Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: RELATÓRIO. JF intentou a presente acção declarativa com processo ordinário contra Companhia de Seguros …, SA alegando, em síntese, que no dia 18/07/2004 conduzia o seu motociclo de matrícula …-NQ, quando foi embatido pelo veículo de ligeiro de passageiros de matrícula …-GZ, seguro pela ré, que seguia em sentido contrário e saiu da sua mão de trânsito, invadindo a faixa de rodagem do motociclo do autor e assim lhe causando lesões e outros danos, computando os respectivos valores em 1 325,00 euros pela privação de uso do veículo, 12 500,00 pelos danos não patrimoniais, 24 000,00 euros pela incapacidade temporária absoluta, 40 000,00 euros pela incapacidade permanente parcial, 1 991,34 pelas despesas médicas, 1 321,99 euros por outras despesas, para além de não se encontrar curado e de, no futuro, necessitar de novos tratamentos. Concluiu, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 81 138,33 euros acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação e até integral pagamento, bem como indemnização pelos danos futuros, a liquidar em execução de sentença. A ré contestou alegando, em síntese, que aceita a responsabilidade do seu segurado, embora desconhecendo alguns pormenores do embate e impugnando a extensão dos danos invocados pelo autor. Concluiu pedindo que a acção fosse julgada de acordo com a prova a produzir. O autor replicou mantendo o alegado na petição inicial. Saneados os autos, procedeu-se a julgamento, findo o qual foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar ao autor a quantia de 23 136,33 euros, a título de danos patrimoniais (2 536,33 euros por despesas, 8 000,00 euros pela ITA e 12 600,00 euros pela IPP), acrescida de juros desde a citação até integral pagamento e de 12 500,00 euros, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros desde a data da sentença até integral pagamento. * Inconformadas, ambas as partes interpuseram recurso, os quais foram admitidos como apelação, com subida imediata, nos autos e com efeito devolutivo. * O recorrente autor alegou, formulando as seguintes conclusões: 1ª – Não questiona o recorrente a parte da douta sentença recorrida, na parte em que atribuiu a culpa na produção do sinistro ao condutor do veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula …-GZ, segurado na ré seguradora Companhia de Seguros …, SA. 2ª – Já que, de acordo com a prova produzida e com os factos provados, essa culpa é exclusivamente imputável ao condutor do veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula …-GZ, segurado na ré seguradora Companhia de Seguros …, SA. 3ª – Discorda, porém, o recorrente em relação ao valor de 12 600,00 euros, que lhe foi fixado a título de indemnização pela Incapacidade Parcial Permanente, para o trabalho de 8%. 4ª – Já que é notoriamente insuficiente e irrisório, para ressarcir o recorrente dos danos, a este título, sofridos. 5ª – O autor/recorrente contava, à data do sinistro dos presentes autos, 48 anos de idade, auferia um rendimento, com o empenho do seu trabalho de dezoito (18,00 euros) por dia, sem fins-de-semana e sem férias (30 dias x 100,00 euros) 3 000,00 euros (no mínimo) ficou a padecer de uma IPP de 8% e a expectativa da vida activa cifra-se nos 75 anos de idade. 6ª – O montante de 12 600,00 euros, fixado a este título, é, assim, insuficiente e insuficiente. 7ª – Justo e equitativo é o valor de 40 000,00 euros, que se reclama. 8ª – O Meritíssimo Juiz do Tribunal de Primeira Instância não fez qualquer actualização em relação à indemnização – compensação – pelos danos de natureza não patrimonial. 9ª – Não se justifica, assim, a aplicação da doutrina expressa no acórdão de unificação de jurisprudência nº 4/2002, de 9 de Maio de 2002. 10ª – Os juros incidentes sobre a quantia indemnizatória relativa aos danos de natureza não patrimonial devem, pois, ser fixados, à taxa legal de 4%, desde a data da citação, até efectivo pagamento. 11ª – Decidindo de modo diverso, fez a douta sentença recorrida má aplicação do direito aos factos provados e violou, além de outras normas, o disposto nos artigos 496º, 562º, 564º e 805º, do Código Civil. * A recorrente ré alegou, formulando as seguintes conclusões: 1 – A recorrente …, SA não questiona a obrigação de indemnizar o autor pelos danos sofridos em consequência do acidente de viação melhor descrito nos autos e cuja responsabilidade é exclusivamente imputável ao condutor do veículo por si garantido. 2 – Discorda a recorrente, no entanto, com a liquidação da indemnização danos efectuada na douta sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz a quo quanto aos lucros cessantes, seja a título de ITA, seja por IPP e consequente indemnização fixada, e ainda quanto à compensação pelos danos não patrimoniais arbitrada. 3 – Assim, quanto ao período de ITA, sempre se dirá que o período considerado na douta sentença de 240 (duzentos e quarenta) dias não corresponde à realidade dos factos efectivamente apurados, porquanto nada justifica a soma efectuada na douta sentença em crise quanto ao apurado relatório pericial a título de ITA e de ITP (90+150). 4 – Ao invés, o período de tempo a considerar para efeitos de indemnização pelos lucros cessantes em virtude da incapacidade temporária absoluta do autor seria sempre de 90 dias (ITA apurada), acrescidos de parte do período de incapacidade temporária parcial (ITP apurada de 150 dias) que, como não está definida a sua percentagem, deverá ter-se por adequada a ponderação de uma percentagem de 50%, perfazendo um total de 165 (cento e sessenta e cinco dias): 90+75. 5 – No que concerne à verificação de perdas de rendimentos no período de ITA, há ainda que apurar se o autor, efectivamente, deixou de auferir qualquer rendimento da sua actividade laboral por via das lesões sofridas em consequência do acidente. 6 – O acidente ocorreu em 18.07.2004, sendo que das declarações de rendimentos (IRS) do autor resulta que este auferiu como rendimentos de trabalho enquanto gerente comercial, em 2003, 4 575,00 euros, em 2004, 5 400,00 euros e em 2005, 5 400,00 euros. 7 – O que forçosamente leva a concluir que o autor não deixou de auferir qualquer remuneração nos meses imediatamente subsequentes ao acidente, não teve qualquer perda de rendimentos, pelo que não haverá qualquer dano a ressarcir a título de ITA. 8 – Quanto ao valor dos rendimentos mensais auferidos pelo autor, a recorrente discorda igualmente do decidido, que considerou um valor de 1 000,00 mensais. 9 – Da prova produzida nos autos, foi apurado que os estabelecimentos comerciais do autor facturavam cerca de 3 000,00 euros ilíquidos por dia, obtendo uma margem de lucro de 15%, retirando o autor, enquanto gerente, uma remuneração média na ordem dos 500,00 euros mensais – cfr. resposta aos quesitos 35 e 36 da base instrutória. 10 – Não obstante este facto, considerou-se na douta decisão em crise que “não pode ignorar-se todos os restantes factos provados, ou seja, que o autor se dedicava de corpo e alma aos estabelecimentos comerciais que lhe pertenciam, sendo o seu cérebro e especial motor”, concluindo-se que “se pode afirmar que, além dos 500,00 euros por mês que o autor retira como gerente, o seu contributo para o funcionamento das sociedades representará mais de 500,00 euros”. 11 – Há que atender, porém, que o autor era, à data do acidente, sócio da sociedade “S.V.L., Lda” – cfr. alínea AC) dos factos assentes – sendo esta sociedade a proprietária dos três estabelecimento comerciais em causa nos autos – cfr. alínea AD) dos factos assentes. 12 – Sendo a margem de lucro apurada nos autos o rendimento dessa sociedade comercial de que o autor é sócio gerente e não seu próprio rendimento. 13 – Não se trata aqui de determinar o montante dos prejuízos da sociedade resultantes da perda de capacidade de trabalho do seu sócio gerente, mas de indemnizar o autor pela IPP apurada nos seus rendimentos próprios. 14 – Não se pode aceitar o argumento a que a douta sentença se socorre, remetendo para o Acórdão da Relação do Porto de 26.01.2010, designadamente quanto “à consabida tendência das actividades de prestação de serviço de declararem menos rendimentos ao fisco do que aqueles que auferem”, porquanto não se trata aqui de nenhuma actividade de prestação de serviços, mas da gerência de uma sociedade comercial por parte do autor. 15 – Não foi alegado e muito menos provado que o autor beneficiasse de outros rendimentos por parte da sua actividade laboral de gerente comercial superiores aos 500,00 euros (em média) apurados. 16 – O que o autor alega é bem diferente: que o seu contributo para a sociedade, resultante do esforço do seu próprio trabalho, se computava em 100,00 euros por dia. 17 – Então, se, efectivamente, a contribuição do autor para a sociedade comercial ficou afectada com as sequelas físicas de que o mesmo padece, esse prejuízo, a comprovar-se, sempre será da própria sociedade, pois é ela que é a titular do rendimento que resulta afectado e não o autor. 18 – Uma vez que, como referido, não foram apurados quaisquer outros rendimentos do autor, para além dos rendimentos médios apurados de 500,00 euros mensais enquanto gerente da mesma sociedade, será este o valor do rendimento do autor a considerar pelo julgador para efeitos de fixação de indemnização pela IPP e de ITA. 19 – Conclui-se, em consequência, que considerando a idade do autor, o rendimento mensal de 500,00 euros, doze vezes ao ano e a data de consolidação médico-legal das lesões decorrentes do acidente, o autor terá direito a uma indemnização pela IPP de 8% em valor não superior a 7 000,00 euros. 20 – Quanto à ITA, sem prejuízo do referido quanto à ausência de dano a ressarcir, caso assim não seja entendido, o que apenas se concebe, então a indemnizar a pagar pelos 165 dias não ultrapassará os 2 750,00 euros (500,00 euros x 5,5 meses). 21 – O Tribunal a quo, na fixação do quantum indemnizatório pelos lucros cessantes, violou, pelo exposto, o vertido nos artigos 562º e 566º do CC. 22 – Relativamente aos danos não patrimoniais, a compensação atribuída ao autor de 12 500,00 euros apresenta-se excessiva, face aos dados apurados e à Jurisprudência maioritária em casos análogos. 23 – Considerando a globalidade dos factos apurados e os critérios comummente estabelecidos na Jurisprudência dominante, entende a recorrente que será de atribuir ao autor, com recurso à equidade, uma compensação no valor de 10 000,00 euros. 24 – Esta quantia deverá sempre ser considerada como actualizada para efeito de contabilização de juros, por via do recurso à equidade, conforme decidido no Ac. STJ de 18.03.2010, acessível em www.dgsi.pt. 25 – A douta sentença, na fixação do dano não patrimonial, violou o disposto nos artigos 494º e 496º do CC, por excesso de quantia arbitrada. * Não foram oferecidas contra-alegações. As questões a decidir são: I) Valor dos rendimentos do autor (recurso da ré). II) Montante da indemnização pela incapacidade temporária absoluta (recurso da ré). III) Montante da indemnização pela incapacidade permanente parcial (recurso do autor e da ré). IV) Montante da indemnização por danos não patrimoniais (recurso da ré). V) Juros sobre a indemnização por danos não patrimoniais (recurso do autor). * * FACTOS. Os factos considerados provados pela sentença recorrida são os seguintes: 1. No dia 18 de Julho de 2004, pelas 16.50 horas, na Estrada Municipal nº306, ao quilómetro número 29,350, na freguesia de Rebordões Santa Maria, Ponte de Lima, ocorreu um embate entre o motociclo de matrícula …-NQ, propriedade do autor e por si conduzido e o veículo de matrícula …-GZ, propriedade de V… e por si conduzido (A). 2. A Estrada Municipal nº306, no local do embate, configura um traçado curvilíneo, descrito para o lado direito, tendo em conta o sentido Ponte de Lima - São Julião de Freixo (B). 3. E a sua faixa de rodagem tem uma largura de 05,90 metros (C). 4. O motociclo circulava no sentido São Julião de Freixo - Ponte de Lima, pela metade direita da faixa de rodagem, tendo em conta esse sentido (D). 5. A uma velocidade não superior a quarenta/cinquenta quilómetros por hora (E). 6. O veículo …-GZ circulava no sentido Ponte de Lima - S. Julião de Freixo (F). 7. E transpôs, para a sua esquerda, o eixo divisório da faixa de rodagem da Estrada Municipal nº306 (G). 8. E invadiu a metade esquerda da faixa de rodagem, atendo o sentido Ponte de Lima - São Julião de Freixo (H). 9. O autor travou, de imediato, o motociclo (I). 10. E encostou-o à sua direita, imobilizando a marcha (J e doc de fls 41 e 42 do procedimento cautelar). 11. Quando se encontrava parado e imobilizado, o motociclo foi embatido pelo veículo automóvel GZ (L). 12. Antes de embater contra o motociclo, o veículo deixou, marcados no pavimento, rastos de travagem com um comprimento de 21,30 metros (M). 13. Os rastos de travagem tinham o seu início sobre a metade direita da faixa de rodagem da Estrada Nacional nº306, tendo em conta o sentido Ponte de Lima - São Julião de Freixo e transpunham o eixo divisório onde se encontrava, pintada a cor branca, uma Linha sem Soluções de Continuidade, e terminavam sobre a metade esquerda da faixa de rodagem (N). 14. O embate ocorreu sobre a metade esquerda da faixa de rodagem da Estrada Municipal nº306, tendo em conta o sentido Ponte de Lima - São Julião de Freixo (O). 15. E verificou-se entre a parte frontal do veículo GZ e a parte frontal do motociclo (P). 16. No dia 8 de Setembro de 2004, a ré pagou ao autor o valor de 1 750,00 euros, relativo à diferença entre o valor venal do motociclo e valor dos seus salvados (Q). 17. Em virtude do embate, o autor sofreu traumatismo na coluna lombar, dorsal e cervical, traumatismo do ombro esquerdo, traumatismos dos dois membros inferiores, escoriações nas duas pernas, dor no ombro esquerdo, traumatismo do tornozelo esquerdo, traumatismo do joelho esquerdo, hematomas e escoriações espalhadas pelo corpo todo (R). 18. O autor foi transportado, de ambulância, para o Centro Hospitalar do Alto Minho, SA, de Ponte de Lima, onde lhe foram prestados os primeiros socorros, no respectivo Serviço de Urgência, realizados os exames radiológicos às regiões do seu corpo atingidas, efectuadas lavagens cirúrgicas, desinfecções e curativos às escoriações sofridas (S). 19. O autor teve alta hospitalar no dia do embate (T). 20. Posteriormente, o autor frequentou o consultório do Dr. I…, em Ponte de Lima, o qual lhe concedeu consultas, lhe fez exames vários e lhe efectuou tratamentos e curativos diversos (U). 21. E frequentou o consultório do Ortopedista Dr. C…, com consultório em Ponte de Lima, o qual lhe receitou uma TAC e uma RMN (V). 22. Posteriormente, o autor frequentou a Casa de Saúde da Boavista, com sede na cidade do Porto, por conta e a expensas exclusivas da ré, onde se dirigiu por quatro vezes (X). 23. Nesta Unidade Hospitalar, o autor realizou infiltração de corticóide, no ombro esquerdo (Z). 24. Após, por indicação da ré e a expensas exclusivas desta, o autor frequentou a Clínica de Reabilitação do Vale do Minho, Lda, com sede na vila de Ponte de Lima, ao longo de vinte e seis sessões (AA). 25. O autor nasceu no dia 11 de Novembro de 1956 (AB). 26. À data do embate e presentemente, o autor exercia e exerce a actividade/profissão de comerciante, do ramo alimentar, através da sociedade “S.V.L., Lda, de que são únicos sócios o autor e sua mulher (AC). 27. No exercício dessa sua profissão/actividade, o autor explora, por conta própria no âmbito da referida sociedade: - um estabelecimento de armazenamento e venda por grosso, de artigos de papelaria, vinhos e demais bebidas, sito em Ponte de Lima; - um estabelecimento de café, talho e mini-mercado, sito no lugar de Regatal, freguesia de Arcozelo, Ponte de Lima; - um estabelecimento de mini-mercado, sito no lugar de Barrosa, freguesia de Arcozelo, Ponte de Lima (AD). 28. A responsabilidade civil causada a terceiros pelo veículo automóvel ligeiro de passageiros, de matrícula …-GZ, encontrava-se transferida para a ré através de contrato de seguro, titulado pela apólice nº…, em vigor à data do embate (AE). 29. Não chovia (1). 30. E o pavimento asfáltico da Estrada nº306 encontrava-se limpo e seco (2). 31. Logo que termina a curva indicada em B, a Estrada nº306 desenvolve-se em traçado rectilíneo, em direcção a São Julião de Freixo (3). 32. Ao longo de uma distância superior a cento e cinquenta metros (4). 33. Para quem circula pela Estrada Nacional nº306, em qualquer dos seus dois sentidos de marcha, não consegue avistar a sua faixa de rodagem em toda a sua largura, ao longo de uma distância superior a trinta metros (5). 34. Em consequência do traçado curvilíneo aludido em B (6). 35. Sobre o eixo divisório da faixa de rodagem da Estrada Municipal nº306 existia, no local do embate, pintada a cor branca, uma Linha Sem Quaisquer Soluções de Continuidade (7). 36. O motociclo circulava com os rodados a uma distância não superior a 0,50 metros do limite da metade direita da faixa de rodagem, tendo em conta o sentido São Julião de Freixo - Ponte de Lima (8). 37. O veículo QZ circulava a uma velocidade superior a noventa quilómetros por hora (9). 38. E ao passar a descrever a curva aludida em B, o veículo QZ não travou, nem reduziu a velocidade a que circulava (10). 39. O veículo GZ efectuou o descrito em G no local onde existe pintada a cor branca, uma linha sem solução de continuidade (11). 40. E numa altura em que o motociclo se encontrava a uma distância não superior a dez metros dele (12). 41. A ré propôs ao autor o pagamento da quantia aludida em Q por carta datada de 6 de Agosto de 2004 solicitando o envio da documentação necessária ao envio do respectivo recibo (13). 42. O autor só enviou a documentação indicada em 13 no dia 3 de Setembro de 2004 (14). 43. E apresentou o recibo emitido pela ré a pagamento no dia 8 de Setembro de 2004 (15). 44. Durante a época do verão, o autor utilizava i motociclo diariamente (16). 45. No momento do embate e nos instantes que o precederam, o autor sofreu um enorme susto e receou pela sua própria vida (17). 46. O autor sofreu dores muito intensas, em todas as regiões do seu corpo atingidas, nomeadamente na coluna lombar, dorsal e cervical, no ombro esquerdo, nos dois membros inferiores, no tornozelo esquerdo (18). 47. Essas dores afligiram o autor, ao longo de um período de tempo superior a um ano (19). 48. Como sequelas sofridas, o autor apresenta: - SEQUELAS LESIONAIS: - alterações tróficas cicatriciais, hipermelanizadas, que ocupam parcialmente a face anterior da perna direita; - dano estético, ao nível a perna direita (face anterior); - alterações tróficas, hipermelanizadas, que ocupam a face anterior da perna esquerda; - dano estético, ao nível da perna esquerda (face anterior); - dor no ombro esquerdo; - limitação funcional do ombro esquerdo; - dor localizada na face anterior do ombro esquerdo; - sinais de tendiopatia crónica; - limitação dolorosa marcada, sobretudo nos movimentos de abdução, do membro superior esquerdo, agravando-se com o esforço; - SEQUELAS FUNCIONAIS: - limitação de todos os movimentos de elevação do membro superior esquerdo; - dor que se manifesta de forma intensa, com os movimentos de elevação do membro superior esquerdo; - SEQUELAS SITUACIONAIS: - condicionadas todas as tarefas que impliquem esforço com o membro superior esquerdo; - limitação de todas as tarefas que impliquem movimento e esforços com os dois membros inferiores; - compromisso marcado da actividade profissional do autor, de exploração, com fins lucrativos, de estabelecimentos de mercearia e de talhos, pela necessidade de executar tarefas diárias de elevação e transporte de embalagens e de peças e de carcaças de carne; - dores nas regiões do corpo atingidas – coluna lombar, dorsal e cervical, além de outras, nas mudanças climatéricas (20). 49. À data do embate, o autor não padecia de nenhuma enfermidade, nem nunca tinha sofrido qualquer acidente (21). 50. O autor sente-se desgostoso com as sequelas indicadas em 20 (22). 51. O autor sofreu um período de doença de trinta dias, com igual período de tempo com Incapacidade Temporária Absoluta Geral para o trabalho (23). 52. E um período de tempo de doença de duzentos e dez dias, com igual período de tempo com Incapacidade Temporária Parcial Geral para o trabalho (24). 53. E um período de doença de noventa dias, com igual período de tempo com Incapacidade Temporária Absoluta Profissional para o trabalho (25). 54. E um período de tempo de cento e cinquenta dias, com igual período de tempo com Incapacidade Temporária Parcial Profissional para o trabalho (26). 55. E um “Quantum Doloris” de grau 3, numa escala de 0 a 7 (27). 56. E sofreu um “Coeficiente de Dano” de grau 1, numa escala de o a 4 (28). 57. E sofreu um “Dano Estético” de grau 1, numa escala de 0 a 7 (29). 58. O autor ficou a padecer de uma Incapacidade Parcial Permanente Geral e profissional de 8% de acordo com a Tabela Nacional das Incapacidades (30 e 31). 59. Antes do embate, o autor trabalhava nunca menos de dezoito horas, por dia, no exercício da sua actividade comercial (32). 60. Sem descanso semanal, nos feriados e dias santos, a não ser um pequeno período de tempo, compreendido entre as 16,00 horas e 20,00 horas, dos domingos (33). 61. E sem nunca retirar qualquer período de tempo para o gozo de férias anuais (34). 62. Os estabelecimentos comerciais do autor facturavam cerca de 3 000,00 euros ilíquidos por dia, obtendo uma margem de lucro de 15%, retirando o autor, enquanto gerente, uma remuneração média na ordem dos 500,00 euros mensais (35 e 36). 63. O autor irrita-se com frequência, várias vezes ao dia, perante tarefas que se vê na necessidade de executar e não consegue, como sucedia antes do embate (37). 64. Perante a irritabilidade sentida, o autor interrompe os seus trabalhos e faz permanentes intervalos de descanso, várias vezes ao dia (39). 65. O autor recorre, com frequência, a um ajudante, que o passou a acompanhar, a complementar e a substituir, em tarefas que ele não é capaz de executar ou executar sozinho (41). 66. O autor efectuou as seguintes despesas: - consultas médicas e obtenção do relatório médico, 691,00 euros; - medicamentos, 469,22 euros; - meios de diagnóstico, 324,20 euros; - taxas moderadoras, 17,60 euros; - uma certidão de nascimento, 15,00 euros; - táxis, 78,00 euros; - certidão da participação de acidente, 7,12 euros; - deslocações em carro próprio, para se deslocar a Ponte de Lima, para sessões de fisioterapia – 26 vezes – e para se deslocar o Porto, para tratamentos, nos Serviços Clínicos da ré – 4 vezes –, num total de 1 112 kms x 0,35, 389,20 euros (42). 67. No momento do embate, o autor usava um blusão, um par de calças e um par de sapatos, no valor de 450,00 + 65,00 + 29,99, respectivamente (43). 68. Os quais ficaram danificados e inutilizados (45). * * ENQUADRAMENTO JURÍDICO. I) Valor dos rendimentos do autor. A indemnização por danos causados por factos ilícitos tem como objectivo reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que determinou a reparação (artigo 562º do CC) e, caso não seja possível a reconstituição natural, ou se esta não reparar os danos, ou se for excessivamente onerosa, deverá a indemnização ser fixada em dinheiro (artigo 566º nº1 do CC), mas, se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (artigo 566º nº3 do CC). Nos presentes autos, ambas as partes impugnam a forma de cálculo da indemnização fixada para os danos sofridos a título de incapacidade permanente parcial, impugnando ainda a ré o valor considerado pela sentença recorrida como sendo o dos rendimentos do autor, como base de cálculo para a referida indemnização. Assim, a primeira questão que se coloca é a de saber qual o rendimento médio que o autor auferia à data da consolidação das suas lesões, pois tal rendimento servirá de base para o cálculo da indemnização por danos sofridos com a incapacidade permanente parcial e também por danos sofridos com a incapacidade temporária. Ficou provado que o autor exercia e exerce a actividade de comerciante do ramo alimentar através de uma sociedade de que ele e a esposa são os únicos sócios, sendo o autor gerente da mesma, que explora vários estabelecimentos comerciais, os quais facturavam cerca de 3 000,00 euros ilíquidos por dia, obtendo uma margem de lucro de 15%, retirando o autor como gerente uma remuneração média de 500,00 euros mensais. Partindo destes factos provados e recorrendo à equidade, considerou a sentença recorrida que o rendimento médio do autor seria sempre superior à remuneração acima indicada e fixou-o em 1 000,00 euros mensais. Alega a recorrente ré que deverá ser considerado apenas o valor de 500,00 euros e que as eventuais repercussões sentidas pela sociedade não constituem danos sofridos pelo autor, mas sim pela sociedade. Contudo, sendo o autor e a esposa os únicos sócios da sociedade e dedicando-se o autor em exclusivo e intensamente à actividade de exploração dos estabelecimentos da sociedade, tem de se considerar que os lucros e rendimentos da sociedade pertencem indirectamente ao autor e que foi este (e o casal constituído por si e pela sua esposa) quem ficou prejudicado com a perturbação da exploração dos estabelecimentos da sociedade. É, pois, forçoso concluir que o real rendimento do autor, afectado pelas lesões sofridas, tinha ser superior ao valor da remuneração auferida como gerente, dele fazendo parte os rendimentos auferidos pela sociedade. Não sendo possível averiguar qual o exacto valor e face à dimensão da actividade, que englobava a exploração intensa de três estabelecimentos comerciais, parece-nos equitativamente adequado o valor de 1 000,00 euros mensais adoptado pela sentença recorrida. Improcedem assim as alegações da ré nesta parte. * II) Montante da indemnização por ITA. A indemnização pelos danos sofridos pelo autor com a incapacidade temporária antes da consolidação das lesões foi fixada pela sentença recorrida em 8 000,00 euros, com base num rendimento médio mensal de 1 000,00 euros e num período de 8 meses (240 dias). A recorrente ré discorda, com dois fundamentos, alegando, por um lado, que se retira do conteúdo das declarações fiscais do autor que o rendimento deste não diminuiu no ano em que se situa o período fixado pela sentença como sendo de incapacidade temporária e alegando, por outro lado, que tal período não está correctamente fixado, pois não é de 240 dias, mas sim de 165 dias. Provou-se que o autor costumava trabalhar nos estabelecimentos comerciais ininterruptamente, sem nunca tirar dias de férias, pelo que o período de incapacidade temporária para o trabalho, mesmo quando situado no Verão, tem de ser contabilizado para efeitos de indemnização. No que diz respeito às declarações fiscais do autor, as mesmas não constam dos factos provados, nem a ré recorrente impugnou a decisão da matéria de facto. Contudo, mesmo considerando-se provado que o autor fez as declarações fiscais que constam nos autos a fls 391 e seguintes (ao abrigo dos artigos do 659º nº3 e 713º do CPC), as mesmas não são impedimento para concluir que o autor terá ficado prejudicado com a incapacidade temporária. Desde logo porque, como vem referido na sentença recorrida, é facto notório que muitas vezes não é declarada a totalidade dos rendimentos; por outro lado, ignora-se se os rendimentos declarados poderiam ter sido superiores caso o autor não tivesse sofrido as dificuldades que sofreu. Quanto ao número de dias considerado, verifica-se dos factos descritos nos pontos 51. e 52. dos factos provados da sentença que o autor sofreu um período de 30 dias de incapacidade temporária absoluta geral e um período de 210 dias de incapacidade temporária parcial geral, ou seja, um período 240 dias de incapacidade temporária. E, de acordo com os factos dos pontos 53. e 54., desses 240 dias, 90 dias são de incapacidade temporária absoluta profissional e 150 dias são de incapacidade temporária parcial profissional. Por isso, está correcto o número de 240 dias contabilizado, correspondente a 8 meses de incapacidade temporária, findo o qual se deve então considerar que as lesões ficaram consolidadas com a incapacidade permanente parcial de 8%. É certo que desses 240 dias, 150 dias abrangem um período de incapacidade profissional temporária meramente parcial. Mas, ignorando-se a respectiva proporção e sabendo que a actividade do autor era intensa e exclusivamente dedicada aos estabelecimentos comerciais e, consequentemente, necessariamente determinante para o seu bom funcionamento, parece-nos que, de novo em harmonia com a equidade, deverá ser considerado o rendimento mensal médio de 1 000,00 euros por inteiro, durante todo o período de 240 dias (8 meses) de incapacidade temporária. Revela-se, portanto, correcta a quantia de 8 000,00 euros como indemnização pela incapacidade temporária sofrida pelo autor. * III) Montante da indemnização por IPP. Pelos danos sofridos com a incapacidade permanente parcial de 8% e consequente perda de capacidade de ganho, fixou a sentença recorrida a indemnização em 12 600,00 euros, montante de que discordam ambas as partes, pretendendo o autor uma indemnização de 40 000,00 euros e pretendendo a ré que a indemnização seja fixada em 7 000,00 euros. A reparação dos danos inclui a reparação dos danos futuros, ou benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão (artigo 564º nº2 do CC) e, tal como já acima referido, deverá o tribunal recorrer à equidade nos termos do artigo 566º nº3 do CC, quando não se puder averiguar o valor exacto dos danos. Para se fixar o valor adequado para ressarcir a perda de ganho futuro de um lesado que fica afectado com uma incapacidade permanente parcial tem de se chegar a um montante que se calculará atendendo aos factores conhecidos (rendimento anual médio do lesado, extensão da incapacidade, idade do lesado e esperança de vida activa) e que, mediante a equidade, permita colmatar a aleatoriedade dos restantes factores (condições futuras de trabalho e de saúde do lesado, aumento do custo de vida ou melhoria do nível de vida, despesas inesperadas que venha a ter de efectuar ou liberalidades inesperadas de que venha a beneficiar, etc), de forma a que o lesado receba um capital que abranja a sua vida activa, sem que o enriqueça injustificadamente pelo recebimento antecipado do mesmo. No presente caso, como vimos, deverá ser contabilizado um rendimento mensal de 1 000,00 euros, que, multiplicado por 14 meses, corresponde a um rendimento anual de 14 000,00 euros. Tendo ficado com uma incapacidade permanente parcial de 8%, a perda anual de ganho do autor corresponde a 1 120,00 euros (14 000,00 euros x 8%). O autor nasceu no ano de 1956, por isso tinha 48 anos em 2004, no ano do acidente. Mas, como já vimos, o autor sofreu um período de incapacidade temporária de 8 meses, pelo que as lesões só ficaram consolidadas 8 meses depois da data do acidente, ou sejam em 18 de Março de 2005. Deverá, pois, considerar-se que só a partir do ano de 2005 o autor passou a sofrer de uma IPP de 8% (antes disso, entre a data do acidente e a consolidação, o autor sofreu incapacidades temporárias), sendo esse ano de 2005 o ano que deve servir de base de cálculo para a perda de capacidade de ganho (e não o não de 2004), ano em que o autor completou 49 anos de idade. Conforme tem sido entendido pela jurisprudência (nomeadamente do ST: acs 14/10/2010 e 12/01/2010, em www.dgsi.pt, o segundo sumariada), trabalhando o lesado por conta própria e tendo aumentado a esperança média de vida, não se deverá fixar o fim da vida activa em idade inferior a 70 anos. Deste modo, passando o autor a sofrer a IPP a partir do ano de 2005, ano em que completou 49 anos de idade, falta-lhe 21 anos para atingir o fim da vida activa. Multiplicando a perda de ganho anual de 1 120,00 euros por 21 anos, temos o valor de 23 520,00 euros, o qual deverá ser reduzido de forma a que o lesado não beneficie injustificadamente do facto de receber este valor antecipadamente, situação que não ocorreria se não tivesse sofrido as lesões em causa. Tudo ponderado, parece-nos equitativamente adequado e conforme à jurisprudência existente em casos semelhantes fixar o valor da indemnização em 20 000,00 euros. Improcede, pois, o recurso da ré nesta parte, procedendo parcialmente o do autor, também nesta parte. * IV) Montante da indemnização por danos não patrimoniais. O lesado tem direito a ser ressarcido pelos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, nos termos do artigo 496º do CC. Na reparação destes danos nunca é possível a reconstituição da situação anterior à lesão, pelo que estabelece o nº3 do referido artigo 496º do CC que “O montante será fixado equitativamente tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º”, sendo tais circunstâncias o grau de culpabilidade do agente, a sua situação económica e a do lesado e outras que se tenham apurado. No caso em apreço, o autor não deu causa ao embate, sendo exclusiva a culpa do condutor do outro veículo; sofreu traumatismo na coluna lombar, dorsal e cervical, traumatismos dos dois membros inferiores e do ombro esquerdo, hematomas e escoriações pelo corpo todo, foi transportado ao hospital e sujeito a tratamentos e a exames, teve de ser assistido por vários médicos e sujeito a reabilitação durante vinte e seis sessões, sofreu incapacidade temporária de 8 meses, após o que ficou com uma incapacidade permanente parcial de 8%, com alterações tróficas cicatriciais e dano estético nas duas pernas, dor e limitação do membro superior esquerdo e de tarefas que impliquem esforço com o membro superior esquerdo e com os dois membros inferiores, sofreu dores e sente-se frustrado com as limitações de ficou afectado. Todas estas circunstâncias levam a considerar não ser excessiva, mas sim adequada, a indemnização de 12 500,00 euros fixada pela sentença recorrida, que se mantém, improcedendo também nesta parte o recurso da ré. * V) Juros sobre a indemnização por danos não patrimoniais. Alega ainda o autor que a sentença recorrida não actualizou a indemnização por danos não patrimoniais, não sendo assim aplicável a jurisprudência fixada pelo acórdão do STJ de 4/2002 de 9/05/2005, segundo a qual os juros sobre a indemnização actualizada na decisão se contam a partir dessa data e não da data da citação. É certo que da leitura da decisão se poderia retirar essa conclusão, uma vez que aí se consignou que se fixava o valor de 12 500,00 euros “peticionado”. Contudo, conforme decorre do atrás exposto, entende-se adequada a referida indemnização de 12 500,00 euros com referência à data da sentença, independentemente de já ter sido pedido esse montante na petição inicial, pelo que se deve manter a contagem dos juros a partir da data da sentença, como foi decidido. * * * DECISÃO. Pelo exposto, decide-se julgar totalmente improcedente o recurso da ré e parcialmente procedente o recurso do autor e fixar em 20 000,00 (vinte mil euros) a indemnização pela incapacidade permanente parcial de que ficou afectado, mantendo-se a sentença recorrida no restante decidido. * Custas da apelação da ré pela apelante e custas da apelação do autor na proporção do vencimento. * 2011-03-22
Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: RELATÓRIO. JF intentou a presente acção declarativa com processo ordinário contra Companhia de Seguros …, SA alegando, em síntese, que no dia 18/07/2004 conduzia o seu motociclo de matrícula …-NQ, quando foi embatido pelo veículo de ligeiro de passageiros de matrícula …-GZ, seguro pela ré, que seguia em sentido contrário e saiu da sua mão de trânsito, invadindo a faixa de rodagem do motociclo do autor e assim lhe causando lesões e outros danos, computando os respectivos valores em 1 325,00 euros pela privação de uso do veículo, 12 500,00 pelos danos não patrimoniais, 24 000,00 euros pela incapacidade temporária absoluta, 40 000,00 euros pela incapacidade permanente parcial, 1 991,34 pelas despesas médicas, 1 321,99 euros por outras despesas, para além de não se encontrar curado e de, no futuro, necessitar de novos tratamentos. Concluiu, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 81 138,33 euros acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação e até integral pagamento, bem como indemnização pelos danos futuros, a liquidar em execução de sentença. A ré contestou alegando, em síntese, que aceita a responsabilidade do seu segurado, embora desconhecendo alguns pormenores do embate e impugnando a extensão dos danos invocados pelo autor. Concluiu pedindo que a acção fosse julgada de acordo com a prova a produzir. O autor replicou mantendo o alegado na petição inicial. Saneados os autos, procedeu-se a julgamento, findo o qual foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar ao autor a quantia de 23 136,33 euros, a título de danos patrimoniais (2 536,33 euros por despesas, 8 000,00 euros pela ITA e 12 600,00 euros pela IPP), acrescida de juros desde a citação até integral pagamento e de 12 500,00 euros, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros desde a data da sentença até integral pagamento. * Inconformadas, ambas as partes interpuseram recurso, os quais foram admitidos como apelação, com subida imediata, nos autos e com efeito devolutivo. * O recorrente autor alegou, formulando as seguintes conclusões: 1ª – Não questiona o recorrente a parte da douta sentença recorrida, na parte em que atribuiu a culpa na produção do sinistro ao condutor do veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula …-GZ, segurado na ré seguradora Companhia de Seguros …, SA. 2ª – Já que, de acordo com a prova produzida e com os factos provados, essa culpa é exclusivamente imputável ao condutor do veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula …-GZ, segurado na ré seguradora Companhia de Seguros …, SA. 3ª – Discorda, porém, o recorrente em relação ao valor de 12 600,00 euros, que lhe foi fixado a título de indemnização pela Incapacidade Parcial Permanente, para o trabalho de 8%. 4ª – Já que é notoriamente insuficiente e irrisório, para ressarcir o recorrente dos danos, a este título, sofridos. 5ª – O autor/recorrente contava, à data do sinistro dos presentes autos, 48 anos de idade, auferia um rendimento, com o empenho do seu trabalho de dezoito (18,00 euros) por dia, sem fins-de-semana e sem férias (30 dias x 100,00 euros) 3 000,00 euros (no mínimo) ficou a padecer de uma IPP de 8% e a expectativa da vida activa cifra-se nos 75 anos de idade. 6ª – O montante de 12 600,00 euros, fixado a este título, é, assim, insuficiente e insuficiente. 7ª – Justo e equitativo é o valor de 40 000,00 euros, que se reclama. 8ª – O Meritíssimo Juiz do Tribunal de Primeira Instância não fez qualquer actualização em relação à indemnização – compensação – pelos danos de natureza não patrimonial. 9ª – Não se justifica, assim, a aplicação da doutrina expressa no acórdão de unificação de jurisprudência nº 4/2002, de 9 de Maio de 2002. 10ª – Os juros incidentes sobre a quantia indemnizatória relativa aos danos de natureza não patrimonial devem, pois, ser fixados, à taxa legal de 4%, desde a data da citação, até efectivo pagamento. 11ª – Decidindo de modo diverso, fez a douta sentença recorrida má aplicação do direito aos factos provados e violou, além de outras normas, o disposto nos artigos 496º, 562º, 564º e 805º, do Código Civil. * A recorrente ré alegou, formulando as seguintes conclusões: 1 – A recorrente …, SA não questiona a obrigação de indemnizar o autor pelos danos sofridos em consequência do acidente de viação melhor descrito nos autos e cuja responsabilidade é exclusivamente imputável ao condutor do veículo por si garantido. 2 – Discorda a recorrente, no entanto, com a liquidação da indemnização danos efectuada na douta sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz a quo quanto aos lucros cessantes, seja a título de ITA, seja por IPP e consequente indemnização fixada, e ainda quanto à compensação pelos danos não patrimoniais arbitrada. 3 – Assim, quanto ao período de ITA, sempre se dirá que o período considerado na douta sentença de 240 (duzentos e quarenta) dias não corresponde à realidade dos factos efectivamente apurados, porquanto nada justifica a soma efectuada na douta sentença em crise quanto ao apurado relatório pericial a título de ITA e de ITP (90+150). 4 – Ao invés, o período de tempo a considerar para efeitos de indemnização pelos lucros cessantes em virtude da incapacidade temporária absoluta do autor seria sempre de 90 dias (ITA apurada), acrescidos de parte do período de incapacidade temporária parcial (ITP apurada de 150 dias) que, como não está definida a sua percentagem, deverá ter-se por adequada a ponderação de uma percentagem de 50%, perfazendo um total de 165 (cento e sessenta e cinco dias): 90+75. 5 – No que concerne à verificação de perdas de rendimentos no período de ITA, há ainda que apurar se o autor, efectivamente, deixou de auferir qualquer rendimento da sua actividade laboral por via das lesões sofridas em consequência do acidente. 6 – O acidente ocorreu em 18.07.2004, sendo que das declarações de rendimentos (IRS) do autor resulta que este auferiu como rendimentos de trabalho enquanto gerente comercial, em 2003, 4 575,00 euros, em 2004, 5 400,00 euros e em 2005, 5 400,00 euros. 7 – O que forçosamente leva a concluir que o autor não deixou de auferir qualquer remuneração nos meses imediatamente subsequentes ao acidente, não teve qualquer perda de rendimentos, pelo que não haverá qualquer dano a ressarcir a título de ITA. 8 – Quanto ao valor dos rendimentos mensais auferidos pelo autor, a recorrente discorda igualmente do decidido, que considerou um valor de 1 000,00 mensais. 9 – Da prova produzida nos autos, foi apurado que os estabelecimentos comerciais do autor facturavam cerca de 3 000,00 euros ilíquidos por dia, obtendo uma margem de lucro de 15%, retirando o autor, enquanto gerente, uma remuneração média na ordem dos 500,00 euros mensais – cfr. resposta aos quesitos 35 e 36 da base instrutória. 10 – Não obstante este facto, considerou-se na douta decisão em crise que “não pode ignorar-se todos os restantes factos provados, ou seja, que o autor se dedicava de corpo e alma aos estabelecimentos comerciais que lhe pertenciam, sendo o seu cérebro e especial motor”, concluindo-se que “se pode afirmar que, além dos 500,00 euros por mês que o autor retira como gerente, o seu contributo para o funcionamento das sociedades representará mais de 500,00 euros”. 11 – Há que atender, porém, que o autor era, à data do acidente, sócio da sociedade “S.V.L., Lda” – cfr. alínea AC) dos factos assentes – sendo esta sociedade a proprietária dos três estabelecimento comerciais em causa nos autos – cfr. alínea AD) dos factos assentes. 12 – Sendo a margem de lucro apurada nos autos o rendimento dessa sociedade comercial de que o autor é sócio gerente e não seu próprio rendimento. 13 – Não se trata aqui de determinar o montante dos prejuízos da sociedade resultantes da perda de capacidade de trabalho do seu sócio gerente, mas de indemnizar o autor pela IPP apurada nos seus rendimentos próprios. 14 – Não se pode aceitar o argumento a que a douta sentença se socorre, remetendo para o Acórdão da Relação do Porto de 26.01.2010, designadamente quanto “à consabida tendência das actividades de prestação de serviço de declararem menos rendimentos ao fisco do que aqueles que auferem”, porquanto não se trata aqui de nenhuma actividade de prestação de serviços, mas da gerência de uma sociedade comercial por parte do autor. 15 – Não foi alegado e muito menos provado que o autor beneficiasse de outros rendimentos por parte da sua actividade laboral de gerente comercial superiores aos 500,00 euros (em média) apurados. 16 – O que o autor alega é bem diferente: que o seu contributo para a sociedade, resultante do esforço do seu próprio trabalho, se computava em 100,00 euros por dia. 17 – Então, se, efectivamente, a contribuição do autor para a sociedade comercial ficou afectada com as sequelas físicas de que o mesmo padece, esse prejuízo, a comprovar-se, sempre será da própria sociedade, pois é ela que é a titular do rendimento que resulta afectado e não o autor. 18 – Uma vez que, como referido, não foram apurados quaisquer outros rendimentos do autor, para além dos rendimentos médios apurados de 500,00 euros mensais enquanto gerente da mesma sociedade, será este o valor do rendimento do autor a considerar pelo julgador para efeitos de fixação de indemnização pela IPP e de ITA. 19 – Conclui-se, em consequência, que considerando a idade do autor, o rendimento mensal de 500,00 euros, doze vezes ao ano e a data de consolidação médico-legal das lesões decorrentes do acidente, o autor terá direito a uma indemnização pela IPP de 8% em valor não superior a 7 000,00 euros. 20 – Quanto à ITA, sem prejuízo do referido quanto à ausência de dano a ressarcir, caso assim não seja entendido, o que apenas se concebe, então a indemnizar a pagar pelos 165 dias não ultrapassará os 2 750,00 euros (500,00 euros x 5,5 meses). 21 – O Tribunal a quo, na fixação do quantum indemnizatório pelos lucros cessantes, violou, pelo exposto, o vertido nos artigos 562º e 566º do CC. 22 – Relativamente aos danos não patrimoniais, a compensação atribuída ao autor de 12 500,00 euros apresenta-se excessiva, face aos dados apurados e à Jurisprudência maioritária em casos análogos. 23 – Considerando a globalidade dos factos apurados e os critérios comummente estabelecidos na Jurisprudência dominante, entende a recorrente que será de atribuir ao autor, com recurso à equidade, uma compensação no valor de 10 000,00 euros. 24 – Esta quantia deverá sempre ser considerada como actualizada para efeito de contabilização de juros, por via do recurso à equidade, conforme decidido no Ac. STJ de 18.03.2010, acessível em www.dgsi.pt. 25 – A douta sentença, na fixação do dano não patrimonial, violou o disposto nos artigos 494º e 496º do CC, por excesso de quantia arbitrada. * Não foram oferecidas contra-alegações. As questões a decidir são: I) Valor dos rendimentos do autor (recurso da ré). II) Montante da indemnização pela incapacidade temporária absoluta (recurso da ré). III) Montante da indemnização pela incapacidade permanente parcial (recurso do autor e da ré). IV) Montante da indemnização por danos não patrimoniais (recurso da ré). V) Juros sobre a indemnização por danos não patrimoniais (recurso do autor). * * FACTOS. Os factos considerados provados pela sentença recorrida são os seguintes: 1. No dia 18 de Julho de 2004, pelas 16.50 horas, na Estrada Municipal nº306, ao quilómetro número 29,350, na freguesia de Rebordões Santa Maria, Ponte de Lima, ocorreu um embate entre o motociclo de matrícula …-NQ, propriedade do autor e por si conduzido e o veículo de matrícula …-GZ, propriedade de V… e por si conduzido (A). 2. A Estrada Municipal nº306, no local do embate, configura um traçado curvilíneo, descrito para o lado direito, tendo em conta o sentido Ponte de Lima - São Julião de Freixo (B). 3. E a sua faixa de rodagem tem uma largura de 05,90 metros (C). 4. O motociclo circulava no sentido São Julião de Freixo - Ponte de Lima, pela metade direita da faixa de rodagem, tendo em conta esse sentido (D). 5. A uma velocidade não superior a quarenta/cinquenta quilómetros por hora (E). 6. O veículo …-GZ circulava no sentido Ponte de Lima - S. Julião de Freixo (F). 7. E transpôs, para a sua esquerda, o eixo divisório da faixa de rodagem da Estrada Municipal nº306 (G). 8. E invadiu a metade esquerda da faixa de rodagem, atendo o sentido Ponte de Lima - São Julião de Freixo (H). 9. O autor travou, de imediato, o motociclo (I). 10. E encostou-o à sua direita, imobilizando a marcha (J e doc de fls 41 e 42 do procedimento cautelar). 11. Quando se encontrava parado e imobilizado, o motociclo foi embatido pelo veículo automóvel GZ (L). 12. Antes de embater contra o motociclo, o veículo deixou, marcados no pavimento, rastos de travagem com um comprimento de 21,30 metros (M). 13. Os rastos de travagem tinham o seu início sobre a metade direita da faixa de rodagem da Estrada Nacional nº306, tendo em conta o sentido Ponte de Lima - São Julião de Freixo e transpunham o eixo divisório onde se encontrava, pintada a cor branca, uma Linha sem Soluções de Continuidade, e terminavam sobre a metade esquerda da faixa de rodagem (N). 14. O embate ocorreu sobre a metade esquerda da faixa de rodagem da Estrada Municipal nº306, tendo em conta o sentido Ponte de Lima - São Julião de Freixo (O). 15. E verificou-se entre a parte frontal do veículo GZ e a parte frontal do motociclo (P). 16. No dia 8 de Setembro de 2004, a ré pagou ao autor o valor de 1 750,00 euros, relativo à diferença entre o valor venal do motociclo e valor dos seus salvados (Q). 17. Em virtude do embate, o autor sofreu traumatismo na coluna lombar, dorsal e cervical, traumatismo do ombro esquerdo, traumatismos dos dois membros inferiores, escoriações nas duas pernas, dor no ombro esquerdo, traumatismo do tornozelo esquerdo, traumatismo do joelho esquerdo, hematomas e escoriações espalhadas pelo corpo todo (R). 18. O autor foi transportado, de ambulância, para o Centro Hospitalar do Alto Minho, SA, de Ponte de Lima, onde lhe foram prestados os primeiros socorros, no respectivo Serviço de Urgência, realizados os exames radiológicos às regiões do seu corpo atingidas, efectuadas lavagens cirúrgicas, desinfecções e curativos às escoriações sofridas (S). 19. O autor teve alta hospitalar no dia do embate (T). 20. Posteriormente, o autor frequentou o consultório do Dr. I…, em Ponte de Lima, o qual lhe concedeu consultas, lhe fez exames vários e lhe efectuou tratamentos e curativos diversos (U). 21. E frequentou o consultório do Ortopedista Dr. C…, com consultório em Ponte de Lima, o qual lhe receitou uma TAC e uma RMN (V). 22. Posteriormente, o autor frequentou a Casa de Saúde da Boavista, com sede na cidade do Porto, por conta e a expensas exclusivas da ré, onde se dirigiu por quatro vezes (X). 23. Nesta Unidade Hospitalar, o autor realizou infiltração de corticóide, no ombro esquerdo (Z). 24. Após, por indicação da ré e a expensas exclusivas desta, o autor frequentou a Clínica de Reabilitação do Vale do Minho, Lda, com sede na vila de Ponte de Lima, ao longo de vinte e seis sessões (AA). 25. O autor nasceu no dia 11 de Novembro de 1956 (AB). 26. À data do embate e presentemente, o autor exercia e exerce a actividade/profissão de comerciante, do ramo alimentar, através da sociedade “S.V.L., Lda, de que são únicos sócios o autor e sua mulher (AC). 27. No exercício dessa sua profissão/actividade, o autor explora, por conta própria no âmbito da referida sociedade: - um estabelecimento de armazenamento e venda por grosso, de artigos de papelaria, vinhos e demais bebidas, sito em Ponte de Lima; - um estabelecimento de café, talho e mini-mercado, sito no lugar de Regatal, freguesia de Arcozelo, Ponte de Lima; - um estabelecimento de mini-mercado, sito no lugar de Barrosa, freguesia de Arcozelo, Ponte de Lima (AD). 28. A responsabilidade civil causada a terceiros pelo veículo automóvel ligeiro de passageiros, de matrícula …-GZ, encontrava-se transferida para a ré através de contrato de seguro, titulado pela apólice nº…, em vigor à data do embate (AE). 29. Não chovia (1). 30. E o pavimento asfáltico da Estrada nº306 encontrava-se limpo e seco (2). 31. Logo que termina a curva indicada em B, a Estrada nº306 desenvolve-se em traçado rectilíneo, em direcção a São Julião de Freixo (3). 32. Ao longo de uma distância superior a cento e cinquenta metros (4). 33. Para quem circula pela Estrada Nacional nº306, em qualquer dos seus dois sentidos de marcha, não consegue avistar a sua faixa de rodagem em toda a sua largura, ao longo de uma distância superior a trinta metros (5). 34. Em consequência do traçado curvilíneo aludido em B (6). 35. Sobre o eixo divisório da faixa de rodagem da Estrada Municipal nº306 existia, no local do embate, pintada a cor branca, uma Linha Sem Quaisquer Soluções de Continuidade (7). 36. O motociclo circulava com os rodados a uma distância não superior a 0,50 metros do limite da metade direita da faixa de rodagem, tendo em conta o sentido São Julião de Freixo - Ponte de Lima (8). 37. O veículo QZ circulava a uma velocidade superior a noventa quilómetros por hora (9). 38. E ao passar a descrever a curva aludida em B, o veículo QZ não travou, nem reduziu a velocidade a que circulava (10). 39. O veículo GZ efectuou o descrito em G no local onde existe pintada a cor branca, uma linha sem solução de continuidade (11). 40. E numa altura em que o motociclo se encontrava a uma distância não superior a dez metros dele (12). 41. A ré propôs ao autor o pagamento da quantia aludida em Q por carta datada de 6 de Agosto de 2004 solicitando o envio da documentação necessária ao envio do respectivo recibo (13). 42. O autor só enviou a documentação indicada em 13 no dia 3 de Setembro de 2004 (14). 43. E apresentou o recibo emitido pela ré a pagamento no dia 8 de Setembro de 2004 (15). 44. Durante a época do verão, o autor utilizava i motociclo diariamente (16). 45. No momento do embate e nos instantes que o precederam, o autor sofreu um enorme susto e receou pela sua própria vida (17). 46. O autor sofreu dores muito intensas, em todas as regiões do seu corpo atingidas, nomeadamente na coluna lombar, dorsal e cervical, no ombro esquerdo, nos dois membros inferiores, no tornozelo esquerdo (18). 47. Essas dores afligiram o autor, ao longo de um período de tempo superior a um ano (19). 48. Como sequelas sofridas, o autor apresenta: - SEQUELAS LESIONAIS: - alterações tróficas cicatriciais, hipermelanizadas, que ocupam parcialmente a face anterior da perna direita; - dano estético, ao nível a perna direita (face anterior); - alterações tróficas, hipermelanizadas, que ocupam a face anterior da perna esquerda; - dano estético, ao nível da perna esquerda (face anterior); - dor no ombro esquerdo; - limitação funcional do ombro esquerdo; - dor localizada na face anterior do ombro esquerdo; - sinais de tendiopatia crónica; - limitação dolorosa marcada, sobretudo nos movimentos de abdução, do membro superior esquerdo, agravando-se com o esforço; - SEQUELAS FUNCIONAIS: - limitação de todos os movimentos de elevação do membro superior esquerdo; - dor que se manifesta de forma intensa, com os movimentos de elevação do membro superior esquerdo; - SEQUELAS SITUACIONAIS: - condicionadas todas as tarefas que impliquem esforço com o membro superior esquerdo; - limitação de todas as tarefas que impliquem movimento e esforços com os dois membros inferiores; - compromisso marcado da actividade profissional do autor, de exploração, com fins lucrativos, de estabelecimentos de mercearia e de talhos, pela necessidade de executar tarefas diárias de elevação e transporte de embalagens e de peças e de carcaças de carne; - dores nas regiões do corpo atingidas – coluna lombar, dorsal e cervical, além de outras, nas mudanças climatéricas (20). 49. À data do embate, o autor não padecia de nenhuma enfermidade, nem nunca tinha sofrido qualquer acidente (21). 50. O autor sente-se desgostoso com as sequelas indicadas em 20 (22). 51. O autor sofreu um período de doença de trinta dias, com igual período de tempo com Incapacidade Temporária Absoluta Geral para o trabalho (23). 52. E um período de tempo de doença de duzentos e dez dias, com igual período de tempo com Incapacidade Temporária Parcial Geral para o trabalho (24). 53. E um período de doença de noventa dias, com igual período de tempo com Incapacidade Temporária Absoluta Profissional para o trabalho (25). 54. E um período de tempo de cento e cinquenta dias, com igual período de tempo com Incapacidade Temporária Parcial Profissional para o trabalho (26). 55. E um “Quantum Doloris” de grau 3, numa escala de 0 a 7 (27). 56. E sofreu um “Coeficiente de Dano” de grau 1, numa escala de o a 4 (28). 57. E sofreu um “Dano Estético” de grau 1, numa escala de 0 a 7 (29). 58. O autor ficou a padecer de uma Incapacidade Parcial Permanente Geral e profissional de 8% de acordo com a Tabela Nacional das Incapacidades (30 e 31). 59. Antes do embate, o autor trabalhava nunca menos de dezoito horas, por dia, no exercício da sua actividade comercial (32). 60. Sem descanso semanal, nos feriados e dias santos, a não ser um pequeno período de tempo, compreendido entre as 16,00 horas e 20,00 horas, dos domingos (33). 61. E sem nunca retirar qualquer período de tempo para o gozo de férias anuais (34). 62. Os estabelecimentos comerciais do autor facturavam cerca de 3 000,00 euros ilíquidos por dia, obtendo uma margem de lucro de 15%, retirando o autor, enquanto gerente, uma remuneração média na ordem dos 500,00 euros mensais (35 e 36). 63. O autor irrita-se com frequência, várias vezes ao dia, perante tarefas que se vê na necessidade de executar e não consegue, como sucedia antes do embate (37). 64. Perante a irritabilidade sentida, o autor interrompe os seus trabalhos e faz permanentes intervalos de descanso, várias vezes ao dia (39). 65. O autor recorre, com frequência, a um ajudante, que o passou a acompanhar, a complementar e a substituir, em tarefas que ele não é capaz de executar ou executar sozinho (41). 66. O autor efectuou as seguintes despesas: - consultas médicas e obtenção do relatório médico, 691,00 euros; - medicamentos, 469,22 euros; - meios de diagnóstico, 324,20 euros; - taxas moderadoras, 17,60 euros; - uma certidão de nascimento, 15,00 euros; - táxis, 78,00 euros; - certidão da participação de acidente, 7,12 euros; - deslocações em carro próprio, para se deslocar a Ponte de Lima, para sessões de fisioterapia – 26 vezes – e para se deslocar o Porto, para tratamentos, nos Serviços Clínicos da ré – 4 vezes –, num total de 1 112 kms x 0,35, 389,20 euros (42). 67. No momento do embate, o autor usava um blusão, um par de calças e um par de sapatos, no valor de 450,00 + 65,00 + 29,99, respectivamente (43). 68. Os quais ficaram danificados e inutilizados (45). * * ENQUADRAMENTO JURÍDICO. I) Valor dos rendimentos do autor. A indemnização por danos causados por factos ilícitos tem como objectivo reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que determinou a reparação (artigo 562º do CC) e, caso não seja possível a reconstituição natural, ou se esta não reparar os danos, ou se for excessivamente onerosa, deverá a indemnização ser fixada em dinheiro (artigo 566º nº1 do CC), mas, se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (artigo 566º nº3 do CC). Nos presentes autos, ambas as partes impugnam a forma de cálculo da indemnização fixada para os danos sofridos a título de incapacidade permanente parcial, impugnando ainda a ré o valor considerado pela sentença recorrida como sendo o dos rendimentos do autor, como base de cálculo para a referida indemnização. Assim, a primeira questão que se coloca é a de saber qual o rendimento médio que o autor auferia à data da consolidação das suas lesões, pois tal rendimento servirá de base para o cálculo da indemnização por danos sofridos com a incapacidade permanente parcial e também por danos sofridos com a incapacidade temporária. Ficou provado que o autor exercia e exerce a actividade de comerciante do ramo alimentar através de uma sociedade de que ele e a esposa são os únicos sócios, sendo o autor gerente da mesma, que explora vários estabelecimentos comerciais, os quais facturavam cerca de 3 000,00 euros ilíquidos por dia, obtendo uma margem de lucro de 15%, retirando o autor como gerente uma remuneração média de 500,00 euros mensais. Partindo destes factos provados e recorrendo à equidade, considerou a sentença recorrida que o rendimento médio do autor seria sempre superior à remuneração acima indicada e fixou-o em 1 000,00 euros mensais. Alega a recorrente ré que deverá ser considerado apenas o valor de 500,00 euros e que as eventuais repercussões sentidas pela sociedade não constituem danos sofridos pelo autor, mas sim pela sociedade. Contudo, sendo o autor e a esposa os únicos sócios da sociedade e dedicando-se o autor em exclusivo e intensamente à actividade de exploração dos estabelecimentos da sociedade, tem de se considerar que os lucros e rendimentos da sociedade pertencem indirectamente ao autor e que foi este (e o casal constituído por si e pela sua esposa) quem ficou prejudicado com a perturbação da exploração dos estabelecimentos da sociedade. É, pois, forçoso concluir que o real rendimento do autor, afectado pelas lesões sofridas, tinha ser superior ao valor da remuneração auferida como gerente, dele fazendo parte os rendimentos auferidos pela sociedade. Não sendo possível averiguar qual o exacto valor e face à dimensão da actividade, que englobava a exploração intensa de três estabelecimentos comerciais, parece-nos equitativamente adequado o valor de 1 000,00 euros mensais adoptado pela sentença recorrida. Improcedem assim as alegações da ré nesta parte. * II) Montante da indemnização por ITA. A indemnização pelos danos sofridos pelo autor com a incapacidade temporária antes da consolidação das lesões foi fixada pela sentença recorrida em 8 000,00 euros, com base num rendimento médio mensal de 1 000,00 euros e num período de 8 meses (240 dias). A recorrente ré discorda, com dois fundamentos, alegando, por um lado, que se retira do conteúdo das declarações fiscais do autor que o rendimento deste não diminuiu no ano em que se situa o período fixado pela sentença como sendo de incapacidade temporária e alegando, por outro lado, que tal período não está correctamente fixado, pois não é de 240 dias, mas sim de 165 dias. Provou-se que o autor costumava trabalhar nos estabelecimentos comerciais ininterruptamente, sem nunca tirar dias de férias, pelo que o período de incapacidade temporária para o trabalho, mesmo quando situado no Verão, tem de ser contabilizado para efeitos de indemnização. No que diz respeito às declarações fiscais do autor, as mesmas não constam dos factos provados, nem a ré recorrente impugnou a decisão da matéria de facto. Contudo, mesmo considerando-se provado que o autor fez as declarações fiscais que constam nos autos a fls 391 e seguintes (ao abrigo dos artigos do 659º nº3 e 713º do CPC), as mesmas não são impedimento para concluir que o autor terá ficado prejudicado com a incapacidade temporária. Desde logo porque, como vem referido na sentença recorrida, é facto notório que muitas vezes não é declarada a totalidade dos rendimentos; por outro lado, ignora-se se os rendimentos declarados poderiam ter sido superiores caso o autor não tivesse sofrido as dificuldades que sofreu. Quanto ao número de dias considerado, verifica-se dos factos descritos nos pontos 51. e 52. dos factos provados da sentença que o autor sofreu um período de 30 dias de incapacidade temporária absoluta geral e um período de 210 dias de incapacidade temporária parcial geral, ou seja, um período 240 dias de incapacidade temporária. E, de acordo com os factos dos pontos 53. e 54., desses 240 dias, 90 dias são de incapacidade temporária absoluta profissional e 150 dias são de incapacidade temporária parcial profissional. Por isso, está correcto o número de 240 dias contabilizado, correspondente a 8 meses de incapacidade temporária, findo o qual se deve então considerar que as lesões ficaram consolidadas com a incapacidade permanente parcial de 8%. É certo que desses 240 dias, 150 dias abrangem um período de incapacidade profissional temporária meramente parcial. Mas, ignorando-se a respectiva proporção e sabendo que a actividade do autor era intensa e exclusivamente dedicada aos estabelecimentos comerciais e, consequentemente, necessariamente determinante para o seu bom funcionamento, parece-nos que, de novo em harmonia com a equidade, deverá ser considerado o rendimento mensal médio de 1 000,00 euros por inteiro, durante todo o período de 240 dias (8 meses) de incapacidade temporária. Revela-se, portanto, correcta a quantia de 8 000,00 euros como indemnização pela incapacidade temporária sofrida pelo autor. * III) Montante da indemnização por IPP. Pelos danos sofridos com a incapacidade permanente parcial de 8% e consequente perda de capacidade de ganho, fixou a sentença recorrida a indemnização em 12 600,00 euros, montante de que discordam ambas as partes, pretendendo o autor uma indemnização de 40 000,00 euros e pretendendo a ré que a indemnização seja fixada em 7 000,00 euros. A reparação dos danos inclui a reparação dos danos futuros, ou benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão (artigo 564º nº2 do CC) e, tal como já acima referido, deverá o tribunal recorrer à equidade nos termos do artigo 566º nº3 do CC, quando não se puder averiguar o valor exacto dos danos. Para se fixar o valor adequado para ressarcir a perda de ganho futuro de um lesado que fica afectado com uma incapacidade permanente parcial tem de se chegar a um montante que se calculará atendendo aos factores conhecidos (rendimento anual médio do lesado, extensão da incapacidade, idade do lesado e esperança de vida activa) e que, mediante a equidade, permita colmatar a aleatoriedade dos restantes factores (condições futuras de trabalho e de saúde do lesado, aumento do custo de vida ou melhoria do nível de vida, despesas inesperadas que venha a ter de efectuar ou liberalidades inesperadas de que venha a beneficiar, etc), de forma a que o lesado receba um capital que abranja a sua vida activa, sem que o enriqueça injustificadamente pelo recebimento antecipado do mesmo. No presente caso, como vimos, deverá ser contabilizado um rendimento mensal de 1 000,00 euros, que, multiplicado por 14 meses, corresponde a um rendimento anual de 14 000,00 euros. Tendo ficado com uma incapacidade permanente parcial de 8%, a perda anual de ganho do autor corresponde a 1 120,00 euros (14 000,00 euros x 8%). O autor nasceu no ano de 1956, por isso tinha 48 anos em 2004, no ano do acidente. Mas, como já vimos, o autor sofreu um período de incapacidade temporária de 8 meses, pelo que as lesões só ficaram consolidadas 8 meses depois da data do acidente, ou sejam em 18 de Março de 2005. Deverá, pois, considerar-se que só a partir do ano de 2005 o autor passou a sofrer de uma IPP de 8% (antes disso, entre a data do acidente e a consolidação, o autor sofreu incapacidades temporárias), sendo esse ano de 2005 o ano que deve servir de base de cálculo para a perda de capacidade de ganho (e não o não de 2004), ano em que o autor completou 49 anos de idade. Conforme tem sido entendido pela jurisprudência (nomeadamente do ST: acs 14/10/2010 e 12/01/2010, em www.dgsi.pt, o segundo sumariada), trabalhando o lesado por conta própria e tendo aumentado a esperança média de vida, não se deverá fixar o fim da vida activa em idade inferior a 70 anos. Deste modo, passando o autor a sofrer a IPP a partir do ano de 2005, ano em que completou 49 anos de idade, falta-lhe 21 anos para atingir o fim da vida activa. Multiplicando a perda de ganho anual de 1 120,00 euros por 21 anos, temos o valor de 23 520,00 euros, o qual deverá ser reduzido de forma a que o lesado não beneficie injustificadamente do facto de receber este valor antecipadamente, situação que não ocorreria se não tivesse sofrido as lesões em causa. Tudo ponderado, parece-nos equitativamente adequado e conforme à jurisprudência existente em casos semelhantes fixar o valor da indemnização em 20 000,00 euros. Improcede, pois, o recurso da ré nesta parte, procedendo parcialmente o do autor, também nesta parte. * IV) Montante da indemnização por danos não patrimoniais. O lesado tem direito a ser ressarcido pelos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, nos termos do artigo 496º do CC. Na reparação destes danos nunca é possível a reconstituição da situação anterior à lesão, pelo que estabelece o nº3 do referido artigo 496º do CC que “O montante será fixado equitativamente tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º”, sendo tais circunstâncias o grau de culpabilidade do agente, a sua situação económica e a do lesado e outras que se tenham apurado. No caso em apreço, o autor não deu causa ao embate, sendo exclusiva a culpa do condutor do outro veículo; sofreu traumatismo na coluna lombar, dorsal e cervical, traumatismos dos dois membros inferiores e do ombro esquerdo, hematomas e escoriações pelo corpo todo, foi transportado ao hospital e sujeito a tratamentos e a exames, teve de ser assistido por vários médicos e sujeito a reabilitação durante vinte e seis sessões, sofreu incapacidade temporária de 8 meses, após o que ficou com uma incapacidade permanente parcial de 8%, com alterações tróficas cicatriciais e dano estético nas duas pernas, dor e limitação do membro superior esquerdo e de tarefas que impliquem esforço com o membro superior esquerdo e com os dois membros inferiores, sofreu dores e sente-se frustrado com as limitações de ficou afectado. Todas estas circunstâncias levam a considerar não ser excessiva, mas sim adequada, a indemnização de 12 500,00 euros fixada pela sentença recorrida, que se mantém, improcedendo também nesta parte o recurso da ré. * V) Juros sobre a indemnização por danos não patrimoniais. Alega ainda o autor que a sentença recorrida não actualizou a indemnização por danos não patrimoniais, não sendo assim aplicável a jurisprudência fixada pelo acórdão do STJ de 4/2002 de 9/05/2005, segundo a qual os juros sobre a indemnização actualizada na decisão se contam a partir dessa data e não da data da citação. É certo que da leitura da decisão se poderia retirar essa conclusão, uma vez que aí se consignou que se fixava o valor de 12 500,00 euros “peticionado”. Contudo, conforme decorre do atrás exposto, entende-se adequada a referida indemnização de 12 500,00 euros com referência à data da sentença, independentemente de já ter sido pedido esse montante na petição inicial, pelo que se deve manter a contagem dos juros a partir da data da sentença, como foi decidido. * * * DECISÃO. Pelo exposto, decide-se julgar totalmente improcedente o recurso da ré e parcialmente procedente o recurso do autor e fixar em 20 000,00 (vinte mil euros) a indemnização pela incapacidade permanente parcial de que ficou afectado, mantendo-se a sentença recorrida no restante decidido. * Custas da apelação da ré pela apelante e custas da apelação do autor na proporção do vencimento. * 2011-03-22