLE, processo especial de revitalização instaurado pela aqui Requerente;
b) no processo acima indicado, por decisões proferidas pelo Tribunal da Relação de Évora e pelo Supremo Tribunal de Justiça foi recusada a homologação do plano de revitalização (menção constante do despacho que constitui o documento de fls. 3 v.);
c) ainda no processo acima indicado, o Sr. Administrador judicial provisório apresentou o parecer a que alude o n.º 4 do art.º 17º-G, do C.I.R.E., concluindo que a aqui Requerente não se encontrava em situação de insolvência (menção constante do despacho que constitui o documento de fls. 3 v.);
d) ainda no processo acima indicado, por despacho proferido em 25 de Janeiro de 2016, foi declarado encerrado o processo especial de revitalização, com os efeitos previstos no n.º 2 do art.º 17º-G do C.I..R.E..

2. Direito.
Sob a epígrafe “conclusão do processo negocial sem a aprovação de plano de recuperação”, o artº 17º-G do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, doravante designada por CIRE (aprovado pelo DL n.º 53/2004, de 18.3, na redação da Lei n.º 16/2012, de 20.4), dispõe o seguinte:
“1 - Caso o devedor ou a maioria dos credores prevista no n.º 3 do artigo anterior concluam antecipadamente não ser possível alcançar acordo, ou caso seja ultrapassado o prazo previsto no n.º 5 do artigo 17.º-D, o processo negocial é encerrado, devendo o administrador judicial provisório comunicar tal facto ao processo, se possível, por meios eletrónicos e publicá-lo no portal Citius. 
2 - Nos casos em que o devedor ainda não se encontre em situação de insolvência, o encerramento do processo especial de revitalização acarreta a extinção de todos os seus efeitos. 
3 - Estando, porém, o devedor já em situação de insolvência, o encerramento do processo regulado no presente capítulo acarreta a insolvência do devedor, devendo a mesma ser declarada pelo juiz no prazo de três dias úteis, contados a partir da receção pelo tribunal da comunicação mencionada no n.º 1. 
4 - Compete ao administrador judicial provisório na comunicação a que se refere o n.º 1 e mediante a informação de que disponha, após ouvir o devedor e os credores, emitir o seu parecer sobre se o devedor se encontra em situação de insolvência e, em caso afirmativo, requerer a insolvência do devedor, aplicando-se o disposto no artigo 28.º, com as necessárias adaptações, e sendo o processo especial de revitalização apenso ao processo de insolvência.
5 - O devedor pode pôr termo às negociações a todo o tempo, independentemente de qualquer causa, devendo, para o efeito, comunicar tal pretensão ao administrador judicial provisório, a todos os seus credores e ao tribunal, por meio de carta registada, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto nos números anteriores.
6 - O termo do processo especial de revitalização efetuado de harmonia com os números anteriores impede o devedor de recorrer ao mesmo pelo prazo de dois anos.
7 - Havendo lista definitiva de créditos reclamados, e sendo o processo especial de revitalização convertido em processo de insolvência por aplicação do disposto no n.º 4, o prazo de reclamação de créditos previsto na alínea j) do n.º 1 do artigo 36.º destina-se apenas à reclamação de créditos não reclamados nos termos do n.º 2 do artigo 17.º-D.”
A norma prevê o encerramento do processo negocial (i) caso o devedor conclua antecipadamente (antes da votação do plano) não ser possível alcançar um acordo com os credores, (ii) caso a maioria dos credores concluam antecipadamente não ser possível alcançar acordo, (iii) caso seja ultrapassado o prazo de dois meses para a conclusão das negociações, a contar do termo do prazo para impugnações (sem prejuízo da prorrogação deste prazo por mais mês, mediante acordo prévio e escrito entre o administrador judicial provisório nomeado e o devedor) e (iv) caso o devedor ponha termo às negociações, o que pode fazer a todo o tempo, independentemente de qualquer causa.
Em qualquer destas situações, o encerramento do processo de revitalização acarreta a insolvência do devedor se este já estiver em situação de insolvência ou determina a extinção de todos os efeitos do processo de revitalização, nos casos em que o devedor ainda não se encontre em situação de insolvência.
E é reportando-se ao termo do processo especial de revitalização ocorrido como consequência de uma qualquer destas causas - efetuado de harmonia com os números anteriores – que o nº6 do artigo em referência obsta a que o devedor recorra a novo processo de revitalização pelo prazo de dois anos, ou seja e encurtando razões, encerrado o processo de revitalização com fundamento no reconhecimento antecipado da impossibilidade de obtenção do acordo de revitalização ou pelo decurso do prazo das negociações sem a sua obtenção o devedor, ainda que se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas suscetível de recuperação, não poderá, pelo prazo de dois anos, iniciar um novo processo de revitalização.
	O que se compreende; a apresentação em juízo de um processo de revitalização, ou mais concretamente o despacho do juiz que nomeia o administrador judicial [artº 17º-C, nº3, al. a)] tem efeitos muito relevantes nas relações patrimoniais entre o devedor e os seus credores - obsta à instauração de quaisquer ações para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as ações em curso com idêntica finalidade; suspende os processos em que haja sido requerida a insolvência do devedor, desde que esta ainda não tenha sido decretada (artº 17º-E, nºs 1 e 6) – e a lei terá pretendido obstar a que o devedor atravinque os direitos dos seus credores pela utilização reiterada do processo de revitalização, nos casos em que o acordo conducente à sua revitalização não é viável (seja porque assim o reconhecem antecipadamente os credores ou o devedor, seja porque se esgotou o prazo das negociações) ou nos casos em que o próprio devedor põe termo às negociações com os credores (e se o faz, numa situação económica difícil, será, em regra, por prever o seu fracasso), estabelecendo um hiato de dois anos como o período em que o insucesso negocial não sofrerá alterações relevantes.
No caso dos autos, a ora recorrente, antes da propositura do atual procedimento, havia já instaurado um outro, com idêntica finalidade, que terminou com a não homologação do plano de revitalização – als. a) e b) supra – e a decisão recorrida, seguindo de perto o Ac. R.L. de 8/3/2016Disponível em www.dgsi.pt [em cujo sumário se anotou que se o plano de revitalização for aprovado em assembleia de credores mas o tribunal recusar depois a sua homologação, é de aplicar extensivamente o disposto no nº 6 do art. 17-G do C.I.R.E., ficando o devedor impedido de recorrer ao PER pelo prazo de dois anos a contar do termo desse processo], considerou aplicável o disposto no nº 6 do art. 17-G aos casos de recusa de homologação do plano aprovado pelos credores.
A letra da norma não aconselha, salvo melhor opinião, esta interpretação e a sua teleologia, tanto quanto nos é possível apreendê-la, também não a justifica, porque a recusa de homologação do plano se prende, por regra, com razões estranhas à vontade dos credores em avalizar a recuperação do devedor e é a impossibilidade da formação desta vontade, reconhecida ou presumida, que justifica, a nosso ver, o impedimento do devedor de instaurar um processo de revitalização antes de decorridos dois anos após o insucesso do processo negocial antes iniciado com os seus credores, caso se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas suscetível de recuperação.
	A não homologação do plano decorrente, em regra, da aprovação de planos ilegais, quer quanto à formação da vontade que neles obteve maioria, quer quanto ao seu conteúdo (artºs 17º-F, nº5, 215º e 216º) não comporta, à partida, a impossibilidade da aprovação do plano suposta pela limitação temporal em referência; só não será assim quando a não homologação do plano resultar da inobservância das regras aplicáveis à votação e aprovação do plano de recuperação, por se evidenciar, também nesta situação, em substância, a conclusão do processo negocial sem a aprovação de plano de recuperação [cfr., neste sentido, Catarina Serra O Processo Especial de Revitalização na Jurisprudência, 2016, pág. 107., ao anotar: “Atendendo à letra da lei, parece, de facto, ser possível concluir que a disciplina do artº 17º-G está reservada aos casos em que se torna flagrante que o PER não é – não era ab initio – o instrumento adequado para resolver a situação do devedor. Será, portanto, legítimo presumir, em face da epígrafe e do teor do preceito, que ele se aplica apenas aos casos de não aprovação do plano de recuperação”]. 
Termos em que se conclui, que o encerramento do processo de revitalização devido à não homologação judicial do plano de recuperação, não impede o devedor, que se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas suscetível de recuperação, a que dê inicio a novo processo de revitalização, sem a observância do limite temporal a que se reporta o nº6 do artº 17º-G, do CIRE Cfr., neste sentido, Ac.R.C. de 27/1/2015, disponível em www.dgsi.pt., exceto nos casos em que a recusa de homologação se fundar na inobservância das regras aplicáveis à votação e aprovação do plano de recuperação.
Procede, assim, o recurso com a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que se conforme com a prossecução dos autos sem prejuízo de ser conhecida qualquer outra questão que a tal obste e não tenha, ainda, sido objeto de apreciação na decisão sob recurso.

Sumário:
O encerramento do processo de revitalização devido à não homologação judicial do plano de recuperação, não impede o devedor, que se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas suscetível de recuperação, a que dê inicio a novo processo de revitalização, sem a observância do limite temporal a que se reporta o nº6 do artº 17º-G, do CIRE, exceto nos casos em que a recusa de homologação se fundar na inobservância das regras aplicáveis à votação e aprovação do plano de recuperação. 

IV. Dispositivo.
Decide-se, pelo exposto, na procedência do recurso, em revogar a decisão recorrida determinando-se a prossecução dos autos sem prejuízo de ser conhecida qualquer outra questão que a tal obste e não tenha, ainda, sido objeto de apreciação na decisão sob recurso.
 Custas por quem as houver que pagar a final.
Évora, 17/8/2016		
 
								Francisco Matos

I. Relatório. 1. AA S.A. instaurou na secção de comércio processo especial de revitalização. 2. Liminarmente apreciado, o requerimento inicial veio a ser indeferido, na consideração que “(…) enquanto não decorrer o prazo de dois anos contados do encerramento primeiro especial de revitalização, a aqui Requerente não poderá requerer a um segundo processo especial de revitalização (…)”. 3. É desta decisão que a Requerente interpõe recurso, formulando as seguintes conclusões: a) O Recorrente vem interpor recurso da decisão que indeferiu liminarmente o requerimento inicial de interposição de processo especial de revitalização, por considerar que um segundo PER não podia ser interposto no prazo de dois anos após encerramento de um primeiro PER, por interpretação extensiva do nº 6 do artigo 17º G do CIRE. b) O Meritíssimo Juiz do douto Tribunal a quo interpretou o artº 17º-G n.º 6 do CIRE extensivamente, de forma a incluir os casos em que o plano de revitalização é aprovado mas não judicialmente homologado, consequentemente, entendeu que o Recorrente “estava concretamente impedida de recorrer ao PER pelo prazo de dois anos, prazo esse que, de acordo com o que vimos referindo e por questões de coerência, teria de contar-se forçosamente do termo do processo especial de revitalização anterior”. Conclui decidindo indeferir liminarmente o requerimento inicial. c) O Recorrente não concorda com tal interpretação, por não ser o que decorre da lei, bastando ler o artigo 17º G nº 1, para afastar a aplicação do número 6 a casos não incluídos em tal artigo. d) Existe jurisprudência do Tribunal da Relação de Coimbra, entre outra, que lhe dá razão, entendendo que o prazo de dois anos previsto no artigo 17º G n.º 6 não se aplica a casos em que tenha havido aprovação do plano de recuperação, mas não homologação pelo Meritíssimo Juiz e) No caso em apreço, houve homologação do plano de recuperação em primeira instância, que só numa fase posterior, na sequência da impugnação efetuada, foi revogado o despacho de homologação pelos tribunais superiores. f) Em casos em que o plano especial de recuperação é aprovado pelos credores, mas não homologado pelo Meritíssimo Juiz, não se aplica o prazo de dois anos do artigo 17º G n.º 6 do CIRE, por esta situação não constar das elencadas no artigo 17º G do CIRE. g) A decisão do Tribunal a quo viola o artigo 17.º G n.º 1 e 6 do CIRE, onde se aplica a impossibilidade de interposição de um novo processo especial de revitalização antes de decorridos dois anos da interposição do requerimento de um processo especial de revitalização anterior, fora dos casos legalmente previstos. h) Deve ser revogada a decisão do douto tribunal a quo, sendo substituída por outra que mande os autos prosseguir, com nomeação do administrador, prosseguindo-se o mais que for de direito. Nestes termos, e nos mais de direito aplicável, deve ser revogada a decisão do douto tribunal a quo, sendo substituída por outra que mande os autos prosseguir, com nomeação do administrador, prosseguindo-se o mais que for de direito. ASSIM SE FARÁ JUSTIÇA” Não houve lugar a resposta. Atenta a simplicidade da questão a decidir, profere-se decisão sumária (artº 656º, do CPC). II. Objeto do recurso. Considerando as conclusões da motivação do recurso e sendo estas que delimitam o seu objeto, sem prejuízo da liberdade do juiz quanto à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (artºs. 635º, nº4, 639º, nº1, 608º, nº2 e 5º nº3, todos do Código de Processo Civil), importa decidir se o impedimento temporal (2 anos) para a propositura do (novo) processo especial de revitalização, previsto no nº6 do artº 17º-G, do CIRE se aplica aos casos em que o plano de recuperação, não obstante aprovado pelos credores, não foi homologado pelo juiz. III. Fundamentação. 1. Factos. Sem impugnação, a decisão recorrida fundamentou-se no seguinte circunstancialismo de facto: a) correu termos nesta Secção de Comércio- J2, sob o n.º 2.468/12.3TBLLE, processo especial de revitalização instaurado pela aqui Requerente; b) no processo acima indicado, por decisões proferidas pelo Tribunal da Relação de Évora e pelo Supremo Tribunal de Justiça foi recusada a homologação do plano de revitalização (menção constante do despacho que constitui o documento de fls. 3 v.); c) ainda no processo acima indicado, o Sr. Administrador judicial provisório apresentou o parecer a que alude o n.º 4 do art.º 17º-G, do C.I.R.E., concluindo que a aqui Requerente não se encontrava em situação de insolvência (menção constante do despacho que constitui o documento de fls. 3 v.); d) ainda no processo acima indicado, por despacho proferido em 25 de Janeiro de 2016, foi declarado encerrado o processo especial de revitalização, com os efeitos previstos no n.º 2 do art.º 17º-G do C.I..R.E.. 2. Direito. Sob a epígrafe “conclusão do processo negocial sem a aprovação de plano de recuperação”, o artº 17º-G do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, doravante designada por CIRE (aprovado pelo DL n.º 53/2004, de 18.3, na redação da Lei n.º 16/2012, de 20.4), dispõe o seguinte: “1 - Caso o devedor ou a maioria dos credores prevista no n.º 3 do artigo anterior concluam antecipadamente não ser possível alcançar acordo, ou caso seja ultrapassado o prazo previsto no n.º 5 do artigo 17.º-D, o processo negocial é encerrado, devendo o administrador judicial provisório comunicar tal facto ao processo, se possível, por meios eletrónicos e publicá-lo no portal Citius. 2 - Nos casos em que o devedor ainda não se encontre em situação de insolvência, o encerramento do processo especial de revitalização acarreta a extinção de todos os seus efeitos. 3 - Estando, porém, o devedor já em situação de insolvência, o encerramento do processo regulado no presente capítulo acarreta a insolvência do devedor, devendo a mesma ser declarada pelo juiz no prazo de três dias úteis, contados a partir da receção pelo tribunal da comunicação mencionada no n.º 1. 4 - Compete ao administrador judicial provisório na comunicação a que se refere o n.º 1 e mediante a informação de que disponha, após ouvir o devedor e os credores, emitir o seu parecer sobre se o devedor se encontra em situação de insolvência e, em caso afirmativo, requerer a insolvência do devedor, aplicando-se o disposto no artigo 28.º, com as necessárias adaptações, e sendo o processo especial de revitalização apenso ao processo de insolvência. 5 - O devedor pode pôr termo às negociações a todo o tempo, independentemente de qualquer causa, devendo, para o efeito, comunicar tal pretensão ao administrador judicial provisório, a todos os seus credores e ao tribunal, por meio de carta registada, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto nos números anteriores. 6 - O termo do processo especial de revitalização efetuado de harmonia com os números anteriores impede o devedor de recorrer ao mesmo pelo prazo de dois anos. 7 - Havendo lista definitiva de créditos reclamados, e sendo o processo especial de revitalização convertido em processo de insolvência por aplicação do disposto no n.º 4, o prazo de reclamação de créditos previsto na alínea j) do n.º 1 do artigo 36.º destina-se apenas à reclamação de créditos não reclamados nos termos do n.º 2 do artigo 17.º-D.” A norma prevê o encerramento do processo negocial (i) caso o devedor conclua antecipadamente (antes da votação do plano) não ser possível alcançar um acordo com os credores, (ii) caso a maioria dos credores concluam antecipadamente não ser possível alcançar acordo, (iii) caso seja ultrapassado o prazo de dois meses para a conclusão das negociações, a contar do termo do prazo para impugnações (sem prejuízo da prorrogação deste prazo por mais mês, mediante acordo prévio e escrito entre o administrador judicial provisório nomeado e o devedor) e (iv) caso o devedor ponha termo às negociações, o que pode fazer a todo o tempo, independentemente de qualquer causa. Em qualquer destas situações, o encerramento do processo de revitalização acarreta a insolvência do devedor se este já estiver em situação de insolvência ou determina a extinção de todos os efeitos do processo de revitalização, nos casos em que o devedor ainda não se encontre em situação de insolvência. E é reportando-se ao termo do processo especial de revitalização ocorrido como consequência de uma qualquer destas causas - efetuado de harmonia com os números anteriores – que o nº6 do artigo em referência obsta a que o devedor recorra a novo processo de revitalização pelo prazo de dois anos, ou seja e encurtando razões, encerrado o processo de revitalização com fundamento no reconhecimento antecipado da impossibilidade de obtenção do acordo de revitalização ou pelo decurso do prazo das negociações sem a sua obtenção o devedor, ainda que se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas suscetível de recuperação, não poderá, pelo prazo de dois anos, iniciar um novo processo de revitalização. O que se compreende; a apresentação em juízo de um processo de revitalização, ou mais concretamente o despacho do juiz que nomeia o administrador judicial [artº 17º-C, nº3, al. a)] tem efeitos muito relevantes nas relações patrimoniais entre o devedor e os seus credores - obsta à instauração de quaisquer ações para cobrança de dívidas contra o devedor e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto ao devedor, as ações em curso com idêntica finalidade; suspende os processos em que haja sido requerida a insolvência do devedor, desde que esta ainda não tenha sido decretada (artº 17º-E, nºs 1 e 6) – e a lei terá pretendido obstar a que o devedor atravinque os direitos dos seus credores pela utilização reiterada do processo de revitalização, nos casos em que o acordo conducente à sua revitalização não é viável (seja porque assim o reconhecem antecipadamente os credores ou o devedor, seja porque se esgotou o prazo das negociações) ou nos casos em que o próprio devedor põe termo às negociações com os credores (e se o faz, numa situação económica difícil, será, em regra, por prever o seu fracasso), estabelecendo um hiato de dois anos como o período em que o insucesso negocial não sofrerá alterações relevantes. No caso dos autos, a ora recorrente, antes da propositura do atual procedimento, havia já instaurado um outro, com idêntica finalidade, que terminou com a não homologação do plano de revitalização – als. a) e b) supra – e a decisão recorrida, seguindo de perto o Ac. R.L. de 8/3/2016Disponível em www.dgsi.pt [em cujo sumário se anotou que se o plano de revitalização for aprovado em assembleia de credores mas o tribunal recusar depois a sua homologação, é de aplicar extensivamente o disposto no nº 6 do art. 17-G do C.I.R.E., ficando o devedor impedido de recorrer ao PER pelo prazo de dois anos a contar do termo desse processo], considerou aplicável o disposto no nº 6 do art. 17-G aos casos de recusa de homologação do plano aprovado pelos credores. A letra da norma não aconselha, salvo melhor opinião, esta interpretação e a sua teleologia, tanto quanto nos é possível apreendê-la, também não a justifica, porque a recusa de homologação do plano se prende, por regra, com razões estranhas à vontade dos credores em avalizar a recuperação do devedor e é a impossibilidade da formação desta vontade, reconhecida ou presumida, que justifica, a nosso ver, o impedimento do devedor de instaurar um processo de revitalização antes de decorridos dois anos após o insucesso do processo negocial antes iniciado com os seus credores, caso se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas suscetível de recuperação. A não homologação do plano decorrente, em regra, da aprovação de planos ilegais, quer quanto à formação da vontade que neles obteve maioria, quer quanto ao seu conteúdo (artºs 17º-F, nº5, 215º e 216º) não comporta, à partida, a impossibilidade da aprovação do plano suposta pela limitação temporal em referência; só não será assim quando a não homologação do plano resultar da inobservância das regras aplicáveis à votação e aprovação do plano de recuperação, por se evidenciar, também nesta situação, em substância, a conclusão do processo negocial sem a aprovação de plano de recuperação [cfr., neste sentido, Catarina Serra O Processo Especial de Revitalização na Jurisprudência, 2016, pág. 107., ao anotar: “Atendendo à letra da lei, parece, de facto, ser possível concluir que a disciplina do artº 17º-G está reservada aos casos em que se torna flagrante que o PER não é – não era ab initio – o instrumento adequado para resolver a situação do devedor. Será, portanto, legítimo presumir, em face da epígrafe e do teor do preceito, que ele se aplica apenas aos casos de não aprovação do plano de recuperação”]. Termos em que se conclui, que o encerramento do processo de revitalização devido à não homologação judicial do plano de recuperação, não impede o devedor, que se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas suscetível de recuperação, a que dê inicio a novo processo de revitalização, sem a observância do limite temporal a que se reporta o nº6 do artº 17º-G, do CIRE Cfr., neste sentido, Ac.R.C. de 27/1/2015, disponível em www.dgsi.pt., exceto nos casos em que a recusa de homologação se fundar na inobservância das regras aplicáveis à votação e aprovação do plano de recuperação. Procede, assim, o recurso com a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que se conforme com a prossecução dos autos sem prejuízo de ser conhecida qualquer outra questão que a tal obste e não tenha, ainda, sido objeto de apreciação na decisão sob recurso. Sumário: O encerramento do processo de revitalização devido à não homologação judicial do plano de recuperação, não impede o devedor, que se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas suscetível de recuperação, a que dê inicio a novo processo de revitalização, sem a observância do limite temporal a que se reporta o nº6 do artº 17º-G, do CIRE, exceto nos casos em que a recusa de homologação se fundar na inobservância das regras aplicáveis à votação e aprovação do plano de recuperação. IV. Dispositivo. Decide-se, pelo exposto, na procedência do recurso, em revogar a decisão recorrida determinando-se a prossecução dos autos sem prejuízo de ser conhecida qualquer outra questão que a tal obste e não tenha, ainda, sido objeto de apreciação na decisão sob recurso. Custas por quem as houver que pagar a final. Évora, 17/8/2016 Francisco Matos