1 - Na decisão de homologação cabe ao juiz ponderar, a pedido do credor, a recusa de homologação, caso este demonstre, em termos plausíveis, que a sua situação ao abrigo do plano é previsivelmente menos favorável do que a que interviria na ausência de qualquer plano. 2 - Não poderá constituir critério para aferir da invocada prejudicialidade, uma hipotética situação de incumprimento do plano, havendo que demonstrar, que em presença do plano de revitalização, o credor virá a receber menos do que receberia sem ele. 3 – Fundamenta a não homologação a violação, não justificada, do princípio da igualdade dos credores. 4 – Viola o princípio da igualdade o Plano de Recuperação que, relativamente a credores privilegiados, propõe apenas para um dos grupos de credores o início imediato do pagamento das prestações mensais, a constituição de garantias patrimoniais e o pagamento dos juros vincendos, enquanto que para o outro grupo de credores privilegiados, os credores laborais, prevê apenas o pagamento dos créditos em prestações mensais, com um ano de carência, sem constituição de qualquer garantia nem pagamento dos juros vincendos.
Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães. A.. interpôs recurso da sentença que homologou o plano de revitalização. Pede a sua revogação. Funda-se nas seguintes conclusões: 1. O Plano de Revitalização homologado nos presentes autos prevê o pagamento dos créditos salariais, incluindo o do recorrente, em 24 prestações mensais a iniciar no dia 31.01.2014. 2. Com a homologação do Plano de Revitalização ficará o recorrente sujeito ao recebimento do seu crédito em prestações mensais, tendo de esperar três anos para que o mesmo seja integralmente liquidado. 3. Ao contrário, e sem a aprovação e homologação do Plano de Revitalização, o processo especial de revitalização seria convertido em processo de insolvência, passando-se à imediata apreensão do património da devedora, única garantia patrimonial do crédito do recorrente e demais credores daquela. 4. Com a não homologação do Plano de Revitalização, e consequente conversão em processo de insolvência, passar-se-ia à imediata liquidação do activo da devedora para pagamento aos seus credores, na qual teria o recorrente o direito a ser pago preferencialmente, e de uma só vez, pelo produto obtido com a venda dos bens da devedora, 5. bem como poderia também o recorrente requerer a atribuição do benefício do Fundo de Garantia Salarial para antecipação do recebimento do seu crédito. 6. A situação do recorrente ao abrigo do Plano de Revitalização é manifestamente menos favorável do que a ocorreria na ausência de qualquer plano. 7. Com a homologação do Plano de Revitalização ficará o recorrente numa situação de incerteza quanto ao recebimento do seu crédito, existindo sempre a possibilidade de um incumprimento, a qualquer momento, das prestações constantes do mesmo. 8. Com a homologação do Plano de Revitalização poderá a devedora dispor do seu património como bem lhe apetecer, não ficando o mesmo apreendido para garantia de pagamento dos credores daquela. 9. Se o Plano de Revitalização não vier a ser cumprido nada garante ao recorrente que a devedora continue a ser detentora de património suficiente para garantia do pagamento do seu crédito. 10. Sem a homologação do Plano de Revitalização o recorrente teria a certeza do recebimento do seu crédito, já que o mesmo estaria garantido pelo património da devedora, sendo pago pelo produto da venda do mesmo, ou pelo recurso ao benefício do Fundo de Garantia Salarial. 11. Sem a homologação do Plano de Revitalização o recorrente obteria o pagamento do seu crédito de uma só vez, sem estarem sujeitos à morosidade e incerteza do decorrer de três anos para efectivo e integral pagamento do mesmo. 12. O Plano de Revitalização homologado nos autos trata de modo diferenciado os vários credores privilegiados, prevendo apenas para os credores Instituto da Segurança Social e Fazenda Nacional o início imediato do pagamento das prestações mensais, ao contrário dos credores laborais, cujos créditos terão início de pagamento apenas após um longo período de carência. 13. O Plano de Revitalização homologado nos autos prevê ainda a constituição de garantias patrimoniais (hipotecas voluntárias) a favor dos credores Instituto da Segurança Social e Fazenda Nacional, não prevendo porém a constituição de qualquer garantia patrimonial para os credores laborais, nomeadamente o recorrente. 14. O Plano de Revitalização homologado nos autos prevê o pagamento de 20% dos juros vencidos e o pagamento da totalidade dos juros vincendos à taxa anual de 2,5% para os credores privilegiados Instituto da Segurança Social e Fazenda Nacional, prevendo ao contrário o perdão total de juros para os credores privilegiados trabalhadores. 15. O Plano de Revitalização homologado nos autos não respeita o princípio da igualdade previsto no artigo 194º do CIRE, já que os credores laborais são alvo de tratamento diferenciado relativamente aos restantes credores privilegiados, 16. estando sujeitos a um tratamento menos favorável, nomeadamente no que diz respeito à data de início de pagamento dos seus créditos, ao perdão de juros, bem como relativamente à constituição de garantias para o caso de incumprimento do plano. 17. A douta sentença recorrida, ao homologar um plano de revitalização que não respeita um dos princípios basilares do processo de insolvência, carece de fundamento, pelo que deve ser revogada. J.., residente, quando em Portugal, na Rua.., Póvoa de Varzim, e quando em França, na Avenue.. em Paris, interpôs recurso da sentença homologatória do plano de recuperação. Pede a sua revogação com substituição por acórdão que não homologue o plano de reestruturação aprovado. Funda-se nas seguintes conclusões: I. Foram apresentados diversos requerimentos solicitando a não homologação do plano de revitalização, com distintas fundamentações e distintos requerentes, a sentença não se pronunciou sobre o requerimento e os fundamentos pelo recorrente, que contudo não ficaram prejudicados e eram distintos dos apreciados, pelo que a sentença de homologação ora recorrida violou o disposto no artigo 668º n1 alínea d) do CPC, estando por tal razão ferida de nulidade. II. E as razões invocadas pelo recorrente credor, reconhecido em devido tempo e modo, no seu requerimento solicitando a não homologação do plano aprovado são distintas das invocadas pelos trabalhadores – violação do principio da igualdade e da situação menos favorável em que ficarão com a aprovação do plano quando comparado com a situação de liquidação geral do património da devedora, enquanto que as razões do recorrente que ora igualmente fundamentam o recurso são: III. Primeira, de que a credora largamente maioritária, C.., tinha feito votar e aprovara um plano em que os seus créditos se mantinham inalterados quando comparadas com a situação pré-existente: quanto ao valor a receber; quanto à manutenção das garantias hipotecárias; quanto até aos juros a receber; e mesmo quanto aos prazos expectáveis de recebimento dos seus empréstimos. Pelo que o ter sido considerado o seu voto na deliberação de homologação do Plano de Reestruturação, foi violado o disposto no artigo nº 212º alínea a) do CIRE, já que em tais condições a CGD estaria impedida de votar; IV. Segunda, de que a homologação do plano de reestruturação que expressamente aprovou a “dação em pagamento” de 24 dos 60 apartamentos que constitui os únicos bens da devedora a credor que nunca tinha sido registado na contabilidade da devedora como credor; a quem nunca tinha reclamado qualquer crédito; a quem nada era devido por já lhe ter sido pago, e sem que tivesse realizado qualquer contraprestação que desse entrada nos cofres da sociedade, constitui um sancionar de um crime de favorecimento de credores, além de uma óbvia fraude realizada em prejuízo de todos os credores que não os dotados de hipoteca, ou seja todos os restantes que não a C.., sobre os bens desviados ao património da devedora. V. Constitui tal transmissão de bens, sem contrapartida para a sociedade e no valor de mais de 2.4 milhões de euros, depois de interposto o processo PER e já no decurso de dois processos de insolvência instaurados contra a transmitente, ainda uma violação do princípio da estabilidade da posição relativa dos credores durante o processo de negociação, consagrado na Resolução do Conselho de Ministros nº 43/2011 de 25-10-2011, e artigo 215º do CIRE. VI. Terceira, a homologação do plano aprovado pelos credores, sendo decisão judicial, implica uma apreciação de que os objectivos pretendidos pelo legislador não são violados, pelo que se o “plano de revitalização” aprovado não permite qualquer revitalização – a sobrevivência e recuperação económica e financeira da empresa – já que é óbvio pela sua simples leitura que o mesmo apenas contempla e permite pagamentos á C.., já que os valores remanescentes após a “dação em pagamento”, não chegam nem para o expurgo das hipotecas, não restando nem sendo possível qualquer pagamento a qualquer outro credor. VII. Quarta razão, O plano aprovado pelos credores e homologado ao dispor sobre o efeito possível de decisões judiciais futuras, ao contemplar que quaisquer créditos que venham a ser reconhecidos em acções judiciais favor de terceiros, apenas poderão ser pagos nas condições aprovadas para os credores actuais, ou seja com redução a metade dos créditos reconhecidos, ponto … do plano, é ilegal por violador dos artigos 16º, 17º e 19º da Lei Orgânica dos Tribunais, 205º e 206 da CRP, além de outros, já que constitui uma limitação prévia ao poder de decisão dos juízes de tais processos não obstante se tratarem de tribunais de igual competência hierárquica. VIII. Razões sobre que a decisão recorrida não se pronuncia, nem em resposta nem em conhecimento oficioso como é imposto pelo artigo 215º do CIRE. IX. A decisão de homologação ora recorrida deverá ser revogada ainda porque consagra um uso indevido do processo especial de revitalização, o qual não é o de permitir a liquidação geral do património da devedora sob a administração da própria devedora e em benefício de apenas alguns credores, por mais favorável que tal liquidação possa vir a resultar para estes, sendo obrigação do juiz homologante distinguir e respeitar os âmbitos dos processos de insolvência e de reestruturação, não permitindo o uso do último para as finalidades próprias e reservadas para o primeiro, por violação do disposto no artigo 17-A e 3º do CIRE. X. São pressupostos essenciais da revitalização de uma empresa: primeiro, que exista uma empresa; segundo – que exista um projecto empresarial que possa ser revitalizado ou viabilizado e, terceiro que com o plano aprovado se criem as condições que torne minimamente provável que a empresa sobreviva. XI. A devedora E.., Lda não é mais detentora de qualquer empresa. Não tendo pessoal, ao seu serviço, não tem instalações, nem sequer sede, não tem equipamentos e não tem qualquer projecto empresarial. Resultando do plano aprovado que este apenas tem como finalidade a manutenção das dações em pagamento feitas ao não credor E.. e a liquidação do património restante a favor de um único credor, a C... XII. Não existindo condições para que a devedora consiga realizar quaisquer empreitadas futuras, de 400 mil euros por ano ou qualquer outro valor semelhante, já que não dispõe de quaisquer sem equipamentos, nem materiais, nem está previsto qualquer investimento ou financiamento adicional, nem quadros, nem técnica sendo os seus funcionários inexistentes. XIII. Donde que o presente processo de revitalização, concebido para permitir a sobrevivência e a recuperação de empresas viáveis e socialmente interessantes, tenha sido nos presentes autos desvirtuado na sua finalidade e, ilicitamente, usado para impedir uma liquidação geral em benefício de todos os credores, mas sim para o benefício de um único credor a C.., para salvar o património e a responsabilidade dos gerentes da devedora e para sancionar, legitimar, branquear, o furto de 24 fracções no valor superior a 2.4 milhões de euros aos restantes credores. E.., LDA. contra-alegou ambos os recursos, pugnando pela manutenção da sentença. * Consignamos, agora, um breve resumo dos autos para melhor compreensão. Por despacho proferido a fls. 240, foi liminarmente admitido processo especial de revitalização relativo à requerente E.., LD.ª. Proposto e sujeito a votação plano de revitalização, veio o mesmo a ser aprovado pelas percentagens indicadas no despacho de fls. 954 a 957 e, consequentemente, tal deliberação foi notificada e publicitada nos termos do disposto no artigo 213.º, do CIRE. Por requerimento de fls. 880, vieram os credores (trabalhadores) A.., A.., C.., J.. e M.. solicitar a não homologação do plano de revitalização proposto, invocando, por um lado, a violação do princípio da igualdade dos credores (art.º 194.º, n.º 1 do CIRE) e, já por outro, referindo que a sua situação ao abrigo do plano de revitalização é, previsivelmente, menos favorável do que aquela em que ficariam na ausência da plano, pois poderiam recorrer ao Fundo de Garantia Salarial ou mesmo obter a satisfação dos seus créditos por via de liquidação. Sobre tal requerimento, pronunciou-se a requerente E.., pugnando pelo indeferimento do requerido. Através do requerimento que integra fls. 885, J.. veio opor-se à homologação do plano, alegando, em síntese, que é ininteligível a lista de votações, sendo óbvio que a credora C.. votou em violação do disposto no Artº 212º/2-a) do CIRE, que a homologação do plano sanciona operações de escrituração a favor de J.., em operações que tem como simuladas, que, a não ter havido simulação, está indiciado um crime de favorecimento de credores, que não existe qualquer empresa para revitalizar, pelo que o plano se destina a sancionar desvios de bens e a garantir que um dos credores ultrapasse os demais. Foi, após, proferida sentença que homologou o plano de revitalização constante de fls. 822 a 848. Na sequência de decisão, nesta Relação, para baixa do processo a fim de ser conhecida a nulidade invocada pelo 2º Recrte., o Sr. Juiz proferiu decisão que indeferiu a nulidade por omissão de pronúncia. *** Das conclusões que supra exarámos, e que delimitam o objecto do recurso, extraem-se as seguintes questões a decidir: A) No recurso interposto por A..: 1ª - A situação do recorrente ao abrigo do Plano de Revitalização é manifestamente menos favorável do que a ocorreria na ausência de qualquer plano? 2ª - O Plano de Revitalização homologado nos autos trata de modo diferenciado os vários credores privilegiados? B) No recurso interposto por J..: 1ª – A sentença está ferida de nulidade? 2ª – O plano não pode ser homologado por: a) a credora largamente maioritária, C.., ter feito votar e aprovar um plano em que os seus créditos se mantinham inalterados quando comparadas com a situação pré-existente; b) a homologação do plano de reestruturação que expressamente aprovou a “dação em pagamento” de 24 dos 60 apartamentos que constitui os únicos bens da devedora a credor que nunca tinha sido registado na contabilidade da devedora como credor; a quem nunca tinha reclamado qualquer crédito, constitui um sancionar de um crime de favorecimento de credores; c) a homologação do plano aprovado pelos credores, sendo decisão judicial, implica uma apreciação de que os objectivos pretendidos pelo legislador não são violados; c) o plano aprovado pelos credores e homologado ao dispor sobre o efeito possível de decisões judiciais futuras, ao contemplar que quaisquer créditos que venham a ser reconhecidos em acções judiciais favor de terceiros, apenas poderão ser pagos nas condições aprovadas para os credores actuais, é ilegal por violador dos artigos 16º, 17º e 19º da Lei Orgânica dos Tribunais, 205º e 206 da CRP? 3ª - O presente processo de revitalização, concebido para permitir a sobrevivência e a recuperação de empresas viáveis e socialmente interessantes, foi desvirtuado na sua finalidade e, ilicitamente, usado para impedir uma liquidação geral em benefício de todos os credores, mas sim para o benefício de um único credor a C..? *** Antes de entrarmos na análise das questões que enunciámos, consigna-se que a proposta de solvência constante do plano homologado, é a seguinte: 3.3.1. Credores Públicos 3.3.1.1. Segurança Social: a) A Segurança Social, conforme alínea b) IV do n.º 2 do art.º 3.° do Decreto-Lei n.º 260/99, de 7 de Julho com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 112/2004, de 13 de Maio, conjugado com a alínea b) do n.º 2 do artigo 190.° do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segunda Social, e sem prejuízo pela posterior análise que efectuarão à renúncia dos credores privados e garantias prestadas, perdoará 80% dos juros vencidos. Os valores em dívida vencerão juros à taxa anual de 2,5% b) Nos termos previstos na legislação acima referida, as contribuições para a segurança social e juros de mora não perdoados serão liquidados em 150 prestações mensais progressivas distribuídas equitativamente no valor das prestações sem progressividade (VP), e de acordo com a seguinte quadro: Da 1ª à 12ª 25% VP Da 13ª à 24ª 50% VP Da 25ª à 36ª 75% VP A partir da 37ª 100% VPR c) A administradora judicial provisória emitirá declaração em como «…o perdão de 80% dos juros é uma condição imprescindível para o saneamento da insolvente, no sentido de evitar eventuais rupturas de tesouraria e novas situações de incumprimento por parte da insolvente». d) A primeira prestação vence-se no mês seguinte à data da sentença homologatória do plano de recuperação. e) Para garantia do regime prestacional e nos termos da legislação em vigor, constituirá a requerente, a favor do IGFSS, IP, hipoteca voluntária sobre o seguinte bem imóvel: Loja comercial situada no r/c Esq. Frente do prédio sito na Rua Luis Soares Barbosa, n.º 47 - 4710-403 Braga, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 5310-D, com o valor patrimonial de 72.180€,00. f) Pagamento integral dos valores referentes a custas processuais devidas no âmbito de acções executivas que se encontram suspensas na respectiva secção de processo executivo, no prazo de 30 dias após o trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de recuperação. 3.3.1.2. Fazenda Nacional: a) O crédito a regularizar no âmbito do presente plano, sem prejuízo pelo disposto no ponto 3.3.3 abaixo, é o crédito vencido e reconhecido no presente processo; não se considerando, por conseguinte, o crédito sob condição nos termos do art.º 50.º do CIRE, por estar sujeito à verificação de um acontecimento futuro e incerto, ou seja, a improcedência do processo n.º 927/07.9BEBRG do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, no valor de 756.887,93€ onde, de resto, foi já emitido parecer pelo Digníssimo representante do Ministério Público junto daquele Tribunal no sentido de se proceder à anulação das liquidações efectuadas pela administração fiscal (Anexo III); e, muito embora a contrario da referida promoção, mesmo que venha a ser considerado devido aquele crédito a devedora assume desde já que apresentará nas quarenta e oito horas seguintes ao transito em julgado dessa decisão o competente pedido de pagamento prestacional nos termos da lei em vigor, acompanhado naturalmente da entrega de imóvel para boa garantia do seu cumprimento. b) A Fazenda Nacional, nos termos dos n°s 3, 4, 5 e 6 do art. 196º do CPPT e do DL 73/99, de 16/03, e atendendo ao referido no ponto 3.3.1.1.a), perdoará 80% dos juros vencidos. Os valores em dívida vencerão juros à taxa anual de 2,5% ou da que vier a ser estipulada pela AT, após análise que efectuarão à renúncia dos credores privados e garantias prestadas. Não haverá lugar à redução de coimas e custas; c) Nos termos previstos na legislação acima referida, a quantia exequenda, custas e juros de mora não perdoados serão liquidados em trinta e seis prestações mensais iguais. d) Nos termos do artigo 199º do CPPT e tendo em consideração o Oficio Circulado n.º 60076 de 29.07.2010 da DSGCT, para garantia do regime prestacional acima referido, a insolvente propõe a constituição a favor da AT, hipoteca voluntária sobre o seguinte imóvel: Loja comercial inscrita na matriz sob o artigo 1110-B da freguesia da Sé concelho de Braga, com o valor patrimonial de 50.547,00€, já dado como garantia à AT precisamente para pagamento prestacional da quantia aqui em causa (Processo 0361201201077783). e) A AT, dentro do mês seguinte ao términus do prazo previsto no n.º 5 do artigo 17º-D do CIRE, após análise nos termos do n° 1 e 2 do artigo 197° e nº9 do artigo 199° do CPPT, aferirá a qualidade da garantia a ser prestada bem como a taxa dos juros vincendos e o perdão dos juros vincendos, sendo comunicada ao devedor as condições a cumprir para que seja efectuado o respectivo registo predial da hipoteca e se possa cumprir o prazo referido na alínea f) abaixo. f) A primeira prestação vencerá no mês seguinte ao términus do prazo previsto no n.º 5 do artigo 17º-D do CIRE. g) Para efeitos do disposto no n.º 3 do artigo 196º do CPPT, será considerado o referido na alínea a) do ponto 3.3.5. abaixo. h) Dentro do período referido na alínea f) acima, a devedora apresentará no serviço de finanças de Braga-1 o competente pedido de pagamento prestacional para pagamento das quantias existentes em processos de execução fiscal não reclamados nos presentes autos, conforme o disposto no ponto 3.3.4. abaixo. 3.3.2. Credores Privados 3.3.2.1. C.., S.A. a) Manutenção de todas as garantias constituídas; b) O valor dos expurgos será calculado em função das actuais 34 fracções de propriedade da devedora referentes ao prédio sito na Rua Luis Soares Barbosa, n.º 47 - 4710-403 Braga, sem prejuízo pelo referido na alínea e) abaixo. c) Do crédito n.º 0171004505292: Com o valor actual de 1.982.954,42€: i. Manutenção da sua actual forma de crédito (conta corrente) pelo período máximo de doze meses; ii. No decurso, a pedido da devedora, ou no final daquele período, a C.. converterá o valor em dívida num crédito de médio e longo prazo (construção) com vencimento a dois anos, havendo a possibilidade de renovação por períodos de um ano, com o limite em 31.01.2020 (ano limite de pagamento aos credores privados), mediante acordo prévio entre as partes. iii. Manutenção do indexante e o spread vigentes. iv. Redução das comissões de gestão, acompanhamento e renovação durante a vigência dos contratos, para um valor anual de 1.000,00€. v. O imposto de selo será pago mensalmente enquanto estiver em vigor o primeiro período do contrato, sendo pago de uma só vez e antecipadamente aquando a conversão do contrato. O imposto de selo observará a taxa legal em vigor em cada um daqueles períodos. vi. Pagamento de juros (postecipados): No que se refere ao primeiro período de vigência do contrato (prazo máximo de doze meses acima referidos), os juros seriam liquidados aquando a conversão do crédito. No contrato já sob a forma de MLP seriam pagos em duas semestralidades no primeiro ano e em quatro trimestralidades nos restantes. vii. Amortização de capital pelas vendas (sendo este crédito amortizando em primeiro lugar), com observação da seguinte tabela de expurgos2 que resulta do referido na alínea b) acima: Localização do imóvel garantido: R. Luis Soares Barbosa, nº 41, 43, 45, 47, 49 e 51 Freguesia: Braga (S. Vítor) CRPredial nº 879/19920225 Características dos bens Valor do Expurgo Piso Bloco Letra Tipo Tipologia (euros) R/C A C Comércio Loja 93.655 R/C A D Comércio Loja 65.558 1º A E Habitação T3 96.777 1º A F Habitação T4 103.020 1º A G Habitação T3 90.533 1º A H Habitação T2 71.802 2º A I Habitação T3 96.777 2º A J Habitação T4 103.020 2º A L Habitação T3 87.411 2º A M Habitação T2 71.802 8º A AM Habitação T3 87.411 8º A .AN Habitação T2 71.802 9º A AP Habitação T4 106.142 9º A AQ Habitação T3 87.411 9º A AR Habitação T2 71.802 10º A AS Habitação T3 93.655 10º A AT Habitação T4 106.142 10º A AU Habitação T3 87.411 10º A AV Habitação T2 71.802 11º A AX Habitação T3 93.655 11º A AZ Habitação T4 107.703 11º A BA Habitação T3 87.411 11º A BB Habitação T2 71.802 12º A BC Habitação T3 95.216 12º A BD Habitação T4 106.142 12º A BE Habitação T3 87.411 12º A BF Habitação T2 71.802 13º A BG Habitação T3 93.655 13º A BH Habitação T4 103.020 13º A BI Habitação T3 87.411 13º A BJ Habitação T2 71.802 14º A BL Habitação T3 103.020 14º A BN Habitação T3 99.899 14º A BO Habitação T2 73.363 TOTAL 3.017.250 2 Inclui um acréscimo de 10% do valor do capital em dívida para garantia de eventuais juros e outros encargos que possam vir a verificar-se, sendo que no último expurgo se fará o acerto dos eventuais valores liquidados em excesso. d) Do Crédito n.º 0359001140891: Com o valor de 760.000€: i. Manutenção da sua natureza de um crédito de médio e longo prazo (construção). ii. Ajustamento do vencimento para acompanhar o vencimento do crédito acima referido; iii. Manutenção do indexante e o spread vigentes. iv. Redução em 50% das despesas e comissões de gestão e acompanhamento e renovação durante a vigência do contrato. v. Pagamento de juros (postecipados): em duas semestralidades no primeiro ano e em quatro trimestralidades nos restantes. vi. Amortização de capital pelas vendas (sendo que se iniciará a sua amortização apenas após o término da amortização do anterior crédito) e) No caso de a CGD receber de terceiros os correspondentes valores dos distrates efectuados sobre as restantes fracções do prédio referido na alínea b) e portanto não incluídas na tabela acima exibida, abaterá esse mesmo montante ao valor da dívida a solver pela devedora. f) Os valores vencidos e não liquidados relativos aos contratos supra, serão regularizados no prazo de 3 meses após homologação do plano. 3.3.2.2. Trabalhadores a) Perdão de juros vencidos e juros vincendos. b) Os créditos dos trabalhadores serão liquidados em 24 prestações mensais iguais. c) A primeira prestação vencerá a 31 de Janeiro de 2014, salvo se até a essa data for distratado mais de doze fracções, antecipando-se o inicio do regime prestacional aquando o distrate da décima terceira fracção. 3.3.2.3. Fornecedores e restantes credores (Inclui o Banco .., S.A.): a) Perdão de juros vencidos e juros vincendos. b) Perdão de 50% de capital da dívida. c) Pagamento do remanescente em 16 trimestralidades, com início a 31 de Janeiro de 2014, salvo se até a essa data for distratado mais de doze fracções, antecipando-se o inicio do regime prestacional aquando o distrate da décima terceira fracção. 3.3.3. Credores não identificados no processo: 1. Não haverá lugar a qualquer pagamento relativamente a créditos não reconhecidos neste processo. 2. Eventuais credores que venham a reclamar, e serem reconhecidos judicialmente, créditos anteriores à data da entrada da petição inicial do presente processo em Tribunal, ficarão subrogados às exactas condições previstas nos pontos 3.3.1 a 3.3.2 acima, consoante a natureza e característica do crédito e/ou credor. 3.3.4. Regularização dos créditos da devedora contraídos após a data de entrada da petição inicial do presente processo em Tribunal: Serão observados os vencimentos e condições de pagamento contratados, sem prejuízo pela negociação pontual dos mesmos ou da constituição de regime prestacional especifico. *** Recurso interposto por A..: Iniciemos, então, a discussão, com a 1ª questão que enunciámos no âmbito deste recurso, a saber, se a situação do recorrente ao abrigo do Plano de Revitalização é manifestamente menos favorável do que a ocorreria na ausência de qualquer plano. Alega o Apelante que com a homologação do Plano de Revitalização (1) ficará sujeito ao recebimento do seu crédito em prestações mensais, tendo de esperar três anos para que o mesmo seja integralmente liquidado, (2) ficará numa situação de incerteza quanto ao recebimento do seu crédito, existindo sempre a possibilidade de um incumprimento, a qualquer momento, das prestações constantes do mesmo e (3) poderá a devedora dispor do seu património como bem lhe apetecer, não ficando o mesmo apreendido para garantia de pagamento dos credores daquela. Por fim, (4) se o Plano de Revitalização não vier a ser cumprido nada garante ao recorrente que a devedora continue a ser detentora de património suficiente para garantia do pagamento do seu crédito. Ao invés, sem a aprovação e homologação do Plano de Revitalização, o processo especial de revitalização seria convertido em processo de insolvência, passando-se à imediata apreensão do património da devedora, única garantia patrimonial do crédito do recorrente e demais credores daquela e passar-se-ia à imediata liquidação do activo da devedora para pagamento aos seus credores, na qual teria o recorrente o direito a ser pago preferencialmente, e de uma só vez, pelo produto obtido com a venda dos bens da devedora, bem como poderia também o recorrente requerer a atribuição do benefício do Fundo de Garantia Salarial para antecipação do recebimento do seu crédito. Por outro lado, sem a homologação do Plano de Revitalização o recorrente teria a certeza do recebimento do seu crédito, já que o mesmo estaria garantido pelo património da devedora, sendo pago pelo produto da venda do mesmo, ou pelo recurso ao benefício do Fundo de Garantia Salarial e obteria o pagamento do seu crédito de uma só vez, sem estar sujeitos à morosidade e incerteza do decorrer de três anos para efectivo e integral pagamento do mesmo. Na decisão de homologação cabe ao juiz ponderar, a pedido do credor, a recusa de homologação, caso este demonstre, em termos plausíveis, que a sua situação ao abrigo do plano é previsivelmente menos favorável do que a que interviria na ausência de qualquer plano (Artº 17ºF/5 e 216º/1-a) do CIRE). Assim, a procedência do pedido de não homologação depende da demonstração da invocada situação, demonstração que os autores associam a um complexo juízo de prognose intelectual “que se traduz em comparar o que se antevê resultar da homologação do plano, para o reclamante, com aquilo que aconteceria na ausência dele”, ou seja, e no que toca aos credores, tudo se reconduz “a cotejar quanto recebem com o plano e quanto se estima que receberiam sem ele” (Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, Quid Júris, 718). Ponderou-se na decisão recorrida que ficaram por demonstrar os pressupostos enunciados na disposição legal acima referida, porquanto: “Alegam os requerentes, em primeiro lugar, que o plano estabelece que o pagamento dos créditos dos requerentes será efectuado em 24 (vinte e quatro) prestações mensais, com início no dia 31 de Janeiro de 2014, ao passo que, na ausência de aprovação do plano de revitalização, a devedora seria declarada insolvente e os créditos dos requerentes satisfeitos por via da liquidação ou por recurso ao Fundo de Garantia Salarial. Desde logo, arrancam os requerentes de dois pressupostos que não são líquidos. Em primeiro lugar, a ausência de aprovação de um plano de revitalização não determina, inequivocamente, a declaração de insolvência da devedora, na medida em que esta apenas ocorrerá caso a Sr.ª Administradora Judicial Provisória, após audição da devedores e os credores, conclua nesse sentido (cfr. nºs 2 a 4, do artigo 17.º-G, do CIRE), o que, abstractamente, poderá não suceder. E, já em segundo lugar, na argumentação expendida, os requerentes partem de um outro pressuposto que julgamos não poder ser determinante na apreciação do referido pressuposto previsto no artigo 216º nº 1, alínea a), do CIRE, que é, precisamente, o do incumprimento do plano de revitalização. Com efeito, julgamos que a comparação de situações a que alude o citado artigo pressupõe o cumprimento do plano de insolvência e não a possibilidade do seu incumprimento vir a ocorrer. Assim, partindo desta premissa cremos que não está suficientemente demonstrado que a situação dos requerentes é mais vantajosa em caso de liquidação dos bens da massa insolvente do que com a homologação do plano, desde logo porque, apesar de estar previsto um prazo relativamente longo para liquidação dos respectivos créditos (2 anos, com cerca de 1 ano de moratória), o certo é que, cumprido o plano de pagamento, os credores/requerentes acabam por ver satisfeitos, na íntegra, os seus créditos, estando longe de estar demonstrado que a mesma situação ocorreria com a liquidação imediata dos bens da massa insolvente. Por outro lado, alegam, ainda, que a aprovação do plano terá como consequência a impossibilidade de recorrem ao Fundo de Garantia Salarial para obterem a antecipação dos seus créditos em tempo mais curto do que os aludidos dois anos. Ora, mais uma vez partem os requerentes do pressuposto do incumprimento do plano, o que como se viu, não poderá ser critério a atender. No entanto, sempre se dirá que, ainda que o plano venha a ser incumprido, não estará vedado aos credores o accionamento do Fundo de Garantia Salarial para pagamento dos seus créditos laborais (ainda que esse pagamento seja apenas parcial, atentos os limites legalmente garantidos) que se mostrem ainda por liquidar, ao que se deve acrescentar que, se com a liquidação imediata dos bens da devedora, os requerentes verão satisfeitos parcialmente os seus créditos pelo Fundo de Garantia Salarial, não menos verdade é que, com o cumprimento do plano de insolvência, aqueles verão satisfeitos na íntegra os seus créditos.” Os considerandos assim tecidos não nos merecem, no essencial, oposição, especialmente porque, tal como ali se sublinha, não poderá constituir critério para aferir da invocada prejudicialidade, uma hipotética situação de incumprimento e, sobretudo porque no cotejo efectuado não se demonstra que em presença do plano de revitalização, o Recrte. venha a receber menos do que receberia sem ele, critério que, conforme acima expusemos, nos parece ser o predominante. Ao criar o CIRE, o legislador foi claro ao afirmar que “o objectivo precípuo de qualquer processo de insolvência é a satisfação, pela forma mais eficiente possível, dos direitos dos credores” e que “sendo a garantia comum dos créditos o património do devedor, é aos credores que cumpre decidir quanto á melhor efectivação dessa garantia, e é por essa via que, seguramente, melhor se satisfaz o interesse público da preservação do bom funcionamento do mercado”. Significa isto que, na ponderação de todos os interesses em jogo, importa encontrar mecanismos que não sejam entrave ao bom funcionamento do mercado, sendo sempre a vontade dos credores a que comanda o processo. Nas palavras do próprio legislador, constantes do preâmbulo do DL 53/2004 de 18/03, “não valerá, portanto, afirmar que no novo Código é dada primazia à liquidação do património do insolvente. A primazia que efectivamente existe, não é demais reiterá-lo, é a da vontade dos credores, enquanto titulares do principal interesse que o direito concursal visa acautelar: o pagamento dos respectivos créditos em condições de igualdade quanto ao prejuízo decorrente de o património do devedor não ser, à partida e na generalidade dos casos, suficiente para satisfazer os seus direitos de forma integral”. O plano de revitalização ou recuperação, tal como o de insolvência, foi um dos instrumentos que o legislador pôs ao serviço dos propósitos enunciados no Código, instrumento esse que, no caso concreto, e pelos motivos que vimos analisando, não se vê que desfavoreça a posição do Recrte. em termos que suscitem a sua não homologação. Passemos, agora, a analisar a 2ª questão enunciada, a saber, se o Plano de Revitalização homologado nos autos trata de modo diferenciado os vários credores privilegiados. Alega o Recrte, que o Plano de Revitalização homologado nos autos não respeita o princípio da igualdade previsto no artigo 194º do CIRE, porquanto, e no que toca aos credores privilegiados, prevê apenas para os credores Instituto da Segurança Social e Fazenda Nacional o início imediato do pagamento das prestações mensais, ao contrário dos credores laborais, cujos créditos terão início de pagamento apenas após um longo período de carência; prevê ainda a constituição de garantias patrimoniais (hipotecas voluntárias) a favor dos credores Instituto da Segurança Social e Fazenda Nacional, não prevendo porém a constituição de qualquer garantia patrimonial para os credores laborais, nomeadamente o recorrente; prevê o pagamento de 20% dos juros vencidos e o pagamento da totalidade dos juros vincendos à taxa anual de 2,5% para os credores privilegiados Instituto da Segurança Social e Fazenda Nacional, prevendo ao contrário o perdão total de juros para os credores privilegiados trabalhadores. Contra-alega a Recrdª que há que tratar de forma diferente o que é diferente, sendo que antes do PER tinha a sua situação regularizada perante o Estado e a Segurança Social mercê de acordos de pagamento em prestações que tiveram como condição a constituição de garantias, pelo que o plano veio corroborar tais acordos, que estando previsto um conjunto de alienações que mais não são senão a prossecução do seu objecto social, o produto daí resultante será, a partir da 12ª venda, destinado ao pagamento aos trabalhadores, pelo que, na prática, o plano prevê um pagamento a curto prazo a estes credores e que se não forem feitas as alienações, o privilégio creditório dos trabalhadores está assegurado. Na sentença recorrida concluiu-se que inexiste qualquer violação do princípio da igualdade, porquanto o oferecimento de garantias é inócuo na medida em que o privilégio imobiliário geral, se for detido pelos trabalhadores, prevalece sobre a hipoteca. O que dizer? Os termos em que se mostra concebido o plano de revitalização mostram-se explanados acima, sendo evidente o distinto tratamento dado a esta ordem de créditos. Dispõe-se no Artº 194º/1 do CIRE que o plano de insolvência obedece ao princípio da igualdade dos credores da insolvência, sem prejuízo das diferenciações justificadas por razões objectivas. É, assim, possível, derrogar o princípio que nos ocupa, desde que justificadamente. Uma razão objectiva que pode servir de mote à diferenciação é a classificação dos créditos segundo os critérios enunciados no Artº 47º/4. Contudo, tanto uns, como outros, são privilegiados, não constando do plano qualquer razão justificativa da plausibilidade na diferenciação. Tal como alegado pelo Recrte., o Plano de Recuperação aprovado e homologado nos presentes autos faz distinção entre ambos os grupos de credores ao propor apenas para um dos grupos de credores privilegiados o início imediato do pagamento das prestações mensais, a constituição de garantias patrimoniais e o pagamento dos juros vincendos, enquanto que para o outro grupo de credores privilegiados, os credores laborais, prevê apenas o pagamento dos créditos em prestações mensais, com um ano de carência, sem constituição de qualquer garantia nem pagamento dos juros vincendos. Por outro lado, nada no plano nos elucida acerca da invocada (pela Recrdª) corroboração de acordos já vigentes antes do processo. Bem pelo contrário, o que consta do plano é que a empresa constituirá hipotecas em favor da Segurança Social e da Fazenda Nacional. E nada nos convence de que, na actual situação de crise, as pretendidas alienações patrimoniais se concretizem em prazo que permita antecipar o regime prestacional aos trabalhadores. Não podemos, assim, deixar de concluir que o Plano de Recuperação apresentado e homologado nos presentes autos viola o princípio da igualdade previsto no artigo 194º do CIRE, pelo que, por força do que se dispõe no Artº 215º deve recusar-se a respectiva homologação, já que são não negligenciáveis todas as violações de normas imperativas que acarretem a produção de um resultado que a lei não permite. Termos em que procede a apelação. *** Recurso interposto por J..: A 1ª questão que enunciámos prende-se com a nulidade da sentença, assente na circunstância de terem sido apresentados diversos requerimentos solicitando a não homologação do plano de revitalização, com distintas fundamentações e distintos requerentes, a sentença não se pronunciou sobre o requerimento e os fundamentos invocados pelo recorrente, que contudo não ficaram prejudicados e eram distintos dos apreciados. Compaginada a sentença de homologação, é certo que nada se diz acerca de algum requerimento da autoria do ora Recrte.. Por outro lado, em presença do plano de recuperação, o ora Recrte. explicitamente requereu a recusa de homologação daquele, alegando aquilo que no relatório acima exarado se dá conta. Sobre as questões atinentes ao voto da C.. foi proferida decisão, constante de fls. 954. Não mereceram, assim, pronúncia as demais questões suscitadas pelo ora Recrte., pelo que, quanto a essas, não resta senão concluir pela nulidade da sentença por omissão de pronúncia, porquanto o juiz deve conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido á sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (Artº 660º/2 e 668º/1-d) do CPC). Ora, as distintas questões abordadas na sentença não prejudicam o conhecimento daquelas que foram suscitadas pelo ora apelante, razão pela qual a questão que nos ocupa merece procedência parcial. Detenhamo-nos, agora, sobre a 2ª questão, que se desdobra em várias sub-questões: o plano não pode ser homologado por: a) a credora largamente maioritária, C.., ter feito votar e aprovar um plano em que os seus créditos se mantinham inalterados quando comparadas com a situação pré-existente; b) a homologação do plano de reestruturação que expressamente aprovou a “dação em pagamento” de 24 dos 60 apartamentos que constituem os únicos bens da devedora a credor que nunca tinha sido registado na contabilidade da devedora como credor; a quem nunca tinha reclamado qualquer crédito, constitui um sancionar de um crime de favorecimento de credores; c) a homologação do plano aprovado pelos credores, sendo decisão judicial, implica uma apreciação de que os objectivos pretendidos pelo legislador não são violados; c) o plano aprovado pelos credores e homologado ao dispor sobre o efeito possível de decisões judiciais futuras, ao contemplar que quaisquer créditos que venham a ser reconhecidos em acções judiciais a favor de terceiros, apenas poderão ser pagos nas condições aprovadas para os credores actuais, é ilegal por violador dos artigos 16º, 17º e 19º da Lei Orgânica dos Tribunais, 205º e 206 da CRP? Nas palavras de Catarina Serra, “o PER é um processo pré-insolvencial, cuja maior vantagem é a possibilidade de o devedor obter um plano de recuperação sem ser declarado insolvente” e através do qual se reserva aos credores um papel fundamental – o de “consentirem (pelo menos momentaneamente) no sacrifício dos seus direitos para viabilizarem o PER ou, então, manterem-se irredutíveis” (Processo Especial de Revitalização, Revista da Ordem dos Advogados, Ano 72, II/III, 716). Concluídas as negociações, o plano carece, ainda, de homologação judicial (Artº 17ºF/1 e 2 do CIRE), homologação esta destinada a aferir também da conformidade legal das medidas aprovadas. Á homologação ou não homologação do plano aplicam-se, com as necessárias adaptações, as regras previstas no Titulo IX, em especial nos Artº 215º e 216º do CIRE (Artº 17ºF/5). Dispõe-se no Artº 215º, no que para aqui releva, que o juiz recusa oficiosamente a homologação do plano aprovado no caso de violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo. Por outro lado, e de acordo com o disposto no Artº 216º/1, a homologação deve recusar-se também quando, a pedido de algum credor, se demonstre em ternos plausíveis, que a sua situação ao abrigo do plano é previsivelmente menos favorável do que a que interviria na ausência dele ou que o plano proporciona a algum credor um valor económico superior ao montante nominal dos seus créditos acrescido do valor das eventuais contribuições que ele deva prestar. Compulsados os fundamentos invocados nesta sede pelo Recrte. não vemos como enquadrá-los á luz das disposições citadas, e nem o mesmo invoca, a propósito de cada um daqueles argumentos qual a norma especialmente violada. Não deixaremos, porém, ainda de referir que não vemos que a lei condicione a legalidade do plano à alteração do montante ou condições dos créditos. E, quanto à circunstância de, alegadamente, existir um credor que nunca tinha sido registado na contabilidade da devedora como tal, trata-se de questão a decidir em sede do incidente de impugnação da lista provisória de créditos previsto no Artº 17ºD/3 do CIRE (que, aliás, teve lugar). Termos em que, improcede a questão que nos ocupa. Resta a 3ª questão: o presente processo de revitalização, concebido para permitir a sobrevivência e a recuperação de empresas viáveis e socialmente interessantes, foi desvirtuado na sua finalidade e, ilicitamente, usado para impedir uma liquidação geral em benefício de todos os credores, mas sim para o benefício de um único credor, a C..? Sobre esta temática o Recrte. não alega senão aquilo que traduziu a formulação da questão. Parece daqui decorrer que um credor ficará altamente beneficiado se em comparação com os demais. Ocorre, contudo, conforme evidencia o plano, que o crédito da C.. já estava previamente coberto por garantias, que, com o plano, se mantiveram, tendo-se procedido a reestruturação de um dos créditos – conversão em crédito de médio e longo prazo – e redução de comissões de gestão em ambos. Por outro lado, importa ter presente, que o PER se destina a permitir ao devedor, comprovadamente em situação económica difícil ou em iminente insolvência, o estabelecimento de negociações de forma a concluir um acordo conducente à revitalização. E, conforme acima dissemos, a liquidação do património do insolvente não é a primeira opção. A primazia que efectivamente existe é a da vontade dos credores, enquanto titulares do principal interesse que o direito concursal visa acautelar: o pagamento dos créditos. Ora, sendo o PER um processo pré-insolvencial, o que dele se espera é que, com o sacrifício também dos credores, se venha a conseguir a viabilização da empresa através de um esforço suplementar. Assim, desde que não evidenciada uma situação de discriminação de credores, não há como concluir pela alegada desvirtude do presente plano no que a esta concreta questão respeita. Não será demais lembrar que, tal como consta do plano em análise, “desde 2005 que a única obra que a empresa tem em curso é a denominada Torre Eurolimpica, um edifício habitacional com 60 fracções e cujo investimento total ascende já a oito milhões de euros”, obra que está “em fase final”, mas que, dada a asfixia da empresa, se teme “que as responsabilidades entretanto vencidas impeçam” a realização do seu investimento, sendo que “mais de 75% do passivo exigível refere-se às dívidas ao Estado, Segurança Social e Banca”. Percebe-se, pois, no contexto assinalado, o recurso ao presente processo como forma de solvência dos compromissos assumidos com manutenção da empresa no circuito comercial. Improcede, deste modo, também esta questão. *** Em conformidade com o exposto, acorda-se em: a) julgar a apelação interposta por A.., procedente e, em consequência, revogar a decisão recorrida; b) julgar a apelação interposta por J.. improcedente, declarando-se, embora, parcialmente nula a sentença. Custas, em ambos os casos, pela devedora. Notifique. Manuela Fialho Edgar Valente Paulo Barreto
Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães. A.. interpôs recurso da sentença que homologou o plano de revitalização. Pede a sua revogação. Funda-se nas seguintes conclusões: 1. O Plano de Revitalização homologado nos presentes autos prevê o pagamento dos créditos salariais, incluindo o do recorrente, em 24 prestações mensais a iniciar no dia 31.01.2014. 2. Com a homologação do Plano de Revitalização ficará o recorrente sujeito ao recebimento do seu crédito em prestações mensais, tendo de esperar três anos para que o mesmo seja integralmente liquidado. 3. Ao contrário, e sem a aprovação e homologação do Plano de Revitalização, o processo especial de revitalização seria convertido em processo de insolvência, passando-se à imediata apreensão do património da devedora, única garantia patrimonial do crédito do recorrente e demais credores daquela. 4. Com a não homologação do Plano de Revitalização, e consequente conversão em processo de insolvência, passar-se-ia à imediata liquidação do activo da devedora para pagamento aos seus credores, na qual teria o recorrente o direito a ser pago preferencialmente, e de uma só vez, pelo produto obtido com a venda dos bens da devedora, 5. bem como poderia também o recorrente requerer a atribuição do benefício do Fundo de Garantia Salarial para antecipação do recebimento do seu crédito. 6. A situação do recorrente ao abrigo do Plano de Revitalização é manifestamente menos favorável do que a ocorreria na ausência de qualquer plano. 7. Com a homologação do Plano de Revitalização ficará o recorrente numa situação de incerteza quanto ao recebimento do seu crédito, existindo sempre a possibilidade de um incumprimento, a qualquer momento, das prestações constantes do mesmo. 8. Com a homologação do Plano de Revitalização poderá a devedora dispor do seu património como bem lhe apetecer, não ficando o mesmo apreendido para garantia de pagamento dos credores daquela. 9. Se o Plano de Revitalização não vier a ser cumprido nada garante ao recorrente que a devedora continue a ser detentora de património suficiente para garantia do pagamento do seu crédito. 10. Sem a homologação do Plano de Revitalização o recorrente teria a certeza do recebimento do seu crédito, já que o mesmo estaria garantido pelo património da devedora, sendo pago pelo produto da venda do mesmo, ou pelo recurso ao benefício do Fundo de Garantia Salarial. 11. Sem a homologação do Plano de Revitalização o recorrente obteria o pagamento do seu crédito de uma só vez, sem estarem sujeitos à morosidade e incerteza do decorrer de três anos para efectivo e integral pagamento do mesmo. 12. O Plano de Revitalização homologado nos autos trata de modo diferenciado os vários credores privilegiados, prevendo apenas para os credores Instituto da Segurança Social e Fazenda Nacional o início imediato do pagamento das prestações mensais, ao contrário dos credores laborais, cujos créditos terão início de pagamento apenas após um longo período de carência. 13. O Plano de Revitalização homologado nos autos prevê ainda a constituição de garantias patrimoniais (hipotecas voluntárias) a favor dos credores Instituto da Segurança Social e Fazenda Nacional, não prevendo porém a constituição de qualquer garantia patrimonial para os credores laborais, nomeadamente o recorrente. 14. O Plano de Revitalização homologado nos autos prevê o pagamento de 20% dos juros vencidos e o pagamento da totalidade dos juros vincendos à taxa anual de 2,5% para os credores privilegiados Instituto da Segurança Social e Fazenda Nacional, prevendo ao contrário o perdão total de juros para os credores privilegiados trabalhadores. 15. O Plano de Revitalização homologado nos autos não respeita o princípio da igualdade previsto no artigo 194º do CIRE, já que os credores laborais são alvo de tratamento diferenciado relativamente aos restantes credores privilegiados, 16. estando sujeitos a um tratamento menos favorável, nomeadamente no que diz respeito à data de início de pagamento dos seus créditos, ao perdão de juros, bem como relativamente à constituição de garantias para o caso de incumprimento do plano. 17. A douta sentença recorrida, ao homologar um plano de revitalização que não respeita um dos princípios basilares do processo de insolvência, carece de fundamento, pelo que deve ser revogada. J.., residente, quando em Portugal, na Rua.., Póvoa de Varzim, e quando em França, na Avenue.. em Paris, interpôs recurso da sentença homologatória do plano de recuperação. Pede a sua revogação com substituição por acórdão que não homologue o plano de reestruturação aprovado. Funda-se nas seguintes conclusões: I. Foram apresentados diversos requerimentos solicitando a não homologação do plano de revitalização, com distintas fundamentações e distintos requerentes, a sentença não se pronunciou sobre o requerimento e os fundamentos pelo recorrente, que contudo não ficaram prejudicados e eram distintos dos apreciados, pelo que a sentença de homologação ora recorrida violou o disposto no artigo 668º n1 alínea d) do CPC, estando por tal razão ferida de nulidade. II. E as razões invocadas pelo recorrente credor, reconhecido em devido tempo e modo, no seu requerimento solicitando a não homologação do plano aprovado são distintas das invocadas pelos trabalhadores – violação do principio da igualdade e da situação menos favorável em que ficarão com a aprovação do plano quando comparado com a situação de liquidação geral do património da devedora, enquanto que as razões do recorrente que ora igualmente fundamentam o recurso são: III. Primeira, de que a credora largamente maioritária, C.., tinha feito votar e aprovara um plano em que os seus créditos se mantinham inalterados quando comparadas com a situação pré-existente: quanto ao valor a receber; quanto à manutenção das garantias hipotecárias; quanto até aos juros a receber; e mesmo quanto aos prazos expectáveis de recebimento dos seus empréstimos. Pelo que o ter sido considerado o seu voto na deliberação de homologação do Plano de Reestruturação, foi violado o disposto no artigo nº 212º alínea a) do CIRE, já que em tais condições a CGD estaria impedida de votar; IV. Segunda, de que a homologação do plano de reestruturação que expressamente aprovou a “dação em pagamento” de 24 dos 60 apartamentos que constitui os únicos bens da devedora a credor que nunca tinha sido registado na contabilidade da devedora como credor; a quem nunca tinha reclamado qualquer crédito; a quem nada era devido por já lhe ter sido pago, e sem que tivesse realizado qualquer contraprestação que desse entrada nos cofres da sociedade, constitui um sancionar de um crime de favorecimento de credores, além de uma óbvia fraude realizada em prejuízo de todos os credores que não os dotados de hipoteca, ou seja todos os restantes que não a C.., sobre os bens desviados ao património da devedora. V. Constitui tal transmissão de bens, sem contrapartida para a sociedade e no valor de mais de 2.4 milhões de euros, depois de interposto o processo PER e já no decurso de dois processos de insolvência instaurados contra a transmitente, ainda uma violação do princípio da estabilidade da posição relativa dos credores durante o processo de negociação, consagrado na Resolução do Conselho de Ministros nº 43/2011 de 25-10-2011, e artigo 215º do CIRE. VI. Terceira, a homologação do plano aprovado pelos credores, sendo decisão judicial, implica uma apreciação de que os objectivos pretendidos pelo legislador não são violados, pelo que se o “plano de revitalização” aprovado não permite qualquer revitalização – a sobrevivência e recuperação económica e financeira da empresa – já que é óbvio pela sua simples leitura que o mesmo apenas contempla e permite pagamentos á C.., já que os valores remanescentes após a “dação em pagamento”, não chegam nem para o expurgo das hipotecas, não restando nem sendo possível qualquer pagamento a qualquer outro credor. VII. Quarta razão, O plano aprovado pelos credores e homologado ao dispor sobre o efeito possível de decisões judiciais futuras, ao contemplar que quaisquer créditos que venham a ser reconhecidos em acções judiciais favor de terceiros, apenas poderão ser pagos nas condições aprovadas para os credores actuais, ou seja com redução a metade dos créditos reconhecidos, ponto … do plano, é ilegal por violador dos artigos 16º, 17º e 19º da Lei Orgânica dos Tribunais, 205º e 206 da CRP, além de outros, já que constitui uma limitação prévia ao poder de decisão dos juízes de tais processos não obstante se tratarem de tribunais de igual competência hierárquica. VIII. Razões sobre que a decisão recorrida não se pronuncia, nem em resposta nem em conhecimento oficioso como é imposto pelo artigo 215º do CIRE. IX. A decisão de homologação ora recorrida deverá ser revogada ainda porque consagra um uso indevido do processo especial de revitalização, o qual não é o de permitir a liquidação geral do património da devedora sob a administração da própria devedora e em benefício de apenas alguns credores, por mais favorável que tal liquidação possa vir a resultar para estes, sendo obrigação do juiz homologante distinguir e respeitar os âmbitos dos processos de insolvência e de reestruturação, não permitindo o uso do último para as finalidades próprias e reservadas para o primeiro, por violação do disposto no artigo 17-A e 3º do CIRE. X. São pressupostos essenciais da revitalização de uma empresa: primeiro, que exista uma empresa; segundo – que exista um projecto empresarial que possa ser revitalizado ou viabilizado e, terceiro que com o plano aprovado se criem as condições que torne minimamente provável que a empresa sobreviva. XI. A devedora E.., Lda não é mais detentora de qualquer empresa. Não tendo pessoal, ao seu serviço, não tem instalações, nem sequer sede, não tem equipamentos e não tem qualquer projecto empresarial. Resultando do plano aprovado que este apenas tem como finalidade a manutenção das dações em pagamento feitas ao não credor E.. e a liquidação do património restante a favor de um único credor, a C... XII. Não existindo condições para que a devedora consiga realizar quaisquer empreitadas futuras, de 400 mil euros por ano ou qualquer outro valor semelhante, já que não dispõe de quaisquer sem equipamentos, nem materiais, nem está previsto qualquer investimento ou financiamento adicional, nem quadros, nem técnica sendo os seus funcionários inexistentes. XIII. Donde que o presente processo de revitalização, concebido para permitir a sobrevivência e a recuperação de empresas viáveis e socialmente interessantes, tenha sido nos presentes autos desvirtuado na sua finalidade e, ilicitamente, usado para impedir uma liquidação geral em benefício de todos os credores, mas sim para o benefício de um único credor a C.., para salvar o património e a responsabilidade dos gerentes da devedora e para sancionar, legitimar, branquear, o furto de 24 fracções no valor superior a 2.4 milhões de euros aos restantes credores. E.., LDA. contra-alegou ambos os recursos, pugnando pela manutenção da sentença. * Consignamos, agora, um breve resumo dos autos para melhor compreensão. Por despacho proferido a fls. 240, foi liminarmente admitido processo especial de revitalização relativo à requerente E.., LD.ª. Proposto e sujeito a votação plano de revitalização, veio o mesmo a ser aprovado pelas percentagens indicadas no despacho de fls. 954 a 957 e, consequentemente, tal deliberação foi notificada e publicitada nos termos do disposto no artigo 213.º, do CIRE. Por requerimento de fls. 880, vieram os credores (trabalhadores) A.., A.., C.., J.. e M.. solicitar a não homologação do plano de revitalização proposto, invocando, por um lado, a violação do princípio da igualdade dos credores (art.º 194.º, n.º 1 do CIRE) e, já por outro, referindo que a sua situação ao abrigo do plano de revitalização é, previsivelmente, menos favorável do que aquela em que ficariam na ausência da plano, pois poderiam recorrer ao Fundo de Garantia Salarial ou mesmo obter a satisfação dos seus créditos por via de liquidação. Sobre tal requerimento, pronunciou-se a requerente E.., pugnando pelo indeferimento do requerido. Através do requerimento que integra fls. 885, J.. veio opor-se à homologação do plano, alegando, em síntese, que é ininteligível a lista de votações, sendo óbvio que a credora C.. votou em violação do disposto no Artº 212º/2-a) do CIRE, que a homologação do plano sanciona operações de escrituração a favor de J.., em operações que tem como simuladas, que, a não ter havido simulação, está indiciado um crime de favorecimento de credores, que não existe qualquer empresa para revitalizar, pelo que o plano se destina a sancionar desvios de bens e a garantir que um dos credores ultrapasse os demais. Foi, após, proferida sentença que homologou o plano de revitalização constante de fls. 822 a 848. Na sequência de decisão, nesta Relação, para baixa do processo a fim de ser conhecida a nulidade invocada pelo 2º Recrte., o Sr. Juiz proferiu decisão que indeferiu a nulidade por omissão de pronúncia. *** Das conclusões que supra exarámos, e que delimitam o objecto do recurso, extraem-se as seguintes questões a decidir: A) No recurso interposto por A..: 1ª - A situação do recorrente ao abrigo do Plano de Revitalização é manifestamente menos favorável do que a ocorreria na ausência de qualquer plano? 2ª - O Plano de Revitalização homologado nos autos trata de modo diferenciado os vários credores privilegiados? B) No recurso interposto por J..: 1ª – A sentença está ferida de nulidade? 2ª – O plano não pode ser homologado por: a) a credora largamente maioritária, C.., ter feito votar e aprovar um plano em que os seus créditos se mantinham inalterados quando comparadas com a situação pré-existente; b) a homologação do plano de reestruturação que expressamente aprovou a “dação em pagamento” de 24 dos 60 apartamentos que constitui os únicos bens da devedora a credor que nunca tinha sido registado na contabilidade da devedora como credor; a quem nunca tinha reclamado qualquer crédito, constitui um sancionar de um crime de favorecimento de credores; c) a homologação do plano aprovado pelos credores, sendo decisão judicial, implica uma apreciação de que os objectivos pretendidos pelo legislador não são violados; c) o plano aprovado pelos credores e homologado ao dispor sobre o efeito possível de decisões judiciais futuras, ao contemplar que quaisquer créditos que venham a ser reconhecidos em acções judiciais favor de terceiros, apenas poderão ser pagos nas condições aprovadas para os credores actuais, é ilegal por violador dos artigos 16º, 17º e 19º da Lei Orgânica dos Tribunais, 205º e 206 da CRP? 3ª - O presente processo de revitalização, concebido para permitir a sobrevivência e a recuperação de empresas viáveis e socialmente interessantes, foi desvirtuado na sua finalidade e, ilicitamente, usado para impedir uma liquidação geral em benefício de todos os credores, mas sim para o benefício de um único credor a C..? *** Antes de entrarmos na análise das questões que enunciámos, consigna-se que a proposta de solvência constante do plano homologado, é a seguinte: 3.3.1. Credores Públicos 3.3.1.1. Segurança Social: a) A Segurança Social, conforme alínea b) IV do n.º 2 do art.º 3.° do Decreto-Lei n.º 260/99, de 7 de Julho com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 112/2004, de 13 de Maio, conjugado com a alínea b) do n.º 2 do artigo 190.° do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segunda Social, e sem prejuízo pela posterior análise que efectuarão à renúncia dos credores privados e garantias prestadas, perdoará 80% dos juros vencidos. Os valores em dívida vencerão juros à taxa anual de 2,5% b) Nos termos previstos na legislação acima referida, as contribuições para a segurança social e juros de mora não perdoados serão liquidados em 150 prestações mensais progressivas distribuídas equitativamente no valor das prestações sem progressividade (VP), e de acordo com a seguinte quadro: Da 1ª à 12ª 25% VP Da 13ª à 24ª 50% VP Da 25ª à 36ª 75% VP A partir da 37ª 100% VPR c) A administradora judicial provisória emitirá declaração em como «…o perdão de 80% dos juros é uma condição imprescindível para o saneamento da insolvente, no sentido de evitar eventuais rupturas de tesouraria e novas situações de incumprimento por parte da insolvente». d) A primeira prestação vence-se no mês seguinte à data da sentença homologatória do plano de recuperação. e) Para garantia do regime prestacional e nos termos da legislação em vigor, constituirá a requerente, a favor do IGFSS, IP, hipoteca voluntária sobre o seguinte bem imóvel: Loja comercial situada no r/c Esq. Frente do prédio sito na Rua Luis Soares Barbosa, n.º 47 - 4710-403 Braga, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 5310-D, com o valor patrimonial de 72.180€,00. f) Pagamento integral dos valores referentes a custas processuais devidas no âmbito de acções executivas que se encontram suspensas na respectiva secção de processo executivo, no prazo de 30 dias após o trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de recuperação. 3.3.1.2. Fazenda Nacional: a) O crédito a regularizar no âmbito do presente plano, sem prejuízo pelo disposto no ponto 3.3.3 abaixo, é o crédito vencido e reconhecido no presente processo; não se considerando, por conseguinte, o crédito sob condição nos termos do art.º 50.º do CIRE, por estar sujeito à verificação de um acontecimento futuro e incerto, ou seja, a improcedência do processo n.º 927/07.9BEBRG do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, no valor de 756.887,93€ onde, de resto, foi já emitido parecer pelo Digníssimo representante do Ministério Público junto daquele Tribunal no sentido de se proceder à anulação das liquidações efectuadas pela administração fiscal (Anexo III); e, muito embora a contrario da referida promoção, mesmo que venha a ser considerado devido aquele crédito a devedora assume desde já que apresentará nas quarenta e oito horas seguintes ao transito em julgado dessa decisão o competente pedido de pagamento prestacional nos termos da lei em vigor, acompanhado naturalmente da entrega de imóvel para boa garantia do seu cumprimento. b) A Fazenda Nacional, nos termos dos n°s 3, 4, 5 e 6 do art. 196º do CPPT e do DL 73/99, de 16/03, e atendendo ao referido no ponto 3.3.1.1.a), perdoará 80% dos juros vencidos. Os valores em dívida vencerão juros à taxa anual de 2,5% ou da que vier a ser estipulada pela AT, após análise que efectuarão à renúncia dos credores privados e garantias prestadas. Não haverá lugar à redução de coimas e custas; c) Nos termos previstos na legislação acima referida, a quantia exequenda, custas e juros de mora não perdoados serão liquidados em trinta e seis prestações mensais iguais. d) Nos termos do artigo 199º do CPPT e tendo em consideração o Oficio Circulado n.º 60076 de 29.07.2010 da DSGCT, para garantia do regime prestacional acima referido, a insolvente propõe a constituição a favor da AT, hipoteca voluntária sobre o seguinte imóvel: Loja comercial inscrita na matriz sob o artigo 1110-B da freguesia da Sé concelho de Braga, com o valor patrimonial de 50.547,00€, já dado como garantia à AT precisamente para pagamento prestacional da quantia aqui em causa (Processo 0361201201077783). e) A AT, dentro do mês seguinte ao términus do prazo previsto no n.º 5 do artigo 17º-D do CIRE, após análise nos termos do n° 1 e 2 do artigo 197° e nº9 do artigo 199° do CPPT, aferirá a qualidade da garantia a ser prestada bem como a taxa dos juros vincendos e o perdão dos juros vincendos, sendo comunicada ao devedor as condições a cumprir para que seja efectuado o respectivo registo predial da hipoteca e se possa cumprir o prazo referido na alínea f) abaixo. f) A primeira prestação vencerá no mês seguinte ao términus do prazo previsto no n.º 5 do artigo 17º-D do CIRE. g) Para efeitos do disposto no n.º 3 do artigo 196º do CPPT, será considerado o referido na alínea a) do ponto 3.3.5. abaixo. h) Dentro do período referido na alínea f) acima, a devedora apresentará no serviço de finanças de Braga-1 o competente pedido de pagamento prestacional para pagamento das quantias existentes em processos de execução fiscal não reclamados nos presentes autos, conforme o disposto no ponto 3.3.4. abaixo. 3.3.2. Credores Privados 3.3.2.1. C.., S.A. a) Manutenção de todas as garantias constituídas; b) O valor dos expurgos será calculado em função das actuais 34 fracções de propriedade da devedora referentes ao prédio sito na Rua Luis Soares Barbosa, n.º 47 - 4710-403 Braga, sem prejuízo pelo referido na alínea e) abaixo. c) Do crédito n.º 0171004505292: Com o valor actual de 1.982.954,42€: i. Manutenção da sua actual forma de crédito (conta corrente) pelo período máximo de doze meses; ii. No decurso, a pedido da devedora, ou no final daquele período, a C.. converterá o valor em dívida num crédito de médio e longo prazo (construção) com vencimento a dois anos, havendo a possibilidade de renovação por períodos de um ano, com o limite em 31.01.2020 (ano limite de pagamento aos credores privados), mediante acordo prévio entre as partes. iii. Manutenção do indexante e o spread vigentes. iv. Redução das comissões de gestão, acompanhamento e renovação durante a vigência dos contratos, para um valor anual de 1.000,00€. v. O imposto de selo será pago mensalmente enquanto estiver em vigor o primeiro período do contrato, sendo pago de uma só vez e antecipadamente aquando a conversão do contrato. O imposto de selo observará a taxa legal em vigor em cada um daqueles períodos. vi. Pagamento de juros (postecipados): No que se refere ao primeiro período de vigência do contrato (prazo máximo de doze meses acima referidos), os juros seriam liquidados aquando a conversão do crédito. No contrato já sob a forma de MLP seriam pagos em duas semestralidades no primeiro ano e em quatro trimestralidades nos restantes. vii. Amortização de capital pelas vendas (sendo este crédito amortizando em primeiro lugar), com observação da seguinte tabela de expurgos2 que resulta do referido na alínea b) acima: Localização do imóvel garantido: R. Luis Soares Barbosa, nº 41, 43, 45, 47, 49 e 51 Freguesia: Braga (S. Vítor) CRPredial nº 879/19920225 Características dos bens Valor do Expurgo Piso Bloco Letra Tipo Tipologia (euros) R/C A C Comércio Loja 93.655 R/C A D Comércio Loja 65.558 1º A E Habitação T3 96.777 1º A F Habitação T4 103.020 1º A G Habitação T3 90.533 1º A H Habitação T2 71.802 2º A I Habitação T3 96.777 2º A J Habitação T4 103.020 2º A L Habitação T3 87.411 2º A M Habitação T2 71.802 8º A AM Habitação T3 87.411 8º A .AN Habitação T2 71.802 9º A AP Habitação T4 106.142 9º A AQ Habitação T3 87.411 9º A AR Habitação T2 71.802 10º A AS Habitação T3 93.655 10º A AT Habitação T4 106.142 10º A AU Habitação T3 87.411 10º A AV Habitação T2 71.802 11º A AX Habitação T3 93.655 11º A AZ Habitação T4 107.703 11º A BA Habitação T3 87.411 11º A BB Habitação T2 71.802 12º A BC Habitação T3 95.216 12º A BD Habitação T4 106.142 12º A BE Habitação T3 87.411 12º A BF Habitação T2 71.802 13º A BG Habitação T3 93.655 13º A BH Habitação T4 103.020 13º A BI Habitação T3 87.411 13º A BJ Habitação T2 71.802 14º A BL Habitação T3 103.020 14º A BN Habitação T3 99.899 14º A BO Habitação T2 73.363 TOTAL 3.017.250 2 Inclui um acréscimo de 10% do valor do capital em dívida para garantia de eventuais juros e outros encargos que possam vir a verificar-se, sendo que no último expurgo se fará o acerto dos eventuais valores liquidados em excesso. d) Do Crédito n.º 0359001140891: Com o valor de 760.000€: i. Manutenção da sua natureza de um crédito de médio e longo prazo (construção). ii. Ajustamento do vencimento para acompanhar o vencimento do crédito acima referido; iii. Manutenção do indexante e o spread vigentes. iv. Redução em 50% das despesas e comissões de gestão e acompanhamento e renovação durante a vigência do contrato. v. Pagamento de juros (postecipados): em duas semestralidades no primeiro ano e em quatro trimestralidades nos restantes. vi. Amortização de capital pelas vendas (sendo que se iniciará a sua amortização apenas após o término da amortização do anterior crédito) e) No caso de a CGD receber de terceiros os correspondentes valores dos distrates efectuados sobre as restantes fracções do prédio referido na alínea b) e portanto não incluídas na tabela acima exibida, abaterá esse mesmo montante ao valor da dívida a solver pela devedora. f) Os valores vencidos e não liquidados relativos aos contratos supra, serão regularizados no prazo de 3 meses após homologação do plano. 3.3.2.2. Trabalhadores a) Perdão de juros vencidos e juros vincendos. b) Os créditos dos trabalhadores serão liquidados em 24 prestações mensais iguais. c) A primeira prestação vencerá a 31 de Janeiro de 2014, salvo se até a essa data for distratado mais de doze fracções, antecipando-se o inicio do regime prestacional aquando o distrate da décima terceira fracção. 3.3.2.3. Fornecedores e restantes credores (Inclui o Banco .., S.A.): a) Perdão de juros vencidos e juros vincendos. b) Perdão de 50% de capital da dívida. c) Pagamento do remanescente em 16 trimestralidades, com início a 31 de Janeiro de 2014, salvo se até a essa data for distratado mais de doze fracções, antecipando-se o inicio do regime prestacional aquando o distrate da décima terceira fracção. 3.3.3. Credores não identificados no processo: 1. Não haverá lugar a qualquer pagamento relativamente a créditos não reconhecidos neste processo. 2. Eventuais credores que venham a reclamar, e serem reconhecidos judicialmente, créditos anteriores à data da entrada da petição inicial do presente processo em Tribunal, ficarão subrogados às exactas condições previstas nos pontos 3.3.1 a 3.3.2 acima, consoante a natureza e característica do crédito e/ou credor. 3.3.4. Regularização dos créditos da devedora contraídos após a data de entrada da petição inicial do presente processo em Tribunal: Serão observados os vencimentos e condições de pagamento contratados, sem prejuízo pela negociação pontual dos mesmos ou da constituição de regime prestacional especifico. *** Recurso interposto por A..: Iniciemos, então, a discussão, com a 1ª questão que enunciámos no âmbito deste recurso, a saber, se a situação do recorrente ao abrigo do Plano de Revitalização é manifestamente menos favorável do que a ocorreria na ausência de qualquer plano. Alega o Apelante que com a homologação do Plano de Revitalização (1) ficará sujeito ao recebimento do seu crédito em prestações mensais, tendo de esperar três anos para que o mesmo seja integralmente liquidado, (2) ficará numa situação de incerteza quanto ao recebimento do seu crédito, existindo sempre a possibilidade de um incumprimento, a qualquer momento, das prestações constantes do mesmo e (3) poderá a devedora dispor do seu património como bem lhe apetecer, não ficando o mesmo apreendido para garantia de pagamento dos credores daquela. Por fim, (4) se o Plano de Revitalização não vier a ser cumprido nada garante ao recorrente que a devedora continue a ser detentora de património suficiente para garantia do pagamento do seu crédito. Ao invés, sem a aprovação e homologação do Plano de Revitalização, o processo especial de revitalização seria convertido em processo de insolvência, passando-se à imediata apreensão do património da devedora, única garantia patrimonial do crédito do recorrente e demais credores daquela e passar-se-ia à imediata liquidação do activo da devedora para pagamento aos seus credores, na qual teria o recorrente o direito a ser pago preferencialmente, e de uma só vez, pelo produto obtido com a venda dos bens da devedora, bem como poderia também o recorrente requerer a atribuição do benefício do Fundo de Garantia Salarial para antecipação do recebimento do seu crédito. Por outro lado, sem a homologação do Plano de Revitalização o recorrente teria a certeza do recebimento do seu crédito, já que o mesmo estaria garantido pelo património da devedora, sendo pago pelo produto da venda do mesmo, ou pelo recurso ao benefício do Fundo de Garantia Salarial e obteria o pagamento do seu crédito de uma só vez, sem estar sujeitos à morosidade e incerteza do decorrer de três anos para efectivo e integral pagamento do mesmo. Na decisão de homologação cabe ao juiz ponderar, a pedido do credor, a recusa de homologação, caso este demonstre, em termos plausíveis, que a sua situação ao abrigo do plano é previsivelmente menos favorável do que a que interviria na ausência de qualquer plano (Artº 17ºF/5 e 216º/1-a) do CIRE). Assim, a procedência do pedido de não homologação depende da demonstração da invocada situação, demonstração que os autores associam a um complexo juízo de prognose intelectual “que se traduz em comparar o que se antevê resultar da homologação do plano, para o reclamante, com aquilo que aconteceria na ausência dele”, ou seja, e no que toca aos credores, tudo se reconduz “a cotejar quanto recebem com o plano e quanto se estima que receberiam sem ele” (Luís A. Carvalho Fernandes e João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, Quid Júris, 718). Ponderou-se na decisão recorrida que ficaram por demonstrar os pressupostos enunciados na disposição legal acima referida, porquanto: “Alegam os requerentes, em primeiro lugar, que o plano estabelece que o pagamento dos créditos dos requerentes será efectuado em 24 (vinte e quatro) prestações mensais, com início no dia 31 de Janeiro de 2014, ao passo que, na ausência de aprovação do plano de revitalização, a devedora seria declarada insolvente e os créditos dos requerentes satisfeitos por via da liquidação ou por recurso ao Fundo de Garantia Salarial. Desde logo, arrancam os requerentes de dois pressupostos que não são líquidos. Em primeiro lugar, a ausência de aprovação de um plano de revitalização não determina, inequivocamente, a declaração de insolvência da devedora, na medida em que esta apenas ocorrerá caso a Sr.ª Administradora Judicial Provisória, após audição da devedores e os credores, conclua nesse sentido (cfr. nºs 2 a 4, do artigo 17.º-G, do CIRE), o que, abstractamente, poderá não suceder. E, já em segundo lugar, na argumentação expendida, os requerentes partem de um outro pressuposto que julgamos não poder ser determinante na apreciação do referido pressuposto previsto no artigo 216º nº 1, alínea a), do CIRE, que é, precisamente, o do incumprimento do plano de revitalização. Com efeito, julgamos que a comparação de situações a que alude o citado artigo pressupõe o cumprimento do plano de insolvência e não a possibilidade do seu incumprimento vir a ocorrer. Assim, partindo desta premissa cremos que não está suficientemente demonstrado que a situação dos requerentes é mais vantajosa em caso de liquidação dos bens da massa insolvente do que com a homologação do plano, desde logo porque, apesar de estar previsto um prazo relativamente longo para liquidação dos respectivos créditos (2 anos, com cerca de 1 ano de moratória), o certo é que, cumprido o plano de pagamento, os credores/requerentes acabam por ver satisfeitos, na íntegra, os seus créditos, estando longe de estar demonstrado que a mesma situação ocorreria com a liquidação imediata dos bens da massa insolvente. Por outro lado, alegam, ainda, que a aprovação do plano terá como consequência a impossibilidade de recorrem ao Fundo de Garantia Salarial para obterem a antecipação dos seus créditos em tempo mais curto do que os aludidos dois anos. Ora, mais uma vez partem os requerentes do pressuposto do incumprimento do plano, o que como se viu, não poderá ser critério a atender. No entanto, sempre se dirá que, ainda que o plano venha a ser incumprido, não estará vedado aos credores o accionamento do Fundo de Garantia Salarial para pagamento dos seus créditos laborais (ainda que esse pagamento seja apenas parcial, atentos os limites legalmente garantidos) que se mostrem ainda por liquidar, ao que se deve acrescentar que, se com a liquidação imediata dos bens da devedora, os requerentes verão satisfeitos parcialmente os seus créditos pelo Fundo de Garantia Salarial, não menos verdade é que, com o cumprimento do plano de insolvência, aqueles verão satisfeitos na íntegra os seus créditos.” Os considerandos assim tecidos não nos merecem, no essencial, oposição, especialmente porque, tal como ali se sublinha, não poderá constituir critério para aferir da invocada prejudicialidade, uma hipotética situação de incumprimento e, sobretudo porque no cotejo efectuado não se demonstra que em presença do plano de revitalização, o Recrte. venha a receber menos do que receberia sem ele, critério que, conforme acima expusemos, nos parece ser o predominante. Ao criar o CIRE, o legislador foi claro ao afirmar que “o objectivo precípuo de qualquer processo de insolvência é a satisfação, pela forma mais eficiente possível, dos direitos dos credores” e que “sendo a garantia comum dos créditos o património do devedor, é aos credores que cumpre decidir quanto á melhor efectivação dessa garantia, e é por essa via que, seguramente, melhor se satisfaz o interesse público da preservação do bom funcionamento do mercado”. Significa isto que, na ponderação de todos os interesses em jogo, importa encontrar mecanismos que não sejam entrave ao bom funcionamento do mercado, sendo sempre a vontade dos credores a que comanda o processo. Nas palavras do próprio legislador, constantes do preâmbulo do DL 53/2004 de 18/03, “não valerá, portanto, afirmar que no novo Código é dada primazia à liquidação do património do insolvente. A primazia que efectivamente existe, não é demais reiterá-lo, é a da vontade dos credores, enquanto titulares do principal interesse que o direito concursal visa acautelar: o pagamento dos respectivos créditos em condições de igualdade quanto ao prejuízo decorrente de o património do devedor não ser, à partida e na generalidade dos casos, suficiente para satisfazer os seus direitos de forma integral”. O plano de revitalização ou recuperação, tal como o de insolvência, foi um dos instrumentos que o legislador pôs ao serviço dos propósitos enunciados no Código, instrumento esse que, no caso concreto, e pelos motivos que vimos analisando, não se vê que desfavoreça a posição do Recrte. em termos que suscitem a sua não homologação. Passemos, agora, a analisar a 2ª questão enunciada, a saber, se o Plano de Revitalização homologado nos autos trata de modo diferenciado os vários credores privilegiados. Alega o Recrte, que o Plano de Revitalização homologado nos autos não respeita o princípio da igualdade previsto no artigo 194º do CIRE, porquanto, e no que toca aos credores privilegiados, prevê apenas para os credores Instituto da Segurança Social e Fazenda Nacional o início imediato do pagamento das prestações mensais, ao contrário dos credores laborais, cujos créditos terão início de pagamento apenas após um longo período de carência; prevê ainda a constituição de garantias patrimoniais (hipotecas voluntárias) a favor dos credores Instituto da Segurança Social e Fazenda Nacional, não prevendo porém a constituição de qualquer garantia patrimonial para os credores laborais, nomeadamente o recorrente; prevê o pagamento de 20% dos juros vencidos e o pagamento da totalidade dos juros vincendos à taxa anual de 2,5% para os credores privilegiados Instituto da Segurança Social e Fazenda Nacional, prevendo ao contrário o perdão total de juros para os credores privilegiados trabalhadores. Contra-alega a Recrdª que há que tratar de forma diferente o que é diferente, sendo que antes do PER tinha a sua situação regularizada perante o Estado e a Segurança Social mercê de acordos de pagamento em prestações que tiveram como condição a constituição de garantias, pelo que o plano veio corroborar tais acordos, que estando previsto um conjunto de alienações que mais não são senão a prossecução do seu objecto social, o produto daí resultante será, a partir da 12ª venda, destinado ao pagamento aos trabalhadores, pelo que, na prática, o plano prevê um pagamento a curto prazo a estes credores e que se não forem feitas as alienações, o privilégio creditório dos trabalhadores está assegurado. Na sentença recorrida concluiu-se que inexiste qualquer violação do princípio da igualdade, porquanto o oferecimento de garantias é inócuo na medida em que o privilégio imobiliário geral, se for detido pelos trabalhadores, prevalece sobre a hipoteca. O que dizer? Os termos em que se mostra concebido o plano de revitalização mostram-se explanados acima, sendo evidente o distinto tratamento dado a esta ordem de créditos. Dispõe-se no Artº 194º/1 do CIRE que o plano de insolvência obedece ao princípio da igualdade dos credores da insolvência, sem prejuízo das diferenciações justificadas por razões objectivas. É, assim, possível, derrogar o princípio que nos ocupa, desde que justificadamente. Uma razão objectiva que pode servir de mote à diferenciação é a classificação dos créditos segundo os critérios enunciados no Artº 47º/4. Contudo, tanto uns, como outros, são privilegiados, não constando do plano qualquer razão justificativa da plausibilidade na diferenciação. Tal como alegado pelo Recrte., o Plano de Recuperação aprovado e homologado nos presentes autos faz distinção entre ambos os grupos de credores ao propor apenas para um dos grupos de credores privilegiados o início imediato do pagamento das prestações mensais, a constituição de garantias patrimoniais e o pagamento dos juros vincendos, enquanto que para o outro grupo de credores privilegiados, os credores laborais, prevê apenas o pagamento dos créditos em prestações mensais, com um ano de carência, sem constituição de qualquer garantia nem pagamento dos juros vincendos. Por outro lado, nada no plano nos elucida acerca da invocada (pela Recrdª) corroboração de acordos já vigentes antes do processo. Bem pelo contrário, o que consta do plano é que a empresa constituirá hipotecas em favor da Segurança Social e da Fazenda Nacional. E nada nos convence de que, na actual situação de crise, as pretendidas alienações patrimoniais se concretizem em prazo que permita antecipar o regime prestacional aos trabalhadores. Não podemos, assim, deixar de concluir que o Plano de Recuperação apresentado e homologado nos presentes autos viola o princípio da igualdade previsto no artigo 194º do CIRE, pelo que, por força do que se dispõe no Artº 215º deve recusar-se a respectiva homologação, já que são não negligenciáveis todas as violações de normas imperativas que acarretem a produção de um resultado que a lei não permite. Termos em que procede a apelação. *** Recurso interposto por J..: A 1ª questão que enunciámos prende-se com a nulidade da sentença, assente na circunstância de terem sido apresentados diversos requerimentos solicitando a não homologação do plano de revitalização, com distintas fundamentações e distintos requerentes, a sentença não se pronunciou sobre o requerimento e os fundamentos invocados pelo recorrente, que contudo não ficaram prejudicados e eram distintos dos apreciados. Compaginada a sentença de homologação, é certo que nada se diz acerca de algum requerimento da autoria do ora Recrte.. Por outro lado, em presença do plano de recuperação, o ora Recrte. explicitamente requereu a recusa de homologação daquele, alegando aquilo que no relatório acima exarado se dá conta. Sobre as questões atinentes ao voto da C.. foi proferida decisão, constante de fls. 954. Não mereceram, assim, pronúncia as demais questões suscitadas pelo ora Recrte., pelo que, quanto a essas, não resta senão concluir pela nulidade da sentença por omissão de pronúncia, porquanto o juiz deve conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido á sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (Artº 660º/2 e 668º/1-d) do CPC). Ora, as distintas questões abordadas na sentença não prejudicam o conhecimento daquelas que foram suscitadas pelo ora apelante, razão pela qual a questão que nos ocupa merece procedência parcial. Detenhamo-nos, agora, sobre a 2ª questão, que se desdobra em várias sub-questões: o plano não pode ser homologado por: a) a credora largamente maioritária, C.., ter feito votar e aprovar um plano em que os seus créditos se mantinham inalterados quando comparadas com a situação pré-existente; b) a homologação do plano de reestruturação que expressamente aprovou a “dação em pagamento” de 24 dos 60 apartamentos que constituem os únicos bens da devedora a credor que nunca tinha sido registado na contabilidade da devedora como credor; a quem nunca tinha reclamado qualquer crédito, constitui um sancionar de um crime de favorecimento de credores; c) a homologação do plano aprovado pelos credores, sendo decisão judicial, implica uma apreciação de que os objectivos pretendidos pelo legislador não são violados; c) o plano aprovado pelos credores e homologado ao dispor sobre o efeito possível de decisões judiciais futuras, ao contemplar que quaisquer créditos que venham a ser reconhecidos em acções judiciais a favor de terceiros, apenas poderão ser pagos nas condições aprovadas para os credores actuais, é ilegal por violador dos artigos 16º, 17º e 19º da Lei Orgânica dos Tribunais, 205º e 206 da CRP? Nas palavras de Catarina Serra, “o PER é um processo pré-insolvencial, cuja maior vantagem é a possibilidade de o devedor obter um plano de recuperação sem ser declarado insolvente” e através do qual se reserva aos credores um papel fundamental – o de “consentirem (pelo menos momentaneamente) no sacrifício dos seus direitos para viabilizarem o PER ou, então, manterem-se irredutíveis” (Processo Especial de Revitalização, Revista da Ordem dos Advogados, Ano 72, II/III, 716). Concluídas as negociações, o plano carece, ainda, de homologação judicial (Artº 17ºF/1 e 2 do CIRE), homologação esta destinada a aferir também da conformidade legal das medidas aprovadas. Á homologação ou não homologação do plano aplicam-se, com as necessárias adaptações, as regras previstas no Titulo IX, em especial nos Artº 215º e 216º do CIRE (Artº 17ºF/5). Dispõe-se no Artº 215º, no que para aqui releva, que o juiz recusa oficiosamente a homologação do plano aprovado no caso de violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo. Por outro lado, e de acordo com o disposto no Artº 216º/1, a homologação deve recusar-se também quando, a pedido de algum credor, se demonstre em ternos plausíveis, que a sua situação ao abrigo do plano é previsivelmente menos favorável do que a que interviria na ausência dele ou que o plano proporciona a algum credor um valor económico superior ao montante nominal dos seus créditos acrescido do valor das eventuais contribuições que ele deva prestar. Compulsados os fundamentos invocados nesta sede pelo Recrte. não vemos como enquadrá-los á luz das disposições citadas, e nem o mesmo invoca, a propósito de cada um daqueles argumentos qual a norma especialmente violada. Não deixaremos, porém, ainda de referir que não vemos que a lei condicione a legalidade do plano à alteração do montante ou condições dos créditos. E, quanto à circunstância de, alegadamente, existir um credor que nunca tinha sido registado na contabilidade da devedora como tal, trata-se de questão a decidir em sede do incidente de impugnação da lista provisória de créditos previsto no Artº 17ºD/3 do CIRE (que, aliás, teve lugar). Termos em que, improcede a questão que nos ocupa. Resta a 3ª questão: o presente processo de revitalização, concebido para permitir a sobrevivência e a recuperação de empresas viáveis e socialmente interessantes, foi desvirtuado na sua finalidade e, ilicitamente, usado para impedir uma liquidação geral em benefício de todos os credores, mas sim para o benefício de um único credor, a C..? Sobre esta temática o Recrte. não alega senão aquilo que traduziu a formulação da questão. Parece daqui decorrer que um credor ficará altamente beneficiado se em comparação com os demais. Ocorre, contudo, conforme evidencia o plano, que o crédito da C.. já estava previamente coberto por garantias, que, com o plano, se mantiveram, tendo-se procedido a reestruturação de um dos créditos – conversão em crédito de médio e longo prazo – e redução de comissões de gestão em ambos. Por outro lado, importa ter presente, que o PER se destina a permitir ao devedor, comprovadamente em situação económica difícil ou em iminente insolvência, o estabelecimento de negociações de forma a concluir um acordo conducente à revitalização. E, conforme acima dissemos, a liquidação do património do insolvente não é a primeira opção. A primazia que efectivamente existe é a da vontade dos credores, enquanto titulares do principal interesse que o direito concursal visa acautelar: o pagamento dos créditos. Ora, sendo o PER um processo pré-insolvencial, o que dele se espera é que, com o sacrifício também dos credores, se venha a conseguir a viabilização da empresa através de um esforço suplementar. Assim, desde que não evidenciada uma situação de discriminação de credores, não há como concluir pela alegada desvirtude do presente plano no que a esta concreta questão respeita. Não será demais lembrar que, tal como consta do plano em análise, “desde 2005 que a única obra que a empresa tem em curso é a denominada Torre Eurolimpica, um edifício habitacional com 60 fracções e cujo investimento total ascende já a oito milhões de euros”, obra que está “em fase final”, mas que, dada a asfixia da empresa, se teme “que as responsabilidades entretanto vencidas impeçam” a realização do seu investimento, sendo que “mais de 75% do passivo exigível refere-se às dívidas ao Estado, Segurança Social e Banca”. Percebe-se, pois, no contexto assinalado, o recurso ao presente processo como forma de solvência dos compromissos assumidos com manutenção da empresa no circuito comercial. Improcede, deste modo, também esta questão. *** Em conformidade com o exposto, acorda-se em: a) julgar a apelação interposta por A.., procedente e, em consequência, revogar a decisão recorrida; b) julgar a apelação interposta por J.. improcedente, declarando-se, embora, parcialmente nula a sentença. Custas, em ambos os casos, pela devedora. Notifique. Manuela Fialho Edgar Valente Paulo Barreto