Processo:
Relator: Tribunal:
Decisão: Meio processual:

Profissão: Data de nascimento: Invalid Date
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
MARIA DE FÁTIMA ALMEIDA ANDRADE
Descritores
ACIDENTE DE VIAÇÃO DEVER DE REPARAÇÃO DOS DANOS RECONSTITUIÇÃO NATURAL PERDA TOTAL EXCESSIVA ONEROSIDADE
No do documento
RG
Data do Acordão
02/09/2017
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO
Decisão
IMPROCEDENTE
Sumário
1- Ao tribunal de recurso está vedado o conhecimento de questões novas anteriormente não submetidas à apreciação do tribunal a quo. Por tal não havendo lugar à reapreciação da matéria de facto quando em causa está matéria nova antes não alegada e que visa enquadrar fundamento de defesa antes não invocado pela recorrente, sob pena de violação do princípio da concentração da defesa e da preclusão. 2 – Na reapreciação da matéria de facto o tribunal da Relação fazendo uso dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, apenas deve alterar o decidido pelo tribunal a quo quando verifique erro de julgamento. 3- A obrigação da reconstituição natural em sede indemnizatória só cede perante a indemnização pecuniária em caso de excessiva onerosidade daquela; 4- O conceito de perda total definido pelo artigo 41º do DL 291/2007 para efeitos de afastar a obrigação da reconstituição natural no âmbito da regularização de sinistros por via extrajudicial não é para o tribunal vinculativo; 5- É ónus do obrigado à reparação a prova da excessiva onerosidade da reconstituição natural;
Decisão integral
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
I- Relatório

J, melhor id. a fls. 5, instaurou ação declarativa sob a forma de processo comum contra C igualmente melhor id. a fls. 5.
Pela procedência da ação peticionou oA. a condenação da R. a pagar-lhe a quantia de €12.490,77, acrescida de juros de mora à taxa legal contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Valoreste correspondente aos danos por si sofridos em consequência de acidente de viação no qual foi interveniente, mas cuja responsabilidade na produção do mesmo imputou ao outro veículo igualmente interveniente e na aqui R. segurado.
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	Devidamente citada a R., contestou esta em suma tendo aceitea responsabilidade na produção do acidente do veículo por si seguro e impugnado os danos pelo A. elencados e reclamados, sobre estes deduzindo ainda matéria de exceção a que o A. respondeu nos termos de fls. 54 e segs..
 
	Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, identificado o objeto do litígio e elencados os temas da prova.
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	Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença que julgando a ação parcialmente procedente decidiu:
“A.	Condenar a ré no pagamento ao autor da quantia de €11.490,77 [onze mil quatrocentos e noventa euros e setenta e sete cêntimos], correspondente à soma do valor da reparação da viatura sinistrada com o prejuízo decorrente da privação da viatura;

B.	Condenar a ré no pagamento ao autor da quantia que vier a ser liquidada no respetivo incidente de liquidação e que tem como limite máximo o montante de €1.000,00 [mil euros], ao abrigo do disposto no artigo 609.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, por conta da desvalorização sofrida pelo veículo do Autor;

C.	Condenar a ré no pagamento dos juros moratórios vencidos desde a citação e vincendos até integral pagamento, calculados à taxa legal estabelecida para os juros civis sobre o montante de €11.490,77 [onze mil quatrocentos e noventa euros e setenta e sete cêntimos] e daqueloutro que se vier a apurar em sede de incidente de liquidação nos termos determinados em C.;

D.	Absolver a ré do demais peticionado.”

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	Do assim decidido apelou a Ré oferecendo alegações e formulando as seguintes 	

 Conclusões:
1) Na Sentença recorrida foi feita uma incorreta interpretação da prova produzida, assim como uma menos precisa interpretação da lei. 
2) Não deveria o Tribunal a quo ter dado como provado que, devido ao sinistro do FT, o Autor viu-se obrigado a proceder ao aluguer de uma viatura para substituir o mesmo por modo a satisfazer as necessidades que antes satisfazia com o FT. 
3) A fatura que consta dos autos, a ser verdadeira, não cumpre os requisitos legais, não se encontrando nela mencionada a matrícula do veículo alugado, sendo que a quantia na mesma inscrita não foi liquidada pelo Autor mas sim por uma empresa de mediação de seguros, como foi relatado pela testemunha Luís Carlos Martins Sá. 
4) Por outro lado, a ser verdade que o referido aluguer existiu, o veículo referente à fatura acima mencionada trata-se de um Opel Corsa de dois lugares, ou seja um veículo ligeiro, com nenhuma característica semelhante ao do sinistrado. 
5) Tendo em consideração o uso que era dado pelo Autor ao FT, nunca um veículo com as características de um Opel Corsa de dois lugares o poderia substituir, não sendo o mesmo adequado para ir até ao terrenos onde se fazia a apanha da azeitona, para transportar trabalhadores, e muito menos para transportar o produto da apanha que era entregue na cooperativa por meio de trator, como foi relatado pelas testemunhas L e J. 
6) Por fim resultou provado que o Autor era ainda proprietário de um outro veículo jipe, que, mesmo sendo usualmente utilizado pelo seu filho (que estava emigrado em Espanha), estava à sua livre disposição. 
7) Assim, utilizando o Autor um trator para o trabalho agrícola e tendo à sua disposição um veículo jipe, que estava registado em seu nome, não se compreende a razão pela qual teve necessidade (se é que teve) de alugar um outro veículo - um ligeiro de mercadorias. 
8) Acresce ainda referir que em momento algum do seu depoimento, a testemunha Luís Sá referiu que, apesar de ter sido a sociedade de mediação de seguros em que trabalhava a custear a fatura em apreço, tal quantia foi ou ia ser reclamada do Autor, pelo que não faz qualquer sentido, à falta dessa prova, a condenação da Ré a pagar o que quer que seja, a esse título, ao Autor. 
9) A redação do ponto 11 dos factos provados deverá ser alterada para “A partir de 15/11/2014 a 17/12/2017, o Autor alugou uma viatura, tendo o custo de tal aluguer sido suportado por uma empresa de mediação de seguros". 
10) Resultou demonstrado que o veículo mencionado no ponto 12 dos factos provados foi adquirido pelo Autor pela quantia de € 2.000,00, assim como que o mesmo se encontrava, à data dessa aquisição, com o motor avariado. 
11) Por seu turno, resultou ainda demonstrado que o Autor procedeu à substituição do motor avariado do HX pelo motor do FT. 
12) Após esta operação de substituição de motores, o Autor procedeu ao cancelamento da sua matrícula do FT (ponto 13 dos factos provados). 
13) Pelo que deverá a redação do ponto 12 dos factos provados ser alterada para: "Após, o Autor adquiriu um veículo da mesma marca e modelo da viatura referida em 1) com a matrícula HX, tendo sido registada essa aquisição em 16 de Fevereiro de 2015, pelo qual pagou o montante de € 2.000,00, e no qual instalou o motor da viatura acidentada" 
14) Atenta a aquisição de um veículo da mesma marca e modelo do FT, a substituição dos motores entre os mesmos e o cancelamento da matrícula do FT, dúvidas não restam que o Autor se colocou na posição em que se encontrava antes do acidente, demonstrando ainda um total desinteresse pela reparação do FT que, pura e simplesmente, substituiu por outro veículo. 
15) Tendo em conta o valor de aquisição daquele novo veículo, que serviu para substituir o FT - € 2.000,00 - concluiu-se que, por um lado, carece de fundamento a condenação da Ré no pagamento da reparação do FT (que não foi nem vai ser feita) e, por outro, que o valor do prejuízo que o Autor teve ascende a esse mesmo montante de € 2.000,00 (valor despendido na substituição do veículo acidentado por um da mesma marca, modelo e características). 
16) Devendo a Sentença, nessa parte, ser revogada e substituída por outra que condene a Ré a pagar ao Autor, a título de prejuízos decorrentes dos danos verificados no FT, o montante de € 2.000,00. 
17) O valor venal de € 4.500,00 atribuído ao FT pela Ré afigura-se adequado, uma vez que foi fixado pela testemunha Leonel Rodrigues que, junto de concessionários vendedores deste tipo de veículos e do Stand Virtual, encontrou dois veículos da mesma marca e modelo que o FT, mas de versões mais atualizadas a nível de carroçaria e significativamente com menos Km, sendo um do ano de 1998 e outro de 1999, atribuindo ao primeiro uma desvalorização, decorrente do ano de fabrico e kms. percorridos, de € 1.000,00. 
18) Assim não se entendendo, tendo em consideração o valor de venda de veículos da mesma marca e modelo mas mais recentes e de versões mais atualizadas (€ 5.500,00 e € 5.800,00), estava o Tribunal recorrido na posse de elementos mais que suficientes para fixar o valor venal do FT em, no máximo, € 5.800,00. 
19) Atento o exposto, deverá ser aditado um ponto à matéria de facto provada com a seguinte redação: "O valor de mercado da viatura referida em 1) era de € 4.500,00." ou, subsidiariamente, "O valor de mercado da viatura referida em 1) era de € 5.800,00." 
20) Considerando-se os valores constantes dos pontos 19 ou, subsidiariamente, 20, assim como o valor do salvado, avaliado em € 1.875,00, o montante indemnizatório a atribuir ao Autor deverá ser reduzido para € 2.625,00 ou € 3.925,00. 
Nestes termos, deverá ser concedido integral provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se nesta parte a Sentença recorrida de acordo com o supra alegado, assim se fazendo Justiça.”

*
	Apresentou o A. contra-alegações, concluindo nos seguintes termos:
“1. Resulta das alegações do recurso interposto, bem como das respetivas conclusões, que a Recorrente Companhia de Seguros Tranquilidade S.A., não se conforma com a douta sentença proferida e sindica no recurso interposto a matéria de facto e direito elencadas e desenvolvidas na douta sentença objeto de recurso. 
2. A sentença em análise entendeu como provado que o Autor, entre 15/11/2014 e 17/12/2014, por estar privado do uso do veículo PT, em consequência do acidente, alugou uma viatura pela qual desembolsou a quantia de 1.262,35 Euros (Mil cento e sessenta e dois euros e trinta e cinco cêntimos), ponto 11 da matéria de facto assente. 
3. A Ré seguradora afirma que tal conclusão foi sustentada no depoimento da testemunha por si arrolada A que, supostamente, terá mencionado que a viatura alugada que consta nos autos, tratava-se de um veículo comercial, "sendo, por isso mais adequada às tarefas agrícolas, nomeadamente, ao transporte de objetos e de produtos agrícolas." 
4. Porém, refere a Ré que de facto no âmbito dessa averiguação, entre outras coisas, a testemunha A apurou a existência de um aluguer (porque tal lhe foi reclamado pelo Autor), com a duração de um mês, de uma viatura comercial; no entanto, em momento algum do seu depoimento é referido que a viatura alugada era a mais adequada às tarefas profissionais do Autor. 
5. Mais refere a Ré seguradora que pese embora conste dos autos a fatura e recibo desse suposto aluguer, entende que não conseguiu o autor provar ter efetivamente alugado o referido veículo, e se o fez, terá sido certamente por outros motivos/necessidades que nada têm a ver com o sinistro aqui em causa. 
6. Respinga também a ré que o autor era à data do acidente, proprietário de uma outra viatura tipo jipe, de matrícula OX, que este tentou convencer que dela não fez uso algum, apesar de a mesma se encontrar à sua livre disposição. 
7. Contudo bem entendeu o douto tribunal a quo quando afirmou que, não obstante a ré ter invocado e demonstrado que se encontrava registada em nome do autor uma outra viatura, de onde se presume a sua propriedade, tal não invalida que o autor se tivesse visto forçado a alugar uma outra. 
8. Isto porque, importante seria alegar e demonstrar também que essa viatura estava à disposição do autor, que ele a poderia usar e, com isso, satisfazer as suas necessidades, o que não sucedeu. 
9. Embora a recorrente se escude no facto de o autor ser proprietário de uma outra viatura, demonstrando-o com base no registo automóvel ou respingando parcialmente os depoimentos da prova testemunhal ouvida em audiência de discussão e julgamento, não alegou ou mesmo demonstrou que permitisse afastar a concreta efetiva necessidade do aluguer, cfr. depoimento prestado no dia 15.02.2016, registado em ata com início da gravação 00:00:01; fim da gravação 00:11:42 pelas 11:33:29, na passagem 00:02:18 até 00:06:09: 
Ao contrário do retorquido pela recorrente, mormente que a fatura junta aos autos não seria válida ou por outro lado, que a mesma não teria sido liquidada, o certo é que o autor recorrido liquidou o valor referente ao aluguer do veículo em questão, até porque deixou essa quantia na posse do pai da testemunha ouvida L e foi este quem procedeu à sua entrega na oficina onde havia sido feito o aluguer, cfr. depoimento da testemunho L, prestado no dia 15.02.2016, registado em ata com início da gravação 00:00:01; fim da gravação 00:4145:42 pelas 10:49:42, nas passagens 00:10:17 até 00:12:44, 00:18:32 até 00:21:00, 00:26:23 até 00:31:58 e 00:32:09 até 00:34:16: 
10. Discorda-se do alegado pela Ré recorrente, mormente que o autor não tenha logrado demonstrar em que circunstância utilizava o veículo alugado. Que interesse teria o autor em proceder ao aluguer desta viatura, que não para utilização nas tarefas anteriormente executadas, como seja, e ficou bem claro, na agricultura. 
11. Tendo este aluguer ocorrido exatamente em data posterior ao sinistro do qual o seu veículo foi vítima e logo de seguida, após entrega daquele veículo automóvel, adquirido um outro exatamente igual ao veículo então sinistrado, qual poderia ser um outro interesse do autor recorrido, que não o provado em audiência de discussão e julgamento?! 
12. O autor só não teve acesso a um jipe, porque o mesmo não existia na pequena cidade de Macedo de Cavaleiros, não pense a Ré recorrente, que autor estivesse a alugar um veículo na cidade do Porto ou na cidade de Lisboa, onde seguramente a oferta seria manifestamente proporcional às suas necessidades, mas também o preço ora imputado seria claramente superior. 
13. Pelo supra exposto, deve manter-se o ponto n.º 11 (Décimo primeiro) da matéria de facto dado como provada, mormente "a partir de 15/11/2014 a 17/12/2014, por estar privado do uso da sua viatura em consequência do acidente, alugou uma viatura pela qual desembolsou a quantia de 1.162,35 Euros (Mil cento e sessenta e dois euros e trinta e cinco cêntimos)." 
14. Bem assentou então o tribunal a que, que ficou demonstrado que o recorrido autor recorreu à viatura de substituição por causa da privação da sua viatura entre o período de 15/11/14 a 17/12/2014. A seguradora aqui Recorrente apenas tomou posição, assumindo a sua responsabilidade pelo sinistro por missiva de 12/12/2014, mas apenas oferecendo uma indemnização no valor de 2.625,00 Euros (Dois mil seiscentos e vinte e cinco euros), acrescido do valor do salvado. 
15. Bem julgou a sentença recorrida no sentido de que é indemnizável o preço que o autor recorrente suportou por via do respetivo aluguer, enquanto dano emergente do sinistro, cabendo à aqui Ré recorrente a sua reparação. 
16. Em amparo desta questão atente-se pois o exposto no recente acórdão desta Ilustre Casa da Justiça, sob o processo n.º  <a href="https://acordao.pt/decisoes/194818" target="_blank">2671/11.3TBBCL.G1</a>, cujo Relator foi a Excelentíssima Senhora Desembargadora Doutora Ana Cristina Duarte, datado de 21/05/15, disponível no site www.dgsi.pt,no qual pode ler-se o seguinte arresto: "( ... ) O uso de um veículo constitui uma vantagem suscetível de avaliação pecuniária, consubstanciando a sua privação um dano que deve ser indemnizado como contrapartida da perda da capacidade de utilização normal do veículo." 
Por outro lado, 
17. Resulta do ponto 12.º (Décimo segundo) dos factos provados que "Após, o Autor adquiriu um veículo da mesma marca e modelo da viatura referida em 1) com a matrícula HX, tendo sido registada essa aquisição em 16 de Fevereiro de 2015." 
18. A Ré recorrente entende que a redação do referido ponto dos factos provados deve ser alterada passando a constar: "Após, o Autor adquiriu um veículo da mesma marca e modelo da viatura referida em 1) com a matrícula HX, tendo sido registada essa aquisição em 16 de Fevereiro de 2015, pelo qual pagou o montante de € 2.000,00 (Dois mil euros) e no qual instalou o motor da viatura acidentada." 
19. Da prova produzida resultou que o responsável pela avaliação efetuada à viatura sinistrada foi a testemunha L, perito avaliador, que trabalha por conta própria para a ré e assumiu o encargo de estimar e avaliar os danos e o próprio jipe. 
20. Segundo a testemunha ouvida, o valor da reparação era bastante superior ao da viatura, concluindo que esta viatura valia cerca de 4.500,00 Euros (Quatro mil e quinhentos euros). Para justificar este alegado valor referiu a testemunha que fez consultas na internet e afirmou que contactou com comerciantes do setor automóvel que vendem este tipo de carros. 
21. A testemunha ouvida exibiu em audiência de discussão e julgamento os resultados de duas pesquisas que terá efetuado, através do "stand virtual" e, dessa exibição, assim como daquilo que a própria referiu, resultou que o senhor perito teve como valores de referência os peticionados no stand virtual por viaturas com características distintas da que lhe cabia avaliar. 
22. A testemunha L exibiu em audiência de discussão e julgamento documentos - resultado de pesquisas efetuadas - porém todas estas pesquisas respeitavam, curiosamente a modelos de veículos mais recentes, com menos idade e quilómetros, tentando com esta mesma pesquisa fazer concluir que por se estes veículos mais recentes osstands estão a pedir 5.500,00 Euros (Cinco mil e quinhentos euros) a 5.800,00 Euros (Cinco mil e oitocentos euros), a viatura do autor recorrido automaticamente valeria necessariamente menos. 
23. Curiosamente, a testemunha não trouxe qualquer documento alusivo ao seu efetivo valor do carro acidentado, ao valor apresentado pela ré recorrente. 
24. A testemunha igualmente ouvida, L, referiu que encontrou em stands virtuais veículos como o ora sinistrado, com o valor de comercialização de 8.000,00 Euros (Oito mil euros). 
25. Nesta senda, bem entendeu o tribunal a quo que perante todos estes elementos e o critério duvidoso e pouco rigoroso e esclarecedor que presidiu à avaliação da viatura sinistrada, a decisão teve de ser desfavorável à parte sobre quem recaía o ónus probatório, pelo que a matéria foi dada como não provada. 
26. Claramente o pedido de reformulação do ponto 12.º (Décimo Segundo) da matéria de facto provada deve ser entendido como não admitido, conquanto a própria ré recorrente admite qual o efetivo valor de reparação do veículo sinistrado propriedade do autor recorrido, que igualmente ficou provado, ainda encontrar por reparar, em posse do autor recorrido. 
27. O autor não perdeu o interesse no veículo sinistrado, tão só, aprontou uma solução temporária, face à posição assumida pela Ré recorrente. Quicá entendesse a ré recorrente ser mais conveniente continuar o autor recorrido com um veículo alugado! 
28. Desta feita, discorda o Autor da posição da Ré recorrente no sentido de que este tenha tornado a reconstituição natural materialmente impossível, quando retirou o motor do FT que não sofrera qualquer dano, para o instalar num outro veículo, que entretanto, sem alternativa adquiriu. 
29. Nem prevalece o facto de o autor recorrido ter cancelado a matrícula do veículo sinistrado, porque nada impede a sua renovação. 
30. Esqueceu a ré recorrente que o veículo sinistrado mesmo paralisado teria de liquidar anualmente o imposto de circulação automóvel - situação que o autor recorrido entendeu não despender, cancelando a matrícula em questão. 
31. Desta feita, não releva aos autos o facto de o autor recorrido ter adquirido um outro veículo pelo valor de 2.000,00 Euros (Dois mil euros), visto que o prejuízo efetivo do autor recorrido continua a existir, no valor assumido pela própria ré recorrente, ou seja, no veículo sinistrado matrícula FT e não no veículo ulteriormente adquirido de matrícula HX. 
32. Ora, ficou provado que o aqui sinistro gerou danos materiais a terceiros, in casu, ao autor recorrido. 
33. Daí que, seguindo na esteira o raciocínio da Meritíssima Juiz do tribunal recorrido, caso o autor demonstre tais danos, o que aconteceu e não se verifique exceção ao seu direito de ressarcimento, incumbirá à ré recorrente proceder ao pagamento da indemnização devida pela ocorrência desses danos, nos termos do artigo 43.º, 1, do referido preceito legal, lido conjuntamente com o n.º 1 do artigo 102.º do Decreto-Lei n.º 72/2008 de 16 de Abril. 
34. A regra vigente na responsabilidade civil é a da reparação integral dos danos resultantes do facto ilícito, conforme os artigos 562.º e 566.º, n.º 1 do Código Civil. 
35. O artigo 562.º do Código Civil defende como princípio, a restauração natural, isto é, a realização de uma prestação específica. Com a indemnização pretende-se então reconstituir a situação anterior à lesão, ou seja, repor as coisas no estado em que estariam, se não fora o facto determinante da responsabilidade, isto é, tornar o lesado, in demne, sem dano. 
36. O dano patrimonial mede-se pela diferença entre a situação real atual do sinistrado e a situação hipotética em que ele se encontraria, se não tivesse ocorrido o acidente de viação. 
37. No âmbito do direito português, aceita-se pacificamente que a reconstituição natural prevalece sobre a indemnização por equivalente, confirmar artigo 562.º, do Código Civil. 
38. A este propósito, de forma clara e cabal, distingue-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 28/02/2013, relatado pelo Senhor Desembargador Moisés Silva, disponível in sitewww.dgsi.pt.o qual o tribunal recorrido segue de perto, que o dano emergente consiste no dano causado nos bens ou nos direito já existentes na esfera jurídica do sinistrado à data do acidente e conduzem à desvalorização do património. Veículo em que se deslocava danificado, roupa e objetos pessoais rasgados ou perdidos. 
39. Ao que ora interessa, o autor pretende, aquém do já supra referido, uma indemnização correspondente ao valor necessário para a reparação da viatura, modalidade esta que ainda se integra no campo da reconstituição natural. 
40. Porém alega a ré recorrente que essa reconstituição natural nos termos pretendidos pelo autor recorrido não pode proceder, ancorando o seu conceito de justa indemnização no regime previsto no artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 291/2007 de 21/08, que rege sobre a "perda total" da viatura. 
41. Decorre então da norma em apreço, e erroneamente defendida pela ré recorrente, que o veículo sinistrado fica em situação de perda total, quando «o valor estimado para a reparação dos danos sofridos, adicionado do valor do salvado, ultrapassa 100% ou 120% do valor venal do veículo consoante se trate respetivamente de um veículo com menos ou mais de dois anos.» Nesse caso, a obrigação de indemnização, defende a ré recorrente, é cumprida em dinheiro e não através de reparação, de acordo com o n.º 1 do normativo invocado. 
42. E isto porque, é entendimento pacífico na jurisprudência que este regime valerá para os procedimentos a adotar pelas empresas de seguros na fixação de prazos com vista à regularização rápida de litígios e do estabelecimento de principio base na gestão de sinistros com vista à apresentação de uma "proposta razoável", mas já não na fase judicial, em que regem as regras e princípios gerais da responsabilidade civil e da obrigação de indemnização supra citados, podendo quando muito tais normativos considerarem-se como elementos de referência não vinculativos. 
43. Ou seja, com bem decidiu o douto tribunal a que, em sede judicial vigora o primado da reparação in natura, competindo ao lesado demonstrar, entre o mais, os danos sofridos na sua viatura e o respetivo montante e à seguradora a prova da excessiva onerosidade, suscetível de afastar tal princípio, tendo em conta dois fatores: o preço da reparação e o valor patrimonial do veículo, não o seu valor venal. 
44. A jurisprudência unanimemente afasta o conceito de valor venal do veículo, que no tradicional entendimento das seguradoras, correspondia ao valor comercial do mesmo, considerando-se que este não é justo, posto que o dano sofrido consiste, essencialmente, na diminuição da faculdade de uso do veículo e não na perda do seu valor de troca. 
45. A própria doutrina critica este conceito, considerando que atender-se estritamente ao valor de mercado do bem, no sentido do seu valor de venda, seria converter a responsabilidade civil numa forma de expropriação privada, pelo preço de mercado. 
46. Importa, como bem entendeu o tribunal a quo atender ao custo de substituição do veículo, apurar o valor que mesmo representa para o património do lesado. 
47. Nesta senda, atente-se inclusivamente o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 19/02/2015, disponível in site www.dgsi.pt, relatado pelo Senhor Desembargador Pedro Martins, "se A tem um bem que vale 500 e esse bem é destruído culposamente por B, A tem direito à indemnização pelo valor necessário à compra de um bem que tenta as mesmas característica do destruído (mesma marca, modelo, ano de construção, equipamento, estado de conservação, quilometragem .... ) que é o valor do custo da sua substituição ou o valor de substituição (que alguns também chamam de valor patrimonial) e não pelo valor de mercado do bem (ou valor venal ou comercial). Se o bem fica apenas estragado, A tem direito à reparação da coisa (reconstituição natural) ou, se essa reparação for excessivamente onerosa, à indemnização pelo valor de substituição (indemnização por dinheiro ou por equivalente)." 
48. Pelo que, defendeu o tribunal a quo que cabe à Seguradora alegar e provar que o autor podia adquirir no mercado, e por que preço, um outro veículo que igualmente lhe satisfizesse as suas necessidades «danificadas». 
49. Assim, compreendeu o douto tribunal recorrido que no que ao caso concreto interessa, a ré recorrente não alegou tal factualidade, segurando-se apenas no conceito de valor venal, o qual é afastado por não corresponder ao tal valor patrimonial ou valor de substituição. 
50. A ré recorrente, baseou-se unicamente no conceito de valor de mercado - desesperadamente invoca agora o valor de custo de uma situação provisória e a imparcialidade das testemunhas que procederam à instrução do processo de averiguação de danos, as quais prestaram e prestam serviços para a mesma ré recorrente, por isso definir tais testemunhas como isentas e idóneas, bem sabendo que os relatórios apresentados foram ao serviço da ré recorrente, é manifestamente forçado, pois jamais testemunhas iriam contrariar de posição defendida pela ré, não obstante o dever de falar com verdade. 
51. O valor de mercado que a ré recorrente indica para fundamentar a excessiva onerosidade da reparação e o afastamento desta é um conceito redutor, afastado pela lei e pela jurisprudência, porquanto o valor de mercado não serve o conceito de valor venal para efeitos do disposto no artigo 41.°, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 291/2007, o que prejudica a validade do cálculo que faz para concluir pela perda total do veículo. 
52. Veja-se que, indo ao encontro desta posição, o próprio Provedor de Justiça, na sua Recomendação 2/B/2009, datada de 29/05/2009, onde aconselhou "a empresa de seguros, ao propor a regularização de um sinistro com base no conceito de perda total, não se limitar a indicar o valor da indemnização por perda total, indicando, outrossim, a disponibilidade no mercado de veículo automóvel com características similares às do veículo sinistrado e que franqueie ao lesado uma utilização comparável à que este proporcionava." 
53. Por conseguinte, refere a douta sentença que a recorrente não seguiu esta recomendação, como facilmente se retira das missivas endereçadas ao autor e juntas aos autos. Bem como a recorrente ré não provou, pese embora invoque o inverso, o valor venal da viatura sinistrada. 
54. Isto porque, curiosamente a testemunha ouvida em audiência de discussão e julgamento, L, em momento algum identificou um veículo com características pelo menos semelhantes ao veículo sinistrado, cfr. depoimento prestado no dia 15.02.2016, registado em ata com início da gravação 00:00:01; fim da gravação 00:41:45: pelas 10:49:42, nas passagens 00:02:12 até 00:05:29 e 00:34:16 até 00:35:58: 
55. Assim, é certo que a ré recorrente não provou o valor venal da viatura sinistrada. Ou seja, se a pretensão da ré recorrente claudicaria até que tivesse demonstrado o valor venal que alegou, o certo é que nem isso logrou fazer. 
56. Por outro lado, o afastamento da restauração natural pressupõe como explanado supra, a excessiva onerosidade e foi entendimento do tribunal, do qual sufragamos, que nem isso, da mera alegação da ré resulta. 
57. A propósito deste conceito, atente-se a jurisprudência vertida no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21/04/2010, relatado pelo Senhor Doutor Juiz Conselheiro Garcia Calejo, disponível in site www.dgsi.pt.de que "(..) em relação a um veículo automóvel acidentado, sendo a sua reparação integral possível, deve privilegiar-se a sua reconstituição natural, exceto se, se revelar excessivamente onerosa, o que corresponde a que o encargo seja exagerado, desmedido, desajustado para o obrigado, transcendo-se os limites de uma legítima indemnização." 
58. Na situação em mãos, entendeu o tribunal recorrido, que a ré recorrente alegava que a viatura tinha um valor de mercado de 4.500,00 Euros (Quatro mil e quinhentos euros) e que a reparação importava a quantia de 10.328,42 Euros (Dez mil trezentos e vinte e oito euros e quarenta e dois cêntimos). Ou seja, a reparação era superior ao dobro, mas inferior ao triplo, do valor apontado como de mercado do veículo. 
59. Ora, entendeu então a Meritíssima Juiz do tribunal de primeira instância que tal diferença não permite representar excessiva onerosidade da restauração natural, dado que, da alegação da ré não resultou quanto é que o autor precisava para adquirir uma viatura semelhante à sua de molde a poder concluir o tribunal recorrido que existiria desproporção clamorosa entre o valor de substituição e o valor da reparação. 
60. O tribunal recorrido adotou assim, posição semelhante à consagrada no Acórdão da Relação do Porto, datada de 16/03/2015, relatado pelo Senhor Doutor Desembargador Carlos Gil, disponível in site www.dgsi.pt e sobejamente defendido pelo autor recorrido, em cujo sumário consta, "( ... ) não obstante o custo da reparação do veículo sinistrado ser superior ao dobro do seu valor comercial, não se pode concluir pela excessiva onerosidade da reconstituição natural se não demonstrou que o referido valor comercial permite a aquisição de um veículo de características similares ao acidentado." 
61. Bem como, posição semelhante ainda à consagrada no Acórdão da Relação de Guimarães, datado de 23/04/2015, decidido por unanimidade e relatado pelo Senhor Doutor Juiz Desembargador Espinheira Baltar, disponível in sitewww.dgsi.ptno qual pode ser-se que: "A jurisprudência dominante nos tribunais superiores vai no sentido de que o artigo 41.º do Decreto-Lei de 21 de Agosto se enquadra num conjunto de regras e procedimentos que as seguradoras deverão tomar, na fase extrajudicial, para apresentarem uma proposta razoável ao credor, em caso de acidente rodoviário, não substituindo as regras gerais do cálculo da indemnização previstas nos artigos 562.º a 572.º do Código Civil. 
A doutrina e a jurisprudência consideram que a prestação é excessivamente onerosa quando haja uma desproporção flagrante, manifesta, entre o interesse do credor na reconstituição e o custo da reparação que se impõe ao devedor." 
62. Portanto, foi entendimento do tribunal recorrido, o qual defendemos, que independentemente da sua demonstração, a matéria alegada assomava insuficiente para concretizar a excessiva onerosidade e afastar o direito à reparação. 
63. Pelo que, não comprovada a excessiva onerosidade e demonstrado que está o valor dos danos pelo autor, tem este autor direito ao preço correspondente ao preço da reparação da viatura sinistrada, de 10.328,42 Euros (Dez mil trezentos e vinte e oito euros e quarenta e dois cêntimos). 
64. Como última nota, louva-se ainda o exposto pela Meritíssima Juiz do tribunal a quo no sentido de que, a indemnização pelo valor de reparação consubstancia ainda uma forma de reconstituição natural a que o autor recorrido tem direito e que não é afastada por ele ter adquirido uma outra viatura - e temporariamente ter remediado a situação, com substituição de peças, pois o dano continuou a existir. Na verdade, o dano existiu e existe e impõe-se a sua reparação mediante a atribuição do valor necessário à sua reparação ou, pelo menos, à obtenção de uma viatura com características idênticas à sinistrada. 
65. Aliás, o tribunal a quo vai ainda mais longe, referindo atentamente que face à recusa da Ré recorrente em proceder à reparação do veículo sinistrado, a atitude do auto em obter viatura idêntica mostra-se perfeitamente compreensível e legítima, servindo até para atenuar outros danos pelos quais a ré recorrente poderia ser igualmente responsável, nomeadamente, ao nível da privação do uso veículo, por valor manifestamente superior, não fosse a resolução da situação. 
66. Concomitantemente, não deve claramente ser aditado ou mesmo acrescentado qualquer facto à matéria de facto provada, mormente com a redação: "O valor de mercado da viatura referida em 1) era de 5.800,00." 
67. Face ao exposto, entende o Autor recorrido J que não assiste qualquer razão à Recorrente seguradora, porquanto a douta sentença recorrida apreciou e julgou concretamente os factos e o direito aplicável, 
68. Sintetizando, a douta sentença recorrida deve ser mantida e sufragada pelo Tribunal da Relação de Guimarães.”
***O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
	Foram colhidos os vistos legais.

***
II- Âmbito do recurso.
Delimitado como está o recurso pelas conclusões das alegações, sem prejuízo de e em relação às mesmas não estar o tribunal sujeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito nem limitado ao conhecimento das questões de que cumpra oficiosamente conhecer – vide artigos 5º n.º 3, 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3 do CPC – resulta das formuladas pelos apelantes serem as seguintes as questões a apreciar:
 1) erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto;
 2) erro na aplicação do direito, como consequência da pugnada alteração da decisão da matéria de facto.
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III- Fundamentação
Foram dados como provados os seguintes factos:
“1) No dia 15 de Novembro do ano de 2014, pelas 13H50m, no concelho de Macedo de Cavaleiros, J conduzia a viatura com a matrícula FT, propriedade do Autor J, na Estrada Nacional 102, no sentido Grijó/Macedo de Cavaleiros.
2) Quando é surpreendido pela presença do veículo JA, conduzido por M, que seguia no sentido Macedo de Cavaleiro/Grijó e, após descrever a curva aí existente, entra em total despiste, invade a faixa de rodagem contrária e vai embater bruscamente na lateral esquerda do veículo FT.
3) À data referida em 1) a responsabilidade civil por danos resultantes da circulação do veículo automóvel de matrícula JA estava transferida para a Ré através da apólice n.º 0000510996, sendo a condutora M quem o segurava.
4) A ré enviou ao autor a missiva de 4/12/2014, de fls. 23, cujo teor damos por integralmente reproduzido, com o seguinte teor:
“[…] No seguimento da vistoria efetuada constatámos que a viatura de V. Exa. sofreu danos cuja reparação se torna excessivamente onerosa face ao seu valor de mercado antes do acidente.
Na situação em concreto, considerando o valor estimado para a reparação €10.328,42 na oficina António e Fernandes Rep. Automóveis, Lda., a melhor proposta de aquisição da sua viatura com danos (€1.875,00), bem como o seu valor de mercado antes do acidente (€4.500,00), e embora ainda não nos seja possível assumir uma posição quanto a responsabilidades, propomos condicionalmente a quantia de €2.625,00 solicitando que nos remeta fotocópias do bilhete de identidade, cartão de contribuinte do proprietário e documentos da viatura […]”.
5) Após, a ré veio assumir junto do autor a responsabilidade pela regularização dos danos decorrentes do sinistro por carta de 12/12/2014, constante de fls., 25, cujo teor damos por integralmente reproduzindo, oferecendo-lhe o valor de €2.625,00, acrescido do veículo com danos.
6)Como  consequência  do  sinistro,  resultaram  danos  para  a  viatura  cuja  reparação  orça os €10.328,42 [dez mil trezentos e vinte e oito euros e quarenta e dois cêntimos].
7) Ainda em consequência do sinistro, a viatura do autor sofreu uma desvalorização.
8) Colocado o salvado da viatura referida em 1) em leilão, a ré obteve como melhor proposta o montante de €1.875,00.
9) O autor adquiriu a viatura referida em 1) em janeiro de 2010, usando-a nas deslocações normais do quotidiano e para a agricultura, mormente, para a apanha da azeitona.
10) À data do acidente, a mesma estava em normal estado de conservação e tinha de 252.131 quilómetros percorridos.
11) A partir de 15/11/2014 a 17/12/2014, por estar privado do uso da sua viatura em consequência  do  acidente,  alugou  uma  viatura  pela  qual  desembolsou  a  quantia  de €1.162,35 [mil cento e sessenta e dois euros e trinta e cinco cêntimos].
12) Após, o autor adquiriu um veículo da mesma marca e modelo da viatura referida em 1) com  a matrícula HX, tendo registado essa aquisição em 16 de janeiro de 2015.
13) Em 25/8/2015 cancelou a matrícula do veículo referido em 1).
14) Mostra-se registada a favor do autor uma viatura todo-o-terreno, marca UMM 4x4, com a matrícula OX.”

***
O tribunal a quo deu ainda como não provada a seguinte factualidade

“B.	Factos não provados
Com relevo para a decisão da causa ficou por demonstrar:
a) O valor de mercado da viatura referida em 1) fosse de €4.500,00;
b) A viatura desvalorizou em €1.000,00 por força do sinistro.”
*
***

Conhecendo.
1)Em função do supra decidido, cumpre apreciar a decisão da matéria de facto.
Na reapreciação da matéria de facto – vide nº 1 do artigo 662ºdo CPC - a modificação da decisão de facto é um dever para a Relação, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou a junção de documento superveniente impuser diversa decisão.
Tendo presente que o princípio da livre apreciação das provas continua a ser a base, nomeadamente quando em causa estão documentos sem valor probatório pleno; relatórios periciais; depoimentos das testemunhas e declarações de parte [vide art.os 341º. a 396º. do Código Civil (C.C.) e 607.º, n.os  4 e 5 e ainda 466.º, n.º 3 (quanto às declarações de parte) do C.P.C.],  cabe ao tribunal da Relação formar a sua própria convicção mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou que se mostrem acessíveis. Fazendo ainda [vide António S. Geraldes in “Recursos no Novo Código do Processo Civil, 2ª ed. 2014, anotação ao artigo 662º do CPC, págs. 229 e segs. que aqui seguimos como referência]:
- uso de presunções judiciais – “ilações que a lei ou julgador tira de um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido” (vide artigo 349º do CC), sem prejuízo do disposto no artigo 351º do CC, enquanto mecanismo valorativo de outros meios de prova;
- ou extraindo de factos apurados presunções legais impostas pelas regras da experiência em conformidade com o disposto no artigo 607º n.º 4 última parte (aqui sem que possa contrariar outros factos não objeto de impugnação e considerados como provados pela 1ª instância);
- levando em consideração, sem dependência da iniciativa da parte, os factos admitidos por acordo, os provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito por força do disposto no artigo  607º n.º 4 do CPC (norma que define as regras de elaboração da sentença) ex vi artigo 663º do CPC (norma que define as regras de elaboração do Acórdão e que para o disposto nos artigos 607º a 612º do CPC remete, na parte aplicável). 
Importa ainda relembrar que os recursos visam o reexame das decisões proferidas em 1ª instância, motivo porque o objeto de recurso está limitado pelas questões que foram sujeitas a apreciação ao tribunal recorrido.
O mesmo é dizer que ao tribunal de recurso está vedado o conhecimento de questões novas anteriormente não apreciadas pelo tribunal a quo, salvo em situações limitadas e expressamente consagradas como por exemplo no caso de ocorrer alteração ou ampliação do pedido em 2ª instância (artigo 264º do CPC) ou de se impor o conhecimento oficioso de exceção ainda não decidida com trânsito em julgado [cfr. Ac. STJ, Relatora Ana Geraldes de 17/11/2016 in www.dgsi.pt/jstj ] .
Tal como referido no Ac. ora citado, em obediência ao princípio da concentração da defesa e da preclusão que se extraem do artigo 573º n.º 1 do CPC o qual preceitua que “a defesa deve ser deduzida na contestação, excetuados os incidentes que a lei manda deduzir em separado”, está o R. obrigado a deduzir todos os meios de defesa que entenda por pertinentes na respetiva contestação, não o podendo fazer posteriormente salvo quando se esteja perante exceções ou meios de defesa supervenientes, entendidos estes como aqueles que abarcam:
“a) quer os casos em que os factos em que eles se baseiam se verificam supervenientemente (superveniência objetiva), quer aqueles em que esses factos são anteriores à contestação, mas só posteriormente se tornam conhecidos pelo Réu (superveniência subjetiva), devendo em ambos os casos ser alegados em articulado superveniente (art. 588.º, nº 2, do NCPC); 
b) os meios de defesa de que o Tribunal pode conhecer oficiosamente, abrangendo a impugnação de direito (art. 5.º, nº 3, do NCPC) e a maioria das exceções dilatórias (art. 578.º do NCPC) e perentórias (art.º 579.º do NCPC), sem prejuízo de os factos em que as exceções se baseiem só poderem ser introduzidos no processo pelas partes (salvo nos casos excecionais em que é permitido o seu conhecimento oficioso: art. 412.º do NCPC), na fase dos articulados ou com os limites definidos para a alegação de facto em articulado superveniente.[5]” .
Mais e na medida em que os recursos visam, por via da modificação de decisão antes proferida reapreciar a pretensão dos recorrentes por forma a validar o juízo de existência ou inexistência do direito reclamado, temos igualmente de concluir que a reapreciação da matéria de facto está limitada ao efeito útil que da mesma possa provir para os autos, em função do objeto processual delineado pelas partes e assim já antes submetido a apreciação pelo tribunal a quo [vide neste sentido Acs. deste TRGde 12/07/2016, Relator Jorge Seabra e de 15/12/2016, Relatora Maria João Matos, ambos inwww.dgsi.pt/jtrg].

A recorrente cumpriu o seu ónus de alegação e formulação de conclusões, indicando os fundamentos por que pede a alteração da decisão – artigo 639º n.º 1 do CPC – na certeza de que estas têm a função de delimitar o objeto do recurso conforme se extrai do n.º 3 do artigo 635º do CPC.
Estando em causa a impugnação da matéria de facto, observou ainda a recorrente o ónus de especificação que lhe é imposto, sob pena de rejeição, do artigo 640º n.º 1 do CPC.
*
Analisadas as conclusões formuladas pela recorrente conclui-se que a mesmo pugna:
- pela alteração da redação dada ao n.º 11 (conclusões 2 a 9) e 12 (conclusões 10 a 13) dos factos provados;
- pelaeliminação da al. a) dos factos provados e sua passagem para os factos provados, sugerindo ainda uma redação subsidiária para tal alínea (vide conclusões 17 a 19).
*
Tendo presentes os considerandos supra expendidos quanto aos poderes do tribunal na reapreciação da matéria de facto, resulta que e no que ao n.º 12) dos factos provados concerne, a recorrente pretende introduzir neste facto um elemento que não foi alegado nos articulados e como tal sobre o mesmo o tribunal não se pronunciou, constituindo como tal questão nova. Para além de e em função do objeto processual para o mesmo não ter relevo jurídico.
Com efeito e quanto ao facto 12) o tribunal a quo deu como provado:
- “12) Após, o autor adquiriu um veículo da mesma marca e modelo da viatura referida em 1) com  a matrícula HX, tendo registado essa aquisição em 16 de janeiro de 2015.”.
Por sua vez a recorrente pugna pela alteração desta redação, por forma a do mesmo ficar a constar
-“12) Após, o autor adquiriu um veículo da mesma marca e modelo da viatura referida em 1) com  a matrícula HX, tendo registado essa aquisição em 16 de janeiro de 2015, pelo qual pagou o montante de € 2.000,00 e no qual instalou o motor da viatura acidentada.”.
	A alteração pretendida (a negrito) corresponde a factualidade que pela R. não foi invocada em sede de contestação.
	E ainda que se possa dizer que a mesma resultou apurada da discussão dos factos, como a recorrente o alegou, facto é que esta factualidade não tem para a discussão jurídica relevo.
	Note-se que o A. na sua petição elencou como prejuízos indemnizáveis os danos provocados na sua viatura – matrícula FT - correspondentes ao valor de reparação (este aceite pela R.); o valor correspondente ao prejuízo pela privação do uso da viatura e ainda o valor correspondente à desvalorização que o seu veículo sofreu (decorrente do embate).
	A recorrente na sua contestação contrapôs que o veículo do A. FT atento o seu valor de mercado e o valor de reparação, se encontrava em situação de perda total, motivo porque propôs ao A. uma indemnização correspondente à diferença entre o valor de mercado da viatura à data e o valor do salvado que este não aceitou.
	Concluiu assim não ter o A. direito a receber o valor da reparação do veículo.
	Reparação que mais contrapôs o A. já não teria interesse, atenta a sua aquisição posterior de um outro veículo da mesma marca e modelo – HX- que registou em seu nome, tendo por outro lado cancelado a matrícula do FT.
	No que ao pedido do A. de indemnização correspondente ao valor da reparação, nada mais alegou a R..
	O mesmo é dizer que as questões suscitadas pela R. em sede de alegações de recurso com vista a justificar a inclusão no n.º 12) dos factos provados da factualidade nova referente ao HX [por esta via pretendendo justificar a sua conclusão de que o único prejuízo do autor corresponde ao valor de aquisição deste HX – os mencionados € 2.000,00] para além de ser questão não submetida à apreciação do tribunal a quo por tal se apresentando como questão nova, é ainda e por tal destituída de relevo jurídico para o objeto processual delineado pelas partes por visar justificar uma outra via defensiva, não invocada oportunamente na contestação.
	Termos em que se conclui pela inadmissibilidade da apreciação da questão suscitada, em respeito pelo disposto no artigo 608º n.º 2 do CPC.
***
Releva portanto reapreciar as seguintes questões, tendo presentes os depoimentos testemunhais que foram ouvidos e a prova documental:

A)quanto ao facto 11) o tribunal a quo deu como provado:
“11) A partir de 15/11/2014 a 17/12/2014,o autor  por estar privado do uso da sua viatura em consequência  do  acidente,  alugou  uma  viatura  pela  qual  desembolsou  a  quantia  de €1.162,35 [mil cento e sessenta e dois euros e trinta e cinco cêntimos].
Por sua vez a recorrente pugna pela alteração desta redação, por forma a do mesmo ficar a constar
- “11) A partir de 15/11/2014 a 17/12/2014,o autor alugou  uma  viatura, tendo o custo de tal aluguer sido suportado por uma empresa de mediação de seguros.”(a negrito estando a alteração pretendida, para além da eliminação do 2º segmento do ponto 11 dos factos provados)

Para justificar a convicção formada sobre este ponto convocou o tribunal a quo os depoimentos de A; L e J, conjugado com o  doc.de fls. 27 – fatura e recibo  relativos ao aluguer de uma viatura de 17/11/2014 [certamente por lapso é referido o dia 15, mas o doc. em causa menciona 17] a 17/12/2014 em nome de J aqui A. no valor de € 1.162,35.
Contrapôs a recorrente nomeadamente que a viatura alugada não seria a mais adequada às necessidades profissionais do autor por este habitualmente utilizar um jipe e o veículo alugado ser um Opel, conforme depoimento de A; mais alega que o A. não provou efetivamente que alugou o referido veículo [nomeadamente invocando que quem pagou a fatura foi a empresa de mediação conforme depoimento de L, fatura cujo valor probatório questiona] e que se o fez teria sido por outros interesses que nada têm a ver com o sinistro, como aliás alega resulta dos depoimentos das testemunhas arroladas pelo autor, nomeadamente L e J.
Para além de que sendo proprietário de outra viatura não necessitava de alugar um outro veículo.
Ouvidos os depoimentos em questão é de afastar de forma clara as referências da R. recorrente:
- quer quanto ao depoimento de L, o qual de forma clara afirmou o pagamento do aluguer por parte do A., tendo explicado, evidenciando conhecimento direto, que o A. foi à sua agência (sua e do pai) tendo pedido ao pai que procedesse ao pagamento, para o que deixou o dinheiro respetivo (nem se entenderia qual a justificação de ser a agencia de seguros a fazer tal pagamento) o que o pai satisfez, após o que entregou a fatura e recibo ao A. de fls. 27 dos autos [note-se que o valor probatório desta é valorada livremente pelo tribunal nos termos dos artigos 366º do CC e 607º n.º 5 do CPC, dada a sua natureza de documento particular de terceiro (vide 363º n.º 2 a contrario do CC)]; explicou ainda esta testemunha que o aluguer foi efetuado na oficina Fernandes, sita próximo da sua agencia, por ser a única que em Macedo de Cavaleiros presta este serviço; mais explicou que tentaram alugar um jipe – dada a utilização que o A. com ele fazia também na sua vida profissional de agricultor – mas como não havia, foi alugado o Opel Corsa que a testemunha A confirmou ser um comercial de 2 lugares; finalmente confirmou a falta que ao A. fazia o veículo FT por ser por ele utilizado no dia-a-dia, incluindo na atividade profissional.
Explicou que o A. tinha ainda um trator que utilizava na sua atividade agrícola, que naquela altura chegou a transportar nele azeitona (apesar de demorar muito mais tempo e apanhar frio) quando antes o fazia com o jipe a que associava um atrelado; sem prejuízo de existirem atividades que com o trator não podia fazer, desde logo levar e trazer trabalhadores. Evidente resulta assim a necessidade de outro veículo em substituição do sinistrado;
Sobre a propriedade e utilização pelo autor do OX, não tendo este depoimento sido claro.
- Quer quanto ao depoimentode  J, o qual em suma confirmou a falta do FT para a atividade agrícola do A.; disse ser este seu vizinho, vendo-o a usar o FT todos os dias até que e com o acidente teve um carro alugado. Mais tarde tendo comprado outro jipe.
Explicou que o OX pertence / só é utilizado pelo filho do A. e sendo seu vizinho nunca o viu – a ele autor -  a utilizar o OX. Sobre esta não utilização nenhuma testemunha tendo prestado qualquer declaração que o infirmasse.
Assim ficando por demonstrar que o OX fosse solução alternativa e válida para o A..
Neste contexto afasta-se a afirmação da R. de que estes depoimentos colocaram em questão quer o efetivo pagamento do aluguer quer a necessidade do mesmo, como consequência do acidente.
Por tal aderimos neste ponto à motivação do tribunal a quo que nenhuma  censura merece, concluindo pela manutenção da redação dada ao ponto 11) dos factos provados, apenas com a retificação – pelo que se nos afigura ser um manifesto lapso de escrita – de que a data do aluguer foi de 17/11/2014 a 17/12/2014, conforme consta da fatura de fls. 27.

B)quanto à eliminação da al. a) dos factos provados cujo teor é:
“a) O valor de mercado da viatura referida em 1) fosse de €4.500,00;”
Pugnou a recorrente pela eliminação desta alínea nos factos não provados, devendo ser introduzido nos factos provados um novo número com a seguinte redação:
- “a) O valor de mercado da viatura referida em 1) era de €4.500,00;”
ou subsidiariamente
- “a) O valor de mercado da viatura referida em 1) era de €5.800,00;”

Conforme o tribunal a quo realçou, foram neste ponto prestados depoimentos testemunhais denotando afastamento neste ponto.
Assim e de um lado o Sr. perito avaliador L emitiu ser sua opinião que o valor comercial do veículo era à data do sinistro de 4500 euros; justificou-o com base em consulta que fez na net e com comerciantes; apresentou duas consultas da net – no stand virtual – relativa a veículos similares – marca e modelo, mas em versões mais recentes, dos anos de 98 e 99 por 5500 e 5900 euros respetivamente; desvalorizou o facto de a motorização do FT ser 2800 contra a de 2500 (observação que a testemunha L havia feito como relevante para o valor da viatura). 
Destes valores concluiu por valor inferior para o FT, atento o facto de ser de 95, sem que fatoresque igualmente costumam ser ponderados como estado de conservação, nº de registos de proprietários, eventuais extras ou outros elementos diferenciadores do FT em contraposição às duas consultas da net tivessemsido mencionados e assim ponderados.
Certo sendo ainda que e conforme referido pelo tribunal a quo não deu nota o Sr. perito de ter aferido e ou apurado em concreto o valor de veículos de idênticas caraterísticas ao FT.
Por outro lado a testemunha L, embora não perito avaliador explicou que enquanto agente de seguros faz parte do seu trabalho também dar opinião sobre o valor dos veículos para efeitos de seguro pelo que justificou ter neste campo experiência. E neste contexto foi veemente em afastar o valor atribuído pela seguradora de 4.500,00 que qualificou de muito baixo, tendo emitido a opinião de o FT valer então cerca de 7.000/8.000 euros.
Opinião de valor aproximado foi emitida pela testemunha M que vendeu o OX ao A.  o qual referiu que não teria vendido o OX – do mesmo modelo e marca do FT – ao A. por valor inferior a € 7.000,00, se este não tivesse o motor estragado (veículo que tinha adquirido para si em 2008 por 10.000,00 euros, conforme o disse).
Neste contexto, atentos os moldes em que o perito avaliador efetuou a sua avaliação e explicou ao tribunal, no confronto com o declarado pelas outras duas testemunhas acima referidas, entende-se ser igualmente neste ponto de aderir à fundamentação do tribunal a quo que nenhuma censura merece, concluindo pela manutenção da redação dada à al. ) dos factos não provados, que se mantém nos mesmos termos pois dos mesmos não foi produzida prova cabal – nem por referência o valor de € 4.500,00 nem do valor superior de € 5.800,00.
Improcede assim a pretensão de introdução de novo facto nos factos provados.
Em suma conclui-se pela improcedência da pretensão da R. recorrente em sede de reapreciação da matéria de facto.
*
 Do direito.
Em função do acima decidido, cumpre apreciar de direito, sendo certo que o tribunal não está vinculado às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito [vide artigo 5º nº 3 do CPC], sem prejuízo do limite imposto pelo artigo 609º quanto ao objeto e quantidade do pedido.
Pugnou a recorrente pela parcial revogação da decisão em recurso, na parte em que a condenou a indemnizar o A.:
- pelo valor correspondente ao do aluguer da viatura [11) dos factos provados] e pelo tribunal a quo enquadrado no dano decorrente da privação de uso.
Fundou esta sua pretensão na pressuposta alteração da matéria de facto, nomeadamente na alteração do ponto 11) dos factos provados.
Tendo esta improcedido esta igualmente improcede a pretensão da recorrente neste ponto.
Note-se que a alegação e prova da existência de um outro veículo registado em nome do A. só por si não demonstra a desnecessidade de o A. ter recorrido ao aluguer de um outro veículo.
E à R. incumbia fazer prova de tal, ónus que não logrou cumprir.
Tal questão foi devidamente valorada em sede de matéria de facto por referência à peticionada alteração da resposta dada ao ponto 11) dos factos provados, único meio de afastar a obrigação de indemnização nos termos apreciados de forma correta pelo tribunal a quo e em relação ao que nada mais se nos oferece dizer, até porque a recorrente nada mais alegou nesse sentido.
- pelo valor correspondente à reparação do FT.
Para este efeito fundou a sua pretensão igualmente na prévia alteração de parte do n.º 12) dos factos provados. Pretensão logo abinitio indeferida, nos termos acima assinalados
E ainda na alteração da resposta dada em a) dos factos não provados e sua passagem para os provados, nos termos por si propostos e acima analisados.
Também aqui improcedeu a pretensão da recorrente.
Ora a pretendida alteração da recorrente quanto a este valor indemnizatório partia, por um lado da prova de que o FT à data do acidente tinha um valor de mercado de € 4.500,00, ou subsidiariamente € 5.800,00; sendo o valor do salvado de € 1.875,00, a implicar a redução do valor indemnizatório à diferença entre um e outro por se tratar de veículo com perda total para efeitos do artigo 41º do DL 291/2007. Cuja reparação assim se não justifica e afirma o A. ao valor da mesma não tem direito.
Reparação que igualmente alegou o A. à mesma não ter interesse, na medida em que cancelou até a matrícula do FT e adquiriu um outro veículo.
Em função da não alteração dos factos provados e não provados pretendida pela recorrente, igualmente improcede esta sua pretensão.
Porque em sede de alegações de recurso alegou a recorrente que o cancelamento da matrícula e a compra de outro veículo implicam desinteresse do A. na reparação do FT, não fazendo sentido condenar a recorrente a pagar ao A. a reparação do veículo quando o autor o substituiu por um igual, ainda que de forma breve teceremos neste ponto algumas observações.

Ao pedido nos autos formulado subjaz a responsabilidade civil emergente de acidente de viação.
A culpa na produção do acidente foi desde o início aceite pela R. seguradora em relação ao seu segurado, motivo porque aceitou a obrigação de indemnizar o A. na medida dos seus danos.
É o quantum indemnizatório a causa do litígio, que em sede de recurso continua a motivar as partes, conforme se extrai das suas conclusões de recurso.
" Para haver obrigação de indemnizar é condição essencial que haja dano, que o facto ilícito culposo tenha causado um prejuízo a alguém", [cfr. A. Varela in "Das Obrigações em Geral" vol. 1º, 5ª ed., p. 557].
Existindo o dano, aquele que estiver obrigado a repará-lo, deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (art.º 562º do C.C.). A lei manda "reconstituir, não a situação anterior à lesão, mas a situação (hipotética) que existiria, se não fora o facto determinante da responsabilidade."Ant. Varela in ob. cit. p. 862.
Nos termos do disposto no art.º 566º n.º 1 do C.C. " A indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor.
2- Sem prejuízo do preceituado noutras disposições, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos." (sublinhado nosso).
Do citado artigo 566º n.º 1 extrai-se como limite da reconstituição natural a partir do qual esta se torna em meio impróprio ou inadequado – in casu está em causa a reparação do FT por forma a colocar o lesado na situação que existiria se não fosse o evento danoso - a excessiva onerosidade para o devedor, entendida esta como a “manifesta desproporção entre o interesse do lesado que importa recompor e o custo que a reparação natural envolve para o responsável”.
 Nestes casos de insuficiência da reconstituição in natura, devendo então a indemnização ser fixada em dinheiro, calculada em função da situação concreta do lesado, tendo como medida a diferença “entre a situação real atual e a situação hipotética correspondente ao mesmo momento” (vide mesmo autor in ob. cit. p. 877/878), em conformidade com o que dispõe o artigo 566º n.º 2 do CC que manda atender à diferença entre situação patrimonial do lesado na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal e a que teria nessa data se não existissem danos.
Assim se o bem fica apenas estragado, tem o lesado direito à sua reparação – reconstituição in natura.
Porém se esta reparação for excessivamente onerosa ou o bem sofrer perda total, terá o lesado direito a uma indemnização.
Discutido na jurisprudência bem como na doutrina se para efeitos indemnizatórios e no caso de impossibilidade da reconstituição natural se deve atender ao valor venal (ou seja comercial) do bem danificado (in casu o FT) ou antes ao seu valor de substituição (ou patrimonial), tem de forma reiterada vindo a ser entendido como critério orientador adotado o valor de substituição, igualmente identificado como valor patrimonial, porquanto só assim e numa interpretação mais conforme ao disposto no artigo 566º n.º 2 do CC os interesses do lesado são devidamente salvaguardados [cfr. neste sentido Ac. STJ de 21/02/2006 in CJ – ACSTJ T I, p. 83/84, Relator Ferreira Girão; Ac. STJ 04/12/2007, Relator Pires da Rosa, Ac. TRG de 21/05/2015, Relatora Ana Cristina Duarte e Ac. TRP de 19/02/2015, Relator Pedro Martins todos in http://www.dgsi.pt/ neste último se fazendo uma resenha jurisprudencial (onde entre outros é citado o Ac. do STJ de 2006 acima referido)  e doutrinária sobre este assunto].
Em conformidade com este entendimento veio (aliás) no pela R. invocado artigo 41º DL 291/2007 [o qual aprovou o regime do sistema do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel e transpôs parcialmente para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2005/14/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Maio, que altera as Diretivas n.ºs 72/166/CEE, 84/5/CEE, 88/357/CEE e 90/232/CEE, do Conselho, e a Diretiva n.º 2000/26/CE, relativas ao seguro de responsabilidade civil resultante da circulação de veículos automóveis] a ser consagrado que:
“2 - O valor venal do veículo antes do sinistro corresponde ao seu valor de substituição no momento anterior ao acidente.” – assimilando aqui o legislador o conceito de “valor venal” a “valor de substituição”.
Este artigo 41º insere-se no capítulo relativo à “Regularização de Sinistros” o qual“fixa as regras e os procedimentos a observar pelas empresas de seguros com vista a garantir, de forma pronta e diligente, a assunção da sua responsabilidade e o pagamento das indemnizações devidas em caso de sinistro no âmbito do seguro de responsabilidade civil automóvel.” (vide artigo 31º do citado DL).
De notar que o procedimento regulado no citado DL visou em sede extrajudicial fornecer critérios objetivos orientadores da proposta a apresentar pela seguradora aos lesados em sede indemnizatória em termos razoáveis, com vista a um possível acordo extrajudicial.
Porém e não sendo possível às partes chegar a um entendimento sobre o quantum indemnizatório, não são, como é comummente aceite, tais regras vinculativas para o tribunal que passará a julgar de acordo com a lei e nomeadamente em respeito às disposições do CC e aos princípios atinentes à responsabilidade civil [vide neste sentido entre outros Ac. STJ de 09/09/2010, Relator João Bernardo e Ac. STJ 06/10/2016, Relator António Piçarra ambos in http:// www.dgsi.pt/jstj].
Assente portanto que em sede indemnizatória e no caso de a reconstituição natural ser excessivamente onerosa (ou impossível), deverá a medida da indemnização ser aferida pelo valor de substituição, importa ainda dilucidar os termos em que a “excessiva onerosidade” deverá ser balizada.
O já citado artigo 41º fornece como critério orientador do conceito de perda total – caso em que igualmente estabelece que a obrigação de indemnização é cumprida em dinheiro e não através da reparação do veículo – entre outras situações, aquela em que:
“c) Se constate que o valor estimado para a reparação dos danos sofridos, adicionado do valor do salvado, ultrapassa 100 % ou 120 % do valor venal do veículo consoante se trate respetivamente de um veículo com menos ou mais de dois anos. “.
Através de um critério objetivo matemático que como já vimos não vincula o tribunal, pretendeu o legislador definir os limites a partir dos quais é afastada a obrigação da reconstituição natural por excessiva onerosidade em sede de regularização de sinistros por via extrajudicial.
Embora se aceite que os limites previstos nesta al. c) poderão servir de ponto de partida e como limite mínimo para a análise desta questão, importa ter presente que a excessiva onerosidade e por referência ao previsto no artigo 566º do CC deverá ser aferida, conforme tem vindo a ser jurisprudencialmente defendido, no caso concreto entre o interesse do lesado à total reparação do veículo (quando possível) e o custo que tal representa para o responsável. Só perante uma manifesta desproporção entre estes dois interesses se devendo entender justificado o afastamento da obrigação da reconstituição natural / in casu a reparação total da viatura.
Assim e na ponderação do interesse do lesado deverão ser levados em consideração, para além do valor da reparação e de substituição do mesmo,fatores como o uso dado ao veículo em questão; a possibilidade de o lesado vir a adquirir veículo idêntico que satisfaça de igual modo as suas necessidades ou até o valor sentimental que o poderá ligar ao veículo [vide neste sentido Ac. TRP de 25/02/2013 Relator Carlos Querido, bem como o Ac. TRG de 21/05/2015 já supra citado in http://www.dgsi.pt e Ac. STJ de 05/07/2007, Relator Santos Bernardino inhttp://www.dgsi.pt/jstj ].
Da parte do devedor sendo de ponderar nomeadamente a repercussão que a reparação natural representará para o seu património.
Tal como sumariado no Ac. do STJ de 05/07/2007 acima citado:
“4. Na ponderação da excessiva onerosidade para o devedor não podem, assim, deixar de ser considerados fatoressubjetivos, respeitantes não só à pessoa deste, e à repercussão do custo da reparação natural no seu património, mas também às condições do lesado, e ao seu justificado interesse específico na reparação do objeto danificado, antes que no percebimento do seu valor em dinheiro.
5. Um veículo já com muito uso pode ter um valor comercial pouco significativo, mas, ainda assim, pode satisfazer as necessidades do dono, enquanto a quantia, muitas vezes irrisória, equivalente ao seu valor de mercado, pode não conduzir à satisfação dessas mesmas necessidades, por não lhe permitir a aquisição de uma viatura da mesma marca, com as mesmas características e com o mesmo uso.”.
Tendo presentes estes considerandos sobre a aferição da “excessiva onerosidade” que afasta a obrigação da reconstituição natural importa reverter ao caso concreto.
Dos factos provados resulta apenas o valor da reparação do FT - € 10.328,42; o valor que a R. ofereceu a título indemnizatório ao A. € 2625,00 que associado ao valor do salvado de € 1875,00 indicado em 8) dos factos provados perfaria o total de € 4500,00; mais está provado que o autor adquiriu o FT em janeiro de 2010, usando-o nas deslocações normais do quotidiano e para a agricultura, mormente na apanha da azeitona, estando à data do acidente em normal estado de conservação e com 252.131 Kms percorridos.
Não resultou, provado qual o valor venal (comercial) do FT à data do acidente, nem qual o seu valor patrimonial / de substituição.
Este elemento era e é essencial para aferir da impossibilidade da reconstituição natural por excessiva onerosidade.
Não se tendo provado este valor e fazendo apelo às regras do ónus probatório – resolvendo-se a dúvida sobre a realidade de um facto contra a parte a quem o facto aproveita (vide artigo 414º do CPC) – temos de concluir que a R. está obrigada a suportar o custo da reparação do FC.
Na verdade à R. incumbia a prova da excessiva onerosidade da reparação, como facto impeditivo do direito do autor à reconstituição natural [cfr. quanto a esta questão do ónus probatório e no sentido por nós pugnado os já citados Acs. STJ de 05/07/2007; Ac. TRP de 25/02/2013 e Ac. TRG de 21/05/2015].
E esta apenas se pode aferir desde logo no confronto entre o valor do veículo à data do acidente/valor de substituição e o valor da reparação.
A esta conclusão em nada afeta quer o cancelamento da matrícula do FT quer a aquisição de outra viatura posteriormente ao acidente de igual marca e modelo.
A obrigação da R. à indemnização, atenta a sua qualidade de seguradora e responsabilidade assente do seu segurado, advém do prejuízo causado no património do autor pela ocorrência do acidente e a obrigação de indemnizar o correspondente prejuízo, aferido este nos termos supra analisados.
O facto de o autor ter cancelado a matrícula ou adquirido outro carro – independentemente do valor de aquisição deste – em nada afasta tal obrigação.
Improcede assim a pretensão da recorrente no que respeita à alteração da sua condenação ao pagamento do valor de reparação do FT que como tal se mantém.
De qualquer modo, diga-se ainda que no confronto entre o valor de mercado invocado pela recorrente de € 4.500,00 ou os subsidiariamente invocados € 5.800,00 e o valor da reparação, a ter-se provado aqueles, atenta a demais factualidade alegada e o ónus que sobre a R. impendia de demonstrar a invocada excessiva onerosidade, não seria a prova deste valor no contexto da demais factualidade provada suficiente para considerar observado tal ónus.
Termos em que se julga totalmente improcedente o recurso apresentado pela  recorrente seguradora.
*
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Sumário (artigo 663º n.º 7 do CPC).
1- Ao tribunal de recurso está vedado o conhecimento de questões novas anteriormente não submetidas à apreciação do tribunal a quo.
Por tal não havendo lugar à reapreciação da matéria de facto quando em causa está matéria nova antes não alegada e que visa enquadrar fundamento de defesa antes não invocado pela recorrente, sob pena de violação do princípio da concentração da defesa e da preclusão.
2 –Na reapreciação da matéria de facto o tribunal da Relação fazendo uso dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, apenas deve alterar o decidido pelo tribunal a quo quando verifique erro de julgamento.
3- A obrigação da reconstituição natural em sede indemnizatória só cede perante a indemnização pecuniária em caso de excessiva onerosidade daquela;
4- O conceito de perda total definido pelo artigo 41º do DL 291/2007 para efeitos de afastar a obrigação da reconstituição natural no âmbito da regularização de sinistros por via extrajudicial não é para o tribunal vinculativo;
5- É ónus do obrigado à reparação a prova da excessiva onerosidade da reconstituição natural;

III. Decisão.
Em face do exposto, julga-se o recurso totalmente improcedente, consequentemente se confirmando a sentença recorrida.
Custas da apelaçãopela recorrente.

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Guimarães, 09 de fevereiro de 2017.


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(Maria de Fátima Almeida Andrade)

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(Alexandra Maria Rolim Mendes)

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(Maria Purificação Carvalho)

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório J, melhor id. a fls. 5, instaurou ação declarativa sob a forma de processo comum contra C igualmente melhor id. a fls. 5. Pela procedência da ação peticionou oA. a condenação da R. a pagar-lhe a quantia de €12.490,77, acrescida de juros de mora à taxa legal contados desde a citação até efetivo e integral pagamento. Valoreste correspondente aos danos por si sofridos em consequência de acidente de viação no qual foi interveniente, mas cuja responsabilidade na produção do mesmo imputou ao outro veículo igualmente interveniente e na aqui R. segurado. * Devidamente citada a R., contestou esta em suma tendo aceitea responsabilidade na produção do acidente do veículo por si seguro e impugnado os danos pelo A. elencados e reclamados, sobre estes deduzindo ainda matéria de exceção a que o A. respondeu nos termos de fls. 54 e segs.. Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, identificado o objeto do litígio e elencados os temas da prova. * Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença que julgando a ação parcialmente procedente decidiu: “A. Condenar a ré no pagamento ao autor da quantia de €11.490,77 [onze mil quatrocentos e noventa euros e setenta e sete cêntimos], correspondente à soma do valor da reparação da viatura sinistrada com o prejuízo decorrente da privação da viatura; B. Condenar a ré no pagamento ao autor da quantia que vier a ser liquidada no respetivo incidente de liquidação e que tem como limite máximo o montante de €1.000,00 [mil euros], ao abrigo do disposto no artigo 609.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, por conta da desvalorização sofrida pelo veículo do Autor; C. Condenar a ré no pagamento dos juros moratórios vencidos desde a citação e vincendos até integral pagamento, calculados à taxa legal estabelecida para os juros civis sobre o montante de €11.490,77 [onze mil quatrocentos e noventa euros e setenta e sete cêntimos] e daqueloutro que se vier a apurar em sede de incidente de liquidação nos termos determinados em C.; D. Absolver a ré do demais peticionado.” * Do assim decidido apelou a Ré oferecendo alegações e formulando as seguintes Conclusões: 1) Na Sentença recorrida foi feita uma incorreta interpretação da prova produzida, assim como uma menos precisa interpretação da lei. 2) Não deveria o Tribunal a quo ter dado como provado que, devido ao sinistro do FT, o Autor viu-se obrigado a proceder ao aluguer de uma viatura para substituir o mesmo por modo a satisfazer as necessidades que antes satisfazia com o FT. 3) A fatura que consta dos autos, a ser verdadeira, não cumpre os requisitos legais, não se encontrando nela mencionada a matrícula do veículo alugado, sendo que a quantia na mesma inscrita não foi liquidada pelo Autor mas sim por uma empresa de mediação de seguros, como foi relatado pela testemunha Luís Carlos Martins Sá. 4) Por outro lado, a ser verdade que o referido aluguer existiu, o veículo referente à fatura acima mencionada trata-se de um Opel Corsa de dois lugares, ou seja um veículo ligeiro, com nenhuma característica semelhante ao do sinistrado. 5) Tendo em consideração o uso que era dado pelo Autor ao FT, nunca um veículo com as características de um Opel Corsa de dois lugares o poderia substituir, não sendo o mesmo adequado para ir até ao terrenos onde se fazia a apanha da azeitona, para transportar trabalhadores, e muito menos para transportar o produto da apanha que era entregue na cooperativa por meio de trator, como foi relatado pelas testemunhas L e J. 6) Por fim resultou provado que o Autor era ainda proprietário de um outro veículo jipe, que, mesmo sendo usualmente utilizado pelo seu filho (que estava emigrado em Espanha), estava à sua livre disposição. 7) Assim, utilizando o Autor um trator para o trabalho agrícola e tendo à sua disposição um veículo jipe, que estava registado em seu nome, não se compreende a razão pela qual teve necessidade (se é que teve) de alugar um outro veículo - um ligeiro de mercadorias. 8) Acresce ainda referir que em momento algum do seu depoimento, a testemunha Luís Sá referiu que, apesar de ter sido a sociedade de mediação de seguros em que trabalhava a custear a fatura em apreço, tal quantia foi ou ia ser reclamada do Autor, pelo que não faz qualquer sentido, à falta dessa prova, a condenação da Ré a pagar o que quer que seja, a esse título, ao Autor. 9) A redação do ponto 11 dos factos provados deverá ser alterada para “A partir de 15/11/2014 a 17/12/2017, o Autor alugou uma viatura, tendo o custo de tal aluguer sido suportado por uma empresa de mediação de seguros". 10) Resultou demonstrado que o veículo mencionado no ponto 12 dos factos provados foi adquirido pelo Autor pela quantia de € 2.000,00, assim como que o mesmo se encontrava, à data dessa aquisição, com o motor avariado. 11) Por seu turno, resultou ainda demonstrado que o Autor procedeu à substituição do motor avariado do HX pelo motor do FT. 12) Após esta operação de substituição de motores, o Autor procedeu ao cancelamento da sua matrícula do FT (ponto 13 dos factos provados). 13) Pelo que deverá a redação do ponto 12 dos factos provados ser alterada para: "Após, o Autor adquiriu um veículo da mesma marca e modelo da viatura referida em 1) com a matrícula HX, tendo sido registada essa aquisição em 16 de Fevereiro de 2015, pelo qual pagou o montante de € 2.000,00, e no qual instalou o motor da viatura acidentada" 14) Atenta a aquisição de um veículo da mesma marca e modelo do FT, a substituição dos motores entre os mesmos e o cancelamento da matrícula do FT, dúvidas não restam que o Autor se colocou na posição em que se encontrava antes do acidente, demonstrando ainda um total desinteresse pela reparação do FT que, pura e simplesmente, substituiu por outro veículo. 15) Tendo em conta o valor de aquisição daquele novo veículo, que serviu para substituir o FT - € 2.000,00 - concluiu-se que, por um lado, carece de fundamento a condenação da Ré no pagamento da reparação do FT (que não foi nem vai ser feita) e, por outro, que o valor do prejuízo que o Autor teve ascende a esse mesmo montante de € 2.000,00 (valor despendido na substituição do veículo acidentado por um da mesma marca, modelo e características). 16) Devendo a Sentença, nessa parte, ser revogada e substituída por outra que condene a Ré a pagar ao Autor, a título de prejuízos decorrentes dos danos verificados no FT, o montante de € 2.000,00. 17) O valor venal de € 4.500,00 atribuído ao FT pela Ré afigura-se adequado, uma vez que foi fixado pela testemunha Leonel Rodrigues que, junto de concessionários vendedores deste tipo de veículos e do Stand Virtual, encontrou dois veículos da mesma marca e modelo que o FT, mas de versões mais atualizadas a nível de carroçaria e significativamente com menos Km, sendo um do ano de 1998 e outro de 1999, atribuindo ao primeiro uma desvalorização, decorrente do ano de fabrico e kms. percorridos, de € 1.000,00. 18) Assim não se entendendo, tendo em consideração o valor de venda de veículos da mesma marca e modelo mas mais recentes e de versões mais atualizadas (€ 5.500,00 e € 5.800,00), estava o Tribunal recorrido na posse de elementos mais que suficientes para fixar o valor venal do FT em, no máximo, € 5.800,00. 19) Atento o exposto, deverá ser aditado um ponto à matéria de facto provada com a seguinte redação: "O valor de mercado da viatura referida em 1) era de € 4.500,00." ou, subsidiariamente, "O valor de mercado da viatura referida em 1) era de € 5.800,00." 20) Considerando-se os valores constantes dos pontos 19 ou, subsidiariamente, 20, assim como o valor do salvado, avaliado em € 1.875,00, o montante indemnizatório a atribuir ao Autor deverá ser reduzido para € 2.625,00 ou € 3.925,00. Nestes termos, deverá ser concedido integral provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se nesta parte a Sentença recorrida de acordo com o supra alegado, assim se fazendo Justiça.” * Apresentou o A. contra-alegações, concluindo nos seguintes termos: “1. Resulta das alegações do recurso interposto, bem como das respetivas conclusões, que a Recorrente Companhia de Seguros Tranquilidade S.A., não se conforma com a douta sentença proferida e sindica no recurso interposto a matéria de facto e direito elencadas e desenvolvidas na douta sentença objeto de recurso. 2. A sentença em análise entendeu como provado que o Autor, entre 15/11/2014 e 17/12/2014, por estar privado do uso do veículo PT, em consequência do acidente, alugou uma viatura pela qual desembolsou a quantia de 1.262,35 Euros (Mil cento e sessenta e dois euros e trinta e cinco cêntimos), ponto 11 da matéria de facto assente. 3. A Ré seguradora afirma que tal conclusão foi sustentada no depoimento da testemunha por si arrolada A que, supostamente, terá mencionado que a viatura alugada que consta nos autos, tratava-se de um veículo comercial, "sendo, por isso mais adequada às tarefas agrícolas, nomeadamente, ao transporte de objetos e de produtos agrícolas." 4. Porém, refere a Ré que de facto no âmbito dessa averiguação, entre outras coisas, a testemunha A apurou a existência de um aluguer (porque tal lhe foi reclamado pelo Autor), com a duração de um mês, de uma viatura comercial; no entanto, em momento algum do seu depoimento é referido que a viatura alugada era a mais adequada às tarefas profissionais do Autor. 5. Mais refere a Ré seguradora que pese embora conste dos autos a fatura e recibo desse suposto aluguer, entende que não conseguiu o autor provar ter efetivamente alugado o referido veículo, e se o fez, terá sido certamente por outros motivos/necessidades que nada têm a ver com o sinistro aqui em causa. 6. Respinga também a ré que o autor era à data do acidente, proprietário de uma outra viatura tipo jipe, de matrícula OX, que este tentou convencer que dela não fez uso algum, apesar de a mesma se encontrar à sua livre disposição. 7. Contudo bem entendeu o douto tribunal a quo quando afirmou que, não obstante a ré ter invocado e demonstrado que se encontrava registada em nome do autor uma outra viatura, de onde se presume a sua propriedade, tal não invalida que o autor se tivesse visto forçado a alugar uma outra. 8. Isto porque, importante seria alegar e demonstrar também que essa viatura estava à disposição do autor, que ele a poderia usar e, com isso, satisfazer as suas necessidades, o que não sucedeu. 9. Embora a recorrente se escude no facto de o autor ser proprietário de uma outra viatura, demonstrando-o com base no registo automóvel ou respingando parcialmente os depoimentos da prova testemunhal ouvida em audiência de discussão e julgamento, não alegou ou mesmo demonstrou que permitisse afastar a concreta efetiva necessidade do aluguer, cfr. depoimento prestado no dia 15.02.2016, registado em ata com início da gravação 00:00:01; fim da gravação 00:11:42 pelas 11:33:29, na passagem 00:02:18 até 00:06:09: Ao contrário do retorquido pela recorrente, mormente que a fatura junta aos autos não seria válida ou por outro lado, que a mesma não teria sido liquidada, o certo é que o autor recorrido liquidou o valor referente ao aluguer do veículo em questão, até porque deixou essa quantia na posse do pai da testemunha ouvida L e foi este quem procedeu à sua entrega na oficina onde havia sido feito o aluguer, cfr. depoimento da testemunho L, prestado no dia 15.02.2016, registado em ata com início da gravação 00:00:01; fim da gravação 00:4145:42 pelas 10:49:42, nas passagens 00:10:17 até 00:12:44, 00:18:32 até 00:21:00, 00:26:23 até 00:31:58 e 00:32:09 até 00:34:16: 10. Discorda-se do alegado pela Ré recorrente, mormente que o autor não tenha logrado demonstrar em que circunstância utilizava o veículo alugado. Que interesse teria o autor em proceder ao aluguer desta viatura, que não para utilização nas tarefas anteriormente executadas, como seja, e ficou bem claro, na agricultura. 11. Tendo este aluguer ocorrido exatamente em data posterior ao sinistro do qual o seu veículo foi vítima e logo de seguida, após entrega daquele veículo automóvel, adquirido um outro exatamente igual ao veículo então sinistrado, qual poderia ser um outro interesse do autor recorrido, que não o provado em audiência de discussão e julgamento?! 12. O autor só não teve acesso a um jipe, porque o mesmo não existia na pequena cidade de Macedo de Cavaleiros, não pense a Ré recorrente, que autor estivesse a alugar um veículo na cidade do Porto ou na cidade de Lisboa, onde seguramente a oferta seria manifestamente proporcional às suas necessidades, mas também o preço ora imputado seria claramente superior. 13. Pelo supra exposto, deve manter-se o ponto n.º 11 (Décimo primeiro) da matéria de facto dado como provada, mormente "a partir de 15/11/2014 a 17/12/2014, por estar privado do uso da sua viatura em consequência do acidente, alugou uma viatura pela qual desembolsou a quantia de 1.162,35 Euros (Mil cento e sessenta e dois euros e trinta e cinco cêntimos)." 14. Bem assentou então o tribunal a que, que ficou demonstrado que o recorrido autor recorreu à viatura de substituição por causa da privação da sua viatura entre o período de 15/11/14 a 17/12/2014. A seguradora aqui Recorrente apenas tomou posição, assumindo a sua responsabilidade pelo sinistro por missiva de 12/12/2014, mas apenas oferecendo uma indemnização no valor de 2.625,00 Euros (Dois mil seiscentos e vinte e cinco euros), acrescido do valor do salvado. 15. Bem julgou a sentença recorrida no sentido de que é indemnizável o preço que o autor recorrente suportou por via do respetivo aluguer, enquanto dano emergente do sinistro, cabendo à aqui Ré recorrente a sua reparação. 16. Em amparo desta questão atente-se pois o exposto no recente acórdão desta Ilustre Casa da Justiça, sob o processo n.º 2671/11.3TBBCL.G1, cujo Relator foi a Excelentíssima Senhora Desembargadora Doutora Ana Cristina Duarte, datado de 21/05/15, disponível no site www.dgsi.pt,no qual pode ler-se o seguinte arresto: "( ... ) O uso de um veículo constitui uma vantagem suscetível de avaliação pecuniária, consubstanciando a sua privação um dano que deve ser indemnizado como contrapartida da perda da capacidade de utilização normal do veículo." Por outro lado, 17. Resulta do ponto 12.º (Décimo segundo) dos factos provados que "Após, o Autor adquiriu um veículo da mesma marca e modelo da viatura referida em 1) com a matrícula HX, tendo sido registada essa aquisição em 16 de Fevereiro de 2015." 18. A Ré recorrente entende que a redação do referido ponto dos factos provados deve ser alterada passando a constar: "Após, o Autor adquiriu um veículo da mesma marca e modelo da viatura referida em 1) com a matrícula HX, tendo sido registada essa aquisição em 16 de Fevereiro de 2015, pelo qual pagou o montante de € 2.000,00 (Dois mil euros) e no qual instalou o motor da viatura acidentada." 19. Da prova produzida resultou que o responsável pela avaliação efetuada à viatura sinistrada foi a testemunha L, perito avaliador, que trabalha por conta própria para a ré e assumiu o encargo de estimar e avaliar os danos e o próprio jipe. 20. Segundo a testemunha ouvida, o valor da reparação era bastante superior ao da viatura, concluindo que esta viatura valia cerca de 4.500,00 Euros (Quatro mil e quinhentos euros). Para justificar este alegado valor referiu a testemunha que fez consultas na internet e afirmou que contactou com comerciantes do setor automóvel que vendem este tipo de carros. 21. A testemunha ouvida exibiu em audiência de discussão e julgamento os resultados de duas pesquisas que terá efetuado, através do "stand virtual" e, dessa exibição, assim como daquilo que a própria referiu, resultou que o senhor perito teve como valores de referência os peticionados no stand virtual por viaturas com características distintas da que lhe cabia avaliar. 22. A testemunha L exibiu em audiência de discussão e julgamento documentos - resultado de pesquisas efetuadas - porém todas estas pesquisas respeitavam, curiosamente a modelos de veículos mais recentes, com menos idade e quilómetros, tentando com esta mesma pesquisa fazer concluir que por se estes veículos mais recentes osstands estão a pedir 5.500,00 Euros (Cinco mil e quinhentos euros) a 5.800,00 Euros (Cinco mil e oitocentos euros), a viatura do autor recorrido automaticamente valeria necessariamente menos. 23. Curiosamente, a testemunha não trouxe qualquer documento alusivo ao seu efetivo valor do carro acidentado, ao valor apresentado pela ré recorrente. 24. A testemunha igualmente ouvida, L, referiu que encontrou em stands virtuais veículos como o ora sinistrado, com o valor de comercialização de 8.000,00 Euros (Oito mil euros). 25. Nesta senda, bem entendeu o tribunal a quo que perante todos estes elementos e o critério duvidoso e pouco rigoroso e esclarecedor que presidiu à avaliação da viatura sinistrada, a decisão teve de ser desfavorável à parte sobre quem recaía o ónus probatório, pelo que a matéria foi dada como não provada. 26. Claramente o pedido de reformulação do ponto 12.º (Décimo Segundo) da matéria de facto provada deve ser entendido como não admitido, conquanto a própria ré recorrente admite qual o efetivo valor de reparação do veículo sinistrado propriedade do autor recorrido, que igualmente ficou provado, ainda encontrar por reparar, em posse do autor recorrido. 27. O autor não perdeu o interesse no veículo sinistrado, tão só, aprontou uma solução temporária, face à posição assumida pela Ré recorrente. Quicá entendesse a ré recorrente ser mais conveniente continuar o autor recorrido com um veículo alugado! 28. Desta feita, discorda o Autor da posição da Ré recorrente no sentido de que este tenha tornado a reconstituição natural materialmente impossível, quando retirou o motor do FT que não sofrera qualquer dano, para o instalar num outro veículo, que entretanto, sem alternativa adquiriu. 29. Nem prevalece o facto de o autor recorrido ter cancelado a matrícula do veículo sinistrado, porque nada impede a sua renovação. 30. Esqueceu a ré recorrente que o veículo sinistrado mesmo paralisado teria de liquidar anualmente o imposto de circulação automóvel - situação que o autor recorrido entendeu não despender, cancelando a matrícula em questão. 31. Desta feita, não releva aos autos o facto de o autor recorrido ter adquirido um outro veículo pelo valor de 2.000,00 Euros (Dois mil euros), visto que o prejuízo efetivo do autor recorrido continua a existir, no valor assumido pela própria ré recorrente, ou seja, no veículo sinistrado matrícula FT e não no veículo ulteriormente adquirido de matrícula HX. 32. Ora, ficou provado que o aqui sinistro gerou danos materiais a terceiros, in casu, ao autor recorrido. 33. Daí que, seguindo na esteira o raciocínio da Meritíssima Juiz do tribunal recorrido, caso o autor demonstre tais danos, o que aconteceu e não se verifique exceção ao seu direito de ressarcimento, incumbirá à ré recorrente proceder ao pagamento da indemnização devida pela ocorrência desses danos, nos termos do artigo 43.º, 1, do referido preceito legal, lido conjuntamente com o n.º 1 do artigo 102.º do Decreto-Lei n.º 72/2008 de 16 de Abril. 34. A regra vigente na responsabilidade civil é a da reparação integral dos danos resultantes do facto ilícito, conforme os artigos 562.º e 566.º, n.º 1 do Código Civil. 35. O artigo 562.º do Código Civil defende como princípio, a restauração natural, isto é, a realização de uma prestação específica. Com a indemnização pretende-se então reconstituir a situação anterior à lesão, ou seja, repor as coisas no estado em que estariam, se não fora o facto determinante da responsabilidade, isto é, tornar o lesado, in demne, sem dano. 36. O dano patrimonial mede-se pela diferença entre a situação real atual do sinistrado e a situação hipotética em que ele se encontraria, se não tivesse ocorrido o acidente de viação. 37. No âmbito do direito português, aceita-se pacificamente que a reconstituição natural prevalece sobre a indemnização por equivalente, confirmar artigo 562.º, do Código Civil. 38. A este propósito, de forma clara e cabal, distingue-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 28/02/2013, relatado pelo Senhor Desembargador Moisés Silva, disponível in sitewww.dgsi.pt.o qual o tribunal recorrido segue de perto, que o dano emergente consiste no dano causado nos bens ou nos direito já existentes na esfera jurídica do sinistrado à data do acidente e conduzem à desvalorização do património. Veículo em que se deslocava danificado, roupa e objetos pessoais rasgados ou perdidos. 39. Ao que ora interessa, o autor pretende, aquém do já supra referido, uma indemnização correspondente ao valor necessário para a reparação da viatura, modalidade esta que ainda se integra no campo da reconstituição natural. 40. Porém alega a ré recorrente que essa reconstituição natural nos termos pretendidos pelo autor recorrido não pode proceder, ancorando o seu conceito de justa indemnização no regime previsto no artigo 41.º do Decreto-Lei n.º 291/2007 de 21/08, que rege sobre a "perda total" da viatura. 41. Decorre então da norma em apreço, e erroneamente defendida pela ré recorrente, que o veículo sinistrado fica em situação de perda total, quando «o valor estimado para a reparação dos danos sofridos, adicionado do valor do salvado, ultrapassa 100% ou 120% do valor venal do veículo consoante se trate respetivamente de um veículo com menos ou mais de dois anos.» Nesse caso, a obrigação de indemnização, defende a ré recorrente, é cumprida em dinheiro e não através de reparação, de acordo com o n.º 1 do normativo invocado. 42. E isto porque, é entendimento pacífico na jurisprudência que este regime valerá para os procedimentos a adotar pelas empresas de seguros na fixação de prazos com vista à regularização rápida de litígios e do estabelecimento de principio base na gestão de sinistros com vista à apresentação de uma "proposta razoável", mas já não na fase judicial, em que regem as regras e princípios gerais da responsabilidade civil e da obrigação de indemnização supra citados, podendo quando muito tais normativos considerarem-se como elementos de referência não vinculativos. 43. Ou seja, com bem decidiu o douto tribunal a que, em sede judicial vigora o primado da reparação in natura, competindo ao lesado demonstrar, entre o mais, os danos sofridos na sua viatura e o respetivo montante e à seguradora a prova da excessiva onerosidade, suscetível de afastar tal princípio, tendo em conta dois fatores: o preço da reparação e o valor patrimonial do veículo, não o seu valor venal. 44. A jurisprudência unanimemente afasta o conceito de valor venal do veículo, que no tradicional entendimento das seguradoras, correspondia ao valor comercial do mesmo, considerando-se que este não é justo, posto que o dano sofrido consiste, essencialmente, na diminuição da faculdade de uso do veículo e não na perda do seu valor de troca. 45. A própria doutrina critica este conceito, considerando que atender-se estritamente ao valor de mercado do bem, no sentido do seu valor de venda, seria converter a responsabilidade civil numa forma de expropriação privada, pelo preço de mercado. 46. Importa, como bem entendeu o tribunal a quo atender ao custo de substituição do veículo, apurar o valor que mesmo representa para o património do lesado. 47. Nesta senda, atente-se inclusivamente o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 19/02/2015, disponível in site www.dgsi.pt, relatado pelo Senhor Desembargador Pedro Martins, "se A tem um bem que vale 500 e esse bem é destruído culposamente por B, A tem direito à indemnização pelo valor necessário à compra de um bem que tenta as mesmas característica do destruído (mesma marca, modelo, ano de construção, equipamento, estado de conservação, quilometragem .... ) que é o valor do custo da sua substituição ou o valor de substituição (que alguns também chamam de valor patrimonial) e não pelo valor de mercado do bem (ou valor venal ou comercial). Se o bem fica apenas estragado, A tem direito à reparação da coisa (reconstituição natural) ou, se essa reparação for excessivamente onerosa, à indemnização pelo valor de substituição (indemnização por dinheiro ou por equivalente)." 48. Pelo que, defendeu o tribunal a quo que cabe à Seguradora alegar e provar que o autor podia adquirir no mercado, e por que preço, um outro veículo que igualmente lhe satisfizesse as suas necessidades «danificadas». 49. Assim, compreendeu o douto tribunal recorrido que no que ao caso concreto interessa, a ré recorrente não alegou tal factualidade, segurando-se apenas no conceito de valor venal, o qual é afastado por não corresponder ao tal valor patrimonial ou valor de substituição. 50. A ré recorrente, baseou-se unicamente no conceito de valor de mercado - desesperadamente invoca agora o valor de custo de uma situação provisória e a imparcialidade das testemunhas que procederam à instrução do processo de averiguação de danos, as quais prestaram e prestam serviços para a mesma ré recorrente, por isso definir tais testemunhas como isentas e idóneas, bem sabendo que os relatórios apresentados foram ao serviço da ré recorrente, é manifestamente forçado, pois jamais testemunhas iriam contrariar de posição defendida pela ré, não obstante o dever de falar com verdade. 51. O valor de mercado que a ré recorrente indica para fundamentar a excessiva onerosidade da reparação e o afastamento desta é um conceito redutor, afastado pela lei e pela jurisprudência, porquanto o valor de mercado não serve o conceito de valor venal para efeitos do disposto no artigo 41.°, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 291/2007, o que prejudica a validade do cálculo que faz para concluir pela perda total do veículo. 52. Veja-se que, indo ao encontro desta posição, o próprio Provedor de Justiça, na sua Recomendação 2/B/2009, datada de 29/05/2009, onde aconselhou "a empresa de seguros, ao propor a regularização de um sinistro com base no conceito de perda total, não se limitar a indicar o valor da indemnização por perda total, indicando, outrossim, a disponibilidade no mercado de veículo automóvel com características similares às do veículo sinistrado e que franqueie ao lesado uma utilização comparável à que este proporcionava." 53. Por conseguinte, refere a douta sentença que a recorrente não seguiu esta recomendação, como facilmente se retira das missivas endereçadas ao autor e juntas aos autos. Bem como a recorrente ré não provou, pese embora invoque o inverso, o valor venal da viatura sinistrada. 54. Isto porque, curiosamente a testemunha ouvida em audiência de discussão e julgamento, L, em momento algum identificou um veículo com características pelo menos semelhantes ao veículo sinistrado, cfr. depoimento prestado no dia 15.02.2016, registado em ata com início da gravação 00:00:01; fim da gravação 00:41:45: pelas 10:49:42, nas passagens 00:02:12 até 00:05:29 e 00:34:16 até 00:35:58: 55. Assim, é certo que a ré recorrente não provou o valor venal da viatura sinistrada. Ou seja, se a pretensão da ré recorrente claudicaria até que tivesse demonstrado o valor venal que alegou, o certo é que nem isso logrou fazer. 56. Por outro lado, o afastamento da restauração natural pressupõe como explanado supra, a excessiva onerosidade e foi entendimento do tribunal, do qual sufragamos, que nem isso, da mera alegação da ré resulta. 57. A propósito deste conceito, atente-se a jurisprudência vertida no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21/04/2010, relatado pelo Senhor Doutor Juiz Conselheiro Garcia Calejo, disponível in site www.dgsi.pt.de que "(..) em relação a um veículo automóvel acidentado, sendo a sua reparação integral possível, deve privilegiar-se a sua reconstituição natural, exceto se, se revelar excessivamente onerosa, o que corresponde a que o encargo seja exagerado, desmedido, desajustado para o obrigado, transcendo-se os limites de uma legítima indemnização." 58. Na situação em mãos, entendeu o tribunal recorrido, que a ré recorrente alegava que a viatura tinha um valor de mercado de 4.500,00 Euros (Quatro mil e quinhentos euros) e que a reparação importava a quantia de 10.328,42 Euros (Dez mil trezentos e vinte e oito euros e quarenta e dois cêntimos). Ou seja, a reparação era superior ao dobro, mas inferior ao triplo, do valor apontado como de mercado do veículo. 59. Ora, entendeu então a Meritíssima Juiz do tribunal de primeira instância que tal diferença não permite representar excessiva onerosidade da restauração natural, dado que, da alegação da ré não resultou quanto é que o autor precisava para adquirir uma viatura semelhante à sua de molde a poder concluir o tribunal recorrido que existiria desproporção clamorosa entre o valor de substituição e o valor da reparação. 60. O tribunal recorrido adotou assim, posição semelhante à consagrada no Acórdão da Relação do Porto, datada de 16/03/2015, relatado pelo Senhor Doutor Desembargador Carlos Gil, disponível in site www.dgsi.pt e sobejamente defendido pelo autor recorrido, em cujo sumário consta, "( ... ) não obstante o custo da reparação do veículo sinistrado ser superior ao dobro do seu valor comercial, não se pode concluir pela excessiva onerosidade da reconstituição natural se não demonstrou que o referido valor comercial permite a aquisição de um veículo de características similares ao acidentado." 61. Bem como, posição semelhante ainda à consagrada no Acórdão da Relação de Guimarães, datado de 23/04/2015, decidido por unanimidade e relatado pelo Senhor Doutor Juiz Desembargador Espinheira Baltar, disponível in sitewww.dgsi.ptno qual pode ser-se que: "A jurisprudência dominante nos tribunais superiores vai no sentido de que o artigo 41.º do Decreto-Lei de 21 de Agosto se enquadra num conjunto de regras e procedimentos que as seguradoras deverão tomar, na fase extrajudicial, para apresentarem uma proposta razoável ao credor, em caso de acidente rodoviário, não substituindo as regras gerais do cálculo da indemnização previstas nos artigos 562.º a 572.º do Código Civil. A doutrina e a jurisprudência consideram que a prestação é excessivamente onerosa quando haja uma desproporção flagrante, manifesta, entre o interesse do credor na reconstituição e o custo da reparação que se impõe ao devedor." 62. Portanto, foi entendimento do tribunal recorrido, o qual defendemos, que independentemente da sua demonstração, a matéria alegada assomava insuficiente para concretizar a excessiva onerosidade e afastar o direito à reparação. 63. Pelo que, não comprovada a excessiva onerosidade e demonstrado que está o valor dos danos pelo autor, tem este autor direito ao preço correspondente ao preço da reparação da viatura sinistrada, de 10.328,42 Euros (Dez mil trezentos e vinte e oito euros e quarenta e dois cêntimos). 64. Como última nota, louva-se ainda o exposto pela Meritíssima Juiz do tribunal a quo no sentido de que, a indemnização pelo valor de reparação consubstancia ainda uma forma de reconstituição natural a que o autor recorrido tem direito e que não é afastada por ele ter adquirido uma outra viatura - e temporariamente ter remediado a situação, com substituição de peças, pois o dano continuou a existir. Na verdade, o dano existiu e existe e impõe-se a sua reparação mediante a atribuição do valor necessário à sua reparação ou, pelo menos, à obtenção de uma viatura com características idênticas à sinistrada. 65. Aliás, o tribunal a quo vai ainda mais longe, referindo atentamente que face à recusa da Ré recorrente em proceder à reparação do veículo sinistrado, a atitude do auto em obter viatura idêntica mostra-se perfeitamente compreensível e legítima, servindo até para atenuar outros danos pelos quais a ré recorrente poderia ser igualmente responsável, nomeadamente, ao nível da privação do uso veículo, por valor manifestamente superior, não fosse a resolução da situação. 66. Concomitantemente, não deve claramente ser aditado ou mesmo acrescentado qualquer facto à matéria de facto provada, mormente com a redação: "O valor de mercado da viatura referida em 1) era de 5.800,00." 67. Face ao exposto, entende o Autor recorrido J que não assiste qualquer razão à Recorrente seguradora, porquanto a douta sentença recorrida apreciou e julgou concretamente os factos e o direito aplicável, 68. Sintetizando, a douta sentença recorrida deve ser mantida e sufragada pelo Tribunal da Relação de Guimarães.” ***O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo. Foram colhidos os vistos legais. *** II- Âmbito do recurso. Delimitado como está o recurso pelas conclusões das alegações, sem prejuízo de e em relação às mesmas não estar o tribunal sujeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito nem limitado ao conhecimento das questões de que cumpra oficiosamente conhecer – vide artigos 5º n.º 3, 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3 do CPC – resulta das formuladas pelos apelantes serem as seguintes as questões a apreciar: 1) erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto; 2) erro na aplicação do direito, como consequência da pugnada alteração da decisão da matéria de facto. *** III- Fundamentação Foram dados como provados os seguintes factos: “1) No dia 15 de Novembro do ano de 2014, pelas 13H50m, no concelho de Macedo de Cavaleiros, J conduzia a viatura com a matrícula FT, propriedade do Autor J, na Estrada Nacional 102, no sentido Grijó/Macedo de Cavaleiros. 2) Quando é surpreendido pela presença do veículo JA, conduzido por M, que seguia no sentido Macedo de Cavaleiro/Grijó e, após descrever a curva aí existente, entra em total despiste, invade a faixa de rodagem contrária e vai embater bruscamente na lateral esquerda do veículo FT. 3) À data referida em 1) a responsabilidade civil por danos resultantes da circulação do veículo automóvel de matrícula JA estava transferida para a Ré através da apólice n.º 0000510996, sendo a condutora M quem o segurava. 4) A ré enviou ao autor a missiva de 4/12/2014, de fls. 23, cujo teor damos por integralmente reproduzido, com o seguinte teor: “[…] No seguimento da vistoria efetuada constatámos que a viatura de V. Exa. sofreu danos cuja reparação se torna excessivamente onerosa face ao seu valor de mercado antes do acidente. Na situação em concreto, considerando o valor estimado para a reparação €10.328,42 na oficina António e Fernandes Rep. Automóveis, Lda., a melhor proposta de aquisição da sua viatura com danos (€1.875,00), bem como o seu valor de mercado antes do acidente (€4.500,00), e embora ainda não nos seja possível assumir uma posição quanto a responsabilidades, propomos condicionalmente a quantia de €2.625,00 solicitando que nos remeta fotocópias do bilhete de identidade, cartão de contribuinte do proprietário e documentos da viatura […]”. 5) Após, a ré veio assumir junto do autor a responsabilidade pela regularização dos danos decorrentes do sinistro por carta de 12/12/2014, constante de fls., 25, cujo teor damos por integralmente reproduzindo, oferecendo-lhe o valor de €2.625,00, acrescido do veículo com danos. 6)Como consequência do sinistro, resultaram danos para a viatura cuja reparação orça os €10.328,42 [dez mil trezentos e vinte e oito euros e quarenta e dois cêntimos]. 7) Ainda em consequência do sinistro, a viatura do autor sofreu uma desvalorização. 8) Colocado o salvado da viatura referida em 1) em leilão, a ré obteve como melhor proposta o montante de €1.875,00. 9) O autor adquiriu a viatura referida em 1) em janeiro de 2010, usando-a nas deslocações normais do quotidiano e para a agricultura, mormente, para a apanha da azeitona. 10) À data do acidente, a mesma estava em normal estado de conservação e tinha de 252.131 quilómetros percorridos. 11) A partir de 15/11/2014 a 17/12/2014, por estar privado do uso da sua viatura em consequência do acidente, alugou uma viatura pela qual desembolsou a quantia de €1.162,35 [mil cento e sessenta e dois euros e trinta e cinco cêntimos]. 12) Após, o autor adquiriu um veículo da mesma marca e modelo da viatura referida em 1) com a matrícula HX, tendo registado essa aquisição em 16 de janeiro de 2015. 13) Em 25/8/2015 cancelou a matrícula do veículo referido em 1). 14) Mostra-se registada a favor do autor uma viatura todo-o-terreno, marca UMM 4x4, com a matrícula OX.” *** O tribunal a quo deu ainda como não provada a seguinte factualidade “B. Factos não provados Com relevo para a decisão da causa ficou por demonstrar: a) O valor de mercado da viatura referida em 1) fosse de €4.500,00; b) A viatura desvalorizou em €1.000,00 por força do sinistro.” * *** Conhecendo. 1)Em função do supra decidido, cumpre apreciar a decisão da matéria de facto. Na reapreciação da matéria de facto – vide nº 1 do artigo 662ºdo CPC - a modificação da decisão de facto é um dever para a Relação, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou a junção de documento superveniente impuser diversa decisão. Tendo presente que o princípio da livre apreciação das provas continua a ser a base, nomeadamente quando em causa estão documentos sem valor probatório pleno; relatórios periciais; depoimentos das testemunhas e declarações de parte [vide art.os 341º. a 396º. do Código Civil (C.C.) e 607.º, n.os 4 e 5 e ainda 466.º, n.º 3 (quanto às declarações de parte) do C.P.C.], cabe ao tribunal da Relação formar a sua própria convicção mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou que se mostrem acessíveis. Fazendo ainda [vide António S. Geraldes in “Recursos no Novo Código do Processo Civil, 2ª ed. 2014, anotação ao artigo 662º do CPC, págs. 229 e segs. que aqui seguimos como referência]: - uso de presunções judiciais – “ilações que a lei ou julgador tira de um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido” (vide artigo 349º do CC), sem prejuízo do disposto no artigo 351º do CC, enquanto mecanismo valorativo de outros meios de prova; - ou extraindo de factos apurados presunções legais impostas pelas regras da experiência em conformidade com o disposto no artigo 607º n.º 4 última parte (aqui sem que possa contrariar outros factos não objeto de impugnação e considerados como provados pela 1ª instância); - levando em consideração, sem dependência da iniciativa da parte, os factos admitidos por acordo, os provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito por força do disposto no artigo 607º n.º 4 do CPC (norma que define as regras de elaboração da sentença) ex vi artigo 663º do CPC (norma que define as regras de elaboração do Acórdão e que para o disposto nos artigos 607º a 612º do CPC remete, na parte aplicável). Importa ainda relembrar que os recursos visam o reexame das decisões proferidas em 1ª instância, motivo porque o objeto de recurso está limitado pelas questões que foram sujeitas a apreciação ao tribunal recorrido. O mesmo é dizer que ao tribunal de recurso está vedado o conhecimento de questões novas anteriormente não apreciadas pelo tribunal a quo, salvo em situações limitadas e expressamente consagradas como por exemplo no caso de ocorrer alteração ou ampliação do pedido em 2ª instância (artigo 264º do CPC) ou de se impor o conhecimento oficioso de exceção ainda não decidida com trânsito em julgado [cfr. Ac. STJ, Relatora Ana Geraldes de 17/11/2016 in www.dgsi.pt/jstj ] . Tal como referido no Ac. ora citado, em obediência ao princípio da concentração da defesa e da preclusão que se extraem do artigo 573º n.º 1 do CPC o qual preceitua que “a defesa deve ser deduzida na contestação, excetuados os incidentes que a lei manda deduzir em separado”, está o R. obrigado a deduzir todos os meios de defesa que entenda por pertinentes na respetiva contestação, não o podendo fazer posteriormente salvo quando se esteja perante exceções ou meios de defesa supervenientes, entendidos estes como aqueles que abarcam: “a) quer os casos em que os factos em que eles se baseiam se verificam supervenientemente (superveniência objetiva), quer aqueles em que esses factos são anteriores à contestação, mas só posteriormente se tornam conhecidos pelo Réu (superveniência subjetiva), devendo em ambos os casos ser alegados em articulado superveniente (art. 588.º, nº 2, do NCPC); b) os meios de defesa de que o Tribunal pode conhecer oficiosamente, abrangendo a impugnação de direito (art. 5.º, nº 3, do NCPC) e a maioria das exceções dilatórias (art. 578.º do NCPC) e perentórias (art.º 579.º do NCPC), sem prejuízo de os factos em que as exceções se baseiem só poderem ser introduzidos no processo pelas partes (salvo nos casos excecionais em que é permitido o seu conhecimento oficioso: art. 412.º do NCPC), na fase dos articulados ou com os limites definidos para a alegação de facto em articulado superveniente.[5]” . Mais e na medida em que os recursos visam, por via da modificação de decisão antes proferida reapreciar a pretensão dos recorrentes por forma a validar o juízo de existência ou inexistência do direito reclamado, temos igualmente de concluir que a reapreciação da matéria de facto está limitada ao efeito útil que da mesma possa provir para os autos, em função do objeto processual delineado pelas partes e assim já antes submetido a apreciação pelo tribunal a quo [vide neste sentido Acs. deste TRGde 12/07/2016, Relator Jorge Seabra e de 15/12/2016, Relatora Maria João Matos, ambos inwww.dgsi.pt/jtrg]. A recorrente cumpriu o seu ónus de alegação e formulação de conclusões, indicando os fundamentos por que pede a alteração da decisão – artigo 639º n.º 1 do CPC – na certeza de que estas têm a função de delimitar o objeto do recurso conforme se extrai do n.º 3 do artigo 635º do CPC. Estando em causa a impugnação da matéria de facto, observou ainda a recorrente o ónus de especificação que lhe é imposto, sob pena de rejeição, do artigo 640º n.º 1 do CPC. * Analisadas as conclusões formuladas pela recorrente conclui-se que a mesmo pugna: - pela alteração da redação dada ao n.º 11 (conclusões 2 a 9) e 12 (conclusões 10 a 13) dos factos provados; - pelaeliminação da al. a) dos factos provados e sua passagem para os factos provados, sugerindo ainda uma redação subsidiária para tal alínea (vide conclusões 17 a 19). * Tendo presentes os considerandos supra expendidos quanto aos poderes do tribunal na reapreciação da matéria de facto, resulta que e no que ao n.º 12) dos factos provados concerne, a recorrente pretende introduzir neste facto um elemento que não foi alegado nos articulados e como tal sobre o mesmo o tribunal não se pronunciou, constituindo como tal questão nova. Para além de e em função do objeto processual para o mesmo não ter relevo jurídico. Com efeito e quanto ao facto 12) o tribunal a quo deu como provado: - “12) Após, o autor adquiriu um veículo da mesma marca e modelo da viatura referida em 1) com a matrícula HX, tendo registado essa aquisição em 16 de janeiro de 2015.”. Por sua vez a recorrente pugna pela alteração desta redação, por forma a do mesmo ficar a constar -“12) Após, o autor adquiriu um veículo da mesma marca e modelo da viatura referida em 1) com a matrícula HX, tendo registado essa aquisição em 16 de janeiro de 2015, pelo qual pagou o montante de € 2.000,00 e no qual instalou o motor da viatura acidentada.”. A alteração pretendida (a negrito) corresponde a factualidade que pela R. não foi invocada em sede de contestação. E ainda que se possa dizer que a mesma resultou apurada da discussão dos factos, como a recorrente o alegou, facto é que esta factualidade não tem para a discussão jurídica relevo. Note-se que o A. na sua petição elencou como prejuízos indemnizáveis os danos provocados na sua viatura – matrícula FT - correspondentes ao valor de reparação (este aceite pela R.); o valor correspondente ao prejuízo pela privação do uso da viatura e ainda o valor correspondente à desvalorização que o seu veículo sofreu (decorrente do embate). A recorrente na sua contestação contrapôs que o veículo do A. FT atento o seu valor de mercado e o valor de reparação, se encontrava em situação de perda total, motivo porque propôs ao A. uma indemnização correspondente à diferença entre o valor de mercado da viatura à data e o valor do salvado que este não aceitou. Concluiu assim não ter o A. direito a receber o valor da reparação do veículo. Reparação que mais contrapôs o A. já não teria interesse, atenta a sua aquisição posterior de um outro veículo da mesma marca e modelo – HX- que registou em seu nome, tendo por outro lado cancelado a matrícula do FT. No que ao pedido do A. de indemnização correspondente ao valor da reparação, nada mais alegou a R.. O mesmo é dizer que as questões suscitadas pela R. em sede de alegações de recurso com vista a justificar a inclusão no n.º 12) dos factos provados da factualidade nova referente ao HX [por esta via pretendendo justificar a sua conclusão de que o único prejuízo do autor corresponde ao valor de aquisição deste HX – os mencionados € 2.000,00] para além de ser questão não submetida à apreciação do tribunal a quo por tal se apresentando como questão nova, é ainda e por tal destituída de relevo jurídico para o objeto processual delineado pelas partes por visar justificar uma outra via defensiva, não invocada oportunamente na contestação. Termos em que se conclui pela inadmissibilidade da apreciação da questão suscitada, em respeito pelo disposto no artigo 608º n.º 2 do CPC. *** Releva portanto reapreciar as seguintes questões, tendo presentes os depoimentos testemunhais que foram ouvidos e a prova documental: A)quanto ao facto 11) o tribunal a quo deu como provado: “11) A partir de 15/11/2014 a 17/12/2014,o autor por estar privado do uso da sua viatura em consequência do acidente, alugou uma viatura pela qual desembolsou a quantia de €1.162,35 [mil cento e sessenta e dois euros e trinta e cinco cêntimos]. Por sua vez a recorrente pugna pela alteração desta redação, por forma a do mesmo ficar a constar - “11) A partir de 15/11/2014 a 17/12/2014,o autor alugou uma viatura, tendo o custo de tal aluguer sido suportado por uma empresa de mediação de seguros.”(a negrito estando a alteração pretendida, para além da eliminação do 2º segmento do ponto 11 dos factos provados) Para justificar a convicção formada sobre este ponto convocou o tribunal a quo os depoimentos de A; L e J, conjugado com o doc.de fls. 27 – fatura e recibo relativos ao aluguer de uma viatura de 17/11/2014 [certamente por lapso é referido o dia 15, mas o doc. em causa menciona 17] a 17/12/2014 em nome de J aqui A. no valor de € 1.162,35. Contrapôs a recorrente nomeadamente que a viatura alugada não seria a mais adequada às necessidades profissionais do autor por este habitualmente utilizar um jipe e o veículo alugado ser um Opel, conforme depoimento de A; mais alega que o A. não provou efetivamente que alugou o referido veículo [nomeadamente invocando que quem pagou a fatura foi a empresa de mediação conforme depoimento de L, fatura cujo valor probatório questiona] e que se o fez teria sido por outros interesses que nada têm a ver com o sinistro, como aliás alega resulta dos depoimentos das testemunhas arroladas pelo autor, nomeadamente L e J. Para além de que sendo proprietário de outra viatura não necessitava de alugar um outro veículo. Ouvidos os depoimentos em questão é de afastar de forma clara as referências da R. recorrente: - quer quanto ao depoimento de L, o qual de forma clara afirmou o pagamento do aluguer por parte do A., tendo explicado, evidenciando conhecimento direto, que o A. foi à sua agência (sua e do pai) tendo pedido ao pai que procedesse ao pagamento, para o que deixou o dinheiro respetivo (nem se entenderia qual a justificação de ser a agencia de seguros a fazer tal pagamento) o que o pai satisfez, após o que entregou a fatura e recibo ao A. de fls. 27 dos autos [note-se que o valor probatório desta é valorada livremente pelo tribunal nos termos dos artigos 366º do CC e 607º n.º 5 do CPC, dada a sua natureza de documento particular de terceiro (vide 363º n.º 2 a contrario do CC)]; explicou ainda esta testemunha que o aluguer foi efetuado na oficina Fernandes, sita próximo da sua agencia, por ser a única que em Macedo de Cavaleiros presta este serviço; mais explicou que tentaram alugar um jipe – dada a utilização que o A. com ele fazia também na sua vida profissional de agricultor – mas como não havia, foi alugado o Opel Corsa que a testemunha A confirmou ser um comercial de 2 lugares; finalmente confirmou a falta que ao A. fazia o veículo FT por ser por ele utilizado no dia-a-dia, incluindo na atividade profissional. Explicou que o A. tinha ainda um trator que utilizava na sua atividade agrícola, que naquela altura chegou a transportar nele azeitona (apesar de demorar muito mais tempo e apanhar frio) quando antes o fazia com o jipe a que associava um atrelado; sem prejuízo de existirem atividades que com o trator não podia fazer, desde logo levar e trazer trabalhadores. Evidente resulta assim a necessidade de outro veículo em substituição do sinistrado; Sobre a propriedade e utilização pelo autor do OX, não tendo este depoimento sido claro. - Quer quanto ao depoimentode J, o qual em suma confirmou a falta do FT para a atividade agrícola do A.; disse ser este seu vizinho, vendo-o a usar o FT todos os dias até que e com o acidente teve um carro alugado. Mais tarde tendo comprado outro jipe. Explicou que o OX pertence / só é utilizado pelo filho do A. e sendo seu vizinho nunca o viu – a ele autor - a utilizar o OX. Sobre esta não utilização nenhuma testemunha tendo prestado qualquer declaração que o infirmasse. Assim ficando por demonstrar que o OX fosse solução alternativa e válida para o A.. Neste contexto afasta-se a afirmação da R. de que estes depoimentos colocaram em questão quer o efetivo pagamento do aluguer quer a necessidade do mesmo, como consequência do acidente. Por tal aderimos neste ponto à motivação do tribunal a quo que nenhuma censura merece, concluindo pela manutenção da redação dada ao ponto 11) dos factos provados, apenas com a retificação – pelo que se nos afigura ser um manifesto lapso de escrita – de que a data do aluguer foi de 17/11/2014 a 17/12/2014, conforme consta da fatura de fls. 27. B)quanto à eliminação da al. a) dos factos provados cujo teor é: “a) O valor de mercado da viatura referida em 1) fosse de €4.500,00;” Pugnou a recorrente pela eliminação desta alínea nos factos não provados, devendo ser introduzido nos factos provados um novo número com a seguinte redação: - “a) O valor de mercado da viatura referida em 1) era de €4.500,00;” ou subsidiariamente - “a) O valor de mercado da viatura referida em 1) era de €5.800,00;” Conforme o tribunal a quo realçou, foram neste ponto prestados depoimentos testemunhais denotando afastamento neste ponto. Assim e de um lado o Sr. perito avaliador L emitiu ser sua opinião que o valor comercial do veículo era à data do sinistro de 4500 euros; justificou-o com base em consulta que fez na net e com comerciantes; apresentou duas consultas da net – no stand virtual – relativa a veículos similares – marca e modelo, mas em versões mais recentes, dos anos de 98 e 99 por 5500 e 5900 euros respetivamente; desvalorizou o facto de a motorização do FT ser 2800 contra a de 2500 (observação que a testemunha L havia feito como relevante para o valor da viatura). Destes valores concluiu por valor inferior para o FT, atento o facto de ser de 95, sem que fatoresque igualmente costumam ser ponderados como estado de conservação, nº de registos de proprietários, eventuais extras ou outros elementos diferenciadores do FT em contraposição às duas consultas da net tivessemsido mencionados e assim ponderados. Certo sendo ainda que e conforme referido pelo tribunal a quo não deu nota o Sr. perito de ter aferido e ou apurado em concreto o valor de veículos de idênticas caraterísticas ao FT. Por outro lado a testemunha L, embora não perito avaliador explicou que enquanto agente de seguros faz parte do seu trabalho também dar opinião sobre o valor dos veículos para efeitos de seguro pelo que justificou ter neste campo experiência. E neste contexto foi veemente em afastar o valor atribuído pela seguradora de 4.500,00 que qualificou de muito baixo, tendo emitido a opinião de o FT valer então cerca de 7.000/8.000 euros. Opinião de valor aproximado foi emitida pela testemunha M que vendeu o OX ao A. o qual referiu que não teria vendido o OX – do mesmo modelo e marca do FT – ao A. por valor inferior a € 7.000,00, se este não tivesse o motor estragado (veículo que tinha adquirido para si em 2008 por 10.000,00 euros, conforme o disse). Neste contexto, atentos os moldes em que o perito avaliador efetuou a sua avaliação e explicou ao tribunal, no confronto com o declarado pelas outras duas testemunhas acima referidas, entende-se ser igualmente neste ponto de aderir à fundamentação do tribunal a quo que nenhuma censura merece, concluindo pela manutenção da redação dada à al. ) dos factos não provados, que se mantém nos mesmos termos pois dos mesmos não foi produzida prova cabal – nem por referência o valor de € 4.500,00 nem do valor superior de € 5.800,00. Improcede assim a pretensão de introdução de novo facto nos factos provados. Em suma conclui-se pela improcedência da pretensão da R. recorrente em sede de reapreciação da matéria de facto. * Do direito. Em função do acima decidido, cumpre apreciar de direito, sendo certo que o tribunal não está vinculado às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito [vide artigo 5º nº 3 do CPC], sem prejuízo do limite imposto pelo artigo 609º quanto ao objeto e quantidade do pedido. Pugnou a recorrente pela parcial revogação da decisão em recurso, na parte em que a condenou a indemnizar o A.: - pelo valor correspondente ao do aluguer da viatura [11) dos factos provados] e pelo tribunal a quo enquadrado no dano decorrente da privação de uso. Fundou esta sua pretensão na pressuposta alteração da matéria de facto, nomeadamente na alteração do ponto 11) dos factos provados. Tendo esta improcedido esta igualmente improcede a pretensão da recorrente neste ponto. Note-se que a alegação e prova da existência de um outro veículo registado em nome do A. só por si não demonstra a desnecessidade de o A. ter recorrido ao aluguer de um outro veículo. E à R. incumbia fazer prova de tal, ónus que não logrou cumprir. Tal questão foi devidamente valorada em sede de matéria de facto por referência à peticionada alteração da resposta dada ao ponto 11) dos factos provados, único meio de afastar a obrigação de indemnização nos termos apreciados de forma correta pelo tribunal a quo e em relação ao que nada mais se nos oferece dizer, até porque a recorrente nada mais alegou nesse sentido. - pelo valor correspondente à reparação do FT. Para este efeito fundou a sua pretensão igualmente na prévia alteração de parte do n.º 12) dos factos provados. Pretensão logo abinitio indeferida, nos termos acima assinalados E ainda na alteração da resposta dada em a) dos factos não provados e sua passagem para os provados, nos termos por si propostos e acima analisados. Também aqui improcedeu a pretensão da recorrente. Ora a pretendida alteração da recorrente quanto a este valor indemnizatório partia, por um lado da prova de que o FT à data do acidente tinha um valor de mercado de € 4.500,00, ou subsidiariamente € 5.800,00; sendo o valor do salvado de € 1.875,00, a implicar a redução do valor indemnizatório à diferença entre um e outro por se tratar de veículo com perda total para efeitos do artigo 41º do DL 291/2007. Cuja reparação assim se não justifica e afirma o A. ao valor da mesma não tem direito. Reparação que igualmente alegou o A. à mesma não ter interesse, na medida em que cancelou até a matrícula do FT e adquiriu um outro veículo. Em função da não alteração dos factos provados e não provados pretendida pela recorrente, igualmente improcede esta sua pretensão. Porque em sede de alegações de recurso alegou a recorrente que o cancelamento da matrícula e a compra de outro veículo implicam desinteresse do A. na reparação do FT, não fazendo sentido condenar a recorrente a pagar ao A. a reparação do veículo quando o autor o substituiu por um igual, ainda que de forma breve teceremos neste ponto algumas observações. Ao pedido nos autos formulado subjaz a responsabilidade civil emergente de acidente de viação. A culpa na produção do acidente foi desde o início aceite pela R. seguradora em relação ao seu segurado, motivo porque aceitou a obrigação de indemnizar o A. na medida dos seus danos. É o quantum indemnizatório a causa do litígio, que em sede de recurso continua a motivar as partes, conforme se extrai das suas conclusões de recurso. " Para haver obrigação de indemnizar é condição essencial que haja dano, que o facto ilícito culposo tenha causado um prejuízo a alguém", [cfr. A. Varela in "Das Obrigações em Geral" vol. 1º, 5ª ed., p. 557]. Existindo o dano, aquele que estiver obrigado a repará-lo, deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (art.º 562º do C.C.). A lei manda "reconstituir, não a situação anterior à lesão, mas a situação (hipotética) que existiria, se não fora o facto determinante da responsabilidade."Ant. Varela in ob. cit. p. 862. Nos termos do disposto no art.º 566º n.º 1 do C.C. " A indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor. 2- Sem prejuízo do preceituado noutras disposições, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos." (sublinhado nosso). Do citado artigo 566º n.º 1 extrai-se como limite da reconstituição natural a partir do qual esta se torna em meio impróprio ou inadequado – in casu está em causa a reparação do FT por forma a colocar o lesado na situação que existiria se não fosse o evento danoso - a excessiva onerosidade para o devedor, entendida esta como a “manifesta desproporção entre o interesse do lesado que importa recompor e o custo que a reparação natural envolve para o responsável”. Nestes casos de insuficiência da reconstituição in natura, devendo então a indemnização ser fixada em dinheiro, calculada em função da situação concreta do lesado, tendo como medida a diferença “entre a situação real atual e a situação hipotética correspondente ao mesmo momento” (vide mesmo autor in ob. cit. p. 877/878), em conformidade com o que dispõe o artigo 566º n.º 2 do CC que manda atender à diferença entre situação patrimonial do lesado na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal e a que teria nessa data se não existissem danos. Assim se o bem fica apenas estragado, tem o lesado direito à sua reparação – reconstituição in natura. Porém se esta reparação for excessivamente onerosa ou o bem sofrer perda total, terá o lesado direito a uma indemnização. Discutido na jurisprudência bem como na doutrina se para efeitos indemnizatórios e no caso de impossibilidade da reconstituição natural se deve atender ao valor venal (ou seja comercial) do bem danificado (in casu o FT) ou antes ao seu valor de substituição (ou patrimonial), tem de forma reiterada vindo a ser entendido como critério orientador adotado o valor de substituição, igualmente identificado como valor patrimonial, porquanto só assim e numa interpretação mais conforme ao disposto no artigo 566º n.º 2 do CC os interesses do lesado são devidamente salvaguardados [cfr. neste sentido Ac. STJ de 21/02/2006 in CJ – ACSTJ T I, p. 83/84, Relator Ferreira Girão; Ac. STJ 04/12/2007, Relator Pires da Rosa, Ac. TRG de 21/05/2015, Relatora Ana Cristina Duarte e Ac. TRP de 19/02/2015, Relator Pedro Martins todos in http://www.dgsi.pt/ neste último se fazendo uma resenha jurisprudencial (onde entre outros é citado o Ac. do STJ de 2006 acima referido) e doutrinária sobre este assunto]. Em conformidade com este entendimento veio (aliás) no pela R. invocado artigo 41º DL 291/2007 [o qual aprovou o regime do sistema do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel e transpôs parcialmente para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2005/14/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Maio, que altera as Diretivas n.ºs 72/166/CEE, 84/5/CEE, 88/357/CEE e 90/232/CEE, do Conselho, e a Diretiva n.º 2000/26/CE, relativas ao seguro de responsabilidade civil resultante da circulação de veículos automóveis] a ser consagrado que: “2 - O valor venal do veículo antes do sinistro corresponde ao seu valor de substituição no momento anterior ao acidente.” – assimilando aqui o legislador o conceito de “valor venal” a “valor de substituição”. Este artigo 41º insere-se no capítulo relativo à “Regularização de Sinistros” o qual“fixa as regras e os procedimentos a observar pelas empresas de seguros com vista a garantir, de forma pronta e diligente, a assunção da sua responsabilidade e o pagamento das indemnizações devidas em caso de sinistro no âmbito do seguro de responsabilidade civil automóvel.” (vide artigo 31º do citado DL). De notar que o procedimento regulado no citado DL visou em sede extrajudicial fornecer critérios objetivos orientadores da proposta a apresentar pela seguradora aos lesados em sede indemnizatória em termos razoáveis, com vista a um possível acordo extrajudicial. Porém e não sendo possível às partes chegar a um entendimento sobre o quantum indemnizatório, não são, como é comummente aceite, tais regras vinculativas para o tribunal que passará a julgar de acordo com a lei e nomeadamente em respeito às disposições do CC e aos princípios atinentes à responsabilidade civil [vide neste sentido entre outros Ac. STJ de 09/09/2010, Relator João Bernardo e Ac. STJ 06/10/2016, Relator António Piçarra ambos in http:// www.dgsi.pt/jstj]. Assente portanto que em sede indemnizatória e no caso de a reconstituição natural ser excessivamente onerosa (ou impossível), deverá a medida da indemnização ser aferida pelo valor de substituição, importa ainda dilucidar os termos em que a “excessiva onerosidade” deverá ser balizada. O já citado artigo 41º fornece como critério orientador do conceito de perda total – caso em que igualmente estabelece que a obrigação de indemnização é cumprida em dinheiro e não através da reparação do veículo – entre outras situações, aquela em que: “c) Se constate que o valor estimado para a reparação dos danos sofridos, adicionado do valor do salvado, ultrapassa 100 % ou 120 % do valor venal do veículo consoante se trate respetivamente de um veículo com menos ou mais de dois anos. “. Através de um critério objetivo matemático que como já vimos não vincula o tribunal, pretendeu o legislador definir os limites a partir dos quais é afastada a obrigação da reconstituição natural por excessiva onerosidade em sede de regularização de sinistros por via extrajudicial. Embora se aceite que os limites previstos nesta al. c) poderão servir de ponto de partida e como limite mínimo para a análise desta questão, importa ter presente que a excessiva onerosidade e por referência ao previsto no artigo 566º do CC deverá ser aferida, conforme tem vindo a ser jurisprudencialmente defendido, no caso concreto entre o interesse do lesado à total reparação do veículo (quando possível) e o custo que tal representa para o responsável. Só perante uma manifesta desproporção entre estes dois interesses se devendo entender justificado o afastamento da obrigação da reconstituição natural / in casu a reparação total da viatura. Assim e na ponderação do interesse do lesado deverão ser levados em consideração, para além do valor da reparação e de substituição do mesmo,fatores como o uso dado ao veículo em questão; a possibilidade de o lesado vir a adquirir veículo idêntico que satisfaça de igual modo as suas necessidades ou até o valor sentimental que o poderá ligar ao veículo [vide neste sentido Ac. TRP de 25/02/2013 Relator Carlos Querido, bem como o Ac. TRG de 21/05/2015 já supra citado in http://www.dgsi.pt e Ac. STJ de 05/07/2007, Relator Santos Bernardino inhttp://www.dgsi.pt/jstj ]. Da parte do devedor sendo de ponderar nomeadamente a repercussão que a reparação natural representará para o seu património. Tal como sumariado no Ac. do STJ de 05/07/2007 acima citado: “4. Na ponderação da excessiva onerosidade para o devedor não podem, assim, deixar de ser considerados fatoressubjetivos, respeitantes não só à pessoa deste, e à repercussão do custo da reparação natural no seu património, mas também às condições do lesado, e ao seu justificado interesse específico na reparação do objeto danificado, antes que no percebimento do seu valor em dinheiro. 5. Um veículo já com muito uso pode ter um valor comercial pouco significativo, mas, ainda assim, pode satisfazer as necessidades do dono, enquanto a quantia, muitas vezes irrisória, equivalente ao seu valor de mercado, pode não conduzir à satisfação dessas mesmas necessidades, por não lhe permitir a aquisição de uma viatura da mesma marca, com as mesmas características e com o mesmo uso.”. Tendo presentes estes considerandos sobre a aferição da “excessiva onerosidade” que afasta a obrigação da reconstituição natural importa reverter ao caso concreto. Dos factos provados resulta apenas o valor da reparação do FT - € 10.328,42; o valor que a R. ofereceu a título indemnizatório ao A. € 2625,00 que associado ao valor do salvado de € 1875,00 indicado em 8) dos factos provados perfaria o total de € 4500,00; mais está provado que o autor adquiriu o FT em janeiro de 2010, usando-o nas deslocações normais do quotidiano e para a agricultura, mormente na apanha da azeitona, estando à data do acidente em normal estado de conservação e com 252.131 Kms percorridos. Não resultou, provado qual o valor venal (comercial) do FT à data do acidente, nem qual o seu valor patrimonial / de substituição. Este elemento era e é essencial para aferir da impossibilidade da reconstituição natural por excessiva onerosidade. Não se tendo provado este valor e fazendo apelo às regras do ónus probatório – resolvendo-se a dúvida sobre a realidade de um facto contra a parte a quem o facto aproveita (vide artigo 414º do CPC) – temos de concluir que a R. está obrigada a suportar o custo da reparação do FC. Na verdade à R. incumbia a prova da excessiva onerosidade da reparação, como facto impeditivo do direito do autor à reconstituição natural [cfr. quanto a esta questão do ónus probatório e no sentido por nós pugnado os já citados Acs. STJ de 05/07/2007; Ac. TRP de 25/02/2013 e Ac. TRG de 21/05/2015]. E esta apenas se pode aferir desde logo no confronto entre o valor do veículo à data do acidente/valor de substituição e o valor da reparação. A esta conclusão em nada afeta quer o cancelamento da matrícula do FT quer a aquisição de outra viatura posteriormente ao acidente de igual marca e modelo. A obrigação da R. à indemnização, atenta a sua qualidade de seguradora e responsabilidade assente do seu segurado, advém do prejuízo causado no património do autor pela ocorrência do acidente e a obrigação de indemnizar o correspondente prejuízo, aferido este nos termos supra analisados. O facto de o autor ter cancelado a matrícula ou adquirido outro carro – independentemente do valor de aquisição deste – em nada afasta tal obrigação. Improcede assim a pretensão da recorrente no que respeita à alteração da sua condenação ao pagamento do valor de reparação do FT que como tal se mantém. De qualquer modo, diga-se ainda que no confronto entre o valor de mercado invocado pela recorrente de € 4.500,00 ou os subsidiariamente invocados € 5.800,00 e o valor da reparação, a ter-se provado aqueles, atenta a demais factualidade alegada e o ónus que sobre a R. impendia de demonstrar a invocada excessiva onerosidade, não seria a prova deste valor no contexto da demais factualidade provada suficiente para considerar observado tal ónus. Termos em que se julga totalmente improcedente o recurso apresentado pela recorrente seguradora. * *** Sumário (artigo 663º n.º 7 do CPC). 1- Ao tribunal de recurso está vedado o conhecimento de questões novas anteriormente não submetidas à apreciação do tribunal a quo. Por tal não havendo lugar à reapreciação da matéria de facto quando em causa está matéria nova antes não alegada e que visa enquadrar fundamento de defesa antes não invocado pela recorrente, sob pena de violação do princípio da concentração da defesa e da preclusão. 2 –Na reapreciação da matéria de facto o tribunal da Relação fazendo uso dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, apenas deve alterar o decidido pelo tribunal a quo quando verifique erro de julgamento. 3- A obrigação da reconstituição natural em sede indemnizatória só cede perante a indemnização pecuniária em caso de excessiva onerosidade daquela; 4- O conceito de perda total definido pelo artigo 41º do DL 291/2007 para efeitos de afastar a obrigação da reconstituição natural no âmbito da regularização de sinistros por via extrajudicial não é para o tribunal vinculativo; 5- É ónus do obrigado à reparação a prova da excessiva onerosidade da reconstituição natural; III. Decisão. Em face do exposto, julga-se o recurso totalmente improcedente, consequentemente se confirmando a sentença recorrida. Custas da apelaçãopela recorrente. *** Guimarães, 09 de fevereiro de 2017. ____________________________________ (Maria de Fátima Almeida Andrade) ____________________________________ (Alexandra Maria Rolim Mendes) _____________________________________ (Maria Purificação Carvalho)