Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães Mediante participação da Autoridade para as Condições do Trabalho relativo a B., o Ministério Público, formulando pretensão em conformidade, intentou acção declarativa especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho contra Massa Insolvente da Casa de Saúde C., SA. Alegou, no essencial: a existência de um contrato de trabalho, na medida em que, nomeadamente, a referida B., enfermeira, desde Junho de 2011 presta as suas funções nas instalações da R e utiliza os seus instrumentos de trabalho, tem um horário pré-definido, controle das horas de início e termo da prestação de serviço, recebido formação de integração e recebe ordens e instruções da beneficiária da prestação de trabalho. A R contestou alegando, em súmula: a acção deveria ser intentada e correr por apenso ao seu processo de insolvência (3576/14.1T8 GMR), uma vez que decisão poderá alterar o montante total das dívidas da massa e consequentemente a diminuição das garantias dos credores da massa insolvente; havia incompetência material do tribunal; e no sentido de impugnar os factos alegados pelo MºPº, estando-se perante um contrato de prestação de serviços. Foi cumprido o disposto no artº 186º-L, nº 4, do CPT. Efetuado julgamento, onde se respondeu à matéria de fato, foi elaborada sentença, pela qual se julgou improcedente a invocada incompetência material do tribunal e com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julga-se a acção procedente por provada e, e consequência, reconhece-se que a relação contratual que existe desde Junho de 2011 entre a R.“ Casa de Saúde C., SA”(declarada insolvente) e a trabalhadora B., consiste num contrato de trabalho enquadrável no conceito definido no artº 12º do C. do Trabalho”. A R recorreu e concluiu: 1) A R. veio na contestação invocar a excepção da incompetência absoluta do tribunal em razão da matéria, com o fundamento que a presente acção deveria ser intentada e correr por apenso ao Processo de insolvência nº 3576/14. 1 T8 GMR, uma vez que decisão poderá alterar o montante total das dívidas da massa e consequentemente a diminuição das garantias dos credores da massa insolvente. 2) A acção intentada pelo MP deu entrada após trânsito da sentença que decretou a insolvência da Casa de Saúde C.. 3) Daí que qualquer consequência emergente desse reconhecimento de existência contrato de trabalho projectar-se-á, já não sobre o insolvente, mas sim SOBRE a massa insolvente. 4) Estamos, assim, em pleno âmbito de aplicação das conjugadas normas dos artigos 51.º e 55.º do CIRE, pelo que a acção (ou procedimento cautelar) que seja susceptível de onerar a massa insolvente deve correr por apenso ao respectivo processo, conforme imposto pelo artigo 89.º, n.º 2, do CIRE, sendo a competência para o seu conhecimento e tramitação, por necessário, cometida ao Tribunal do Comércio, ao abrigo do disposto no artigo 89.º, n.º 2, da LOFTJ. 5) “Destarte, não é propriamente por o preceito aludir a dívidas da massa insolvente que se devem excluir do seu âmbito de aplicação acções que, não tendo na sua base, imediata ou directamente, dívidas de natureza pecuniária, têm, contudo, a virtualidade de virem a afectar, por via reflexa, a massa insolvente, o que reclama a competência dos tribunais do comércio para o seu conhecimento”. Cfr. Ac. Tribunal da Relação do Porto de 28/10/2015. 6) É da competência do Tribunal de Comércio o conhecimento da acção proposta pelo Ministério Público, tendo em vista o citado artigo 89, n.º 2 do CIRE. 7) Todavia, não se perseguindo este ponto de vista jurídico, sempre se discorda da decisão recorrida no que concerne à factualidade dada como assente, como se diverge do direito para tal matéria, reparado que seja o erro de julgamento que está patente na decisão recorrida. 8) E no que concerne à matéria de facto de que se discorda, na ponderação a concretizar, deve-se atentar como critério de resolução o que se escreveu no acórdão o que se exarou no acórdão do STJ de 21/03/2003, proc. 4324/02, relator Afonso Correia, que refere: “A admissibilidade da respectiva alteração por parte do Tribunal da Relação, mesmo quando exista prova gravada, funcionará assim, apenas, nos casos para os quais não exista qualquer sustentabilidade face à compatibilidade da resposta com a respectiva fundamentação. Assim, por exemplo: a) (…); b) apoiar-se exclusivamente em depoimento(s) de testemunha(s) que não depôs(useram) à matéria em causa ou que teve(tiveram) expressão de sinal contrário daquele que foi considerado como provado;… “. 9) Manifestamente se diverge a Ré dos seguintes factos dados como provados, ou na sua totalidade, ou, então, parcialmente, os seguintes: 6, 10 a 13, 15, 16, 19 e 22. Assim se cumpre o dever de especificação previsto no ordenamento adjectivo. 10) Como se anuncia, do mesmo passo, como decorre da exposição subsequente, quais as provas impositivas, quais aquelas provas que, afinal, suportam a posição jurídica da decorrente e, afinal, revelam o erro de julgamento que importa ultrapassar. 11) No ponto de facto n.º 6 dos factos provados - “sem nunca ter sido celebrado contrato de trabalho nem contrato de prestação de serviços entre a trabalhadora e a beneficiária “ – sendo manifesta a sua imprecisão, deverá ser acrescentado “por escrito”, dando-se, assim, como provado o seguinte: “sem nunca ter sido celebrado, por escrito, contrato de trabalho nem contrato de prestação de serviços entre a trabalhadora e a beneficiária”. 12) Por outro lado, reconhecendo-se que as testemunhas relevantes para a definição da factualidade em apreciação são, exclusivamente, as duas inspectoras do ACT e a testemunha Teresa, deve dizer-se que nem aquelas nem esta - a então enfermeira – chefe da Ré, não dá qualquer cobertura ao que ficou a constar dos factos 10 a 13, que agora especificamente se impugnam. Ouvido o depoimento prestado pela testemunha Teresa prestado na audiência de julgamento de 23/11/2015, entre as 15:26:29 e as 15:51:16 (cfr. gravação n.º 20151123152629_4982779_2870538), há factos dados como provados que ela não acolheu, pois pela mesma foi dito que: “TERESA: Pronto, nós sendo um hospital privado e passando por diversas dificuldades que fomos passando neste último tempo os horários era... havia diminuição do trabalho ou aumento do trabalho e muito imprevisível, o que é verdade hoje é mentira amanhã, posso não ter cirurgia nenhuma não é? E de repente aparece-me uma cirurgia, acciona todo uma equipa não só de enfermeiros, como anestesistas, médicos, etc.. Pronto. Como é que eu faço isso? É sempre muito complicado, em cima do joelho, dada a nossa instabilidade profissional neste momento no hospital, eu faço um horário que muda todos os dias e todas as semanas, começo por um horário com os enfermeiros que temos com contrato de trabalho, esses têm de ter ao final do mês as horas... MANDATÁRIO R.: Primeiro preenche com os enfermeiros contratados? TERESA: Contratados. MANDATÁRIO R.: Muito bem. TERESA: Para assegurar que o horário deles é cumprido e será pago para não ficarem com banco de horas, ou positivas ou negativas, para que cumpram as horas do mês, a seguir eu tenho vários enfermeiros a prestação de serviços, a equipa é muito grande...MANDATÁRIO R.: Mas como é que sabe a disponibilidade deles? TERESA: Eles põem no computador todos os meses, no computador deles no registo de enfermagem, eles põem a disponibilidade, cada um deles chega lá e põe disponibilidade, pronto, eu uso essa disponibilidade deles para ir completando (corte na gravação) MANDATÁRIO R.: (imperceptível) como quisesse, não são vocês que determinam o período de férias da enfermeira certo? TERESA: Sim. Não, não somos nós, eu às vezes pedia era... solicitava os colegas, aos prestadores para tentarem não irem todos ao mesmo tempo de forma a eu ter sempre uma equipe grande para poder chamar (imperceptível).” 13) Pelo que, quanto o ponto 10 dos factos provados deverá ser alterado, devendo ser dado como provado “10 - Está vinculada a observar um horário de trabalho ACORDADO COM A beneficiária da prestação de trabalho”; 14) Excluindo-se dele o segmento “com distribuição de turnos que variam entre as 6 e as 12 horas diárias”, pois nenhuma testemunha, com razão de ciência, mencionou tal distribuição mormente a Teresa. Para além de não haver prova documental que o suporte. 15) A factualidade constante do ponto 11 dos factos provados deverá ser pura e simplesmente excluída, pois que o que decorre do depoimento da mesma testemunha Teresa, e que não foi contraditado fosse por quem fosse, é que ela não disponibilizava à B. uma qualquer escala de serviço; a B. é que numa plataforma digital da Ré publicava, os tempos que tinha disponíveis, segundo as suas conveniências, para lhe prestar os seus serviços de enfermagem (depoimento prestado entre as 15:26:29 e as 15:51:16 na audiência de julgamento de 23/11/2015- cfr. gravação n.º 20151123152629_4982779_2870538): “MANDATÁRIO R.: Mas como é que sabe a disponibilidade deles? TERESA: Eles põem no computador todos os meses, no computador deles no registo de enfermagem, eles põem a disponibilidade, cada um deles chega lá e põe disponibilidade, pronto, eu uso essa disponibilidade deles para ir completando”; a Ré elaborava ESCALAS DE TRABALHO, preenchendo-as primeiramente com os enfermeiros contratados e só depois, consoante as necessidades, ia à plataforma dos prestadores de serviço e vendo as disponibilidades por estes previamente apresentadas é que completava as ESCALAS de serviço. O depoimento da testemunha Teresa (prestado entre as 15:26:29 e as 15:51:16 na audiência de julgamento de 23/11/2015_cfr. gravação n.º 20151123152629_4982779_2870538) é claro quanto a este ponto, - ”(…) começo por um horário com os enfermeiros que temos com contrato de trabalho, esses têm de ter ao final do mês as horas...MANDATÁRIO R.: Primeiro preenche com os enfermeiros contratados? TERESA: Contratados.” - , o que determina que este preciso facto deverá ser redigido seguinte forma: “12- A R. ao elaborar AS ESCALAS dos enfermeiros contratados e prestadores de serviços consulta previamente a respectiva disponibilidade de horário DESTES ÚLTIMOS”. 16) Nenhuma testemunha afirmou que - ponto 13 dos factos provados – os enfermeiros contratados enviavam a sua disponibilidade de horário, nem há prova documental a sustentá-lo, pelo que a redacção do ponto 13, deverá ser “13- Como todos os outros enfermeiros prestadores de serviços, a enfermeira B., no fim de cada mês, enviava a sua disponibilidade horária mensal para prestar serviços à unidade da Ré”. 17) No que concerne ao ponto 15, não é possível encontrar na prova produzida – as ditas testemunhas - qualquer correspondência com que nele se fez constar, na sua parte final, o segmento (“o motivo da sua ausência”). Para justificar o erro de julgamento, bastará considerar o depoimento prestado pela testemunha MARTA, inspectora do ACT de Guimarães, na audiência de julgamento de 23/11/2015, entre as 14:33:15 e as 15:03:55 (cfr. gravação n.º 20151123143314_4982779_2870538), e que responde da seguinte forma “O que me foi referido por ambas as pares foi que quando a trabalhadora tinha que faltar ela própria arranjaria alguém para a substituir de dentro, dos colegas enfermeiros ...”, pelo que deverá neste dele se deve retirar a menção: … “o motivo da sua ausência”, devendo, eventualmente, substituir-se esta por “que não arranjou substituição”. 18) O ponto de facto com o n.º 16 dos factos provados, deve ser pura e simplesmente excluída a referência “ habitualmente ao dia 8 ou 9 do mês seguinte, por transferência bancária, obrigatoriamente para a conta bancária daquela”, pois não há qualquer testemunha que referencie o modo de pagamento, nem existe qualquer prova documental que sustente tal referencia, ou seja, inexiste sustentabilidade na prova produzida. 19) E de acordo com esta, não ficou demonstrado - ponto 22 dos factos provados - que a Autora recebesse quaisquer ordens ou instruções que extravasem as componentes técnicas - sujeitas a protocolos oficiais, administrativas e de mera organização dos serviços do hospital. Releva aqui, uma vez mais, exclusivamente, o que a testemunha Teresa asseverou, no seu depoimento prestado entre as 15:26:29 e as 15:51:16 na audiência de julgamento de 23/11/2015 (cfr. gravação n.º 20151123152629_4982779_2870538): “PROCURADOR ADJUNTO: Quem é que define lá dentro o serviço que por exemplo a enfermeira B. ia fazer? Ela chegava lá dentro, enfiava a bata e dizia “Vou tratar aqui o Zé Manel. Amanhã vou tratar o António Manuel.”? TERESA: O serviço de enfermagem...”; para a Ré, apenas interessava o resultado da actividade de enfermagem que a enfermeira B. desenvolvia, pelo que o ponto factual em causa deverá assumir a seguinte redacção, como postulado pela prova produzida, obviamente impositiva, “A enfermeira B., no exercício a sua actividade de enfermagem, recebe ordens e instruções da beneficiária da prestação de trabalho, que lhe são dadas através daquela enfermeira-chefe, sendo esta que define qual o serviço onde aquela trabalhadora deve trabalhar e quais os utentes que tem que acompanhar e vigiar.” 20) Inexiste prova testemunhal, ou outra, que dê guarida ao que se deu especificamente como provado no ponto 19 dos factos provados, que o trabalho desenvolvido pela enfermeira B., como enfermeira, para a Ré, constituísse “ a sua fonte principal de subsistência”, pois que, apesar de ser matéria conclusiva, ignorou-se na decisão recorrida, completamente, a documentação da Segurança Social e da Autoridade Tributária que se encontra junta aos autos (Cfr. docs. 83 a 94) na sequência de petitório efectuado pela Ré com tal alcance e que demonstra, precisamente, o contrário, ou seja, que prestava serviços a outras entidades, às quais emitia os respectivos recibos de quitação, pelo que de tal ponto deverá ser retirada, sem mais, o dito segmento – “a sua fonte principal de subsistência”. 21) E porque alegado pelo Ministério Público, ou seja, porque este afirmou que o serviço prestado pela enfermeira B. para a Ré era por ela realizado em regime de exclusividade, deverá dar-se expressamente como NÃO PROVADO tal facto, ou seja, NÃO PROVADO que a Cátia Ribeiro exercia as suas funções COM EXCLUSIVIDADE para a Ré, facto fundamentado, sem qualquer dúvida, na dita documentação da Segurança Social e da Autoridade Tributária (Docs. 83 a 94). 22) In casu, foi produzida prova testemunhal e documental nos termos da qual se deverá proceder à modificação da matéria de facto, prova que impõe decisão diversa da que foi dada como provada, nos termos atrás mencionados, acarretando necessariamente uma diferente qualificação jurídica da mesma. 23) Na sentença recorrida, a questão a decidir reconduz-se, no essencial, em determinar se a relação contratual mantida entre a enfermeira B. e a R. consubstancia, ou não, um contrato de trabalho, consignando-se na decisão recorrida “O contrato de trabalho tem como objecto a prestação de uma actividade e como elemento típico e distintivo a subordinação jurídica do trabalhador, traduzida no poder do empregador conformar através de ordens, directivas e instruções, a prestação a que o trabalhador se obrigou. Diferentemente, no contrato de prestação de serviços, o prestador obriga-se à obtenção de um resultado, que efectiva por si, com autonomia, sem subordinação à direcção da outra parte. (…) Com o propósito de determinar a natureza laboral ou liberal de um determinado vínculo jurídico entre uma pessoa singular e uma pessoa singular ou coletiva, radica-se a nossa doutrina e jurisprudência, essencialmente, na existência ou não de subordinação jurídica (…) Sendo a subordinação definida (pelo art.º 11º CT) por referência à «autoridade e direcção» do empregador, ou construída (pela doutrina) como um estado de heterodeterminação em que o prestador de trabalho se coloca, nem assim fica o julgador munido de instrumentos suficientes e seguros para a qualificação dos casos concretos. (…)”. 24) Para se decidir pela existência de um contrato de trabalho, já não de prestação de serviços, o tribunal recorrido apoiou-se em “indícios de subordinação” justamente elencados por Maria do Rosário Palma Ramalho na obra “Direito do Trabalho”, 3ª Edição, Almedina, págs. 41 a 44., tendo chegado à conclusão que dos 10 indícios listados pela referida autora na referida obra, perante a matéria de facto que deu como assente, estariam presentes apenas três deles: “(…) as funções da enfermeira B. são exercidas no local propriedade do beneficiário do trabalho/Ré ou em local por ela indicado, os instrumentos de trabalho pertencem à mesma e a mesma enfermeira observa horas de início e de termo da prestação, determinadas pela R..”, todavia não recolhem mínimo fundamento na factualidade dada como assente, como acima exposto. 25) Em relação ao primeiro indicio que se diz estar presente - as funções da enfermeira B. são exercidas no local propriedade do beneficiário do trabalho/Ré ou em local por ela indicado – o mesmo não denuncia a existência de um contrato de trabalho, diferenciando-o de um contrato de prestação de serviços. O local onde se exerce esta concreta actividade é aqui de todo inócuo para a distinção que se pretende firmar. 26) O segundo expresso indício – “os instrumentos de trabalho pertencem à mesma” – afinal também não funciona, no caso, como elemento distintivo para a demarcação de um ou outro contrato, porquanto estando em causa o exercício de funções de enfermagem num hospital, e como se deu até por provado nos pontos 23 e 24, e como até decorre de norma legal, “No estrito cumprimento desta norma, todos os profissionais independentemente do vínculo laboral, recebem formação, utilizam os equipamentos, materiais, consumíveis e vestuário fornecido pela Ré”. 27) Em relação ao terceiro indício – “a mesma enfermeira observa horas de início e de termo da prestação, determinadas pela Ré” - tal indício afinal, também, é de todo inócuo na economia que está em apreciação pois que nos contratos em disputa haverá sempre início e fim do serviço prestado. 28) Da factualidade supra descrita, que se entende dever dar-se como provada, resulta demonstrado, inexistirem indícios da existência de um contrato de trabalho firmado pela Ré com a dita enfermeira. 29) O Tribunal a quo errou na fixação de certa matéria de facto acima mencionada, pelo que a mesma deverá ser modificada nos termos supra expostos. 30) Em resultado dessa modificação, verifica-se inexistirem dois dos elementos factuais essenciais constitutivos do contrato de trabalho: por um lado a subordinação económica e por outro, a subordinação jurídica. Se, na verdade a enfermeira B. recebeu da Ré retribuição, certo é que na prestação da sua actividade ela não esteve sob as ordens, direcção e fiscalização do dador do trabalho. 31) A casuística que a ponderação deve invocar, obriga a apelar, expressamente a uma decisão jurisprudencial que atentou num caso igual ao que agora nos preocupa e que se passou em estabelecimento de saúde da cidade de BRAGA – nos factos e no direito, e que ficou a constar do Acórdão do STJ de 09/12/2010, proc.1155/07.9TTBRG.P1.S1, onde se consignou: “Atendendo à natureza e conteúdo das funções compreendidas na profissão de enfermeiro, não são suficientes para se concluir pela existência de subordinação jurídica, a obrigatoriedade de cumprimento de protocolos; o pagamento mensal das retribuições calculadas com base nas horas de trabalho efectivamente prestadas; a vinculação a um horário pré-definido; o facto de o local de trabalho se situar nas instalações da Ré e o fornecimento de uniformes e instrumentos de trabalho por parte da Ré, tanto mais quando está, também, demonstrado que as Autoras não prestavam a sua actividade em regime de exclusividade; que o horário de trabalho na Ré era fixado, por acordo, atendendo às conveniências das Autoras; que, as mesmas, nas suas faltas, tinham a possibilidade de se fazerem substituir, na prestação, por outra pessoa, com a única consequência de não lhes ser pagas as horas em que não tivessem prestado serviço. Na apreciação global de todos estes indícios, não pode inferir-se a possibilidade de, no seu âmbito, a Ré exercer efectivos poderes de direcção e autoridade e, menos ainda, o poder disciplinar sobre as Autoras, não estando, assim, demonstrados factos bastantes para caracterizar, com segurança, a subordinação jurídica e, pois, para conferir às relações contratuais entre elas estabelecidas, natureza laboral.” 32) Tal como acertadamente se decidiu neste aresto, em causa, que, repete-se, com factualidade quase decalcada da que agora se possui – nos serviços de enfermagem prestados pela B. como enfermeira, à Ré recorrente, não está presente um contrato de trabalho. Está antes um contrato de prestação de serviço pois que não se provou a existência de uma subordinação jurídica, já que à Ré apenas interessava o resultado da actividade desenvolvida pela mencionada enfermeira. 33) O autor, o Ministério Público, não provou a existência de um contrato de trabalho entre a Ré e a dita enfermeira B.. Como até se escreveu no mencionado acórdão do STJ “O ónus da prova dos factos constitutivo do contrato de trabalho, nomeadamente da subordinação jurídica ou dos que possam apontar no sentido da existência de um tal contrato, compete ao Autor, nos termos do disposto no artigo 342, n.º1 do Código Civil”. 34) A sentença recorrida viola, entre outras, as normas dos artigos 89.º, n.º 2, do CIRE, 89.º, n.º 2, da LOFTJ e 11º Código de Trabalho. Termina pretendendo que seja dado provimento ao recurso, “decretando-se ou a incompetência absoluta do Tribunal de Trabalho para decidir a questão, ou então, caso assim não se entenda, a alteração da decisão recorrida na matéria de facto especificadamente impugnada, nos termos acima indicados e determinar-se a revogação da sentença recorrida com a declaração de inexistência de um contrato de trabalho entre a enfermeira B. e a Ré”. O A contra-alegou sem que formulasse formalmente conclusões. Termina pretendendo a improcedência da acção. Efectuado o exame preliminar e corridos os vistos legais, cumpre decidir. As questões a apreciar revertem sucessivamente, sem prejuízo das conclusões do recurso e das que se encontrem prejudicadas pelo conhecimento anterior de outras, para a admissibilidade da impugnação da decisão sobre a matéria de fato, a intempestividade do recurso, a incompetência em razão da matéria, essa impugnação e a inexistência de contrato de trabalho. Os factos considerados assentes na sentença são: “1 - A “Casa de Saúde C., S.A.” tem como objecto o exercício de medicina e cirurgia. 2 - Por sentença transitada em julgado em 10.3.2015, proferida no processo nº 3576/14.1 T8GMR da 1ª Secção de Comércio de Guimarães, foi declarada insolvente. 3 - A massa insolvente da Casa de Saúde C. é detentora do Hospital Privado de …, que presta serviços de saúde em regime de ambulatório, internamento e urgência. 4- Este estabelecimento de saúde, para, além do quadro de contratados de enfermagem, em função dos picos de actividade existentes, recorre a prestadores de serviços externos na área de enfermagem. 5- Na sequência da acção inspectiva desenvolvida no dia 20 de Julho de 2015 nas instalações dos serviços que “Casa de Saúde C.” possui na AMl-Hospital Privado de…, sito na …, pela Autoridade para as Condições de Trabalho - Centro Local do…, a inspectora do trabalho, Marta verificou que aquela tinha ao seu serviço, naquelas instalações, a prestar a sua actividade de enfermeira, a trabalhadora B., residente em …. 6- A enfermeira B. iniciou em Junho de 2011 a prestação de actividade ao serviço da “Casa de Saúde C.”, sem nunca ter sido celebrado contrato de trabalho nem contrato de prestação de serviços entre a trabalhadora e a beneficiária. 7- A enfermeira B. está ao serviço da R., exercendo funções de enfermeira, que, consistem, essencialmente, em serviços de enfermagem. 8- Exerce essas funções nas instalações da beneficiária da prestação de trabalho, ou em local por ela determinado, utiliza os equipamentos e instrumentos de trabalho pertencentes àquela, que assim os disponibiliza, nomeadamente, mobiliário, todo o material inerente à actividade própria de um enfermeiro(a) como seja o material de higiene e desinfecção, equipamentos hospitalares, material de emergência, descartáveis/consumíveis e material de protecção. 9- Aquando da acção inspectiva a enfermeira B., como habitualmente, trajava uma bata branca fornecida pela beneficiária da prestação de trabalho, bata essa identificada com a inscrição AMI, igual a todos os restantes enfermeiros que aí prestam a sua actividade, estejam eles qualificados como trabalhadores independentes ou como trabalhadores por conta de outrem. 10 - Está vinculada a observar um horário de trabalho determinado pela beneficiária da prestação de trabalho, com horas de início e de termo de cada dia de trabalho, obedecendo a uma escala de serviço definida e elaborada pela enfermeira-chefe Teresa, com distribuição de turnos que variam entre as 6 e as 12 horas diárias. 11 - Essa escala de serviço é disponibilizada, em regra, à enfermeira B. no final do mês anterior. 12- A R. ao elaborar os horários dos enfermeiros contratados e prestadores de serviços consulta previamente a respectiva disponibilidade de horário de ambos. 13- Como todos os outros enfermeiros contratados e prestadores de serviços a enfermeira B., no fim de cada mês, enviava a sua disponibilidade horária mensal para prestar serviços à unidade da Ré. 14 - As horas de início e termo de prestação de serviço são controladas pela beneficiária da prestação de trabalho através de um sistema de picagens do registo das suas entradas e saídas, utilizado por todos os trabalhadores que prestam a mesma actividade naquele local, estejam eles qualificados como trabalhadores independentes ou como trabalhadores por conta de outrem, no seguimento de instruções da beneficiária. 15 -A enfermeira B., na eventualidade de não poder cumprir a escala de serviço definida pela beneficiária da actividade, deve comunicar à enfermeira-chefe, Teresa, em tempo útil, o motivo da sua ausência. 16- A retribuição auferida pela enfermeira B. é paga mensalmente pela entidade beneficiária do trabalho, habitualmente ao dia 8 ou 9 do mês seguinte, por transferência bancária, obrigatoriamente para a conta bancária daquela. 17 - Em valor variável e à razão de € 7,00/hora de trabalho. 18 - O valor mensal a receber é o resultante do somatório dos tempos de actividade prestada em todos os turnos praticados pela trabalhadora em cada mês, calculados a partir do registo no sistema informático. 19 - O trabalho prestado na R. pela enfermeira B. constitui a sua fonte principal de subsistência e é essencialmente com ele que se sustenta e satisfaz as suas necessidades básicas. 20 - A enfermeira B., tal como os outros enfermeiros, contratados e prestadores de serviços, recebeu formação inicial - formação de integração por parte da entidade empregadora, tendo sido acompanhada durante os primeiros meses por “um colega mais antigo”, não podendo ficar sozinha durante o turno. 21 - Foi sujeita a uma avaliação efectuada pela já referida enfermeira-chefe, Teresa. 22 - A enfermeira B. recebe ordens e instruções da beneficiária da prestação de trabalho, que lhe são dadas através daquela enfermeira-chefe, sendo esta que define qual o serviço onde aquela trabalhadora deve trabalhar e quais os utentes que tem que e acompanhar e vigiar. 23 - A Norma da DGS nº 029/12, obriga que Entidades hospitalares, como o Hospital Privado de …, garantam a existência de sistemas e recursos que facilitam a implementação das precauções básicas do controlo da infecção (PBCI) e a monitorização do seu cumprimento, por todos aqueles que prestam cuidados de saúde, o que também inclui os profissionais das empresas de prestação de serviços. 24 - No estrito cumprimento desta norma, todos os profissionais independentemente do vínculo laboral, recebem formação, utilizam os equipamentos, materiais, consumíveis e vestuário fornecido pela Ré. 25 - Por cada pagamento efectuado pela Ré, a Autora emite a correspondente factura recibo. 26 - A R. nunca pagou à enfermeira B. subsídio de férias e de Natal, nem quaisquer proporcionais correspondentes aos serviços efectuados. 27 - A enfermeira B., efectuava os descontos como trabalhadora independente, junto da Segurança Social. 28- E também desde sempre que junto da Autoridade Tributária abriu actividade como trabalhadora independente, sob o regime da prestação de serviços, tendo-se mantido colectada até à data como profissional liberal. 29 - A enfermeira B. prestava e continua a prestar alguns serviços para outras entidades externas. 30 - No dia 30 de Julho de 2015 a A.C.T. procedeu à notificação da Ré, na pessoa do administrador de insolvência, por carta registada com aviso de recepção, dando-lhe o prazo de dez dias para proceder à regularização da situação da trabalhadora e para fazer prova perante a ACT dessa regularização mediante a apresentação do contrato de trabalho por tempo indeterminado ou de documento comprovativo da existência do mesmo reportado à data do início da relação laboral. 31 - Não foi regularizada a situação nem obtida resposta”. A R pretende impugnar a decisão sobre a matéria de fato. Para o efeito invoca essencialmente prova oral. Embora resulte da ata da audiência de julgamento que a prova oral foi gravada na verdade, compulsados os autos, não logramos verificar que qualquer das partes a tenha requerido ou a Mmº Juíza que a presidiu oficiosamente a tenha ordenado. E a parte meramente descritiva da acta da primeira sessão de que, logo no início, “Após, vieram os presentes prestar depoimento, procedendo-se a gravação fonográfica através do programa informático H@bilus Média Studio, pela ordem seguinte:….” e, no final, que “Por determinação da Mmª. Juiz de Direito e conforme o disposto no nº 5 do artº 155º do Cód. Proc. Civil, revisto pela Lei 41/2013, de 26/06, foram transcritos para a presente ata todos os requerimento, respostas e despachos/decisões proferidos na presente audiência” não colmata qualquer uma dessas omissões e a última citação até é susceptível de confirmar estas. Não tendo sido requerida ou ordenada oficiosamente a gravação da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, e em função do valor da causa e da natureza desta tal era legalmente possível (artºs 68º, nº 2, e 79º do CPT), não poderá ser considerado e valorado por este tribunal ad quem o citado registo-áudio. A tal não obsta o disposto no artº 155º do CPC, que impõe o registo de todos os atos praticados na audiência final, norma que possui carácter geral e que não derrogou e se sobrepôs à norma especial em que consiste o citado artº 68º, designadamente, para fins recursórios. E mesmo no processo civil, não sendo efetuado esse registo e isso consistindo numa nulidade secundária impunha-se a sua arguição no prazo de 10 dias a contar do conhecimento das partes da sua ocorrência (artºs 195º e 199º do NCPC), sob pena de ficar sanada. Logo essa impugnação é ineficaz pela impossibilidade da sua apreciação. E surge a questão principal. Face ao motivo pelo qual a mesma é ineficaz igualmente a recorrente só se poderia utilizar do prazo de 20 dias para interpor o recurso. Já não acrescido de dez dias, nos termos do artº 80º, nºs 1 e 2 do CPT. Com efeito, ab initio não tinha direito à impugnação em causa (António Santos Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 112). A sentença foi notificada aos ilustres mandatários das partes em 11.01.2016, via electrónica (Citius). O prazo de 20 dias para recorrer começou a contar a 15.01.2016; terminou em 03.02.2016, nos termos conjugados dos artºs 132º, nº 1, 137º, nºs 1 e 2, 138º, nºs 1 e 2, 248º do CPC e 26º, nº 1, alª i), do CPT. Contudo o recurso foi interposto via electrónica em 13.02.2016, inclusive como tal para além do momento de se poder praticar o ato independentemente de justo impedimento (nos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo; artº 139º do CPC). Foi pois extemporaneamente deduzido. Nestes termos tem de se concluir que não se deve conhecer do objeto do mesmo, considerando-se extinta a instância. Sumário, da única responsabilidade do relator 1- Não sendo requerida ou ordenada oficiosamente a gravação da prova produzida em audiência de julgamento, nos termos do artº 68º do CPT, não pode ser considerado e valorado pelo tribunal de recurso o registo-áudio efetuado na audiência. 2- Se a impugnação sobre a decisão da matéria de fato é ineficaz pela impossibilidade da sua apreciação e a parte não tendo ab initio esse direito, a mesma só poderia utilizar o prazo de 20 dias para interpor o recurso. Decisão Acordam os Juízes nesta Relação em julgar extemporâneo o recurso e, consequentemente, não devendo ser conhecido o seu objecto consideram extinta a instância. Custas do incidente pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 2 UCs. ***** O acórdão compõe-se de 15 folhas, com os versos não impressos. ****** 30.11.2016 Eduardo Azevedo Vera Sottomayor Antero Veiga
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães Mediante participação da Autoridade para as Condições do Trabalho relativo a B., o Ministério Público, formulando pretensão em conformidade, intentou acção declarativa especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho contra Massa Insolvente da Casa de Saúde C., SA. Alegou, no essencial: a existência de um contrato de trabalho, na medida em que, nomeadamente, a referida B., enfermeira, desde Junho de 2011 presta as suas funções nas instalações da R e utiliza os seus instrumentos de trabalho, tem um horário pré-definido, controle das horas de início e termo da prestação de serviço, recebido formação de integração e recebe ordens e instruções da beneficiária da prestação de trabalho. A R contestou alegando, em súmula: a acção deveria ser intentada e correr por apenso ao seu processo de insolvência (3576/14.1T8 GMR), uma vez que decisão poderá alterar o montante total das dívidas da massa e consequentemente a diminuição das garantias dos credores da massa insolvente; havia incompetência material do tribunal; e no sentido de impugnar os factos alegados pelo MºPº, estando-se perante um contrato de prestação de serviços. Foi cumprido o disposto no artº 186º-L, nº 4, do CPT. Efetuado julgamento, onde se respondeu à matéria de fato, foi elaborada sentença, pela qual se julgou improcedente a invocada incompetência material do tribunal e com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julga-se a acção procedente por provada e, e consequência, reconhece-se que a relação contratual que existe desde Junho de 2011 entre a R.“ Casa de Saúde C., SA”(declarada insolvente) e a trabalhadora B., consiste num contrato de trabalho enquadrável no conceito definido no artº 12º do C. do Trabalho”. A R recorreu e concluiu: 1) A R. veio na contestação invocar a excepção da incompetência absoluta do tribunal em razão da matéria, com o fundamento que a presente acção deveria ser intentada e correr por apenso ao Processo de insolvência nº 3576/14. 1 T8 GMR, uma vez que decisão poderá alterar o montante total das dívidas da massa e consequentemente a diminuição das garantias dos credores da massa insolvente. 2) A acção intentada pelo MP deu entrada após trânsito da sentença que decretou a insolvência da Casa de Saúde C.. 3) Daí que qualquer consequência emergente desse reconhecimento de existência contrato de trabalho projectar-se-á, já não sobre o insolvente, mas sim SOBRE a massa insolvente. 4) Estamos, assim, em pleno âmbito de aplicação das conjugadas normas dos artigos 51.º e 55.º do CIRE, pelo que a acção (ou procedimento cautelar) que seja susceptível de onerar a massa insolvente deve correr por apenso ao respectivo processo, conforme imposto pelo artigo 89.º, n.º 2, do CIRE, sendo a competência para o seu conhecimento e tramitação, por necessário, cometida ao Tribunal do Comércio, ao abrigo do disposto no artigo 89.º, n.º 2, da LOFTJ. 5) “Destarte, não é propriamente por o preceito aludir a dívidas da massa insolvente que se devem excluir do seu âmbito de aplicação acções que, não tendo na sua base, imediata ou directamente, dívidas de natureza pecuniária, têm, contudo, a virtualidade de virem a afectar, por via reflexa, a massa insolvente, o que reclama a competência dos tribunais do comércio para o seu conhecimento”. Cfr. Ac. Tribunal da Relação do Porto de 28/10/2015. 6) É da competência do Tribunal de Comércio o conhecimento da acção proposta pelo Ministério Público, tendo em vista o citado artigo 89, n.º 2 do CIRE. 7) Todavia, não se perseguindo este ponto de vista jurídico, sempre se discorda da decisão recorrida no que concerne à factualidade dada como assente, como se diverge do direito para tal matéria, reparado que seja o erro de julgamento que está patente na decisão recorrida. 8) E no que concerne à matéria de facto de que se discorda, na ponderação a concretizar, deve-se atentar como critério de resolução o que se escreveu no acórdão o que se exarou no acórdão do STJ de 21/03/2003, proc. 4324/02, relator Afonso Correia, que refere: “A admissibilidade da respectiva alteração por parte do Tribunal da Relação, mesmo quando exista prova gravada, funcionará assim, apenas, nos casos para os quais não exista qualquer sustentabilidade face à compatibilidade da resposta com a respectiva fundamentação. Assim, por exemplo: a) (…); b) apoiar-se exclusivamente em depoimento(s) de testemunha(s) que não depôs(useram) à matéria em causa ou que teve(tiveram) expressão de sinal contrário daquele que foi considerado como provado;… “. 9) Manifestamente se diverge a Ré dos seguintes factos dados como provados, ou na sua totalidade, ou, então, parcialmente, os seguintes: 6, 10 a 13, 15, 16, 19 e 22. Assim se cumpre o dever de especificação previsto no ordenamento adjectivo. 10) Como se anuncia, do mesmo passo, como decorre da exposição subsequente, quais as provas impositivas, quais aquelas provas que, afinal, suportam a posição jurídica da decorrente e, afinal, revelam o erro de julgamento que importa ultrapassar. 11) No ponto de facto n.º 6 dos factos provados - “sem nunca ter sido celebrado contrato de trabalho nem contrato de prestação de serviços entre a trabalhadora e a beneficiária “ – sendo manifesta a sua imprecisão, deverá ser acrescentado “por escrito”, dando-se, assim, como provado o seguinte: “sem nunca ter sido celebrado, por escrito, contrato de trabalho nem contrato de prestação de serviços entre a trabalhadora e a beneficiária”. 12) Por outro lado, reconhecendo-se que as testemunhas relevantes para a definição da factualidade em apreciação são, exclusivamente, as duas inspectoras do ACT e a testemunha Teresa, deve dizer-se que nem aquelas nem esta - a então enfermeira – chefe da Ré, não dá qualquer cobertura ao que ficou a constar dos factos 10 a 13, que agora especificamente se impugnam. Ouvido o depoimento prestado pela testemunha Teresa prestado na audiência de julgamento de 23/11/2015, entre as 15:26:29 e as 15:51:16 (cfr. gravação n.º 20151123152629_4982779_2870538), há factos dados como provados que ela não acolheu, pois pela mesma foi dito que: “TERESA: Pronto, nós sendo um hospital privado e passando por diversas dificuldades que fomos passando neste último tempo os horários era... havia diminuição do trabalho ou aumento do trabalho e muito imprevisível, o que é verdade hoje é mentira amanhã, posso não ter cirurgia nenhuma não é? E de repente aparece-me uma cirurgia, acciona todo uma equipa não só de enfermeiros, como anestesistas, médicos, etc.. Pronto. Como é que eu faço isso? É sempre muito complicado, em cima do joelho, dada a nossa instabilidade profissional neste momento no hospital, eu faço um horário que muda todos os dias e todas as semanas, começo por um horário com os enfermeiros que temos com contrato de trabalho, esses têm de ter ao final do mês as horas... MANDATÁRIO R.: Primeiro preenche com os enfermeiros contratados? TERESA: Contratados. MANDATÁRIO R.: Muito bem. TERESA: Para assegurar que o horário deles é cumprido e será pago para não ficarem com banco de horas, ou positivas ou negativas, para que cumpram as horas do mês, a seguir eu tenho vários enfermeiros a prestação de serviços, a equipa é muito grande...MANDATÁRIO R.: Mas como é que sabe a disponibilidade deles? TERESA: Eles põem no computador todos os meses, no computador deles no registo de enfermagem, eles põem a disponibilidade, cada um deles chega lá e põe disponibilidade, pronto, eu uso essa disponibilidade deles para ir completando (corte na gravação) MANDATÁRIO R.: (imperceptível) como quisesse, não são vocês que determinam o período de férias da enfermeira certo? TERESA: Sim. Não, não somos nós, eu às vezes pedia era... solicitava os colegas, aos prestadores para tentarem não irem todos ao mesmo tempo de forma a eu ter sempre uma equipe grande para poder chamar (imperceptível).” 13) Pelo que, quanto o ponto 10 dos factos provados deverá ser alterado, devendo ser dado como provado “10 - Está vinculada a observar um horário de trabalho ACORDADO COM A beneficiária da prestação de trabalho”; 14) Excluindo-se dele o segmento “com distribuição de turnos que variam entre as 6 e as 12 horas diárias”, pois nenhuma testemunha, com razão de ciência, mencionou tal distribuição mormente a Teresa. Para além de não haver prova documental que o suporte. 15) A factualidade constante do ponto 11 dos factos provados deverá ser pura e simplesmente excluída, pois que o que decorre do depoimento da mesma testemunha Teresa, e que não foi contraditado fosse por quem fosse, é que ela não disponibilizava à B. uma qualquer escala de serviço; a B. é que numa plataforma digital da Ré publicava, os tempos que tinha disponíveis, segundo as suas conveniências, para lhe prestar os seus serviços de enfermagem (depoimento prestado entre as 15:26:29 e as 15:51:16 na audiência de julgamento de 23/11/2015- cfr. gravação n.º 20151123152629_4982779_2870538): “MANDATÁRIO R.: Mas como é que sabe a disponibilidade deles? TERESA: Eles põem no computador todos os meses, no computador deles no registo de enfermagem, eles põem a disponibilidade, cada um deles chega lá e põe disponibilidade, pronto, eu uso essa disponibilidade deles para ir completando”; a Ré elaborava ESCALAS DE TRABALHO, preenchendo-as primeiramente com os enfermeiros contratados e só depois, consoante as necessidades, ia à plataforma dos prestadores de serviço e vendo as disponibilidades por estes previamente apresentadas é que completava as ESCALAS de serviço. O depoimento da testemunha Teresa (prestado entre as 15:26:29 e as 15:51:16 na audiência de julgamento de 23/11/2015_cfr. gravação n.º 20151123152629_4982779_2870538) é claro quanto a este ponto, - ”(…) começo por um horário com os enfermeiros que temos com contrato de trabalho, esses têm de ter ao final do mês as horas...MANDATÁRIO R.: Primeiro preenche com os enfermeiros contratados? TERESA: Contratados.” - , o que determina que este preciso facto deverá ser redigido seguinte forma: “12- A R. ao elaborar AS ESCALAS dos enfermeiros contratados e prestadores de serviços consulta previamente a respectiva disponibilidade de horário DESTES ÚLTIMOS”. 16) Nenhuma testemunha afirmou que - ponto 13 dos factos provados – os enfermeiros contratados enviavam a sua disponibilidade de horário, nem há prova documental a sustentá-lo, pelo que a redacção do ponto 13, deverá ser “13- Como todos os outros enfermeiros prestadores de serviços, a enfermeira B., no fim de cada mês, enviava a sua disponibilidade horária mensal para prestar serviços à unidade da Ré”. 17) No que concerne ao ponto 15, não é possível encontrar na prova produzida – as ditas testemunhas - qualquer correspondência com que nele se fez constar, na sua parte final, o segmento (“o motivo da sua ausência”). Para justificar o erro de julgamento, bastará considerar o depoimento prestado pela testemunha MARTA, inspectora do ACT de Guimarães, na audiência de julgamento de 23/11/2015, entre as 14:33:15 e as 15:03:55 (cfr. gravação n.º 20151123143314_4982779_2870538), e que responde da seguinte forma “O que me foi referido por ambas as pares foi que quando a trabalhadora tinha que faltar ela própria arranjaria alguém para a substituir de dentro, dos colegas enfermeiros ...”, pelo que deverá neste dele se deve retirar a menção: … “o motivo da sua ausência”, devendo, eventualmente, substituir-se esta por “que não arranjou substituição”. 18) O ponto de facto com o n.º 16 dos factos provados, deve ser pura e simplesmente excluída a referência “ habitualmente ao dia 8 ou 9 do mês seguinte, por transferência bancária, obrigatoriamente para a conta bancária daquela”, pois não há qualquer testemunha que referencie o modo de pagamento, nem existe qualquer prova documental que sustente tal referencia, ou seja, inexiste sustentabilidade na prova produzida. 19) E de acordo com esta, não ficou demonstrado - ponto 22 dos factos provados - que a Autora recebesse quaisquer ordens ou instruções que extravasem as componentes técnicas - sujeitas a protocolos oficiais, administrativas e de mera organização dos serviços do hospital. Releva aqui, uma vez mais, exclusivamente, o que a testemunha Teresa asseverou, no seu depoimento prestado entre as 15:26:29 e as 15:51:16 na audiência de julgamento de 23/11/2015 (cfr. gravação n.º 20151123152629_4982779_2870538): “PROCURADOR ADJUNTO: Quem é que define lá dentro o serviço que por exemplo a enfermeira B. ia fazer? Ela chegava lá dentro, enfiava a bata e dizia “Vou tratar aqui o Zé Manel. Amanhã vou tratar o António Manuel.”? TERESA: O serviço de enfermagem...”; para a Ré, apenas interessava o resultado da actividade de enfermagem que a enfermeira B. desenvolvia, pelo que o ponto factual em causa deverá assumir a seguinte redacção, como postulado pela prova produzida, obviamente impositiva, “A enfermeira B., no exercício a sua actividade de enfermagem, recebe ordens e instruções da beneficiária da prestação de trabalho, que lhe são dadas através daquela enfermeira-chefe, sendo esta que define qual o serviço onde aquela trabalhadora deve trabalhar e quais os utentes que tem que acompanhar e vigiar.” 20) Inexiste prova testemunhal, ou outra, que dê guarida ao que se deu especificamente como provado no ponto 19 dos factos provados, que o trabalho desenvolvido pela enfermeira B., como enfermeira, para a Ré, constituísse “ a sua fonte principal de subsistência”, pois que, apesar de ser matéria conclusiva, ignorou-se na decisão recorrida, completamente, a documentação da Segurança Social e da Autoridade Tributária que se encontra junta aos autos (Cfr. docs. 83 a 94) na sequência de petitório efectuado pela Ré com tal alcance e que demonstra, precisamente, o contrário, ou seja, que prestava serviços a outras entidades, às quais emitia os respectivos recibos de quitação, pelo que de tal ponto deverá ser retirada, sem mais, o dito segmento – “a sua fonte principal de subsistência”. 21) E porque alegado pelo Ministério Público, ou seja, porque este afirmou que o serviço prestado pela enfermeira B. para a Ré era por ela realizado em regime de exclusividade, deverá dar-se expressamente como NÃO PROVADO tal facto, ou seja, NÃO PROVADO que a Cátia Ribeiro exercia as suas funções COM EXCLUSIVIDADE para a Ré, facto fundamentado, sem qualquer dúvida, na dita documentação da Segurança Social e da Autoridade Tributária (Docs. 83 a 94). 22) In casu, foi produzida prova testemunhal e documental nos termos da qual se deverá proceder à modificação da matéria de facto, prova que impõe decisão diversa da que foi dada como provada, nos termos atrás mencionados, acarretando necessariamente uma diferente qualificação jurídica da mesma. 23) Na sentença recorrida, a questão a decidir reconduz-se, no essencial, em determinar se a relação contratual mantida entre a enfermeira B. e a R. consubstancia, ou não, um contrato de trabalho, consignando-se na decisão recorrida “O contrato de trabalho tem como objecto a prestação de uma actividade e como elemento típico e distintivo a subordinação jurídica do trabalhador, traduzida no poder do empregador conformar através de ordens, directivas e instruções, a prestação a que o trabalhador se obrigou. Diferentemente, no contrato de prestação de serviços, o prestador obriga-se à obtenção de um resultado, que efectiva por si, com autonomia, sem subordinação à direcção da outra parte. (…) Com o propósito de determinar a natureza laboral ou liberal de um determinado vínculo jurídico entre uma pessoa singular e uma pessoa singular ou coletiva, radica-se a nossa doutrina e jurisprudência, essencialmente, na existência ou não de subordinação jurídica (…) Sendo a subordinação definida (pelo art.º 11º CT) por referência à «autoridade e direcção» do empregador, ou construída (pela doutrina) como um estado de heterodeterminação em que o prestador de trabalho se coloca, nem assim fica o julgador munido de instrumentos suficientes e seguros para a qualificação dos casos concretos. (…)”. 24) Para se decidir pela existência de um contrato de trabalho, já não de prestação de serviços, o tribunal recorrido apoiou-se em “indícios de subordinação” justamente elencados por Maria do Rosário Palma Ramalho na obra “Direito do Trabalho”, 3ª Edição, Almedina, págs. 41 a 44., tendo chegado à conclusão que dos 10 indícios listados pela referida autora na referida obra, perante a matéria de facto que deu como assente, estariam presentes apenas três deles: “(…) as funções da enfermeira B. são exercidas no local propriedade do beneficiário do trabalho/Ré ou em local por ela indicado, os instrumentos de trabalho pertencem à mesma e a mesma enfermeira observa horas de início e de termo da prestação, determinadas pela R..”, todavia não recolhem mínimo fundamento na factualidade dada como assente, como acima exposto. 25) Em relação ao primeiro indicio que se diz estar presente - as funções da enfermeira B. são exercidas no local propriedade do beneficiário do trabalho/Ré ou em local por ela indicado – o mesmo não denuncia a existência de um contrato de trabalho, diferenciando-o de um contrato de prestação de serviços. O local onde se exerce esta concreta actividade é aqui de todo inócuo para a distinção que se pretende firmar. 26) O segundo expresso indício – “os instrumentos de trabalho pertencem à mesma” – afinal também não funciona, no caso, como elemento distintivo para a demarcação de um ou outro contrato, porquanto estando em causa o exercício de funções de enfermagem num hospital, e como se deu até por provado nos pontos 23 e 24, e como até decorre de norma legal, “No estrito cumprimento desta norma, todos os profissionais independentemente do vínculo laboral, recebem formação, utilizam os equipamentos, materiais, consumíveis e vestuário fornecido pela Ré”. 27) Em relação ao terceiro indício – “a mesma enfermeira observa horas de início e de termo da prestação, determinadas pela Ré” - tal indício afinal, também, é de todo inócuo na economia que está em apreciação pois que nos contratos em disputa haverá sempre início e fim do serviço prestado. 28) Da factualidade supra descrita, que se entende dever dar-se como provada, resulta demonstrado, inexistirem indícios da existência de um contrato de trabalho firmado pela Ré com a dita enfermeira. 29) O Tribunal a quo errou na fixação de certa matéria de facto acima mencionada, pelo que a mesma deverá ser modificada nos termos supra expostos. 30) Em resultado dessa modificação, verifica-se inexistirem dois dos elementos factuais essenciais constitutivos do contrato de trabalho: por um lado a subordinação económica e por outro, a subordinação jurídica. Se, na verdade a enfermeira B. recebeu da Ré retribuição, certo é que na prestação da sua actividade ela não esteve sob as ordens, direcção e fiscalização do dador do trabalho. 31) A casuística que a ponderação deve invocar, obriga a apelar, expressamente a uma decisão jurisprudencial que atentou num caso igual ao que agora nos preocupa e que se passou em estabelecimento de saúde da cidade de BRAGA – nos factos e no direito, e que ficou a constar do Acórdão do STJ de 09/12/2010, proc.1155/07.9TTBRG.P1.S1, onde se consignou: “Atendendo à natureza e conteúdo das funções compreendidas na profissão de enfermeiro, não são suficientes para se concluir pela existência de subordinação jurídica, a obrigatoriedade de cumprimento de protocolos; o pagamento mensal das retribuições calculadas com base nas horas de trabalho efectivamente prestadas; a vinculação a um horário pré-definido; o facto de o local de trabalho se situar nas instalações da Ré e o fornecimento de uniformes e instrumentos de trabalho por parte da Ré, tanto mais quando está, também, demonstrado que as Autoras não prestavam a sua actividade em regime de exclusividade; que o horário de trabalho na Ré era fixado, por acordo, atendendo às conveniências das Autoras; que, as mesmas, nas suas faltas, tinham a possibilidade de se fazerem substituir, na prestação, por outra pessoa, com a única consequência de não lhes ser pagas as horas em que não tivessem prestado serviço. Na apreciação global de todos estes indícios, não pode inferir-se a possibilidade de, no seu âmbito, a Ré exercer efectivos poderes de direcção e autoridade e, menos ainda, o poder disciplinar sobre as Autoras, não estando, assim, demonstrados factos bastantes para caracterizar, com segurança, a subordinação jurídica e, pois, para conferir às relações contratuais entre elas estabelecidas, natureza laboral.” 32) Tal como acertadamente se decidiu neste aresto, em causa, que, repete-se, com factualidade quase decalcada da que agora se possui – nos serviços de enfermagem prestados pela B. como enfermeira, à Ré recorrente, não está presente um contrato de trabalho. Está antes um contrato de prestação de serviço pois que não se provou a existência de uma subordinação jurídica, já que à Ré apenas interessava o resultado da actividade desenvolvida pela mencionada enfermeira. 33) O autor, o Ministério Público, não provou a existência de um contrato de trabalho entre a Ré e a dita enfermeira B.. Como até se escreveu no mencionado acórdão do STJ “O ónus da prova dos factos constitutivo do contrato de trabalho, nomeadamente da subordinação jurídica ou dos que possam apontar no sentido da existência de um tal contrato, compete ao Autor, nos termos do disposto no artigo 342, n.º1 do Código Civil”. 34) A sentença recorrida viola, entre outras, as normas dos artigos 89.º, n.º 2, do CIRE, 89.º, n.º 2, da LOFTJ e 11º Código de Trabalho. Termina pretendendo que seja dado provimento ao recurso, “decretando-se ou a incompetência absoluta do Tribunal de Trabalho para decidir a questão, ou então, caso assim não se entenda, a alteração da decisão recorrida na matéria de facto especificadamente impugnada, nos termos acima indicados e determinar-se a revogação da sentença recorrida com a declaração de inexistência de um contrato de trabalho entre a enfermeira B. e a Ré”. O A contra-alegou sem que formulasse formalmente conclusões. Termina pretendendo a improcedência da acção. Efectuado o exame preliminar e corridos os vistos legais, cumpre decidir. As questões a apreciar revertem sucessivamente, sem prejuízo das conclusões do recurso e das que se encontrem prejudicadas pelo conhecimento anterior de outras, para a admissibilidade da impugnação da decisão sobre a matéria de fato, a intempestividade do recurso, a incompetência em razão da matéria, essa impugnação e a inexistência de contrato de trabalho. Os factos considerados assentes na sentença são: “1 - A “Casa de Saúde C., S.A.” tem como objecto o exercício de medicina e cirurgia. 2 - Por sentença transitada em julgado em 10.3.2015, proferida no processo nº 3576/14.1 T8GMR da 1ª Secção de Comércio de Guimarães, foi declarada insolvente. 3 - A massa insolvente da Casa de Saúde C. é detentora do Hospital Privado de …, que presta serviços de saúde em regime de ambulatório, internamento e urgência. 4- Este estabelecimento de saúde, para, além do quadro de contratados de enfermagem, em função dos picos de actividade existentes, recorre a prestadores de serviços externos na área de enfermagem. 5- Na sequência da acção inspectiva desenvolvida no dia 20 de Julho de 2015 nas instalações dos serviços que “Casa de Saúde C.” possui na AMl-Hospital Privado de…, sito na …, pela Autoridade para as Condições de Trabalho - Centro Local do…, a inspectora do trabalho, Marta verificou que aquela tinha ao seu serviço, naquelas instalações, a prestar a sua actividade de enfermeira, a trabalhadora B., residente em …. 6- A enfermeira B. iniciou em Junho de 2011 a prestação de actividade ao serviço da “Casa de Saúde C.”, sem nunca ter sido celebrado contrato de trabalho nem contrato de prestação de serviços entre a trabalhadora e a beneficiária. 7- A enfermeira B. está ao serviço da R., exercendo funções de enfermeira, que, consistem, essencialmente, em serviços de enfermagem. 8- Exerce essas funções nas instalações da beneficiária da prestação de trabalho, ou em local por ela determinado, utiliza os equipamentos e instrumentos de trabalho pertencentes àquela, que assim os disponibiliza, nomeadamente, mobiliário, todo o material inerente à actividade própria de um enfermeiro(a) como seja o material de higiene e desinfecção, equipamentos hospitalares, material de emergência, descartáveis/consumíveis e material de protecção. 9- Aquando da acção inspectiva a enfermeira B., como habitualmente, trajava uma bata branca fornecida pela beneficiária da prestação de trabalho, bata essa identificada com a inscrição AMI, igual a todos os restantes enfermeiros que aí prestam a sua actividade, estejam eles qualificados como trabalhadores independentes ou como trabalhadores por conta de outrem. 10 - Está vinculada a observar um horário de trabalho determinado pela beneficiária da prestação de trabalho, com horas de início e de termo de cada dia de trabalho, obedecendo a uma escala de serviço definida e elaborada pela enfermeira-chefe Teresa, com distribuição de turnos que variam entre as 6 e as 12 horas diárias. 11 - Essa escala de serviço é disponibilizada, em regra, à enfermeira B. no final do mês anterior. 12- A R. ao elaborar os horários dos enfermeiros contratados e prestadores de serviços consulta previamente a respectiva disponibilidade de horário de ambos. 13- Como todos os outros enfermeiros contratados e prestadores de serviços a enfermeira B., no fim de cada mês, enviava a sua disponibilidade horária mensal para prestar serviços à unidade da Ré. 14 - As horas de início e termo de prestação de serviço são controladas pela beneficiária da prestação de trabalho através de um sistema de picagens do registo das suas entradas e saídas, utilizado por todos os trabalhadores que prestam a mesma actividade naquele local, estejam eles qualificados como trabalhadores independentes ou como trabalhadores por conta de outrem, no seguimento de instruções da beneficiária. 15 -A enfermeira B., na eventualidade de não poder cumprir a escala de serviço definida pela beneficiária da actividade, deve comunicar à enfermeira-chefe, Teresa, em tempo útil, o motivo da sua ausência. 16- A retribuição auferida pela enfermeira B. é paga mensalmente pela entidade beneficiária do trabalho, habitualmente ao dia 8 ou 9 do mês seguinte, por transferência bancária, obrigatoriamente para a conta bancária daquela. 17 - Em valor variável e à razão de € 7,00/hora de trabalho. 18 - O valor mensal a receber é o resultante do somatório dos tempos de actividade prestada em todos os turnos praticados pela trabalhadora em cada mês, calculados a partir do registo no sistema informático. 19 - O trabalho prestado na R. pela enfermeira B. constitui a sua fonte principal de subsistência e é essencialmente com ele que se sustenta e satisfaz as suas necessidades básicas. 20 - A enfermeira B., tal como os outros enfermeiros, contratados e prestadores de serviços, recebeu formação inicial - formação de integração por parte da entidade empregadora, tendo sido acompanhada durante os primeiros meses por “um colega mais antigo”, não podendo ficar sozinha durante o turno. 21 - Foi sujeita a uma avaliação efectuada pela já referida enfermeira-chefe, Teresa. 22 - A enfermeira B. recebe ordens e instruções da beneficiária da prestação de trabalho, que lhe são dadas através daquela enfermeira-chefe, sendo esta que define qual o serviço onde aquela trabalhadora deve trabalhar e quais os utentes que tem que e acompanhar e vigiar. 23 - A Norma da DGS nº 029/12, obriga que Entidades hospitalares, como o Hospital Privado de …, garantam a existência de sistemas e recursos que facilitam a implementação das precauções básicas do controlo da infecção (PBCI) e a monitorização do seu cumprimento, por todos aqueles que prestam cuidados de saúde, o que também inclui os profissionais das empresas de prestação de serviços. 24 - No estrito cumprimento desta norma, todos os profissionais independentemente do vínculo laboral, recebem formação, utilizam os equipamentos, materiais, consumíveis e vestuário fornecido pela Ré. 25 - Por cada pagamento efectuado pela Ré, a Autora emite a correspondente factura recibo. 26 - A R. nunca pagou à enfermeira B. subsídio de férias e de Natal, nem quaisquer proporcionais correspondentes aos serviços efectuados. 27 - A enfermeira B., efectuava os descontos como trabalhadora independente, junto da Segurança Social. 28- E também desde sempre que junto da Autoridade Tributária abriu actividade como trabalhadora independente, sob o regime da prestação de serviços, tendo-se mantido colectada até à data como profissional liberal. 29 - A enfermeira B. prestava e continua a prestar alguns serviços para outras entidades externas. 30 - No dia 30 de Julho de 2015 a A.C.T. procedeu à notificação da Ré, na pessoa do administrador de insolvência, por carta registada com aviso de recepção, dando-lhe o prazo de dez dias para proceder à regularização da situação da trabalhadora e para fazer prova perante a ACT dessa regularização mediante a apresentação do contrato de trabalho por tempo indeterminado ou de documento comprovativo da existência do mesmo reportado à data do início da relação laboral. 31 - Não foi regularizada a situação nem obtida resposta”. A R pretende impugnar a decisão sobre a matéria de fato. Para o efeito invoca essencialmente prova oral. Embora resulte da ata da audiência de julgamento que a prova oral foi gravada na verdade, compulsados os autos, não logramos verificar que qualquer das partes a tenha requerido ou a Mmº Juíza que a presidiu oficiosamente a tenha ordenado. E a parte meramente descritiva da acta da primeira sessão de que, logo no início, “Após, vieram os presentes prestar depoimento, procedendo-se a gravação fonográfica através do programa informático H@bilus Média Studio, pela ordem seguinte:….” e, no final, que “Por determinação da Mmª. Juiz de Direito e conforme o disposto no nº 5 do artº 155º do Cód. Proc. Civil, revisto pela Lei 41/2013, de 26/06, foram transcritos para a presente ata todos os requerimento, respostas e despachos/decisões proferidos na presente audiência” não colmata qualquer uma dessas omissões e a última citação até é susceptível de confirmar estas. Não tendo sido requerida ou ordenada oficiosamente a gravação da prova produzida em audiência de discussão e julgamento, e em função do valor da causa e da natureza desta tal era legalmente possível (artºs 68º, nº 2, e 79º do CPT), não poderá ser considerado e valorado por este tribunal ad quem o citado registo-áudio. A tal não obsta o disposto no artº 155º do CPC, que impõe o registo de todos os atos praticados na audiência final, norma que possui carácter geral e que não derrogou e se sobrepôs à norma especial em que consiste o citado artº 68º, designadamente, para fins recursórios. E mesmo no processo civil, não sendo efetuado esse registo e isso consistindo numa nulidade secundária impunha-se a sua arguição no prazo de 10 dias a contar do conhecimento das partes da sua ocorrência (artºs 195º e 199º do NCPC), sob pena de ficar sanada. Logo essa impugnação é ineficaz pela impossibilidade da sua apreciação. E surge a questão principal. Face ao motivo pelo qual a mesma é ineficaz igualmente a recorrente só se poderia utilizar do prazo de 20 dias para interpor o recurso. Já não acrescido de dez dias, nos termos do artº 80º, nºs 1 e 2 do CPT. Com efeito, ab initio não tinha direito à impugnação em causa (António Santos Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 112). A sentença foi notificada aos ilustres mandatários das partes em 11.01.2016, via electrónica (Citius). O prazo de 20 dias para recorrer começou a contar a 15.01.2016; terminou em 03.02.2016, nos termos conjugados dos artºs 132º, nº 1, 137º, nºs 1 e 2, 138º, nºs 1 e 2, 248º do CPC e 26º, nº 1, alª i), do CPT. Contudo o recurso foi interposto via electrónica em 13.02.2016, inclusive como tal para além do momento de se poder praticar o ato independentemente de justo impedimento (nos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo; artº 139º do CPC). Foi pois extemporaneamente deduzido. Nestes termos tem de se concluir que não se deve conhecer do objeto do mesmo, considerando-se extinta a instância. Sumário, da única responsabilidade do relator 1- Não sendo requerida ou ordenada oficiosamente a gravação da prova produzida em audiência de julgamento, nos termos do artº 68º do CPT, não pode ser considerado e valorado pelo tribunal de recurso o registo-áudio efetuado na audiência. 2- Se a impugnação sobre a decisão da matéria de fato é ineficaz pela impossibilidade da sua apreciação e a parte não tendo ab initio esse direito, a mesma só poderia utilizar o prazo de 20 dias para interpor o recurso. Decisão Acordam os Juízes nesta Relação em julgar extemporâneo o recurso e, consequentemente, não devendo ser conhecido o seu objecto consideram extinta a instância. Custas do incidente pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 2 UCs. ***** O acórdão compõe-se de 15 folhas, com os versos não impressos. ****** 30.11.2016 Eduardo Azevedo Vera Sottomayor Antero Veiga