I - Não se considera justificada a falta do arguido nos serviços do MP, para interrogatório, na data que lhe foi previamente comunicada, se o mesmo não comunicou a impossibilidade de comparecimento, nos termos do art. 117º, n.º 2 do CPP. II - Não basta, assim, a existência de um motivo justificativo da impossibilidade de comparecimento, comunicado fora do prazo legal e desacompanhado dos respectivos elementos de prova.
Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto 1. Relatório B....., arguido no processo de inquérito n.º ../03, inconformado com a decisão que o condenou na multa de 2 UC, por não ter comparecido nos Serviços do MP da Comarca de Lamego, no dia 11/06/04, recorreu para este Tribunal da Relação, formulando as seguintes conclusões: 1 – O arguido tem o direito constitucional a escolher defensor e a fazer-se acompanhar por advogado em todos os actos que lhe digam respeito e perante qualquer autoridade; 2 – A falta de advogado constituído, impedido em serviço com outras diligências, é motivo de adiamento de interrogatório de arguido, devendo ser designada outra data para a sua realização; 3 – A ausência anunciada pelo arguido de que a data designada não era compatível com a agenda de qualquer dos seus advogados e a indicação de datas alternativas para a sua realização, é motivo justificativo bastante, pelo que não deve o mesmo ser condenado em multa. O M.P. na 1ª instância respondeu à motivação do recurso, pugnando pela manutenção da decisão recorrida, sublinhando, além do mais, que nem sequer foram concretizadas as alegadas dificuldades de agenda, designadamente quanto à impossibilidade de comunicação atempada da impossibilidade de comparência. Nesta Relação o Ex.mo Procurador-geral Adjunto emitiu parecer no sentido do recurso não merecer provimento. Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência para julgamento. 2. Fundamentação 2.1. Matéria de facto Com interesse para o julgamento do presente recurso, são relevantes os seguintes factos e ocorrências processuais: a) Datada de 21/05/2004, foi remetida ao arguido a notificação para comparecer, nessa qualidade, nos serviços do M.P. de Lamego, no dia 11-06-2004, às 10,30 horas, com a seguinte advertência: “…caso falte e não justifique a falta no prazo legal (por motivo previsível: com cinco dias de antecedência; por motivo imprevisível: no dia e hora designados – art. 117º, n.º 2 do C.P.Penal), fica sujeito ao pagamento de uma soma entre 2 e 10 UC (UC= € 89,00) …”. b) Em 9 de Junho de 2004, o arguido, através do seu advogado, apresentou um requerimento (fls. 26) onde, além do mais, informava “que não prescinde do direito de se fazer acompanhar por defensor, sendo certo que, nesse dia, nenhum dos seus advogados, por dificuldades de agenda, pode estar presente. Pelo que requer que seja dada sem efeito a diligência, designando-se nova data para a sua realização, propondo-se como datas alternativas, as seguintes: 7, 9, 12, 13, 14 e 15 de Julho”; c) Em 16-06-04 o M.P. proferiu o despacho constante de fls. 29 e segs., onde referiu, além do mais: “Notificado que foi regular e pessoalmente B..... para comparecer nos Serviços do MP no dia 11/06/04, pelas 10h.30m. (…) não compareceu (…) Assim, promovo que seja condenado no pagamento de duas UCs (vd. art. 116º, n.º 1 do CPP ”. d) A M.ª Juiz de Instrução proferiu então o despacho recorrido, do seguinte teor: “Uma vez que apesar de regularmente convocado para comparecer nos serviços do M.P. no pretérito dia 11/06/04, pelas 10 h 30 m, pese embora ter apresentado requerimento a solicitar o adiamento por impedimento de comparência dos seus mandatários, sem que fosse adiada a diligência, a que acresce a circunstância de o impedimento dos ilustres mandatários não ser impedimento para a realização de diligências em sede de inquérito não se tem a sua falta por justificada e, em consequência, condena-se o mesmo na multa de 2 UC (art. 116º do CPP). DN”. 2.2. Matéria de direito Tendo em atenção o objecto do presente recurso, a única questão a decidir é a de saber se a multa de 2 UC aplicada ao arguido, por não ter comparecido nos Serviços do MP da Comarca de Lamego, no dia 11/06/04, tem fundamento legal. O arguido entende que a sua falta deve considerar-se justificada, uma vez que tinha o direito constitucional a escolher defensor e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade (arts. 32º,3 e 20º,2 CRP) e os seus advogados, por dificuldade de agenda, não podiam estar presentes no dia e hora designados. Assim, tendo dado a conhecer esse facto ao M.P e indicado as datas alternativas, entende que justificou em termos bastantes a sua falta no dia e hora previamente designados. O M.P., por sua vez, entende que o arguido não cumpriu as formalidades legais relativas à situação de impossibilidade de comparência, não tendo, além do mais, concretizado as dificuldades de agenda, designadamente quanto “à impossibilidade de comunicação atempada da impossibilidade de comparência”. Vejamos a questão. O arguido tem o direito a escolher defensor e a ser por ele assistido em todos os actos do processo – art. 32, 2 da CRP, podendo constituir advogado em qualquer altura do processo – art. 62,1 do CPP. Tendo advogado constituído, na fase de inquérito, o arguido tem o direito a ser por ele acompanhado e assistido em todos os actos processuais, designadamente no interrogatório na qualidade de arguido (caso destes autos). Contudo, ter o direito a ser assistido pelo seu advogado constituído, não dispensa o arguido de cumprir as formalidades legais relativas à justificação da sua ausência a actos judiciais, por impedimento do seu mandatário. A justificação das faltas, em direito processual penal, tem duas componentes completamente distintas: uma, de ordem substancial, relativa ao motivo justificativo da ausência (compreendendo todas as causas materiais legalmente previstas como justificativas) e outra, de ordem formal, relativa às formalidades legais a observar, para que a falta seja justificada. Pode ocorrer (e ocorre frequentemente) que haja motivo legal para a justificação da falta e a mesma não venha a ser justificada porque, p.ex., foi apresentada fora do prazo legal. No presente caso, a argumentação do recorrente limita-se a demonstrar a existência de um motivo justificativo: a impossibilidade de comparência do seu mandatário, em conjugação com o seu direito a fazer-se assistir por ele. Ora, independentemente deste motivo ser materialmente justificativo, o certo é que não foi comunicado no prazo previsto no art. 117, n.º 2 do C.P.Penal. De acordo com tal preceito, a impossibilidade de comparecimento deve ser comunicada com 5 dias de antecedência, se for previsível e, sendo imprevisível, no dia e hora designados para o acto. Os elementos de prova da impossibilidade de comparecimento, quando previsível, devem ser apresentados com a respectiva comunicação, salvo tratando-se de impedimento imprevisível (comunicado no próprio dia e hora) caso em que, por motivo justificado, podem ser apresentados até ao 3º dia útil seguinte (art. 117º,3 CPP). No caso dos autos, os motivos justificativos da impossibilidade de comparecimento foram comunicados ao tribunal dois dias antes da data designada, desacompanhados dos respectivos elementos de prova. Deste modo, não foram cumpridas as formalidades legais (processuais) com vista à justificação da falta, pelo que não merece censura o despacho recorrido. Na parte final da sua motivação, o recorrente diz que o despacho recorrido terá violado, além do mais, os arts. 20, 2 e 32, 3 da CRP. Julgamos todavia que não há qualquer inconstitucionalidade na interpretação que acolhemos do art. 117, nºs 2 e 3 do C.P.Penal. Tal interpretação não põe em causa um processo equitativo, onde o arguido tenha o direito a ser assistido, em todas as fases do processo, por advogado por si escolhido. De facto, não foi esse, como vimos, o motivo da não justificação da falta. O motivo dessa não justificação radicou (na tese acima seguida) no incumprimento das formalidades legais (procedimentais) tendentes à justificação da falta, previstas no art. 117º, n.º 2 e 3 do CPP. Por outro lado, a exigência de prazos curtos para a justificação da falta e a imposição legal de comunicação do motivo justificativo, com uma antecedência legalmente determinada, não são exigências incomportáveis para o arguido e, no caso, tais cominações constavam expressamente da notificação. Tendo sido o arguido expressamente advertido do dever de comunicar antecipadamente o motivo justificativo da sua ausência, só a si próprio se pode imputar o incumprimento desse ónus. Assim, é equitativa e justa a consequência que a lei faz decorrer do incumprimento desse ónus, ou seja, a não justificação da falta e a respectiva condenação em multa. Improcedem, deste modo, todas as conclusões do recurso. 3.Decisão Face ao exposto, os juízes da 1ª Secção Criminal do Porto acordam em negar provimento ao recurso e, consequentemente, manter o despacho recorrido. Custas pelo recorrente, fixando a taxa de justiça em 3 UC *Porto, 20 de Abril de 2005 Élia Costa de Mendonça São Pedro António Manuel Alves Fernandes José Henriques Marques Salgueiro
Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto 1. Relatório B....., arguido no processo de inquérito n.º ../03, inconformado com a decisão que o condenou na multa de 2 UC, por não ter comparecido nos Serviços do MP da Comarca de Lamego, no dia 11/06/04, recorreu para este Tribunal da Relação, formulando as seguintes conclusões: 1 – O arguido tem o direito constitucional a escolher defensor e a fazer-se acompanhar por advogado em todos os actos que lhe digam respeito e perante qualquer autoridade; 2 – A falta de advogado constituído, impedido em serviço com outras diligências, é motivo de adiamento de interrogatório de arguido, devendo ser designada outra data para a sua realização; 3 – A ausência anunciada pelo arguido de que a data designada não era compatível com a agenda de qualquer dos seus advogados e a indicação de datas alternativas para a sua realização, é motivo justificativo bastante, pelo que não deve o mesmo ser condenado em multa. O M.P. na 1ª instância respondeu à motivação do recurso, pugnando pela manutenção da decisão recorrida, sublinhando, além do mais, que nem sequer foram concretizadas as alegadas dificuldades de agenda, designadamente quanto à impossibilidade de comunicação atempada da impossibilidade de comparência. Nesta Relação o Ex.mo Procurador-geral Adjunto emitiu parecer no sentido do recurso não merecer provimento. Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência para julgamento. 2. Fundamentação 2.1. Matéria de facto Com interesse para o julgamento do presente recurso, são relevantes os seguintes factos e ocorrências processuais: a) Datada de 21/05/2004, foi remetida ao arguido a notificação para comparecer, nessa qualidade, nos serviços do M.P. de Lamego, no dia 11-06-2004, às 10,30 horas, com a seguinte advertência: “…caso falte e não justifique a falta no prazo legal (por motivo previsível: com cinco dias de antecedência; por motivo imprevisível: no dia e hora designados – art. 117º, n.º 2 do C.P.Penal), fica sujeito ao pagamento de uma soma entre 2 e 10 UC (UC= € 89,00) …”. b) Em 9 de Junho de 2004, o arguido, através do seu advogado, apresentou um requerimento (fls. 26) onde, além do mais, informava “que não prescinde do direito de se fazer acompanhar por defensor, sendo certo que, nesse dia, nenhum dos seus advogados, por dificuldades de agenda, pode estar presente. Pelo que requer que seja dada sem efeito a diligência, designando-se nova data para a sua realização, propondo-se como datas alternativas, as seguintes: 7, 9, 12, 13, 14 e 15 de Julho”; c) Em 16-06-04 o M.P. proferiu o despacho constante de fls. 29 e segs., onde referiu, além do mais: “Notificado que foi regular e pessoalmente B..... para comparecer nos Serviços do MP no dia 11/06/04, pelas 10h.30m. (…) não compareceu (…) Assim, promovo que seja condenado no pagamento de duas UCs (vd. art. 116º, n.º 1 do CPP ”. d) A M.ª Juiz de Instrução proferiu então o despacho recorrido, do seguinte teor: “Uma vez que apesar de regularmente convocado para comparecer nos serviços do M.P. no pretérito dia 11/06/04, pelas 10 h 30 m, pese embora ter apresentado requerimento a solicitar o adiamento por impedimento de comparência dos seus mandatários, sem que fosse adiada a diligência, a que acresce a circunstância de o impedimento dos ilustres mandatários não ser impedimento para a realização de diligências em sede de inquérito não se tem a sua falta por justificada e, em consequência, condena-se o mesmo na multa de 2 UC (art. 116º do CPP). DN”. 2.2. Matéria de direito Tendo em atenção o objecto do presente recurso, a única questão a decidir é a de saber se a multa de 2 UC aplicada ao arguido, por não ter comparecido nos Serviços do MP da Comarca de Lamego, no dia 11/06/04, tem fundamento legal. O arguido entende que a sua falta deve considerar-se justificada, uma vez que tinha o direito constitucional a escolher defensor e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade (arts. 32º,3 e 20º,2 CRP) e os seus advogados, por dificuldade de agenda, não podiam estar presentes no dia e hora designados. Assim, tendo dado a conhecer esse facto ao M.P e indicado as datas alternativas, entende que justificou em termos bastantes a sua falta no dia e hora previamente designados. O M.P., por sua vez, entende que o arguido não cumpriu as formalidades legais relativas à situação de impossibilidade de comparência, não tendo, além do mais, concretizado as dificuldades de agenda, designadamente quanto “à impossibilidade de comunicação atempada da impossibilidade de comparência”. Vejamos a questão. O arguido tem o direito a escolher defensor e a ser por ele assistido em todos os actos do processo – art. 32, 2 da CRP, podendo constituir advogado em qualquer altura do processo – art. 62,1 do CPP. Tendo advogado constituído, na fase de inquérito, o arguido tem o direito a ser por ele acompanhado e assistido em todos os actos processuais, designadamente no interrogatório na qualidade de arguido (caso destes autos). Contudo, ter o direito a ser assistido pelo seu advogado constituído, não dispensa o arguido de cumprir as formalidades legais relativas à justificação da sua ausência a actos judiciais, por impedimento do seu mandatário. A justificação das faltas, em direito processual penal, tem duas componentes completamente distintas: uma, de ordem substancial, relativa ao motivo justificativo da ausência (compreendendo todas as causas materiais legalmente previstas como justificativas) e outra, de ordem formal, relativa às formalidades legais a observar, para que a falta seja justificada. Pode ocorrer (e ocorre frequentemente) que haja motivo legal para a justificação da falta e a mesma não venha a ser justificada porque, p.ex., foi apresentada fora do prazo legal. No presente caso, a argumentação do recorrente limita-se a demonstrar a existência de um motivo justificativo: a impossibilidade de comparência do seu mandatário, em conjugação com o seu direito a fazer-se assistir por ele. Ora, independentemente deste motivo ser materialmente justificativo, o certo é que não foi comunicado no prazo previsto no art. 117, n.º 2 do C.P.Penal. De acordo com tal preceito, a impossibilidade de comparecimento deve ser comunicada com 5 dias de antecedência, se for previsível e, sendo imprevisível, no dia e hora designados para o acto. Os elementos de prova da impossibilidade de comparecimento, quando previsível, devem ser apresentados com a respectiva comunicação, salvo tratando-se de impedimento imprevisível (comunicado no próprio dia e hora) caso em que, por motivo justificado, podem ser apresentados até ao 3º dia útil seguinte (art. 117º,3 CPP). No caso dos autos, os motivos justificativos da impossibilidade de comparecimento foram comunicados ao tribunal dois dias antes da data designada, desacompanhados dos respectivos elementos de prova. Deste modo, não foram cumpridas as formalidades legais (processuais) com vista à justificação da falta, pelo que não merece censura o despacho recorrido. Na parte final da sua motivação, o recorrente diz que o despacho recorrido terá violado, além do mais, os arts. 20, 2 e 32, 3 da CRP. Julgamos todavia que não há qualquer inconstitucionalidade na interpretação que acolhemos do art. 117, nºs 2 e 3 do C.P.Penal. Tal interpretação não põe em causa um processo equitativo, onde o arguido tenha o direito a ser assistido, em todas as fases do processo, por advogado por si escolhido. De facto, não foi esse, como vimos, o motivo da não justificação da falta. O motivo dessa não justificação radicou (na tese acima seguida) no incumprimento das formalidades legais (procedimentais) tendentes à justificação da falta, previstas no art. 117º, n.º 2 e 3 do CPP. Por outro lado, a exigência de prazos curtos para a justificação da falta e a imposição legal de comunicação do motivo justificativo, com uma antecedência legalmente determinada, não são exigências incomportáveis para o arguido e, no caso, tais cominações constavam expressamente da notificação. Tendo sido o arguido expressamente advertido do dever de comunicar antecipadamente o motivo justificativo da sua ausência, só a si próprio se pode imputar o incumprimento desse ónus. Assim, é equitativa e justa a consequência que a lei faz decorrer do incumprimento desse ónus, ou seja, a não justificação da falta e a respectiva condenação em multa. Improcedem, deste modo, todas as conclusões do recurso. 3.Decisão Face ao exposto, os juízes da 1ª Secção Criminal do Porto acordam em negar provimento ao recurso e, consequentemente, manter o despacho recorrido. Custas pelo recorrente, fixando a taxa de justiça em 3 UC *Porto, 20 de Abril de 2005 Élia Costa de Mendonça São Pedro António Manuel Alves Fernandes José Henriques Marques Salgueiro