Processo:
Relator: Tribunal:
Decisão: Meio processual:

Profissão: Data de nascimento: Invalid Date
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
ALDA MARTINS
Descritores
CONTRATO DE TRABALHO ENFERMEIRO IGUALDADE LABORAL SALÁRIO
No do documento
RG
Data do Acordão
12/17/2018
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO
Decisão
IMPROCEDENTE
Sumário
I – O princípio da igualdade no trabalho, designadamente em matéria de retribuição, faz apelo a uma igualdade material (deve tratar-se de igual modo o que é essencialmente igual e de forma desigual o que é desigual), que não se verifica no caso de enfermeiros vinculados por contrato de trabalho de direito privado e por contrato de trabalho em funções públicas, a prestar trabalho na mesma entidade pública empresarial. II – Em primeiro lugar, é pressuposto essencial que esteja em causa o mesmo empregador, o que não ocorre verdadeiramente, uma vez que o mesmo se corporiza na entidade pública empresarial, no caso dos enfermeiros vinculados por contrato de trabalho de direito privado, e no Estado (em sentido amplo), no caso dos enfermeiros vinculados por contrato de trabalho em funções públicas. III – O hospital com natureza de entidade pública empresarial apenas pode admitir enfermeiros mediante contrato de trabalho a que se aplica o Código do Trabalho e legislação complementar, incluindo o DL n.º 247/2009, de 22/09, bem como os instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho que existam, imperando os princípios da autonomia privada e colectiva. III – Já os enfermeiros vinculados por contrato de trabalho em funções públicas, pertencentes ao quadro de pessoal do Serviço Nacional de Saúde, podem prestar a respectiva actividade em hospital com natureza de entidade pública empresarial apenas por força de obrigações impostas a este perante o Estado, imperando o princípio da legalidade. IV – Assim, desde logo em matéria retributiva, o art. 13.º do DL n.º 247/2009 remete para os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, o que permite que sejam acordados salários mais altos ou mais baixos do que os fixados legalmente para os enfermeiros que exercem funções no âmbito de contratos de trabalho em funções públicas, tudo dependendo das negociações entre as entidades que representam os empregadores e os trabalhadores. V – Acresce que os enfermeiros com contrato de trabalho em funções públicas são sujeitos a um regime de ingresso e progressão, bem como de incompatibilidades e mobilidade geográfica e funcional, que se têm como mais fortemente constrangedores da liberdade de acesso e exercício da actividade profissional, sendo também distintos os regimes disciplinar, de férias, feriados, faltas e licenças, etc.. VI – Deste modo, não obstante a perspectiva de progressiva aproximação de regimes, os mesmos mantêm distinções determinadas por diferente peso de direitos e deveres, cujo equilíbrio soçobraria pela pretensão de alcançar «o melhor de dois mundos». VII – Acresce que a sobrevivência do contrato de trabalho em funções públicas no âmbito de entidades públicas empresariais é vista legalmente como residual e transitória, não fazendo sentido que possa constituir a situação de referência dos trabalhadores admitidos ao abrigo do regime legalmente estabelecido como regra.
Decisão integral
1. Relatório

1- A. J., 
2- A. C.,
3- A. L., 
4- A. F.,
5- A. P., 
6- A. R.,
7- A. S., 
8- A. B., 
9- A. M., 
10- C. C., 
11- C. M., 
12- C. A., 
13- C. S., 
14- C. L., 
15- C. F., 
16- C. V., 
17- C. F. M., 
18- C. D., 
19- C. J., 
20- C. M. S., 
21- C. M. C., 
22- C. M. A.,
23- C. R., 
24- E. J., 
25- E. C., 
26- E. B., 
27- E. R., 
28- F. C., 
29- F. A., 
30- J. C., 
31- J. D., 
32- J. T., 
33- L. S., 
34- L. T., 
35- L. E., 
36- L. M., 
37- L. C., 
38- L. F., 
39- L. A., 
40- M. S., 
41- M. J., 
42- M. F., 
43- M. C., 
44- M. P., 
45- M. I., 
46- M. E., 
47- M. V., 
48- M. M., 
49- M. A., 
50- M. A. C., 
51- N. H., 
52- N. M., 
53- N. F., 
54- O. C., 
55- O. M., 
56- O. I., 
57- P. C., 
58- P. S., 
59- P. D.,
60- P. M., 
61- P. A., 
62- P. O.,
63- P. A. C.,
64- P. V.,
65-  P. H.,
66- P. F.,
67- P. F. F., 
68- P. N.,
69- R. P., 
70- R. M., 
71- R. S., 
72- R. J., 
73- R. A.,
74- R. G., 
75- R. F., 
76- S. M., 
77- S. A., 
78-  S. C.,
79- S. F., 
80- S. R., 
81- S. L., 
82- S. C. R., 
83- S. S., 
84- S. P., 
85- S. R. A., 
86- S. C. S., 
87- T. C., 
88- T. R.,
89- T. A., 
90- V. R., 
91- V. T., 
92- V. F.,
93- V. B.

intentaram acção declarativa de condenação, com processo comum, contra HOSPITAL X, E.P.E., 
alegando, em síntese, que:

Os autores foram admitidos ao serviço da ré, mediante a celebração de contratos individuais de trabalho, para prestarem cuidados especializados de enfermagem.

Desde 01.01.2013 que os seus salários deviam ter aumentado para o valor de € 1.201,48, por força do DL n.º 122/2010, de 11.11, decorrente da vontade do legislador em estabelecer o percurso comum de progressão profissional para todos os enfermeiros independentemente do vínculo contratual, o que resulta dos princípios constitucionais da igualdade e paridade retributiva. 

Ao tê-lo feito apenas a partir de Novembro de 2015, deverá proceder ao reposicionamento remuneratório desde aquela data, pelo que, concluem, são devidas diferenças retributivas.

Dos contratos de trabalho (cláusula 7.ª) resulta um prémio de assiduidade correspondente a 14,286% da retribuição ilíquida auferida, a ser vencido sempre que, no desempenho das suas funções, os autores preencham na totalidade os critérios de assiduidade, para todos os autores com excepção de 4 (id. em 47 (M. E.), 57 (O. I.), 67 (P. F.) e 81 (S. R.).

O prémio de assiduidade tem natureza retributiva, na medida em que é devido por força do contrato e tem carácter regular e permanente. Sucede que, aquando da actualização supra, os autores viram-se privados do prémio de assiduidade, sem qualquer motivo justificado, pelo que deve a ré repô-lo desde pelo menos Outubro de 2015.

O prémio é devido a todos (incluindo aqueles 4 a que se fez referência), sob pena de se violar o princípio trabalho igual, salário igual, e independentemente de os autores se encontrarem ou não sindicalizados.

O Acordo de Regulamentação Colectiva assinado entre o sindicato e as várias E.P.E. abrange e representa a vontade dos sindicalizados, por outro lado a cláusula 4.ª, n.º 2 dispõe que “nos casos em que a remuneração do trabalhador integre uma componente fixa e uma variável, deve atender-se ao somatório das duas componentes, sem prejuízo do que remanesce”, e, finalmente, uma vez que o prémio de assiduidade é calculado em 14,286% da remuneração base, o seu valor não é variável, mas sim sempre de € 171,64.

Atendendo a que o salário base deveria ter sido actualizado em 01-01-2013, conforme o supra exposto, o prémio de assiduidade seria calculado com base em € 1.201,48 e não em € 998,08, pelo que deverá a ré pagar a título de retroactivos a diferença do mesmo.

Acresce que inexiste fundamento válido para que enfermeiros tenham diferentes horários semanais, entendendo que todos deveriam trabalhar 35 horas (e não 40 horas, como acontece com os autores), sob pena de discriminação.

Esta conduta discriminatória causa-lhes revolta, fazendo-os sentir humilhados, vexados, irritados e angustiados.

Concluem, pedindo que se condene a ré a:

a) Pagar a cada um dos autores, a título de retroactivos, o valor de € 6.712,20 (seis mil setecentos e doze euros e vinte cêntimos), acrescido de juros vencidos no valor de € 239.47 (duzentos e trinta e nove euros e quarenta e sete cêntimos) e de juros vincendos à taxa legal em vigor até integral pagamento, bem como a diferença da retribuição das férias, do respectivo subsídio e do subsídio de Natal, o que até ao presente perfaz o valor de € 1.220,40 (mil duzentos e vinte euros e quarenta cêntimos), acrescido de juros à taxa legal em vigor, o que perfaz o total de € 8.171,87 (oito mil cento e setenta e um euros e oitenta e sete cêntimos) a pagar a cada um dos autores;
b) Fixar o prémio de assiduidade nos termos anteriores à entrada do Acordo Parcelar e, consequentemente, pagar os prémios devidos desde essa data até à sua reposição, o que até à data perfaz o total de € 2.059,68 (dois mil e cinquenta e nove euros e sessenta e oito cêntimos) a cada um dos autores;
c) Pagar aos autores, que sempre receberam o prémio de assiduidade, os retroactivos relativos ao mesmo, perfazendo a quantia de € 968,65 (novecentos e sessenta e oito euros e sessenta e cinco cêntimos) a cada um (com excepção de M. E., O. I., P. F. e S. R.); 
d) Pagar aos autores que nunca receberam prémio de assiduidade, a saber, M. E., O. I., P. F. e S. R., os retroactivos relativos ao prémio de assiduidade, que perfazem a quantia de € 5.656,20 (cinco mil seiscentos e cinquenta e seis euros e vinte cêntimos) a cada um;
e) Fixar o horário de trabalho dos autores em 35 horas semanais;
e.1) Ou, alternativamente, a pagar aos autores as 5 (cinco) horas semanais remanescentes, no valor de € 158,40 (cento e cinquenta e oito euros e quarenta cêntimos) mensais a cada um;
f) Pagar os danos não patrimoniais conforme o alegado em 66.º e seguintes da petição inicial, no valor de € 1.000,00 (mil euros) a cada um, perfazendo o total de € 93.000,00 (noventa e três mil euros).

A ré apresentou contestação defendendo-se por excepção e por impugnação.

Impugnou os factos essenciais da causa de pedir, sustentando, nomeadamente, que a diferença de regimes contratuais explica as diferenças apontadas pelos autores.

Por excepção, invocou, desde logo, a incompetência do Tribunal em razão da matéria, pugnando pela competência dos Tribunais administrativos.

Mais requereu que se declarasse a impossibilidade da causa de pedir e do pedido, relativamente às atribuições e competências da ré, com os legais efeitos e consequências.
Por fim, e caso assim se não entendesse, pugnou pela improcedência da acção, sendo absolvido do pedido.
Os autores responderam à contestação, mantendo, no essencial, a posição assumida em sede de petição inicial, pugnando pela competência do Tribunal, bem assim como pela condenação como litigante de má-fé da ré.
Em sede de audiência prévia/tentativa de conciliação, os autores declararam, para os devidos e legais efeitos, desistir do pedido de condenação por litigância de má-fé antes formulado contra a ré.

Seguidamente, foi proferido despacho saneador-sentença, que, para além de julgar improcedentes as excepções dilatórias invocadas pela ré, conheceu do mérito da causa, terminando com o seguinte dispositivo:

«Pelo exposto, decide-se julgar a presente acção total e integralmente improcedente e, em consequência, absolve-se o Réu Hospital X, E.P.E., dos pedidos contra si formulados.
Custas a cargo dos autores.» 

Os autores 
A. C. 
A. P.
A. R.
A. B.
A. M.
C. C.
C. M.
C. L.
C. F.
C. F. M.
C. D.
E. J.
E. R.
F. C.
J. C.
J. D.
L. C.
L. F.
M. J.
M. E.
M. V.
M. A.
M. A. C.
N. M.
O. M.
P. C.
P. S.
P. D.
P. V.
P. F.
P. F. F.
P. N.
R. M.
R. A.
S. R.
S. C. R.
S. R. A.
S. C. S.
T. R.
T. A.
inconformados, interpuseram recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões:

«1. Ainda que a disparidade de tratamento entre os enfermeiros em regime CIT e em RTFP resulte de uma diversidade de regimes legais aplicáveis, a manutenção dessa desigualdade por quase três anos quanto à remuneração mensal e até aos dias de hoje quanto ao horário normal de trabalho, consubstancia uma discriminação, sendo uma violação do princípio trabalho igual, salário igual.
2. Pois, a equidade retributiva, contida no referido princípio, é diretamente aplicável às entidades públicas e privadas.
3. Tal princípio proíbe discriminações e reclama a igualdade substantiva de tratamento dos trabalhadores que prestam o mesmo tipo de trabalho, aferido este pelos critério da quantidade, natureza e qualidade.
4. Os critério objetivos sufragados na CRP são a quantidade, a natureza e a qualidade E NÃO NO REGIME LEGAL SOB O QUAL OS TRABALHADORES EXERCEM FUNÇÕES.
5. Pelo que, a interpretação feita pelo Meritíssimo Juiz a quo, com o devido respeito que é muito e merecido, é inconstitucional.
6. As normas dos artigos 1.º, 2.º, 4.º e 5.º do Decreto-lei n.º 122/2010, de 11 de Novembro, bem como o preceito do artigo 13.º do Decreto-lei n.º 247/2009, de 22 de Setembro, são material e organicamente inconstitucionais, na interpretação segundo a qual o regime remuneratório contido no primeiro diploma se aplica subjectivamente apenas aos enfermeiros em contrato de trabalho em funções públicas, permitindo-se a introdução de diferenças remuneratórias entre enfermeiros que exerçam funções em instituições do Serviço Nacional de Saúde apenas com base na natureza jurídica da relação de emprego.
7. O Decreto-Lei 122/2010, de 11 de Novembro, alegadamente criado para a regulação das carreiras dos enfermeiros vinculados à Administração Pública por contrato de trabalho em funções públicas, no entanto, no seu artigo 8.º o citado diploma, procede à alteração do Decreto Lei 247/2009, de 22 de Setembro que rege os enfermeiros em regime individual de trabalho.
8. Pelo que, é forçoso concluir que o Decreto de Lei 122/2010, de 11 de Novembro, não se pode aplicar apenas e só aos enfermeiros vinculados à Administração Pública por contratos de trabalho em funções públicas, mas antes é também aplicável aos enfermeiros em regime de contrato individual de trabalho.
9. O direito fundamental consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea a), da Constituição da República Portuguesa é um direito análogo aos direitos, liberdades e garantias, vinculando diretamente todas as pessoas coletivas integrantes da Administração Pública em sentido orgânico.
10. Os hospitais organizados sob a forma jurídica de entidade pública empresarial são pessoas coletivas públicas que desenvolvem uma atividade administrativa de gestão privada, integrando a Administração Indireta do Estado.
11. Quaisquer atos legislativos restritivos do conteúdo essencial dos direitos análogos aos direitos, liberdades e garantias devem revestir formalmente a veste de lei da Assembleia da República.
12. Não são constitucionalmente admissíveis quaisquer leis, atos ou regulamentos administrativos, contratos individuais de trabalho ou instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho que introduzam, no âmbito da mesma organização, diferenciações remuneratórias como contrapartida da prestação de trabalho com a mesma quantidade, natureza e qualidade.
13. Tais normas, são material e organicamente inconstitucionais, na interpretação segundo a qual o regime remuneratório contido no diploma se aplica subjetivamente apenas aos enfermeiros em contrato de trabalho em funções públicas, permitindo-se a introdução de diferenças remuneratórias entre enfermeiros que exerçam funções em instituições do Serviço Nacional de Saúde apenas com base na natureza jurídica da relação de emprego.
14. Pelo que, o Tribunal no cumprimento do seu poder/dever não pode permitir que os Privados se aproveitam das lacunas na legislação para permitir que os privados enriqueçam à custa duma desarmonização salarial e horária injusta, pois o princípio constitucional para trabalho igual, salário igual é aplicável quer a entes públicos como a entres privados. Aliás, a este respeito à que recorrer à doutrina de António Monteiro Fernandes, posição sufragada no Ac. da Relação de Lisboa, processo nº 3424/11.4TTLSB.L1-4, datado de 04-06-2014: “A Constituição da República Portuguesa e as normas legais em matéria de igualdade e não discriminação no trabalho exigem do empregador que adopte as medidas necessárias à efectiva igualdade de tratamento e se iniba das práticas que importem diferenciação injustificada, pelo que, se o mesmo tiver ao seu serviço trabalhadores em regime de emprego público e em regime de contrato de trabalho, não tendo tal factor qualquer influência na quantidade, natureza e qualidade do trabalho, o princípio a trabalho igual, salário igual, numa vertente positiva, exige daquele uma atitude activa de equiparação substantiva em matéria retributiva, e, por inerência, em matéria de promoção profissional.”(negrito nosso).
15. E ainda o o Ac. Do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 04-06-2014, disponível em www.dgsi.pt, que passamos a citar: “o princípio da equidade retributiva que se traduz na fórmula para trabalho igual, salário igual, assume posição normativa directa e efectiva no plano das relações de trabalho. Ele significa imediatamente, que não pode, por nenhuma das vias possíveis (contrato individual de trabalho, convenção coletiva, regulamentação administrativa, legislação ordinária) atingir-se o resultado de, numa concreta relação de trabalho, ser praticada retribuição desigual da que seja paga, no âmbito da mesma organização, como contrapartida de trabalho igual. Nessa perspetiva, a jurisprudência tem declarado o princípio como vinculante das entidades públicas e dos particulares”.
16. Aliás o Ac. Da Relação de Coimbra, datado de 14-06-2012, processo 222/11.9TTVCIS.C1 decidiu e passamos a citar: “Todos os trabalhadores têm direito à retribuição do trabalho segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual. São pressupostos do princípio “a trabalho igual, salário igual”, a identidade de natureza da actividade e a igualdade do tempo de trabalho. Viola esse princípio o empregador que dispensa tratamento diferenciado ao nível das retribuições pagas a pessoas que, exercendo funções no âmbito da sua organização … desempenham exactamente as mesmas funções do ponto de vista da qualidade e quantidade.”(sublinhado nosso).
17. Ainda o Ac. da Relação de Guimarães , “SE, NUMA MESMA ORGANIZAÇÃO, DOIS TRABALHADORES DESEMPENHAM TAREFAS QUALITATIVAMENTE COINCIDENTES E EM IDÊNTICA QUANTIDADE, DEVE SER-LHE, POR FORÇA DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL A TRABALHO IGUAL, SALÁRIO IGUAL, IDÊNTICA REMUNERAÇÃO”. (negrito e sublinhado nosso).
18. E ainda, o Ac. Do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 04-06-2014, disponível em www.dgsi.pt, que passamos a citar: “o princípio da equidade retributiva que se traduz na fórmula para trabalho igual, salário igual, assume posição normativa directa e efectiva no plano das relações de trabalho. Ele significa imediatamente, que não pode, por nenhuma das vias possíveis (contrato individual de trabalho, convenção colectiva, regulamentação administrativa, legislação ordinária) atingir-se o resultado de, numa concreta relação de trabalho, ser praticada retribuição desigual da que seja paga, no âmbito da mesma organização, como contrapartida de trabalho igual. Nessa perspectiva, a jurisprudência tem declarado o princípio como vinculante das entidades públicas e dos particulares”. (negrito e sublinhado nosso).
19. Retornando ao caso dos autos, e apreciando-o à luz destes ensinamentos, os aludidos princípios plasmados na Constituição da República Portuguesa e na legislação laboral ordinária impõem que a R. conceda igual tratamento aos enfermeiros que a si estão ligados mediante contrato individual de trabalho, uma vez que não está em causa que o trabalho de uns e outros seja igual quanto à quantidade, natureza e qualidade e apenas é invocado como motivo justificativo da diferenciação a distinta natureza do vínculo e o objecto daquele diploma legal, que, obviamente, não teve em conta os casos em que, dentro da mesma organização, coexistam trabalhadores em ambas as situações.
20. Com efeito, a unificação das carreiras de enfermagem constituiu um propósito confesso do legislador: no preâmbulo do Decreto-lei n.º 247/2009, de 22 de Setembro, refere-se que “o Governo pretende garantir que os enfermeiros das instituições de saúde no âmbito do SNS possam dispor de um percurso comum de progressão profissional e de diferenciação técnico-científica, o que possibilita também a mobilidade interinstitucional, com harmonização de direitos e deveres, sem subverter a autonomia de gestão do sector empresarial do Estado.”
21. Aliás, a Assembleia da República, mediante a resolução da Assembleia da República nº 85/2016, ponto 10 – Todos os profissionais de saúde que desempenham funções permanentes nos hospitais do SNS sejam integrados em carreiras com vínculo à Administração Pública, através de contratos de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado - reconhece a necessidade de por fim à discriminação existente dos enfermeiros a laborar no SNS em regime CIT.
22. Ora, mais não é uma assunção da inconstitucionalidade da situação em vigor.
23. As referidas inconstitucionalidades foram arguidas nas alegações de recurso interposto pelos Autores/recorridas da Douta Sentença proferida em 1ª Instancia.
24. De frisar que, a interpretação levada a cabo pelo Tribunal da Relação do Porto, no sentido de que os regimes apesar de harmonizados permitem discriminação a nível salarial não é mais que dizer que, o regime legal adotado nas E.P.E. permite discriminar livremente os trabalhadores, ainda que trabalhem igual, quer em quantidade, quer em quantidade.
25. Aliás, os recorrentes (Autores) trabalham mais que os demais funcionários da Ré, pois trabalham mais 5 horas semanais, isto é, mais 40 horas mensais.
26. Assim, não se consegue percecionar como se pode entender que dois trabalhadores iguais em formação e em trabalho, adstritos ao serviço nacional de saúde (doravante SNS), a laborar numa instituição pública, possam ser discriminados, trabalhando mais e recebendo mesmo.
27. TAL DISCRIMINAÇÃO NÃO É DIFERENTE, NEM MENOS GRAVOSA, DO QUE UMA DISCRIMINAÇÃO EM FAVOR DO SEXO, RAÇA, PREFERÊNCIA SEXUAL OU CREDO.
28. Pois, ficou demonstrado, conforme frisou o Meritíssimo Juiz da primeira instância que, os enfermeiros em regime de funções públicas e os enfermeiros em contrato individual de trabalho laboram com a mesma qualidade.
29. Inclusive ficou provado que na sua maioria os enfermeiros em regime de contrato individual de trabalho possuem melhores e mais qualificações académicas e especialização.
30. Igualmente se provou que, trabalham com a mesma qualidade em maior quantidade, pois laboram mais cinco horas semanais, um total de 40 horas mensais.
31. E que por força, única e exclusiva, do vinculo laboral ser um contrato individual de trabalho auferem um salário inferior, auferem de um valor hora de trabalho inferior e trabalham mais cinco horas.
32. Assim, o único fator que discrimina aqui não é objetivo, não é sério, não é constitucional.
33. Não é a qualidade, a eficiência, o tempo, a dedicação, o zelo, o rendimento, as qualificações, o tempo de serviço que estão em causa.
34. Mas antes o reconhecer que os enfermeiros que laboram para a Ré são iguais no que concerne à qualidade e quantidade de trabalho, ambos estão ao serviço do Serviço Nacional de Saúde, mas os enfermeiros em regime individual de trabalho podem receber menos, apenas e só, por não estarem contratos em regime de funções públicas.
35. Tal conclusão, seria uma permissão legal para violar um princípio basilar da nossa constituição, o princípio da igualdade.
36. Além do mais, à que ter em que estamos perante enfermeiros contratados para exercerem a sua atividade no âmbito, único e exclusivo, do Serviço Nacional de Saúde.
37. Consequentemente, o empregador é o Estado.
38. Pelo que, o Estado enquanto contratante usa de má-fé, pois não pode usar enfermeiros para exercerem as mesmas funções no Serviço Nacional de Saúde, com diferentes vínculos, resultando em razão, única e exclusiva do mesmo, diferentes remunerações e carga horária.
39. Aliás, o Estado e o Legislador reconhecem que urge acabar com a precaridade, urge criar paridade, urge uniformizar as carreiras de enfermagem (basta para tanto ver o preâmbulo dos Decretos de Lei 247/2009 e 248/2009), no entanto é o próprio que motiva esta disparidade.
40. A este propósito vide a Resolução de Ministro 85/2016 suprarreferida:
Todos os profissionais de saúde que desempenham funções permanentes nos hospitais do SNS sejam integrados em carreiras com vínculo à Administração Pública, através de contratos de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado - reconhece a necessidade de por fim à discriminação existente dos enfermeiros a laborar no SNS em regime CIT. (negrito e sublinhado nosso).
41. Portanto, o próprio Estado e Legislador reconhecem esta discriminação.
42. Assim, o Estado, enquanto entidade contratante, não pode usar de subterfúgios legais para contratar mão de obra igual a um preço inferior.
43. Tal é inconstitucional.
44. Acresce ainda a violação do princípio da proteção da confiança, sendo que a este propósito se pronunciou o Tribunal Constitucional nos Acórdãos n.º 188/2010 e 396/2011, acerca dos funcionários públicos passarem a laborar mais cinco horas semanais: “Esta alteração que agora preconiza (do período normal de trabalho de trinta e cinco horas para quarenta horas semanais tem) em vista alcançar uma maior convergência entre os setores público e privado, passando os trabalhadores do primeiro a estar sujeitas ao período normal de trabalho que há muito tem sido praticado no segundo”
45. Ora, à contrario sensu é forçosamente inconstitucional uma interpretação que permita distanciar o privado do público, prejudicando-os a nível salarial de carga horária.
46. Ou seja, era legitimo os privados (enfermeiros em regime de contrato individual de trabalho) expetarem auferir de um salário igual pelo mesmo período de trabalho.
47. Tais acórdãos referem inclusive que: “Nessa medida a Lei 68/2013 é apresentada como “mais uma etapa” do processo de laboração da função pública, no âmbito do qual tem sido reconhecida a convergência entre o regime laboral privado e as regras de trabalho público em termos de flexibilidade da parte do trabalhador e condicionalismos do empregador”.(negrito e sublinhado nosso).,
48. Ora, o Estado Legislador não pode deixar esta suscetibilidade, quando ele é a entidade contratante, quando ele tem o poder de aceitar o instrumento de regulamentação coletiva. 
49. No entanto não o aceita.
50. Aliás, é de conhecimento público as greves da classe de enfermagem no sentido de obter um instrumento de regulamentação coletiva.
51. Contudo, estão nas mãos do Estado enquanto entidade contratante e entidade decisória.
52. Enquanto isso, os Autores, bem como todos os enfermeiros em regime de contrato vêem-se forçados assinar os contratos individuais de trabalho conforme estes lhe são impostos.
53. Aliás, recuando no tempo dez anos, aquando dos cortes orçamentais que resultou no corte salarial aos funcionários em regime de funções públicas, tal corte afetou em igual medida dos enfermeiros com contratos individuais.
54. Assim, os enfermeiros em regime de contrato individual no que concerne a cortes estão sujeitos ao regime da função pública, mas no que concerne a aumentos já não.
55. Tal é sem dúvida violador do princípio da igualdade, violador do princípio trabalho igual salário igual e do princípio da proteção da confiança.
56. Caso contrário, obriga a concluir que o regime legal adotado nas E.P.E. permite discriminar livremente os trabalhadores, ainda que trabalhem igual, quer em quantidade, quer em quantidade.
57. Tal conclusão, seria uma permissão legal para violar um princípio basilar da nossa constituição, o princípio da igualdade.
58. Pelo que devem ser declarados inconstitucionais os artigos 1º, 2º, 4º, 5º do Dl 122/2010, o art.º 13.º do Dl 247/2009 e o art.º 17.º do Dl 248/2009, na interpretação segundo a qual o regime remuneratório e de duração e organização do tempo de trabalho contido nos diplomas se aplica subjetivamente apenas aos enfermeiros em regime de contrato de trabalho em funções públicas, permitindo-se a introdução de diferenças remuneratórias e de diferenças de horas de trabalho entre enfermeiros que exerçam funções em instituições do Serviço Nacional de Saúde apenas com base na natureza da relação de emprego.
59. Portanto, deve o recurso interposto ser totalmente procedente.»

A ré apresentou resposta ao recurso dos autores, pugnando pela sua improcedência.
O recurso foi admitido como apelação, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Recebidos os autos nesta Relação, o Senhor Procurador Geral-Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos dos Exmos. Desembargadores Adjuntos, cumpre decidir.

2. Objecto do recurso

Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, a única questão que se coloca a este tribunal é se o regime legal aplicável aos autores, ligados à ré por contrato de trabalho de direito privado, é inconstitucional na medida em que permite um tratamento distinto e alegadamente desvantajoso em matéria de remuneração e tempo de trabalho, comparativamente com os enfermeiros ligados à ré por relação pública de emprego.

3. Fundamentação de facto

Os factos provados são os seguintes:

1- São enfermeiros com contrato individual de trabalho celebrado com a ré, no que cada um descreve:
1. O autor A. J. iniciou funções em 11/08/2003, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 11 de Agosto de 2006;
2. A autora A. C. iniciou funções em 01/02/2005, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 1 de Agosto de 2006;
3. A autora A. L. iniciou funções em 18/05/2009, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 18 de Maio de 2010;
4. A autora A. F. iniciou funções em 23/04/2010, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 23 de Abril de 2010;
5. A autora A. P. iniciou funções em 01/09/2006, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006;
6. A autora A. R. iniciou funções em 03/01/2005, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 3 de Julho de 2006;
7. O autor A. S. iniciou funções em 01/,08/2006, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 9 de Agosto de 2006;
8. O autor A. B. iniciou funções em 11/08/2006, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 11 Agosto de 2006;
9. A autora A. M. iniciou funções em 09/12/2010, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 9 de Dezembro de 2010;
10. A autora C. C. iniciou funções em 02/05/2010, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Maio de 2010;
11. A autora C. M. iniciou funções em18/05/2010, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 18 de Maio de 2010;
12. A autora C. A. iniciou funções em 01/09/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006;
13. A autora C. S. iniciou funções em 11/08/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 11 de Agosto de 2006;
14. A autora C. L. iniciou funções em 01/09/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006;
15. A autora C. F. iniciou funções em 01/08/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Agosto de 2006;
16. O autor C. V. iniciou funções em 01/08/2010, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de agosto de 2010;
17. A autora C. F. M. iniciou funções em 15/09/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 15 de Setembro de 2006;
18. A autora C. D. iniciou funções em 02/01/2011, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Janeiro de 2011;
19. A autora C. J. iniciou funções em 13/01/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 13 de Janeiro de 2006;
20. A autora C. M. S. iniciou funções em 10/06/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 10 de Junho de 2006;
21. A autora C. M. C. iniciou funções em 25/05/2009, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 25 de Maio de 2010;
22. A autora C. M. A. iniciou funções em 13/11/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 23 de Novembro de 2006;
23. A autora C. R. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 6 de Outubro de 2006, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações;
24. O autor E. J. iniciou funções em 03/07/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 3 de Julho de 2006;
25. A autora E. C. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 30 de Junho de 2004, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações;
26. A autora E. B. celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Agosto de 2010;
27. A autora E. R. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 26 de Junho de 2009, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações;
28. A autora F. C. iniciou funções em 01/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Agosto de 2006;
29. A autora F. A. iniciou funções em 11/08/2005 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 11 de Agosto de 2005;
30. A autora J. C. iniciou funções em 01/10/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Outubro de 2010;
31. A autora J. D. iniciou funções em 13/02/2011 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 13 de Fevereiro de 2011;
32. A autora J. T. iniciou funções em 11/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 11 de Agosto de 2006;
33. A autora L. S. iniciou funções em 22/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 22 de Agosto de 2006;
34. A autora L. T. iniciou funções em 20/05/2005 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 20 de Abril de 2005;
35. A autora L. E. iniciou funções em 25/05/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de Maio de 2010;
36. A autora L. M. iniciou funções em 02/04/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Abril de 2010;
37. A autora L. C. iniciou funções em 02/05/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Maio de 2006;
38. O autor L. F. iniciou funções em 11/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 11 de Agosto de 2006;
39. A autora L. A. iniciou funções em 21/07/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 21 de Julho de 2010;
40. A autora M. S. iniciou funções em 01/02/2011 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Fevereiro de 2011;
41. O autor M. J. iniciou funções em 11/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 11 de Agosto de 2006;
42. A autora M. F. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 8 de Maio de 2006, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações;
43. A autora M. C. iniciou funções em 01/06/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Junho de 2010;
44. A autora M. P. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006;
45. A autora M. I. iniciou funções em 02/05/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Maio de 2006;
46. A autora M. E. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 25 de Maio de 2011, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações;
47. A autora M. V. iniciou funções em 16/02/2011 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 16 de Fevereiro de 2011;
48. A autora M. M. iniciou funções em 26/01/2011 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 26 de Janeiro de 2011;
49. O autor M. A. iniciou funções em 11/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 11 de agosto de 2006;
50. A autora M. A. C. iniciou funções em 02/08/2005 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Agosto de 2005;
51. A autora N. H. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006;
52. O autor N. M. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 2 de Dezembro de 2005, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações;
53. O autor N. F. iniciou funções em 16/08/2005 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 16 de Agosto de 2005;
54. A autora O. C. iniciou funções em 11/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 12 Agosto de 2006;
55. A autora O. M. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006;
56. A autora O. I. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 27 de Junho de 2011, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações;
57. A autora P. C. iniciou funções em 11/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 11 de Agosto de 2006;
58. A autora P. S. iniciou funções em 02/05/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Maio de 2010;
59. A autora P. D. iniciou funções em 27/07/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 27 de Julho de 2010;
60. A autora P. M. celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 3 de Agosto de 2010;
61. A autora P. A. celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 15 de Junho de 2005;
62. O autor P. O. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006;
63. O autor P. A. C. iniciou funções em 01/10/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Outubro de 2010;
64. O autor P. V. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 11 de Agosto de 2003, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações;
65. O autor P. H. iniciou funções em 30/09/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 30 de Setembro de 2010;
66. O autor P. F. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 1 de Julho de 2011, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações;
67. O autor P. F. F. celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Agosto de 2006;
68. O autor P. N. iniciou funções em 01/05/2007 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Maio de 2007;
69. A autora R. P. iniciou funções em 06/02/2011 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 6 de Fevereiro de 2011;
70. A autora R. M. iniciou funções em 01/06/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Junho de 2010;
71. O autor R. S. iniciou funções em 09/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 9 de Agosto de 2006;
72. O autor R. J. iniciou funções em 01/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Agosto de 2006;
73. O autor R. A. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 17 de Fevereiro de 2006, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações;
74. O autor R. G. iniciou funções em 02/06/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Junho de 2006;
75. A autora R. F. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006;
76. A autora S. M. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006;
77. A autora S. A. iniciou funções em 01/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Agosto de 2006;
78. A autora S. C. iniciou funções em 08/05/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 8 de Maio de 2006;
79. A autora S. F. celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006;
80. A autora S. R. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 11 de Agosto de 2011, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações;
81. A autora S. L. iniciou funções em 16/11/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 16 de Novembro de 2010;
82. A autora S. C. R. iniciou funções em 23/07/2001 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006;
83. A autora S. S. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 1 de Agosto de 2006, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações;
84. A autora S. P. iniciou funções em 01/08/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Agosto de 2010;
85. A autora S. R. A. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006;
86. A autora S. C. S. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 1 de Agosto de 2006, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações;
87. A autora T. C. iniciou funções em 09/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 9 de Agosto de 2006;
88. A autora T. R. celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 3 de Junho de 2010;
89. O autor T. A. iniciou funções em 02/01/2007 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Janeiro de 2011;
90. A autora V. R. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 25 de Agosto de 2009, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações;
91. A autora V. T. iniciou funções em 15/12/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 15 de Dezembro de 2010;
92. A autora V. F. iniciou funções em 15/06/2005 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 15 Junho de 2005;
93. A autora V. B. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006;

2- A ré é resultado da fusão do Hospital X, Guimarães, E. P. E., com o Hospital Hospital Y – Fafe, passando a denominar-se HOSPITAL X, E.P.E..
3- Os autores foram admitidos ao serviço da ré mediante contrato individual de trabalho para exercerem funções inerentes à categoria de enfermagem.
4- Contrato através do qual se obrigaram, mediante retribuição, a prestar serviços nas suas instalações, sob as ordens, direcção, fiscalização e autoridade desta, aí integrando a sua organização.
5- Resulta dos contratos escritos celebrados, além do mais, sob a cláusula 2.ª:
“A prestação de trabalho destina-se, nomeadamente, ao desempenho das seguintes funções, correspondentes à sua categoria profissional: Prestação de cuidados de enfermagem, caracterizados nos termos do artigo 5º do DL nº 161/96, de 4-9 que aprova o Regulamento do Exercício Profissional dos Enfermeiros e enunciados no artigo 7º do DL 437/91, de 08-11.”, resultando ainda, com excepção dos contratos dos autores referidos no ponto 13 infra, sob a cláusula 7.ª (remuneração):

“A retribuição ilíquida a auferir pela/o segunda/o contraente é fixada em € 935,96, paga mensalmente, sujeita aos descontos legais.
A título de acréscimo salarial receberá 14,286% do seu salário base condicionado à sua assiduidade que não deverá comportar qualquer falta, à excepção das associadas à protecção da maternidade, férias e à qualidade do seu desempenho avaliado pela inexistência de qualquer reclamação, interna ou externa que seja julgada procedente.
Como compensação do modo de organização do horário, receberá um acréscimo remuneratório com base nas normas dos artigos 192º e 257º, do Código do Trabalho, ou seja, a remuneração de trabalho por relação em tempos de semana em que é prestado, segundo critério análogo ao previsto no Decreto-Lei nº 62/79, de 30.03.
A remuneração base e as remunerações acessórias previstas nesta cláusula têm carácter transitório até à conclusão da celebração da regulamentação colectiva de trabalho entre os Hospitais E.P.E. e as respectivas associações sindicais ou até à definição dos incentivos, com base no que vier a ser proposto pela Comissão Negociadora do Ministério da Saúde, transitoriedade essa que os Contraentes reconhecem como essencial e que a sua Segunda Contraente aceita.”
6- Em Novembro de 2015, os autores foram alvo de reposicionamento remuneratório em € 1.201,48, com retroactivos ao mês de Outubro de 2015;
7- Desde 01.01.2013 e até Outubro de 2015, os autores auferiam € 998,08.
8- Os autores/enfermeiros trabalham 40 horas semanais;
9- A ré procedeu ao reposicionamento por via de indexação remuneratória dos demais enfermeiros a exercerem funções e com a relação jurídica constituída por contrato de trabalho em funções públicas, fixando-se pelo menos a partir de Janeiro de 2013 o vencimento de todos eles em € 1.201,48;
10- Os autores exercem de igual modo funções de enfermagem;
11- Os autores assumem semelhantes responsabilidades e possuem o mesmo, ou até mais tempo de serviço;
12- Trabalham 40 horas semanais e com as mesmas qualificações profissionais que os demais enfermeiros ao serviço do réu, integrados no Sistema Nacional de Saúde;
13- Com excepção dos trabalhadores M. E., O. I., P. F. e S. R., relativamente aos demais trabalhadores, dos respectivos contratos de trabalho resulta, na cláusula 7.ª, um prémio de assiduidade de natureza não regular, correspondente a 14,286% da retribuição ilíquida auferida, no montante de € 171,64, a ser vencido sempre que, no desempenho das suas funções, os autores preencham na totalidade os critérios de assiduidade, conforme descrito no ponto 5 supra.
14- Aquando da actualização ocorrida em Outubro de 2015, os autores viram-se privados do prémio de assiduidade.
15-  São sindicalizados os autores:

1- A. C.,
2- A. B.,
3- A. M.,
4- C. C.,
5- C. A.,
6- C. L.,
7- C. F.,
8- C. D.,
9- C. M. S.,
10- E. R.,
11- L. S.,
12- L. C.,
13- L. A.,
14- M. J.,
15- M. E.,
16- M. A.,
17- N. M.,
18- O. C.,
19- P. A. C.,
20- P. N.,
21-  R. M.,
22- R. S.,
23- S. M.,
24- S. A.,
25- S. C. R.,
26- S. R. A.,
27- S. C. S.,
28- V. R.,
29- V. F.,
30- C. F. M.
31- O. M..

4. Apreciação do recurso

Conforme acima enunciado, a única questão que se coloca a este tribunal é se o regime legal aplicável aos autores, ligados à ré por contrato de trabalho de direito privado, é inconstitucional na medida em que permite um tratamento distinto e alegadamente desvantajoso em matéria de remuneração e tempo de trabalho, comparativamente com os enfermeiros ligados à ré por relação pública de emprego.

Isto é, e em concreto, como concluem os Apelantes, trata-se de saber se «(…) devem ser declarados inconstitucionais os artigos 1º, 2º, 4º, 5º do Dl 122/2010, o art.º 13.º do Dl 247/2009 e o art.º 17.º do Dl 248/2009, na interpretação segundo a qual o regime remuneratório e de duração e organização do tempo de trabalho contido nos diplomas se aplica subjetivamente apenas aos enfermeiros em regime de contrato de trabalho em funções públicas, permitindo-se a introdução de diferenças remuneratórias e de diferenças de horas de trabalho entre enfermeiros que exerçam funções em instituições do Serviço Nacional de Saúde apenas com base na natureza da relação de emprego.»

Com efeito, a ré é uma pessoa colectiva de direito público, com a natureza de entidade pública empresarial, criada pelo DL n.º 50-A/2007, de 28/02, e submetida aos estatutos constantes do anexo do DL n.º 233/2005, de 29/12, bem como ao regime jurídico de gestão hospitalar, aprovado pela Lei n.º 27/2002, de 08/11.

Ora, as entidades públicas empresariais foram excluídas do âmbito de aplicação da Lei n.º 12-A/2008, de 27/02, que estabeleceu os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas, e da Lei n.º 35/2014, de 20/06, que aprovou a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, actualmente em vigor, com ressalva dos trabalhadores que já tivessem a qualidade de funcionário ou agente.
Assim, para estes últimos, vinculados por contrato de trabalho em funções públicas, a respectiva carreira de enfermagem, enquanto carreira especial da Administração Pública, é regulada pelo DL n.º 248/2009, de 22/09, sendo que tal regime é essencialmente caracterizado pela atribuição ao trabalhador de uma situação estatutária e regulamentar, uniformemente aplicável a todos os que pertençam a um mesmo grupo de pessoal e integrem a mesma categoria.

Na sequência do disposto nos arts. 14.º e 15.º desse diploma, segundo os quais os níveis remuneratórios correspondentes às posições remuneratórias das categorias que integram a carreira especial de enfermagem do sector público – enfermeiro e enfermeiro principal – são identificados por diploma próprio, o DL n.º 122/2010, de 11/09, em conformidade com os princípios e regras consagrados na Lei n.º 12-A/2008, de 27/02, veio estabelecer, por categoria, o número de posições remuneratórias da carreira especial de enfermagem, bem como identificar os correspondentes níveis salariais.

Por seu turno, o DL n.º 247/2009, de 22/09, estabeleceu o regime aplicável aos enfermeiros vinculados em regime de contrato de trabalho, nos termos do Código do Trabalho, nas entidades públicas empresariais e nas parcerias em saúde, em regime de gestão e financiamento privados, integradas no Serviço Nacional de Saúde, bem como os respectivos requisitos de habilitação profissional e percurso de progressão profissional e diferenciação técnica.

No que concerne aos autores, é pacífico que todos celebraram contrato de trabalho com a ré sujeito ao regime do DL n.º 247/2009 e do Código do Trabalho, sendo certo que naquela trabalham também enfermeiros integrados no Sistema Nacional de Saúde mediante contrato de trabalho em funções públicas, a quem são aplicáveis o DL n.º 248/2009 e o DL n.º 122/2010.

Ora, por um lado, resulta dos autos que a ré se limita a aplicar cada um dos regimes jurídicos indicados aos enfermeiros visados pelos respectivos âmbitos de aplicação, pelo que, no que toca aos autores, não está em causa o incumprimento do contrato ou da lei ou uma prática discriminatória livremente assumida pela ré, sendo despicienda para a solução do presente litígio a jurisprudência invocada pelos Apelantes produzida em situações em que, ao contrário do que sucede na que nos ocupa, as condutas do empregador não estavam autorizadas ou impostas por lei expressa.   
Deste modo, como se começou por dizer, no presente recurso importa tão somente apreciar a procedibilidade do pedido dos autores à luz da invocada inconstitucionalidade dos regimes jurídicos indicados, na medida em que permitem um tratamento distinto e alegadamente desvantajoso para os enfermeiros vinculados por contrato de trabalho de direito privado, em matéria de remuneração e tempo de trabalho, comparativamente com os enfermeiros vinculados por relação pública de emprego.

Vejamos, então.

Estabelece o art. 13.º da Constituição da República Portuguesa, sob a epígrafe «Princípio da igualdade»:

1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.

Por seu turno, dispõe o art. 59.º, com a epígrafe «Direitos dos trabalhadores»:

1. Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito:

a) À retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna; 
b) A organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da actividade profissional com a vida familiar; 
c) (…) 
d) Ao repouso e aos lazeres, a um limite máximo da jornada de trabalho, ao descanso semanal e a férias periódicas pagas; (…)

Em conformidade, prevê o art. 270.º do Código do Trabalho que na determinação do valor da retribuição deve ter-se em conta a quantidade, natureza e qualidade do trabalho, observando-se o princípio de que, para trabalho igual ou de valor igual, salário igual.
Estabelece, ainda, com pertinência para o caso, esse diploma legal:

Artigo 23.º
Conceitos em matéria de igualdade e não discriminação

1 - Para efeitos do presente Código, considera-se: 

a) Discriminação directa, sempre que, em razão de um factor de discriminação, uma pessoa seja sujeita a tratamento menos favorável do que aquele que é, tenha sido ou venha a ser dado a outra pessoa em situação comparável; 
b) Discriminação indirecta, sempre que uma disposição, critério ou prática aparentemente neutro seja susceptível de colocar uma pessoa, por motivo de um factor de discriminação, numa posição de desvantagem comparativamente com outras, a não ser que essa disposição, critério ou prática seja objectivamente justificado por um fim legítimo e que os meios para o alcançar sejam adequados e necessários; 
c) Trabalho igual, aquele em que as funções desempenhadas ao serviço do mesmo empregador são iguais ou objectivamente semelhantes em natureza, qualidade e quantidade; 
d) Trabalho de valor igual, aquele em que as funções desempenhadas ao serviço do mesmo empregador são equivalentes, atendendo nomeadamente à qualificação ou experiência exigida, às responsabilidades atribuídas, ao esforço físico e psíquico e às condições em que o trabalho é efectuado. 
2 - Constitui discriminação a mera ordem ou instrução que tenha por finalidade prejudicar alguém em razão de um factor de discriminação.

Artigo 24.º
Direito à igualdade no acesso a emprego e no trabalho

1 - O trabalhador ou candidato a emprego tem direito a igualdade de oportunidades e de tratamento no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção ou carreira profissionais e às condições de trabalho, não podendo ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão, nomeadamente, de ascendência, idade, sexo, orientação sexual, identidade de género, estado civil, situação familiar, situação económica, instrução, origem ou condição social, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência, doença crónica, nacionalidade, origem étnica ou raça, território de origem, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas e filiação sindical, devendo o Estado promover a igualdade de acesso a tais direitos. 
2 - O direito referido no número anterior respeita, designadamente:
a) A critérios de selecção e a condições de contratação, em qualquer sector de actividade e a todos os níveis hierárquicos;  
(…)
c) A retribuição e outras prestações patrimoniais, promoção a todos os níveis hierárquicos e critérios para selecção de trabalhadores a despedir; 
(…)
Artigo 25.º
Proibição de discriminação

1 - O empregador não pode praticar qualquer discriminação, directa ou indirecta, em razão nomeadamente dos factores referidos no n.º 1 do artigo anterior. 
(…)
5 - Cabe a quem alega discriminação indicar o trabalhador ou trabalhadores em relação a quem se considera discriminado, incumbindo ao empregador provar que a diferença de tratamento não assenta em qualquer factor de discriminação. 
(…)

Assim, por um lado, como esclarece João Leal Amado, “[e]m termos gerais, parece adquirida a afirmação de que com tal princípio não se visa alcançar um qualquer igualitarismo extremo. O que este princípio proíbe não é a diferenciação salarial, mas sim a discriminação salarial, ou seja, a diferenciação injustificada, baseada, p. ex., em factores como o sexo, a raça, a nacionalidade, a religião, as convicções políticas, etc. Já constituem fundamento bastante para a diferenciação e títulos legitimadores da mesma os factores ligados à distinta quantidade (duração ou intensidade, p. ex.), natureza (dificuldade ou penosidade, p. ex.) e qualidade (mérito ou produtividade, p. ex.) do trabalho prestado. Há, pois, diferenças admissíveis e diferenças inadmissíveis, traduzindo-se o princípio da igualdade de tratamento na exigência de um fundamento material para a diferenciação salarial. O que aqui se proíbe, repete-se, são desde logo as práticas discriminatórias, são as distinções desprovidas de uma justificação razoável e aceitável (bem como, acrescente-se, o tratamento indiferenciado de situações objectivamente desiguais). Sublinhe-se, no entanto, que o princípio da igualdade retributiva não compreende apenas um conteúdo negativo (a proibição de discriminações) mas comporta também uma vertente positiva, reclamando a igualdade substantiva de tratamento dos trabalhadores que prestam o mesmo tipo de trabalho (trabalho igual ou de valor igual), aferido este pelos critérios da quantidade, natureza e qualidade, critérios objectivos e sufragados pela CRP. Proibição do arbítrio, proibição de discriminação e obrigação de diferenciação, eis, na lição de Gomes Canotilho e Vital Moreira, as principais dimensões do princípio constitucional da igualdade.” (1)

Por outro lado, consagra-se “(…) uma regra geral de inversão do ónus da prova, ao arrepio do regime geral do art. 342.º do CC. (…) Trata-se de um preceito com uma importância extrema: provar que uma exclusão teve por fundamento o sexo, a raça, as convicções religiosas ou políticas do trabalhador lesado constitui um óbice quase intransponível. A utilização das regras gerais em matéria do ónus da prova afigura-se, neste domínio, claramente insuficiente. À luz deste preceito, cabe ao empregador a prova de que a exclusão ou o tratamento desvantajoso conferido ao trabalhador ou ao candidato a emprego não é irrazoável, arbitrário e discriminatório, tendo uma justificação plausível.” (2)

Assim, no que respeita ao ónus da prova, valem as regras que, com clareza, foram enunciadas no sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de Junho de 2017, proferido no âmbito do processo n.º 816/14.0T8LSB.L1.S1, com o seguinte teor (3):

“1. O Código do Trabalho ao estabelecer critérios de determinação da retribuição refere que na determinação do valor da mesma deve ter-se em conta a quantidade, natureza e qualidade do trabalho, observando-se o princípio de que, para trabalho igual ou de valor igual, salário igual.
2. O art.º 24.º, do mesmo diploma legal, consagra o direito à igualdade no acesso a emprego e no trabalho, elencando, de forma exemplificativa, fatores suscetíveis de causar discriminação, tais como a ascendência, idade, sexo, orientação sexual, identidade de género, estado civil, situação familiar, situação económica, instrução, origem ou condição social, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência, doença crónica, nacionalidade, origem étnica ou raça, território de origem, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas e filiação sindical.
3. Quando as situações referidas são invocadas como fatores de discriminação, nomeadamente, no plano retributivo, o legislador, no n.º 5, do art.º 25, do diploma legal referido, estabelece um regime especial de repartição do ónus da prova, em que afastand‑se da regra geral, prevista no art.º 342.º, n.º 1, do Código Civil, estipula uma inversão do ónus da prova, impondo que seja o empregador a provar que a diferença de tratamento não assenta em qualquer fator de discriminação.
4. Já quando for alegada violação do princípio do trabalho igual salário igual, sem que tenha sido invocado quaisquer factos suscetíveis de serem inseridos nas categorias do que se pode considerar fatores de discriminação, cabe a quem invocar o direito fazer a prova, nos termos do mencionado art.º 342.º, n.º 1, dos factos constitutivos do direito alegado, não beneficiando da referida presunção.
5. Para que se pudesse concluir que ocorreu violação do princípio para trabalho igual salário igual, seria necessário que o trabalhador tivesse alegado e demonstrado factos reveladores de uma prestação de trabalho ao serviço do empregador, como chefe de equipa do tratamento, nível 4, que fosse não só de igual natureza, mas também de igual qualidade e quantidade que a dos seus colegas de trabalho com a mesma categoria profissional, o que não aconteceu.”

Retornando ao caso dos autos, verifica-se que os autores invocaram discriminação salarial e em matéria de duração do tempo de trabalho relativamente aos seus colegas de trabalho sujeitos a relação pública de emprego, mas em sentido impróprio, ou seja, sem ser naquele que é utilizado pela lei, designadamente, para efeitos do especial regime de prova, pois não invocaram que o tratamento desigual por parte da ré assente em ascendência, idade, sexo, orientação sexual, identidade de género, estado civil, situação familiar, situação económica, instrução, origem ou condição social, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência, doença crónica, nacionalidade, origem étnica ou raça, território de origem, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas, filiação sindical ou outra categoria subjectiva que comungue de idêntico desvalor ético ou social.

Na verdade, o contrato de trabalho de direito privado e o contrato de trabalho em funções públicas são fontes de relações jurídicas tuteladas pela Constituição e pela Lei de modos que diferem em função da natureza do vínculo e do empregador, e não duma hierarquização do valor ético ou social dos respectivos trabalhadores ou do trabalho prestado por uns e outros, gozando ambas as situações de idêntica dignidade à face da Constituição e da Lei.

Assim, não estando em causa a invocação de tratamento discriminatório em sentido próprio, tal como definido e entendido nos arts. 23.º, n.º 1, als. a) e b), 24.º, n.º 1 e 25.º, n.ºs 1 e 5 do Código do Trabalho, mas a violação do princípio do trabalho igual salário igual, cabia aos autores demonstrar, nos termos do art. 342.º, n.º 1, do Código Civil, os factos constitutivos do direito alegado, não beneficiando da presunção aludida.

Ora, independentemente de quaisquer situações concretas e individualizadas, que nem se discutiram, parece-nos pacífico na economia dos autos que o trabalho dos enfermeiros autores não é inferior em natureza, qualidade e quantidade ao dos enfermeiros vinculados por contrato de trabalho em funções públicas que também prestam a sua actividade na ré.

O que é controverso é que o tratamento diferenciado de uns e outros seja efectiva e injustificadamente desvantajoso no que toca aos autores, considerando as respectivas condições globais de prestação do trabalho.

Na verdade, o princípio constitucional da igualdade não significa uma exigência de igualdade absoluta em todas as situações, nem proíbe diferenciações de tratamento.

Como ensinam Gomes Canotilho e Vital Moreira, “[o] que se exige é que as medidas de diferenciação sejam materialmente fundadas sob o ponto de vista da segurança jurídica, da proporcionalidade, da justiça, da praticabilidade e da solidariedade e não se baseiem em qualquer motivo constitucionalmente impróprio.

As diferenciações de tratamento podem ser legítimas quando:

a) - se baseiam numa distinção objectiva de situações;
b) - não se fundamentam em qualquer dos motivos indicados no n.º 2 do art. 13º;
c) - tenham um fim legítimo segundo o ordenamento constitucional positivo;
d) – se revelem necessárias, adequadas e proporcionadas à satisfação do seu objectivo.” (4)

Ora, a questão do tratamento diferenciado de enfermeiros vinculados por contrato de trabalho de direito privado e por contrato de trabalho em funções públicas, ao abrigo dos regimes jurídicos acima identificados, no âmbito do mesmo hospital, foi já apreciada por este Tribunal no Acórdão de 7 de Dezembro de 2017, proferido no processo n.º 2423/16.4T8BRG.G1, em que intervieram como adjuntos a ora Relatora e o ora 1.º Adjunto, não havendo alteração de facto ou de direito que importe a modificação da posição aí assumida.

Aí se refere, na sequência de considerações semelhantes às acabadas de expender:

“Importa portanto saber se este fundamento de distinção, relação jurídica de emprego público/contrato individual de trabalho, esta razão para a diferenciação constitui ou não fundamento material razoável, se constitui condição diferenciadora atendível. 

Importa previamente referir que a entidade gestora apenas pode contratar recorrendo ao regime privado. Os trabalhadores com relação jurídica de emprego público recebeu-os ela da anterior gestora (gestão pública), ou admiti-los-á com essa relação mediante os mecanismos de mobilidade, porque já vinculados com referência à data da Transmissão do Estabelecimento Hospitalar, nos termos acordados no contrato de gestão, obrigando-se mediante este.

(…)
A manutenção de trabalhadores com relação jurídica de emprego público resulta desta obrigação contratual, a admissão de novos trabalhadores será sempre em moldes privados, pois que os vinculados por relação jurídica de emprego publico só mediante a utilização dos instrumentos de mobilidade podem vir a prestar serviço na ré, e apenas se à data da Transmissão do Estabelecimento Hospitalar já tinham esse vínculo.

(…)
Resulta assim que a ré não atribuiu, de “motu próprio”, aos trabalhadores de referência condições superiores aos autores, antes se vê obrigada a garantir essas condições por força do contrato de gestão celebrado e por virtude, digamos, da irredutibilidade do “estatuto” daqueles.

Aqueles trabalhadores, mais que do quadro da ré, pertencem aos “quadros de pessoal das instituições e serviços integrados no Serviço Nacional de Saúde”, podendo mudar de acordo com as regras da mobilidade. Exercem funções na ré por força do contrato de gestão, não perdendo o vínculo que possuem. A ré recebe o seu trabalho, mas a sua vinculação a esta é limitada ao necessário à prestação do trabalho. Note-se que a ré, detendo algum poder disciplinar, não tem o poder expulsivo, nem obrigações ao nível da reforma.

 Não é pois a ré que concede aqueles níveis remuneratórios ou outras particularidades do estatuto, designadamente relativos à carreira, antes reconhece porque contratualmente obrigada, aqueles níveis e demais consequências ao nível da relação, que resultam das normas fixadas pelo Estado para os seus trabalhadores no SNS com relação jurídica de emprego público. 

O critério diferenciador é objetivo e atendível. Ocorreu uma alteração de monta na estrutura de gestão, o que demandou necessariamente um reajustamento desta, designadamente ao nível da contratação, com repercussões várias, designadamente ao nível remuneratório. Ponto é que a ré ao contratar, e relativamente aos demais aspetos que dependem de atuação e iniciativa sua, e não estejam necessariamente determinados pelo estatuto dos trabalhadores com vínculo de emprego publico, não procede a descriminações.

Limitar o parceiro privado, agora gestor, além do que a lei exige, a critérios anteriormente seguidos, não só limitaria a liberdade de empresa, como poderia volver-se contraproducente, inutilizando em parte os intentos do novo modelo. 

(…)
Assim a contratação em moldes privados e com outros níveis remuneratórios e nestas circunstâncias (em que os trabalhadores de referência recebem mais apenas por força da garantia do seu estatuto de “emprego publico”), não teve como critério qualquer circunstância que possa considerar-se discriminativa. Já se contratar com remunerações diversas o problema se porá, mas tal não vem invocado.”

Com efeito – não é demais sublinhar –, o princípio da igualdade no trabalho, designadamente em matéria de retribuição, faz apelo a uma igualdade material (deve tratar-se de igual modo o que é essencialmente igual e de forma desigual o que é desigual), que, in casu, não se verifica.

Em primeiro lugar, é pressuposto essencial que esteja em causa o mesmo empregador, o que não ocorre verdadeiramente, uma vez que o mesmo se corporiza na entidade pública empresarial, no caso dos enfermeiros vinculados por contrato de trabalho de direito privado, e no Estado (em sentido amplo), no caso dos enfermeiros vinculados por contrato de trabalho em funções públicas. 

O hospital com natureza de entidade pública empresarial apenas pode admitir enfermeiros mediante contrato de trabalho a que se aplica o Código do Trabalho e legislação complementar, incluindo o mencionado DL n.º 247/2009, de 22/09, bem como os instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho que existam, imperando os princípios da autonomia privada e colectiva. Já os enfermeiros vinculados por contrato de trabalho em funções públicas, pertencentes ao quadro de pessoal do Serviço Nacional de Saúde, podem prestar a respectiva actividade em hospital com natureza de entidade pública empresarial apenas por força de obrigações impostas a este perante o Estado, imperando o princípio da legalidade.  
Assim, desde logo em matéria retributiva, o art. 13.º do DL n.º 247/2009 remete para os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, o que permite que sejam acordados salários mais altos ou mais baixos do que os fixados legalmente para os enfermeiros que exercem funções no âmbito de contratos de trabalho em funções públicas, tudo dependendo das negociações entre as entidades que representam os empregadores e os trabalhadores.

Acresce que os enfermeiros com contrato de trabalho em funções públicas são sujeitos a um regime de ingresso e progressão, bem como de incompatibilidades e mobilidade geográfica e funcional, que se têm como mais fortemente constrangedores da liberdade de acesso e exercício da actividade profissional.

Também os regimes disciplinar e de férias, feriados, faltas e licenças são distintos, o mesmo sucedendo com outros aspectos.  

Deste modo, não obstante a perspectiva de progressiva aproximação de regimes, os mesmos mantêm distinções determinadas por diferente peso de direitos e deveres, cujo equilíbrio soçobraria pela pretensão de alcançar «o melhor de dois mundos».

Acresce que, como decorre de todo o exposto, a sobrevivência do contrato de trabalho em funções públicas no âmbito de entidades públicas empresariais é vista legalmente como residual e transitória, não fazendo sentido que possa constituir a situação de referência dos trabalhadores admitidos ao abrigo do regime legalmente estabelecido como regra.

Por todo o exposto, não se verifica a alegada inconstitucionalidade e, consequentemente, improcede o recurso.
 
5. Decisão

Nestes termos, acorda-se em julgar a apelação improcedente e em confirmar a sentença recorrida.
Custas pelos Apelantes.
Guimarães, 17 de Dezembro de 2018
(Alda Martins)
 (Eduardo Azevedo)
 (Vera Sottomayor)

Sumário (elaborado pela Relatora):

I – O princípio da igualdade no trabalho, designadamente em matéria de retribuição, faz apelo a uma igualdade material (deve tratar-se de igual modo o que é essencialmente igual e de forma desigual o que é desigual), que não se verifica no caso de enfermeiros vinculados por contrato de trabalho de direito privado e por contrato de trabalho em funções públicas, a prestar trabalho na mesma entidade pública empresarial.
II – Em primeiro lugar, é pressuposto essencial que esteja em causa o mesmo empregador, o que não ocorre verdadeiramente, uma vez que o mesmo se corporiza na entidade pública empresarial, no caso dos enfermeiros vinculados por contrato de trabalho de direito privado, e no Estado (em sentido amplo), no caso dos enfermeiros vinculados por contrato de trabalho em funções públicas. 
III – O hospital com natureza de entidade pública empresarial apenas pode admitir enfermeiros mediante contrato de trabalho a que se aplica o Código do Trabalho e legislação complementar, incluindo o DL n.º 247/2009, de 22/09, bem como os instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho que existam, imperando os princípios da autonomia privada e colectiva. 
III – Já os enfermeiros vinculados por contrato de trabalho em funções públicas, pertencentes ao quadro de pessoal do Serviço Nacional de Saúde, podem prestar a respectiva actividade em hospital com natureza de entidade pública empresarial apenas por força de obrigações impostas a este perante o Estado, imperando o princípio da legalidade.  
IV – Assim, desde logo em matéria retributiva, o art. 13.º do DL n.º 247/2009 remete para os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, o que permite que sejam acordados salários mais altos ou mais baixos do que os fixados legalmente para os enfermeiros que exercem funções no âmbito de contratos de trabalho em funções públicas, tudo dependendo das negociações entre as entidades que representam os empregadores e os trabalhadores.
V – Acresce que os enfermeiros com contrato de trabalho em funções públicas são sujeitos a um regime de ingresso e progressão, bem como de incompatibilidades e mobilidade geográfica e funcional, que se têm como mais fortemente constrangedores da liberdade de acesso e exercício da actividade profissional, sendo também distintos os regimes disciplinar, de férias, feriados, faltas e licenças, etc..
VI – Deste modo, não obstante a perspectiva de progressiva aproximação de regimes, os mesmos mantêm distinções determinadas por diferente peso de direitos e deveres, cujo equilíbrio soçobraria pela pretensão de alcançar «o melhor de dois mundos».
VII – Acresce que a sobrevivência do contrato de trabalho em funções públicas no âmbito de entidades públicas empresariais é vista legalmente como residual e transitória, não fazendo sentido que possa constituir a situação de referência dos trabalhadores admitidos ao abrigo do regime legalmente estabelecido como regra.


 (Alda Martins)


1. Contrato de Trabalho, Coimbra Editora, 2009, pp. 307-308.
2. Pedro Romano Martinez et al, Código do Trabalho Anotado, Almedina, 2005, pp. 122-123.
3. Disponível em www.dgsi.pt.
4. Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª ed., pp. 127-128.

1. Relatório 1- A. J., 2- A. C., 3- A. L., 4- A. F., 5- A. P., 6- A. R., 7- A. S., 8- A. B., 9- A. M., 10- C. C., 11- C. M., 12- C. A., 13- C. S., 14- C. L., 15- C. F., 16- C. V., 17- C. F. M., 18- C. D., 19- C. J., 20- C. M. S., 21- C. M. C., 22- C. M. A., 23- C. R., 24- E. J., 25- E. C., 26- E. B., 27- E. R., 28- F. C., 29- F. A., 30- J. C., 31- J. D., 32- J. T., 33- L. S., 34- L. T., 35- L. E., 36- L. M., 37- L. C., 38- L. F., 39- L. A., 40- M. S., 41- M. J., 42- M. F., 43- M. C., 44- M. P., 45- M. I., 46- M. E., 47- M. V., 48- M. M., 49- M. A., 50- M. A. C., 51- N. H., 52- N. M., 53- N. F., 54- O. C., 55- O. M., 56- O. I., 57- P. C., 58- P. S., 59- P. D., 60- P. M., 61- P. A., 62- P. O., 63- P. A. C., 64- P. V., 65- P. H., 66- P. F., 67- P. F. F., 68- P. N., 69- R. P., 70- R. M., 71- R. S., 72- R. J., 73- R. A., 74- R. G., 75- R. F., 76- S. M., 77- S. A., 78- S. C., 79- S. F., 80- S. R., 81- S. L., 82- S. C. R., 83- S. S., 84- S. P., 85- S. R. A., 86- S. C. S., 87- T. C., 88- T. R., 89- T. A., 90- V. R., 91- V. T., 92- V. F., 93- V. B. intentaram acção declarativa de condenação, com processo comum, contra HOSPITAL X, E.P.E., alegando, em síntese, que: Os autores foram admitidos ao serviço da ré, mediante a celebração de contratos individuais de trabalho, para prestarem cuidados especializados de enfermagem. Desde 01.01.2013 que os seus salários deviam ter aumentado para o valor de € 1.201,48, por força do DL n.º 122/2010, de 11.11, decorrente da vontade do legislador em estabelecer o percurso comum de progressão profissional para todos os enfermeiros independentemente do vínculo contratual, o que resulta dos princípios constitucionais da igualdade e paridade retributiva. Ao tê-lo feito apenas a partir de Novembro de 2015, deverá proceder ao reposicionamento remuneratório desde aquela data, pelo que, concluem, são devidas diferenças retributivas. Dos contratos de trabalho (cláusula 7.ª) resulta um prémio de assiduidade correspondente a 14,286% da retribuição ilíquida auferida, a ser vencido sempre que, no desempenho das suas funções, os autores preencham na totalidade os critérios de assiduidade, para todos os autores com excepção de 4 (id. em 47 (M. E.), 57 (O. I.), 67 (P. F.) e 81 (S. R.). O prémio de assiduidade tem natureza retributiva, na medida em que é devido por força do contrato e tem carácter regular e permanente. Sucede que, aquando da actualização supra, os autores viram-se privados do prémio de assiduidade, sem qualquer motivo justificado, pelo que deve a ré repô-lo desde pelo menos Outubro de 2015. O prémio é devido a todos (incluindo aqueles 4 a que se fez referência), sob pena de se violar o princípio trabalho igual, salário igual, e independentemente de os autores se encontrarem ou não sindicalizados. O Acordo de Regulamentação Colectiva assinado entre o sindicato e as várias E.P.E. abrange e representa a vontade dos sindicalizados, por outro lado a cláusula 4.ª, n.º 2 dispõe que “nos casos em que a remuneração do trabalhador integre uma componente fixa e uma variável, deve atender-se ao somatório das duas componentes, sem prejuízo do que remanesce”, e, finalmente, uma vez que o prémio de assiduidade é calculado em 14,286% da remuneração base, o seu valor não é variável, mas sim sempre de € 171,64. Atendendo a que o salário base deveria ter sido actualizado em 01-01-2013, conforme o supra exposto, o prémio de assiduidade seria calculado com base em € 1.201,48 e não em € 998,08, pelo que deverá a ré pagar a título de retroactivos a diferença do mesmo. Acresce que inexiste fundamento válido para que enfermeiros tenham diferentes horários semanais, entendendo que todos deveriam trabalhar 35 horas (e não 40 horas, como acontece com os autores), sob pena de discriminação. Esta conduta discriminatória causa-lhes revolta, fazendo-os sentir humilhados, vexados, irritados e angustiados. Concluem, pedindo que se condene a ré a: a) Pagar a cada um dos autores, a título de retroactivos, o valor de € 6.712,20 (seis mil setecentos e doze euros e vinte cêntimos), acrescido de juros vencidos no valor de € 239.47 (duzentos e trinta e nove euros e quarenta e sete cêntimos) e de juros vincendos à taxa legal em vigor até integral pagamento, bem como a diferença da retribuição das férias, do respectivo subsídio e do subsídio de Natal, o que até ao presente perfaz o valor de € 1.220,40 (mil duzentos e vinte euros e quarenta cêntimos), acrescido de juros à taxa legal em vigor, o que perfaz o total de € 8.171,87 (oito mil cento e setenta e um euros e oitenta e sete cêntimos) a pagar a cada um dos autores; b) Fixar o prémio de assiduidade nos termos anteriores à entrada do Acordo Parcelar e, consequentemente, pagar os prémios devidos desde essa data até à sua reposição, o que até à data perfaz o total de € 2.059,68 (dois mil e cinquenta e nove euros e sessenta e oito cêntimos) a cada um dos autores; c) Pagar aos autores, que sempre receberam o prémio de assiduidade, os retroactivos relativos ao mesmo, perfazendo a quantia de € 968,65 (novecentos e sessenta e oito euros e sessenta e cinco cêntimos) a cada um (com excepção de M. E., O. I., P. F. e S. R.); d) Pagar aos autores que nunca receberam prémio de assiduidade, a saber, M. E., O. I., P. F. e S. R., os retroactivos relativos ao prémio de assiduidade, que perfazem a quantia de € 5.656,20 (cinco mil seiscentos e cinquenta e seis euros e vinte cêntimos) a cada um; e) Fixar o horário de trabalho dos autores em 35 horas semanais; e.1) Ou, alternativamente, a pagar aos autores as 5 (cinco) horas semanais remanescentes, no valor de € 158,40 (cento e cinquenta e oito euros e quarenta cêntimos) mensais a cada um; f) Pagar os danos não patrimoniais conforme o alegado em 66.º e seguintes da petição inicial, no valor de € 1.000,00 (mil euros) a cada um, perfazendo o total de € 93.000,00 (noventa e três mil euros). A ré apresentou contestação defendendo-se por excepção e por impugnação. Impugnou os factos essenciais da causa de pedir, sustentando, nomeadamente, que a diferença de regimes contratuais explica as diferenças apontadas pelos autores. Por excepção, invocou, desde logo, a incompetência do Tribunal em razão da matéria, pugnando pela competência dos Tribunais administrativos. Mais requereu que se declarasse a impossibilidade da causa de pedir e do pedido, relativamente às atribuições e competências da ré, com os legais efeitos e consequências. Por fim, e caso assim se não entendesse, pugnou pela improcedência da acção, sendo absolvido do pedido. Os autores responderam à contestação, mantendo, no essencial, a posição assumida em sede de petição inicial, pugnando pela competência do Tribunal, bem assim como pela condenação como litigante de má-fé da ré. Em sede de audiência prévia/tentativa de conciliação, os autores declararam, para os devidos e legais efeitos, desistir do pedido de condenação por litigância de má-fé antes formulado contra a ré. Seguidamente, foi proferido despacho saneador-sentença, que, para além de julgar improcedentes as excepções dilatórias invocadas pela ré, conheceu do mérito da causa, terminando com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, decide-se julgar a presente acção total e integralmente improcedente e, em consequência, absolve-se o Réu Hospital X, E.P.E., dos pedidos contra si formulados. Custas a cargo dos autores.» Os autores A. C. A. P. A. R. A. B. A. M. C. C. C. M. C. L. C. F. C. F. M. C. D. E. J. E. R. F. C. J. C. J. D. L. C. L. F. M. J. M. E. M. V. M. A. M. A. C. N. M. O. M. P. C. P. S. P. D. P. V. P. F. P. F. F. P. N. R. M. R. A. S. R. S. C. R. S. R. A. S. C. S. T. R. T. A. inconformados, interpuseram recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões: «1. Ainda que a disparidade de tratamento entre os enfermeiros em regime CIT e em RTFP resulte de uma diversidade de regimes legais aplicáveis, a manutenção dessa desigualdade por quase três anos quanto à remuneração mensal e até aos dias de hoje quanto ao horário normal de trabalho, consubstancia uma discriminação, sendo uma violação do princípio trabalho igual, salário igual. 2. Pois, a equidade retributiva, contida no referido princípio, é diretamente aplicável às entidades públicas e privadas. 3. Tal princípio proíbe discriminações e reclama a igualdade substantiva de tratamento dos trabalhadores que prestam o mesmo tipo de trabalho, aferido este pelos critério da quantidade, natureza e qualidade. 4. Os critério objetivos sufragados na CRP são a quantidade, a natureza e a qualidade E NÃO NO REGIME LEGAL SOB O QUAL OS TRABALHADORES EXERCEM FUNÇÕES. 5. Pelo que, a interpretação feita pelo Meritíssimo Juiz a quo, com o devido respeito que é muito e merecido, é inconstitucional. 6. As normas dos artigos 1.º, 2.º, 4.º e 5.º do Decreto-lei n.º 122/2010, de 11 de Novembro, bem como o preceito do artigo 13.º do Decreto-lei n.º 247/2009, de 22 de Setembro, são material e organicamente inconstitucionais, na interpretação segundo a qual o regime remuneratório contido no primeiro diploma se aplica subjectivamente apenas aos enfermeiros em contrato de trabalho em funções públicas, permitindo-se a introdução de diferenças remuneratórias entre enfermeiros que exerçam funções em instituições do Serviço Nacional de Saúde apenas com base na natureza jurídica da relação de emprego. 7. O Decreto-Lei 122/2010, de 11 de Novembro, alegadamente criado para a regulação das carreiras dos enfermeiros vinculados à Administração Pública por contrato de trabalho em funções públicas, no entanto, no seu artigo 8.º o citado diploma, procede à alteração do Decreto Lei 247/2009, de 22 de Setembro que rege os enfermeiros em regime individual de trabalho. 8. Pelo que, é forçoso concluir que o Decreto de Lei 122/2010, de 11 de Novembro, não se pode aplicar apenas e só aos enfermeiros vinculados à Administração Pública por contratos de trabalho em funções públicas, mas antes é também aplicável aos enfermeiros em regime de contrato individual de trabalho. 9. O direito fundamental consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea a), da Constituição da República Portuguesa é um direito análogo aos direitos, liberdades e garantias, vinculando diretamente todas as pessoas coletivas integrantes da Administração Pública em sentido orgânico. 10. Os hospitais organizados sob a forma jurídica de entidade pública empresarial são pessoas coletivas públicas que desenvolvem uma atividade administrativa de gestão privada, integrando a Administração Indireta do Estado. 11. Quaisquer atos legislativos restritivos do conteúdo essencial dos direitos análogos aos direitos, liberdades e garantias devem revestir formalmente a veste de lei da Assembleia da República. 12. Não são constitucionalmente admissíveis quaisquer leis, atos ou regulamentos administrativos, contratos individuais de trabalho ou instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho que introduzam, no âmbito da mesma organização, diferenciações remuneratórias como contrapartida da prestação de trabalho com a mesma quantidade, natureza e qualidade. 13. Tais normas, são material e organicamente inconstitucionais, na interpretação segundo a qual o regime remuneratório contido no diploma se aplica subjetivamente apenas aos enfermeiros em contrato de trabalho em funções públicas, permitindo-se a introdução de diferenças remuneratórias entre enfermeiros que exerçam funções em instituições do Serviço Nacional de Saúde apenas com base na natureza jurídica da relação de emprego. 14. Pelo que, o Tribunal no cumprimento do seu poder/dever não pode permitir que os Privados se aproveitam das lacunas na legislação para permitir que os privados enriqueçam à custa duma desarmonização salarial e horária injusta, pois o princípio constitucional para trabalho igual, salário igual é aplicável quer a entes públicos como a entres privados. Aliás, a este respeito à que recorrer à doutrina de António Monteiro Fernandes, posição sufragada no Ac. da Relação de Lisboa, processo nº 3424/11.4TTLSB.L1-4, datado de 04-06-2014: “A Constituição da República Portuguesa e as normas legais em matéria de igualdade e não discriminação no trabalho exigem do empregador que adopte as medidas necessárias à efectiva igualdade de tratamento e se iniba das práticas que importem diferenciação injustificada, pelo que, se o mesmo tiver ao seu serviço trabalhadores em regime de emprego público e em regime de contrato de trabalho, não tendo tal factor qualquer influência na quantidade, natureza e qualidade do trabalho, o princípio a trabalho igual, salário igual, numa vertente positiva, exige daquele uma atitude activa de equiparação substantiva em matéria retributiva, e, por inerência, em matéria de promoção profissional.”(negrito nosso). 15. E ainda o o Ac. Do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 04-06-2014, disponível em www.dgsi.pt, que passamos a citar: “o princípio da equidade retributiva que se traduz na fórmula para trabalho igual, salário igual, assume posição normativa directa e efectiva no plano das relações de trabalho. Ele significa imediatamente, que não pode, por nenhuma das vias possíveis (contrato individual de trabalho, convenção coletiva, regulamentação administrativa, legislação ordinária) atingir-se o resultado de, numa concreta relação de trabalho, ser praticada retribuição desigual da que seja paga, no âmbito da mesma organização, como contrapartida de trabalho igual. Nessa perspetiva, a jurisprudência tem declarado o princípio como vinculante das entidades públicas e dos particulares”. 16. Aliás o Ac. Da Relação de Coimbra, datado de 14-06-2012, processo 222/11.9TTVCIS.C1 decidiu e passamos a citar: “Todos os trabalhadores têm direito à retribuição do trabalho segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual. São pressupostos do princípio “a trabalho igual, salário igual”, a identidade de natureza da actividade e a igualdade do tempo de trabalho. Viola esse princípio o empregador que dispensa tratamento diferenciado ao nível das retribuições pagas a pessoas que, exercendo funções no âmbito da sua organização … desempenham exactamente as mesmas funções do ponto de vista da qualidade e quantidade.”(sublinhado nosso). 17. Ainda o Ac. da Relação de Guimarães , “SE, NUMA MESMA ORGANIZAÇÃO, DOIS TRABALHADORES DESEMPENHAM TAREFAS QUALITATIVAMENTE COINCIDENTES E EM IDÊNTICA QUANTIDADE, DEVE SER-LHE, POR FORÇA DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL A TRABALHO IGUAL, SALÁRIO IGUAL, IDÊNTICA REMUNERAÇÃO”. (negrito e sublinhado nosso). 18. E ainda, o Ac. Do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 04-06-2014, disponível em www.dgsi.pt, que passamos a citar: “o princípio da equidade retributiva que se traduz na fórmula para trabalho igual, salário igual, assume posição normativa directa e efectiva no plano das relações de trabalho. Ele significa imediatamente, que não pode, por nenhuma das vias possíveis (contrato individual de trabalho, convenção colectiva, regulamentação administrativa, legislação ordinária) atingir-se o resultado de, numa concreta relação de trabalho, ser praticada retribuição desigual da que seja paga, no âmbito da mesma organização, como contrapartida de trabalho igual. Nessa perspectiva, a jurisprudência tem declarado o princípio como vinculante das entidades públicas e dos particulares”. (negrito e sublinhado nosso). 19. Retornando ao caso dos autos, e apreciando-o à luz destes ensinamentos, os aludidos princípios plasmados na Constituição da República Portuguesa e na legislação laboral ordinária impõem que a R. conceda igual tratamento aos enfermeiros que a si estão ligados mediante contrato individual de trabalho, uma vez que não está em causa que o trabalho de uns e outros seja igual quanto à quantidade, natureza e qualidade e apenas é invocado como motivo justificativo da diferenciação a distinta natureza do vínculo e o objecto daquele diploma legal, que, obviamente, não teve em conta os casos em que, dentro da mesma organização, coexistam trabalhadores em ambas as situações. 20. Com efeito, a unificação das carreiras de enfermagem constituiu um propósito confesso do legislador: no preâmbulo do Decreto-lei n.º 247/2009, de 22 de Setembro, refere-se que “o Governo pretende garantir que os enfermeiros das instituições de saúde no âmbito do SNS possam dispor de um percurso comum de progressão profissional e de diferenciação técnico-científica, o que possibilita também a mobilidade interinstitucional, com harmonização de direitos e deveres, sem subverter a autonomia de gestão do sector empresarial do Estado.” 21. Aliás, a Assembleia da República, mediante a resolução da Assembleia da República nº 85/2016, ponto 10 – Todos os profissionais de saúde que desempenham funções permanentes nos hospitais do SNS sejam integrados em carreiras com vínculo à Administração Pública, através de contratos de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado - reconhece a necessidade de por fim à discriminação existente dos enfermeiros a laborar no SNS em regime CIT. 22. Ora, mais não é uma assunção da inconstitucionalidade da situação em vigor. 23. As referidas inconstitucionalidades foram arguidas nas alegações de recurso interposto pelos Autores/recorridas da Douta Sentença proferida em 1ª Instancia. 24. De frisar que, a interpretação levada a cabo pelo Tribunal da Relação do Porto, no sentido de que os regimes apesar de harmonizados permitem discriminação a nível salarial não é mais que dizer que, o regime legal adotado nas E.P.E. permite discriminar livremente os trabalhadores, ainda que trabalhem igual, quer em quantidade, quer em quantidade. 25. Aliás, os recorrentes (Autores) trabalham mais que os demais funcionários da Ré, pois trabalham mais 5 horas semanais, isto é, mais 40 horas mensais. 26. Assim, não se consegue percecionar como se pode entender que dois trabalhadores iguais em formação e em trabalho, adstritos ao serviço nacional de saúde (doravante SNS), a laborar numa instituição pública, possam ser discriminados, trabalhando mais e recebendo mesmo. 27. TAL DISCRIMINAÇÃO NÃO É DIFERENTE, NEM MENOS GRAVOSA, DO QUE UMA DISCRIMINAÇÃO EM FAVOR DO SEXO, RAÇA, PREFERÊNCIA SEXUAL OU CREDO. 28. Pois, ficou demonstrado, conforme frisou o Meritíssimo Juiz da primeira instância que, os enfermeiros em regime de funções públicas e os enfermeiros em contrato individual de trabalho laboram com a mesma qualidade. 29. Inclusive ficou provado que na sua maioria os enfermeiros em regime de contrato individual de trabalho possuem melhores e mais qualificações académicas e especialização. 30. Igualmente se provou que, trabalham com a mesma qualidade em maior quantidade, pois laboram mais cinco horas semanais, um total de 40 horas mensais. 31. E que por força, única e exclusiva, do vinculo laboral ser um contrato individual de trabalho auferem um salário inferior, auferem de um valor hora de trabalho inferior e trabalham mais cinco horas. 32. Assim, o único fator que discrimina aqui não é objetivo, não é sério, não é constitucional. 33. Não é a qualidade, a eficiência, o tempo, a dedicação, o zelo, o rendimento, as qualificações, o tempo de serviço que estão em causa. 34. Mas antes o reconhecer que os enfermeiros que laboram para a Ré são iguais no que concerne à qualidade e quantidade de trabalho, ambos estão ao serviço do Serviço Nacional de Saúde, mas os enfermeiros em regime individual de trabalho podem receber menos, apenas e só, por não estarem contratos em regime de funções públicas. 35. Tal conclusão, seria uma permissão legal para violar um princípio basilar da nossa constituição, o princípio da igualdade. 36. Além do mais, à que ter em que estamos perante enfermeiros contratados para exercerem a sua atividade no âmbito, único e exclusivo, do Serviço Nacional de Saúde. 37. Consequentemente, o empregador é o Estado. 38. Pelo que, o Estado enquanto contratante usa de má-fé, pois não pode usar enfermeiros para exercerem as mesmas funções no Serviço Nacional de Saúde, com diferentes vínculos, resultando em razão, única e exclusiva do mesmo, diferentes remunerações e carga horária. 39. Aliás, o Estado e o Legislador reconhecem que urge acabar com a precaridade, urge criar paridade, urge uniformizar as carreiras de enfermagem (basta para tanto ver o preâmbulo dos Decretos de Lei 247/2009 e 248/2009), no entanto é o próprio que motiva esta disparidade. 40. A este propósito vide a Resolução de Ministro 85/2016 suprarreferida: Todos os profissionais de saúde que desempenham funções permanentes nos hospitais do SNS sejam integrados em carreiras com vínculo à Administração Pública, através de contratos de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado - reconhece a necessidade de por fim à discriminação existente dos enfermeiros a laborar no SNS em regime CIT. (negrito e sublinhado nosso). 41. Portanto, o próprio Estado e Legislador reconhecem esta discriminação. 42. Assim, o Estado, enquanto entidade contratante, não pode usar de subterfúgios legais para contratar mão de obra igual a um preço inferior. 43. Tal é inconstitucional. 44. Acresce ainda a violação do princípio da proteção da confiança, sendo que a este propósito se pronunciou o Tribunal Constitucional nos Acórdãos n.º 188/2010 e 396/2011, acerca dos funcionários públicos passarem a laborar mais cinco horas semanais: “Esta alteração que agora preconiza (do período normal de trabalho de trinta e cinco horas para quarenta horas semanais tem) em vista alcançar uma maior convergência entre os setores público e privado, passando os trabalhadores do primeiro a estar sujeitas ao período normal de trabalho que há muito tem sido praticado no segundo” 45. Ora, à contrario sensu é forçosamente inconstitucional uma interpretação que permita distanciar o privado do público, prejudicando-os a nível salarial de carga horária. 46. Ou seja, era legitimo os privados (enfermeiros em regime de contrato individual de trabalho) expetarem auferir de um salário igual pelo mesmo período de trabalho. 47. Tais acórdãos referem inclusive que: “Nessa medida a Lei 68/2013 é apresentada como “mais uma etapa” do processo de laboração da função pública, no âmbito do qual tem sido reconhecida a convergência entre o regime laboral privado e as regras de trabalho público em termos de flexibilidade da parte do trabalhador e condicionalismos do empregador”.(negrito e sublinhado nosso)., 48. Ora, o Estado Legislador não pode deixar esta suscetibilidade, quando ele é a entidade contratante, quando ele tem o poder de aceitar o instrumento de regulamentação coletiva. 49. No entanto não o aceita. 50. Aliás, é de conhecimento público as greves da classe de enfermagem no sentido de obter um instrumento de regulamentação coletiva. 51. Contudo, estão nas mãos do Estado enquanto entidade contratante e entidade decisória. 52. Enquanto isso, os Autores, bem como todos os enfermeiros em regime de contrato vêem-se forçados assinar os contratos individuais de trabalho conforme estes lhe são impostos. 53. Aliás, recuando no tempo dez anos, aquando dos cortes orçamentais que resultou no corte salarial aos funcionários em regime de funções públicas, tal corte afetou em igual medida dos enfermeiros com contratos individuais. 54. Assim, os enfermeiros em regime de contrato individual no que concerne a cortes estão sujeitos ao regime da função pública, mas no que concerne a aumentos já não. 55. Tal é sem dúvida violador do princípio da igualdade, violador do princípio trabalho igual salário igual e do princípio da proteção da confiança. 56. Caso contrário, obriga a concluir que o regime legal adotado nas E.P.E. permite discriminar livremente os trabalhadores, ainda que trabalhem igual, quer em quantidade, quer em quantidade. 57. Tal conclusão, seria uma permissão legal para violar um princípio basilar da nossa constituição, o princípio da igualdade. 58. Pelo que devem ser declarados inconstitucionais os artigos 1º, 2º, 4º, 5º do Dl 122/2010, o art.º 13.º do Dl 247/2009 e o art.º 17.º do Dl 248/2009, na interpretação segundo a qual o regime remuneratório e de duração e organização do tempo de trabalho contido nos diplomas se aplica subjetivamente apenas aos enfermeiros em regime de contrato de trabalho em funções públicas, permitindo-se a introdução de diferenças remuneratórias e de diferenças de horas de trabalho entre enfermeiros que exerçam funções em instituições do Serviço Nacional de Saúde apenas com base na natureza da relação de emprego. 59. Portanto, deve o recurso interposto ser totalmente procedente.» A ré apresentou resposta ao recurso dos autores, pugnando pela sua improcedência. O recurso foi admitido como apelação, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. Recebidos os autos nesta Relação, o Senhor Procurador Geral-Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. Colhidos os vistos dos Exmos. Desembargadores Adjuntos, cumpre decidir. 2. Objecto do recurso Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, a única questão que se coloca a este tribunal é se o regime legal aplicável aos autores, ligados à ré por contrato de trabalho de direito privado, é inconstitucional na medida em que permite um tratamento distinto e alegadamente desvantajoso em matéria de remuneração e tempo de trabalho, comparativamente com os enfermeiros ligados à ré por relação pública de emprego. 3. Fundamentação de facto Os factos provados são os seguintes: 1- São enfermeiros com contrato individual de trabalho celebrado com a ré, no que cada um descreve: 1. O autor A. J. iniciou funções em 11/08/2003, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 11 de Agosto de 2006; 2. A autora A. C. iniciou funções em 01/02/2005, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 1 de Agosto de 2006; 3. A autora A. L. iniciou funções em 18/05/2009, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 18 de Maio de 2010; 4. A autora A. F. iniciou funções em 23/04/2010, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 23 de Abril de 2010; 5. A autora A. P. iniciou funções em 01/09/2006, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006; 6. A autora A. R. iniciou funções em 03/01/2005, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 3 de Julho de 2006; 7. O autor A. S. iniciou funções em 01/,08/2006, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 9 de Agosto de 2006; 8. O autor A. B. iniciou funções em 11/08/2006, tendo celebrado contrato individual sem termo, datado de 11 Agosto de 2006; 9. A autora A. M. iniciou funções em 09/12/2010, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 9 de Dezembro de 2010; 10. A autora C. C. iniciou funções em 02/05/2010, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Maio de 2010; 11. A autora C. M. iniciou funções em18/05/2010, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 18 de Maio de 2010; 12. A autora C. A. iniciou funções em 01/09/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006; 13. A autora C. S. iniciou funções em 11/08/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 11 de Agosto de 2006; 14. A autora C. L. iniciou funções em 01/09/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006; 15. A autora C. F. iniciou funções em 01/08/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Agosto de 2006; 16. O autor C. V. iniciou funções em 01/08/2010, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de agosto de 2010; 17. A autora C. F. M. iniciou funções em 15/09/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 15 de Setembro de 2006; 18. A autora C. D. iniciou funções em 02/01/2011, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Janeiro de 2011; 19. A autora C. J. iniciou funções em 13/01/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 13 de Janeiro de 2006; 20. A autora C. M. S. iniciou funções em 10/06/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 10 de Junho de 2006; 21. A autora C. M. C. iniciou funções em 25/05/2009, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 25 de Maio de 2010; 22. A autora C. M. A. iniciou funções em 13/11/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 23 de Novembro de 2006; 23. A autora C. R. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 6 de Outubro de 2006, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações; 24. O autor E. J. iniciou funções em 03/07/2006, tendo celebrado contrato individual de trabalho sem termo, datado de 3 de Julho de 2006; 25. A autora E. C. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 30 de Junho de 2004, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações; 26. A autora E. B. celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Agosto de 2010; 27. A autora E. R. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 26 de Junho de 2009, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações; 28. A autora F. C. iniciou funções em 01/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Agosto de 2006; 29. A autora F. A. iniciou funções em 11/08/2005 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 11 de Agosto de 2005; 30. A autora J. C. iniciou funções em 01/10/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Outubro de 2010; 31. A autora J. D. iniciou funções em 13/02/2011 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 13 de Fevereiro de 2011; 32. A autora J. T. iniciou funções em 11/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 11 de Agosto de 2006; 33. A autora L. S. iniciou funções em 22/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 22 de Agosto de 2006; 34. A autora L. T. iniciou funções em 20/05/2005 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 20 de Abril de 2005; 35. A autora L. E. iniciou funções em 25/05/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de Maio de 2010; 36. A autora L. M. iniciou funções em 02/04/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Abril de 2010; 37. A autora L. C. iniciou funções em 02/05/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Maio de 2006; 38. O autor L. F. iniciou funções em 11/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 11 de Agosto de 2006; 39. A autora L. A. iniciou funções em 21/07/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 21 de Julho de 2010; 40. A autora M. S. iniciou funções em 01/02/2011 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Fevereiro de 2011; 41. O autor M. J. iniciou funções em 11/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 11 de Agosto de 2006; 42. A autora M. F. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 8 de Maio de 2006, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações; 43. A autora M. C. iniciou funções em 01/06/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Junho de 2010; 44. A autora M. P. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006; 45. A autora M. I. iniciou funções em 02/05/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Maio de 2006; 46. A autora M. E. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 25 de Maio de 2011, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações; 47. A autora M. V. iniciou funções em 16/02/2011 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 16 de Fevereiro de 2011; 48. A autora M. M. iniciou funções em 26/01/2011 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 26 de Janeiro de 2011; 49. O autor M. A. iniciou funções em 11/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 11 de agosto de 2006; 50. A autora M. A. C. iniciou funções em 02/08/2005 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Agosto de 2005; 51. A autora N. H. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006; 52. O autor N. M. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 2 de Dezembro de 2005, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações; 53. O autor N. F. iniciou funções em 16/08/2005 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 16 de Agosto de 2005; 54. A autora O. C. iniciou funções em 11/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 12 Agosto de 2006; 55. A autora O. M. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006; 56. A autora O. I. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 27 de Junho de 2011, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações; 57. A autora P. C. iniciou funções em 11/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 11 de Agosto de 2006; 58. A autora P. S. iniciou funções em 02/05/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Maio de 2010; 59. A autora P. D. iniciou funções em 27/07/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 27 de Julho de 2010; 60. A autora P. M. celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 3 de Agosto de 2010; 61. A autora P. A. celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 15 de Junho de 2005; 62. O autor P. O. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006; 63. O autor P. A. C. iniciou funções em 01/10/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Outubro de 2010; 64. O autor P. V. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 11 de Agosto de 2003, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações; 65. O autor P. H. iniciou funções em 30/09/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 30 de Setembro de 2010; 66. O autor P. F. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 1 de Julho de 2011, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações; 67. O autor P. F. F. celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Agosto de 2006; 68. O autor P. N. iniciou funções em 01/05/2007 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Maio de 2007; 69. A autora R. P. iniciou funções em 06/02/2011 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 6 de Fevereiro de 2011; 70. A autora R. M. iniciou funções em 01/06/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Junho de 2010; 71. O autor R. S. iniciou funções em 09/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 9 de Agosto de 2006; 72. O autor R. J. iniciou funções em 01/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Agosto de 2006; 73. O autor R. A. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 17 de Fevereiro de 2006, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações; 74. O autor R. G. iniciou funções em 02/06/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Junho de 2006; 75. A autora R. F. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006; 76. A autora S. M. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006; 77. A autora S. A. iniciou funções em 01/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Agosto de 2006; 78. A autora S. C. iniciou funções em 08/05/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 8 de Maio de 2006; 79. A autora S. F. celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006; 80. A autora S. R. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 11 de Agosto de 2011, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações; 81. A autora S. L. iniciou funções em 16/11/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 16 de Novembro de 2010; 82. A autora S. C. R. iniciou funções em 23/07/2001 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006; 83. A autora S. S. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 1 de Agosto de 2006, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações; 84. A autora S. P. iniciou funções em 01/08/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Agosto de 2010; 85. A autora S. R. A. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006; 86. A autora S. C. S. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 1 de Agosto de 2006, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações; 87. A autora T. C. iniciou funções em 09/08/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 9 de Agosto de 2006; 88. A autora T. R. celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 3 de Junho de 2010; 89. O autor T. A. iniciou funções em 02/01/2007 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 2 de Janeiro de 2011; 90. A autora V. R. celebrou contrato individual de trabalho a termo certo, datado de 25 de Agosto de 2009, tendo-se convertido em contrato sem termo por sucessivas renovações; 91. A autora V. T. iniciou funções em 15/12/2010 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 15 de Dezembro de 2010; 92. A autora V. F. iniciou funções em 15/06/2005 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 15 Junho de 2005; 93. A autora V. B. iniciou funções em 01/09/2006 e celebrou contrato individual de trabalho sem termo, datado de 1 de Setembro de 2006; 2- A ré é resultado da fusão do Hospital X, Guimarães, E. P. E., com o Hospital Hospital Y – Fafe, passando a denominar-se HOSPITAL X, E.P.E.. 3- Os autores foram admitidos ao serviço da ré mediante contrato individual de trabalho para exercerem funções inerentes à categoria de enfermagem. 4- Contrato através do qual se obrigaram, mediante retribuição, a prestar serviços nas suas instalações, sob as ordens, direcção, fiscalização e autoridade desta, aí integrando a sua organização. 5- Resulta dos contratos escritos celebrados, além do mais, sob a cláusula 2.ª: “A prestação de trabalho destina-se, nomeadamente, ao desempenho das seguintes funções, correspondentes à sua categoria profissional: Prestação de cuidados de enfermagem, caracterizados nos termos do artigo 5º do DL nº 161/96, de 4-9 que aprova o Regulamento do Exercício Profissional dos Enfermeiros e enunciados no artigo 7º do DL 437/91, de 08-11.”, resultando ainda, com excepção dos contratos dos autores referidos no ponto 13 infra, sob a cláusula 7.ª (remuneração): “A retribuição ilíquida a auferir pela/o segunda/o contraente é fixada em € 935,96, paga mensalmente, sujeita aos descontos legais. A título de acréscimo salarial receberá 14,286% do seu salário base condicionado à sua assiduidade que não deverá comportar qualquer falta, à excepção das associadas à protecção da maternidade, férias e à qualidade do seu desempenho avaliado pela inexistência de qualquer reclamação, interna ou externa que seja julgada procedente. Como compensação do modo de organização do horário, receberá um acréscimo remuneratório com base nas normas dos artigos 192º e 257º, do Código do Trabalho, ou seja, a remuneração de trabalho por relação em tempos de semana em que é prestado, segundo critério análogo ao previsto no Decreto-Lei nº 62/79, de 30.03. A remuneração base e as remunerações acessórias previstas nesta cláusula têm carácter transitório até à conclusão da celebração da regulamentação colectiva de trabalho entre os Hospitais E.P.E. e as respectivas associações sindicais ou até à definição dos incentivos, com base no que vier a ser proposto pela Comissão Negociadora do Ministério da Saúde, transitoriedade essa que os Contraentes reconhecem como essencial e que a sua Segunda Contraente aceita.” 6- Em Novembro de 2015, os autores foram alvo de reposicionamento remuneratório em € 1.201,48, com retroactivos ao mês de Outubro de 2015; 7- Desde 01.01.2013 e até Outubro de 2015, os autores auferiam € 998,08. 8- Os autores/enfermeiros trabalham 40 horas semanais; 9- A ré procedeu ao reposicionamento por via de indexação remuneratória dos demais enfermeiros a exercerem funções e com a relação jurídica constituída por contrato de trabalho em funções públicas, fixando-se pelo menos a partir de Janeiro de 2013 o vencimento de todos eles em € 1.201,48; 10- Os autores exercem de igual modo funções de enfermagem; 11- Os autores assumem semelhantes responsabilidades e possuem o mesmo, ou até mais tempo de serviço; 12- Trabalham 40 horas semanais e com as mesmas qualificações profissionais que os demais enfermeiros ao serviço do réu, integrados no Sistema Nacional de Saúde; 13- Com excepção dos trabalhadores M. E., O. I., P. F. e S. R., relativamente aos demais trabalhadores, dos respectivos contratos de trabalho resulta, na cláusula 7.ª, um prémio de assiduidade de natureza não regular, correspondente a 14,286% da retribuição ilíquida auferida, no montante de € 171,64, a ser vencido sempre que, no desempenho das suas funções, os autores preencham na totalidade os critérios de assiduidade, conforme descrito no ponto 5 supra. 14- Aquando da actualização ocorrida em Outubro de 2015, os autores viram-se privados do prémio de assiduidade. 15- São sindicalizados os autores: 1- A. C., 2- A. B., 3- A. M., 4- C. C., 5- C. A., 6- C. L., 7- C. F., 8- C. D., 9- C. M. S., 10- E. R., 11- L. S., 12- L. C., 13- L. A., 14- M. J., 15- M. E., 16- M. A., 17- N. M., 18- O. C., 19- P. A. C., 20- P. N., 21- R. M., 22- R. S., 23- S. M., 24- S. A., 25- S. C. R., 26- S. R. A., 27- S. C. S., 28- V. R., 29- V. F., 30- C. F. M. 31- O. M.. 4. Apreciação do recurso Conforme acima enunciado, a única questão que se coloca a este tribunal é se o regime legal aplicável aos autores, ligados à ré por contrato de trabalho de direito privado, é inconstitucional na medida em que permite um tratamento distinto e alegadamente desvantajoso em matéria de remuneração e tempo de trabalho, comparativamente com os enfermeiros ligados à ré por relação pública de emprego. Isto é, e em concreto, como concluem os Apelantes, trata-se de saber se «(…) devem ser declarados inconstitucionais os artigos 1º, 2º, 4º, 5º do Dl 122/2010, o art.º 13.º do Dl 247/2009 e o art.º 17.º do Dl 248/2009, na interpretação segundo a qual o regime remuneratório e de duração e organização do tempo de trabalho contido nos diplomas se aplica subjetivamente apenas aos enfermeiros em regime de contrato de trabalho em funções públicas, permitindo-se a introdução de diferenças remuneratórias e de diferenças de horas de trabalho entre enfermeiros que exerçam funções em instituições do Serviço Nacional de Saúde apenas com base na natureza da relação de emprego.» Com efeito, a ré é uma pessoa colectiva de direito público, com a natureza de entidade pública empresarial, criada pelo DL n.º 50-A/2007, de 28/02, e submetida aos estatutos constantes do anexo do DL n.º 233/2005, de 29/12, bem como ao regime jurídico de gestão hospitalar, aprovado pela Lei n.º 27/2002, de 08/11. Ora, as entidades públicas empresariais foram excluídas do âmbito de aplicação da Lei n.º 12-A/2008, de 27/02, que estabeleceu os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas, e da Lei n.º 35/2014, de 20/06, que aprovou a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, actualmente em vigor, com ressalva dos trabalhadores que já tivessem a qualidade de funcionário ou agente. Assim, para estes últimos, vinculados por contrato de trabalho em funções públicas, a respectiva carreira de enfermagem, enquanto carreira especial da Administração Pública, é regulada pelo DL n.º 248/2009, de 22/09, sendo que tal regime é essencialmente caracterizado pela atribuição ao trabalhador de uma situação estatutária e regulamentar, uniformemente aplicável a todos os que pertençam a um mesmo grupo de pessoal e integrem a mesma categoria. Na sequência do disposto nos arts. 14.º e 15.º desse diploma, segundo os quais os níveis remuneratórios correspondentes às posições remuneratórias das categorias que integram a carreira especial de enfermagem do sector público – enfermeiro e enfermeiro principal – são identificados por diploma próprio, o DL n.º 122/2010, de 11/09, em conformidade com os princípios e regras consagrados na Lei n.º 12-A/2008, de 27/02, veio estabelecer, por categoria, o número de posições remuneratórias da carreira especial de enfermagem, bem como identificar os correspondentes níveis salariais. Por seu turno, o DL n.º 247/2009, de 22/09, estabeleceu o regime aplicável aos enfermeiros vinculados em regime de contrato de trabalho, nos termos do Código do Trabalho, nas entidades públicas empresariais e nas parcerias em saúde, em regime de gestão e financiamento privados, integradas no Serviço Nacional de Saúde, bem como os respectivos requisitos de habilitação profissional e percurso de progressão profissional e diferenciação técnica. No que concerne aos autores, é pacífico que todos celebraram contrato de trabalho com a ré sujeito ao regime do DL n.º 247/2009 e do Código do Trabalho, sendo certo que naquela trabalham também enfermeiros integrados no Sistema Nacional de Saúde mediante contrato de trabalho em funções públicas, a quem são aplicáveis o DL n.º 248/2009 e o DL n.º 122/2010. Ora, por um lado, resulta dos autos que a ré se limita a aplicar cada um dos regimes jurídicos indicados aos enfermeiros visados pelos respectivos âmbitos de aplicação, pelo que, no que toca aos autores, não está em causa o incumprimento do contrato ou da lei ou uma prática discriminatória livremente assumida pela ré, sendo despicienda para a solução do presente litígio a jurisprudência invocada pelos Apelantes produzida em situações em que, ao contrário do que sucede na que nos ocupa, as condutas do empregador não estavam autorizadas ou impostas por lei expressa. Deste modo, como se começou por dizer, no presente recurso importa tão somente apreciar a procedibilidade do pedido dos autores à luz da invocada inconstitucionalidade dos regimes jurídicos indicados, na medida em que permitem um tratamento distinto e alegadamente desvantajoso para os enfermeiros vinculados por contrato de trabalho de direito privado, em matéria de remuneração e tempo de trabalho, comparativamente com os enfermeiros vinculados por relação pública de emprego. Vejamos, então. Estabelece o art. 13.º da Constituição da República Portuguesa, sob a epígrafe «Princípio da igualdade»: 1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei. 2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual. Por seu turno, dispõe o art. 59.º, com a epígrafe «Direitos dos trabalhadores»: 1. Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito: a) À retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna; b) A organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da actividade profissional com a vida familiar; c) (…) d) Ao repouso e aos lazeres, a um limite máximo da jornada de trabalho, ao descanso semanal e a férias periódicas pagas; (…) Em conformidade, prevê o art. 270.º do Código do Trabalho que na determinação do valor da retribuição deve ter-se em conta a quantidade, natureza e qualidade do trabalho, observando-se o princípio de que, para trabalho igual ou de valor igual, salário igual. Estabelece, ainda, com pertinência para o caso, esse diploma legal: Artigo 23.º Conceitos em matéria de igualdade e não discriminação 1 - Para efeitos do presente Código, considera-se: a) Discriminação directa, sempre que, em razão de um factor de discriminação, uma pessoa seja sujeita a tratamento menos favorável do que aquele que é, tenha sido ou venha a ser dado a outra pessoa em situação comparável; b) Discriminação indirecta, sempre que uma disposição, critério ou prática aparentemente neutro seja susceptível de colocar uma pessoa, por motivo de um factor de discriminação, numa posição de desvantagem comparativamente com outras, a não ser que essa disposição, critério ou prática seja objectivamente justificado por um fim legítimo e que os meios para o alcançar sejam adequados e necessários; c) Trabalho igual, aquele em que as funções desempenhadas ao serviço do mesmo empregador são iguais ou objectivamente semelhantes em natureza, qualidade e quantidade; d) Trabalho de valor igual, aquele em que as funções desempenhadas ao serviço do mesmo empregador são equivalentes, atendendo nomeadamente à qualificação ou experiência exigida, às responsabilidades atribuídas, ao esforço físico e psíquico e às condições em que o trabalho é efectuado. 2 - Constitui discriminação a mera ordem ou instrução que tenha por finalidade prejudicar alguém em razão de um factor de discriminação. Artigo 24.º Direito à igualdade no acesso a emprego e no trabalho 1 - O trabalhador ou candidato a emprego tem direito a igualdade de oportunidades e de tratamento no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção ou carreira profissionais e às condições de trabalho, não podendo ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão, nomeadamente, de ascendência, idade, sexo, orientação sexual, identidade de género, estado civil, situação familiar, situação económica, instrução, origem ou condição social, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência, doença crónica, nacionalidade, origem étnica ou raça, território de origem, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas e filiação sindical, devendo o Estado promover a igualdade de acesso a tais direitos. 2 - O direito referido no número anterior respeita, designadamente: a) A critérios de selecção e a condições de contratação, em qualquer sector de actividade e a todos os níveis hierárquicos; (…) c) A retribuição e outras prestações patrimoniais, promoção a todos os níveis hierárquicos e critérios para selecção de trabalhadores a despedir; (…) Artigo 25.º Proibição de discriminação 1 - O empregador não pode praticar qualquer discriminação, directa ou indirecta, em razão nomeadamente dos factores referidos no n.º 1 do artigo anterior. (…) 5 - Cabe a quem alega discriminação indicar o trabalhador ou trabalhadores em relação a quem se considera discriminado, incumbindo ao empregador provar que a diferença de tratamento não assenta em qualquer factor de discriminação. (…) Assim, por um lado, como esclarece João Leal Amado, “[e]m termos gerais, parece adquirida a afirmação de que com tal princípio não se visa alcançar um qualquer igualitarismo extremo. O que este princípio proíbe não é a diferenciação salarial, mas sim a discriminação salarial, ou seja, a diferenciação injustificada, baseada, p. ex., em factores como o sexo, a raça, a nacionalidade, a religião, as convicções políticas, etc. Já constituem fundamento bastante para a diferenciação e títulos legitimadores da mesma os factores ligados à distinta quantidade (duração ou intensidade, p. ex.), natureza (dificuldade ou penosidade, p. ex.) e qualidade (mérito ou produtividade, p. ex.) do trabalho prestado. Há, pois, diferenças admissíveis e diferenças inadmissíveis, traduzindo-se o princípio da igualdade de tratamento na exigência de um fundamento material para a diferenciação salarial. O que aqui se proíbe, repete-se, são desde logo as práticas discriminatórias, são as distinções desprovidas de uma justificação razoável e aceitável (bem como, acrescente-se, o tratamento indiferenciado de situações objectivamente desiguais). Sublinhe-se, no entanto, que o princípio da igualdade retributiva não compreende apenas um conteúdo negativo (a proibição de discriminações) mas comporta também uma vertente positiva, reclamando a igualdade substantiva de tratamento dos trabalhadores que prestam o mesmo tipo de trabalho (trabalho igual ou de valor igual), aferido este pelos critérios da quantidade, natureza e qualidade, critérios objectivos e sufragados pela CRP. Proibição do arbítrio, proibição de discriminação e obrigação de diferenciação, eis, na lição de Gomes Canotilho e Vital Moreira, as principais dimensões do princípio constitucional da igualdade.” (1) Por outro lado, consagra-se “(…) uma regra geral de inversão do ónus da prova, ao arrepio do regime geral do art. 342.º do CC. (…) Trata-se de um preceito com uma importância extrema: provar que uma exclusão teve por fundamento o sexo, a raça, as convicções religiosas ou políticas do trabalhador lesado constitui um óbice quase intransponível. A utilização das regras gerais em matéria do ónus da prova afigura-se, neste domínio, claramente insuficiente. À luz deste preceito, cabe ao empregador a prova de que a exclusão ou o tratamento desvantajoso conferido ao trabalhador ou ao candidato a emprego não é irrazoável, arbitrário e discriminatório, tendo uma justificação plausível.” (2) Assim, no que respeita ao ónus da prova, valem as regras que, com clareza, foram enunciadas no sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1 de Junho de 2017, proferido no âmbito do processo n.º 816/14.0T8LSB.L1.S1, com o seguinte teor (3): “1. O Código do Trabalho ao estabelecer critérios de determinação da retribuição refere que na determinação do valor da mesma deve ter-se em conta a quantidade, natureza e qualidade do trabalho, observando-se o princípio de que, para trabalho igual ou de valor igual, salário igual. 2. O art.º 24.º, do mesmo diploma legal, consagra o direito à igualdade no acesso a emprego e no trabalho, elencando, de forma exemplificativa, fatores suscetíveis de causar discriminação, tais como a ascendência, idade, sexo, orientação sexual, identidade de género, estado civil, situação familiar, situação económica, instrução, origem ou condição social, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência, doença crónica, nacionalidade, origem étnica ou raça, território de origem, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas e filiação sindical. 3. Quando as situações referidas são invocadas como fatores de discriminação, nomeadamente, no plano retributivo, o legislador, no n.º 5, do art.º 25, do diploma legal referido, estabelece um regime especial de repartição do ónus da prova, em que afastand‑se da regra geral, prevista no art.º 342.º, n.º 1, do Código Civil, estipula uma inversão do ónus da prova, impondo que seja o empregador a provar que a diferença de tratamento não assenta em qualquer fator de discriminação. 4. Já quando for alegada violação do princípio do trabalho igual salário igual, sem que tenha sido invocado quaisquer factos suscetíveis de serem inseridos nas categorias do que se pode considerar fatores de discriminação, cabe a quem invocar o direito fazer a prova, nos termos do mencionado art.º 342.º, n.º 1, dos factos constitutivos do direito alegado, não beneficiando da referida presunção. 5. Para que se pudesse concluir que ocorreu violação do princípio para trabalho igual salário igual, seria necessário que o trabalhador tivesse alegado e demonstrado factos reveladores de uma prestação de trabalho ao serviço do empregador, como chefe de equipa do tratamento, nível 4, que fosse não só de igual natureza, mas também de igual qualidade e quantidade que a dos seus colegas de trabalho com a mesma categoria profissional, o que não aconteceu.” Retornando ao caso dos autos, verifica-se que os autores invocaram discriminação salarial e em matéria de duração do tempo de trabalho relativamente aos seus colegas de trabalho sujeitos a relação pública de emprego, mas em sentido impróprio, ou seja, sem ser naquele que é utilizado pela lei, designadamente, para efeitos do especial regime de prova, pois não invocaram que o tratamento desigual por parte da ré assente em ascendência, idade, sexo, orientação sexual, identidade de género, estado civil, situação familiar, situação económica, instrução, origem ou condição social, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência, doença crónica, nacionalidade, origem étnica ou raça, território de origem, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas, filiação sindical ou outra categoria subjectiva que comungue de idêntico desvalor ético ou social. Na verdade, o contrato de trabalho de direito privado e o contrato de trabalho em funções públicas são fontes de relações jurídicas tuteladas pela Constituição e pela Lei de modos que diferem em função da natureza do vínculo e do empregador, e não duma hierarquização do valor ético ou social dos respectivos trabalhadores ou do trabalho prestado por uns e outros, gozando ambas as situações de idêntica dignidade à face da Constituição e da Lei. Assim, não estando em causa a invocação de tratamento discriminatório em sentido próprio, tal como definido e entendido nos arts. 23.º, n.º 1, als. a) e b), 24.º, n.º 1 e 25.º, n.ºs 1 e 5 do Código do Trabalho, mas a violação do princípio do trabalho igual salário igual, cabia aos autores demonstrar, nos termos do art. 342.º, n.º 1, do Código Civil, os factos constitutivos do direito alegado, não beneficiando da presunção aludida. Ora, independentemente de quaisquer situações concretas e individualizadas, que nem se discutiram, parece-nos pacífico na economia dos autos que o trabalho dos enfermeiros autores não é inferior em natureza, qualidade e quantidade ao dos enfermeiros vinculados por contrato de trabalho em funções públicas que também prestam a sua actividade na ré. O que é controverso é que o tratamento diferenciado de uns e outros seja efectiva e injustificadamente desvantajoso no que toca aos autores, considerando as respectivas condições globais de prestação do trabalho. Na verdade, o princípio constitucional da igualdade não significa uma exigência de igualdade absoluta em todas as situações, nem proíbe diferenciações de tratamento. Como ensinam Gomes Canotilho e Vital Moreira, “[o] que se exige é que as medidas de diferenciação sejam materialmente fundadas sob o ponto de vista da segurança jurídica, da proporcionalidade, da justiça, da praticabilidade e da solidariedade e não se baseiem em qualquer motivo constitucionalmente impróprio. As diferenciações de tratamento podem ser legítimas quando: a) - se baseiam numa distinção objectiva de situações; b) - não se fundamentam em qualquer dos motivos indicados no n.º 2 do art. 13º; c) - tenham um fim legítimo segundo o ordenamento constitucional positivo; d) – se revelem necessárias, adequadas e proporcionadas à satisfação do seu objectivo.” (4) Ora, a questão do tratamento diferenciado de enfermeiros vinculados por contrato de trabalho de direito privado e por contrato de trabalho em funções públicas, ao abrigo dos regimes jurídicos acima identificados, no âmbito do mesmo hospital, foi já apreciada por este Tribunal no Acórdão de 7 de Dezembro de 2017, proferido no processo n.º 2423/16.4T8BRG.G1, em que intervieram como adjuntos a ora Relatora e o ora 1.º Adjunto, não havendo alteração de facto ou de direito que importe a modificação da posição aí assumida. Aí se refere, na sequência de considerações semelhantes às acabadas de expender: “Importa portanto saber se este fundamento de distinção, relação jurídica de emprego público/contrato individual de trabalho, esta razão para a diferenciação constitui ou não fundamento material razoável, se constitui condição diferenciadora atendível. Importa previamente referir que a entidade gestora apenas pode contratar recorrendo ao regime privado. Os trabalhadores com relação jurídica de emprego público recebeu-os ela da anterior gestora (gestão pública), ou admiti-los-á com essa relação mediante os mecanismos de mobilidade, porque já vinculados com referência à data da Transmissão do Estabelecimento Hospitalar, nos termos acordados no contrato de gestão, obrigando-se mediante este. (…) A manutenção de trabalhadores com relação jurídica de emprego público resulta desta obrigação contratual, a admissão de novos trabalhadores será sempre em moldes privados, pois que os vinculados por relação jurídica de emprego publico só mediante a utilização dos instrumentos de mobilidade podem vir a prestar serviço na ré, e apenas se à data da Transmissão do Estabelecimento Hospitalar já tinham esse vínculo. (…) Resulta assim que a ré não atribuiu, de “motu próprio”, aos trabalhadores de referência condições superiores aos autores, antes se vê obrigada a garantir essas condições por força do contrato de gestão celebrado e por virtude, digamos, da irredutibilidade do “estatuto” daqueles. Aqueles trabalhadores, mais que do quadro da ré, pertencem aos “quadros de pessoal das instituições e serviços integrados no Serviço Nacional de Saúde”, podendo mudar de acordo com as regras da mobilidade. Exercem funções na ré por força do contrato de gestão, não perdendo o vínculo que possuem. A ré recebe o seu trabalho, mas a sua vinculação a esta é limitada ao necessário à prestação do trabalho. Note-se que a ré, detendo algum poder disciplinar, não tem o poder expulsivo, nem obrigações ao nível da reforma. Não é pois a ré que concede aqueles níveis remuneratórios ou outras particularidades do estatuto, designadamente relativos à carreira, antes reconhece porque contratualmente obrigada, aqueles níveis e demais consequências ao nível da relação, que resultam das normas fixadas pelo Estado para os seus trabalhadores no SNS com relação jurídica de emprego público. O critério diferenciador é objetivo e atendível. Ocorreu uma alteração de monta na estrutura de gestão, o que demandou necessariamente um reajustamento desta, designadamente ao nível da contratação, com repercussões várias, designadamente ao nível remuneratório. Ponto é que a ré ao contratar, e relativamente aos demais aspetos que dependem de atuação e iniciativa sua, e não estejam necessariamente determinados pelo estatuto dos trabalhadores com vínculo de emprego publico, não procede a descriminações. Limitar o parceiro privado, agora gestor, além do que a lei exige, a critérios anteriormente seguidos, não só limitaria a liberdade de empresa, como poderia volver-se contraproducente, inutilizando em parte os intentos do novo modelo. (…) Assim a contratação em moldes privados e com outros níveis remuneratórios e nestas circunstâncias (em que os trabalhadores de referência recebem mais apenas por força da garantia do seu estatuto de “emprego publico”), não teve como critério qualquer circunstância que possa considerar-se discriminativa. Já se contratar com remunerações diversas o problema se porá, mas tal não vem invocado.” Com efeito – não é demais sublinhar –, o princípio da igualdade no trabalho, designadamente em matéria de retribuição, faz apelo a uma igualdade material (deve tratar-se de igual modo o que é essencialmente igual e de forma desigual o que é desigual), que, in casu, não se verifica. Em primeiro lugar, é pressuposto essencial que esteja em causa o mesmo empregador, o que não ocorre verdadeiramente, uma vez que o mesmo se corporiza na entidade pública empresarial, no caso dos enfermeiros vinculados por contrato de trabalho de direito privado, e no Estado (em sentido amplo), no caso dos enfermeiros vinculados por contrato de trabalho em funções públicas. O hospital com natureza de entidade pública empresarial apenas pode admitir enfermeiros mediante contrato de trabalho a que se aplica o Código do Trabalho e legislação complementar, incluindo o mencionado DL n.º 247/2009, de 22/09, bem como os instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho que existam, imperando os princípios da autonomia privada e colectiva. Já os enfermeiros vinculados por contrato de trabalho em funções públicas, pertencentes ao quadro de pessoal do Serviço Nacional de Saúde, podem prestar a respectiva actividade em hospital com natureza de entidade pública empresarial apenas por força de obrigações impostas a este perante o Estado, imperando o princípio da legalidade. Assim, desde logo em matéria retributiva, o art. 13.º do DL n.º 247/2009 remete para os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, o que permite que sejam acordados salários mais altos ou mais baixos do que os fixados legalmente para os enfermeiros que exercem funções no âmbito de contratos de trabalho em funções públicas, tudo dependendo das negociações entre as entidades que representam os empregadores e os trabalhadores. Acresce que os enfermeiros com contrato de trabalho em funções públicas são sujeitos a um regime de ingresso e progressão, bem como de incompatibilidades e mobilidade geográfica e funcional, que se têm como mais fortemente constrangedores da liberdade de acesso e exercício da actividade profissional. Também os regimes disciplinar e de férias, feriados, faltas e licenças são distintos, o mesmo sucedendo com outros aspectos. Deste modo, não obstante a perspectiva de progressiva aproximação de regimes, os mesmos mantêm distinções determinadas por diferente peso de direitos e deveres, cujo equilíbrio soçobraria pela pretensão de alcançar «o melhor de dois mundos». Acresce que, como decorre de todo o exposto, a sobrevivência do contrato de trabalho em funções públicas no âmbito de entidades públicas empresariais é vista legalmente como residual e transitória, não fazendo sentido que possa constituir a situação de referência dos trabalhadores admitidos ao abrigo do regime legalmente estabelecido como regra. Por todo o exposto, não se verifica a alegada inconstitucionalidade e, consequentemente, improcede o recurso. 5. Decisão Nestes termos, acorda-se em julgar a apelação improcedente e em confirmar a sentença recorrida. Custas pelos Apelantes. Guimarães, 17 de Dezembro de 2018 (Alda Martins) (Eduardo Azevedo) (Vera Sottomayor) Sumário (elaborado pela Relatora): I – O princípio da igualdade no trabalho, designadamente em matéria de retribuição, faz apelo a uma igualdade material (deve tratar-se de igual modo o que é essencialmente igual e de forma desigual o que é desigual), que não se verifica no caso de enfermeiros vinculados por contrato de trabalho de direito privado e por contrato de trabalho em funções públicas, a prestar trabalho na mesma entidade pública empresarial. II – Em primeiro lugar, é pressuposto essencial que esteja em causa o mesmo empregador, o que não ocorre verdadeiramente, uma vez que o mesmo se corporiza na entidade pública empresarial, no caso dos enfermeiros vinculados por contrato de trabalho de direito privado, e no Estado (em sentido amplo), no caso dos enfermeiros vinculados por contrato de trabalho em funções públicas. III – O hospital com natureza de entidade pública empresarial apenas pode admitir enfermeiros mediante contrato de trabalho a que se aplica o Código do Trabalho e legislação complementar, incluindo o DL n.º 247/2009, de 22/09, bem como os instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho que existam, imperando os princípios da autonomia privada e colectiva. III – Já os enfermeiros vinculados por contrato de trabalho em funções públicas, pertencentes ao quadro de pessoal do Serviço Nacional de Saúde, podem prestar a respectiva actividade em hospital com natureza de entidade pública empresarial apenas por força de obrigações impostas a este perante o Estado, imperando o princípio da legalidade. IV – Assim, desde logo em matéria retributiva, o art. 13.º do DL n.º 247/2009 remete para os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, o que permite que sejam acordados salários mais altos ou mais baixos do que os fixados legalmente para os enfermeiros que exercem funções no âmbito de contratos de trabalho em funções públicas, tudo dependendo das negociações entre as entidades que representam os empregadores e os trabalhadores. V – Acresce que os enfermeiros com contrato de trabalho em funções públicas são sujeitos a um regime de ingresso e progressão, bem como de incompatibilidades e mobilidade geográfica e funcional, que se têm como mais fortemente constrangedores da liberdade de acesso e exercício da actividade profissional, sendo também distintos os regimes disciplinar, de férias, feriados, faltas e licenças, etc.. VI – Deste modo, não obstante a perspectiva de progressiva aproximação de regimes, os mesmos mantêm distinções determinadas por diferente peso de direitos e deveres, cujo equilíbrio soçobraria pela pretensão de alcançar «o melhor de dois mundos». VII – Acresce que a sobrevivência do contrato de trabalho em funções públicas no âmbito de entidades públicas empresariais é vista legalmente como residual e transitória, não fazendo sentido que possa constituir a situação de referência dos trabalhadores admitidos ao abrigo do regime legalmente estabelecido como regra. (Alda Martins) 1. Contrato de Trabalho, Coimbra Editora, 2009, pp. 307-308. 2. Pedro Romano Martinez et al, Código do Trabalho Anotado, Almedina, 2005, pp. 122-123. 3. Disponível em www.dgsi.pt. 4. Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª ed., pp. 127-128.