Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório; Recorrente: Companhia de Seguros T… SA (ré); Recorridos Eusébio e Laura (autores); ***** Eusébio e Laura demandaram na presente acção de condenação a Companhia de Seguros T… SA, reclamando desta o pagamento da quantia de €22.414,76, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação e até integral pagamento, e, ainda, a pagar à A. a quantia que se viesse a liquidar em execução de sentença relativa a danos sofridos na saúde desta, intervenções cirúrgicas, exames e tratamentos médicos que houvesse lugar - quantias estas relativas a danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelos AA. num acidente de viação em que intervieram, produzido por culpa do condutor do veículo de matrícula 10-66-TT seguro na Ré. A Ré contestou, impugnando os alegados danos sofridos pelos AA.. Dispensou-se a prolação do despacho saneador, com fixação de factos assentes e elaboração da base instrutória. Os AA. formularam pedido de ampliação do pedido a fls. 79/81, peticionando a condenação da Ré a pagar-lhes a quantia de € 12.505,03 (doze mil quinhentos e cinco euros e três cêntimos) para além do que foi inicialmente indicado, o que foi deferido. Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença que condenou a Ré a: - A) Pagar aos AA. a quantia € 27.364,82 (vinte e sete mil trezentos e sessenta e quatro euros e oitenta e dois cêntimos), a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora, desde a data da citação e até integral pagamento, à taxa legal de 4%.; B) Pagar à A. a quantia de € 3.000,00 (três mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da presente sentença e até integral pagamento; C) Pagar à A. a quantia de € 500,00 (quinhentos euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da presente sentença e até integral pagamento. Inconformada com tal decisão, dela interpôs recurso a ré, de cujas alegações se transcreve o seguinte arrazoado de extensas, que não sintéticas Como o impõe o artº 685º-A, do Código de Processo Civil., conclusões: I- A Ré considera incorrectamente julgados e, por esse motivo, impugna a decisão proferida quanto aos pontos 24, 31, 34 e 35 do elenco de factos provados contestante da douta sentença, ou seja: - 24. A M & Costas cobrou aos AA o valor diário de 20,00€, acrescido de IVA, desde o dia 16 de Dezembro de 2008 até 15 de Setembro de 2009; - 31. Os AA utilizavam o veículo ZV, no seu quotidiano, nomeadamente para fazer compras domésticas, visitar familiares e amigos e ir ao cemitério; - 34. Os AA alugaram o veículo Volkswagen Pólo C, matrícula 38-EP-82 junto à MB Moverent-ACar, pelo período de 242 dias; - 35. importando esse aluguer a quantia diária de 33,33€, acrescida de IVA. II- Relativamente ao ponto 24 deverá ter-se em consideração que a Ré, a fls 107 impugnou o teor do documento de fls 82 (factura da M & Costas, Lda.) e nenhum outro elemento de prova foi produzido no sentido de confirmar a veracidade do seu teor; III- Além disso, da análise dos documentos de fls 271 e 272 constata-se que a M & Costas não só não cobrou o valor em causa dos AA, como pretendeu cobrá-lo, isso sim, da ora recorrente. IV- Tão pouco foi junto aos autos qualquer documento comprovativo do pagamento da importância do parqueamento à empresa M & Costas, estando antes reconhecido que não foi paga. V- A testemunha Maria da Glória, cujo depoimento se encontra registado no sistema de gravação H@bilus, no dia 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 15:18:13 e 16:11:53 confirmou que o custo respeitante ao parqueamento do veículo não foi liquidado e, inclusive, que foi enviada a respectiva factura ou, pelo menos, trocada correspondência com a Lusitânia para respectivo pagamento; VI- A factura respeitante a essa alegada despesa, junta a fls 82 destes autos, é datada de 18 de Setembro de 2009 e não há notícia de que o valor em causa tenha sido cobrado aos AA, ou por estes pago, nem é seguro que o venha a ser no futuro. VII- O simples facto de ter sido emitida uma factura não significa, forçosamente, que o valor venha a ser exigido aos demandantes, tanto mais que no decurso de mais de dois anos não há notícia de qualquer actuação da pretensa credora no sentido de exercer esse direito contra os demandantes. VIII- Assim, face ao depoimento da testemunha Maria da Glória, registado no sistema de gravação H@bilus, no dia 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 15:18:13 e 16:11:53 e ao teor dos documentos de fls 82, 271 e 272, deve o facto n.º 24º do elenco da matéria dada como demonstrada na douta sentença, ser dado como não provado. IX- Relativamente à matéria do ponto 31, depuseram as testemunhas Maria da Glória, cujo depoimento se encontra registado no sistema de gravação H@bilus, no dia 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 15:18:13 e 16:11:53 e Rui, cujo depoimento se encontra registado no sistema de gravação H@bilus nos dias 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 16:30:11 e 17:07:13 e dia 25/11/2001, entre os minutos 9:57:43 e 10:09:10, declarou que: X- Nos respectivos depoimentos estas testemunhas são convergentes num facto: o veiculo sinistrado era utilizado pelos demandantes, essencialmente, durante os fins-de-semana para efectuarem compras, visitar amigos e familiares e deslocarem-se ao cemitério. XI- Não resulta dos depoimentos em causa que essa utilização fosse quotidiana (“muito pouco uso”, referiu a testemunha Maria da Glória, essencialmente aos fins-de-semana), tanto mais que, segundo referiu esta testemunha, o demandante Eusébio deslocar-se-ia para o emprego a pé e a A. Laura em transportes públicos. XII- Além disso, foi dado como provado que o veículo ZV era do ano de 2005 (Maio desse ano, de acordo com o documento de fls 164) e contava 12.007 à data do acidente XIII- Feitas as contas, desde Abril de 2005 até à data do acidente, decorreram 3 anos de 8 meses, ou seja, 80 meses, nos quais os AA percorreram o equivalente a 150 quilómetros por mês e não mais de 5 quilómetros por dia! XIV- Esta escassíssima utilização da viatura confirma, efectivamente, que o uso da viatura não era diário ou quotidiano e, quando muito, ocorria aos fins-de-semana e, ocasionalmente, durante a semana. XV- Pelo que, face ao depoimento das testemunhas Maria da Glória, registado no sistema de gravação H@bilus, no dia 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 15:18:13 e 16:11:53 e Rui, registado no sistema de gravação H@bilus nos dias 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 16:30:11 e 17:07:13 e dia 25/11/2001, entre os minutos 9:57:43 e 10:09:10, bem como do documento de fls 164, não pode a matéria do quesito 31 ser dada como provada. XVI- Antes se impondo que seja dado como provado, apenas, que os AA utilizavam o veículo para algumas deslocações ao fim-de-semana, nomeadamente para fazer compras e deslocarem-se ao cemitério, únicos factos concretos que, com a necessária segurança, resultaram da prova produzida nestes autos. XVII- Relativamente à matéria dos pontos 34º e 35º do elenco de factos dados como provados na douta sentença, a prova produzida nestes autos foi, a nosso ver, escassa a insuficiente para que se tivesse decidido dá-la como demonstrada. XVIII- Desde logo, a Ré, a fls 107, impugnou o teor da factura de fls 83, bem como o fez, na respectiva contestação, relativamente ao documentos de fls 29, por desconhecer o seu teor e nenhuma outra prova tendo sido produzida no sentido de confirmar a sua veracidade. XIX- A testemunha Rui no seu depoimento registado no sistema de gravação H@bilus nos dias 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 16:30:11 e 17:07:13 e dia 25/11/2001, entre os minutos 9:57:43 e 10:09:10:, instado a esclarecer quais os meios de transporte utilizados pelos seus tios após o acidente para se movimentarem, respondeu, espontaneamente, que recorreram a transportes públicos e, sem o poder afirmar, taxis! XX- Só perante uma pergunta feita nos termos constantes da transcrição que se fez no corpo destas alegações (“Advogada: Que conhecimento é que tem? Como é que o veículo foi alugado, se é que tem conhecimento?”) é que a testemunha se lembrou do aluguer de um veículo.... XXI- A testemunha Maria da Glória, por seu turno, declarou no seu depoimento registado no sistema de gravação H@bilus, no dia 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 15:18:13 e 16:11:53 que pouco ou nenhum conhecimento tinha quanto ao aluguer de automóvel. XXII- Destes dois depoimentos não podemos, salvo melhor opinião, retirar com a devida segurança que ao AA procederam, efectivamente, ao aluguer e utilização de um veiculo. XXIII- Acresce que o contrato de aluguer (cujo teor foi impugnado pela Ré), terá sido celebrado com a M & Costas, S.A. e não com o autor - cfr fls 29 (onde é mencionado como “Cliente” a M & Costas). XXIV- Além disso, também quanto a esta alegada despesa no aluguer de um veículo se verifica uma inexplicável complacência do alegado credor, a MBRent, que continua à espera há mais de 2 anos pelo respectivo pagamento, sem que haja notícia nos autos de qualquer atitude concreta no sentido de obter a sua cobrança. XXV- Ademais, dos documentos de fls 83 e 144 (factura desse aluguer) retira-se que o veículo de substituição terá sido alugado e entregue aos demandantes no dia 16 de Janeiro de 2009, pelas 14:47 minutos, contando 9.320 km.- doc 1 que se junta novamente, assinalando-se o local onde essa menção é feita. XXVI- E consta ainda desse documento que o mesmo automóvel, de matricula 38-EP-82 foi entregue na MBRent no dia 15 de Setembro de 2009, à mesma hora, contando já 20.145 km. XXVII- Ou seja, do próprio documento junto pelos AA resulta que o automóvel que terá, alegadamente, sido alugado aos demandantes e por estes utilizado durante 242 dias, terá percorrido nesse período 10.842 km, isto é, em média, 44,80 km por dia e a bela soma de 1.344 km por mês! XXVIII- Não deixa, pois, de ser espantoso que os AA, donos de um carro durante 3 anos e 8 meses, nele não tenham percorrido mais de 12.000 km e, após o aluguer de um outro carro, nele tenham circulado em 8 meses quase o mesmo número de quilómetros. XXIX- Esta circunstância, associada ao teor dos depoimentos prestados em audiência, descredibiliza a versão dos AA de que foi, efectivamente, alugado um automóvel e, sobretudo, que dele tenham feito, pessoalmente, uso. XXX -Pelo que, face ao depoimento as testemunhas Maria da Glória (sobrinha “afectiva” dos AA e funcionária da empresa M & Costas, SA), registado no sistema de gravação H@bilus, no dia 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 15:18:13 e 16:11:53 e Rui, registado no sistema de gravação H@bilus nos dias 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 16:30:11 e 17:07:13 e dia 25/11/2001, entre os minutos 9:57:43 e 10:09:10, bem como do documento de fls 29, 83 e 144, não pode a matéria dos pontos 34º e 35º do elenco de factos dados como provados na douta sentença ser dada como demonstrada, antes se impondo que seja considerados não provados. XXXI- Na apreciação do objecto deste processo devermos ter em conta que a regularização extra-judicial das consequências deste acidente não foi, inicialmente, assegurada pela Ré, mas antes pela L… Companhia de Seguros, S.A., seguradora do veículo dos demandantes (cfr ponto 32 da matéria de facto provada), como se vê de fls 114, 115, 117, 164 a 170, 173, 174, 175, 177 e 178 destes autos. XXXII- Ora, a intervenção da L… na regularização do acidente não podia ser acompanhada por simultâneo tratamento das consequências do sinistro pela T…, ora Ré. XXXIII- Só em 23 de Janeiro de 2009 a L… informou os AA que não iria assumir a responsabilidade, legitimando a intervenção da Ré e a primeira comunicação feita pelos AA à Ré relativamente a este acidente é datada de 19 de Janeiro de 2009 (cfr ponto 66 da matéria de facto provada). XXXIV- O s danos cuja indemnização se peticionou nesta acção verificaram-se antes do início da intervenção da ora Ré e, na sua esmagadora maioria, no decurso do processo ou seja, depois de instalado um litígio judicial. XXXV- E, como se colhe do documento de fls 278, a Ré teve de enfrentar a presente acção sem o conhecimento cabal, por facto que não lhe é imputável, dos danos ocorridos em consequência do acidente. XXXVI- Face ao acima exposto e caso venha a ser alterada a decisão proferida quanto à matéria de facto, designadamente no que toca à “cobrança” pela M & Costas, S.A. aos autores do valor do parqueamento da viatura (ponto 24), impor-se-á, a absolvição da Ré, nessa parte, do pedido. XXXVII- Porém, mesmo que assim não se venha a decidir, o que não se concede, jamais se justificaria a atribuição do valor em causa. XXXVIII- Desde logo tal importância não foi paga pelos demandantes (o que não deixa de ser estranho, já que se trata de dívida que, neste momento, já tem mais de dois anos). XXXIX- Além disso, não bastará concluir-se pela viabilidade da reparação para que se justifique a atribuição de indemnização pelo depósito de um carro numa oficina e, por outro, não é consequência necessária de uma paralisação de um automóvel a existência de um custo de parqueamento. XL- No essencial, entendeu o tribunal que os AA estavam convencidos de que a reparação da viatura seria efectuada, assim que a Ré se dignasse a assumir a responsabilidade, pelo foram deixando o veículo na oficina para que assim se procedesse. XLI- Porém, tal facto não foi alegado pelos AA, ou seja, não referiram em momento algum do processo que tenha sido essa a justificação do depósito da viatura na oficina, nem pode assumir-se que era esse o propósito ou expectativa dos demandantes quando em Março de 2009, ou seja, já com o veículo depositado, intentaram a presente acção. XLII- Pelo menos na data da propositura do processo (23 de Março de 2009) e atento o litígio instalado com a Ré, não poderiam os demandantes continuar a esperar como possível que essa reparação viesse a ser feita antes de terminado o pleito por si intentado. XLIII- Perante a instauração do processo judicial impunha-se aos demandantes que tivessem retirado o veículo da oficina, colocando-o em local onde não tivessem de suportar uma despesa diária de 20€, totalmente desnecessária. XLIV- Além disso, como referiu, nomeadamente, a testemunha Rui no seu depoimento gravado, os AA dispunham de uma garagem onde, aliás, o carro se encontra desde 15 de Setembro de 2009. XLV- Ora, assim sendo, não existe qualquer nexo de causalidade entre o sinistro e esse pretenso gasto no parqueamento do veículo na oficina, já que não é consequência directa e necessária de um acidente a necessidade de parqueamento do veículo numa oficina, sobretudo quando os lesados dispõe de local apropriado onde, sem custo, esse veículo possa ser depositado (no caso a sua própria garagem). XLVI- Aliás, nada foi peticionado pelos AA relativamente ao período de 15 de Setembro de 2009 em diante (e referiram as testemunhas que o carro ficou parqueado na garagem dos demandantes desde então), o que resulta, precisamente, do facto de aqueles terem, finalmente, optado por limitar o dano que, anteriormente, permitiram que se avolumasse. XLVII- Em face do exposto, não lograram os demandantes, no que toca a este concreto dano, demonstrar os factos necessários para que se concluísse existir um nexo de causalidade entre os mesmos e o sinistro, o que passaria, julgamos nós, pela alegação, designadamente, de que não dispunham de local onde o veículo pudesse ser depositado a não ser a oficina, ou que o seu transporte desde esse local até outro era técnica ou economicamente inviável, factos que eram constitutivos do seu direito(cfr artigo 342º do Código Civil). XLVIII- Devendo, pois, a Ré ser absolvida, nessa parte, do pedido. XLIX- No que toca ao valor do aluguer de automóvel, caso venha a ser alterada a decisão proferida quanto à matéria e facto e não se demonstrando um efectivo prejuízo patrimonial decorrente da privação do uso da viatura, deverá, na parte respeitante ao dano da privação do uso do veículo, ser a Ré absolvida do pedido, como vem entendendo a nossa jurisprudência, designadamente a citada no corpo destas alegações. L- Acresce que, ainda que não fosse alterada a decisão proferida quanto aos factos dos pontos 34º e 35º do elenco de factos dados como provados na douta sentença, sempre deveria ser alterada a decisão quanto ao ponto 31º, que decorre, manifestamente, da prova produzida em julgamento e constante dos autos. LI- Assim, como resulta da prova produzida em audiência, a utilização do automóvel dos demandantes era quase residual, perfazendo uma média de não mais de 5 quilómetros diários ao longo de 3 anos e 8 meses prévios ao acidente. LII- Ora, em face do exposto, não pode afirmar-se, face à utilização que era dada ao automóvel sinistrada, que a privação do seu uso impusesse ou justificasse a necessidade de alugar de um automóvel. LIII- Com efeito, sendo a sua utilização, essencialmente, durante os fins de semana, o prejuízo com a privação do carro, a existir, verificar-se-ia, apenas, durante esse período de tempo semanal, não se verificando o necessário nexo de causalidade entre o acidente e o aluguer de um automóvel durante 242 dias. LIV- O direito de indemnização por privação do uso do automóvel, a ser reconhecido, deveria restringir-se aos danos que os AA efectivamente sofreriam por se verem impedidos de usar o automóvel, os quais apenas teriam ocorrido dentro dos limites da utilização que lhe davam. LV- Pelo que a indemnização a atribuir, em equidade, deveria ser reduzida e proporcional a essa utilização, que seria, no máximo, durante dois dias por cada semana que decorreu desde a data do acidente até 15 de Setembro de 2009. LVI- De todo o modo, sempre seriam excessivas e desproporcionadas as verbas atribuídas na douta sentença pela privação do uso da viatura. LVII- Com efeito, os factos alegados (e, nesse caso, definitivamente assentes) sempre seriam insuficientes para que se concluísse pela existência do direito à indemnização atribuída, quer por parqueamento do veículo, quer pela substituição do automóvel. LVIII- No caso dos autos o que ocorreu, no essencial, foi uma substituição do tribunal pelos AA na definição do seu próprio prejuízo. LIX- Assim, em invés de alegarem os factos dos quais se retiraria e concluiria a extensão do respectivo prejuízo, limitaram-se a alegar que uma oficina lhes “cobrou” 20€ diários pelo depósito do automóvel e que “para fazerem face às necessidades de transporte no exercício das suas actividades e da vida diária, os AA viram-se forçados a proceder ao aluguer de um veículo de idênticas características – o veículo Vokswagen Polo C, matrícula 38-EP-82 – junto da empresa MB Moverent, Rent a car, Lda”. LX. Ora, qualquer um dos factos acima mencionados é, salvo o devido respeito, insuficiente para que se apurasse o prejuízo efectivo que os demandantes teriam ou tiveram com a privação do uso do veículo. LXI- Como se referiu já relativamente ao parqueamento da viatura, deveriam os AA ter alegado os factos necessários ao estabelecimento do concreto nexo de causalidade entre o acidente e o prolongado depósito do carro na oficina, o que não fizeram. LXII- E, relativamente ao dano decorrente da não utilização do automóvel, o facto de terem alegado que procederam ao aluguer de um veículo, não os isentava o dever de provar os prejuízos que da privação do uso do veículo resultariam. LXIII- O pretenso dano emergente – aluguer de um carro – foi motivado ou surgiu por iniciativa dos próprios AA, ao celebrarem um contrato com esse objecto. LXIV- Mas o que se procurava apurar nestes autos não era o custo desse aluguer, mas sim a perda patrimonial dos demandantes se assim não tivessem procedido. LXV- Acresce que os AA não alegaram que não dispusessem de meios financeiros bastantes para proceder à reparação da viatura. LXVI- Da factualidade apurada deve concluir-se que os AA dispunham de meios financeiros bastantes para proceder a essa reparação. LXVII- Na verdade, para evitar uma despesa que não ascenderia a 10.044,28€ (reparação), os AA optaram por deixar avolumar o dano para a verba total de 26.661,28€ (10.044,28€ + 16.617€ [paralisação e parqueamento]). LXVIII- Se os demandantes não dispunham de meios financeiros bastantes para custear a reparação, igualmente lhes deveria estar vedado o aluguer de um carro e o depósito do veículo na oficina. LXIX- Se dispunham de meios financeiros bastantes para justificar a assunção de despesas no valor de cerca de 16.000€, poderiam e deveriam ter encaminhado tal importância para o único gasto efectivamente necessário e suficiente paraa evitar o prejuízo, que era a reparação do carro. LXX- E, note-se, o automóvel esteve parqueado na oficina de uma empresa (M & Costas, S,A,) que, passados mais de dois anos (desde 15 de Setembro de 2009 até hoje, pelo menos), não exigiu dos AA o pagamento da importância respeitante ao parqueamento e, tão pouco uma outra empresa desse grupo, a MBRent, exigiu, até à data, o pagamento do custo do aluguer do carro. LXXI- Tudo factos aos quais não será alheio, é certo, a relação de quase familiaridade que existe entre AA e funcionária dessa empresa. LXXII- Daí que seja legítimo questionar porque motivo não solicitaram os AA a reparação do carro (que custaria, relembre-se, cerca de 10.000€), mediante o compromisso de pagamento a essa mesmo grupo empresarial, ainda à espera (ao que dizem os AA) de mais de 16.000? LXXIII- Entende, por isso, a Ré que estava ao alcance dos AA, face ao acima exposto, evitar o agravamento desse prejuízo, pelo que é manifesto que houve culpa dos lesados no agravamento dos prejuízos, pelo que a indemnização deverá ser reduzida ou excluída, nos termos do artigo 570º do Código Civil. LXXIV- E sempre ofenderia os bons costumes e o respectivo fim social, o exercício do direito de indemnização dos demandantes por paralisação nos termos em que foi reconhecido. LXXV- Isto porque não é moralmente aceitável que um lesado se coloque numa posição que propicie o recebimento de indemnização no valor de mais de 26.000€ por se julgar irresponsável pelo dever de evitar um gasto de apenas 10.000€. LXXVI- O dever de boa-fé das partes no cumprimento das obrigações, bem como no exercício de direitos imporia comportamento diferente, que passaria pela reparação do carro. LXXVII- Pelo que deve ser impedido o exercício desse direito, reduzindo-se a indemnização pela paralisação para montantes equitativos de conformes. LXXVIII- Em face do acima exposto e caso se venha a concluir pela existência de direito a indemnização pelo parqueamento e privação do uso de veículo, o que só se admite de forma subsidiária, deveria recorrer-se à equidade para a sua fixação. LXXIX- Como tal, será adequado considerar-se, em equidade, que o único período relativamente ao qual o depósito do veículo na oficina se justificaria seria o ocorrido entre o dia 15 de Dezembro (data em que o automóvel foi entregue na oficina) e o da sua peritagem (ocorrida em 29 de Dezembro de 2008- cfr fls 164). LXXX- Quando muito seria razoável que se considerasse estendido esse período até ao momento em que foi proposta a acção, data a partir da qual deixou de ser aceitável a manutenção do carro na oficina, por se ter esgotado a via extra-judicial. LXXXIII- Pelo que, não se considerado de afastar o direito de indemnização em causa (tanto mais que os AA não procederam, sequer, ao pagamento do custo do parqueamento e não se sabe se alguma vez o irão suportar) a indemnização teria, necessariamente, de ser reduzida a não mais de 1940€+Iva, correspondentes a 97 dias (entre 16 de Dezembro de 2008 e 23 de Março de 2009). LXXXIV- E, relativamente ao veículo de substituição, em equidade, a indemnização deveria ser reduzida a não mais de 78 dias (correspondes a fins-de-semana desde 16 de Dezembro de 2008 até Setembro de 2009), os quais, ao montante de 33€ correspondente ao custo do aluger de um automóvel, ascenderiam a 2.574,00€+IVA. LXXXV- A douta sentença sob censura violou as normas dos artigos 334º, 496º, 566º e 570º do Código Civil. Pede a revogação da sentença. Apresentaram os recorridos as respectivas contra-alegações, pugnando pelo julgado. II – Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar; O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das alegações, nos termos dos artigos 660º, nº 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 685º-A, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (doravante CPC). As questões suscitadas pela Recorrente radicam no seguinte: - Alteração da matéria de facto relativamente aos pontos de facto provados nºs 24, 31, 34 e 35; - Montante da indemnização devida pelo dano patrimonial relativo à alegada paralização do veículo; Colhidos os vistos, cumpre decidir. III – Fundamentos; 1. De facto; A factualidade dada como assente na sentença recorrida é a seguinte: 1. No dia 13 de Dezembro de 2008, pelas 19h20, o veículo ligeiro de passageiros, marca Seat, 6l, Ibiza, 1200 cc, matrícula 01-92-ZV, propriedade dos AA, circulava na Avenida da Imaculada Conceição, em Braga… 2. Na hemi-faixa da direita, atento o sentido Braga-Ferreiros/Rua Cidade do Porto, 3. Seguindo esse sentido… 4. A uma velocidade inferior a 50 Km/h 5. Conduzido pelo A…. 6. E transportando como passageira a A… 7. E o veículo ligeiro de passageiros, marca Fiat Punto 55S, matrícula 28-31-EL, conduzido por Susana Maria Ferreira da Silva, transportando como passageiros João Manuel Macedo Silva e Andreia Filipa Ferreira da Silva,…. 8. Circulava na faixa mais à esquerda da hemi-faixa da direita, atento o sentido Ferreiros/Rua Cidade do Porto- Braga, seguindo essa direcção…. 9. E o veículo pesado de passageiros, marca Scania, matrícula 10-66-TT, propriedade da Arriva Portugal Transportes, Ldª, conduzido por Joaquim Ferreira de Oliveira… 10. Circulava na faixa central da hemi-faixa de rodagem da direita, atento o sentido Ferreiros/Rua Cidade do Porto- Braga, seguindo essa direcção. 11. O veículo TT embateu na traseira do veículo EL quando, sem se certificar que podia realizar tal manobra em segurança, invadiu a faixa mais à esquerda da hemi-faixa direita atento o sentido Ferreiros/Rua Cidade do Porto- Braga… 12. Em consequência do embate, o veículo EL entrou em despiste, transpôs o separador central e invadiu a hemi-faixa da direita, atento o sentido Braga-Ferreiros/Cidade do Porto,… 13. E aí embateu no veículo ZV, à entrada do túnel existente no local, conhecido por túnel Santos da Cunha, 14. O qual, desgovernado, foi imobilizar-se contra o muro do túnel, à sua direita. 15. A Avenida da Imaculada Conceição é bem iluminada… 16. E possui três vias na hemi-faixa destinada ao trânsito que circula no sentido Braga- Ferreiros/Cidade do Porto… 17. E três vias na hemi-faixa destinada ao trânsito que circula no sentido Ferreiros/Cidade do Porto-Braga, sendo uma destinada a autocarros. 18. O limite da velocidade máxima na Avenida da Imaculada Conceição é de 50km/h. 19. À data do embate, o piso encontrava-se molhado. 20. Em consequência do embate, o veículo ZV sofreu estragos na frente, lados direito e esquerdo, e traseira. 21. A reparação do veículo ZV é viável de acordo com as especificações técnicas disponibilizadas pela marca Seat e com o uso de ferramentas e equipamentos preconizados por esta marca, importando a quantia de € 10.044,28. 22. Os estragos sofridos no veículo ZV determinaram a sua imobilização. 23. O veículo ZV esteve imobilizado no parque da M. & Costas desde o dia 15 de Dezembro de 2008 até ao dia 15 de Setembro de 2009. 24. A M.& Costas cobrou aos AA. o valor diário de € 20,00, acrescido de IVA, desde o dia 16 de Dezembro de 2008 até 15 de Setembro de 2009, no valor global de € 6.576,00 (IVA incluído). ´ 25. O veículo ZV é do ano de 2005… 26. E tinha percorrido 12.007 km à data do embate. 27. Um veículo de idênticas características ao veículo ZV custava, em Abril de 2009, em estado de novo, € 14.638,00. ´ 28. À data do embate, o valor comercial do veículo ZV era de € 9.941,00. 29. Os AA. residem em Ferreiros. 30. A A. trabalha em Braga, como empregada doméstica. 31. Os AA. utilizavam o veículo ZV, no seu quotidiano, nomeadamente para fazer compras domésticas, visitar familiares e amigos e ir ao cemitério. 32. A seguradora L…, com quem inicialmente contactaram, e a Ré não colocaram à disposição dos AA. qualquer veículo de substituição. 33. Os AA. utilizaram transportes públicos, nos dias 15, 27 e 29 de Dezembro de 2008, tendo gasto a quantia de € 21,60. 34. Os AA. alugaram o veículo Volkswagen Pólo C, matrícula 38-EP-82 junto à MB Moverent, Rent-A-Car, Ldª, pelo período de 242 dias. 35. Importando esse aluguer a quantia diária de € 33,33, acrescida de IVA. 36. A A. sofreu factura no escafóide cárpico esquerdo e fractura-avulsão do maléolo peroneal direito. 37. Os AA. foram assistidos no Hospital de S. Marcos em Braga. 38. A A. recorreu a vários médicos, foi a várias consultas e realizou vários exames. 39. A. gastou a quantia de € 207,61 em medicamentos… 40. E a quantia de € 261,30 em exames radiológicos e tratamentos. 41. A A. esteve de baixa médica entre a data do embate e o dia 09 de Fevereiro de 2009. 42. No dia 09 de Fevereiro de 2009, o médico da Ré deu alta para o trabalho à A., atribuindo-lhe uma incapacidade parcial para o trabalho de 10% (ITP). 43. Desde o embate, a A. sente perda de sensibilidade e força na mão esquerda e no pé direito. 44. A data da consolidação médico-legal das lesões sofridas pela A. foi fixada no dia 16 de Fevereiro de 2009. 45. A incapacidade permanente geral foi fixada à A. em 2 pontos. 46. Tal incapacidade é compatível com o exercício da sua actividade de empregada doméstica, implicando esforços suplementares. 47. Em 26 de Fevereiro de 2010, a A. não necessitava de quaisquer outros tratamentos. 48. O quantum doloris da A. foi fixado no grau 2. 49. No momento do embate, os AA. sofreram momentos de angústia e temeram pelas suas vidas. 50. A A. nasceu no dia 7 de Dezembro de 1948. 51. Antes do embate, a A. não padecia de qualquer lesão no pulso esquerdo e pé e perna direitos…. 52. Ou de qualquer outra mazela. 53. Após o embate, a A. sofreu de insónias. 54. Em consequência do embate, a A. partiu uns óculos…. 55. E comprou outros no valor de € 455,00. 56. No dia do embate, a A. vestia uma parka e umas calças que ficaram estragadas. 57. Os AA. pagaram a quantia de € 11,52 por uma certidão da participação do acidente. 58. À data do embate, a responsabilidade civil em relação a terceiros decorrente da circulação do veículo EL encontrava-se transferida para a Companhia de Seguros L…, SA, através da apólice 5528728. 59. A L… procedeu à avaliação dos danos sofridos pelos AA. em resultado do embate… 60. E prestou assistência médica à A. 61. A L… procedeu à avaliação dos danos sofridos no veículo ZV… 62. E estimou que a reparação do mesmo importava a quantia de € 9.242,86…. 63. E avaliou os salvados em € 1.000,00. 64. Por carta datada de 23 de Janeiro de 2009, a L… informou o A. de que “Procedemos à peritagem do veículo em referência, da qual se conclui estarmos perante uma perda total, uma vez que a reparação é materialmente impossível ou tecnicamente não aconselhável e o valor estimado para os danos sofridos, adicionado do valor dos salvados, ultrapassar o valor venal do veículo antes do sinistro…A estimativa do valor da reparação…totalizou 9.242,86. Após consulta feita ao mercado e de acordo com as tabelas do Eurotax, o valor de venda do veículo, à data do acidente, era de 9.550,00 e que o valor apurado para o salvado foi de 1.250,00….a responsabilidade pela produção do acidente deve-se na totalidade ao veículo 10-66-TT, por o seu condutor não ter tomado as devidas precauções ao efectuar a mudança de fila de trânsito, desrespeitando o estatuído no nº 1, do artigo 35º do Código da Estrada. Nestes termos, não nos é possível atender qualquer reclamação quanto aos prejuízos sofridos. Salientamos que, após a recepção desta carta, a L… não poderá ser responsabilizada por eventuais prejuízos decorrentes de atrasos na regularização do sinistro, com custos de recolhas em oficinas ou garagens, privação de uso do veículo ou outros.” 65. A responsabilidade civil por danos causados a terceiros decorrente da circulação do veículo TT encontrava-se transferida para a Ré, à data do embate, por contrato de seguro titulado pela apólice nº 1355105. 66. A 19 de Janeiro de 2009, a mandatária dos AA. enviou carta registada à Ré com o seguinte teor: “Na sequência de contacto efectuado pelos m/constituintes…analisado o acidente em que os mesmos se viram envolvidos, sou a contactá-los a fim de, com a máxima rapidez, resolvermos a questão. Mais informo, que no dia 15 de Janeiro de 2009, procederam os mesmos ao aluguer de um veículo automóvel.” 67. A 23 de Janeiro de 2009, a mandatária dos AA. enviou à Ré uma carta registada com o seguinte teor: “Na sequência da carta datada de 19 de Janeiro de 2009, ainda não respondida, sou a informar que a Companhia de Seguros L… concluiu após instrução que a produção do evento envolvendo os meus constituintes é da exclusiva responsabilidade do condutor do veículo 10-66-TT, vosso segurado. Mais informo que a Companhia de Seguros citada suspendeu todos os tratamentos e consultas médicas já agendadas relativas à minha constituinte Laura, a qual se encontra à data sem qualquer apoio médico essencial à cura das lesões sofridas. Assim sendo, venho uma vez mais requerer com a máxima celeridade na resolução deste caso.”. 68. Por carta registada enviada à mandatária dos AA., no dia 26 de Janeiro de 2009, a Ré concluiu que a responsabilidade pelo embate pertenceu na totalidade ao condutor do veículo 10-66- TT, por infracção do disposto no nº 2 do art. 14º do Código da Estrada. 69. No dia 03 de Fevereiro de 2009, a mandatária dos AA. dirigiu à Ré uma carta a remeter comprovativos de despesas efectuadas até àquela data pela A, a informar que a A. se viu forçada a recorrer a apoio médico privado, uma vez que o médico indicado pela Seguradora Lusitânia declinou continuar a tratá-la e a reiterar a informação de que os AA se viram forçados a alugar um veículo no dia 15 de Janeiro de 2009. 70. A Ré não emitiu qualquer resposta a esta comunicação. 71. A 23 de Fevereiro de 2009, a mandatária dos AA. dirigiu uma carta à Ré a remeter comprovativos de despesas médicas efectuadas pela A. a 03 de Fevereiro de 2009 e a propor um prazo de 10 dias para a resolução extra-judicial da questão. 72. A Ré não respondeu à carta datada de 23 de Fevereiro de 2009. 73. Durante o ano de 2007, o A. auferiu o rendimento bruto de € 7.770,28… 74. E durante o ano de 2008, o A. auferiu o rendimento bruto de € 7.933,00. 75. Durante os anos de 2007 e 2008, a A. não declarou qualquer rendimento. ***** 2. De direito; a) Alteração da matéria de facto relativamente aos pontos de facto provados nºs 24, 31, 34 e 35; b) Montante da indemnização devida pelo dano patrimonial relativo à alegada paralização do veículo; Suscita a apelante a modificação dos factos constantes dos pontos nºs 24, 31, 34 e 35 da matéria de facto, os quais foram considerados como provados. O seu teor é o seguinte: «- 24.. A M & Costas cobrou aos AA o valor diário de 20,00€, acrescido de IVA, desde o dia 16 de Dezembro de 2008 até 15 de Setembro de 2009; - 31. Os AA utilizavam o veículo ZV, no seu quotidiano, nomeadamente para fazer compras domésticas, visitar familiares e amigos e ir ao cemitério; - 34.. Os AA alugaram o veículo Volkswagen Pólo C, matrícula 38-EP-82 junto à MB Moverent-ACar, pelo período de 242 dias; - 35. importando esse aluguer a quantia diária de 33,33€, acrescida de IVA.». Quanto ao ponto de facto nº 24 pretende a recorrente que se considere como não provado, argumentando que o documento de fls. 82 (factura) foi impugnado e não existe documento comprovativo de pagamento desse parqueamento à empresa “M & Costas”, o que a testemunha Maria da Glória terá confirmado. No caso vertente, estando em causa o ressarcimento de danos causados por embate em acidente de viação, os alegados prejuízos que terão advindo para os recorridos pela não utilização do veículo emergem directa e conexamente da aludida cobertura de danos por força da apólice de seguro do condutor responsável por aquele evento danoso. Os danos peticionados a esse título – por privação do uso do veículo – estão interligados com a impossibilidade de utilização do mesmo para o fim a que se destinava. Trata-se de danos indemnizáveis e consequência directa e adequada da lesão - que lhe advieram do risco inerente à situação de “ choque “ do veículo, cobertura esta que contratara com a ré seguradora. Dito de outro modo, estamos perante danos que são decorrentes do facto de o lesado se ver privado do uso do veículo, em si mesmo, e não qualquer prejuízo que tenha decorrido dessa privação do uso, nomeadamente no âmbito do exercício de uma actividade a que estava adstrito o aludido veículo. São danos directos e conexos com a impossibilidade de utilização do veículo (e não reflexos dessa mesma privação de uso), sofridos em consequência de acidente de trânsito por despiste, o que constitui, por si só, um dano indemnizável, já que essa privação se traduz numa lesão no seu património, pois o dono do veículo vê-se impossibilitado do exercício do direito de utilização de uma coisa que lhe pertence Neste sentido vide o Acórdão da RG de 12.03.2009, Proc. 634/04.4TBBCL, in www. dgsi.pt.. Citando o douto aresto do STJ, Ac. de 57.02.07, in www.dgsi.pt, “ o dano produzido atinge, neste caso, a possibilidade e capacidade que são retiradas ao proprietário durante o tempo em que, por via do dano produzido, está privado do veículo”. E essa privação configura um dano patrimonial, dado que a utilidade de um veículo tem valor pecuniário. Trata-se, enfim, de lesão avaliável em dinheiro. Também ainda sobre esta problemática, convém sublinhar que é “ao autor da lesão (e, consequentemente, à seguradora para quem tenha sido transferida a responsabilidade), e não ao lesado, que compete agir, e de forma diligente, para que o dano seja reparado, de sorte que as implicações danosas acrescidas decorrentes do decurso do tempo correm por conta do obrigado à reparação do dano e não por conta do lesado” Veja Ac RG de 07.07.2011, in www.dgsi.pt. Reportando-nos ao caso, a argumentação da recorrente não é atendível. Desde logo, quanto ao ponto de facto nº 24, mostra-se ele suportado no documento de fls. 82 (factura) e no depoimento da testemunha Maria da Glória, funcionária da “M & Costas”e Rui Manuel da Silva Rodrigues, que confirmaram que o veículo ZV ficou parqueado na garagem daquela empresa e que foi emitida aquela factura para cobrança do montante em dinheiro correspondente a tal parqueamento. Daí que, não obstante a impugnação genérica de tal elemento documental, não deixou o lesado de fazer a prova material do conteúdo do mesmo, ou seja, de que a quantia constante da factura corresponde a uma despesa feita com o parqueamento daquela viatura por parte da sua emitente e cuja cobrança reclama, afim de ser ressarcida. Contrapõe a recorrente que não ficou seguro que o valor em causa tenha ou venha a ser cobrado aos AA. Ora, chama-se factura ao documento em que o vendedor ou prestador de serviços faz a discriminação completa das mercadorias que vende ao comprador ou dos serviços que presta e em que indica as despesas que efectuou, o preço e as condições de pagamento, tendo em vista o seu ressarcimento, assim como o IVA que sobre essa transacção incide a favor do Estado e que importa pagar também. Dos autos ou da análise em si da factura de fls. 82 não emerge qualquer elemento que permita inferir que se trata de um documento elaborado simulada ou falsamente, não tendo em vista ser cobrado. Além disso, como estatui o artº 565º, do Código Civil (doravante CC), no cálculo da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis. Pelo que, mesmo que os AA. não tenham pago ainda tal factura (as ditas testemunhas relataram que os AA. não têm dinheiro para o efeito), o seu valor a ser satisfeito constitui um prejuízo patrimonial que vão ter de arcar. Também quanto ao ponto de facto nº 31, nenhuma razão tem a recorrente. A realidade fáctica relatada pelas aludidas testemunhas alicerça a prova daquele ponto nº 31, ao afirmarem que os AA. “ (…) durante a semana penso que usavam para ir às compras”, “costumavam ir visitar os amigos todos os fins de semana”,” (…) iam ao cemitério ao meio da semana e ao fim da semana”, “usavam essencialmente a viatura para fazer, ao fim de semana as suas compras, as suas visitas aos amigos”,” E depois, durante a semana para se moverem, quando fosse preciso ir…” utilizaram a viatura de amigos durante algum tempo (da testemunha Maria da Glória por exemplo) para poderem deslocar-se e a A. fazer os tratamentos. E a circunstância de usarem algumas vezes os transportes públicos (porque ainda não tinham qualquer veículo, seja o seu, o de amigos ou o alugado, como afirmaram as aludidas testemunhas) só reforça o dano sofrido pelos demandantes inerente à privação do uso do seu veículo. Aliás, o termo quotidiano tanto significa todos os dias, diariamente, como muito comum, banal. O que é certo é que a disponibilidade de utilização do veículo sinistrado era diária, ainda que o pudessem usar com mais incidência aos fins-de-semana. Com a sua imobilização, ficaram privados desse uso em qualquer dia. Como se defende no Ac. desta Relação de Proc. 3116/09.4TBBCL, in dgsi.pt, «afirma A. Abrantes Geraldes [Indemnização do Dano da Privação do Uso, 39], tal privação, desacompanhada da sua substituição por um outro ou do pagamento de uma quantia bastante para alcançar o mesmo efeito, reflecte o corte definitivo e irrecuperável de uma “fatia” dos poderes inerentes ao proprietário. Nestas circunstâncias, não custa compreender que a simples privação do uso seja causa adequada de uma modificação negativa na relação entre o lesado e o seu património que possa servir de base à determinação da indemnização. E mesmo que se considere que a situação não atinge a gravidade susceptível de merecer a sua inclusão na categoria de danos morais, nos termos do artº 496º nº 1 do CC, é incontornável a percepção de que entre a situação que existia se não houvesse o sinistro e aquela que se verifica na pendência da privação existe um desequilíbrio que, na falta de outra alternativa, deve ser compensado através da única forma possível, ou seja, mediante a atribuição de uma quantia adequada. Tem sido também jurisprudência do STJ que a privação de uso de um veículo automóvel durante um certo lapso de tempo, em consequência dos danos sofridos em acidente de trânsito, constitui, só por si, um dano indemnizável (Cf., por todos, o Ac. de 29.11.2005, Col. Jur.- Acs. do STJ, ano XIII, tomo III, pág.151, e os mais aí citados). Segundo este mesmo Tribunal, o dano produzido atinge, neste caso, a propriedade – direito que tem como manifestações, entre outras, a possibilidade de utilizar a coisa e a capacidade de dispor materialmente dela; possibilidade e capacidade que são retiradas ao proprietário durante o tempo em que, por via do dano produzido, está privado do veículo. E a perda da possibilidade de utilização do veículo quando e como lhe aprouver tem, claramente, valor económico, e não apenas quando outro veículo é alugado para substituir o danificado». Ou seja, tal dano é indemnizável, seja a mera privação do uso do veículo, seja o custo do aluguer de um veículo de substituição Acórdão do STJ de 05.07.2007, Proc. nº 07B1849, in dgsi.pt,. Destarte, claudicam os argumentos da apelante nesta vertente. Também quanto à matéria dos pontos de facto provados nºs 34 e 35 deve a mesma manter-se, considerando-se aqui mutatis mutandis os argumentos acima expendidos quanto à força probatória do documento de fls. 83 – factura emitida pela empresa “MB Moverente-Rent a Car Ldª” – reiterando as apontadas testemunhas Maria da Glória e Rui que o referido veículo automóvel de substituição foi alugado e utilizado pelos AA., inclusive a uma festa de aniversário (como lembrou a testemunha Rui). No que concerne ao custo da recolha do veículo, cumpre assinalar que estamos perante um custo que os AA. não suportariam se, por um lado, não tivesse havido necessidade de reparar o seu veículo (por via do acidente) e se, por outro, a Ré tivesse pago pontual e atempadamente o que era devido aos AA. Refere a apelante que a conclusão pela viabilidade da reparação da viatura não justifica a indemnização pelo seu depósito numa oficina nem o seu parqueamento é consequência da paralisação do automóvel. Discorda-se frontalmente. Estamos aqui perante um nexo de causalidade adequado entre o evento danoso e o prejuízo. O custo do parqueamento do veículo dos AA. é ainda uma consequência do sinistro. E in casu essa adequação é tanto mais normal e necessária quanto é certo que se concluiu pela viabilidade da reparação do veículo (o veículo a reparar não há-de ficar exposto ao sol, à intempérie ou à fácil subtracção ou danificação de terceiros), ao invés da de perda total do mesmo, como defendeu temerariamente a congénere “L…”, já que o valor da reparação quase se equivalia ao valor comercial do veículo. Aliás, como acima ficou dito, a recorrente nem tem que se queixar, uma vez que, se houve agravamento dos danos pelo decurso do tempo, sibi imputet ou à sua dita congénere. Tanto mais que não facultou aos AA. um veículo de substituição, ainda que avisada para o aluguer de um veículo pelos AA., nem procedeu ao pagamento da reparação do veículo. E, como se disse, é sobre o lesante (e subsequentemente, à sua seguradora), obrigado ao ressarcimento dos danos, que se repercute os custos reflexos de falta de diligência nesse cumprimento, como sejam os de aluguer de um veículo ou o seu parqueamento, por via de retardamento na sua reparação. Diga-se, porém, a talhe de foice, como referiram as testemunhas Maria Glória e Rui que os AA., que estes nem sequer tinham possibilidades financeiras para proceder à reparação do veículo. Noutra linha, esgrime ainda a recorrente o argumento da concorrência de culpa dos lesados, aqui AA., no agravamento dos prejuízos, nos termos do artº 570º do CC, para concluir pela redução ou exclusão da indemnização. Arvora que, face aos elevados custos do parqueamento e do aluguer do veículo, deveriam os AA. proceder à reparação dos danos para prevenir tais gastos excessivos ou estão estava-lhes vedado o aluguer de um carro ou o seu depósito na oficina, uma vez que não tinha meios financeiros para tal. Não tem razão a apelante pelo simples facto de que, repete-se, é sobre a seguradora que impende o ónus de cumprir a prestação: reparar pontual e atempadamente os danos. A concorrência de culpas prevista no assinalado artº 570º pressupõe a prática de um facto culposo – negligente ou doloso - do lesado para a produção ou agravamento dos danos. Porém, no caso em apreço, se os custos inerentes ao aluguer de um veículo e depósito da viatura danificada, tal deve-se unicamente à falta de diligência da ré seguradora ou da sua congénere na resolução do sinistro, seja porque se escudou numa perda total do veículo que não lhe foi reconhecida judicialmente, seja porque, pese embora as várias cartas do lesado a alertá-la do referido aluguer do veículo e a solicitar a resolução do litígio, nada fez – pontos de facto nºs 64, 66, 67, 69 e 71. Por fim escuda-se também a recorrente no instituto do abuso de direito que o artº 334º do CC consagra, para asseverar que os AA. excederam os limites de boa fé, dos bons costumes e do respectivo fim social, ao pretenderam receber uma indemnização de mais de 26.000,00€, quando poderiam ter evitado que o gasto se cingisse a 10.000,00€. Alega assim a ré seguradora que o dever de boa-fé das partes no cumprimento das obrigações, bem como no exercício de direitos imporia comportamento diferente, que passaria pela reparação do carro. Antes de mais, diga-se que no caso de abuso de direito está em jogo um princípio de ordem e interesse público, não dependendo da invocação das partes a apreciação da questão - puramente de Direito e assim do âmbito do conhecimento mesmo do tribunal de revista - de saber de quem exercita o direito a que se arroga age motivado e sob condicionantes que tornem o seu exercício ilegítimo - cf. Acórdão do S.T.J., de 5/2/87, B.M.J., nº364, página 787. Antes da entrada em vigor do actual Código Civil, já Manuel de Andrade defendia a existência de abuso de direito quando este era exercido "em termos clamorosamente ofensivos da justiça", mostrando-se "gravemente chocante e reprovável para o sentimento jurídico prevalecente na colectividade" - Teoria Geral das Obrigações, página 63. E Vaz Serra, na mesma linha de pensamento, aludia à "clamorosa ofensa do sentimento jurídico socialmente dominante" - Boletim do Ministério da Justiça nº85, página 253. Hoje, de acordo com o estabelecido no artigo 334º do CC, "é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social e económico desse direito". Segundo Pires de Lima e Antunes Varela, adoptou-se neste preceito a concepção objectiva de abuso de direito, uma vez que " não é necessária a consciência de se excederem com o seu exercício os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito; basta que se excedam esses limites " - cfr. Código Civil Anotado, volume I, página 298. Não se contentou a lei, assim, com qualquer excesso; o excesso cometido tem que ser manifesto para poder desencadear a aplicabilidade do artigo 334º. Por isso, os tribunais só podem fiscalizar a " moralidade dos actos praticados no exercício de direitos ou a sua conformidade com as razões sociais ou económicas que os legitimam, se houver manifesto abuso " - autores e obra citada. Diferente é a posição de Castanheira Neves que vê no abuso de direito "um comportamento que tenha a aparência de licitude jurídica - por não contrariar a estrutura formal - definidora (legal ou conceitualmente) de um direito, à qual mesmo externamente corresponde - e, no entanto, viole ou não cumpra no seu sentido concreto materialmente realizado a intenção normativa que materialmente fundamenta e constitui o direito invocado ou de que o comportamento realizado se diz exercício" - cfr. Questão de Facto - Questão de Direito ou o Problema Metodológico da Juridicidade, página 518 e seguintes. Por seu turno, Orlando de Carvalho sustenta que o que importa averiguar é se o uso do direito subjectivo obedeceu ou não aos limites de autodeterminação, poder este que existe, tão somente, para se prosseguirem interesses e não para se negarem interesses, sejam eles próprios ou alheios, e o abuso de direito "é justamente um abuso porque se utiliza o direito subjectivo para fora do poder de se usar dele" (Teoria Geral do Direito Civil - Sumários Desenvolvidos, Coimbra, 1981, p. 44). Seja como for, para que possa funcionar o comando contido no artigo 334º, do Código Civil, tem de haver um excesso manifesto, o que significa que a existência do abuso de direito tem de ser facilmente apreensível sem que seja preciso o recurso a extensas congeminações.~ Haverá abuso de direito, segundo o critério proposto por Coutinho de Abreu "quando um comportamento aparentando ser exercício de um direito se traduz na não realização dos interesses pessoais de que esse direito é instrumental e na negação de interesses sensíveis de outrém" (Abuso de Direito, p. 43) . Configura-se, assim, um comportamento antijurídico que se caracteriza pelo exercício anormal do direito próprio, que não pela violação de um direito de outrém ou pela ofensa de uma norma tuteladora de um interesse alheio. E para que o abuso de direito exista, não basta que o exercício do direito pelo seu titular, cause prejuízo a alguém - a atribuição de um direito traduz deliberadamente a supremacia de certos interesses sobre outros interesses com aqueles confluentes, sendo necessário, sim, que o titular dele manifestamente exceda os limites que lhe cumpre observar, impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do próprio direito exercido . Ora, sendo obrigação da recorrente proceder à reparação do veículo sinistrado, o que esta ainda não cumpriu, nem se dispôs a colocar veículo de substituição à disposição dos AA. (ponto de facto nº 32), apesar de alertado pelo menos três vezes por aqueles (em 19.09.2009, 29.01.2009 e 03.02.2009), sendo que o veículo esteve imobilizado de 15.12.2008 a 15.09.2009, não se vislumbra como a conduta daqueles de alugarem um veículo para se transportarem e de parquearem o veículo acidentado, até para minimizarem os danos neste, pode constituir um exercício ilegítimo, tanto mais que, como as testemunhas Maria da Glória e Rui depuseram, nem sequer tinham possibilidades financeiras para proceder à reparação por conta própria. Também não se lhes impunha que diligenciassem tal, com vista a impedir o avolumar dos custos de aluguer e parqueamento, uma vez que, além daquela carência de meios, a ré seguradora (ou a sua congénere “Lusitânia”) jamais aceitou que se procedesse a essa reparação por ser viável (só em sentença tal foi decidido), antes assumindo que se tratava de uma perda total de veículo. Em conclusão, essa álea de reparação ou perda total que a seguradora quis jogar teve efeitos mais gravosos que sobre esta se repercutem! Os lesados limitaram-se a exercer legitimamente o seu direito à indemnização. Também não se descortina que tenha de haver recurso à equidade, uma vez que esta pressupõe que não possa ser averiguado o valor exacto dos danos – artº 566º, nº 3, do CC. Neste caso, quer as despesas atinentes ao aluguer do veículo, quer às relativas ao parqueamento mostram-se concretamente contabilizadas e reclamadas pelos prestadores de tais serviços, como se provou, pelo que o seu valor está determinado, funcionando o disposto nos nºs 1 e 2 do supracitado preceito na fixação da indemnização.* Não procede, pois, a apelação. Sintetizando: 1. É ao autor da lesão (e, consequentemente, à seguradora para quem tenha sido transferida a responsabilidade), e não ao lesado, que compete agir, e de forma diligente, para que o dano seja reparado, de modo que as implicações danosas acrescidas decorrentes do decurso do tempo correm por conta do obrigado à reparação do dano e não por conta do lesado. 2. Quer o aluguer de veículo, quer o custo do parqueamento da viatura sinistrada são danos indemnizáveis por serem consequência directa e adequada da privação do uso do veículo e da necessidade da sua reparação ainda não efectuada, resultantes do acidente de viação. IV – Decisão; Pelo exposto, acordam os juízes que constituem esta 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar improcedente a apelação e confirmar a decisão recorrida. Custas pela apelante. Guimarães, 26.04.2012 António Sobrinho Isabel Rocha Jorge Teixeira
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório; Recorrente: Companhia de Seguros T… SA (ré); Recorridos Eusébio e Laura (autores); ***** Eusébio e Laura demandaram na presente acção de condenação a Companhia de Seguros T… SA, reclamando desta o pagamento da quantia de €22.414,76, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação e até integral pagamento, e, ainda, a pagar à A. a quantia que se viesse a liquidar em execução de sentença relativa a danos sofridos na saúde desta, intervenções cirúrgicas, exames e tratamentos médicos que houvesse lugar - quantias estas relativas a danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelos AA. num acidente de viação em que intervieram, produzido por culpa do condutor do veículo de matrícula 10-66-TT seguro na Ré. A Ré contestou, impugnando os alegados danos sofridos pelos AA.. Dispensou-se a prolação do despacho saneador, com fixação de factos assentes e elaboração da base instrutória. Os AA. formularam pedido de ampliação do pedido a fls. 79/81, peticionando a condenação da Ré a pagar-lhes a quantia de € 12.505,03 (doze mil quinhentos e cinco euros e três cêntimos) para além do que foi inicialmente indicado, o que foi deferido. Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença que condenou a Ré a: - A) Pagar aos AA. a quantia € 27.364,82 (vinte e sete mil trezentos e sessenta e quatro euros e oitenta e dois cêntimos), a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora, desde a data da citação e até integral pagamento, à taxa legal de 4%.; B) Pagar à A. a quantia de € 3.000,00 (três mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da presente sentença e até integral pagamento; C) Pagar à A. a quantia de € 500,00 (quinhentos euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da presente sentença e até integral pagamento. Inconformada com tal decisão, dela interpôs recurso a ré, de cujas alegações se transcreve o seguinte arrazoado de extensas, que não sintéticas Como o impõe o artº 685º-A, do Código de Processo Civil., conclusões: I- A Ré considera incorrectamente julgados e, por esse motivo, impugna a decisão proferida quanto aos pontos 24, 31, 34 e 35 do elenco de factos provados contestante da douta sentença, ou seja: - 24. A M & Costas cobrou aos AA o valor diário de 20,00€, acrescido de IVA, desde o dia 16 de Dezembro de 2008 até 15 de Setembro de 2009; - 31. Os AA utilizavam o veículo ZV, no seu quotidiano, nomeadamente para fazer compras domésticas, visitar familiares e amigos e ir ao cemitério; - 34. Os AA alugaram o veículo Volkswagen Pólo C, matrícula 38-EP-82 junto à MB Moverent-ACar, pelo período de 242 dias; - 35. importando esse aluguer a quantia diária de 33,33€, acrescida de IVA. II- Relativamente ao ponto 24 deverá ter-se em consideração que a Ré, a fls 107 impugnou o teor do documento de fls 82 (factura da M & Costas, Lda.) e nenhum outro elemento de prova foi produzido no sentido de confirmar a veracidade do seu teor; III- Além disso, da análise dos documentos de fls 271 e 272 constata-se que a M & Costas não só não cobrou o valor em causa dos AA, como pretendeu cobrá-lo, isso sim, da ora recorrente. IV- Tão pouco foi junto aos autos qualquer documento comprovativo do pagamento da importância do parqueamento à empresa M & Costas, estando antes reconhecido que não foi paga. V- A testemunha Maria da Glória, cujo depoimento se encontra registado no sistema de gravação H@bilus, no dia 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 15:18:13 e 16:11:53 confirmou que o custo respeitante ao parqueamento do veículo não foi liquidado e, inclusive, que foi enviada a respectiva factura ou, pelo menos, trocada correspondência com a Lusitânia para respectivo pagamento; VI- A factura respeitante a essa alegada despesa, junta a fls 82 destes autos, é datada de 18 de Setembro de 2009 e não há notícia de que o valor em causa tenha sido cobrado aos AA, ou por estes pago, nem é seguro que o venha a ser no futuro. VII- O simples facto de ter sido emitida uma factura não significa, forçosamente, que o valor venha a ser exigido aos demandantes, tanto mais que no decurso de mais de dois anos não há notícia de qualquer actuação da pretensa credora no sentido de exercer esse direito contra os demandantes. VIII- Assim, face ao depoimento da testemunha Maria da Glória, registado no sistema de gravação H@bilus, no dia 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 15:18:13 e 16:11:53 e ao teor dos documentos de fls 82, 271 e 272, deve o facto n.º 24º do elenco da matéria dada como demonstrada na douta sentença, ser dado como não provado. IX- Relativamente à matéria do ponto 31, depuseram as testemunhas Maria da Glória, cujo depoimento se encontra registado no sistema de gravação H@bilus, no dia 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 15:18:13 e 16:11:53 e Rui, cujo depoimento se encontra registado no sistema de gravação H@bilus nos dias 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 16:30:11 e 17:07:13 e dia 25/11/2001, entre os minutos 9:57:43 e 10:09:10, declarou que: X- Nos respectivos depoimentos estas testemunhas são convergentes num facto: o veiculo sinistrado era utilizado pelos demandantes, essencialmente, durante os fins-de-semana para efectuarem compras, visitar amigos e familiares e deslocarem-se ao cemitério. XI- Não resulta dos depoimentos em causa que essa utilização fosse quotidiana (“muito pouco uso”, referiu a testemunha Maria da Glória, essencialmente aos fins-de-semana), tanto mais que, segundo referiu esta testemunha, o demandante Eusébio deslocar-se-ia para o emprego a pé e a A. Laura em transportes públicos. XII- Além disso, foi dado como provado que o veículo ZV era do ano de 2005 (Maio desse ano, de acordo com o documento de fls 164) e contava 12.007 à data do acidente XIII- Feitas as contas, desde Abril de 2005 até à data do acidente, decorreram 3 anos de 8 meses, ou seja, 80 meses, nos quais os AA percorreram o equivalente a 150 quilómetros por mês e não mais de 5 quilómetros por dia! XIV- Esta escassíssima utilização da viatura confirma, efectivamente, que o uso da viatura não era diário ou quotidiano e, quando muito, ocorria aos fins-de-semana e, ocasionalmente, durante a semana. XV- Pelo que, face ao depoimento das testemunhas Maria da Glória, registado no sistema de gravação H@bilus, no dia 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 15:18:13 e 16:11:53 e Rui, registado no sistema de gravação H@bilus nos dias 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 16:30:11 e 17:07:13 e dia 25/11/2001, entre os minutos 9:57:43 e 10:09:10, bem como do documento de fls 164, não pode a matéria do quesito 31 ser dada como provada. XVI- Antes se impondo que seja dado como provado, apenas, que os AA utilizavam o veículo para algumas deslocações ao fim-de-semana, nomeadamente para fazer compras e deslocarem-se ao cemitério, únicos factos concretos que, com a necessária segurança, resultaram da prova produzida nestes autos. XVII- Relativamente à matéria dos pontos 34º e 35º do elenco de factos dados como provados na douta sentença, a prova produzida nestes autos foi, a nosso ver, escassa a insuficiente para que se tivesse decidido dá-la como demonstrada. XVIII- Desde logo, a Ré, a fls 107, impugnou o teor da factura de fls 83, bem como o fez, na respectiva contestação, relativamente ao documentos de fls 29, por desconhecer o seu teor e nenhuma outra prova tendo sido produzida no sentido de confirmar a sua veracidade. XIX- A testemunha Rui no seu depoimento registado no sistema de gravação H@bilus nos dias 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 16:30:11 e 17:07:13 e dia 25/11/2001, entre os minutos 9:57:43 e 10:09:10:, instado a esclarecer quais os meios de transporte utilizados pelos seus tios após o acidente para se movimentarem, respondeu, espontaneamente, que recorreram a transportes públicos e, sem o poder afirmar, taxis! XX- Só perante uma pergunta feita nos termos constantes da transcrição que se fez no corpo destas alegações (“Advogada: Que conhecimento é que tem? Como é que o veículo foi alugado, se é que tem conhecimento?”) é que a testemunha se lembrou do aluguer de um veículo.... XXI- A testemunha Maria da Glória, por seu turno, declarou no seu depoimento registado no sistema de gravação H@bilus, no dia 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 15:18:13 e 16:11:53 que pouco ou nenhum conhecimento tinha quanto ao aluguer de automóvel. XXII- Destes dois depoimentos não podemos, salvo melhor opinião, retirar com a devida segurança que ao AA procederam, efectivamente, ao aluguer e utilização de um veiculo. XXIII- Acresce que o contrato de aluguer (cujo teor foi impugnado pela Ré), terá sido celebrado com a M & Costas, S.A. e não com o autor - cfr fls 29 (onde é mencionado como “Cliente” a M & Costas). XXIV- Além disso, também quanto a esta alegada despesa no aluguer de um veículo se verifica uma inexplicável complacência do alegado credor, a MBRent, que continua à espera há mais de 2 anos pelo respectivo pagamento, sem que haja notícia nos autos de qualquer atitude concreta no sentido de obter a sua cobrança. XXV- Ademais, dos documentos de fls 83 e 144 (factura desse aluguer) retira-se que o veículo de substituição terá sido alugado e entregue aos demandantes no dia 16 de Janeiro de 2009, pelas 14:47 minutos, contando 9.320 km.- doc 1 que se junta novamente, assinalando-se o local onde essa menção é feita. XXVI- E consta ainda desse documento que o mesmo automóvel, de matricula 38-EP-82 foi entregue na MBRent no dia 15 de Setembro de 2009, à mesma hora, contando já 20.145 km. XXVII- Ou seja, do próprio documento junto pelos AA resulta que o automóvel que terá, alegadamente, sido alugado aos demandantes e por estes utilizado durante 242 dias, terá percorrido nesse período 10.842 km, isto é, em média, 44,80 km por dia e a bela soma de 1.344 km por mês! XXVIII- Não deixa, pois, de ser espantoso que os AA, donos de um carro durante 3 anos e 8 meses, nele não tenham percorrido mais de 12.000 km e, após o aluguer de um outro carro, nele tenham circulado em 8 meses quase o mesmo número de quilómetros. XXIX- Esta circunstância, associada ao teor dos depoimentos prestados em audiência, descredibiliza a versão dos AA de que foi, efectivamente, alugado um automóvel e, sobretudo, que dele tenham feito, pessoalmente, uso. XXX -Pelo que, face ao depoimento as testemunhas Maria da Glória (sobrinha “afectiva” dos AA e funcionária da empresa M & Costas, SA), registado no sistema de gravação H@bilus, no dia 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 15:18:13 e 16:11:53 e Rui, registado no sistema de gravação H@bilus nos dias 7 de Novembro de 2011, entre os minutos 16:30:11 e 17:07:13 e dia 25/11/2001, entre os minutos 9:57:43 e 10:09:10, bem como do documento de fls 29, 83 e 144, não pode a matéria dos pontos 34º e 35º do elenco de factos dados como provados na douta sentença ser dada como demonstrada, antes se impondo que seja considerados não provados. XXXI- Na apreciação do objecto deste processo devermos ter em conta que a regularização extra-judicial das consequências deste acidente não foi, inicialmente, assegurada pela Ré, mas antes pela L… Companhia de Seguros, S.A., seguradora do veículo dos demandantes (cfr ponto 32 da matéria de facto provada), como se vê de fls 114, 115, 117, 164 a 170, 173, 174, 175, 177 e 178 destes autos. XXXII- Ora, a intervenção da L… na regularização do acidente não podia ser acompanhada por simultâneo tratamento das consequências do sinistro pela T…, ora Ré. XXXIII- Só em 23 de Janeiro de 2009 a L… informou os AA que não iria assumir a responsabilidade, legitimando a intervenção da Ré e a primeira comunicação feita pelos AA à Ré relativamente a este acidente é datada de 19 de Janeiro de 2009 (cfr ponto 66 da matéria de facto provada). XXXIV- O s danos cuja indemnização se peticionou nesta acção verificaram-se antes do início da intervenção da ora Ré e, na sua esmagadora maioria, no decurso do processo ou seja, depois de instalado um litígio judicial. XXXV- E, como se colhe do documento de fls 278, a Ré teve de enfrentar a presente acção sem o conhecimento cabal, por facto que não lhe é imputável, dos danos ocorridos em consequência do acidente. XXXVI- Face ao acima exposto e caso venha a ser alterada a decisão proferida quanto à matéria de facto, designadamente no que toca à “cobrança” pela M & Costas, S.A. aos autores do valor do parqueamento da viatura (ponto 24), impor-se-á, a absolvição da Ré, nessa parte, do pedido. XXXVII- Porém, mesmo que assim não se venha a decidir, o que não se concede, jamais se justificaria a atribuição do valor em causa. XXXVIII- Desde logo tal importância não foi paga pelos demandantes (o que não deixa de ser estranho, já que se trata de dívida que, neste momento, já tem mais de dois anos). XXXIX- Além disso, não bastará concluir-se pela viabilidade da reparação para que se justifique a atribuição de indemnização pelo depósito de um carro numa oficina e, por outro, não é consequência necessária de uma paralisação de um automóvel a existência de um custo de parqueamento. XL- No essencial, entendeu o tribunal que os AA estavam convencidos de que a reparação da viatura seria efectuada, assim que a Ré se dignasse a assumir a responsabilidade, pelo foram deixando o veículo na oficina para que assim se procedesse. XLI- Porém, tal facto não foi alegado pelos AA, ou seja, não referiram em momento algum do processo que tenha sido essa a justificação do depósito da viatura na oficina, nem pode assumir-se que era esse o propósito ou expectativa dos demandantes quando em Março de 2009, ou seja, já com o veículo depositado, intentaram a presente acção. XLII- Pelo menos na data da propositura do processo (23 de Março de 2009) e atento o litígio instalado com a Ré, não poderiam os demandantes continuar a esperar como possível que essa reparação viesse a ser feita antes de terminado o pleito por si intentado. XLIII- Perante a instauração do processo judicial impunha-se aos demandantes que tivessem retirado o veículo da oficina, colocando-o em local onde não tivessem de suportar uma despesa diária de 20€, totalmente desnecessária. XLIV- Além disso, como referiu, nomeadamente, a testemunha Rui no seu depoimento gravado, os AA dispunham de uma garagem onde, aliás, o carro se encontra desde 15 de Setembro de 2009. XLV- Ora, assim sendo, não existe qualquer nexo de causalidade entre o sinistro e esse pretenso gasto no parqueamento do veículo na oficina, já que não é consequência directa e necessária de um acidente a necessidade de parqueamento do veículo numa oficina, sobretudo quando os lesados dispõe de local apropriado onde, sem custo, esse veículo possa ser depositado (no caso a sua própria garagem). XLVI- Aliás, nada foi peticionado pelos AA relativamente ao período de 15 de Setembro de 2009 em diante (e referiram as testemunhas que o carro ficou parqueado na garagem dos demandantes desde então), o que resulta, precisamente, do facto de aqueles terem, finalmente, optado por limitar o dano que, anteriormente, permitiram que se avolumasse. XLVII- Em face do exposto, não lograram os demandantes, no que toca a este concreto dano, demonstrar os factos necessários para que se concluísse existir um nexo de causalidade entre os mesmos e o sinistro, o que passaria, julgamos nós, pela alegação, designadamente, de que não dispunham de local onde o veículo pudesse ser depositado a não ser a oficina, ou que o seu transporte desde esse local até outro era técnica ou economicamente inviável, factos que eram constitutivos do seu direito(cfr artigo 342º do Código Civil). XLVIII- Devendo, pois, a Ré ser absolvida, nessa parte, do pedido. XLIX- No que toca ao valor do aluguer de automóvel, caso venha a ser alterada a decisão proferida quanto à matéria e facto e não se demonstrando um efectivo prejuízo patrimonial decorrente da privação do uso da viatura, deverá, na parte respeitante ao dano da privação do uso do veículo, ser a Ré absolvida do pedido, como vem entendendo a nossa jurisprudência, designadamente a citada no corpo destas alegações. L- Acresce que, ainda que não fosse alterada a decisão proferida quanto aos factos dos pontos 34º e 35º do elenco de factos dados como provados na douta sentença, sempre deveria ser alterada a decisão quanto ao ponto 31º, que decorre, manifestamente, da prova produzida em julgamento e constante dos autos. LI- Assim, como resulta da prova produzida em audiência, a utilização do automóvel dos demandantes era quase residual, perfazendo uma média de não mais de 5 quilómetros diários ao longo de 3 anos e 8 meses prévios ao acidente. LII- Ora, em face do exposto, não pode afirmar-se, face à utilização que era dada ao automóvel sinistrada, que a privação do seu uso impusesse ou justificasse a necessidade de alugar de um automóvel. LIII- Com efeito, sendo a sua utilização, essencialmente, durante os fins de semana, o prejuízo com a privação do carro, a existir, verificar-se-ia, apenas, durante esse período de tempo semanal, não se verificando o necessário nexo de causalidade entre o acidente e o aluguer de um automóvel durante 242 dias. LIV- O direito de indemnização por privação do uso do automóvel, a ser reconhecido, deveria restringir-se aos danos que os AA efectivamente sofreriam por se verem impedidos de usar o automóvel, os quais apenas teriam ocorrido dentro dos limites da utilização que lhe davam. LV- Pelo que a indemnização a atribuir, em equidade, deveria ser reduzida e proporcional a essa utilização, que seria, no máximo, durante dois dias por cada semana que decorreu desde a data do acidente até 15 de Setembro de 2009. LVI- De todo o modo, sempre seriam excessivas e desproporcionadas as verbas atribuídas na douta sentença pela privação do uso da viatura. LVII- Com efeito, os factos alegados (e, nesse caso, definitivamente assentes) sempre seriam insuficientes para que se concluísse pela existência do direito à indemnização atribuída, quer por parqueamento do veículo, quer pela substituição do automóvel. LVIII- No caso dos autos o que ocorreu, no essencial, foi uma substituição do tribunal pelos AA na definição do seu próprio prejuízo. LIX- Assim, em invés de alegarem os factos dos quais se retiraria e concluiria a extensão do respectivo prejuízo, limitaram-se a alegar que uma oficina lhes “cobrou” 20€ diários pelo depósito do automóvel e que “para fazerem face às necessidades de transporte no exercício das suas actividades e da vida diária, os AA viram-se forçados a proceder ao aluguer de um veículo de idênticas características – o veículo Vokswagen Polo C, matrícula 38-EP-82 – junto da empresa MB Moverent, Rent a car, Lda”. LX. Ora, qualquer um dos factos acima mencionados é, salvo o devido respeito, insuficiente para que se apurasse o prejuízo efectivo que os demandantes teriam ou tiveram com a privação do uso do veículo. LXI- Como se referiu já relativamente ao parqueamento da viatura, deveriam os AA ter alegado os factos necessários ao estabelecimento do concreto nexo de causalidade entre o acidente e o prolongado depósito do carro na oficina, o que não fizeram. LXII- E, relativamente ao dano decorrente da não utilização do automóvel, o facto de terem alegado que procederam ao aluguer de um veículo, não os isentava o dever de provar os prejuízos que da privação do uso do veículo resultariam. LXIII- O pretenso dano emergente – aluguer de um carro – foi motivado ou surgiu por iniciativa dos próprios AA, ao celebrarem um contrato com esse objecto. LXIV- Mas o que se procurava apurar nestes autos não era o custo desse aluguer, mas sim a perda patrimonial dos demandantes se assim não tivessem procedido. LXV- Acresce que os AA não alegaram que não dispusessem de meios financeiros bastantes para proceder à reparação da viatura. LXVI- Da factualidade apurada deve concluir-se que os AA dispunham de meios financeiros bastantes para proceder a essa reparação. LXVII- Na verdade, para evitar uma despesa que não ascenderia a 10.044,28€ (reparação), os AA optaram por deixar avolumar o dano para a verba total de 26.661,28€ (10.044,28€ + 16.617€ [paralisação e parqueamento]). LXVIII- Se os demandantes não dispunham de meios financeiros bastantes para custear a reparação, igualmente lhes deveria estar vedado o aluguer de um carro e o depósito do veículo na oficina. LXIX- Se dispunham de meios financeiros bastantes para justificar a assunção de despesas no valor de cerca de 16.000€, poderiam e deveriam ter encaminhado tal importância para o único gasto efectivamente necessário e suficiente paraa evitar o prejuízo, que era a reparação do carro. LXX- E, note-se, o automóvel esteve parqueado na oficina de uma empresa (M & Costas, S,A,) que, passados mais de dois anos (desde 15 de Setembro de 2009 até hoje, pelo menos), não exigiu dos AA o pagamento da importância respeitante ao parqueamento e, tão pouco uma outra empresa desse grupo, a MBRent, exigiu, até à data, o pagamento do custo do aluguer do carro. LXXI- Tudo factos aos quais não será alheio, é certo, a relação de quase familiaridade que existe entre AA e funcionária dessa empresa. LXXII- Daí que seja legítimo questionar porque motivo não solicitaram os AA a reparação do carro (que custaria, relembre-se, cerca de 10.000€), mediante o compromisso de pagamento a essa mesmo grupo empresarial, ainda à espera (ao que dizem os AA) de mais de 16.000? LXXIII- Entende, por isso, a Ré que estava ao alcance dos AA, face ao acima exposto, evitar o agravamento desse prejuízo, pelo que é manifesto que houve culpa dos lesados no agravamento dos prejuízos, pelo que a indemnização deverá ser reduzida ou excluída, nos termos do artigo 570º do Código Civil. LXXIV- E sempre ofenderia os bons costumes e o respectivo fim social, o exercício do direito de indemnização dos demandantes por paralisação nos termos em que foi reconhecido. LXXV- Isto porque não é moralmente aceitável que um lesado se coloque numa posição que propicie o recebimento de indemnização no valor de mais de 26.000€ por se julgar irresponsável pelo dever de evitar um gasto de apenas 10.000€. LXXVI- O dever de boa-fé das partes no cumprimento das obrigações, bem como no exercício de direitos imporia comportamento diferente, que passaria pela reparação do carro. LXXVII- Pelo que deve ser impedido o exercício desse direito, reduzindo-se a indemnização pela paralisação para montantes equitativos de conformes. LXXVIII- Em face do acima exposto e caso se venha a concluir pela existência de direito a indemnização pelo parqueamento e privação do uso de veículo, o que só se admite de forma subsidiária, deveria recorrer-se à equidade para a sua fixação. LXXIX- Como tal, será adequado considerar-se, em equidade, que o único período relativamente ao qual o depósito do veículo na oficina se justificaria seria o ocorrido entre o dia 15 de Dezembro (data em que o automóvel foi entregue na oficina) e o da sua peritagem (ocorrida em 29 de Dezembro de 2008- cfr fls 164). LXXX- Quando muito seria razoável que se considerasse estendido esse período até ao momento em que foi proposta a acção, data a partir da qual deixou de ser aceitável a manutenção do carro na oficina, por se ter esgotado a via extra-judicial. LXXXIII- Pelo que, não se considerado de afastar o direito de indemnização em causa (tanto mais que os AA não procederam, sequer, ao pagamento do custo do parqueamento e não se sabe se alguma vez o irão suportar) a indemnização teria, necessariamente, de ser reduzida a não mais de 1940€+Iva, correspondentes a 97 dias (entre 16 de Dezembro de 2008 e 23 de Março de 2009). LXXXIV- E, relativamente ao veículo de substituição, em equidade, a indemnização deveria ser reduzida a não mais de 78 dias (correspondes a fins-de-semana desde 16 de Dezembro de 2008 até Setembro de 2009), os quais, ao montante de 33€ correspondente ao custo do aluger de um automóvel, ascenderiam a 2.574,00€+IVA. LXXXV- A douta sentença sob censura violou as normas dos artigos 334º, 496º, 566º e 570º do Código Civil. Pede a revogação da sentença. Apresentaram os recorridos as respectivas contra-alegações, pugnando pelo julgado. II – Delimitação do objecto do recurso; questões a apreciar; O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das alegações, nos termos dos artigos 660º, nº 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 685º-A, nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (doravante CPC). As questões suscitadas pela Recorrente radicam no seguinte: - Alteração da matéria de facto relativamente aos pontos de facto provados nºs 24, 31, 34 e 35; - Montante da indemnização devida pelo dano patrimonial relativo à alegada paralização do veículo; Colhidos os vistos, cumpre decidir. III – Fundamentos; 1. De facto; A factualidade dada como assente na sentença recorrida é a seguinte: 1. No dia 13 de Dezembro de 2008, pelas 19h20, o veículo ligeiro de passageiros, marca Seat, 6l, Ibiza, 1200 cc, matrícula 01-92-ZV, propriedade dos AA, circulava na Avenida da Imaculada Conceição, em Braga… 2. Na hemi-faixa da direita, atento o sentido Braga-Ferreiros/Rua Cidade do Porto, 3. Seguindo esse sentido… 4. A uma velocidade inferior a 50 Km/h 5. Conduzido pelo A…. 6. E transportando como passageira a A… 7. E o veículo ligeiro de passageiros, marca Fiat Punto 55S, matrícula 28-31-EL, conduzido por Susana Maria Ferreira da Silva, transportando como passageiros João Manuel Macedo Silva e Andreia Filipa Ferreira da Silva,…. 8. Circulava na faixa mais à esquerda da hemi-faixa da direita, atento o sentido Ferreiros/Rua Cidade do Porto- Braga, seguindo essa direcção…. 9. E o veículo pesado de passageiros, marca Scania, matrícula 10-66-TT, propriedade da Arriva Portugal Transportes, Ldª, conduzido por Joaquim Ferreira de Oliveira… 10. Circulava na faixa central da hemi-faixa de rodagem da direita, atento o sentido Ferreiros/Rua Cidade do Porto- Braga, seguindo essa direcção. 11. O veículo TT embateu na traseira do veículo EL quando, sem se certificar que podia realizar tal manobra em segurança, invadiu a faixa mais à esquerda da hemi-faixa direita atento o sentido Ferreiros/Rua Cidade do Porto- Braga… 12. Em consequência do embate, o veículo EL entrou em despiste, transpôs o separador central e invadiu a hemi-faixa da direita, atento o sentido Braga-Ferreiros/Cidade do Porto,… 13. E aí embateu no veículo ZV, à entrada do túnel existente no local, conhecido por túnel Santos da Cunha, 14. O qual, desgovernado, foi imobilizar-se contra o muro do túnel, à sua direita. 15. A Avenida da Imaculada Conceição é bem iluminada… 16. E possui três vias na hemi-faixa destinada ao trânsito que circula no sentido Braga- Ferreiros/Cidade do Porto… 17. E três vias na hemi-faixa destinada ao trânsito que circula no sentido Ferreiros/Cidade do Porto-Braga, sendo uma destinada a autocarros. 18. O limite da velocidade máxima na Avenida da Imaculada Conceição é de 50km/h. 19. À data do embate, o piso encontrava-se molhado. 20. Em consequência do embate, o veículo ZV sofreu estragos na frente, lados direito e esquerdo, e traseira. 21. A reparação do veículo ZV é viável de acordo com as especificações técnicas disponibilizadas pela marca Seat e com o uso de ferramentas e equipamentos preconizados por esta marca, importando a quantia de € 10.044,28. 22. Os estragos sofridos no veículo ZV determinaram a sua imobilização. 23. O veículo ZV esteve imobilizado no parque da M. & Costas desde o dia 15 de Dezembro de 2008 até ao dia 15 de Setembro de 2009. 24. A M.& Costas cobrou aos AA. o valor diário de € 20,00, acrescido de IVA, desde o dia 16 de Dezembro de 2008 até 15 de Setembro de 2009, no valor global de € 6.576,00 (IVA incluído). ´ 25. O veículo ZV é do ano de 2005… 26. E tinha percorrido 12.007 km à data do embate. 27. Um veículo de idênticas características ao veículo ZV custava, em Abril de 2009, em estado de novo, € 14.638,00. ´ 28. À data do embate, o valor comercial do veículo ZV era de € 9.941,00. 29. Os AA. residem em Ferreiros. 30. A A. trabalha em Braga, como empregada doméstica. 31. Os AA. utilizavam o veículo ZV, no seu quotidiano, nomeadamente para fazer compras domésticas, visitar familiares e amigos e ir ao cemitério. 32. A seguradora L…, com quem inicialmente contactaram, e a Ré não colocaram à disposição dos AA. qualquer veículo de substituição. 33. Os AA. utilizaram transportes públicos, nos dias 15, 27 e 29 de Dezembro de 2008, tendo gasto a quantia de € 21,60. 34. Os AA. alugaram o veículo Volkswagen Pólo C, matrícula 38-EP-82 junto à MB Moverent, Rent-A-Car, Ldª, pelo período de 242 dias. 35. Importando esse aluguer a quantia diária de € 33,33, acrescida de IVA. 36. A A. sofreu factura no escafóide cárpico esquerdo e fractura-avulsão do maléolo peroneal direito. 37. Os AA. foram assistidos no Hospital de S. Marcos em Braga. 38. A A. recorreu a vários médicos, foi a várias consultas e realizou vários exames. 39. A. gastou a quantia de € 207,61 em medicamentos… 40. E a quantia de € 261,30 em exames radiológicos e tratamentos. 41. A A. esteve de baixa médica entre a data do embate e o dia 09 de Fevereiro de 2009. 42. No dia 09 de Fevereiro de 2009, o médico da Ré deu alta para o trabalho à A., atribuindo-lhe uma incapacidade parcial para o trabalho de 10% (ITP). 43. Desde o embate, a A. sente perda de sensibilidade e força na mão esquerda e no pé direito. 44. A data da consolidação médico-legal das lesões sofridas pela A. foi fixada no dia 16 de Fevereiro de 2009. 45. A incapacidade permanente geral foi fixada à A. em 2 pontos. 46. Tal incapacidade é compatível com o exercício da sua actividade de empregada doméstica, implicando esforços suplementares. 47. Em 26 de Fevereiro de 2010, a A. não necessitava de quaisquer outros tratamentos. 48. O quantum doloris da A. foi fixado no grau 2. 49. No momento do embate, os AA. sofreram momentos de angústia e temeram pelas suas vidas. 50. A A. nasceu no dia 7 de Dezembro de 1948. 51. Antes do embate, a A. não padecia de qualquer lesão no pulso esquerdo e pé e perna direitos…. 52. Ou de qualquer outra mazela. 53. Após o embate, a A. sofreu de insónias. 54. Em consequência do embate, a A. partiu uns óculos…. 55. E comprou outros no valor de € 455,00. 56. No dia do embate, a A. vestia uma parka e umas calças que ficaram estragadas. 57. Os AA. pagaram a quantia de € 11,52 por uma certidão da participação do acidente. 58. À data do embate, a responsabilidade civil em relação a terceiros decorrente da circulação do veículo EL encontrava-se transferida para a Companhia de Seguros L…, SA, através da apólice 5528728. 59. A L… procedeu à avaliação dos danos sofridos pelos AA. em resultado do embate… 60. E prestou assistência médica à A. 61. A L… procedeu à avaliação dos danos sofridos no veículo ZV… 62. E estimou que a reparação do mesmo importava a quantia de € 9.242,86…. 63. E avaliou os salvados em € 1.000,00. 64. Por carta datada de 23 de Janeiro de 2009, a L… informou o A. de que “Procedemos à peritagem do veículo em referência, da qual se conclui estarmos perante uma perda total, uma vez que a reparação é materialmente impossível ou tecnicamente não aconselhável e o valor estimado para os danos sofridos, adicionado do valor dos salvados, ultrapassar o valor venal do veículo antes do sinistro…A estimativa do valor da reparação…totalizou 9.242,86. Após consulta feita ao mercado e de acordo com as tabelas do Eurotax, o valor de venda do veículo, à data do acidente, era de 9.550,00 e que o valor apurado para o salvado foi de 1.250,00….a responsabilidade pela produção do acidente deve-se na totalidade ao veículo 10-66-TT, por o seu condutor não ter tomado as devidas precauções ao efectuar a mudança de fila de trânsito, desrespeitando o estatuído no nº 1, do artigo 35º do Código da Estrada. Nestes termos, não nos é possível atender qualquer reclamação quanto aos prejuízos sofridos. Salientamos que, após a recepção desta carta, a L… não poderá ser responsabilizada por eventuais prejuízos decorrentes de atrasos na regularização do sinistro, com custos de recolhas em oficinas ou garagens, privação de uso do veículo ou outros.” 65. A responsabilidade civil por danos causados a terceiros decorrente da circulação do veículo TT encontrava-se transferida para a Ré, à data do embate, por contrato de seguro titulado pela apólice nº 1355105. 66. A 19 de Janeiro de 2009, a mandatária dos AA. enviou carta registada à Ré com o seguinte teor: “Na sequência de contacto efectuado pelos m/constituintes…analisado o acidente em que os mesmos se viram envolvidos, sou a contactá-los a fim de, com a máxima rapidez, resolvermos a questão. Mais informo, que no dia 15 de Janeiro de 2009, procederam os mesmos ao aluguer de um veículo automóvel.” 67. A 23 de Janeiro de 2009, a mandatária dos AA. enviou à Ré uma carta registada com o seguinte teor: “Na sequência da carta datada de 19 de Janeiro de 2009, ainda não respondida, sou a informar que a Companhia de Seguros L… concluiu após instrução que a produção do evento envolvendo os meus constituintes é da exclusiva responsabilidade do condutor do veículo 10-66-TT, vosso segurado. Mais informo que a Companhia de Seguros citada suspendeu todos os tratamentos e consultas médicas já agendadas relativas à minha constituinte Laura, a qual se encontra à data sem qualquer apoio médico essencial à cura das lesões sofridas. Assim sendo, venho uma vez mais requerer com a máxima celeridade na resolução deste caso.”. 68. Por carta registada enviada à mandatária dos AA., no dia 26 de Janeiro de 2009, a Ré concluiu que a responsabilidade pelo embate pertenceu na totalidade ao condutor do veículo 10-66- TT, por infracção do disposto no nº 2 do art. 14º do Código da Estrada. 69. No dia 03 de Fevereiro de 2009, a mandatária dos AA. dirigiu à Ré uma carta a remeter comprovativos de despesas efectuadas até àquela data pela A, a informar que a A. se viu forçada a recorrer a apoio médico privado, uma vez que o médico indicado pela Seguradora Lusitânia declinou continuar a tratá-la e a reiterar a informação de que os AA se viram forçados a alugar um veículo no dia 15 de Janeiro de 2009. 70. A Ré não emitiu qualquer resposta a esta comunicação. 71. A 23 de Fevereiro de 2009, a mandatária dos AA. dirigiu uma carta à Ré a remeter comprovativos de despesas médicas efectuadas pela A. a 03 de Fevereiro de 2009 e a propor um prazo de 10 dias para a resolução extra-judicial da questão. 72. A Ré não respondeu à carta datada de 23 de Fevereiro de 2009. 73. Durante o ano de 2007, o A. auferiu o rendimento bruto de € 7.770,28… 74. E durante o ano de 2008, o A. auferiu o rendimento bruto de € 7.933,00. 75. Durante os anos de 2007 e 2008, a A. não declarou qualquer rendimento. ***** 2. De direito; a) Alteração da matéria de facto relativamente aos pontos de facto provados nºs 24, 31, 34 e 35; b) Montante da indemnização devida pelo dano patrimonial relativo à alegada paralização do veículo; Suscita a apelante a modificação dos factos constantes dos pontos nºs 24, 31, 34 e 35 da matéria de facto, os quais foram considerados como provados. O seu teor é o seguinte: «- 24.. A M & Costas cobrou aos AA o valor diário de 20,00€, acrescido de IVA, desde o dia 16 de Dezembro de 2008 até 15 de Setembro de 2009; - 31. Os AA utilizavam o veículo ZV, no seu quotidiano, nomeadamente para fazer compras domésticas, visitar familiares e amigos e ir ao cemitério; - 34.. Os AA alugaram o veículo Volkswagen Pólo C, matrícula 38-EP-82 junto à MB Moverent-ACar, pelo período de 242 dias; - 35. importando esse aluguer a quantia diária de 33,33€, acrescida de IVA.». Quanto ao ponto de facto nº 24 pretende a recorrente que se considere como não provado, argumentando que o documento de fls. 82 (factura) foi impugnado e não existe documento comprovativo de pagamento desse parqueamento à empresa “M & Costas”, o que a testemunha Maria da Glória terá confirmado. No caso vertente, estando em causa o ressarcimento de danos causados por embate em acidente de viação, os alegados prejuízos que terão advindo para os recorridos pela não utilização do veículo emergem directa e conexamente da aludida cobertura de danos por força da apólice de seguro do condutor responsável por aquele evento danoso. Os danos peticionados a esse título – por privação do uso do veículo – estão interligados com a impossibilidade de utilização do mesmo para o fim a que se destinava. Trata-se de danos indemnizáveis e consequência directa e adequada da lesão - que lhe advieram do risco inerente à situação de “ choque “ do veículo, cobertura esta que contratara com a ré seguradora. Dito de outro modo, estamos perante danos que são decorrentes do facto de o lesado se ver privado do uso do veículo, em si mesmo, e não qualquer prejuízo que tenha decorrido dessa privação do uso, nomeadamente no âmbito do exercício de uma actividade a que estava adstrito o aludido veículo. São danos directos e conexos com a impossibilidade de utilização do veículo (e não reflexos dessa mesma privação de uso), sofridos em consequência de acidente de trânsito por despiste, o que constitui, por si só, um dano indemnizável, já que essa privação se traduz numa lesão no seu património, pois o dono do veículo vê-se impossibilitado do exercício do direito de utilização de uma coisa que lhe pertence Neste sentido vide o Acórdão da RG de 12.03.2009, Proc. 634/04.4TBBCL, in www. dgsi.pt.. Citando o douto aresto do STJ, Ac. de 57.02.07, in www.dgsi.pt, “ o dano produzido atinge, neste caso, a possibilidade e capacidade que são retiradas ao proprietário durante o tempo em que, por via do dano produzido, está privado do veículo”. E essa privação configura um dano patrimonial, dado que a utilidade de um veículo tem valor pecuniário. Trata-se, enfim, de lesão avaliável em dinheiro. Também ainda sobre esta problemática, convém sublinhar que é “ao autor da lesão (e, consequentemente, à seguradora para quem tenha sido transferida a responsabilidade), e não ao lesado, que compete agir, e de forma diligente, para que o dano seja reparado, de sorte que as implicações danosas acrescidas decorrentes do decurso do tempo correm por conta do obrigado à reparação do dano e não por conta do lesado” Veja Ac RG de 07.07.2011, in www.dgsi.pt. Reportando-nos ao caso, a argumentação da recorrente não é atendível. Desde logo, quanto ao ponto de facto nº 24, mostra-se ele suportado no documento de fls. 82 (factura) e no depoimento da testemunha Maria da Glória, funcionária da “M & Costas”e Rui Manuel da Silva Rodrigues, que confirmaram que o veículo ZV ficou parqueado na garagem daquela empresa e que foi emitida aquela factura para cobrança do montante em dinheiro correspondente a tal parqueamento. Daí que, não obstante a impugnação genérica de tal elemento documental, não deixou o lesado de fazer a prova material do conteúdo do mesmo, ou seja, de que a quantia constante da factura corresponde a uma despesa feita com o parqueamento daquela viatura por parte da sua emitente e cuja cobrança reclama, afim de ser ressarcida. Contrapõe a recorrente que não ficou seguro que o valor em causa tenha ou venha a ser cobrado aos AA. Ora, chama-se factura ao documento em que o vendedor ou prestador de serviços faz a discriminação completa das mercadorias que vende ao comprador ou dos serviços que presta e em que indica as despesas que efectuou, o preço e as condições de pagamento, tendo em vista o seu ressarcimento, assim como o IVA que sobre essa transacção incide a favor do Estado e que importa pagar também. Dos autos ou da análise em si da factura de fls. 82 não emerge qualquer elemento que permita inferir que se trata de um documento elaborado simulada ou falsamente, não tendo em vista ser cobrado. Além disso, como estatui o artº 565º, do Código Civil (doravante CC), no cálculo da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis. Pelo que, mesmo que os AA. não tenham pago ainda tal factura (as ditas testemunhas relataram que os AA. não têm dinheiro para o efeito), o seu valor a ser satisfeito constitui um prejuízo patrimonial que vão ter de arcar. Também quanto ao ponto de facto nº 31, nenhuma razão tem a recorrente. A realidade fáctica relatada pelas aludidas testemunhas alicerça a prova daquele ponto nº 31, ao afirmarem que os AA. “ (…) durante a semana penso que usavam para ir às compras”, “costumavam ir visitar os amigos todos os fins de semana”,” (…) iam ao cemitério ao meio da semana e ao fim da semana”, “usavam essencialmente a viatura para fazer, ao fim de semana as suas compras, as suas visitas aos amigos”,” E depois, durante a semana para se moverem, quando fosse preciso ir…” utilizaram a viatura de amigos durante algum tempo (da testemunha Maria da Glória por exemplo) para poderem deslocar-se e a A. fazer os tratamentos. E a circunstância de usarem algumas vezes os transportes públicos (porque ainda não tinham qualquer veículo, seja o seu, o de amigos ou o alugado, como afirmaram as aludidas testemunhas) só reforça o dano sofrido pelos demandantes inerente à privação do uso do seu veículo. Aliás, o termo quotidiano tanto significa todos os dias, diariamente, como muito comum, banal. O que é certo é que a disponibilidade de utilização do veículo sinistrado era diária, ainda que o pudessem usar com mais incidência aos fins-de-semana. Com a sua imobilização, ficaram privados desse uso em qualquer dia. Como se defende no Ac. desta Relação de Proc. 3116/09.4TBBCL, in dgsi.pt, «afirma A. Abrantes Geraldes [Indemnização do Dano da Privação do Uso, 39], tal privação, desacompanhada da sua substituição por um outro ou do pagamento de uma quantia bastante para alcançar o mesmo efeito, reflecte o corte definitivo e irrecuperável de uma “fatia” dos poderes inerentes ao proprietário. Nestas circunstâncias, não custa compreender que a simples privação do uso seja causa adequada de uma modificação negativa na relação entre o lesado e o seu património que possa servir de base à determinação da indemnização. E mesmo que se considere que a situação não atinge a gravidade susceptível de merecer a sua inclusão na categoria de danos morais, nos termos do artº 496º nº 1 do CC, é incontornável a percepção de que entre a situação que existia se não houvesse o sinistro e aquela que se verifica na pendência da privação existe um desequilíbrio que, na falta de outra alternativa, deve ser compensado através da única forma possível, ou seja, mediante a atribuição de uma quantia adequada. Tem sido também jurisprudência do STJ que a privação de uso de um veículo automóvel durante um certo lapso de tempo, em consequência dos danos sofridos em acidente de trânsito, constitui, só por si, um dano indemnizável (Cf., por todos, o Ac. de 29.11.2005, Col. Jur.- Acs. do STJ, ano XIII, tomo III, pág.151, e os mais aí citados). Segundo este mesmo Tribunal, o dano produzido atinge, neste caso, a propriedade – direito que tem como manifestações, entre outras, a possibilidade de utilizar a coisa e a capacidade de dispor materialmente dela; possibilidade e capacidade que são retiradas ao proprietário durante o tempo em que, por via do dano produzido, está privado do veículo. E a perda da possibilidade de utilização do veículo quando e como lhe aprouver tem, claramente, valor económico, e não apenas quando outro veículo é alugado para substituir o danificado». Ou seja, tal dano é indemnizável, seja a mera privação do uso do veículo, seja o custo do aluguer de um veículo de substituição Acórdão do STJ de 05.07.2007, Proc. nº 07B1849, in dgsi.pt,. Destarte, claudicam os argumentos da apelante nesta vertente. Também quanto à matéria dos pontos de facto provados nºs 34 e 35 deve a mesma manter-se, considerando-se aqui mutatis mutandis os argumentos acima expendidos quanto à força probatória do documento de fls. 83 – factura emitida pela empresa “MB Moverente-Rent a Car Ldª” – reiterando as apontadas testemunhas Maria da Glória e Rui que o referido veículo automóvel de substituição foi alugado e utilizado pelos AA., inclusive a uma festa de aniversário (como lembrou a testemunha Rui). No que concerne ao custo da recolha do veículo, cumpre assinalar que estamos perante um custo que os AA. não suportariam se, por um lado, não tivesse havido necessidade de reparar o seu veículo (por via do acidente) e se, por outro, a Ré tivesse pago pontual e atempadamente o que era devido aos AA. Refere a apelante que a conclusão pela viabilidade da reparação da viatura não justifica a indemnização pelo seu depósito numa oficina nem o seu parqueamento é consequência da paralisação do automóvel. Discorda-se frontalmente. Estamos aqui perante um nexo de causalidade adequado entre o evento danoso e o prejuízo. O custo do parqueamento do veículo dos AA. é ainda uma consequência do sinistro. E in casu essa adequação é tanto mais normal e necessária quanto é certo que se concluiu pela viabilidade da reparação do veículo (o veículo a reparar não há-de ficar exposto ao sol, à intempérie ou à fácil subtracção ou danificação de terceiros), ao invés da de perda total do mesmo, como defendeu temerariamente a congénere “L…”, já que o valor da reparação quase se equivalia ao valor comercial do veículo. Aliás, como acima ficou dito, a recorrente nem tem que se queixar, uma vez que, se houve agravamento dos danos pelo decurso do tempo, sibi imputet ou à sua dita congénere. Tanto mais que não facultou aos AA. um veículo de substituição, ainda que avisada para o aluguer de um veículo pelos AA., nem procedeu ao pagamento da reparação do veículo. E, como se disse, é sobre o lesante (e subsequentemente, à sua seguradora), obrigado ao ressarcimento dos danos, que se repercute os custos reflexos de falta de diligência nesse cumprimento, como sejam os de aluguer de um veículo ou o seu parqueamento, por via de retardamento na sua reparação. Diga-se, porém, a talhe de foice, como referiram as testemunhas Maria Glória e Rui que os AA., que estes nem sequer tinham possibilidades financeiras para proceder à reparação do veículo. Noutra linha, esgrime ainda a recorrente o argumento da concorrência de culpa dos lesados, aqui AA., no agravamento dos prejuízos, nos termos do artº 570º do CC, para concluir pela redução ou exclusão da indemnização. Arvora que, face aos elevados custos do parqueamento e do aluguer do veículo, deveriam os AA. proceder à reparação dos danos para prevenir tais gastos excessivos ou estão estava-lhes vedado o aluguer de um carro ou o seu depósito na oficina, uma vez que não tinha meios financeiros para tal. Não tem razão a apelante pelo simples facto de que, repete-se, é sobre a seguradora que impende o ónus de cumprir a prestação: reparar pontual e atempadamente os danos. A concorrência de culpas prevista no assinalado artº 570º pressupõe a prática de um facto culposo – negligente ou doloso - do lesado para a produção ou agravamento dos danos. Porém, no caso em apreço, se os custos inerentes ao aluguer de um veículo e depósito da viatura danificada, tal deve-se unicamente à falta de diligência da ré seguradora ou da sua congénere na resolução do sinistro, seja porque se escudou numa perda total do veículo que não lhe foi reconhecida judicialmente, seja porque, pese embora as várias cartas do lesado a alertá-la do referido aluguer do veículo e a solicitar a resolução do litígio, nada fez – pontos de facto nºs 64, 66, 67, 69 e 71. Por fim escuda-se também a recorrente no instituto do abuso de direito que o artº 334º do CC consagra, para asseverar que os AA. excederam os limites de boa fé, dos bons costumes e do respectivo fim social, ao pretenderam receber uma indemnização de mais de 26.000,00€, quando poderiam ter evitado que o gasto se cingisse a 10.000,00€. Alega assim a ré seguradora que o dever de boa-fé das partes no cumprimento das obrigações, bem como no exercício de direitos imporia comportamento diferente, que passaria pela reparação do carro. Antes de mais, diga-se que no caso de abuso de direito está em jogo um princípio de ordem e interesse público, não dependendo da invocação das partes a apreciação da questão - puramente de Direito e assim do âmbito do conhecimento mesmo do tribunal de revista - de saber de quem exercita o direito a que se arroga age motivado e sob condicionantes que tornem o seu exercício ilegítimo - cf. Acórdão do S.T.J., de 5/2/87, B.M.J., nº364, página 787. Antes da entrada em vigor do actual Código Civil, já Manuel de Andrade defendia a existência de abuso de direito quando este era exercido "em termos clamorosamente ofensivos da justiça", mostrando-se "gravemente chocante e reprovável para o sentimento jurídico prevalecente na colectividade" - Teoria Geral das Obrigações, página 63. E Vaz Serra, na mesma linha de pensamento, aludia à "clamorosa ofensa do sentimento jurídico socialmente dominante" - Boletim do Ministério da Justiça nº85, página 253. Hoje, de acordo com o estabelecido no artigo 334º do CC, "é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social e económico desse direito". Segundo Pires de Lima e Antunes Varela, adoptou-se neste preceito a concepção objectiva de abuso de direito, uma vez que " não é necessária a consciência de se excederem com o seu exercício os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do direito; basta que se excedam esses limites " - cfr. Código Civil Anotado, volume I, página 298. Não se contentou a lei, assim, com qualquer excesso; o excesso cometido tem que ser manifesto para poder desencadear a aplicabilidade do artigo 334º. Por isso, os tribunais só podem fiscalizar a " moralidade dos actos praticados no exercício de direitos ou a sua conformidade com as razões sociais ou económicas que os legitimam, se houver manifesto abuso " - autores e obra citada. Diferente é a posição de Castanheira Neves que vê no abuso de direito "um comportamento que tenha a aparência de licitude jurídica - por não contrariar a estrutura formal - definidora (legal ou conceitualmente) de um direito, à qual mesmo externamente corresponde - e, no entanto, viole ou não cumpra no seu sentido concreto materialmente realizado a intenção normativa que materialmente fundamenta e constitui o direito invocado ou de que o comportamento realizado se diz exercício" - cfr. Questão de Facto - Questão de Direito ou o Problema Metodológico da Juridicidade, página 518 e seguintes. Por seu turno, Orlando de Carvalho sustenta que o que importa averiguar é se o uso do direito subjectivo obedeceu ou não aos limites de autodeterminação, poder este que existe, tão somente, para se prosseguirem interesses e não para se negarem interesses, sejam eles próprios ou alheios, e o abuso de direito "é justamente um abuso porque se utiliza o direito subjectivo para fora do poder de se usar dele" (Teoria Geral do Direito Civil - Sumários Desenvolvidos, Coimbra, 1981, p. 44). Seja como for, para que possa funcionar o comando contido no artigo 334º, do Código Civil, tem de haver um excesso manifesto, o que significa que a existência do abuso de direito tem de ser facilmente apreensível sem que seja preciso o recurso a extensas congeminações.~ Haverá abuso de direito, segundo o critério proposto por Coutinho de Abreu "quando um comportamento aparentando ser exercício de um direito se traduz na não realização dos interesses pessoais de que esse direito é instrumental e na negação de interesses sensíveis de outrém" (Abuso de Direito, p. 43) . Configura-se, assim, um comportamento antijurídico que se caracteriza pelo exercício anormal do direito próprio, que não pela violação de um direito de outrém ou pela ofensa de uma norma tuteladora de um interesse alheio. E para que o abuso de direito exista, não basta que o exercício do direito pelo seu titular, cause prejuízo a alguém - a atribuição de um direito traduz deliberadamente a supremacia de certos interesses sobre outros interesses com aqueles confluentes, sendo necessário, sim, que o titular dele manifestamente exceda os limites que lhe cumpre observar, impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico do próprio direito exercido . Ora, sendo obrigação da recorrente proceder à reparação do veículo sinistrado, o que esta ainda não cumpriu, nem se dispôs a colocar veículo de substituição à disposição dos AA. (ponto de facto nº 32), apesar de alertado pelo menos três vezes por aqueles (em 19.09.2009, 29.01.2009 e 03.02.2009), sendo que o veículo esteve imobilizado de 15.12.2008 a 15.09.2009, não se vislumbra como a conduta daqueles de alugarem um veículo para se transportarem e de parquearem o veículo acidentado, até para minimizarem os danos neste, pode constituir um exercício ilegítimo, tanto mais que, como as testemunhas Maria da Glória e Rui depuseram, nem sequer tinham possibilidades financeiras para proceder à reparação por conta própria. Também não se lhes impunha que diligenciassem tal, com vista a impedir o avolumar dos custos de aluguer e parqueamento, uma vez que, além daquela carência de meios, a ré seguradora (ou a sua congénere “Lusitânia”) jamais aceitou que se procedesse a essa reparação por ser viável (só em sentença tal foi decidido), antes assumindo que se tratava de uma perda total de veículo. Em conclusão, essa álea de reparação ou perda total que a seguradora quis jogar teve efeitos mais gravosos que sobre esta se repercutem! Os lesados limitaram-se a exercer legitimamente o seu direito à indemnização. Também não se descortina que tenha de haver recurso à equidade, uma vez que esta pressupõe que não possa ser averiguado o valor exacto dos danos – artº 566º, nº 3, do CC. Neste caso, quer as despesas atinentes ao aluguer do veículo, quer às relativas ao parqueamento mostram-se concretamente contabilizadas e reclamadas pelos prestadores de tais serviços, como se provou, pelo que o seu valor está determinado, funcionando o disposto nos nºs 1 e 2 do supracitado preceito na fixação da indemnização.* Não procede, pois, a apelação. Sintetizando: 1. É ao autor da lesão (e, consequentemente, à seguradora para quem tenha sido transferida a responsabilidade), e não ao lesado, que compete agir, e de forma diligente, para que o dano seja reparado, de modo que as implicações danosas acrescidas decorrentes do decurso do tempo correm por conta do obrigado à reparação do dano e não por conta do lesado. 2. Quer o aluguer de veículo, quer o custo do parqueamento da viatura sinistrada são danos indemnizáveis por serem consequência directa e adequada da privação do uso do veículo e da necessidade da sua reparação ainda não efectuada, resultantes do acidente de viação. IV – Decisão; Pelo exposto, acordam os juízes que constituem esta 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar improcedente a apelação e confirmar a decisão recorrida. Custas pela apelante. Guimarães, 26.04.2012 António Sobrinho Isabel Rocha Jorge Teixeira