Processo:
Relator: Tribunal:
Decisão: Meio processual:

Profissão: Data de nascimento: Invalid Date
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
ANTÓNIO FIGUEIREDO DE ALMEIDA
Descritores
ARRENDAMENTO LICENÇA DE ESTABELECIMENTO COMERCIAL E INDUSTRIAL DECLARAÇÃO NEGOCIAL INTERPRETAÇÃO
No do documento
RG
Data do Acordão
03/09/2017
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO
Decisão
IMPROCEDENTE
Sumário
1) As licenças para o exercício de certo ramo (que podem implicar a realização de obras internas, instalações de água e eletricidade próprias e definições de áreas de compartimentos) cumprem ao arrendatário que pretende exercer a atividade específica; 2) Na interpretação da declaração negocial releva o sentido que seria considerado por uma pessoa normalmente diligente, sagaz e experiente em face dos termos da declaração e de todas as circunstâncias situadas dentro do horizonte concreto do declaratário, isto é, em face daquilo que o concreto destinatário da declaração conhecia e daquilo até onde ele podia conhecer.
Decisão integral
SUMÁRIO
1) As licenças para o exercício de certo ramo (que podem implicar a realização de obras internas, instalações de água e eletricidade próprias e definições de áreas de compartimentos) cumprem ao arrendatário que pretende exercer a atividade específica;
2) Na interpretação da declaração negocial releva o sentido que seria considerado por uma pessoa normalmente diligente, sagaz e experiente em face dos termos da declaração e de todas as circunstâncias situadas dentro do horizonte concreto do declaratário, isto é, em face daquilo que o concreto destinatário da declaração conhecia e daquilo até onde ele podia conhecer.
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Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães
I. RELATÓRIO
A) S veio intentar ação com processo comum contra o C, onde conclui pedindo que a ação seja julgada procedente, por provada e, em consequência, a ré condenada a:
a) Ver declarado que o contrato de arrendamento teve o seu termo por oposição à renovação em 31 de Março de 2015;
b) Entregar à autora livre de pessoas e coisas o arrendado;
c) Indemnizar a autora com €1.000,00 por cada dia de atraso na entrega do arrendado ou o valor que vier a ser fixado, a contar de 1 de Abril de 2015 até efetiva entrega.
O réu C apresentou contestação onde conclui:
a) Deve a ação ser julgada não provada e improcedente, absolvendo-se a ré dos pedidos formulados pela autora, com custas por esta, sendo ainda esta condenada em multa e indemnização de valor não inferior a todos as despesas e encargos processuais, por litigância de má-fé.
b) Deve a reconvenção ser julgada provada e procedente e condenar-se a autora a pagar, nos termos peticionados, o valor de €148.939,44, acrescidos de juros de mora à taxa legal e anual, contados desde a notificação desta contestação e até integral pagamento, sendo ainda declarado e reconhecido que a Associação ré goza do direito de retenção da coisa locada até que se mostre pago esse seu crédito, tudo com custas pela autora.
A autora S apresentou réplica onde conclui entendendo dever a ação ser julgada procedente e a reconvenção julgada improcedente, por não provada, devendo a ré ser condenada, como litigante de má-fé, em indemnização e multa a favor da autora, não inferior a €10.000.
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B) Foi elaborado despacho saneador, tendo-se relegado o conhecimento da invocada exceção perentória de direito de retenção para momento posterior, foi identificado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova.
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C) Procedeu-se a julgamento e foi proferida sentença onde se decidiu julgar a ação parcialmente procedente e a reconvenção totalmente improcedente e, consequentemente:
a) Declarar que o contrato de arrendamento em causa teve o seu termo por oposição à renovação em 31 de março de 2015;
b) Condenar a ré a entregar à autora livre de pessoas e coisas o arrendado;
c) Absolver a ré do pedido de indemnização formulado nos autos;
d) Absolver a reconvinda do pedido reconvencional.
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D) Inconformado com a decisão proferida, veio o réu C interpor recurso, o qual foi admitido como sendo de apelação, a subir nos próprios autos, com efeito suspensivo (fls. 229).
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Nas alegações de recurso d o réu C, são formuladas as seguintes conclusões:
1-Vem o presente recurso interposto, também com impugnação da decisão sobre a matéria de facto e com reapreciação da prova gravada, para o Tribunal da Relação de Guimarães, a processar como de Apelação, a subir imediatamente e nos próprios autos, com efeito suspensivo, sendo o presente recurso alargado à impugnação da decisão da matéria de facto e com reapreciação da prova gravada (artigos 638º, 639º e 640º NCPC).
2-Na verdade, a Apelante entende, salvo melhor opinião, que, atenta a prova documental, bem como os depoimentos gravados, a decisão deveria ser precisamente a contrária, ou seja deverá antes a douta sentença ser revogada e julgar-se totalmente improcedente a ação, absolvendo-se a ré de todos os pedidos, e a reconvenção julgada procedente, com condenação da autora /apelada no pagamento da quantia de €131.092,64, acrescida de juros e com reconhecimento do direito de retenção por parte da ré até que se mostre pago, sem prejuízo de se julgar improcedente o pedido de despejo, com declaração de que o contrato se mantém em vigor e se mostra renovado nos termos legais.
3-Daí que, nos termos do artigo 662º nº 1 do NCPC entende a ré que deve ser também dada por provada a matéria que se encontra alegada e foi objeto de prova documental e testemunhal acima transcrita, designadamente:
a) Que o local arrendado nunca o foi para outro fim que não fosse a de instalação e exploração de um parque de campismo;
b) Que, nos termos do Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de Março, com as alterações do Decreto-Lei n.º 228/2009, de 14 de Setembro, de conhecimento oficioso, um parque de campismo é um empreendimento turístico.
c) Que a atividade ali desenvolvida pela ré/apelante é uma atividade que é classificada como integrada na chamada indústria turística, com a prática de atos comerciais discriminados no artigo 19º do referido Decreto-Lei nº 39/2008;
d) Que os créditos resultantes da realização de obras decorrentes do disposto neste Decreto-Lei gozam, por parte da entidade exploradora, ou seja a apelante, do privilégio creditório imobiliário previsto no nº 4 do artigo 57º, logo sendo a apelante credora do respetivo montante dado por provado (€131.092,64);
e) Que o regime aplicável é o da urbanização e da edificação nos termos do nº 1 do artigo 23º do Dec.Lei nº 39/2008.
4- Atendendo aos critérios dos artigos 236º e 238º do Código Civil, bem como ao teor do texto do contrato original, designadamente quanto ao montante da renda e fim do contrato – “Primeira: O prédio arrendado destina-se à instalação de um parque de campismo e caravanismo”, não restam dúvidas quanto ao fim do contrato.
5- Como tal, e contrariamente à interpretação da douta sentença recorrida, faz todo o sentido a sua integração nas normas transitórias do NRAU – artigos 27º e seguintes, uma vez que os contratos de prédios rústicos para fins comerciais ou industriais são sujeitos às regras do arrendamento urbano para aqueles fins.
6- Desta feita mantém-se o nosso entendimento quanto à aplicação do artigo 1097º, nos termos da redação conferida pela Lei 6/2006 de 27 de fevereiro.
7- Nunca a autora comunicou à ré que pretendia aplicar ao contrato o regime previsto na Lei nº 6/2006, de 27 de fevereiro, muito menos a ré alguma vez aceitou expressamente submeter ao regime desta lei o contrato de arrendamento e designadamente este seu último aditamento.
 8- Mas, ainda que se considerasse que o contrato tivesse o seu termo em 31.03.2015, a “denúncia” ou declaração de intenção de não renovação naquela data não foi efetuada com a antecedência mínima legal, então exigível.
9- A Lei nº 6/2006, de 27 de fevereiro, que veio alterar o regime de arrendamento, introduziu nova redação aos artigos 1110º do Código Civil, estipulando no seu nº 2 que “na falta de estipulação, o contrato considera-se celebrado com prazo certo, pelo período de 10 anos…”
10- Também a mesma Lei nº 6/2006 veio dar nova redação ao artigo 1097º do Código Civil, ao estipular que “o senhorio pode impedir a renovação automática mediante comunicação ao arrendatário com uma antecedência não inferior a um ano do termo do contrato”.
11- Acresce que da mesma Lei nº 6/2006, das suas normas transitórias, designadamente nos seus artigos 26º e 27º, resulta ser este novo regime aplicável ao contrato objeto dos autos.
12- Assim, é de concluir que a autora não observa nem a forma prevista no artigo 1097º do C. Civil, na redação do DL 321-B/90, de 15 de outubro, nem os prazos e meio processual estipulados, muito menos o prazo de um ano previsto no mesmo artigo na redação da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, que lhe é aplicável.
13- Na verdade, atento o disposto na Lei 31/2012, de 14 de agosto, que aprova o NRAU, que só entrou em vigor no prazo estipulado no seu artigo 65º, tendo em atenção a data da sua entrada em vigor e o disposto nos seus artigos 59º, nº 1 e nº 4, ou seja que “as normas supletivas contidas no NRAU só se aplicam aos contratos celebrados antes da entrada em vigor da presente lei quando não sejam em sentido oposto ao de norma supletiva vigente aquando da celebração, caso em que é essa a norma aplicável”, é óbvio e definitivo que, mesmo que fosse considerada a alegação e confissão da autora de que o contrato teve o seu termo em 31.03.2015, a autora não efetuou a denúncia do contrato na forma e com a antecedência legal exigidas, o que conduz a total improcedência da ação.
14- Deste modo, o contrato em curso tinha o seu termo não em 31.03.2015, mas sim em 31.12.2015 e, porque a autora não fez qualquer denúncia do mesmo no prazo e forma legal, para ter efeitos nesta data de 31.12.2015 ou em qualquer outra, o contrato encontra-se virtual, automaticamente, legal e formalmente renovado, nos termos da lei aplicável supracitada.
15- Finalmente, não estamos perante o arrendamento simplista de um terreno rústico, mas antes de um complexo de construções, com artigos urbanos, e de um terreno com inscrição matricial rústica, mas que se destinam no seu todo ao exercício da atividade da industria de turismo, com prática de atos comerciais, designadamente da prestação de serviços turísticos pela ré, tendo como compensação o pagamento de taxas e valores diários por ocupação de espaço e instalações, uso e consumo de infraestruturas de água e energia elétrica, de saneamento e de higiene pessoal e pública, serviços de segurança e guarda de pessoas e bens, venda de produtos e serviços turísticos, como definidos no Decreto Lei nº 39/2008, de 7 de Março.
16- Ora, sujeitos que estão tais empreendimentos turísticos a licenciamento, nos termos dos artigos 26º e seguintes daquele Decreto-Lei, foi estabelecido no seu artigo 75º um prazo de dois anos para a sua legalização e licenciamento nos termos decretados, sem exceção, sob pena de encerramento.
17- Daí que, sendo a lei de conhecimento oficioso, o Tribunal a quo deixou de conhecer desta matéria essencial, aliás, alegada pela ré e classificou erradamente o contrato de arrendamento em causa, que obviamente não pode ser considerado como “um arrendamento rústico não sujeito a regime especial”, aliás, até em contrário da causa de pedir da própria autora.
18- Ora, nos termos do artigo 1031º do Código Civil, a autora, enquanto locadora, estava e está obrigada a assegurar à locatária, a Associação demandada, o gozo da coisa locada para os fins a que a mesma se destina.
19- As obras e instalações técnicas, inclusive de segurança e proteção, foram efetuadas a partir de 2009 a até 2011, no valor total de €131.092,64 (nº 11 dos factos provados).
20- Todas estas obras e intervenções técnicas foram imprescindíveis para a legalização e licenciamento do parque, sem as quais o mesmo já estaria encerrado há muito, por não cumprimento da legislação em vigor e exigências das entidades oficiais que a fiscalizam.
21- Obrigatoriedade de obras essas que, aquando da celebração do contrato original e seus posteriores aditamentos, não era previsível, pelo que não foi nesse sentido a manifestação de vontade das partes na celebração do contrato.
22- Assim, não pode ser admitido como válido o entendimento de que as obras decorrentes da entrada em vigor do Decreto-lei nº 39/2008, de 7 de março, eram obrigação da apelante.
23- A Associação ré sempre terá direito a ser reembolsada de todos aqueles custos com a legalização do parque, atrás referidos e esse direito a reembolso resulta do disposto no artigo 1031º do C. Civil, bem como artigo 29º da lei n.º 6/2006, esta quer na sua redação original, quer na alteração que foi introduzida pela Lei n.º 79/2014, de 19 de dezembro e 473º a 481º do CC.
24- Deste modo, a Associação ré é credora da autora daquela quantia de €131.092,64, pelo que, atento o alegado, a pretensão da autora e as disposições legais referidas e ainda o disposto no artigo 754º e seguintes do CC, goza esta do direito de retenção sobre o local arrendado, objeto do contrato, até que se mostre pago aquele valor, quer o contrato finde por denúncia ou outra razão atendível, quer se mantenha em vigor.
25- Assim, a douta sentença deixou de apreciar e valorar devidamente matéria de facto essencial, omissão de pronúncia que influiu na boa decisão da causa, o que constitui nulidade prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 615º do CPC.
26- Aliás, tal reapreciação da prova revela-se essencial para uma boa decisão e resulta inequivocamente dos depoimentos prestados em audiência de julgamento e do teor dos documentos juntos aos autos, tudo conjugado também à luz da experiência comum.
27- Era ónus da Autora, como resulta dos artigos 342º e seguintes do C. Civil, alegar e provar os factos que constituem a sua causa de pedir, no sentido de se concluir se serão ou seriam subsumíveis ao caso as conclusões de direito que pretendem e que suportam os seus pedidos.
28- Daí que, nos termos do artigo 662º, n.º 1 do NCPC entende a ré que deve a ação ser antes julgada improcedente, atento os concretos meios de prova alegados e citados.
29- Acresce que as custas da ação devem assim ser imputadas à autora, na totalidade, pois que deu causa à ação, e, de qualquer modo, como a autora não provou os factos alegados, a ação, também por isso, deverá improceder totalmente.
30- Deste modo foram violadas as disposições legais citadas devendo a apelação ser julgada procedente e no sentido das conclusões, com a total improcedência da ação, revogando-se nesse sentido a douta sentença recorrida.
Termina entendendo dever ser dado provimento ao recurso e no sentido das conclusões.
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Pela autora S foi apresentada resposta onde entende dever ser negado o recurso do recorrente.
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E) Foram colhidos os vistos legais.
F) As questões a decidir na apelação são as de saber:
1) Se a sentença é nula;
2) Se deverá ser alterada a decisão quanto à matéria de facto;
3) Se deverá ser alterada a decisão propriamente jurídica da causa.
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II. FUNDAMENTAÇÃO
A) Na 1ª instância foi apurada a seguinte matéria de facto:
I. Factos Provados 
1. Por escritura pública, lavrada no dia 12 de maio de 1979, no Cartório Notarial de Esposende, a autora deu de arrendamento à ré o prédio misto, que consta de casa térrea com coberto, terreno e logradouro e terreno de lavradio e mato, sito no Lugar dos Lírios, em Fão (…) inscrito nas matrizes respetivas sob os artigos …, urbano, e 2/8 do artigo …, rústico, acordando ambas nas seguintes cláusulas:
Primeira
O prédio arrendado destina-se à instalação de um parque de campismo e caravanismo.
Segunda
O prazo do arrendamento é de vinte anos, com início em um de abril de mil novecentos e setenta e oito e termo em trinta e um de março de mil novecentos e noventa e oito;
Terceira
A renda total é de um milhão novecentos e vinte mil escudos, a qual será satisfeita nos seguintes termos (…)
Quarta
A renda anual será paga no dia um de abril do ano imediatamente anterior ao que respeitar ficando isento o ano de mil novecentos e setenta e oito na Secretaria da representada da primeira outorgante.
Quinta
A Associação representada pelo segundo outorgante poderá introduzir no prédio arrendado as obras ou benfeitorias que entender necessárias ao fim e objetivos do arrendamento, obras e benfeitorias essas que, findo o contrato, ficam incorporadas no prédio, sem direito a qualquer indemnização ou direito de retenção pela arrendatária. (fls. 92 a 95)
2. No final do referido contrato consta ainda o seguinte: “Considerando que a parte rústica do prédio dado de arrendamento tem valor muito superior à parte urbana, este arrendamento é considerado de prédio rústico, sendo o respetivo selo liquidado como tal”.
3. Em 01.09.1994, autora e ré declararam acordar num aditamento ao referido contrato, com as seguintes cláusulas:
“Alínea A)
No dia 12 de maio de 1979 foi lavrada a escritura de arrendamento (…)
Alínea B)
O prédio destina-se à instalação de um parque de campismo e caravanismo.
Alínea C)
O termo do prazo deste contrato ocorre em 31.03.1998.
Alínea D)
Os pactuantes reconhecem a validade plena do invocado contrato, em especial a renda em vigor, o fim do contrato e o seu termo, cláusulas aceites por ambas as partes, sem o que jamais celebrariam o invocado contrato.
Alínea E)
Ora, tendo presente o mesmo espírito acima referido, sem o qual ambas as partes aceitam a invalidade do contrato celebrado, e deste modo contrato-promessa, os pactuantes prometem alterá-lo com as seguintes cláusulas:
Alínea F)
O termo do prazo do contrato de arrendamento em vigor passa para 31 de março de 2005.
Alínea G)
A renda anual é de 2.400.000$00 a pagar até finais de setembro de cada ano.
Alínea H)
A renda sofrerá um aumento anual equivalente ao indicie de inflação do ano anterior.
Alínea I)
Em tudo o mais se respeitarão as cláusulas do contrato.
Alínea J)
Este acordo faz parte integrante do contrato de arrendamento acima referenciado e os pactuantes renunciam a invocar a sua nulidade em juízo, por falta de observância da forma exigida para a alteração”
4. Em 31 de Março de 2006, autora e ré celebraram novo aditamento ao referido contrato e sua alteração, com as seguintes cláusulas:
Alínea A)
Que vão prolongar o contrato de arrendamento celebrado em 12 de maio de 1979 (…) nos termos e condições seguintes:
1. Este acordo tem o seu início em 01.04.2006 e termina em 2015;
2. A renda anual, e a pagar até ao final do mês de setembro de cada ano, é a seguinte: em 2006 a quantia de (…) €, em 2007 a quantia de (…), em 2008 a quantia de …, em 2009 a quantia de …, em 2010 a quantia de …, em 2011 a quantia de…, em 2012 a quantia de …, em 2013 a quantia de…, em 2014 a quantia de … e em 2015 a quantia de … €.
Alínea B)
Que quanto ao mais são respeitadas todas as cláusulas anteriormente expressamente acordadas, em particular, quanto às obras em efeito, que ficarão a pertencer ao prédio, sem direito a indemnização ou retenção, sejam elas de que natureza forem, e bem assim quanto ao prazo agora acordado. (fls. 14-verso e 15)
5. Por ofício (nº 227) de 02.12.2013, rececionado pela autora, a ré comunicou àquela que:
“Tendo em atenção a assinatura do contrato de arrendamento efetuado em 31 de março de 2006 e encontrando-se a decorrer a sua renovação até final de 2015.
(…)
Estando este Clube interessado em continuar com o Parque de Campismo, em Fão (…)
Considerando o grande investimento realizado nos últimos dois anos para legalização do Parque, junto da C.M. de Esposende e Turismo de Portugal, só amortizável em não menos de 4 ou 5 anos.
Vimos por este meio solicitar a sua renovação por um período nunca inferior a dez anos, em virtude deste Clube estar a amortizar o investimento efetuado.” (fls. 109)
6. Em resposta ao referido ofício da ré, por carta registada, com aviso de receção, de 30.12.2013, rececionada pela ré em 03.01.2014, a autora comunicou a esta última que não pretendia a renovação do contrato de arrendamento do Parque de Campismo, mas que poderia ser considerada a prorrogação do contrato, por escrito, por mais um ou dois anos. (fls. 97 a 99)
7. Por carta registada, com aviso de receção, de 10.04.2014, rececionada pela ré em 14.04.2014, a autora comunicou à ré que não pretendia a renovação do contrato em 01.04.2015. (fls. 16 a 17)
8. Por carta registada, com aviso de receção, de 11.06.2014, a autora comunicou à ré, “para que não haja qualquer dúvida sobre o termo do contrato”, que o termo do contrato ocorria em março de 2015 e que, na referida data, deveria a ré fazer a entrega do prédio arrendado livre de pessoas e coisas. (fls. 18 a 19)
9. Por carta registada, com aviso de receção, de 03.03.2015, a autora comunicou à ré que não tendo esta comunicado a entrega voluntária e livre do campismo instalado na propriedade da mesma até ao dia 31 de março em curso, informava que iria reclamar uma indemnização diária, pelo atraso, não inferior a 1.000 €. (fls. 22 a 23)
10. Por carta registada, com aviso de recepção, de 28.04.2015, recepcionada pela Autora em
04.05.2015, a ré comunicou à autora, designadamente, que considerava que o contrato teria o seu termo em 31.12.2015, não tendo sido rececionada com a antecedência e forma legal qualquer denúncia para essa data, mas que estavam abertos a iniciar negociações. (fls. 42-verso a 43-verso)
11. Para adequar as instalações às exigências técnicas resultantes de nova legislação, a ré teve de efetuar, a partir de 2009 e até 2011, obras de eletricidade, água, saneamento, instalações elétricas na casa arrendada, anexos, arruamentos e terrenos do parque destinados ao campismo, bem como de segurança e proteção, no valor total de 131.092,64 €.
II. Factos não provados
1. A autora tivesse, em 01.04.2015, contactos e interessados no arrendamento que lhe iriam proporcionar uma renda nunca inferior a 5.000 € mensais;
2. Para adequar as instalações às exigências técnicas resultantes da nova legislação, a ré tenha tido de efetuar, em 2013 a 2015, pequenas correções às obras realizadas em 2009 a 2011.
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B) O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente, não podendo o tribunal conhecer de outras questões, que não tenham sido suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
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C) O apelante vem invocar a nulidade da sentença, alegando que a mesma deixou de apreciar matéria que deveria ter conhecido, como seja, a que se refere ao disposto nos artigos 19º, 23º nº 1, 24º, 26º e 75º do Decreto-Lei nº 39/2008, de 07/03.
A sentença recorrida apreciou tais matérias, na parte que relevam quanto ao objeto do processo, não obstante o normativo referido não ter sido indicado nos articulados e não ser relevante para tal objeto.
Com efeito, o diploma em referência aprova o regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos e trata no artigo 19º da noção de parques de campismo e de caravanismo, estabelecendo no artigo 23º nº 1 que o procedimento respeitante à instalação dos empreendimentos turísticos segue o regime previsto no presente decreto-lei e está submetido ao regime jurídico da urbanização e da edificação, com as especificidades constantes do presente regime e respetiva regulamentação, sempre que envolva a realização das operações urbanísticas ali previstas.
Por sua vez o artigo 24º diz que:
1 — As disposições do presente decreto-lei relativas à instalação e ao funcionamento dos empreendimentos turísticos são aplicáveis aos estabelecimentos comerciais e de restauração ou de bebidas que deles sejam partes integrantes.
2 — O disposto no número anterior não dispensa o cumprimento dos requisitos específicos relativos a instalações e funcionamento previstos nas respetivas regulamentações.
O artigo 26º refere-se ao licenciamento de operações urbanísticas e o artigo 75º ao prazo para a legalização, de onde resulta que para o objeto do processo os normativos em questão não têm qualquer relevância, pelo que nunca teriam de ser apreciados pelo tribunal a quo, pelo que improcede a arguição.
O apelante afirma pretender impugnar a decisão sobre a matéria de facto e com reapreciação da prova gravada, entendendo que “deve ser também dada por provada a matéria que se encontra alegada e foi objeto de prova documental e testemunhal acima transcrita, designadamente:
a)-Que o local arrendado nunca o foi para outro fim que não fosse a de instalação e exploração de um parque de campismo;
b)-Que, nos termos do Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de Março, com as alterações do Decreto Lei n.º 228/2009, de 14 de Setembro, de conhecimento oficioso, um parque de campismo é um empreendimento turístico.
c)-Que a atividade ali desenvolvida pela ré/apelante é uma atividade que é classificada como integrada na chamada indústria turística, com a prática de atos comerciais discriminados no artigo 19º do referido DL 39/2008;
d)-Que os créditos resultantes da realização de obras decorrentes do disposto neste Decreto-Lei gozam, por parte da entidade exploradora, ou seja, a apelante, do privilégio creditório imobiliário previsto no n.º 4 do artigo 57, logo sendo a apelante credora do respetivo montante dado por provado (131.092,64 €);
e)-Que o regime aplicável é o da urbanização e da edificação nos termos do n.º 1 do artigo 23º do Dec.Lei n.º 39/2008.”
Quanto à matéria “de facto” que o apelante pretende ver reapreciada importa dizer que, no que se refere à matéria da alínea a), já resulta da matéria de facto apurada que o prédio arrendado se destinou à instalação de um parque de campismo e caravanismo, sendo completamente irrelevante a formulação constante da referida alínea a), sendo certo que não resulta da matéria de facto que alguma vez o local arrendado tivesse tido destino diferente.
Quanto às matérias que constam das alíneas b) a e) é manifesto que se trata de matéria de direito ou conclusiva que, nessa qualidade, não podem figurar na matéria de facto apurada, sem prejuízo de as questões aí suscitadas, na medida em que possam ter algum relevo para a apreciação da decisão jurídica da causa, possam ser apreciadas, enquanto tal, mas não em termos de matéria de facto, que não são.
Pelo exposto, manter-se-á a formulação da matéria de facto, tal como foi decidida na 1ª Instância.
Referia o apelante que os créditos resultantes da realização de obras decorrentes do disposto neste Decreto-Lei gozam, por parte da entidade exploradora, ou seja, a apelante, do privilégio creditório imobiliário previsto no n.º 4 do artigo 57, logo sendo a apelante credora do respetivo montante dado por provado (131.092,64 €), para daí concluir que a autora é devedora de tal quantia, simplesmente, para se ter um privilégio creditório é necessário – como resulta da expressão – que o apelante seja credor da apelada, e não é, conforme resulta da decisão recorrida.
Importa recordar que de acordo com a cláusula quinta do contrato celebrado entre a autora e o réu, por escritura de 12/05/1979, ficou estabelecido que “a Associação representada pelo segundo outorgante poderá introduzir no prédio arrendado as obras ou benfeitorias que entender necessárias ao fim e objetivos do arrendamento, obras e benfeitorias essas que, findo o contrato, ficam incorporadas no prédio, sem direito a qualquer indemnização ou direito de retenção pela arrendatária”, o que se mostra reafirmado na alínea B) do último aditamento, de 31.03.2006, onde se pode ler “que quanto ao mais são respeitadas todas as cláusulas anteriormente expressamente acordadas, em particular, quanto às obras em efeito, que ficarão a pertencer ao prédio, sem direito a indemnização ou retenção, sejam elas de que natureza forem (…)”.
Conforme se refere na decisão recorrida, “defende, porém, a ré que as obras ora em causa não são aquelas que foram visadas pelas partes nas apontadas cláusulas, tendo sido a realização das mesmas impostas por legislação sobre parques de campismo e instalações de carácter turístico, entrada em vigor após o último dos aludidos aditamentos, sendo tais obras da responsabilidade da autora, porquanto nos termos do art. 1031º, b), do Cód. Civil, é obrigação do locador assegurar ao locatário o gozo da coisa para os fins a que a coisa se destina, não tendo a autora tomado nenhuma iniciativa, sendo conhecedora que a falta de legalização implicaria o encerramento do parque e de que a sua realização era urgente…
Desde logo, convém recordar que, de harmonia com o disposto no art. 1036º, nº 1, do Cód. Civil, a possibilidade de o locatário se substituir ao locador na realização de “reparações ou outras despesas”, da responsabilidade do último e com direito ao seu reembolso, se umas ou outras, pela sua urgência, se não compadecerem com as delongas do procedimento judicial, depende da existência de mora por parte do locador, o mesmo é dizer, da verificação de uma prévia interpelação do locador para a realização daquelas, só se mostrando justificada a realização das mesmas independentemente de mora do locador em caso de “urgência que não consinta qualquer dilação” (nº 2).
Ora, no caso, ainda que as obras em causa fossem da responsabilidade da autora - o que, como infra se verá, não se figura defensável -, certo é que a ré tão pouco alega ter interpelado a autora para a realização das aludidas obras, nada tendo, por outro lado, alegado no sentido de demonstrar a verificação de uma situação suscetível de configurar um caso de “urgência que não consinta qualquer dilação”.
Mas poderá sequer dizer-se que as aludidas obras eram da responsabilidade da autora?
Utilizando as palavras do Acórdão do STJ de 06.07.2011 “assim como não é do senso comum” que, sem convenção de sentido contrário, seja o proprietário do prédio locado a requerer licença específica que viabilize o funcionamento de um estabelecimento comercial ou, no caso que nos ocupa, parque de campismo, alheio, “do mesmo modo não se alcança a razoabilidade de se lhe impor a realização de obras de que aquele possa depender e que contendam, v.g. com o cumprimento de exigências sanitárias (…), o mesmo se tendo defendido em Acórdão do STJ de 13.12.2007, Pº nº07 A2766, onde se escreveu que licenças “para o exercício de certo ramo (que podem implicar a realização de obras internas, instalações de água e eletricidade próprias e definições de áreas de compartimentos) cumprem ao arrendatário que pretende exercer a atividade específica”.
Assim sendo, não cumpria à autora, como locadora, proceder à realização das obras legalmente impostas para o funcionamento do parque de campismo instalado no prédio arrendado.”
Quanto à questão de saber qual a lei aplicável à situação, antes do mais, parece ser de aceitar a qualificação feita de que se trata de um contrato de arrendamento de prédio rústico (face à manifesta prevalência desta perante a parte urbana do mesmo prédio) não abrangido pelo regime do arrendamento rural, conforme era designado no regime do Código Civil de 1966 e que, atualmente, é designado como arrendamento rústico não sujeito a regime especial (artigo 1108º Código Civil).
O contrato foi celebrado em 12/05/1979 e mantinha-se quando entrou em vigor a Lei nº 6/2006, de 27/02, que aprovou o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU).
Conforme se refere no Acórdão do STJ de 24/09/2013, proferido no processo nº 317/098.9TBOLH.E1.S1 (www.dgsi.pt), que tratava de uma situação análoga à presente e se discutia, designadamente, o regime de denúncia, “de acordo com o “princípio geral”, em vigor à data da celebração do contrato, no arrendamento em causa, o senhorio não gozava do direito de denúncia (art. 1095 do Cód. Civil, preceito integrado na Subsecção III, Denúncia do contrato, da Secção VIII, Arrendamento de prédios urbanos e arrendamento de prédios rústicos não abrangidos na secção precedente; respeitante esta ao arrendamento rural).
A situação modificou-se com o DL n.º 321-B/90, de 15 de outubro, que, no respetivo Decreto Preambular, aprovou o RAU (art. 1), tendo revogado, expressamente, os artigos 1083º a 1120º do Código Civil ((art. 3, n.º 1, al. a)).      
Nos termos do art. 6º, n.º 1 do RAU, “aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regimes especiais…aplica-se o regime geral da locação civil, bem como o disposto nos artigos 2 a 4, 19 a 21, 44 a 46, 74 a 76 e 83 a 85, 88 e 89 do presente diploma, com as devidas adaptações”.
Conforme sustenta, António Pais de Sousa, [Anotações ao Regime do Arrendamento Urbano (RAU), 6.ª ed., p. 76] reportando-se aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regimes especiais: “trata-se daqueles arrendamentos a que o Código Civil de 1967 designava por arrendamentos de prédios rústicos não abrangidos pelo arrendamento rural”.
Acrescentando que: “No Código Civil eles mereceram toda a proteção conferida ao arrendamento urbano, o que não sucede no RAU”.
Com efeito, nos arrendamentos rústicos não sujeitos a regime especial, o senhorio passou a poder denunciar o contrato nos termos do regime geral da locação civil, por não estar sujeito à restrição do n.º 2 do artigo 68 do RAU (uma vez, excluída a aplicação a tais arrendamentos dos arts. 69 a 72 do RAU).
Sendo esta possibilidade legal aplicável mesmo aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regime especial, que tenham sido celebrados antes de 15 de novembro de 1990, como no caso do contrato sub judice.
A Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro (conhecida como NRAU), que entrou em vigor em 28 de junho, devolvendo a disciplina substantiva do arrendamento urbano ao Cód. Civil, repôs (com a redação dada pelo art. 3) os arts. 1064 a 1113. [10] 
Pretendeu o legislador do NRAU, como se sabe, reduzir o vinculismo arrendatício.
Preceitua o art. 1108 (na redação da Lei n.º 6/2006, como os demais artigos a seguir citados sem menção de origem) que:
“As regras da presente subsecção aplicam-se aos arrendamentos urbanos para fins não habitacionais, bem como, com as necessárias adaptações e em conjunto com o regime geral da locação civil, aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regimes especiais”.
As disposições especiais do arrendamento para fins não habitacionais são as que constam dos arts. 1108 a 1113 do CC, regendo o art. 1110, n.º 1 e 2 sobre a “duração, denúncia ou oposição à renovação”.
O regime geral da locação civil é o estabelecido nos arts. 1054 e 1055 do CC.
Na Lei n.º 6/2006, a norma fundamental sobre a aplicação no tempo é a constante do art. 59, n.º 1:
“O NRAU aplica-se aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor, bem como às relações contratuais constituídas que subsistam nessa data, sem prejuízo do previsto nas normas transitórias”.
   Manda esta norma aplicar o NRAU às relações contratuais constituídas que subsistam na data da sua entrada em vigor, como é o caso em análise, sem prejuízo do previsto nas normas transitórias.
   As normas transitórias, a que se alude, são as constantes dos arts. 26 a 28 do NRAU - normas que integram os Capítulo I (“contratos habitacionais celebrados na vigência do regime do arrendamento urbano e contratos não habitacionais celebrados depois do Decreto-Lei n.º 257/95, de 30 de Setembro”) e II (“contratos habitacionais celebrados antes da vigência do RAU e contratos não habitacionais celebrados antes do Decreto-Lei n.º 257/95, de 30 de Setembro)”, do Título II, da Lei n.º 6/2006.
Aos contratos englobados no referido Capítulo II, manda o art. 28 aplicar, com as devidas adaptações, o previsto no art. 26.
Distinguindo este, nomeadamente, entre o regime transitório aplicável aos contratos de duração limitada (n.º 3) e aos contratos sem duração limitada (n.º 4). [12] / [13]
Como nota o Conselheiro Jorge Pinto Furtado, Manual de Arrendamento Urbano, volume I, 4.ª ed., p. 178, acerca do regime transitório do Capítulo II, do Título II, da Lei n.º 6/2006: “A diferença dos dois períodos explica-se pela intenção de englobar todos os contratos que se encontram onerados com o vínculo da prorrogação forçada.
Em 15 de Novembro de 1990, com a entrada em vigor do RAU, passou a ser admitida a celebração de arrendamentos para habitação ditos de duração limitada, isto é, em que ultimado o prazo por que foram celebrados, podia o senhorio (embora com um aviso prévio de 1 ano) livremente não prorrogar o contrato, mas fazê-lo cessar.
Esta faculdade só veio a ser permitida relativamente aos arrendamentos não habitacionais (para comércio ou indústria, para exercício de profissão liberal ou para outro fim não habitacional) com a publicação do Decreto-Lei n.º 275/95.
É isto que justifica a referência a estes diplomas e às respetivas entradas em vigor. É a tais arrendamentos que se referem os arts. 27 e ss. da Lei n.º 6/2006”...
E continua aquele aresto, “vimos, também, que os contratos de arrendamento rústicos não sujeitos a regime especial, com a entrada em vigor do RAU, passaram a ser livremente denunciados pelo senhorio, findo o prazo do contrato ou da respetiva renovação, nos termos gerais do art. 1055 do Cód. Civil, valendo tal solução mesmo quanto a arrendamentos anteriores a 15 de novembro de 1990.
Ora, radicando a existência dos dois grupos de normas transitórias (os Capítulos I e II, do Título II da Lei n.º 6/2006) na intenção do legislador de englobar (no Capitulo II) todos os contratos que se encontravam onerados com o vínculo da prorrogação forçada, não parece fazer sentido, segundo julgamos, a integração do arrendamento em causa no âmbito de aplicação das referidas normas transitórias do NRAU: no Capítulo II, por já não se tratar de contrato sujeito ao regime vinculístico; e no Capítulo I, por ter sido celebrado em data anterior ao quadro temporal a que este se refere.
Afastada, deste modo, a aplicação, ao caso, das normas transitórias dos Capítulos I e II, do Título II, do NRAU, atinentes à questão que nos ocupa.
No que diz respeito ao regime da “duração, denúncia ou oposição à renovação”, em sede de disposições especiais do arrendamento para fins não habitacionais, dispõe o art. 1110 o seguinte:
“1. As regras relativas à duração, denúncia e oposição à renovação dos contratos de arrendamento para fins não habitacionais são livremente estabelecidas pelas partes, aplicando-se, na falta de estipulação, o disposto quanto ao arrendamento para habitação.
2. Na falta de estipulação, o contrato considera-se celebrado com prazo certo, pelo período de 10 anos, não podendo o arrendatário denunciá-lo com antecedência inferior a um ano”.
Conclui-se assim que é aplicável à situação dos autos o Regime da Lei nº 6/2006 (NRAU), não sendo, conforme acima exposto, aplicáveis à situação dos autos as normas transitórias dos Capítulos I e II, do Título II, do NRAU, sendo as disposições aplicáveis as previstas para o arrendamento para fins não habitacionais que constam dos artigos 1108º a 1113º do Código Civil.
O artigo 1110º nº 1 Código Civil estabelece que “as regras relativas à duração, denúncia e oposição à renovação dos contratos de arrendamento para fins não habitacionais são livremente estabelecidas pelas partes, aplicando-se, na falta de estipulação, o disposto quanto ao arrendamento para habitação.”
O artigo 1054º nº 1 do Código Civil estabelece que “findo o prazo do arrendamento, o contrato renova-se por períodos sucessivos se nenhuma das partes se tiver oposto à renovação no tempo e pela forma convencionados ou designados na lei.”
Por outro lado, o artigo 1055º do Código Civil dispõe que:
“1 - A oposição à renovação tem de ser comunicada ao outro contraente com a antecedência mínima seguinte:
a) Seis meses, se o prazo for igual ou superior a seis anos;
b) 60 dias, se o prazo for de um a seis anos;
c) 30 dias, quando o prazo for de três meses a um ano;
d) Um terço do prazo, quando este for inferior a três meses.
2 - A antecedência a que se refere o número anterior reporta-se ao fim do prazo do contrato ou da renovação.”
Do exposto resulta que a denúncia pela autora e apelada foi efetuada corretamente e é valida e juridicamente relevante e tem como efeito fazer cessar o contrato de arrendamento que foi celebrado entre as partes.
E tal conclusão não é afastada pelo facto de as partes terem celebrado um novo aditamento ao contrato em 31/03/2006, onde se afirma que vão prolongar o contrato de arrendamento celebrado em 12/05/1979 e que esse acordo tem o seu início em 01/04/2006 e termina em 2015, sem que se tenha estabelecido o dia e mês em que termina.
Para interpretação da declaração negocial importa ter em consideração o estatuído no artigo 236º do Código Civil que estabelece, como princípio geral que,
“1. A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.
2. Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida.”
Trata-se da consagração da chamada teria da impressão do destinatário em que se considera o real declaratário nas condições concretas em que se encontra e se tomam em consideração os elementos que o mesmo efetivamente conheceu, mais aqueles que uma pessoa razoável, quer dizer, normalmente esclarecida, zelosa e sagaz, teria conhecido e afigura-se que ele raciocinou sobre essas circunstâncias como o teria feito um declaratário razoável…
Releva o sentido que seria considerado por uma pessoa normalmente diligente, sagaz e experiente em face dos termos da declaração e de todas as circunstâncias situadas dentro do horizonte concreto do declaratário, isto é, em face daquilo que o concreto destinatário da declaração conhecia e daquilo até onde ele podia conhecer (Prof. Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª Edição, pág. 447 e seg.).
Tendo em conta que se estabeleceu no contrato (original e nos aditamentos) que o pagamento da renda seria anual, e que o período de tempo, em referência sempre foi em termos de anos completos, terá de se entender que a cessação do contrato de arrendamento terá de se referir a 31/03/2015, não havendo qualquer elemento objetivo que imponha outro momento e, designadamente, o dia 31/12/2015.
Quanto à pretensão de reembolso da apelante pelas despesas com a realização das obras, conforme se referiu acima, não havia qualquer obrigação por parte da locadora na realização das mesmas, nem qualquer fundamento legal para que tenha direito ao seu reembolso, a suportar pela apelada, dado que, para além do mais, conforme se referiu, ficou expressamente estabelecido no contrato que a Associação representada pelo segundo outorgante poderá introduzir no prédio arrendado as obras ou benfeitorias que entender necessárias ao fim e objetivos do arrendamento, obras e benfeitorias essas que, findo o contrato, ficam incorporadas no prédio, sem direito a qualquer indemnização ou direito de retenção pela arrendatária.
E há que dizer que não há qualquer enriquecimento ilícito da autora e apelada tendo em conta o estipulado pelas partes, para além de não estar demonstrado que as obras possam vir a ter qualquer utilidade para o aproveitamento que a autora venha a fazer do imóvel, podendo, inclusivamente, suceder que tenha necessidade de as retirar para a utilização que pretenda dar ao imóvel, com as inerentes despesas, pelo que sempre estaria por demonstrar que haja um enriquecimento.
Por todo o exposto resulta que a apelação terá de improceder e, em consequência, confirmar-se a douta sentença recorrida. 
*
D) Em conclusão:
1) As licenças para o exercício de certo ramo (que podem implicar a realização de obras internas, instalações de água e eletricidade próprias e definições de áreas de compartimentos) cumprem ao arrendatário que pretende exercer a atividade específica;
2) Na interpretação da declaração negocial releva o sentido que seria considerado por uma pessoa normalmente diligente, sagaz e experiente em face dos termos da declaração e de todas as circunstâncias situadas dentro do horizonte concreto do declaratário, isto é, em face daquilo que o concreto destinatário da declaração conhecia e daquilo até onde ele podia conhecer.
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III. DECISÃO
Pelo exposto, tendo em conta o que antecede, acorda-se em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a douta sentença recorrida.
Custas pelo apelante.
Notifique.
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Guimarães, 09/03/2017

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	1 - Relator: António Figueiredo de Almeida (60454031617)
       1ª Adjunta: Desembargadora Maria Cristina Cerdeira
       2ª Adjunta: Desembargadora Eva Almeida

SUMÁRIO 1) As licenças para o exercício de certo ramo (que podem implicar a realização de obras internas, instalações de água e eletricidade próprias e definições de áreas de compartimentos) cumprem ao arrendatário que pretende exercer a atividade específica; 2) Na interpretação da declaração negocial releva o sentido que seria considerado por uma pessoa normalmente diligente, sagaz e experiente em face dos termos da declaração e de todas as circunstâncias situadas dentro do horizonte concreto do declaratário, isto é, em face daquilo que o concreto destinatário da declaração conhecia e daquilo até onde ele podia conhecer. ***** Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO A) S veio intentar ação com processo comum contra o C, onde conclui pedindo que a ação seja julgada procedente, por provada e, em consequência, a ré condenada a: a) Ver declarado que o contrato de arrendamento teve o seu termo por oposição à renovação em 31 de Março de 2015; b) Entregar à autora livre de pessoas e coisas o arrendado; c) Indemnizar a autora com €1.000,00 por cada dia de atraso na entrega do arrendado ou o valor que vier a ser fixado, a contar de 1 de Abril de 2015 até efetiva entrega. O réu C apresentou contestação onde conclui: a) Deve a ação ser julgada não provada e improcedente, absolvendo-se a ré dos pedidos formulados pela autora, com custas por esta, sendo ainda esta condenada em multa e indemnização de valor não inferior a todos as despesas e encargos processuais, por litigância de má-fé. b) Deve a reconvenção ser julgada provada e procedente e condenar-se a autora a pagar, nos termos peticionados, o valor de €148.939,44, acrescidos de juros de mora à taxa legal e anual, contados desde a notificação desta contestação e até integral pagamento, sendo ainda declarado e reconhecido que a Associação ré goza do direito de retenção da coisa locada até que se mostre pago esse seu crédito, tudo com custas pela autora. A autora S apresentou réplica onde conclui entendendo dever a ação ser julgada procedente e a reconvenção julgada improcedente, por não provada, devendo a ré ser condenada, como litigante de má-fé, em indemnização e multa a favor da autora, não inferior a €10.000. * B) Foi elaborado despacho saneador, tendo-se relegado o conhecimento da invocada exceção perentória de direito de retenção para momento posterior, foi identificado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova. * C) Procedeu-se a julgamento e foi proferida sentença onde se decidiu julgar a ação parcialmente procedente e a reconvenção totalmente improcedente e, consequentemente: a) Declarar que o contrato de arrendamento em causa teve o seu termo por oposição à renovação em 31 de março de 2015; b) Condenar a ré a entregar à autora livre de pessoas e coisas o arrendado; c) Absolver a ré do pedido de indemnização formulado nos autos; d) Absolver a reconvinda do pedido reconvencional. * D) Inconformado com a decisão proferida, veio o réu C interpor recurso, o qual foi admitido como sendo de apelação, a subir nos próprios autos, com efeito suspensivo (fls. 229). * Nas alegações de recurso d o réu C, são formuladas as seguintes conclusões: 1-Vem o presente recurso interposto, também com impugnação da decisão sobre a matéria de facto e com reapreciação da prova gravada, para o Tribunal da Relação de Guimarães, a processar como de Apelação, a subir imediatamente e nos próprios autos, com efeito suspensivo, sendo o presente recurso alargado à impugnação da decisão da matéria de facto e com reapreciação da prova gravada (artigos 638º, 639º e 640º NCPC). 2-Na verdade, a Apelante entende, salvo melhor opinião, que, atenta a prova documental, bem como os depoimentos gravados, a decisão deveria ser precisamente a contrária, ou seja deverá antes a douta sentença ser revogada e julgar-se totalmente improcedente a ação, absolvendo-se a ré de todos os pedidos, e a reconvenção julgada procedente, com condenação da autora /apelada no pagamento da quantia de €131.092,64, acrescida de juros e com reconhecimento do direito de retenção por parte da ré até que se mostre pago, sem prejuízo de se julgar improcedente o pedido de despejo, com declaração de que o contrato se mantém em vigor e se mostra renovado nos termos legais. 3-Daí que, nos termos do artigo 662º nº 1 do NCPC entende a ré que deve ser também dada por provada a matéria que se encontra alegada e foi objeto de prova documental e testemunhal acima transcrita, designadamente: a) Que o local arrendado nunca o foi para outro fim que não fosse a de instalação e exploração de um parque de campismo; b) Que, nos termos do Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de Março, com as alterações do Decreto-Lei n.º 228/2009, de 14 de Setembro, de conhecimento oficioso, um parque de campismo é um empreendimento turístico. c) Que a atividade ali desenvolvida pela ré/apelante é uma atividade que é classificada como integrada na chamada indústria turística, com a prática de atos comerciais discriminados no artigo 19º do referido Decreto-Lei nº 39/2008; d) Que os créditos resultantes da realização de obras decorrentes do disposto neste Decreto-Lei gozam, por parte da entidade exploradora, ou seja a apelante, do privilégio creditório imobiliário previsto no nº 4 do artigo 57º, logo sendo a apelante credora do respetivo montante dado por provado (€131.092,64); e) Que o regime aplicável é o da urbanização e da edificação nos termos do nº 1 do artigo 23º do Dec.Lei nº 39/2008. 4- Atendendo aos critérios dos artigos 236º e 238º do Código Civil, bem como ao teor do texto do contrato original, designadamente quanto ao montante da renda e fim do contrato – “Primeira: O prédio arrendado destina-se à instalação de um parque de campismo e caravanismo”, não restam dúvidas quanto ao fim do contrato. 5- Como tal, e contrariamente à interpretação da douta sentença recorrida, faz todo o sentido a sua integração nas normas transitórias do NRAU – artigos 27º e seguintes, uma vez que os contratos de prédios rústicos para fins comerciais ou industriais são sujeitos às regras do arrendamento urbano para aqueles fins. 6- Desta feita mantém-se o nosso entendimento quanto à aplicação do artigo 1097º, nos termos da redação conferida pela Lei 6/2006 de 27 de fevereiro. 7- Nunca a autora comunicou à ré que pretendia aplicar ao contrato o regime previsto na Lei nº 6/2006, de 27 de fevereiro, muito menos a ré alguma vez aceitou expressamente submeter ao regime desta lei o contrato de arrendamento e designadamente este seu último aditamento. 8- Mas, ainda que se considerasse que o contrato tivesse o seu termo em 31.03.2015, a “denúncia” ou declaração de intenção de não renovação naquela data não foi efetuada com a antecedência mínima legal, então exigível. 9- A Lei nº 6/2006, de 27 de fevereiro, que veio alterar o regime de arrendamento, introduziu nova redação aos artigos 1110º do Código Civil, estipulando no seu nº 2 que “na falta de estipulação, o contrato considera-se celebrado com prazo certo, pelo período de 10 anos…” 10- Também a mesma Lei nº 6/2006 veio dar nova redação ao artigo 1097º do Código Civil, ao estipular que “o senhorio pode impedir a renovação automática mediante comunicação ao arrendatário com uma antecedência não inferior a um ano do termo do contrato”. 11- Acresce que da mesma Lei nº 6/2006, das suas normas transitórias, designadamente nos seus artigos 26º e 27º, resulta ser este novo regime aplicável ao contrato objeto dos autos. 12- Assim, é de concluir que a autora não observa nem a forma prevista no artigo 1097º do C. Civil, na redação do DL 321-B/90, de 15 de outubro, nem os prazos e meio processual estipulados, muito menos o prazo de um ano previsto no mesmo artigo na redação da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, que lhe é aplicável. 13- Na verdade, atento o disposto na Lei 31/2012, de 14 de agosto, que aprova o NRAU, que só entrou em vigor no prazo estipulado no seu artigo 65º, tendo em atenção a data da sua entrada em vigor e o disposto nos seus artigos 59º, nº 1 e nº 4, ou seja que “as normas supletivas contidas no NRAU só se aplicam aos contratos celebrados antes da entrada em vigor da presente lei quando não sejam em sentido oposto ao de norma supletiva vigente aquando da celebração, caso em que é essa a norma aplicável”, é óbvio e definitivo que, mesmo que fosse considerada a alegação e confissão da autora de que o contrato teve o seu termo em 31.03.2015, a autora não efetuou a denúncia do contrato na forma e com a antecedência legal exigidas, o que conduz a total improcedência da ação. 14- Deste modo, o contrato em curso tinha o seu termo não em 31.03.2015, mas sim em 31.12.2015 e, porque a autora não fez qualquer denúncia do mesmo no prazo e forma legal, para ter efeitos nesta data de 31.12.2015 ou em qualquer outra, o contrato encontra-se virtual, automaticamente, legal e formalmente renovado, nos termos da lei aplicável supracitada. 15- Finalmente, não estamos perante o arrendamento simplista de um terreno rústico, mas antes de um complexo de construções, com artigos urbanos, e de um terreno com inscrição matricial rústica, mas que se destinam no seu todo ao exercício da atividade da industria de turismo, com prática de atos comerciais, designadamente da prestação de serviços turísticos pela ré, tendo como compensação o pagamento de taxas e valores diários por ocupação de espaço e instalações, uso e consumo de infraestruturas de água e energia elétrica, de saneamento e de higiene pessoal e pública, serviços de segurança e guarda de pessoas e bens, venda de produtos e serviços turísticos, como definidos no Decreto Lei nº 39/2008, de 7 de Março. 16- Ora, sujeitos que estão tais empreendimentos turísticos a licenciamento, nos termos dos artigos 26º e seguintes daquele Decreto-Lei, foi estabelecido no seu artigo 75º um prazo de dois anos para a sua legalização e licenciamento nos termos decretados, sem exceção, sob pena de encerramento. 17- Daí que, sendo a lei de conhecimento oficioso, o Tribunal a quo deixou de conhecer desta matéria essencial, aliás, alegada pela ré e classificou erradamente o contrato de arrendamento em causa, que obviamente não pode ser considerado como “um arrendamento rústico não sujeito a regime especial”, aliás, até em contrário da causa de pedir da própria autora. 18- Ora, nos termos do artigo 1031º do Código Civil, a autora, enquanto locadora, estava e está obrigada a assegurar à locatária, a Associação demandada, o gozo da coisa locada para os fins a que a mesma se destina. 19- As obras e instalações técnicas, inclusive de segurança e proteção, foram efetuadas a partir de 2009 a até 2011, no valor total de €131.092,64 (nº 11 dos factos provados). 20- Todas estas obras e intervenções técnicas foram imprescindíveis para a legalização e licenciamento do parque, sem as quais o mesmo já estaria encerrado há muito, por não cumprimento da legislação em vigor e exigências das entidades oficiais que a fiscalizam. 21- Obrigatoriedade de obras essas que, aquando da celebração do contrato original e seus posteriores aditamentos, não era previsível, pelo que não foi nesse sentido a manifestação de vontade das partes na celebração do contrato. 22- Assim, não pode ser admitido como válido o entendimento de que as obras decorrentes da entrada em vigor do Decreto-lei nº 39/2008, de 7 de março, eram obrigação da apelante. 23- A Associação ré sempre terá direito a ser reembolsada de todos aqueles custos com a legalização do parque, atrás referidos e esse direito a reembolso resulta do disposto no artigo 1031º do C. Civil, bem como artigo 29º da lei n.º 6/2006, esta quer na sua redação original, quer na alteração que foi introduzida pela Lei n.º 79/2014, de 19 de dezembro e 473º a 481º do CC. 24- Deste modo, a Associação ré é credora da autora daquela quantia de €131.092,64, pelo que, atento o alegado, a pretensão da autora e as disposições legais referidas e ainda o disposto no artigo 754º e seguintes do CC, goza esta do direito de retenção sobre o local arrendado, objeto do contrato, até que se mostre pago aquele valor, quer o contrato finde por denúncia ou outra razão atendível, quer se mantenha em vigor. 25- Assim, a douta sentença deixou de apreciar e valorar devidamente matéria de facto essencial, omissão de pronúncia que influiu na boa decisão da causa, o que constitui nulidade prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 615º do CPC. 26- Aliás, tal reapreciação da prova revela-se essencial para uma boa decisão e resulta inequivocamente dos depoimentos prestados em audiência de julgamento e do teor dos documentos juntos aos autos, tudo conjugado também à luz da experiência comum. 27- Era ónus da Autora, como resulta dos artigos 342º e seguintes do C. Civil, alegar e provar os factos que constituem a sua causa de pedir, no sentido de se concluir se serão ou seriam subsumíveis ao caso as conclusões de direito que pretendem e que suportam os seus pedidos. 28- Daí que, nos termos do artigo 662º, n.º 1 do NCPC entende a ré que deve a ação ser antes julgada improcedente, atento os concretos meios de prova alegados e citados. 29- Acresce que as custas da ação devem assim ser imputadas à autora, na totalidade, pois que deu causa à ação, e, de qualquer modo, como a autora não provou os factos alegados, a ação, também por isso, deverá improceder totalmente. 30- Deste modo foram violadas as disposições legais citadas devendo a apelação ser julgada procedente e no sentido das conclusões, com a total improcedência da ação, revogando-se nesse sentido a douta sentença recorrida. Termina entendendo dever ser dado provimento ao recurso e no sentido das conclusões. * Pela autora S foi apresentada resposta onde entende dever ser negado o recurso do recorrente. * E) Foram colhidos os vistos legais. F) As questões a decidir na apelação são as de saber: 1) Se a sentença é nula; 2) Se deverá ser alterada a decisão quanto à matéria de facto; 3) Se deverá ser alterada a decisão propriamente jurídica da causa. * II. FUNDAMENTAÇÃO A) Na 1ª instância foi apurada a seguinte matéria de facto: I. Factos Provados 1. Por escritura pública, lavrada no dia 12 de maio de 1979, no Cartório Notarial de Esposende, a autora deu de arrendamento à ré o prédio misto, que consta de casa térrea com coberto, terreno e logradouro e terreno de lavradio e mato, sito no Lugar dos Lírios, em Fão (…) inscrito nas matrizes respetivas sob os artigos …, urbano, e 2/8 do artigo …, rústico, acordando ambas nas seguintes cláusulas: Primeira O prédio arrendado destina-se à instalação de um parque de campismo e caravanismo. Segunda O prazo do arrendamento é de vinte anos, com início em um de abril de mil novecentos e setenta e oito e termo em trinta e um de março de mil novecentos e noventa e oito; Terceira A renda total é de um milhão novecentos e vinte mil escudos, a qual será satisfeita nos seguintes termos (…) Quarta A renda anual será paga no dia um de abril do ano imediatamente anterior ao que respeitar ficando isento o ano de mil novecentos e setenta e oito na Secretaria da representada da primeira outorgante. Quinta A Associação representada pelo segundo outorgante poderá introduzir no prédio arrendado as obras ou benfeitorias que entender necessárias ao fim e objetivos do arrendamento, obras e benfeitorias essas que, findo o contrato, ficam incorporadas no prédio, sem direito a qualquer indemnização ou direito de retenção pela arrendatária. (fls. 92 a 95) 2. No final do referido contrato consta ainda o seguinte: “Considerando que a parte rústica do prédio dado de arrendamento tem valor muito superior à parte urbana, este arrendamento é considerado de prédio rústico, sendo o respetivo selo liquidado como tal”. 3. Em 01.09.1994, autora e ré declararam acordar num aditamento ao referido contrato, com as seguintes cláusulas: “Alínea A) No dia 12 de maio de 1979 foi lavrada a escritura de arrendamento (…) Alínea B) O prédio destina-se à instalação de um parque de campismo e caravanismo. Alínea C) O termo do prazo deste contrato ocorre em 31.03.1998. Alínea D) Os pactuantes reconhecem a validade plena do invocado contrato, em especial a renda em vigor, o fim do contrato e o seu termo, cláusulas aceites por ambas as partes, sem o que jamais celebrariam o invocado contrato. Alínea E) Ora, tendo presente o mesmo espírito acima referido, sem o qual ambas as partes aceitam a invalidade do contrato celebrado, e deste modo contrato-promessa, os pactuantes prometem alterá-lo com as seguintes cláusulas: Alínea F) O termo do prazo do contrato de arrendamento em vigor passa para 31 de março de 2005. Alínea G) A renda anual é de 2.400.000$00 a pagar até finais de setembro de cada ano. Alínea H) A renda sofrerá um aumento anual equivalente ao indicie de inflação do ano anterior. Alínea I) Em tudo o mais se respeitarão as cláusulas do contrato. Alínea J) Este acordo faz parte integrante do contrato de arrendamento acima referenciado e os pactuantes renunciam a invocar a sua nulidade em juízo, por falta de observância da forma exigida para a alteração” 4. Em 31 de Março de 2006, autora e ré celebraram novo aditamento ao referido contrato e sua alteração, com as seguintes cláusulas: Alínea A) Que vão prolongar o contrato de arrendamento celebrado em 12 de maio de 1979 (…) nos termos e condições seguintes: 1. Este acordo tem o seu início em 01.04.2006 e termina em 2015; 2. A renda anual, e a pagar até ao final do mês de setembro de cada ano, é a seguinte: em 2006 a quantia de (…) €, em 2007 a quantia de (…), em 2008 a quantia de …, em 2009 a quantia de …, em 2010 a quantia de …, em 2011 a quantia de…, em 2012 a quantia de …, em 2013 a quantia de…, em 2014 a quantia de … e em 2015 a quantia de … €. Alínea B) Que quanto ao mais são respeitadas todas as cláusulas anteriormente expressamente acordadas, em particular, quanto às obras em efeito, que ficarão a pertencer ao prédio, sem direito a indemnização ou retenção, sejam elas de que natureza forem, e bem assim quanto ao prazo agora acordado. (fls. 14-verso e 15) 5. Por ofício (nº 227) de 02.12.2013, rececionado pela autora, a ré comunicou àquela que: “Tendo em atenção a assinatura do contrato de arrendamento efetuado em 31 de março de 2006 e encontrando-se a decorrer a sua renovação até final de 2015. (…) Estando este Clube interessado em continuar com o Parque de Campismo, em Fão (…) Considerando o grande investimento realizado nos últimos dois anos para legalização do Parque, junto da C.M. de Esposende e Turismo de Portugal, só amortizável em não menos de 4 ou 5 anos. Vimos por este meio solicitar a sua renovação por um período nunca inferior a dez anos, em virtude deste Clube estar a amortizar o investimento efetuado.” (fls. 109) 6. Em resposta ao referido ofício da ré, por carta registada, com aviso de receção, de 30.12.2013, rececionada pela ré em 03.01.2014, a autora comunicou a esta última que não pretendia a renovação do contrato de arrendamento do Parque de Campismo, mas que poderia ser considerada a prorrogação do contrato, por escrito, por mais um ou dois anos. (fls. 97 a 99) 7. Por carta registada, com aviso de receção, de 10.04.2014, rececionada pela ré em 14.04.2014, a autora comunicou à ré que não pretendia a renovação do contrato em 01.04.2015. (fls. 16 a 17) 8. Por carta registada, com aviso de receção, de 11.06.2014, a autora comunicou à ré, “para que não haja qualquer dúvida sobre o termo do contrato”, que o termo do contrato ocorria em março de 2015 e que, na referida data, deveria a ré fazer a entrega do prédio arrendado livre de pessoas e coisas. (fls. 18 a 19) 9. Por carta registada, com aviso de receção, de 03.03.2015, a autora comunicou à ré que não tendo esta comunicado a entrega voluntária e livre do campismo instalado na propriedade da mesma até ao dia 31 de março em curso, informava que iria reclamar uma indemnização diária, pelo atraso, não inferior a 1.000 €. (fls. 22 a 23) 10. Por carta registada, com aviso de recepção, de 28.04.2015, recepcionada pela Autora em 04.05.2015, a ré comunicou à autora, designadamente, que considerava que o contrato teria o seu termo em 31.12.2015, não tendo sido rececionada com a antecedência e forma legal qualquer denúncia para essa data, mas que estavam abertos a iniciar negociações. (fls. 42-verso a 43-verso) 11. Para adequar as instalações às exigências técnicas resultantes de nova legislação, a ré teve de efetuar, a partir de 2009 e até 2011, obras de eletricidade, água, saneamento, instalações elétricas na casa arrendada, anexos, arruamentos e terrenos do parque destinados ao campismo, bem como de segurança e proteção, no valor total de 131.092,64 €. II. Factos não provados 1. A autora tivesse, em 01.04.2015, contactos e interessados no arrendamento que lhe iriam proporcionar uma renda nunca inferior a 5.000 € mensais; 2. Para adequar as instalações às exigências técnicas resultantes da nova legislação, a ré tenha tido de efetuar, em 2013 a 2015, pequenas correções às obras realizadas em 2009 a 2011. * B) O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente, não podendo o tribunal conhecer de outras questões, que não tenham sido suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. * C) O apelante vem invocar a nulidade da sentença, alegando que a mesma deixou de apreciar matéria que deveria ter conhecido, como seja, a que se refere ao disposto nos artigos 19º, 23º nº 1, 24º, 26º e 75º do Decreto-Lei nº 39/2008, de 07/03. A sentença recorrida apreciou tais matérias, na parte que relevam quanto ao objeto do processo, não obstante o normativo referido não ter sido indicado nos articulados e não ser relevante para tal objeto. Com efeito, o diploma em referência aprova o regime jurídico da instalação, exploração e funcionamento dos empreendimentos turísticos e trata no artigo 19º da noção de parques de campismo e de caravanismo, estabelecendo no artigo 23º nº 1 que o procedimento respeitante à instalação dos empreendimentos turísticos segue o regime previsto no presente decreto-lei e está submetido ao regime jurídico da urbanização e da edificação, com as especificidades constantes do presente regime e respetiva regulamentação, sempre que envolva a realização das operações urbanísticas ali previstas. Por sua vez o artigo 24º diz que: 1 — As disposições do presente decreto-lei relativas à instalação e ao funcionamento dos empreendimentos turísticos são aplicáveis aos estabelecimentos comerciais e de restauração ou de bebidas que deles sejam partes integrantes. 2 — O disposto no número anterior não dispensa o cumprimento dos requisitos específicos relativos a instalações e funcionamento previstos nas respetivas regulamentações. O artigo 26º refere-se ao licenciamento de operações urbanísticas e o artigo 75º ao prazo para a legalização, de onde resulta que para o objeto do processo os normativos em questão não têm qualquer relevância, pelo que nunca teriam de ser apreciados pelo tribunal a quo, pelo que improcede a arguição. O apelante afirma pretender impugnar a decisão sobre a matéria de facto e com reapreciação da prova gravada, entendendo que “deve ser também dada por provada a matéria que se encontra alegada e foi objeto de prova documental e testemunhal acima transcrita, designadamente: a)-Que o local arrendado nunca o foi para outro fim que não fosse a de instalação e exploração de um parque de campismo; b)-Que, nos termos do Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de Março, com as alterações do Decreto Lei n.º 228/2009, de 14 de Setembro, de conhecimento oficioso, um parque de campismo é um empreendimento turístico. c)-Que a atividade ali desenvolvida pela ré/apelante é uma atividade que é classificada como integrada na chamada indústria turística, com a prática de atos comerciais discriminados no artigo 19º do referido DL 39/2008; d)-Que os créditos resultantes da realização de obras decorrentes do disposto neste Decreto-Lei gozam, por parte da entidade exploradora, ou seja, a apelante, do privilégio creditório imobiliário previsto no n.º 4 do artigo 57, logo sendo a apelante credora do respetivo montante dado por provado (131.092,64 €); e)-Que o regime aplicável é o da urbanização e da edificação nos termos do n.º 1 do artigo 23º do Dec.Lei n.º 39/2008.” Quanto à matéria “de facto” que o apelante pretende ver reapreciada importa dizer que, no que se refere à matéria da alínea a), já resulta da matéria de facto apurada que o prédio arrendado se destinou à instalação de um parque de campismo e caravanismo, sendo completamente irrelevante a formulação constante da referida alínea a), sendo certo que não resulta da matéria de facto que alguma vez o local arrendado tivesse tido destino diferente. Quanto às matérias que constam das alíneas b) a e) é manifesto que se trata de matéria de direito ou conclusiva que, nessa qualidade, não podem figurar na matéria de facto apurada, sem prejuízo de as questões aí suscitadas, na medida em que possam ter algum relevo para a apreciação da decisão jurídica da causa, possam ser apreciadas, enquanto tal, mas não em termos de matéria de facto, que não são. Pelo exposto, manter-se-á a formulação da matéria de facto, tal como foi decidida na 1ª Instância. Referia o apelante que os créditos resultantes da realização de obras decorrentes do disposto neste Decreto-Lei gozam, por parte da entidade exploradora, ou seja, a apelante, do privilégio creditório imobiliário previsto no n.º 4 do artigo 57, logo sendo a apelante credora do respetivo montante dado por provado (131.092,64 €), para daí concluir que a autora é devedora de tal quantia, simplesmente, para se ter um privilégio creditório é necessário – como resulta da expressão – que o apelante seja credor da apelada, e não é, conforme resulta da decisão recorrida. Importa recordar que de acordo com a cláusula quinta do contrato celebrado entre a autora e o réu, por escritura de 12/05/1979, ficou estabelecido que “a Associação representada pelo segundo outorgante poderá introduzir no prédio arrendado as obras ou benfeitorias que entender necessárias ao fim e objetivos do arrendamento, obras e benfeitorias essas que, findo o contrato, ficam incorporadas no prédio, sem direito a qualquer indemnização ou direito de retenção pela arrendatária”, o que se mostra reafirmado na alínea B) do último aditamento, de 31.03.2006, onde se pode ler “que quanto ao mais são respeitadas todas as cláusulas anteriormente expressamente acordadas, em particular, quanto às obras em efeito, que ficarão a pertencer ao prédio, sem direito a indemnização ou retenção, sejam elas de que natureza forem (…)”. Conforme se refere na decisão recorrida, “defende, porém, a ré que as obras ora em causa não são aquelas que foram visadas pelas partes nas apontadas cláusulas, tendo sido a realização das mesmas impostas por legislação sobre parques de campismo e instalações de carácter turístico, entrada em vigor após o último dos aludidos aditamentos, sendo tais obras da responsabilidade da autora, porquanto nos termos do art. 1031º, b), do Cód. Civil, é obrigação do locador assegurar ao locatário o gozo da coisa para os fins a que a coisa se destina, não tendo a autora tomado nenhuma iniciativa, sendo conhecedora que a falta de legalização implicaria o encerramento do parque e de que a sua realização era urgente… Desde logo, convém recordar que, de harmonia com o disposto no art. 1036º, nº 1, do Cód. Civil, a possibilidade de o locatário se substituir ao locador na realização de “reparações ou outras despesas”, da responsabilidade do último e com direito ao seu reembolso, se umas ou outras, pela sua urgência, se não compadecerem com as delongas do procedimento judicial, depende da existência de mora por parte do locador, o mesmo é dizer, da verificação de uma prévia interpelação do locador para a realização daquelas, só se mostrando justificada a realização das mesmas independentemente de mora do locador em caso de “urgência que não consinta qualquer dilação” (nº 2). Ora, no caso, ainda que as obras em causa fossem da responsabilidade da autora - o que, como infra se verá, não se figura defensável -, certo é que a ré tão pouco alega ter interpelado a autora para a realização das aludidas obras, nada tendo, por outro lado, alegado no sentido de demonstrar a verificação de uma situação suscetível de configurar um caso de “urgência que não consinta qualquer dilação”. Mas poderá sequer dizer-se que as aludidas obras eram da responsabilidade da autora? Utilizando as palavras do Acórdão do STJ de 06.07.2011 “assim como não é do senso comum” que, sem convenção de sentido contrário, seja o proprietário do prédio locado a requerer licença específica que viabilize o funcionamento de um estabelecimento comercial ou, no caso que nos ocupa, parque de campismo, alheio, “do mesmo modo não se alcança a razoabilidade de se lhe impor a realização de obras de que aquele possa depender e que contendam, v.g. com o cumprimento de exigências sanitárias (…), o mesmo se tendo defendido em Acórdão do STJ de 13.12.2007, Pº nº07 A2766, onde se escreveu que licenças “para o exercício de certo ramo (que podem implicar a realização de obras internas, instalações de água e eletricidade próprias e definições de áreas de compartimentos) cumprem ao arrendatário que pretende exercer a atividade específica”. Assim sendo, não cumpria à autora, como locadora, proceder à realização das obras legalmente impostas para o funcionamento do parque de campismo instalado no prédio arrendado.” Quanto à questão de saber qual a lei aplicável à situação, antes do mais, parece ser de aceitar a qualificação feita de que se trata de um contrato de arrendamento de prédio rústico (face à manifesta prevalência desta perante a parte urbana do mesmo prédio) não abrangido pelo regime do arrendamento rural, conforme era designado no regime do Código Civil de 1966 e que, atualmente, é designado como arrendamento rústico não sujeito a regime especial (artigo 1108º Código Civil). O contrato foi celebrado em 12/05/1979 e mantinha-se quando entrou em vigor a Lei nº 6/2006, de 27/02, que aprovou o Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU). Conforme se refere no Acórdão do STJ de 24/09/2013, proferido no processo nº 317/098.9TBOLH.E1.S1 (www.dgsi.pt), que tratava de uma situação análoga à presente e se discutia, designadamente, o regime de denúncia, “de acordo com o “princípio geral”, em vigor à data da celebração do contrato, no arrendamento em causa, o senhorio não gozava do direito de denúncia (art. 1095 do Cód. Civil, preceito integrado na Subsecção III, Denúncia do contrato, da Secção VIII, Arrendamento de prédios urbanos e arrendamento de prédios rústicos não abrangidos na secção precedente; respeitante esta ao arrendamento rural). A situação modificou-se com o DL n.º 321-B/90, de 15 de outubro, que, no respetivo Decreto Preambular, aprovou o RAU (art. 1), tendo revogado, expressamente, os artigos 1083º a 1120º do Código Civil ((art. 3, n.º 1, al. a)). Nos termos do art. 6º, n.º 1 do RAU, “aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regimes especiais…aplica-se o regime geral da locação civil, bem como o disposto nos artigos 2 a 4, 19 a 21, 44 a 46, 74 a 76 e 83 a 85, 88 e 89 do presente diploma, com as devidas adaptações”. Conforme sustenta, António Pais de Sousa, [Anotações ao Regime do Arrendamento Urbano (RAU), 6.ª ed., p. 76] reportando-se aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regimes especiais: “trata-se daqueles arrendamentos a que o Código Civil de 1967 designava por arrendamentos de prédios rústicos não abrangidos pelo arrendamento rural”. Acrescentando que: “No Código Civil eles mereceram toda a proteção conferida ao arrendamento urbano, o que não sucede no RAU”. Com efeito, nos arrendamentos rústicos não sujeitos a regime especial, o senhorio passou a poder denunciar o contrato nos termos do regime geral da locação civil, por não estar sujeito à restrição do n.º 2 do artigo 68 do RAU (uma vez, excluída a aplicação a tais arrendamentos dos arts. 69 a 72 do RAU). Sendo esta possibilidade legal aplicável mesmo aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regime especial, que tenham sido celebrados antes de 15 de novembro de 1990, como no caso do contrato sub judice. A Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro (conhecida como NRAU), que entrou em vigor em 28 de junho, devolvendo a disciplina substantiva do arrendamento urbano ao Cód. Civil, repôs (com a redação dada pelo art. 3) os arts. 1064 a 1113. [10] Pretendeu o legislador do NRAU, como se sabe, reduzir o vinculismo arrendatício. Preceitua o art. 1108 (na redação da Lei n.º 6/2006, como os demais artigos a seguir citados sem menção de origem) que: “As regras da presente subsecção aplicam-se aos arrendamentos urbanos para fins não habitacionais, bem como, com as necessárias adaptações e em conjunto com o regime geral da locação civil, aos arrendamentos rústicos não sujeitos a regimes especiais”. As disposições especiais do arrendamento para fins não habitacionais são as que constam dos arts. 1108 a 1113 do CC, regendo o art. 1110, n.º 1 e 2 sobre a “duração, denúncia ou oposição à renovação”. O regime geral da locação civil é o estabelecido nos arts. 1054 e 1055 do CC. Na Lei n.º 6/2006, a norma fundamental sobre a aplicação no tempo é a constante do art. 59, n.º 1: “O NRAU aplica-se aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor, bem como às relações contratuais constituídas que subsistam nessa data, sem prejuízo do previsto nas normas transitórias”. Manda esta norma aplicar o NRAU às relações contratuais constituídas que subsistam na data da sua entrada em vigor, como é o caso em análise, sem prejuízo do previsto nas normas transitórias. As normas transitórias, a que se alude, são as constantes dos arts. 26 a 28 do NRAU - normas que integram os Capítulo I (“contratos habitacionais celebrados na vigência do regime do arrendamento urbano e contratos não habitacionais celebrados depois do Decreto-Lei n.º 257/95, de 30 de Setembro”) e II (“contratos habitacionais celebrados antes da vigência do RAU e contratos não habitacionais celebrados antes do Decreto-Lei n.º 257/95, de 30 de Setembro)”, do Título II, da Lei n.º 6/2006. Aos contratos englobados no referido Capítulo II, manda o art. 28 aplicar, com as devidas adaptações, o previsto no art. 26. Distinguindo este, nomeadamente, entre o regime transitório aplicável aos contratos de duração limitada (n.º 3) e aos contratos sem duração limitada (n.º 4). [12] / [13] Como nota o Conselheiro Jorge Pinto Furtado, Manual de Arrendamento Urbano, volume I, 4.ª ed., p. 178, acerca do regime transitório do Capítulo II, do Título II, da Lei n.º 6/2006: “A diferença dos dois períodos explica-se pela intenção de englobar todos os contratos que se encontram onerados com o vínculo da prorrogação forçada. Em 15 de Novembro de 1990, com a entrada em vigor do RAU, passou a ser admitida a celebração de arrendamentos para habitação ditos de duração limitada, isto é, em que ultimado o prazo por que foram celebrados, podia o senhorio (embora com um aviso prévio de 1 ano) livremente não prorrogar o contrato, mas fazê-lo cessar. Esta faculdade só veio a ser permitida relativamente aos arrendamentos não habitacionais (para comércio ou indústria, para exercício de profissão liberal ou para outro fim não habitacional) com a publicação do Decreto-Lei n.º 275/95. É isto que justifica a referência a estes diplomas e às respetivas entradas em vigor. É a tais arrendamentos que se referem os arts. 27 e ss. da Lei n.º 6/2006”... E continua aquele aresto, “vimos, também, que os contratos de arrendamento rústicos não sujeitos a regime especial, com a entrada em vigor do RAU, passaram a ser livremente denunciados pelo senhorio, findo o prazo do contrato ou da respetiva renovação, nos termos gerais do art. 1055 do Cód. Civil, valendo tal solução mesmo quanto a arrendamentos anteriores a 15 de novembro de 1990. Ora, radicando a existência dos dois grupos de normas transitórias (os Capítulos I e II, do Título II da Lei n.º 6/2006) na intenção do legislador de englobar (no Capitulo II) todos os contratos que se encontravam onerados com o vínculo da prorrogação forçada, não parece fazer sentido, segundo julgamos, a integração do arrendamento em causa no âmbito de aplicação das referidas normas transitórias do NRAU: no Capítulo II, por já não se tratar de contrato sujeito ao regime vinculístico; e no Capítulo I, por ter sido celebrado em data anterior ao quadro temporal a que este se refere. Afastada, deste modo, a aplicação, ao caso, das normas transitórias dos Capítulos I e II, do Título II, do NRAU, atinentes à questão que nos ocupa. No que diz respeito ao regime da “duração, denúncia ou oposição à renovação”, em sede de disposições especiais do arrendamento para fins não habitacionais, dispõe o art. 1110 o seguinte: “1. As regras relativas à duração, denúncia e oposição à renovação dos contratos de arrendamento para fins não habitacionais são livremente estabelecidas pelas partes, aplicando-se, na falta de estipulação, o disposto quanto ao arrendamento para habitação. 2. Na falta de estipulação, o contrato considera-se celebrado com prazo certo, pelo período de 10 anos, não podendo o arrendatário denunciá-lo com antecedência inferior a um ano”. Conclui-se assim que é aplicável à situação dos autos o Regime da Lei nº 6/2006 (NRAU), não sendo, conforme acima exposto, aplicáveis à situação dos autos as normas transitórias dos Capítulos I e II, do Título II, do NRAU, sendo as disposições aplicáveis as previstas para o arrendamento para fins não habitacionais que constam dos artigos 1108º a 1113º do Código Civil. O artigo 1110º nº 1 Código Civil estabelece que “as regras relativas à duração, denúncia e oposição à renovação dos contratos de arrendamento para fins não habitacionais são livremente estabelecidas pelas partes, aplicando-se, na falta de estipulação, o disposto quanto ao arrendamento para habitação.” O artigo 1054º nº 1 do Código Civil estabelece que “findo o prazo do arrendamento, o contrato renova-se por períodos sucessivos se nenhuma das partes se tiver oposto à renovação no tempo e pela forma convencionados ou designados na lei.” Por outro lado, o artigo 1055º do Código Civil dispõe que: “1 - A oposição à renovação tem de ser comunicada ao outro contraente com a antecedência mínima seguinte: a) Seis meses, se o prazo for igual ou superior a seis anos; b) 60 dias, se o prazo for de um a seis anos; c) 30 dias, quando o prazo for de três meses a um ano; d) Um terço do prazo, quando este for inferior a três meses. 2 - A antecedência a que se refere o número anterior reporta-se ao fim do prazo do contrato ou da renovação.” Do exposto resulta que a denúncia pela autora e apelada foi efetuada corretamente e é valida e juridicamente relevante e tem como efeito fazer cessar o contrato de arrendamento que foi celebrado entre as partes. E tal conclusão não é afastada pelo facto de as partes terem celebrado um novo aditamento ao contrato em 31/03/2006, onde se afirma que vão prolongar o contrato de arrendamento celebrado em 12/05/1979 e que esse acordo tem o seu início em 01/04/2006 e termina em 2015, sem que se tenha estabelecido o dia e mês em que termina. Para interpretação da declaração negocial importa ter em consideração o estatuído no artigo 236º do Código Civil que estabelece, como princípio geral que, “1. A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele. 2. Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida.” Trata-se da consagração da chamada teria da impressão do destinatário em que se considera o real declaratário nas condições concretas em que se encontra e se tomam em consideração os elementos que o mesmo efetivamente conheceu, mais aqueles que uma pessoa razoável, quer dizer, normalmente esclarecida, zelosa e sagaz, teria conhecido e afigura-se que ele raciocinou sobre essas circunstâncias como o teria feito um declaratário razoável… Releva o sentido que seria considerado por uma pessoa normalmente diligente, sagaz e experiente em face dos termos da declaração e de todas as circunstâncias situadas dentro do horizonte concreto do declaratário, isto é, em face daquilo que o concreto destinatário da declaração conhecia e daquilo até onde ele podia conhecer (Prof. Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª Edição, pág. 447 e seg.). Tendo em conta que se estabeleceu no contrato (original e nos aditamentos) que o pagamento da renda seria anual, e que o período de tempo, em referência sempre foi em termos de anos completos, terá de se entender que a cessação do contrato de arrendamento terá de se referir a 31/03/2015, não havendo qualquer elemento objetivo que imponha outro momento e, designadamente, o dia 31/12/2015. Quanto à pretensão de reembolso da apelante pelas despesas com a realização das obras, conforme se referiu acima, não havia qualquer obrigação por parte da locadora na realização das mesmas, nem qualquer fundamento legal para que tenha direito ao seu reembolso, a suportar pela apelada, dado que, para além do mais, conforme se referiu, ficou expressamente estabelecido no contrato que a Associação representada pelo segundo outorgante poderá introduzir no prédio arrendado as obras ou benfeitorias que entender necessárias ao fim e objetivos do arrendamento, obras e benfeitorias essas que, findo o contrato, ficam incorporadas no prédio, sem direito a qualquer indemnização ou direito de retenção pela arrendatária. E há que dizer que não há qualquer enriquecimento ilícito da autora e apelada tendo em conta o estipulado pelas partes, para além de não estar demonstrado que as obras possam vir a ter qualquer utilidade para o aproveitamento que a autora venha a fazer do imóvel, podendo, inclusivamente, suceder que tenha necessidade de as retirar para a utilização que pretenda dar ao imóvel, com as inerentes despesas, pelo que sempre estaria por demonstrar que haja um enriquecimento. Por todo o exposto resulta que a apelação terá de improceder e, em consequência, confirmar-se a douta sentença recorrida. * D) Em conclusão: 1) As licenças para o exercício de certo ramo (que podem implicar a realização de obras internas, instalações de água e eletricidade próprias e definições de áreas de compartimentos) cumprem ao arrendatário que pretende exercer a atividade específica; 2) Na interpretação da declaração negocial releva o sentido que seria considerado por uma pessoa normalmente diligente, sagaz e experiente em face dos termos da declaração e de todas as circunstâncias situadas dentro do horizonte concreto do declaratário, isto é, em face daquilo que o concreto destinatário da declaração conhecia e daquilo até onde ele podia conhecer. *** III. DECISÃO Pelo exposto, tendo em conta o que antecede, acorda-se em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a douta sentença recorrida. Custas pelo apelante. Notifique. * Guimarães, 09/03/2017 _____________________________ _____________________________ 1 - Relator: António Figueiredo de Almeida (60454031617) 1ª Adjunta: Desembargadora Maria Cristina Cerdeira 2ª Adjunta: Desembargadora Eva Almeida