Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório; Recorrente (s): Companhia de Seguros [A], SA (ré); Recorrida: [B] (autor); ***** [B] demandou a seguradora Companhia de Seguros [A], SA, reclamando desta a quantia total de € 55.842,66, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, em consequência de acidente de viação, acrescida dos juros de mora legais, até integral pagamento. A Ré contestou, impugnando a culpa do seu segurado na produção do sinistro, assim como os danos peticionados, concluindo pela improcedência da acção. Saneado o processo e seleccionados os factos provados e a provar, realizou-se a audiência de julgamento, decidindo-se, a final, sobre a matéria de facto. Seguidamente foi proferida sentença em que se julgou a acção parcialmente procedente, condenando-se a Ré a pagar à Autora a quantia de € 32.500,00 (trinta e dois mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora sobre esta quantia, às taxas anuais sucessivamente aplicáveis, desde a data da citação, até integral pagamento. Inconformada com tal decisão, dela interpôs recurso a Autora, de cujas alegações se extraem, em súmula, as seguintes conclusões: I- Os danos patrimoniais decorrentes da IPP de que a A. ficou portadora mostram-se sobrevalorizados; II- Nos casos, como o é o em apreço, em que não se provou que a lesada sofrerá no futuro uma efectiva redução de rendimentos ou, sequer, que as sequelas impliquem esforços acrescidos no exercício da sua actividade, deverá recorrer-se, na fixação da indemnização, a critérios de equidade. III- Na verdade, atendendo a que não se demonstrou essa efectiva perda de rendimentos, não se poderá, na sentença, ficcionar a sua existência e atribuir-se indemnização baseada nessa redução que não é de prever que ocorra. IV- Considerando os elementos constantes dos autos, a indemnização devida a título de IPP não deverá exorbitar os 9.000€ V- Os danos morais da demandante foram sobrevalorizados, não se devendo exorbitar a quantia de 5.000€ para sua compensação; VI- Na petição inicial a A. liquidara em 766,64€ as suas perdas salariais resultantes do período de incapacidade temporária absoluta; VII- A declaração feita pela A na sua petição inicial de que o seu prejuízo a esse título não exorbita os 766,64€ deverá ser entendido como uma confissão que faz prova plena contra o confitente (cfr artigos 356º nº 1 e 358 n.º 1 do Código Civil) VIII- Pelo que a indemnização devida a esse título não deverá ser superior aos 766,64€ nos quais a própria demandante liquidou o seu prejuízo na petição inicial; IX- A douta sentença sob censura é, na parte respeitante à fixação da compensação por danos morais, actualizadora, pelo que os juros moratórios só serão devidos, quanto à mesma, desde a prolação da decisão. X- Os juros moratórios relativos à indemnização pela perda futura de capacidade de ganho só são devidos desde a data da notificação à recorrente do requerimento de ampliação do pedido. XI- Com efeito, a própria A apenas pediu juros moratórios nessa parte desde a data da notificação à requerente do pedido de ampliação e só com esse pedido se tornou líquida a indemnização. XII- Ao condenar no pagamento de juros contados desde a citação sobre a indemnização por IPP, o meritíssimo Sr. Juiz condena para além do pedido, pelo que, nessa parte, é nula a douta sentença sob censura (cfr artigo 661º e 668º n.º 1 alínea e) do CPC. XIII- A douta sentença sob censura violou as normas dos artigos 496º, 566º, 805º n.º 2 e 3 do Código Civil, 661º e 668º n.º 1 alínea e) e ainda a jurisprudência obrigatória do douto Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do STJ de 9 de Maio de 2002). Houve contra-alegações refutando os argumentos da apelante. II – Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar; O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das alegações, nos termos dos artigos 660º, nº 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 690º, nº 1, todos do Código de Processo Civil (CPC). A questão suscitada pela Recorrente radica apenas na sua discordância quanto ao montante indemnizatório arbitrado a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, por um lado, e quanto ao momento em que devem ser contados os juros moratórios, por outro. Colhidos os vistos, cumpre decidir. III – Fundamentos; 1. De facto; A factualidade dada como assente na sentença recorrida é a seguinte: 1. No dia 24.09.2004, cerca das 09h20m, na E.N. n.º 206, ao Km 55,900, lugar de Docim, em Quinchães, Fafe, ocorreu um acidente de viação, no qual intervieram o veículo automóvel ligeiro de mercadorias, particular, de matrícula QQ-69-19, conduzido pela autora, e o veículo automóvel ligeiro misto, particular, de matrícula 79-41-UM, conduzido por [C]. 2. O QQ circulava no sentido Pica-Fafe, pela hemi-faixa direita da estrada, atento o indicado sentido de marcha, seguindo o UM no mesmo sentido. 3. Ao chegar ao local referido em 1., e pretendendo mudar de direcção à sua esquerda a fim de entrar num prédio aí existente, a A. abrandou a sua marcha. 4. Ligou o sinal luminoso (pisca-pisca) da esquerda, aproximou-se com a devida antecedência do eixo da via, e parou. 5. Certificou-se que não existia trânsito em sentido contrário e que não vinha a ser ultrapassada. 6. À sua frente, até à curva mais próxima, não era visível qualquer outro veículo. 7. No preciso momento em que se preparava para reiniciar a sua marcha, surgiu na sua retaguarda o UM. 8. O condutor do UM, ao aperceber-se da presença do veículo conduzido pela autora, ainda travou, deixando no pavimento um rasto de travagem com o comprimento de 14,30m; 9. Apesar disso, não conseguiu parar nem controlar o veículo. 10. O condutor do UM seguia sem atenção ao trânsito que se fazia sentir na via. 11. A colisão ocorreu na hemi-faixa direita, junto ao eixo da via, atento o indicado sentido de marcha de ambos os veículos. 12. O embate deu-se entre a frente do UM e a traseira do QQ. 13. Mercê do referido acidente o QQ sofreu várias amolgadelas e a destruição da traseira do pára-choques, escape, mala e guarda-lamas esquerdo, tendo o custo da reparação sido pago pela ré à entidade patronal da Autora, sua proprietária. 14. No local, a estrada tem a largura de 6,25 m. 15. Em consequência do acidente a Autora sofreu fractura da clavícula direita, hematoma no ombro direito e fractura parcial de 2 dentes. 16. Imediatamente após o acidente, a autora foi conduzida para o Hospital de São José, em Fafe, onde recebeu tratamento. 17. Posteriormente, andou em tratamentos no serviço de ortopedia do referido hospital e no dentista. 18. Por via dessas lesões, a autora esteve com incapacidade absoluta para o trabalho por um período de 41 dias, após o que teve alta médica. 19. A autora teve um período de incapacidade temporária total geral de 15 dias. 21. Mercê de tais lesões e tratamento sofreu dores que se fixam num grau de 3 numa escala de 1 a 7 e teve angústia, incómodos e sofrimento moral. 22. Durante o referido período de doença e convalescença, andou taciturna, deprimida e triste. 23. Apesar de curada das lesões físicas, ainda sente algumas dores no ombro direito, principalmente por ocasião das mudanças climatéricas. 24. Sentiu o desconforto e incómodos inerentes à assistência hospitalar, à retenção e imobilização no leito e à mudança de hábitos do seu quotidiano, em resultado da doença, incapacidade e dos tratamentos. 25. A fractura dos dois dentes provocou à autora um dano estético que se fixa em grau 1, numa escala de 1 a 7. 26. Ao tempo do acidente, a autora exercia a profissão de encarregada numa empresa de confecções têxteis, auferindo o vencimento mensal de 591,60 €. 27. Durante o período de incapacidade absoluta para o trabalho referido em 18. esteve sem auferir vencimento. 28. Em tratamentos, ajudas técnicas, medicamentos e consultas, despendeu a Autora a quantia de € 431,65. 29. A autora conduzia o QQ mediante incumbência e na prossecução de interesses da sua entidade patronal. 30. Em resultado do embate referido em 1., a autora ficou com uma IPP de 5 %. 31. A Autora [D] nasceu em 29 de Fevereiro de 1976, natural de Fafe, filha de [E] e de [F]. 32. Por contrato de seguro titulado pela Apólice n.º 0900049541 a responsabilidade civil por danos decorrente da circulação do UM foi transferida para a ré. ***** 2. De direito; a) Compensação pelos danos patrimoniais e não patrimoniais; Começa a recorrente por referir que não se provou que a lesada sofrerá no futuro uma efectiva redução de rendimentos ou que as sequelas impliquem esforços acrescidos no exercício da sua actividade, pelo que a indemnização se mostra sobrevalorizada, levando em linha de conta uma efectiva perda de rendimentos futuros, que não ocorrerá. A este título, mostra-se provado que a lesada fracturou a clavícula direita, teve hematoma no ombro direito e fractura parcial de dois dentes (ponto provado nº 15); que, apesar de curada das lesões físicas, ainda sente dores no ombro direito, principalmente por ocasião das mudanças climatéricas (ponto provado n23); que, em resultado do acidente de viação, ficou com uma IPP de 5% (ponto provado nº 30). Perante esta factualidade provada, mormente a dita incapacidade parcial permanente de 5%, é manifesto que, por via das lesões corporais e sequelas que ficou a padecer, a lesada ficou afectada na sua capacidade funcional de ganho, a qual lhe acarretará necessariamente maiores esforços. No Acórdão de 8/6/93 do S.T.J. que se afasta da determinação das indemnizações por simples apelo a tabelas ou fórmulas, considerou-se que “o cálculo da frustração do ganho deverá conduzir a um capital que considere a produção de um rendimento durante todo o tempo de vida activa da vítima, adequado ao que auferiria se não fora a lesão” (cfr. CJ/STJ, II, p. 138). É certo que a fixação da indemnização pelos danos futuros decorrentes deve fazer-se sempre com recurso à equidade, nas fronteiras dos artºs 564º, nº 2, 566º, nº 3, 496º, nº 3 e 494º, como vem sendo entendimento unânime da jurisprudência [Ver, entre outros, os Acs. do STJ de 06.07.00 e 25.06.02, CJ/STJ-00-II-144 e 02-II-128, respectivamente; e de 30.10.01, 15.06.04 e 11.01.05, disponíveis na base citada, respectivamente.] Equidade não significa porém arbitrariedade, e em tal juízo deve ter-se em conta a particular situação do caso concreto e do próprio dano que importa reparar (a equidade terá em vista aqui aproximar a situação da lesada, que sofreu uma diminuição da sua capacidade de ganho futura, à situação que teria no futuro não fora a lesão sofrida). Nesta problemática da fixação do quantum da indemnização devida pelos prejuízos sofridos em virtude da afectação das capacidades funcionais, tem-se entendido, a nível jurisprudencial, que, muito embora não se deva fazê-la corresponder simplesmente ao resultado obtido pela mera aplicação de tabelas financeiras utilizadas no âmbito laboral, importa considerar que “o cálculo da frustração do ganho deverá conduzir a um capital que considere a produção de um rendimento durante todo o tempo de vida activa da vítima, adequado ao que auferiria se não fora a lesão” (cfr. Acórdão do STJ de 8/6/93 CJ/STJ, II, p. 138). Ora, como emerge da própria sentença recorrida, na fixação desse quantum indemnizatório, não se atendeu a meras fórmulas matemáticas, mas, tendo em conta o circunstancialismo do caso concreto, estribou-se em prudentes critérios de equidade. Assim, afigura-se-nos ser de manter a indemnização fixada pelos danos patrimoniais. * Os danos não patrimoniais sofridos pela autora [D] são aqueles que não atingem os bens materiais da lesada ou que, de qualquer modo, não alteram a sua situação patrimonial - formulação negativa -, ou seja, aqueles danos que têm por objecto um bem ou interesse sem conteúdo patrimonial, insusceptível, em rigor, de avaliação pecuniária ). A indemnização não visa propriamente ressarcir, tornar indemne o lesado, mas oferecer-lhe uma compensação que contrabalance o mal sofrido - ver De Cupis, Il Dano, Teoria Generale della Ressponsabilità Civile, Milano, 1966, pags. 44 e segs., e Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, 4ª edição, pag. 560 . Segundo o artigo 496º nº 1 do C.C., na fixação da indemnização devem atender-se os danos não patrimoniais que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito. O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção o grau de culpa do lesante, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso - artigos 496º nº 3 e 494º do C.C. - e também aos padrões de indemnização geralmente adoptados na jurisprudência ( devendo o dano ser valorado por referência ao valor que seria achado se o bem violado tivesse sido a vida do lesado - ver o Ac. S.T.J. de 28/10/92, in C.J. Ano XVII, Tomo IV, pag 29 ). Os danos sofridos são indemnizáveis, pois têm gravidade suficiente para merecer a tutela do direito, já que se consubstanciam numa lesão sofrida pela demandante – artº 496º, nº 1. A este título, o montante de €: 12.500,00 mostra-se acertado, fundamentando devidamente o Mmº juiz a quo o valor arbitrado, ao invés da recorrente, que se limita a afirmar tout court que se mostra sobrevalorizado, adiantando que não deve exorbitar a quantia de € 5.000,00, sem justificar minimamente tal quantitativo. Com efeito, como expressa, em sede de motivação, a 1ª instância, a quantia fixada na sentença teve em conta as lesões, sofrimento e tristeza que a lesada sofreu, o período de doença e de incapacidade total, as sequelas demandadas e ainda o quantum doloris de grau 3 e o dano estético de grau 1 (numa escala de sete graus). * Também a recorrente argumenta que a autora reclamou a quantia de € 766,64, a título de perdas salariais, na petição inicial, o que traduz uma confissão, não podendo o tribunal a quo fixar montante superior – o de € 808, 52, como o fez. Salvo o devido respeito, não assiste razão à recorrente. Como decorre do disposto no artº 661º, nº 1, do CPC, o julgador apenas está vinculado ao pedido global de indemnização formulado na petição e não a cada uma das parcelas que a compõem[i]. O referido valor referente às perdas salariais - €: 808,52 – fixado pela 1ª instância resulta, aliás, de mero cálculo aritmético, tomando por base o salário mensal auferido pela lesada - €: 591,60 – (facto provado nº 26) e o período de incapacidade absoluta para o trabalho – 41 dias – sem auferir qualquer remuneração (factos provados nºs 18 e 27). Tal quantia não é mais do que uma das parcelas que integram o pedido global da indemnização, não sendo este excedido. Destarte, mostra-se correcto o montante indemnizatório fixado a este título. b) Momento em que devem ser contados os juros moratórios; Contrapõe a recorrente que os juros moratórios só devem ser contados a partir da ampliação do pedido, quanto à indemnização relativa à perda futura da capacidade de ganho. Mais defende que esses juros, quanto aos danos não patrimoniais, devem ser contabilizados a partir da sentença, por se tratar de uma compensação já actualizadora, aquando da sua fixação. Ora, quanto a estes últimos, como se refere expressamente na sentença, arbitrou-se a indemnização por danos não patrimoniais, sem se proceder a qualquer actualização. Daí que, tendo-se em conta o disposto no artº 805º, nº 3, do Código Civil, justifica-se o vencimento de juros de mora, a partir da citação e não da prolação da decisão. Em suma, os juros são devidos desde a citação, visto a indemnização pelos danos morais não ter sido calculada com referência à data da sentença da 1ª instância. Também no tocante aos juros de mora pelos danos patrimoniais futuros (perda da capacidade de ganho) – na quantia de €: 15.000,00 – e objecto de ampliação do pedido, não assiste razão à recorrente. Como é consabido, o nº 2 do art. 273º, do CPC, permite que o pedido seja ampliado até ao momento do encerramento da discussão da matéria de facto em 1ª instância, desde que a ampliação constitua desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo, podendo tal ampliação inclusivamente envolver uma cumulação sucessiva de pedidos, os quais, como que se “integram” na petição inicial – cfr. ainda artº 569º, do Código Civil. “Ora, o pedido acessório de juros moratórios constitui desenvolvimento do pedido formulado na petição inicial, entendendo-se esta, no caso, como integrando já a admitida ampliação do pedido. Os juros de mora pelo cumprimento tardio da prestação por parte do devedor são uma verdadeira e própria indemnização pelo prejuízo causado com o retardamento, visando garantir ao credor uma correspondência entre a quantia que tinha direito a receber, e a quantia que lhe é equivalente na data em que efectivamente a recebe - é o que decorre dos arts. 804º, nº 1 e 806º, ambos do Código Civil” [ii]. Assim sendo, os juros foram correctamente fixados desde a data da citação, improcedendo, pois, as conclusões 10ª a 13ª das alegações de apelação Em conclusão, confirma-se a decisão recorrida. ***** IV – Decisão; Em face do exposto, na improcedência da apelação, acordam os Juízes desta secção cível em confirmar a sentença recorrida. Custas pelas apelante. Guimarães, [i] Neste sentido, vide Acórdão do STJ, de 18.11.75; BMJ, 251º-107. [ii] Neste sentido, veja-se o Acórdão do STJ de 06.11.2007, que seguimos de perto, in www.dgsi.pt.
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório; Recorrente (s): Companhia de Seguros [A], SA (ré); Recorrida: [B] (autor); ***** [B] demandou a seguradora Companhia de Seguros [A], SA, reclamando desta a quantia total de € 55.842,66, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, em consequência de acidente de viação, acrescida dos juros de mora legais, até integral pagamento. A Ré contestou, impugnando a culpa do seu segurado na produção do sinistro, assim como os danos peticionados, concluindo pela improcedência da acção. Saneado o processo e seleccionados os factos provados e a provar, realizou-se a audiência de julgamento, decidindo-se, a final, sobre a matéria de facto. Seguidamente foi proferida sentença em que se julgou a acção parcialmente procedente, condenando-se a Ré a pagar à Autora a quantia de € 32.500,00 (trinta e dois mil e quinhentos euros), acrescida de juros de mora sobre esta quantia, às taxas anuais sucessivamente aplicáveis, desde a data da citação, até integral pagamento. Inconformada com tal decisão, dela interpôs recurso a Autora, de cujas alegações se extraem, em súmula, as seguintes conclusões: I- Os danos patrimoniais decorrentes da IPP de que a A. ficou portadora mostram-se sobrevalorizados; II- Nos casos, como o é o em apreço, em que não se provou que a lesada sofrerá no futuro uma efectiva redução de rendimentos ou, sequer, que as sequelas impliquem esforços acrescidos no exercício da sua actividade, deverá recorrer-se, na fixação da indemnização, a critérios de equidade. III- Na verdade, atendendo a que não se demonstrou essa efectiva perda de rendimentos, não se poderá, na sentença, ficcionar a sua existência e atribuir-se indemnização baseada nessa redução que não é de prever que ocorra. IV- Considerando os elementos constantes dos autos, a indemnização devida a título de IPP não deverá exorbitar os 9.000€ V- Os danos morais da demandante foram sobrevalorizados, não se devendo exorbitar a quantia de 5.000€ para sua compensação; VI- Na petição inicial a A. liquidara em 766,64€ as suas perdas salariais resultantes do período de incapacidade temporária absoluta; VII- A declaração feita pela A na sua petição inicial de que o seu prejuízo a esse título não exorbita os 766,64€ deverá ser entendido como uma confissão que faz prova plena contra o confitente (cfr artigos 356º nº 1 e 358 n.º 1 do Código Civil) VIII- Pelo que a indemnização devida a esse título não deverá ser superior aos 766,64€ nos quais a própria demandante liquidou o seu prejuízo na petição inicial; IX- A douta sentença sob censura é, na parte respeitante à fixação da compensação por danos morais, actualizadora, pelo que os juros moratórios só serão devidos, quanto à mesma, desde a prolação da decisão. X- Os juros moratórios relativos à indemnização pela perda futura de capacidade de ganho só são devidos desde a data da notificação à recorrente do requerimento de ampliação do pedido. XI- Com efeito, a própria A apenas pediu juros moratórios nessa parte desde a data da notificação à requerente do pedido de ampliação e só com esse pedido se tornou líquida a indemnização. XII- Ao condenar no pagamento de juros contados desde a citação sobre a indemnização por IPP, o meritíssimo Sr. Juiz condena para além do pedido, pelo que, nessa parte, é nula a douta sentença sob censura (cfr artigo 661º e 668º n.º 1 alínea e) do CPC. XIII- A douta sentença sob censura violou as normas dos artigos 496º, 566º, 805º n.º 2 e 3 do Código Civil, 661º e 668º n.º 1 alínea e) e ainda a jurisprudência obrigatória do douto Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do STJ de 9 de Maio de 2002). Houve contra-alegações refutando os argumentos da apelante. II – Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar; O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das alegações, nos termos dos artigos 660º, nº 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 690º, nº 1, todos do Código de Processo Civil (CPC). A questão suscitada pela Recorrente radica apenas na sua discordância quanto ao montante indemnizatório arbitrado a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, por um lado, e quanto ao momento em que devem ser contados os juros moratórios, por outro. Colhidos os vistos, cumpre decidir. III – Fundamentos; 1. De facto; A factualidade dada como assente na sentença recorrida é a seguinte: 1. No dia 24.09.2004, cerca das 09h20m, na E.N. n.º 206, ao Km 55,900, lugar de Docim, em Quinchães, Fafe, ocorreu um acidente de viação, no qual intervieram o veículo automóvel ligeiro de mercadorias, particular, de matrícula QQ-69-19, conduzido pela autora, e o veículo automóvel ligeiro misto, particular, de matrícula 79-41-UM, conduzido por [C]. 2. O QQ circulava no sentido Pica-Fafe, pela hemi-faixa direita da estrada, atento o indicado sentido de marcha, seguindo o UM no mesmo sentido. 3. Ao chegar ao local referido em 1., e pretendendo mudar de direcção à sua esquerda a fim de entrar num prédio aí existente, a A. abrandou a sua marcha. 4. Ligou o sinal luminoso (pisca-pisca) da esquerda, aproximou-se com a devida antecedência do eixo da via, e parou. 5. Certificou-se que não existia trânsito em sentido contrário e que não vinha a ser ultrapassada. 6. À sua frente, até à curva mais próxima, não era visível qualquer outro veículo. 7. No preciso momento em que se preparava para reiniciar a sua marcha, surgiu na sua retaguarda o UM. 8. O condutor do UM, ao aperceber-se da presença do veículo conduzido pela autora, ainda travou, deixando no pavimento um rasto de travagem com o comprimento de 14,30m; 9. Apesar disso, não conseguiu parar nem controlar o veículo. 10. O condutor do UM seguia sem atenção ao trânsito que se fazia sentir na via. 11. A colisão ocorreu na hemi-faixa direita, junto ao eixo da via, atento o indicado sentido de marcha de ambos os veículos. 12. O embate deu-se entre a frente do UM e a traseira do QQ. 13. Mercê do referido acidente o QQ sofreu várias amolgadelas e a destruição da traseira do pára-choques, escape, mala e guarda-lamas esquerdo, tendo o custo da reparação sido pago pela ré à entidade patronal da Autora, sua proprietária. 14. No local, a estrada tem a largura de 6,25 m. 15. Em consequência do acidente a Autora sofreu fractura da clavícula direita, hematoma no ombro direito e fractura parcial de 2 dentes. 16. Imediatamente após o acidente, a autora foi conduzida para o Hospital de São José, em Fafe, onde recebeu tratamento. 17. Posteriormente, andou em tratamentos no serviço de ortopedia do referido hospital e no dentista. 18. Por via dessas lesões, a autora esteve com incapacidade absoluta para o trabalho por um período de 41 dias, após o que teve alta médica. 19. A autora teve um período de incapacidade temporária total geral de 15 dias. 21. Mercê de tais lesões e tratamento sofreu dores que se fixam num grau de 3 numa escala de 1 a 7 e teve angústia, incómodos e sofrimento moral. 22. Durante o referido período de doença e convalescença, andou taciturna, deprimida e triste. 23. Apesar de curada das lesões físicas, ainda sente algumas dores no ombro direito, principalmente por ocasião das mudanças climatéricas. 24. Sentiu o desconforto e incómodos inerentes à assistência hospitalar, à retenção e imobilização no leito e à mudança de hábitos do seu quotidiano, em resultado da doença, incapacidade e dos tratamentos. 25. A fractura dos dois dentes provocou à autora um dano estético que se fixa em grau 1, numa escala de 1 a 7. 26. Ao tempo do acidente, a autora exercia a profissão de encarregada numa empresa de confecções têxteis, auferindo o vencimento mensal de 591,60 €. 27. Durante o período de incapacidade absoluta para o trabalho referido em 18. esteve sem auferir vencimento. 28. Em tratamentos, ajudas técnicas, medicamentos e consultas, despendeu a Autora a quantia de € 431,65. 29. A autora conduzia o QQ mediante incumbência e na prossecução de interesses da sua entidade patronal. 30. Em resultado do embate referido em 1., a autora ficou com uma IPP de 5 %. 31. A Autora [D] nasceu em 29 de Fevereiro de 1976, natural de Fafe, filha de [E] e de [F]. 32. Por contrato de seguro titulado pela Apólice n.º 0900049541 a responsabilidade civil por danos decorrente da circulação do UM foi transferida para a ré. ***** 2. De direito; a) Compensação pelos danos patrimoniais e não patrimoniais; Começa a recorrente por referir que não se provou que a lesada sofrerá no futuro uma efectiva redução de rendimentos ou que as sequelas impliquem esforços acrescidos no exercício da sua actividade, pelo que a indemnização se mostra sobrevalorizada, levando em linha de conta uma efectiva perda de rendimentos futuros, que não ocorrerá. A este título, mostra-se provado que a lesada fracturou a clavícula direita, teve hematoma no ombro direito e fractura parcial de dois dentes (ponto provado nº 15); que, apesar de curada das lesões físicas, ainda sente dores no ombro direito, principalmente por ocasião das mudanças climatéricas (ponto provado n23); que, em resultado do acidente de viação, ficou com uma IPP de 5% (ponto provado nº 30). Perante esta factualidade provada, mormente a dita incapacidade parcial permanente de 5%, é manifesto que, por via das lesões corporais e sequelas que ficou a padecer, a lesada ficou afectada na sua capacidade funcional de ganho, a qual lhe acarretará necessariamente maiores esforços. No Acórdão de 8/6/93 do S.T.J. que se afasta da determinação das indemnizações por simples apelo a tabelas ou fórmulas, considerou-se que “o cálculo da frustração do ganho deverá conduzir a um capital que considere a produção de um rendimento durante todo o tempo de vida activa da vítima, adequado ao que auferiria se não fora a lesão” (cfr. CJ/STJ, II, p. 138). É certo que a fixação da indemnização pelos danos futuros decorrentes deve fazer-se sempre com recurso à equidade, nas fronteiras dos artºs 564º, nº 2, 566º, nº 3, 496º, nº 3 e 494º, como vem sendo entendimento unânime da jurisprudência [Ver, entre outros, os Acs. do STJ de 06.07.00 e 25.06.02, CJ/STJ-00-II-144 e 02-II-128, respectivamente; e de 30.10.01, 15.06.04 e 11.01.05, disponíveis na base citada, respectivamente.] Equidade não significa porém arbitrariedade, e em tal juízo deve ter-se em conta a particular situação do caso concreto e do próprio dano que importa reparar (a equidade terá em vista aqui aproximar a situação da lesada, que sofreu uma diminuição da sua capacidade de ganho futura, à situação que teria no futuro não fora a lesão sofrida). Nesta problemática da fixação do quantum da indemnização devida pelos prejuízos sofridos em virtude da afectação das capacidades funcionais, tem-se entendido, a nível jurisprudencial, que, muito embora não se deva fazê-la corresponder simplesmente ao resultado obtido pela mera aplicação de tabelas financeiras utilizadas no âmbito laboral, importa considerar que “o cálculo da frustração do ganho deverá conduzir a um capital que considere a produção de um rendimento durante todo o tempo de vida activa da vítima, adequado ao que auferiria se não fora a lesão” (cfr. Acórdão do STJ de 8/6/93 CJ/STJ, II, p. 138). Ora, como emerge da própria sentença recorrida, na fixação desse quantum indemnizatório, não se atendeu a meras fórmulas matemáticas, mas, tendo em conta o circunstancialismo do caso concreto, estribou-se em prudentes critérios de equidade. Assim, afigura-se-nos ser de manter a indemnização fixada pelos danos patrimoniais. * Os danos não patrimoniais sofridos pela autora [D] são aqueles que não atingem os bens materiais da lesada ou que, de qualquer modo, não alteram a sua situação patrimonial - formulação negativa -, ou seja, aqueles danos que têm por objecto um bem ou interesse sem conteúdo patrimonial, insusceptível, em rigor, de avaliação pecuniária ). A indemnização não visa propriamente ressarcir, tornar indemne o lesado, mas oferecer-lhe uma compensação que contrabalance o mal sofrido - ver De Cupis, Il Dano, Teoria Generale della Ressponsabilità Civile, Milano, 1966, pags. 44 e segs., e Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, 4ª edição, pag. 560 . Segundo o artigo 496º nº 1 do C.C., na fixação da indemnização devem atender-se os danos não patrimoniais que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito. O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção o grau de culpa do lesante, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso - artigos 496º nº 3 e 494º do C.C. - e também aos padrões de indemnização geralmente adoptados na jurisprudência ( devendo o dano ser valorado por referência ao valor que seria achado se o bem violado tivesse sido a vida do lesado - ver o Ac. S.T.J. de 28/10/92, in C.J. Ano XVII, Tomo IV, pag 29 ). Os danos sofridos são indemnizáveis, pois têm gravidade suficiente para merecer a tutela do direito, já que se consubstanciam numa lesão sofrida pela demandante – artº 496º, nº 1. A este título, o montante de €: 12.500,00 mostra-se acertado, fundamentando devidamente o Mmº juiz a quo o valor arbitrado, ao invés da recorrente, que se limita a afirmar tout court que se mostra sobrevalorizado, adiantando que não deve exorbitar a quantia de € 5.000,00, sem justificar minimamente tal quantitativo. Com efeito, como expressa, em sede de motivação, a 1ª instância, a quantia fixada na sentença teve em conta as lesões, sofrimento e tristeza que a lesada sofreu, o período de doença e de incapacidade total, as sequelas demandadas e ainda o quantum doloris de grau 3 e o dano estético de grau 1 (numa escala de sete graus). * Também a recorrente argumenta que a autora reclamou a quantia de € 766,64, a título de perdas salariais, na petição inicial, o que traduz uma confissão, não podendo o tribunal a quo fixar montante superior – o de € 808, 52, como o fez. Salvo o devido respeito, não assiste razão à recorrente. Como decorre do disposto no artº 661º, nº 1, do CPC, o julgador apenas está vinculado ao pedido global de indemnização formulado na petição e não a cada uma das parcelas que a compõem[i]. O referido valor referente às perdas salariais - €: 808,52 – fixado pela 1ª instância resulta, aliás, de mero cálculo aritmético, tomando por base o salário mensal auferido pela lesada - €: 591,60 – (facto provado nº 26) e o período de incapacidade absoluta para o trabalho – 41 dias – sem auferir qualquer remuneração (factos provados nºs 18 e 27). Tal quantia não é mais do que uma das parcelas que integram o pedido global da indemnização, não sendo este excedido. Destarte, mostra-se correcto o montante indemnizatório fixado a este título. b) Momento em que devem ser contados os juros moratórios; Contrapõe a recorrente que os juros moratórios só devem ser contados a partir da ampliação do pedido, quanto à indemnização relativa à perda futura da capacidade de ganho. Mais defende que esses juros, quanto aos danos não patrimoniais, devem ser contabilizados a partir da sentença, por se tratar de uma compensação já actualizadora, aquando da sua fixação. Ora, quanto a estes últimos, como se refere expressamente na sentença, arbitrou-se a indemnização por danos não patrimoniais, sem se proceder a qualquer actualização. Daí que, tendo-se em conta o disposto no artº 805º, nº 3, do Código Civil, justifica-se o vencimento de juros de mora, a partir da citação e não da prolação da decisão. Em suma, os juros são devidos desde a citação, visto a indemnização pelos danos morais não ter sido calculada com referência à data da sentença da 1ª instância. Também no tocante aos juros de mora pelos danos patrimoniais futuros (perda da capacidade de ganho) – na quantia de €: 15.000,00 – e objecto de ampliação do pedido, não assiste razão à recorrente. Como é consabido, o nº 2 do art. 273º, do CPC, permite que o pedido seja ampliado até ao momento do encerramento da discussão da matéria de facto em 1ª instância, desde que a ampliação constitua desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo, podendo tal ampliação inclusivamente envolver uma cumulação sucessiva de pedidos, os quais, como que se “integram” na petição inicial – cfr. ainda artº 569º, do Código Civil. “Ora, o pedido acessório de juros moratórios constitui desenvolvimento do pedido formulado na petição inicial, entendendo-se esta, no caso, como integrando já a admitida ampliação do pedido. Os juros de mora pelo cumprimento tardio da prestação por parte do devedor são uma verdadeira e própria indemnização pelo prejuízo causado com o retardamento, visando garantir ao credor uma correspondência entre a quantia que tinha direito a receber, e a quantia que lhe é equivalente na data em que efectivamente a recebe - é o que decorre dos arts. 804º, nº 1 e 806º, ambos do Código Civil” [ii]. Assim sendo, os juros foram correctamente fixados desde a data da citação, improcedendo, pois, as conclusões 10ª a 13ª das alegações de apelação Em conclusão, confirma-se a decisão recorrida. ***** IV – Decisão; Em face do exposto, na improcedência da apelação, acordam os Juízes desta secção cível em confirmar a sentença recorrida. Custas pelas apelante. Guimarães, [i] Neste sentido, vide Acórdão do STJ, de 18.11.75; BMJ, 251º-107. [ii] Neste sentido, veja-se o Acórdão do STJ de 06.11.2007, que seguimos de perto, in www.dgsi.pt.