Processo:
Relator: Tribunal:
Decisão: Meio processual:

Profissão: Data de nascimento: Invalid Date
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
ESTELITA DE MENDONÇA
Descritores
EXECUÇÃO DA PENA DE PRISÃO
No do documento
RG
Data do Acordão
11/16/2009
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
RECURSO PENAL
Decisão
JULGADO IMPROCEDENTE
Sumário
O regime de permanência na habitação previsto no art.º 44.º do CP (redacção da lei 59/2007 de 4.09) - permanência que antes só existia como medida de coacção - constitui um modo de execução da pena de prisão e tem sempre, como pressuposto «material», além dos requisitos «formais», que essa forma de cumprimento realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. exec
Decisão integral
Acordam os Juizes da Relação de Guimarães:


TRIBUNAL RECORRIDO :
 Tribunal Judicial de Celorico de Basto – (Processo comum colectivo n.º 97/05.7GACBT)

RECORRENTE :
J…

RECORRIDO :
Ministério Público

OBJECTO DO RECURSO :
Por Acórdão 4/05/2009 proferido nos autos em referência (fls. 964 a 996), foi decidido, além do mais, julgar a acusação deduzida nos autos parcialmente procedente por parcialmente provada, na parte ainda em apreciação, e, consequentemente:
1. Absolver os arguidos …da acusação na parte em que lhes é imputada a prática, em co-autoria e em concurso efectivo, de um crime de furto qualificado, na forma consumada e continuada, p. e p. pelos artgs 30º, nº 2, 203º, nº 1, e 204º, nº 2, al. e), todos do CP; e de um crime de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artgs 22º, 203º, nº 1, e 204º, nº 2, al. e), todos do CP;
2. Absolver os arguidos … da acusação na parte em que lhes é imputada, a cada um deles, a prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de receptação, p. e p. pelo artº 231º, nº 1, do CP;
3. Absolver o arguido J.. da acusação na parte em que lhe é imputada a prática, em autoria material e em concurso efectivo, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artgs 203º, nº 1, e 204º, nº 2, al. e), do CP; e de um crime de furto simples, na forma continuada, p. e p. pelos artgs 30º, nº 2, e 203º, nº 1, do CP;
4. Condenar o arguido J…, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artº 203º, nº 1, do CP, na pena de 1 (um) ano de prisão efectiva;
5. Condenar o arguido S…, pela prática, em autoria material e na forma tentada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artº 203º, nºs 1 e 2, com referência aos artgs 22º, nºs 1 e 2, al. a), 23º, nº 2, 73º, nº 1, al. c), 202º, al. c), e 204º, nº 4, todos do CP, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de 5 (cinco) euros, num total de 350 (trezentos e cinquenta) euros; 

Inconformado com essa decisão, interpôs recurso da mesma o arguido J…o qual finda a respectiva motivação com as seguintes conclusões:
(…)***	Admitido o recurso, ao mesmo respondeu o M.P.º na 1.ª instância, nos termos de fls. 1067 a 1069, sustentando que deve ser negado provimento ao recurso apresentado mantendo-se a decisão recorrida nos seus precisos termos, com o que será feita JUSTIÇA.***Nesta Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento. ***Foi cumprido o art. 417, n.º 2 do CPP, não tendo sido apresentada resposta. ***Colhidos os vistos legais, procedeu-se à conferência, nada obstando ao conhecimento dos autos.
***
	Como é sabido, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação – cfr. Art. 412, n.º 1 do Código de Processo Penal.
	Assim, as questões a decidir, e suscitadas pelo arguido, são:
-	Errada opção pela pena privativa da liberdade (devia Ter sido aplicada pena de multa ao arguido)
-	Se se mantiver a pena de prisão a mesma deverá ser cumprida em regime de permanência na habitação;
Vejamos então.
(…)
 
 
 
*** 
 2. O cumprimento da pena em regime de permanência na habitação.
 
	Requer o arguido que, “Em alternativa, e para o caso de o sentimento geral da Justiça e as necessidades de prevenção e retribuição não se satisfazerem com a "simples" pena de multa, sempre será de ponderar a escolha de uma pena privativa da liberdade executada no regime de permanência na habitação”, pois “Estão cumpridos os requisitos da medida da pena, bem como os de prevenção geral, quer na sua formulação positiva, quer na sua formulação negativa, os de prevenção especial, os de retribuição e ainda os de reinserção, e o carácter restritivo da liberdade é castigo suficiente para o agente, embora lhe permita manter os laços familiares, essenciais à sua potencial reabilitação, ainda mais que o Arguido tem 3 filhos menores”.
Acrescenta o Arguido que dá expressamente o seu consentimento nessa aplicação.
Vejamos:
Nos termos do disposto no art. 44° do Código Penal (redacção da Lei n.º 59/2007 de 4/09):
"Se o condenado consentir, podem ser executados em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, sempre que o tribunal concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição:
a) A pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano...".
Ora, desde já diremos, como se faz no Ac. Relação do Porto de 20/09/2009, proc. n.º 42/06.2TAOVR-B.P1, Relator Desembargador Ricardo Costa e Silva, já disponível em www.itij.pt, que “o artigo 44º do CP refere-se ao “regime de permanência na habitação” não como uma pena de natureza autónoma, mas sim como um modo de execução da pena de prisão”. 
Na verdade, o regime do artigo 44º (Regime de permanência na habitação) visa poupar o condenado ao efeito criminógeno da reclusão em estabelecimento prisional, pelo período de uma pena curta, tendo em vista o binómio ganhos/ perdas – efeito ressocializador da pena versus a dessocialização inevitavelmente devida ao efeito criminógeno – que pode ser, será, desfavorável ao fim de ressocialização da pena, esgotando-se portanto, na substituição do meio prisional pela residência.
A aplicação do regime do artigo 44º do CP, não visa proteger a normalidade de vida do condenado, mas tão só evitar que ele ingresse em meio prisional.
No mais, a penosidade da sanção penal deve recair sobre ele, em termos o mais idênticos possível aos que resultariam de um cumprimento da pena na prisão. Não se visa descaracterizar a pena de prisão, no que ela tem de privação de liberdade, nem criar um regime de execução desproporcionadamente excepcional, face ao cumprimento efectivo da pena de prisão em estabelecimento próprio para tal fim.
E não podem os condenados abrangidos por este regime, nestes moldes, queixar-se, nomeadamente, de que ele, ao impedi-los de trabalhar, prejudica a sua subsistência. Isso é a consequência natural de uma pena de prisão e o regime de cumprimento da pena de prisão em permanência na habitação apenas é aplicado aos condenados que em tal consintam, cabendo-lhes a responsabilidade da previsão da sua capacidade para se auto manterem, durante o tempo em que durar a situação em causa.
Importa então considerar o artigo 44.º do CP, nomeadamente no segmento em que consigna:
“1. Se o condenado consentir, podem ser executados em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, sempre que o tribunal concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição:
a) A pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano;
	(…)
	2. O limite máximo previsto no número anterior pode ser elevado para dois anos quando se verifiquem, à data da condenação, circunstâncias de natureza pessoal ou familiar do condenado que desaconselhem a privação da liberdade em estabelecimento prisional, nomeadamente: 
	(…)
	e) Existência de familiar exclusivamente ao seu cuidado. (…).”
	Sobre a natureza assumida pelo regime assim instituído, e questões que dele podem emergir, opinaram já a Dr.ª Maria João Antunes, bem como o Desembargador Jorge Gonçalves, em comunicações realizadas nas Jornadas de Direito Penal, organizadas pelo CEJ, em Novembro de 2007, na Aula Magna da Reitoria da Universidade Clássica de Lisboa.
	A primeira, referindo, nomeadamente:
	“No artigo 44.º prevê-se agora o regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância. Uma nova pena de substituição privativa da liberdade, à qual são correspondentemente aplicáveis regras da Lei que regula a vigilância electrónica prevista no artigo 201.º do Código de Processo Penal (artigo 9.º da Lei n.º 59/2007). Substitui a pena de prisão aplicada em medida não superior a 1 ano; e o remanescente não superior a 1 ano da pena de prisão efectiva que exceder o tempo de privação da liberdade a que o arguido esteve sujeito em regime de detenção, prisão preventiva ou obrigação de permanência na habitação. Ou, excepcionalmente, o remanescente não superior a 2 anos, quando se verifiquem circunstâncias de natureza pessoal ou familiar do condenado que desaconselham a privação da liberdade em estabelecimento prisional, nomeadamente gravidez, idade inferior a 21 anos ou superior a 65 anos, doença ou deficiência graves, existência de menor a seu cargo, existência de familiar exclusivamente ao seu cuidado. O enquadramento do regime de permanência na habitação nas penas de substituição privativas da liberdade é para nós inequívoco, quando substitui – à semelhança da prisão por dias livres e do regime de semidetenção – pena de prisão em medida não superior a um ano e é de concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição [artigo 44.º, n.º 1, alínea a)]. Quando substitui o remanescente não superior a um ano – ou, excepcionalmente, dois – da pena de prisão efectiva que exceder o tempo de privação da liberdade a que o arguido esteve sujeito em cumprimento de medida de natureza processual e é de concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição [artigo 44.º, n.ºs 1, alínea a), e 2], já não estamos, verdadeiramente, perante uma pena de substituição, mas antes perante uma regra de execução da pena de prisão, semelhante à agora introduzida no artigo 62.º (Adaptação à liberdade condicional).”
	O segundo, adiantando:
	“O novo artigo 44.º, com a epígrafe Regime de permanência na habitação, veio estabelecer uma forma de execução domiciliária da prisão, podendo ser entendida como uma nova pena de substituição (pelo menos em sentido impróprio), a aplicar-se como alternativa ao cumprimento da prisão nos estabelecimentos prisionais, em condenações até um ano, ou quando estejam em causa condenações superiores, mas em que o remanescente a cumprir não exceda um ano, descontado o tempo de detenção, prisão preventiva ou obrigação de permanência na habitação. 
Excepcionalmente, pode ser uma alternativa em penas até dois anos.
Esta nova pena de substituição/modo de execução, dependente do consentimento do condenado (o que também se exige no regime de semidetenção e na prestação de trabalho a favor da comunidade), tem a particularidade de associar ao cumprimento domiciliário a vigilância electrónica que, até ao momento, estava prevista apenas como mecanismo de fiscalização do cumprimento da medida de coacção de obrigação de permanência na habitação. Mecanismo este que também passa a estar associado à adaptação à liberdade condicional, nos termos do artigo 62.º, na nova redacção. A proposta de revisão do Código Penal colocava algumas dúvidas: seria ou não aplicável, ao regime de permanência na habitação, a legislação relativa à vigilância electrónica, designadamente a Lei n.º 122/99, de 20 de Agosto, pensada para a medida de coacção?	O artigo 9.º da Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, soluciona a dúvida, estabelecendo que o disposto no n.º 1 do artigo 1.º, no artigo 2.º, n.º 2 a 5 do artigo 3.º, nos artigos 4.º a 6.º, nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 8.º e no artigo 9.º do mencionado diploma, é aplicável ao regime de permanência na habitação.
	Que disposições são essas?
	- As que dispõem sobre o consentimento (do arguido e de outros);
	- As que dispõem sobre o conteúdo da decisão (que admite o estabelecimento de autorizações de ausência) e a solicitação de prévia informação aos serviços encarregados da execução da medida sobre a situação pessoal, familiar, laboral ou social do arguido (a unidade de monitorização local colocada na habitação depende da existência de energia eléctrica – condições técnicas);
	- As relativas à execução, entidade encarregada da execução, deveres do condenado, causas de revogação e ao equipamento a utilizar na vigilância electrónica.
	Ora, afigura-se que, como pena de substituição, pelo menos em sentido impróprio, o momento para decidir da aplicação do regime de permanência na habitação é o da sentença condenatória, tal como ocorre com a prisão por dias livres e o regime de semidetenção. O artigo 44.º não consentirá, por exemplo, que tendo sido suspensa a execução de uma pena de prisão que veio a ser revogada, se venha a colocar, posteriormente a tal revogação, a questão do cumprimento domiciliário da prisão. No entanto, a nova regra sobre descontos, constante do artigo 80.º, poderá suscitar algumas dificuldades e dúvidas quanto a este entendimento.
	Mas, quais os pressupostos definidores da possibilidade de recurso a esta nova forma de pena de substituição privativa de liberdade a aplicar como alternativa a um cumprimento de pena em ambiente de estabelecimento prisional?
	Desde logo, que ocorram os requisitos constantes do mencionado n.º 1, alínea a) – pena de prisão aplicada não superior a um ano e a conclusão de que tal forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição –.
Redacção final esta em linha com o sustentado pelo Prof. Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, pág. 331, quando escreveu que à pena privativa da liberdade, o tribunal deve preferir «uma pena alternativa ou de substituição sempre que, verificados os respectivos pressupostos de aplicação, a pena alternativa ou a de substituição se revelem adequadas e suficientes à realização das finalidades da punição. O que vale por dizer que são finalidades exclusivamente preventivas, de prevenção especial e de prevenção geral, não finalidades de compensação da culpa, que justificam a preferência por uma pena alternativa ou por uma pena de substituição e a sua efectiva aplicação».
E que impõe relembrarmos o escrito pela Prof. Fernanda Palma: «A protecção de bens jurídicos implica a utilização da pena para dissuadir a prática de crimes pelos cidadãos (prevenção geral negativa), incentivar a convicção de que as normas penais são válidas e eficazes e aprofundar a consciência dos valores jurídicos por parte dos cidadãos (prevenção geral positiva). A protecção de bens jurídicos significa ainda prevenção especial como dissuasão do próprio delinquente potencial. Por outro lado, a reintegração do agente significa a prevenção especial na escolha da pena ou na execução da pena. E, finalmente, a retribuição não é exigida necessariamente pela protecção de bens jurídicos. A pena como censura da vontade ou da decisão contrária ao direito pode ser desnecessária, segundo critérios preventivos especiais, ou ineficaz para a realização da prevenção geral» – As Alterações Reformadoras da Parte Geral do Código Penal na Revisão de 1995: Desmantelamento, Reforço e Paralisia da Sociedade Punitiva, in Jornadas sobre a Revisão do Código Penal (1998), AAFDL, pp. 25-51, e in Casos e Materiais de Direito Penal (2000), Almedina, pp. 31-51 (32/33) Apud citações constantes do Acórdão da Relação de Lisboa, proferido no recurso n.º 10509/20007-9, em 31 de Janeiro de 2008, e disponível em www.dgsi.pt”.
	O enfoque da motivação do recorrente vai no sentido de chamar à atenção sobre a ocorrência da previsão de condicionalismo determinante de aplicação do citado artigo 44.º, n.º 2, alínea e).
	Olvida, contudo, que, previamente, se impunha a conclusão de que daí adviesse a realização, por forma adequada e suficiente, das finalidades da punição.
	De qualquer modo, reportado ao momento da condenação, o tribunal tem de concluir que, no caso, essa forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Ou seja: a escolha desta pena ou regime depende sempre (além da verificação dos respectivos pressupostos “formais”) de o tribunal, previamente à obtenção do necessário consentimento do arguido, poder concluir (pressuposto “material”) que essa “forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
Ora, no caso vertente, afigura-se-nos que, em termos de prevenção geral positiva, o sentimento de impunidade relativamente ao recorrente, por parte da comunidade, facilmente poderia instalar-se, mantendo-se o mesmo em sua residência.
	Na verdade, os seus antecedentes criminais desaconselham o recurso a qualquer pena de substituição da pena de prisão em que foi condenado, uma vez que se mostraram ineficazes para essa realização.
	Com efeito, deles decorre, à exuberância, a sua absoluta insensibilidade aos juízos sérios de censura que lhe foram sendo sucessivamente dirigidos nas anteriores condenações, tendo já, inclusive, cumprido penas de prisão. 
	Tudo conjugado, a conclusão não pode ser outra que não a de que tais condenações anteriores não surtiram qualquer efeito dissuasor, como seria de esperar, o que denota que relativamente ao tipo de ilícito em causa, o recorrente tem uma personalidade adequada ao facto cometido.
	Acresce que, mesmo verificando-se esse primeiro pressuposto, sempre seria depois mister a verificação de uma das hipóteses previstas no n.º 2 apontado.
	Da factualidade provada na decisão recorrida não decorre um tal circunstancialismo.
	Dupla ordem de considerações, então, para que se não faculte o regime pretendido.
***
 DECISÃO
	Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente o recurso, confirmando a sentença recorrida.
	O arguido pagará a taxa de justiça de 8 (oito) UCS.
 (Processado em computador e revisto pelo primeiro signatário art. 94°, n.º 2 do CPP).
	Guimarães, 2/11/2009.

Acordam os Juizes da Relação de Guimarães: TRIBUNAL RECORRIDO : Tribunal Judicial de Celorico de Basto – (Processo comum colectivo n.º 97/05.7GACBT) RECORRENTE : J… RECORRIDO : Ministério Público OBJECTO DO RECURSO : Por Acórdão 4/05/2009 proferido nos autos em referência (fls. 964 a 996), foi decidido, além do mais, julgar a acusação deduzida nos autos parcialmente procedente por parcialmente provada, na parte ainda em apreciação, e, consequentemente: 1. Absolver os arguidos …da acusação na parte em que lhes é imputada a prática, em co-autoria e em concurso efectivo, de um crime de furto qualificado, na forma consumada e continuada, p. e p. pelos artgs 30º, nº 2, 203º, nº 1, e 204º, nº 2, al. e), todos do CP; e de um crime de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artgs 22º, 203º, nº 1, e 204º, nº 2, al. e), todos do CP; 2. Absolver os arguidos … da acusação na parte em que lhes é imputada, a cada um deles, a prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de receptação, p. e p. pelo artº 231º, nº 1, do CP; 3. Absolver o arguido J.. da acusação na parte em que lhe é imputada a prática, em autoria material e em concurso efectivo, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artgs 203º, nº 1, e 204º, nº 2, al. e), do CP; e de um crime de furto simples, na forma continuada, p. e p. pelos artgs 30º, nº 2, e 203º, nº 1, do CP; 4. Condenar o arguido J…, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artº 203º, nº 1, do CP, na pena de 1 (um) ano de prisão efectiva; 5. Condenar o arguido S…, pela prática, em autoria material e na forma tentada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artº 203º, nºs 1 e 2, com referência aos artgs 22º, nºs 1 e 2, al. a), 23º, nº 2, 73º, nº 1, al. c), 202º, al. c), e 204º, nº 4, todos do CP, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de 5 (cinco) euros, num total de 350 (trezentos e cinquenta) euros; Inconformado com essa decisão, interpôs recurso da mesma o arguido J…o qual finda a respectiva motivação com as seguintes conclusões: (…)*** Admitido o recurso, ao mesmo respondeu o M.P.º na 1.ª instância, nos termos de fls. 1067 a 1069, sustentando que deve ser negado provimento ao recurso apresentado mantendo-se a decisão recorrida nos seus precisos termos, com o que será feita JUSTIÇA.***Nesta Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento. ***Foi cumprido o art. 417, n.º 2 do CPP, não tendo sido apresentada resposta. ***Colhidos os vistos legais, procedeu-se à conferência, nada obstando ao conhecimento dos autos. *** Como é sabido, o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação – cfr. Art. 412, n.º 1 do Código de Processo Penal. Assim, as questões a decidir, e suscitadas pelo arguido, são: - Errada opção pela pena privativa da liberdade (devia Ter sido aplicada pena de multa ao arguido) - Se se mantiver a pena de prisão a mesma deverá ser cumprida em regime de permanência na habitação; Vejamos então. (…) *** 2. O cumprimento da pena em regime de permanência na habitação. Requer o arguido que, “Em alternativa, e para o caso de o sentimento geral da Justiça e as necessidades de prevenção e retribuição não se satisfazerem com a "simples" pena de multa, sempre será de ponderar a escolha de uma pena privativa da liberdade executada no regime de permanência na habitação”, pois “Estão cumpridos os requisitos da medida da pena, bem como os de prevenção geral, quer na sua formulação positiva, quer na sua formulação negativa, os de prevenção especial, os de retribuição e ainda os de reinserção, e o carácter restritivo da liberdade é castigo suficiente para o agente, embora lhe permita manter os laços familiares, essenciais à sua potencial reabilitação, ainda mais que o Arguido tem 3 filhos menores”. Acrescenta o Arguido que dá expressamente o seu consentimento nessa aplicação. Vejamos: Nos termos do disposto no art. 44° do Código Penal (redacção da Lei n.º 59/2007 de 4/09): "Se o condenado consentir, podem ser executados em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, sempre que o tribunal concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição: a) A pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano...". Ora, desde já diremos, como se faz no Ac. Relação do Porto de 20/09/2009, proc. n.º 42/06.2TAOVR-B.P1, Relator Desembargador Ricardo Costa e Silva, já disponível em www.itij.pt, que “o artigo 44º do CP refere-se ao “regime de permanência na habitação” não como uma pena de natureza autónoma, mas sim como um modo de execução da pena de prisão”. Na verdade, o regime do artigo 44º (Regime de permanência na habitação) visa poupar o condenado ao efeito criminógeno da reclusão em estabelecimento prisional, pelo período de uma pena curta, tendo em vista o binómio ganhos/ perdas – efeito ressocializador da pena versus a dessocialização inevitavelmente devida ao efeito criminógeno – que pode ser, será, desfavorável ao fim de ressocialização da pena, esgotando-se portanto, na substituição do meio prisional pela residência. A aplicação do regime do artigo 44º do CP, não visa proteger a normalidade de vida do condenado, mas tão só evitar que ele ingresse em meio prisional. No mais, a penosidade da sanção penal deve recair sobre ele, em termos o mais idênticos possível aos que resultariam de um cumprimento da pena na prisão. Não se visa descaracterizar a pena de prisão, no que ela tem de privação de liberdade, nem criar um regime de execução desproporcionadamente excepcional, face ao cumprimento efectivo da pena de prisão em estabelecimento próprio para tal fim. E não podem os condenados abrangidos por este regime, nestes moldes, queixar-se, nomeadamente, de que ele, ao impedi-los de trabalhar, prejudica a sua subsistência. Isso é a consequência natural de uma pena de prisão e o regime de cumprimento da pena de prisão em permanência na habitação apenas é aplicado aos condenados que em tal consintam, cabendo-lhes a responsabilidade da previsão da sua capacidade para se auto manterem, durante o tempo em que durar a situação em causa. Importa então considerar o artigo 44.º do CP, nomeadamente no segmento em que consigna: “1. Se o condenado consentir, podem ser executados em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, sempre que o tribunal concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição: a) A pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano; (…) 2. O limite máximo previsto no número anterior pode ser elevado para dois anos quando se verifiquem, à data da condenação, circunstâncias de natureza pessoal ou familiar do condenado que desaconselhem a privação da liberdade em estabelecimento prisional, nomeadamente: (…) e) Existência de familiar exclusivamente ao seu cuidado. (…).” Sobre a natureza assumida pelo regime assim instituído, e questões que dele podem emergir, opinaram já a Dr.ª Maria João Antunes, bem como o Desembargador Jorge Gonçalves, em comunicações realizadas nas Jornadas de Direito Penal, organizadas pelo CEJ, em Novembro de 2007, na Aula Magna da Reitoria da Universidade Clássica de Lisboa. A primeira, referindo, nomeadamente: “No artigo 44.º prevê-se agora o regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância. Uma nova pena de substituição privativa da liberdade, à qual são correspondentemente aplicáveis regras da Lei que regula a vigilância electrónica prevista no artigo 201.º do Código de Processo Penal (artigo 9.º da Lei n.º 59/2007). Substitui a pena de prisão aplicada em medida não superior a 1 ano; e o remanescente não superior a 1 ano da pena de prisão efectiva que exceder o tempo de privação da liberdade a que o arguido esteve sujeito em regime de detenção, prisão preventiva ou obrigação de permanência na habitação. Ou, excepcionalmente, o remanescente não superior a 2 anos, quando se verifiquem circunstâncias de natureza pessoal ou familiar do condenado que desaconselham a privação da liberdade em estabelecimento prisional, nomeadamente gravidez, idade inferior a 21 anos ou superior a 65 anos, doença ou deficiência graves, existência de menor a seu cargo, existência de familiar exclusivamente ao seu cuidado. O enquadramento do regime de permanência na habitação nas penas de substituição privativas da liberdade é para nós inequívoco, quando substitui – à semelhança da prisão por dias livres e do regime de semidetenção – pena de prisão em medida não superior a um ano e é de concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição [artigo 44.º, n.º 1, alínea a)]. Quando substitui o remanescente não superior a um ano – ou, excepcionalmente, dois – da pena de prisão efectiva que exceder o tempo de privação da liberdade a que o arguido esteve sujeito em cumprimento de medida de natureza processual e é de concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição [artigo 44.º, n.ºs 1, alínea a), e 2], já não estamos, verdadeiramente, perante uma pena de substituição, mas antes perante uma regra de execução da pena de prisão, semelhante à agora introduzida no artigo 62.º (Adaptação à liberdade condicional).” O segundo, adiantando: “O novo artigo 44.º, com a epígrafe Regime de permanência na habitação, veio estabelecer uma forma de execução domiciliária da prisão, podendo ser entendida como uma nova pena de substituição (pelo menos em sentido impróprio), a aplicar-se como alternativa ao cumprimento da prisão nos estabelecimentos prisionais, em condenações até um ano, ou quando estejam em causa condenações superiores, mas em que o remanescente a cumprir não exceda um ano, descontado o tempo de detenção, prisão preventiva ou obrigação de permanência na habitação. Excepcionalmente, pode ser uma alternativa em penas até dois anos. Esta nova pena de substituição/modo de execução, dependente do consentimento do condenado (o que também se exige no regime de semidetenção e na prestação de trabalho a favor da comunidade), tem a particularidade de associar ao cumprimento domiciliário a vigilância electrónica que, até ao momento, estava prevista apenas como mecanismo de fiscalização do cumprimento da medida de coacção de obrigação de permanência na habitação. Mecanismo este que também passa a estar associado à adaptação à liberdade condicional, nos termos do artigo 62.º, na nova redacção. A proposta de revisão do Código Penal colocava algumas dúvidas: seria ou não aplicável, ao regime de permanência na habitação, a legislação relativa à vigilância electrónica, designadamente a Lei n.º 122/99, de 20 de Agosto, pensada para a medida de coacção? O artigo 9.º da Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, soluciona a dúvida, estabelecendo que o disposto no n.º 1 do artigo 1.º, no artigo 2.º, n.º 2 a 5 do artigo 3.º, nos artigos 4.º a 6.º, nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 8.º e no artigo 9.º do mencionado diploma, é aplicável ao regime de permanência na habitação. Que disposições são essas? - As que dispõem sobre o consentimento (do arguido e de outros); - As que dispõem sobre o conteúdo da decisão (que admite o estabelecimento de autorizações de ausência) e a solicitação de prévia informação aos serviços encarregados da execução da medida sobre a situação pessoal, familiar, laboral ou social do arguido (a unidade de monitorização local colocada na habitação depende da existência de energia eléctrica – condições técnicas); - As relativas à execução, entidade encarregada da execução, deveres do condenado, causas de revogação e ao equipamento a utilizar na vigilância electrónica. Ora, afigura-se que, como pena de substituição, pelo menos em sentido impróprio, o momento para decidir da aplicação do regime de permanência na habitação é o da sentença condenatória, tal como ocorre com a prisão por dias livres e o regime de semidetenção. O artigo 44.º não consentirá, por exemplo, que tendo sido suspensa a execução de uma pena de prisão que veio a ser revogada, se venha a colocar, posteriormente a tal revogação, a questão do cumprimento domiciliário da prisão. No entanto, a nova regra sobre descontos, constante do artigo 80.º, poderá suscitar algumas dificuldades e dúvidas quanto a este entendimento. Mas, quais os pressupostos definidores da possibilidade de recurso a esta nova forma de pena de substituição privativa de liberdade a aplicar como alternativa a um cumprimento de pena em ambiente de estabelecimento prisional? Desde logo, que ocorram os requisitos constantes do mencionado n.º 1, alínea a) – pena de prisão aplicada não superior a um ano e a conclusão de que tal forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição –. Redacção final esta em linha com o sustentado pelo Prof. Figueiredo Dias, in Direito Penal Português, pág. 331, quando escreveu que à pena privativa da liberdade, o tribunal deve preferir «uma pena alternativa ou de substituição sempre que, verificados os respectivos pressupostos de aplicação, a pena alternativa ou a de substituição se revelem adequadas e suficientes à realização das finalidades da punição. O que vale por dizer que são finalidades exclusivamente preventivas, de prevenção especial e de prevenção geral, não finalidades de compensação da culpa, que justificam a preferência por uma pena alternativa ou por uma pena de substituição e a sua efectiva aplicação». E que impõe relembrarmos o escrito pela Prof. Fernanda Palma: «A protecção de bens jurídicos implica a utilização da pena para dissuadir a prática de crimes pelos cidadãos (prevenção geral negativa), incentivar a convicção de que as normas penais são válidas e eficazes e aprofundar a consciência dos valores jurídicos por parte dos cidadãos (prevenção geral positiva). A protecção de bens jurídicos significa ainda prevenção especial como dissuasão do próprio delinquente potencial. Por outro lado, a reintegração do agente significa a prevenção especial na escolha da pena ou na execução da pena. E, finalmente, a retribuição não é exigida necessariamente pela protecção de bens jurídicos. A pena como censura da vontade ou da decisão contrária ao direito pode ser desnecessária, segundo critérios preventivos especiais, ou ineficaz para a realização da prevenção geral» – As Alterações Reformadoras da Parte Geral do Código Penal na Revisão de 1995: Desmantelamento, Reforço e Paralisia da Sociedade Punitiva, in Jornadas sobre a Revisão do Código Penal (1998), AAFDL, pp. 25-51, e in Casos e Materiais de Direito Penal (2000), Almedina, pp. 31-51 (32/33) Apud citações constantes do Acórdão da Relação de Lisboa, proferido no recurso n.º 10509/20007-9, em 31 de Janeiro de 2008, e disponível em www.dgsi.pt”. O enfoque da motivação do recorrente vai no sentido de chamar à atenção sobre a ocorrência da previsão de condicionalismo determinante de aplicação do citado artigo 44.º, n.º 2, alínea e). Olvida, contudo, que, previamente, se impunha a conclusão de que daí adviesse a realização, por forma adequada e suficiente, das finalidades da punição. De qualquer modo, reportado ao momento da condenação, o tribunal tem de concluir que, no caso, essa forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Ou seja: a escolha desta pena ou regime depende sempre (além da verificação dos respectivos pressupostos “formais”) de o tribunal, previamente à obtenção do necessário consentimento do arguido, poder concluir (pressuposto “material”) que essa “forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”. Ora, no caso vertente, afigura-se-nos que, em termos de prevenção geral positiva, o sentimento de impunidade relativamente ao recorrente, por parte da comunidade, facilmente poderia instalar-se, mantendo-se o mesmo em sua residência. Na verdade, os seus antecedentes criminais desaconselham o recurso a qualquer pena de substituição da pena de prisão em que foi condenado, uma vez que se mostraram ineficazes para essa realização. Com efeito, deles decorre, à exuberância, a sua absoluta insensibilidade aos juízos sérios de censura que lhe foram sendo sucessivamente dirigidos nas anteriores condenações, tendo já, inclusive, cumprido penas de prisão. Tudo conjugado, a conclusão não pode ser outra que não a de que tais condenações anteriores não surtiram qualquer efeito dissuasor, como seria de esperar, o que denota que relativamente ao tipo de ilícito em causa, o recorrente tem uma personalidade adequada ao facto cometido. Acresce que, mesmo verificando-se esse primeiro pressuposto, sempre seria depois mister a verificação de uma das hipóteses previstas no n.º 2 apontado. Da factualidade provada na decisão recorrida não decorre um tal circunstancialismo. Dupla ordem de considerações, então, para que se não faculte o regime pretendido. *** DECISÃO Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente o recurso, confirmando a sentença recorrida. O arguido pagará a taxa de justiça de 8 (oito) UCS. (Processado em computador e revisto pelo primeiro signatário art. 94°, n.º 2 do CPP). Guimarães, 2/11/2009.