Processo:11/06.2TBLSD.P1
Data do Acordão: 01/06/2009Relator: M. PINTO DOS SANTOSTribunal:trp
Decisão: Meio processual:

Mostra-se ajustado fixar em € 35.000,00 a indemnização por danos não patrimoniais a um jovem de 18 anos que ficou a padecer em virtude do acidente de IPG de 20%, e que foi submetido a 4 intervenções cirúrgicas e a tratamentos, e internamentos, durante os quais suportou dores e sofrimentos consideráveis.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
M. PINTO DOS SANTOS
Descritores
ACIDENTE DE VIAÇÃO INDEMNIZAÇÃO DANOS NÃO PATRIMONIAIS
No do documento
Data do Acordão
06/02/2009
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO.
Decisão
REVOGADO EM PARTE.
Sumário
Mostra-se ajustado fixar em € 35.000,00 a indemnização por danos não patrimoniais a um jovem de 18 anos que ficou a padecer em virtude do acidente de IPG de 20%, e que foi submetido a 4 intervenções cirúrgicas e a tratamentos, e internamentos, durante os quais suportou dores e sofrimentos consideráveis.
Decisão integral
Pc. 11/06.2TBLSD.P1 – 2ª Secção
(apelação) 
_______________________
Relator: Pinto dos Santos
Adjuntos: Des. Cândido Lemos
                 Des. Marques de Castilho
***Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto:
I. Relatório:

B……………, residente em ………., …….., Guimarães, instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, destinada a exigir a responsabilidade civil emergente de acidente de viação, contra a C…………., SA (que incorporou, por fusão, a D………….., SA), com sede na ………, ….., em Lisboa, pedindo a condenação desta a pagar-lhe, a título de indemnização, a quantia de € 160.525,01 (cento e sessenta mil quinhentos e vinte e cinco euros e um cêntimo), acrescida de juros de mora, à taxa legal, a partir da citação e até efectivo e integral pagamento.
Alegou, para tal e em síntese, que, no dia 11/10/2003, foi vítima de um acidente que ocorreu na EN 106, no lugar de Cruz Nova, em Lustosa, Lousada, quando seguia como passageiro no motociclo de matrícula ..-..-OH, que este acidente ficou a dever-se a condução ilícita e culposa da condutora do veículo automóvel de matrícula ..-..-LM, segurado na ré, que desrespeitou um sinal de STOP e a regra da prioridade no acesso à via por onde circulava o OH e foi embater neste motociclo, e que do mesmo lhe advieram diversos danos patrimoniais e não patrimoniais que descreve e quer ver ressarcidos.

A ré, devidamente citada, contestou a acção, impugnando a essencialidade da materialidade fáctica alegada pelo autor, e concluiu que a acção deveria ser julgada em função da prova que viesse a ser produzida em audiência de julgamento. 

A autora replicou mantendo a posição constante da petição inicial e concluiu que a culpa pelo acidente pertenceu essencialmente à condutora do PI, seguro na ré C……….., SA. 

Foi proferido despacho saneador e foram seleccionados os factos assentes e os controvertidos - estes formando a base instrutória -, que foram objecto de reclamação por parte da ré, que obteve provimento.

Realizadas as pertinentes diligências instrutórias que incluíram a produção de prova pericial, teve lugar a audiência de discussão e julgamento, no termo da qual foi dada resposta aos quesitos da base instrutória pela forma constante do despacho de fls. 250252.

Seguiu-se a prolação de sentença – fls. 255 a 273 – que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência (além da condenação em custas, que aqui não interessa considerar), condenou a ré seguradora a pagar ao autor a quantia de € 70.146,77 (setenta mil cento e quarenta e seis euros e setenta e sete cêntimos), a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral e efectivo pagamento.

Inconformados com esta sentença, autor e ré interpuseram recursos de apelação (aos quais foi fixado o efeito meramente devolutivo), cujas motivações, constantes, respectivamente, de fls. 308 a 319 e de fls. 295 a 302, culminaram com as seguintes conclusões:
- Conclusões do autor:
“1ª - Tendo em conta a matéria dada por provada, o montante global de € 65.000,00 de indemnização fixado na sentença de que se recorre (€ 30.000 pelos danos patrimoniais - danos futuros - e de € 35.000 como compensação pelos respectivos danos não patrimoniais) está manifestamente desvalorizado. 
2ª - Desde logo, a indemnização fixada na sentença de € 30.000 pelos danos patrimoniais (danos futuros) não permite compensar o recorrente, lesado, dos danos em virtude da perda aquisitiva ou de trabalho, nomeadamente, por não ter tido em devida (conta) alguns aspectos concretos deste caso, como a idade jovem do recorrente quando sofreu o acidente (18 anos); a taxa de lPP de 20%, devendo aqui admitir-se que a actividade profissional deste ficou lesada em medida superior àquela percentagem, na medida em que as lesões sofridas têm incidência concreta na locomoção - note-se que o autor era operário têxtil (ramolador) e ficou com lesões físicas permanentes no antebraço direito e perna esquerda. 
3ª - Além do mais, a douta sentença não teve em devida conta que o recorrente ficou a sofrer de um prejuízo anátomo-funcional que prejudica a sua actividade em geral: 
com efeito, foi dado como provado que à data do acidente, o autor era dinâmico, alegre e trabalhador; que não tinha problemas de saúde nem qualquer deficiência motora ou estética, praticava vários desportos, entre os quais futebol, ocupando parte dos seus tempos livres com passeios de bicicleta; e que, em consequência do acidente, deixou de praticar as actividades que praticava anteriormente, como sejam jogar futebol, passeios de bicicleta, sentindo dificuldades na condução de veículos, o que lhe provoca tristeza e inibição; sendo ainda que, na sequência do acidente, (o) autor ficou com nove cicatrizes visíveis, uma na cabeça, uma na anca, três no braço direito e quatro na perna esquerda. 
4ª - Ora, estes factos, consequência directa do acidente em causa, limitam novas opções laborais e restringe(m) o incremento da actividade específica já desenvolvida, implicando previsivelmente também, pela diminuição da sua auto-suficiência, um acréscimo de despesas. 
5ª - De igual modo, entende o recorrente que o montante fixado de € 35.000 como compensação pelos respectivos danos não patrimoniais está desvalorizado, não é justo nem equilibrado, por não ter tido em devida conta as gravíssimas consequências que daquele acidente resultaram para o recorrente. Reafirmam-se aqui os seguintes factos: 
em consequência do embate, o recorrente foi projectado para o chão, ficando imobilizado na via pública e perdeu os sentidos; sofreu fractura exposta dos ossos da perna esquerda, dos ossos do antebraço direito, feridas na face, tornozelo direito e cotovelo esquerdo; desde o acidente e até Fevereiro de 2004 apenas se deslocava em cadeira de rodas; foi submetido a quatro intervenções cirúrgicas; não tinha problemas de saúde nem qualquer deficiência motora ou estética, praticava vários desportos, entre os quais futebol, ocupando parte dos seus tempos livres com passeios de bicicleta; em consequência das lesões sobrevindas, sofreu dores, bem assim com as intervenções cirúrgicas, nos períodos de internamento e com os tratamentos; com o acidente o autor sofreu abalo psíquico, chegando a recear perder a vida ou, pelo menos, algum membro do corpo como o braço direito ou a perna esquerda; nos períodos de internamento e porque se visse privado das suas actividades e da companhia de familiares e dos amigos, sentiu-se triste; e, em consequência do acidente deixou de praticar as actividades que praticava anteriormente, como sejam jogar futebol, passeios de bicicleta, sentindo dificuldades na condução de veículos, o que lhe provoca tristeza e inibição; as cirurgias a que o autor foi submetido foram efectuadas com anestesia geral e determinaram perdas de sangue, dolorosos e intensivos tratamentos e incómodos; em consequência do acidente e sequelas ficou com nove cicatrizes visíveis, uma na cabeça, uma na anca, três no braço direito e quatro na perna esquerda; esteve sujeito aos seguintes períodos de incapacidade: entre 11/10/2003 e 30/11/04 - incapacidade temporária absoluta; entre 01/12/2004 e 13/01/2005 - incapacidade temporária parcial de 50%; entre 14/01/2005 e 19/04/2005 - incapacidade temporária parcial de 20%. 
6ª - Pelo exposto, resulta assim que, ao decidir do modo como o fez, entende o recorrente que, salvo o devido respeito por diferente opinião, o Tribunal a quo não aplicou, ponderada e concretamente, os normativos consagrados nos artigos 562°, 563°, 564°, 2, 566º, 2 e 3, 496º, n° 3, 494°, todos do Código Civil. 
Nestes termos, (…), deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se a decisão recorrida, (…)”. 

- Conclusões da ré seguradora:
“1 - A ora apelante discorda do montante que o Tribunal arbitrou ao recorrido B…………… a título de danos não patrimoniais sofridos, por força do ajuizado sinistro. 
2 - Discutida a matéria de facto relevante para o apuramento da vertente do dano não patrimonial, julgou o Tribunal recorrido assentes e provados os factos descritos na sentença sob os números 6 a 14, 18 a 28 e 33 a 42 e que aqui se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais - por razões de mera economia e celeridade processuais. 
3 - Em face do entendimento sufragado e desenvolvido pela Jurisprudência mais recente do Supremo Tribunal de Justiça, parece-nos, salvo o respeito devido por opinião diversa, que em casos semelhantes ao que ora nos ocupa - mas de gravidade clínica mais relevante, vêm sendo atribuídas quantias por danos não patrimoniais inferiores às que o Tribunal recorrido entendeu fixar ao recorrido B……………. 
4 - Apesar de muito relevantes, não são os danos não patrimoniais sofridos pelo recorrido que a jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores tem entendido merecerem a tutela e a pesada compensação de 35.000,00€. 
5 - Atentemos, para exemplificar esta afirmação, no teor do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido por unanimidade em 30 de Outubro de 2008, consultável no endereço electrónico www.dqsi.pt (Proc.07B2978), que acima se transcreve no corpo das alegações. 
6 - Considerados os factos descritos nesse processo, muito semelhante ao que ora nos ocupa, o STJ entendeu - recentemente - ser justa e equilibrada, a quantia de 20.000,00€, como completa indemnização pelos danos sofridos pelo aludido lesado. 
7 - No caso acima apontado, elucidativo do actual sentido da Jurisprudência, o STJ vem atribuindo montantes inferiores ao fixado nos presentes autos, quando o lesado em acidente de viação (por culpa exclusiva de terceiro) sofreu fracturas ósseas igualmente graves às que o recorrido sofreu, traumatismos de gravidade idêntica, incapacidade parcial permanente superior à do recorrido (IPG de 40% + 5%!!!), perda de faculdades ao nível dos membros superiores, por impossibilidade de andar sem canadianas, e, finalmente, impossibilidade de exercer a sua profissão habitual e qualquer outra que implique uma actividade física normal. 
8 - A nossa Jurisprudência vem reservando a atribuição de indemnizações na ordem dos 35.000,00€, a casos que, pela sua gravidade e consequências, suplantam claramente a gravidade das lesões a que o recorrido se submeteu por força do sinistro de que foi vítima. 
9 - A recorrente entende determinante, quando se pretende indemnizar danos desta natureza de forma justa e equilibrada, que sobre esta matéria deva recair uma certa uniformidade de julgados, o que nos parece óbvio não suceder no caso vertente. 
10 - Por conseguinte, considerando os factos provados nestes autos, acima mencionados, com relevância para a fixação de uma indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pelo recorrido e considerando ainda o teor da decisão proferida recentemente pelo STJ, acima parcialmente transcrita, numa situações francamente mais relevante em termos de dano não patrimonial, 
11 - Entende a ora recorrente que a decisão aqui posta em crise ofende a equidade de forma frontal e deve ser substituída por outra, que melhor se coadune com os danos não patrimoniais sofridos pela recorrida. 
12 - Tal montante, de acordo com o conjunto da nossa Jurisprudência deve fixar-se sempre em valor próximo dos 20.000,00€, quantia que já traduz de forma muito expressiva a gravidade das lesões do recorrido e que não ofende os valores usualmente arbitrados em situações de gravidade substancialmente superior. 
13 - A decisão ora posta em crise ofende o preceituado no artigo 496 n.º 1 e 3 do Código Civil. 
Termos em que, (deve ser) dado provimento ao presente recurso (…)”. 

Não houve contra-alegações.

Foram colhidos os vistos legais.***II. Questões a apreciar e decidir:

Em atenção à delimitação decorrente das conclusões das alegações dos apelantes - art. 684º nº 3 e 690º nºs 1 e 3 do C.Proc.Civ. – e não esquecendo que nos recursos se apreciam questões e não razões ou argumentos e que não visam criar decisões sobre matéria nova, as questões que importa apreciar e decidir traduzem-se em saber:
• Se a indemnização pela IPP de que padece o autor deve ser aumentada, como este pretende.
• Se o montante fixado a título de indemnização por danos não patrimoniais deve ser alterado (para mais, pretende o demandante; para menos, sustenta a ré).***III. Factos provados:

Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos (que as partes não põem em causa nos seus recursos):
1) Em 11/10/2003, o autor seguia como passageiro do veículo motorizado de duas rodas com a matrícula ..-..-OH, conduzido por E………….., cerca das 12h, na estrada nacional 106, no Lugar de Cruz Nova, Lustosa, Lousada, no sentido Lustosa - Lousada. 
2) Do lado direito da via, atento o sentido de marcha do OH, existe um entroncamento entre a EN 106 e outra estrada de acesso à localidade de Chamistães, nesta comarca. 
3) No ponto de intersecção entre a estrada que liga a Chamistães e a EN 106, existe um sinal de STOP. 
4) Quando o condutor do OH seguia na EN 106, nas circunstâncias de tempo e lugar supra descritas, junto ao aludido entroncamento, o LM surgiu da estrada que liga a Chamistães e invadiu a faixa de rodagem por onde seguia aquele, no sentido Lustosa - Lousada, embatendo com a frente e parte lateral do lado esquerdo na parte lateral do lado direito no OH. 
5) A ré assumiu a responsabilidade do seu segurado pela verificação do embate.
6) Em 12/12/2004, o autor foi submetido a uma intervenção cirúrgica para extracção de fixador e gesso e a tratamento cirúrgico da pseudartrose dos ossos do antebraço (cúbito e rádio), a qual ocorreu como consequência directa e necessária dos danos físicos sobrevindos em consequência do acidente. 
7) Em 26/04/2004, o autor tirou os pontos decorrentes da cirurgia mencionada em 6), permanecendo com gesso brânquia-palmar. 
8) Em 09/03/2004, tirou o gesso e fez raios-X pseudartrose da tíbia e perónio para encavilhamento rimado e aparafusado. 
9) Em 26/03/2004, o autor regressou aos serviços médicos onde foi operado a fim de ser submetido a nova intervenção cirúrgica de pseudartrose, encavilhamento + OTM perónio + enxerto. 
10) Em 01/06/2004, o autor voltou aos serviços clínicos da ré para nova intervenção cirúrgica a fim de proceder à extracção de parafuso proximal da tíbia, onde regressou para tirar os pontos em 07/06/2004. 
11) Por solicitação dos serviços clínicos da ré, desde 08/07/2004 o autor realizou tratamentos de fisioterapia para recuperação numa clínica especializada na cidade de Vizela. 
12) No início do mês de Outubro, o autor voltou a ser submetido a nova intervenção cirúrgica para tirar parafuso distal e OTM do perónio, tirando os pontos em 14/10/2004. 
13) Em 24/03/2005, o autor foi submetido a nova intervenção cirúrgica para extracção do material colocado no antebraço direito e perna esquerda. 
14) O autor passou, assim, 566 dias, entre 11/10/2003 e até à alta médica em 19/04/2005, em internamentos. tratamentos e consultas médicas.
15) A segurança social concedeu ao autor subsídio de doença no valor de € 2.844,55, relativo ao período compreendido entre 11/10/2003 e 14/10/2004. 
16) A responsabilidade civil por danos causados a terceiros decorrentes da circulação do veículo com a matrícula ..-..-LM, encontrava-se transferida em Outubro de 2003 para a D……………., incorporada por fusão na C………………., SA.
17) Em consequência do embate o autor foi projectado para o chão, ficando imobilizado na via pública e perdendo os sentidos.
18) E, em consequência do embate, o autor sofreu fractura exposta dos ossos da perna esquerda, dos ossos do antebraço direito, feridas na face, tornozelo direito e cotovelo esquerdo. 
19) Logo após o acidente, foi socorrido no local por equipa médica do INEM e transportado para a urgência do Hospital Padre Américo, onde esteve internado cerca de duas horas, sujeito a exames médicos e medicação. 
20) De seguida, foi transferido para o Hospital da Senhora da Oliveira, em Guimarães, onde permaneceu internado e em regime de observações no serviço de ortopedia durante cerca de um mês. 
21) No decurso daquele mês, o autor foi submetido a duas intervenções cirúrgicas de osteossíntese ao antebraço direito e perna esquerda, sendo submetido a tratamentos médicos às feridas na face e cabeça. 
22) Desde o acidente e até Fevereiro de 2004, o autor apenas se deslocou em cadeira de rodas. 
23) O autor foi submetido a quatro intervenções cirúrgicas devido às lesões decorrentes do acidente. 
24) Após a realização da cirurgia efectuada em 26/03/2004, o autor permaneceu imobilizado cerca de um mês, em total repouso, só tirando os pensos em 15/04/2004. 
25) O autor começou a fazer fisioterapia. 
26) Nos períodos de tempo que mediaram entre as diversas intervenções cirúrgicas o autor dirigia-se diariamente aos serviços clínicos da ré, na cidade do Porto, por indicação destes, em ordem a ser observado e aconselhado sobre o evoluir do seu estado clínico. 
27) Em consequência das lesões sobrevindas ao autor em consequência do acidente, este ficou a padecer das sequelas mencionadas no documento de fls. 4. 
28) O autor ficou com uma incapacidade permanente geral fixável em 20%.
29) Se o autor tivesse trabalhado naquele período de tempo, teria recebido € 1.095,55 relativos a parte do vencimento do mês de Outubro a Dezembro de 2003; € 5.376,00 referentes aos salários do ano de 2004 e € 1.395,68 correspondentes ao ano de 2005, até à data da alta médica, com os proporcionais de subsídio de férias e de Natal. 
30) À data do acidente o autor exercia funções de aprendiz de ramolador, com o vencimento mensal ilíquido de € 320,94, acrescido de prémio de produtividade de € 29,62 e subsídio de alimentação de € 33,60. 
31) Em consequência das ausências determinadas pelas lesões e tratamentos provocados pelo acidente, a entidade patronal do autor fez cessar a relação contratual em 01/09/2004. 
32) Do total das despesas médicas suportadas pelo autor, e a que se reportam os docs. 12 a 24 juntos com a petição inicial, a ré só ainda não pagou a quantia de € 124,09.
33) O autor nasceu a 16/05/1985. 
34) À data do acidente era dinâmico, alegre e trabalhador. 
35) Não tinha problemas de saúde nem qualquer deficiência motora ou estética, praticava vários desportos entre os quais futebol, ocupando parte dos tempos livres com passeios de bicicleta.
36) Em consequência das lesões sobrevindas, o autor sofreu dores, bem assim com as intervenções cirúrgicas, nos períodos de internamento e com os tratamentos. 
37) Com o acidente o autor sofreu abalo psíquico, chegando a recear perder a vida ou, pelo menos, algum membro do corpo como o braço direito ou a perna esquerda, nos períodos de internamento e porque se visse privado das suas actividades e da companhia de familiares e dos amigos, sentiu-se triste. 
38) E, em consequência do acidente, deixou de praticar as actividades que praticava anteriormente, como sejam jogar futebol, passeios de bicicleta, sentindo dificuldades na condução de veículos, o que lhe provoca tristeza e inibição.
39) As cirurgias a que o autor foi submetido foram efectuadas com anestesia geral e determinaram perdas de sangue, tratamentos dolorosos e intensivos e incómodos. 
40) Em consequência do acidente e sequelas, o autor ficou com nove cicatrizes visíveis, (sendo) uma na cabeça, uma na anca, três no braço direito e quatro na perna esquerda. 
41) Em consequência do acidente, o autor esteve sujeito aos seguintes períodos de incapacidade: 
Entre 11/10/2003 e 30/11/2004 - incapacidade temporária absoluta; 
Entre 01/12/2004 e 13/01/2005 - incapacidade temporária parcial de 50%;
Entre 14/01/2005 e 19/04/2005 – incapacidade temporária parcial de 20%.
42) Tratamentos estes que, durante vários meses, foram feitos diariamente e obrigava(m) o autor, com muito sacrifício, a deslocar-se da sua residência até à referida Clínica. ***IV. Apreciação jurídica:

1. Se a indemnização pela IPP arbitrada ao autor deve ser alterada.
Antes de entrarmos na apreciação das questões trazidas a este Tribunal pelas partes nos seus recursos, importa dizer que as mesmas não põem em causa a factologia dada como provada na 1ª instância, nem que o acidente apreciado nos autos ficou a dever-se a culpa exclusiva da condutora do veículo segurado na ré, como se decidiu na sentença recorrida. Também aceitam os montantes indemnizatórios ali fixados pelas despesas médicas que o autor suportou e pelas remunerações que deixou de auferir durante os períodos de tempo em que esteve incapacitado de exercer a sua actividade profissional em consequência do sinistro rodoviário de que foi vítima.
Em questão estão apenas os montantes indemnizatórios arbitrados a título de dano futuro, resultante da incapacidade permanente geral de que o demandante ficou afectado, e a título de compensação por danos não patrimoniais ou morais. Contra a quantia fixada pelo primeiro destes danos insurge-se o autor, pretendendo, certamente, que a mesma se aproxime da que pediu na petição inicial (€ 100.000,00). Da importância atribuída pelo segundo dano discordam ambas as partes, pugnando o autor por valor superior (na p. i. pediu € 50.000,00) e a ré por montante inferior (próximo de € 20.000,00, como refere nas conclusões das suas alegações).
Apreciemos neste item a indemnização pela IPG de que o autor ficou afectado.
Este considera que a quantia de € 30.000,00 fixada na decisão recorrida não permite compensá-lo “dos danos em virtude da perda aquisitiva ou de trabalho”, nomeadamente, por não ter tido em devida conta alguns aspectos concretos, como a sua idade à data do acidente (18 anos), a taxa de IPP de 20% de que ficou afectado, com repercussão superior na sua actividade profissional (era operário têxtil ramolador, à data do sinistro) na medida em que as lesões sofridas têm incidência concreta na locomoção e ficou com lesões físicas permanentes no antebraço direito e perna esquerda e, bem assim, por a sentença recorrida não ter tido em devida conta que ele ficou a sofrer de um prejuízo anátomo-funcional que prejudica a sua actividade em geral [conclusões 2ª a 4ª das suas alegações].

Na sentença recorrida, depois de fundamentar o direito do autor a ser indemnizado pelo dano futuro em apreço no que estabelece o nº 2 do art. 564º do CCiv., a Mma. Juíza «a quo» chamou à colação diversos acórdãos do STJ para dizer que a jurisprudência nacional tem “vindo a fazer um grande esforço de clarificação (…) visando o estabelecimento de critérios de apreciação e de cálculo dos danos que reduzam ao mínimo a margem de arbítrio e de subjectivismo dos magistrados, por forma a que as decisões, convencendo as partes devido ao seu mérito intrínseco, contribuam para uma maior certeza na aplicação do direito e para a redução da litigiosidade a proporções mais razoáveis” e acrescentou que se assentou “de forma bastante generalizada nas seguintes ideias”:
“1ª) A indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que a vítima não auferirá e que se extingue no final do período provável de vida;
2ª) No cálculo desse capital interfere necessariamente, e de forma decisiva, a equidade, o que implica que deve conferir-se relevo às regras da experiência e àquilo que, segundo curso normal das coisas, é razoável;
3ª) As tabelas financeiras por vezes utilizadas para apurar a indemnização têm um mero carácter auxiliar, indicativo, não substituindo de modo algum a ponderação judicial com base na equidade;
4ª) Deve ser proporcionalmente deduzida no cômputo da indemnização a importância que o próprio lesado gastaria consigo mesmo ao longo da vida (em média, para despesas de sobrevivência, um terço dos proventos auferidos), consideração esta que somente vale no caso de morte;
5ª) Deve ponderar-se o facto de a indemnização ser paga de uma só vez, o que permitirá ao seu beneficiário rentabilizá-la em termos financeiros; logo, haverá que considerar esses proveitos, introduzindo um desconto no valor achado, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa do lesado à custa alheia;
6ª) Deve ter-se preferencialmente em conta, mais do que a esperança média de vida activa da vítima, a esperança média de vida, uma vez que, como é óbvio, as necessidades básicas do lesado não cessam no dia em que deixa de trabalhar por virtude da reforma (em Portugal, no momento presente, a esperança média de vida dos homens já é de 73 anos, e tem tendência para aumentar; e a das mulheres chegou aos oitenta)”.
Estas são também as considerações gerais que a Jurisprudência mais recentes dos Tribunais Superiores vem apontando como critérios a ter em atenção na fixação do dano futuro decorrente de incapacidade permanente de que o lesado fica a padecer [a título meramente exemplificativo, podem citar-se, neste sentido, os acórdãos do STJ de 19/05/2009, proc. 298/06.0TBSJM.S1, de 03/03/2009, proc. 09A0009, de 22/01/2009, proc. 07B4242, de 13/01/2009, proc. 08A3747, todos in www.dgsi.pt/jstj e desta Relação do Porto de 03/05/2007, proc. 0731351, de 23/03/2006, proc. 0631053 e de 26/01/2006, proc. 0536116, todos in www.dgsi.pt/jtrp].
Como quer que seja e tem sido frisado nesses (e noutros) arestos dos mesmos Tribunais Superiores, a última ratio do cálculo da indemnização em referência é sempre a equidade, prevista nos arts. 494º e 566º nº 3 do CCiv., e não qualquer tabela (financeira) ou fórmula (matemática), a que habitualmente se recorre, já que estes métodos mais não são, sob pena de se torpedear a margem de subjectividade subjacente à referida equidade, que meros auxiliares ou coadjuvantes do julgador e que servem, essencialmente, para harmonizar as decisões indemnizatórias e evitar grandes disparidades no ressarcimento de situações similares [isto mesmo foi salientado pelo Cons. Sousa Dinis, nos seus estudos sobre o “Dano Corporal em Acidentes de Viação”, in CJ-STJ ano V, tomo 2, pgs. 11 e segs. e ano IX, tomo 1, pgs. 5 e segs., que expressamente referiu que o recurso às tabelas financeiras (o mesmo vale para as fórmulas matemáticas, adiantamos nós) não visa pôr de lado a equidade que continuará, até por imposição do art. 566º nº 3 do CCiv., a ser o critério básico de fixação deste tipo de indemnizações, acrescentando que tais tabelas são utilizadas apenas com o objectivo de tornar tais indemnizações mais justas e actuais e de evitar grandes discrepâncias entre decisões atinentes à mesma matéria; vejam-se, ainda, o Acórdão do STJ de 09/11/2006, proc. 06B3798, in www.dgsi.pt/jstj e desta Relação do Porto de 31/03/2009, proc. <a href="https://acordao.pt/decisoes/145685" target="_blank">3138/06.7TBMTS.P1</a>, in www.dgsi.pt/jtrp]. 
A sentença recorrida adoptou como método de trabalho referencial a fórmula matemática que foi utilizada, pela primeira vez, no Ac. do STJ de 05/05/1994 [in CJ-STJ ano II, 2, 86] e teve expressamente em consideração os seguintes elementos (cfr. fls. 269 a 271):
- Num primeiro momento:
• a idade do lesado: 18 anos, à data do sinistro;
• o número de anos até atingir a reforma: 47 anos, uma vez que situou a reforma aos 65 anos;
• o factor 25,02471 da tabela apresentada a fls. 268 e 269;
• o rendimento anual auferido pelo autor, à data do acidente: € 320,94 x 14 = € 4.493,16;
• a taxa de IPG de que aquele ficou afectado: 20%;
• a inexistência de culpa concorrencial do próprio lesado na produção do acidente e, por via disso, também nas lesões que determinaram a IPG acabada de mencionar.
- Num segundo momento:
• procedeu à dedução de 1/3 do rendimento que o lesado gastará consigo na satisfação das suas necessidades próprias.
- E num terceiro momento ponderou “os outros factores que as ditas fórmulas não contemplam, e que se repercutirão, previsivelmente, em termos de perdas patrimoniais, e que são extremamente relevantes”, particularmente:
• o prolongamento da IPG para além da idade de reforma;
• o de as fórmulas não contemplarem a tendência, pelo menos a médio e longo prazo, quanto à melhoria das condições de vida do país e da sociedade e do aumento da produtividade;
• o de também não terem em consideração a tendência para o aumento da vida activa para se atingir a reforma, nem o aumento da própria longevidade;
• o de não contarem com a inflação;
• o de não contemplarem as despesas que o lesado terá de suportar por tarefas que, se não fosse o acidente, ele mesmo desempenharia
• e o facto de todo o cálculo ser feito na base de que o trabalhador ficaria sempre a auferir aquele salário e que não teria progressão na carreira, ou seja, num completo congelamento da progressão profissional.

Discordamos, no entanto, com o devido respeito, de alguns pormenores dos elementos considerados nos dois primeiros momentos acabados de sinalizar.
Desde logo, da idade de reforma (vida activa) que foi tida em conta, pois em vez dos 65 anos deve atender-se antes à idade de 70 anos que é a que vem sendo seguida nos arestos mais recentes, é a que está mais conforme com as alterações que a este nível (da idade de reforma) têm sido implementadas pelo actual Executivo e porque é também a mais adequada ao aumento da esperança de vida que tem vindo a aumentar nas sociedades ocidentais, de que fazemos parte, com o inerente prolongamento do período de vida activa.
Devido a este aumento da idade de vida activa, também o factor dos métodos matemáticos ou das tabelas financeiras a ponderar tem que ser superior ao que foi considerado na 1ª instância.
Depois, também não concordamos com a retribuição que relevou para o tribunal recorrido, já que o prémio de produtividade e o subsídio de alimentação que o autor auferia mensal e regularmente [cfr. nº 30) dos factos provados] não podem deixar de integrar aquele conceito de “retribuição”, como, aliás, o proclamam as leis laborais, além de que aquele só deixou de os auferir em virtude do acidente causado pela condutora do veículo segurado na ré. 
Temos sérias reservas quanto à dedução de 1/3, correspondente à percentagem dos rendimentos que o autor gastará consigo nas suas despesas pessoais, ao longo da vida – considerada no segundo momento a que atrás se aludiu -, já que, em nosso entender (e repensando posição que anteriormente seguimos), tal dedução só deve ter lugar em caso de morte da vítima (o que não é, felizmente, o caso), pois só nesta situação devem ser deduzidas despesas que esta teria consigo própria mas que já não existirão devido ao seu decesso. Nos casos em que o lesado sobrevive e fica incapacitado (como aqui acontece) não vemos como possa deduzir-se uma despesa que ele continuará a ter e que terá de suportar com os seus réditos.
No que diz respeito aos factores atendidos na terceira fase (ou 3º momento), nada temos a apontar, a não ser mencionar que a esperança de vida a considerar se situa actualmente, no nosso País e quanto aos indivíduos do sexo masculino, nos 76 anos, conforme dados fornecidos pelo INE em 2008 [cfr. tb o Ac. do STJ de 03/03/2009, supra citado].
Ponderando então todos estes dados/factores entendemos que a indemnização justa, adequada e equilibrada para o concreto caso a que nos reportamos deve ser fixada em € 40.000,00 e não nos € 30.000,00 arbitrados na sentença recorrida, a qual, assim, se revoga parcialmente, com a consequente parcial procedência, nesta parte, da apelação.*
*2. Se a indemnização fixada a título de reparação por danos não patrimoniais merece censura.
A segunda questão a apreciar tem a ver com o «quantum» atribuído na 1ª instância como compensação pelos danos morais sofridos pelo demandante, discordando ambas as partes dos € 35.000,00 ali taxados.
É sabido que os danos não patrimoniais indemnizáveis são aqueles que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito - art. 496º nº 1 -, e que no ressarcimento dos mesmos não existe uma genuína indemnização, pois, ao invés desta que visa essencialmente preencher uma lacuna no património do lesado, destina-se aquela a aumentar um património intacto para que, com tal acréscimo, o lesado encontre compensação para a dor, a fim de restabelecer um desequilíbrio no âmbito imedível da felicidade humana, o que impõe que o seu montante - «quantum» - deva ser proporcional à gravidade do dano, ponderando-se, para tal, nas regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e do criterioso sopesar das realidades da vida, em conformidade com o preceituado no nº 3 daquele art. 496º [assim, Prof. Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, vol. I, 9ª ed., pgs. 627 a 630 e Dario M. de Almeida, in “Manual de Acidentes de Viação”, pgs. 274 e segs.].
Mas na fixação desta indemnização interfere, ainda, uma componente punitiva, de reprovação ou castigo, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, da conduta do agente, como vem sendo salientado pela doutrina e pela jurisprudência, sendo certo que «in casu» a condutora do veículo segurado na ré foi a causadora única do sinistro [assim, i. a., Acs. do STJ de 30/10/1996, in BMJ 460/444 e de 19/05/2009, proc. 298/06.0TBSJM.S1, in www.dgsi.pt/jstj; neste último aludem-se também aos ensinamentos, no mesmo sentido, dos Profs. Meneses Cordeiro, in “Direito das Obrigações”, 2º vol., pg. 288 – segundo o qual “a cominação de uma obrigação de indemnizar danos morais representa sempre um sofrimento para o obrigado; nessa medida, a indemnização por danos morais reveste uma certa função punitiva” -, Galvão Telles, in “Direito das Obrigações”, pg. 387 – que sustenta que “a indemnização por danos não patrimoniais é uma «pena privada», estabelecida no interesse da vítima” -, Meneses Leitão, in “Direito das Obrigações”, vol I, pg. 299 e Pinto Monteiro, no estudo “Sobre a Reparação dos Danos Morais”, in RPDC, nº 1, 1º ano, Setembro de 1992, pg. 21].
Para cabal fixação do montante compensatório a que o autor tem direito, há que ter em conta toda a factologia que se mostra descrita nos nºs 6) a 14), 18) a 27) e 34) a 42) do ponto III deste acórdão e o que dela decorre, particularmente, que:
• o demandante passou um ano e meio em internamentos, intervenções cirúrgicas (que foram quatro, todas com anestesia geral) e tratamentos de recuperação (dolorosos, intensivos e incómodos);
• terá de suportar durante toda a vida a significativa incapacidade física de que é portador, com tudo o que isso lhe trará de limitativo na sua vivência pessoal, de relacionamento social e laboral (lembremos até que perdeu o emprego que tinha, por a entidade patronal ter posto termo ao contrato de trabalho devido à prolongada ausência decorrente das incapacidades temporárias por que passou em consequência das lesões que sofreu), já que inúmeras actividades haverá que poderia desenvolver se não sofresse da incapacidade que o acompanhará, mas que, assim, estarão, à partida, afastadas do seu horizonte laboral;
• terá muitos momentos de angústia, de sofrimento psíquico e de dor emocional por causa da sua limitação física e dos sinais exteriores (nove cicatrizes visíveis em parte do seu corpo) que o deformam e lhe trarão à memória os difíceis momentos do acidente e do período de tratamentos e de recuperação subsequente.
Perante todo este quadro circunstancial, pensamos, com o devido respeito pelas opiniões dos recorrentes (autor e ré), que o montante fixado na sentença recorrida - € 35.000,00 – se apresenta criterioso e bem fundado, sendo, por isso, de manter, com a inerente improcedência, nesta parte, de ambas as apelações.

Em conclusão, há apenas que alterar a quantia devida a título de indemnização pela perda parcial da capacidade de ganho do autor. ***V. Decisão:

Em conformidade com o exposto, os Juízes desta secção cível da Relação do Porto acordam em:
1º) Julgar parcialmente procedente a apelação e revogar, também em parte, a decisão recorrida, alterando-se a indemnização pelo dano futuro da IPG de que o autor ficou afectado para a quantia de € 40.000,00 (quarenta mil euros), mantendo-se o mais que ali foi decidido.
2º) Condenar os recorrentes nas custas, na proporção do respectivo decaimento.***Porto, 2009/06/02
Manuel Pinto dos Santos
Cândido Pelágio Castro de Lemos
Augusto José B. Marques de Castilho

Pc. 11/06.2TBLSD.P1 – 2ª Secção (apelação) _______________________ Relator: Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Cândido Lemos Des. Marques de Castilho ***Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B……………, residente em ………., …….., Guimarães, instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, destinada a exigir a responsabilidade civil emergente de acidente de viação, contra a C…………., SA (que incorporou, por fusão, a D………….., SA), com sede na ………, ….., em Lisboa, pedindo a condenação desta a pagar-lhe, a título de indemnização, a quantia de € 160.525,01 (cento e sessenta mil quinhentos e vinte e cinco euros e um cêntimo), acrescida de juros de mora, à taxa legal, a partir da citação e até efectivo e integral pagamento. Alegou, para tal e em síntese, que, no dia 11/10/2003, foi vítima de um acidente que ocorreu na EN 106, no lugar de Cruz Nova, em Lustosa, Lousada, quando seguia como passageiro no motociclo de matrícula ..-..-OH, que este acidente ficou a dever-se a condução ilícita e culposa da condutora do veículo automóvel de matrícula ..-..-LM, segurado na ré, que desrespeitou um sinal de STOP e a regra da prioridade no acesso à via por onde circulava o OH e foi embater neste motociclo, e que do mesmo lhe advieram diversos danos patrimoniais e não patrimoniais que descreve e quer ver ressarcidos. A ré, devidamente citada, contestou a acção, impugnando a essencialidade da materialidade fáctica alegada pelo autor, e concluiu que a acção deveria ser julgada em função da prova que viesse a ser produzida em audiência de julgamento. A autora replicou mantendo a posição constante da petição inicial e concluiu que a culpa pelo acidente pertenceu essencialmente à condutora do PI, seguro na ré C……….., SA. Foi proferido despacho saneador e foram seleccionados os factos assentes e os controvertidos - estes formando a base instrutória -, que foram objecto de reclamação por parte da ré, que obteve provimento. Realizadas as pertinentes diligências instrutórias que incluíram a produção de prova pericial, teve lugar a audiência de discussão e julgamento, no termo da qual foi dada resposta aos quesitos da base instrutória pela forma constante do despacho de fls. 250252. Seguiu-se a prolação de sentença – fls. 255 a 273 – que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência (além da condenação em custas, que aqui não interessa considerar), condenou a ré seguradora a pagar ao autor a quantia de € 70.146,77 (setenta mil cento e quarenta e seis euros e setenta e sete cêntimos), a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral e efectivo pagamento. Inconformados com esta sentença, autor e ré interpuseram recursos de apelação (aos quais foi fixado o efeito meramente devolutivo), cujas motivações, constantes, respectivamente, de fls. 308 a 319 e de fls. 295 a 302, culminaram com as seguintes conclusões: - Conclusões do autor: “1ª - Tendo em conta a matéria dada por provada, o montante global de € 65.000,00 de indemnização fixado na sentença de que se recorre (€ 30.000 pelos danos patrimoniais - danos futuros - e de € 35.000 como compensação pelos respectivos danos não patrimoniais) está manifestamente desvalorizado. 2ª - Desde logo, a indemnização fixada na sentença de € 30.000 pelos danos patrimoniais (danos futuros) não permite compensar o recorrente, lesado, dos danos em virtude da perda aquisitiva ou de trabalho, nomeadamente, por não ter tido em devida (conta) alguns aspectos concretos deste caso, como a idade jovem do recorrente quando sofreu o acidente (18 anos); a taxa de lPP de 20%, devendo aqui admitir-se que a actividade profissional deste ficou lesada em medida superior àquela percentagem, na medida em que as lesões sofridas têm incidência concreta na locomoção - note-se que o autor era operário têxtil (ramolador) e ficou com lesões físicas permanentes no antebraço direito e perna esquerda. 3ª - Além do mais, a douta sentença não teve em devida conta que o recorrente ficou a sofrer de um prejuízo anátomo-funcional que prejudica a sua actividade em geral: com efeito, foi dado como provado que à data do acidente, o autor era dinâmico, alegre e trabalhador; que não tinha problemas de saúde nem qualquer deficiência motora ou estética, praticava vários desportos, entre os quais futebol, ocupando parte dos seus tempos livres com passeios de bicicleta; e que, em consequência do acidente, deixou de praticar as actividades que praticava anteriormente, como sejam jogar futebol, passeios de bicicleta, sentindo dificuldades na condução de veículos, o que lhe provoca tristeza e inibição; sendo ainda que, na sequência do acidente, (o) autor ficou com nove cicatrizes visíveis, uma na cabeça, uma na anca, três no braço direito e quatro na perna esquerda. 4ª - Ora, estes factos, consequência directa do acidente em causa, limitam novas opções laborais e restringe(m) o incremento da actividade específica já desenvolvida, implicando previsivelmente também, pela diminuição da sua auto-suficiência, um acréscimo de despesas. 5ª - De igual modo, entende o recorrente que o montante fixado de € 35.000 como compensação pelos respectivos danos não patrimoniais está desvalorizado, não é justo nem equilibrado, por não ter tido em devida conta as gravíssimas consequências que daquele acidente resultaram para o recorrente. Reafirmam-se aqui os seguintes factos: em consequência do embate, o recorrente foi projectado para o chão, ficando imobilizado na via pública e perdeu os sentidos; sofreu fractura exposta dos ossos da perna esquerda, dos ossos do antebraço direito, feridas na face, tornozelo direito e cotovelo esquerdo; desde o acidente e até Fevereiro de 2004 apenas se deslocava em cadeira de rodas; foi submetido a quatro intervenções cirúrgicas; não tinha problemas de saúde nem qualquer deficiência motora ou estética, praticava vários desportos, entre os quais futebol, ocupando parte dos seus tempos livres com passeios de bicicleta; em consequência das lesões sobrevindas, sofreu dores, bem assim com as intervenções cirúrgicas, nos períodos de internamento e com os tratamentos; com o acidente o autor sofreu abalo psíquico, chegando a recear perder a vida ou, pelo menos, algum membro do corpo como o braço direito ou a perna esquerda; nos períodos de internamento e porque se visse privado das suas actividades e da companhia de familiares e dos amigos, sentiu-se triste; e, em consequência do acidente deixou de praticar as actividades que praticava anteriormente, como sejam jogar futebol, passeios de bicicleta, sentindo dificuldades na condução de veículos, o que lhe provoca tristeza e inibição; as cirurgias a que o autor foi submetido foram efectuadas com anestesia geral e determinaram perdas de sangue, dolorosos e intensivos tratamentos e incómodos; em consequência do acidente e sequelas ficou com nove cicatrizes visíveis, uma na cabeça, uma na anca, três no braço direito e quatro na perna esquerda; esteve sujeito aos seguintes períodos de incapacidade: entre 11/10/2003 e 30/11/04 - incapacidade temporária absoluta; entre 01/12/2004 e 13/01/2005 - incapacidade temporária parcial de 50%; entre 14/01/2005 e 19/04/2005 - incapacidade temporária parcial de 20%. 6ª - Pelo exposto, resulta assim que, ao decidir do modo como o fez, entende o recorrente que, salvo o devido respeito por diferente opinião, o Tribunal a quo não aplicou, ponderada e concretamente, os normativos consagrados nos artigos 562°, 563°, 564°, 2, 566º, 2 e 3, 496º, n° 3, 494°, todos do Código Civil. Nestes termos, (…), deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se a decisão recorrida, (…)”. - Conclusões da ré seguradora: “1 - A ora apelante discorda do montante que o Tribunal arbitrou ao recorrido B…………… a título de danos não patrimoniais sofridos, por força do ajuizado sinistro. 2 - Discutida a matéria de facto relevante para o apuramento da vertente do dano não patrimonial, julgou o Tribunal recorrido assentes e provados os factos descritos na sentença sob os números 6 a 14, 18 a 28 e 33 a 42 e que aqui se dão por integralmente reproduzidos para os devidos efeitos legais - por razões de mera economia e celeridade processuais. 3 - Em face do entendimento sufragado e desenvolvido pela Jurisprudência mais recente do Supremo Tribunal de Justiça, parece-nos, salvo o respeito devido por opinião diversa, que em casos semelhantes ao que ora nos ocupa - mas de gravidade clínica mais relevante, vêm sendo atribuídas quantias por danos não patrimoniais inferiores às que o Tribunal recorrido entendeu fixar ao recorrido B……………. 4 - Apesar de muito relevantes, não são os danos não patrimoniais sofridos pelo recorrido que a jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores tem entendido merecerem a tutela e a pesada compensação de 35.000,00€. 5 - Atentemos, para exemplificar esta afirmação, no teor do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido por unanimidade em 30 de Outubro de 2008, consultável no endereço electrónico www.dqsi.pt (Proc.07B2978), que acima se transcreve no corpo das alegações. 6 - Considerados os factos descritos nesse processo, muito semelhante ao que ora nos ocupa, o STJ entendeu - recentemente - ser justa e equilibrada, a quantia de 20.000,00€, como completa indemnização pelos danos sofridos pelo aludido lesado. 7 - No caso acima apontado, elucidativo do actual sentido da Jurisprudência, o STJ vem atribuindo montantes inferiores ao fixado nos presentes autos, quando o lesado em acidente de viação (por culpa exclusiva de terceiro) sofreu fracturas ósseas igualmente graves às que o recorrido sofreu, traumatismos de gravidade idêntica, incapacidade parcial permanente superior à do recorrido (IPG de 40% + 5%!!!), perda de faculdades ao nível dos membros superiores, por impossibilidade de andar sem canadianas, e, finalmente, impossibilidade de exercer a sua profissão habitual e qualquer outra que implique uma actividade física normal. 8 - A nossa Jurisprudência vem reservando a atribuição de indemnizações na ordem dos 35.000,00€, a casos que, pela sua gravidade e consequências, suplantam claramente a gravidade das lesões a que o recorrido se submeteu por força do sinistro de que foi vítima. 9 - A recorrente entende determinante, quando se pretende indemnizar danos desta natureza de forma justa e equilibrada, que sobre esta matéria deva recair uma certa uniformidade de julgados, o que nos parece óbvio não suceder no caso vertente. 10 - Por conseguinte, considerando os factos provados nestes autos, acima mencionados, com relevância para a fixação de uma indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pelo recorrido e considerando ainda o teor da decisão proferida recentemente pelo STJ, acima parcialmente transcrita, numa situações francamente mais relevante em termos de dano não patrimonial, 11 - Entende a ora recorrente que a decisão aqui posta em crise ofende a equidade de forma frontal e deve ser substituída por outra, que melhor se coadune com os danos não patrimoniais sofridos pela recorrida. 12 - Tal montante, de acordo com o conjunto da nossa Jurisprudência deve fixar-se sempre em valor próximo dos 20.000,00€, quantia que já traduz de forma muito expressiva a gravidade das lesões do recorrido e que não ofende os valores usualmente arbitrados em situações de gravidade substancialmente superior. 13 - A decisão ora posta em crise ofende o preceituado no artigo 496 n.º 1 e 3 do Código Civil. Termos em que, (deve ser) dado provimento ao presente recurso (…)”. Não houve contra-alegações. Foram colhidos os vistos legais.***II. Questões a apreciar e decidir: Em atenção à delimitação decorrente das conclusões das alegações dos apelantes - art. 684º nº 3 e 690º nºs 1 e 3 do C.Proc.Civ. – e não esquecendo que nos recursos se apreciam questões e não razões ou argumentos e que não visam criar decisões sobre matéria nova, as questões que importa apreciar e decidir traduzem-se em saber: • Se a indemnização pela IPP de que padece o autor deve ser aumentada, como este pretende. • Se o montante fixado a título de indemnização por danos não patrimoniais deve ser alterado (para mais, pretende o demandante; para menos, sustenta a ré).***III. Factos provados: Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos (que as partes não põem em causa nos seus recursos): 1) Em 11/10/2003, o autor seguia como passageiro do veículo motorizado de duas rodas com a matrícula ..-..-OH, conduzido por E………….., cerca das 12h, na estrada nacional 106, no Lugar de Cruz Nova, Lustosa, Lousada, no sentido Lustosa - Lousada. 2) Do lado direito da via, atento o sentido de marcha do OH, existe um entroncamento entre a EN 106 e outra estrada de acesso à localidade de Chamistães, nesta comarca. 3) No ponto de intersecção entre a estrada que liga a Chamistães e a EN 106, existe um sinal de STOP. 4) Quando o condutor do OH seguia na EN 106, nas circunstâncias de tempo e lugar supra descritas, junto ao aludido entroncamento, o LM surgiu da estrada que liga a Chamistães e invadiu a faixa de rodagem por onde seguia aquele, no sentido Lustosa - Lousada, embatendo com a frente e parte lateral do lado esquerdo na parte lateral do lado direito no OH. 5) A ré assumiu a responsabilidade do seu segurado pela verificação do embate. 6) Em 12/12/2004, o autor foi submetido a uma intervenção cirúrgica para extracção de fixador e gesso e a tratamento cirúrgico da pseudartrose dos ossos do antebraço (cúbito e rádio), a qual ocorreu como consequência directa e necessária dos danos físicos sobrevindos em consequência do acidente. 7) Em 26/04/2004, o autor tirou os pontos decorrentes da cirurgia mencionada em 6), permanecendo com gesso brânquia-palmar. 8) Em 09/03/2004, tirou o gesso e fez raios-X pseudartrose da tíbia e perónio para encavilhamento rimado e aparafusado. 9) Em 26/03/2004, o autor regressou aos serviços médicos onde foi operado a fim de ser submetido a nova intervenção cirúrgica de pseudartrose, encavilhamento + OTM perónio + enxerto. 10) Em 01/06/2004, o autor voltou aos serviços clínicos da ré para nova intervenção cirúrgica a fim de proceder à extracção de parafuso proximal da tíbia, onde regressou para tirar os pontos em 07/06/2004. 11) Por solicitação dos serviços clínicos da ré, desde 08/07/2004 o autor realizou tratamentos de fisioterapia para recuperação numa clínica especializada na cidade de Vizela. 12) No início do mês de Outubro, o autor voltou a ser submetido a nova intervenção cirúrgica para tirar parafuso distal e OTM do perónio, tirando os pontos em 14/10/2004. 13) Em 24/03/2005, o autor foi submetido a nova intervenção cirúrgica para extracção do material colocado no antebraço direito e perna esquerda. 14) O autor passou, assim, 566 dias, entre 11/10/2003 e até à alta médica em 19/04/2005, em internamentos. tratamentos e consultas médicas. 15) A segurança social concedeu ao autor subsídio de doença no valor de € 2.844,55, relativo ao período compreendido entre 11/10/2003 e 14/10/2004. 16) A responsabilidade civil por danos causados a terceiros decorrentes da circulação do veículo com a matrícula ..-..-LM, encontrava-se transferida em Outubro de 2003 para a D……………., incorporada por fusão na C………………., SA. 17) Em consequência do embate o autor foi projectado para o chão, ficando imobilizado na via pública e perdendo os sentidos. 18) E, em consequência do embate, o autor sofreu fractura exposta dos ossos da perna esquerda, dos ossos do antebraço direito, feridas na face, tornozelo direito e cotovelo esquerdo. 19) Logo após o acidente, foi socorrido no local por equipa médica do INEM e transportado para a urgência do Hospital Padre Américo, onde esteve internado cerca de duas horas, sujeito a exames médicos e medicação. 20) De seguida, foi transferido para o Hospital da Senhora da Oliveira, em Guimarães, onde permaneceu internado e em regime de observações no serviço de ortopedia durante cerca de um mês. 21) No decurso daquele mês, o autor foi submetido a duas intervenções cirúrgicas de osteossíntese ao antebraço direito e perna esquerda, sendo submetido a tratamentos médicos às feridas na face e cabeça. 22) Desde o acidente e até Fevereiro de 2004, o autor apenas se deslocou em cadeira de rodas. 23) O autor foi submetido a quatro intervenções cirúrgicas devido às lesões decorrentes do acidente. 24) Após a realização da cirurgia efectuada em 26/03/2004, o autor permaneceu imobilizado cerca de um mês, em total repouso, só tirando os pensos em 15/04/2004. 25) O autor começou a fazer fisioterapia. 26) Nos períodos de tempo que mediaram entre as diversas intervenções cirúrgicas o autor dirigia-se diariamente aos serviços clínicos da ré, na cidade do Porto, por indicação destes, em ordem a ser observado e aconselhado sobre o evoluir do seu estado clínico. 27) Em consequência das lesões sobrevindas ao autor em consequência do acidente, este ficou a padecer das sequelas mencionadas no documento de fls. 4. 28) O autor ficou com uma incapacidade permanente geral fixável em 20%. 29) Se o autor tivesse trabalhado naquele período de tempo, teria recebido € 1.095,55 relativos a parte do vencimento do mês de Outubro a Dezembro de 2003; € 5.376,00 referentes aos salários do ano de 2004 e € 1.395,68 correspondentes ao ano de 2005, até à data da alta médica, com os proporcionais de subsídio de férias e de Natal. 30) À data do acidente o autor exercia funções de aprendiz de ramolador, com o vencimento mensal ilíquido de € 320,94, acrescido de prémio de produtividade de € 29,62 e subsídio de alimentação de € 33,60. 31) Em consequência das ausências determinadas pelas lesões e tratamentos provocados pelo acidente, a entidade patronal do autor fez cessar a relação contratual em 01/09/2004. 32) Do total das despesas médicas suportadas pelo autor, e a que se reportam os docs. 12 a 24 juntos com a petição inicial, a ré só ainda não pagou a quantia de € 124,09. 33) O autor nasceu a 16/05/1985. 34) À data do acidente era dinâmico, alegre e trabalhador. 35) Não tinha problemas de saúde nem qualquer deficiência motora ou estética, praticava vários desportos entre os quais futebol, ocupando parte dos tempos livres com passeios de bicicleta. 36) Em consequência das lesões sobrevindas, o autor sofreu dores, bem assim com as intervenções cirúrgicas, nos períodos de internamento e com os tratamentos. 37) Com o acidente o autor sofreu abalo psíquico, chegando a recear perder a vida ou, pelo menos, algum membro do corpo como o braço direito ou a perna esquerda, nos períodos de internamento e porque se visse privado das suas actividades e da companhia de familiares e dos amigos, sentiu-se triste. 38) E, em consequência do acidente, deixou de praticar as actividades que praticava anteriormente, como sejam jogar futebol, passeios de bicicleta, sentindo dificuldades na condução de veículos, o que lhe provoca tristeza e inibição. 39) As cirurgias a que o autor foi submetido foram efectuadas com anestesia geral e determinaram perdas de sangue, tratamentos dolorosos e intensivos e incómodos. 40) Em consequência do acidente e sequelas, o autor ficou com nove cicatrizes visíveis, (sendo) uma na cabeça, uma na anca, três no braço direito e quatro na perna esquerda. 41) Em consequência do acidente, o autor esteve sujeito aos seguintes períodos de incapacidade: Entre 11/10/2003 e 30/11/2004 - incapacidade temporária absoluta; Entre 01/12/2004 e 13/01/2005 - incapacidade temporária parcial de 50%; Entre 14/01/2005 e 19/04/2005 – incapacidade temporária parcial de 20%. 42) Tratamentos estes que, durante vários meses, foram feitos diariamente e obrigava(m) o autor, com muito sacrifício, a deslocar-se da sua residência até à referida Clínica. ***IV. Apreciação jurídica: 1. Se a indemnização pela IPP arbitrada ao autor deve ser alterada. Antes de entrarmos na apreciação das questões trazidas a este Tribunal pelas partes nos seus recursos, importa dizer que as mesmas não põem em causa a factologia dada como provada na 1ª instância, nem que o acidente apreciado nos autos ficou a dever-se a culpa exclusiva da condutora do veículo segurado na ré, como se decidiu na sentença recorrida. Também aceitam os montantes indemnizatórios ali fixados pelas despesas médicas que o autor suportou e pelas remunerações que deixou de auferir durante os períodos de tempo em que esteve incapacitado de exercer a sua actividade profissional em consequência do sinistro rodoviário de que foi vítima. Em questão estão apenas os montantes indemnizatórios arbitrados a título de dano futuro, resultante da incapacidade permanente geral de que o demandante ficou afectado, e a título de compensação por danos não patrimoniais ou morais. Contra a quantia fixada pelo primeiro destes danos insurge-se o autor, pretendendo, certamente, que a mesma se aproxime da que pediu na petição inicial (€ 100.000,00). Da importância atribuída pelo segundo dano discordam ambas as partes, pugnando o autor por valor superior (na p. i. pediu € 50.000,00) e a ré por montante inferior (próximo de € 20.000,00, como refere nas conclusões das suas alegações). Apreciemos neste item a indemnização pela IPG de que o autor ficou afectado. Este considera que a quantia de € 30.000,00 fixada na decisão recorrida não permite compensá-lo “dos danos em virtude da perda aquisitiva ou de trabalho”, nomeadamente, por não ter tido em devida conta alguns aspectos concretos, como a sua idade à data do acidente (18 anos), a taxa de IPP de 20% de que ficou afectado, com repercussão superior na sua actividade profissional (era operário têxtil ramolador, à data do sinistro) na medida em que as lesões sofridas têm incidência concreta na locomoção e ficou com lesões físicas permanentes no antebraço direito e perna esquerda e, bem assim, por a sentença recorrida não ter tido em devida conta que ele ficou a sofrer de um prejuízo anátomo-funcional que prejudica a sua actividade em geral [conclusões 2ª a 4ª das suas alegações]. Na sentença recorrida, depois de fundamentar o direito do autor a ser indemnizado pelo dano futuro em apreço no que estabelece o nº 2 do art. 564º do CCiv., a Mma. Juíza «a quo» chamou à colação diversos acórdãos do STJ para dizer que a jurisprudência nacional tem “vindo a fazer um grande esforço de clarificação (…) visando o estabelecimento de critérios de apreciação e de cálculo dos danos que reduzam ao mínimo a margem de arbítrio e de subjectivismo dos magistrados, por forma a que as decisões, convencendo as partes devido ao seu mérito intrínseco, contribuam para uma maior certeza na aplicação do direito e para a redução da litigiosidade a proporções mais razoáveis” e acrescentou que se assentou “de forma bastante generalizada nas seguintes ideias”: “1ª) A indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que a vítima não auferirá e que se extingue no final do período provável de vida; 2ª) No cálculo desse capital interfere necessariamente, e de forma decisiva, a equidade, o que implica que deve conferir-se relevo às regras da experiência e àquilo que, segundo curso normal das coisas, é razoável; 3ª) As tabelas financeiras por vezes utilizadas para apurar a indemnização têm um mero carácter auxiliar, indicativo, não substituindo de modo algum a ponderação judicial com base na equidade; 4ª) Deve ser proporcionalmente deduzida no cômputo da indemnização a importância que o próprio lesado gastaria consigo mesmo ao longo da vida (em média, para despesas de sobrevivência, um terço dos proventos auferidos), consideração esta que somente vale no caso de morte; 5ª) Deve ponderar-se o facto de a indemnização ser paga de uma só vez, o que permitirá ao seu beneficiário rentabilizá-la em termos financeiros; logo, haverá que considerar esses proveitos, introduzindo um desconto no valor achado, sob pena de se verificar um enriquecimento sem causa do lesado à custa alheia; 6ª) Deve ter-se preferencialmente em conta, mais do que a esperança média de vida activa da vítima, a esperança média de vida, uma vez que, como é óbvio, as necessidades básicas do lesado não cessam no dia em que deixa de trabalhar por virtude da reforma (em Portugal, no momento presente, a esperança média de vida dos homens já é de 73 anos, e tem tendência para aumentar; e a das mulheres chegou aos oitenta)”. Estas são também as considerações gerais que a Jurisprudência mais recentes dos Tribunais Superiores vem apontando como critérios a ter em atenção na fixação do dano futuro decorrente de incapacidade permanente de que o lesado fica a padecer [a título meramente exemplificativo, podem citar-se, neste sentido, os acórdãos do STJ de 19/05/2009, proc. 298/06.0TBSJM.S1, de 03/03/2009, proc. 09A0009, de 22/01/2009, proc. 07B4242, de 13/01/2009, proc. 08A3747, todos in www.dgsi.pt/jstj e desta Relação do Porto de 03/05/2007, proc. 0731351, de 23/03/2006, proc. 0631053 e de 26/01/2006, proc. 0536116, todos in www.dgsi.pt/jtrp]. Como quer que seja e tem sido frisado nesses (e noutros) arestos dos mesmos Tribunais Superiores, a última ratio do cálculo da indemnização em referência é sempre a equidade, prevista nos arts. 494º e 566º nº 3 do CCiv., e não qualquer tabela (financeira) ou fórmula (matemática), a que habitualmente se recorre, já que estes métodos mais não são, sob pena de se torpedear a margem de subjectividade subjacente à referida equidade, que meros auxiliares ou coadjuvantes do julgador e que servem, essencialmente, para harmonizar as decisões indemnizatórias e evitar grandes disparidades no ressarcimento de situações similares [isto mesmo foi salientado pelo Cons. Sousa Dinis, nos seus estudos sobre o “Dano Corporal em Acidentes de Viação”, in CJ-STJ ano V, tomo 2, pgs. 11 e segs. e ano IX, tomo 1, pgs. 5 e segs., que expressamente referiu que o recurso às tabelas financeiras (o mesmo vale para as fórmulas matemáticas, adiantamos nós) não visa pôr de lado a equidade que continuará, até por imposição do art. 566º nº 3 do CCiv., a ser o critério básico de fixação deste tipo de indemnizações, acrescentando que tais tabelas são utilizadas apenas com o objectivo de tornar tais indemnizações mais justas e actuais e de evitar grandes discrepâncias entre decisões atinentes à mesma matéria; vejam-se, ainda, o Acórdão do STJ de 09/11/2006, proc. 06B3798, in www.dgsi.pt/jstj e desta Relação do Porto de 31/03/2009, proc. 3138/06.7TBMTS.P1, in www.dgsi.pt/jtrp]. A sentença recorrida adoptou como método de trabalho referencial a fórmula matemática que foi utilizada, pela primeira vez, no Ac. do STJ de 05/05/1994 [in CJ-STJ ano II, 2, 86] e teve expressamente em consideração os seguintes elementos (cfr. fls. 269 a 271): - Num primeiro momento: • a idade do lesado: 18 anos, à data do sinistro; • o número de anos até atingir a reforma: 47 anos, uma vez que situou a reforma aos 65 anos; • o factor 25,02471 da tabela apresentada a fls. 268 e 269; • o rendimento anual auferido pelo autor, à data do acidente: € 320,94 x 14 = € 4.493,16; • a taxa de IPG de que aquele ficou afectado: 20%; • a inexistência de culpa concorrencial do próprio lesado na produção do acidente e, por via disso, também nas lesões que determinaram a IPG acabada de mencionar. - Num segundo momento: • procedeu à dedução de 1/3 do rendimento que o lesado gastará consigo na satisfação das suas necessidades próprias. - E num terceiro momento ponderou “os outros factores que as ditas fórmulas não contemplam, e que se repercutirão, previsivelmente, em termos de perdas patrimoniais, e que são extremamente relevantes”, particularmente: • o prolongamento da IPG para além da idade de reforma; • o de as fórmulas não contemplarem a tendência, pelo menos a médio e longo prazo, quanto à melhoria das condições de vida do país e da sociedade e do aumento da produtividade; • o de também não terem em consideração a tendência para o aumento da vida activa para se atingir a reforma, nem o aumento da própria longevidade; • o de não contarem com a inflação; • o de não contemplarem as despesas que o lesado terá de suportar por tarefas que, se não fosse o acidente, ele mesmo desempenharia • e o facto de todo o cálculo ser feito na base de que o trabalhador ficaria sempre a auferir aquele salário e que não teria progressão na carreira, ou seja, num completo congelamento da progressão profissional. Discordamos, no entanto, com o devido respeito, de alguns pormenores dos elementos considerados nos dois primeiros momentos acabados de sinalizar. Desde logo, da idade de reforma (vida activa) que foi tida em conta, pois em vez dos 65 anos deve atender-se antes à idade de 70 anos que é a que vem sendo seguida nos arestos mais recentes, é a que está mais conforme com as alterações que a este nível (da idade de reforma) têm sido implementadas pelo actual Executivo e porque é também a mais adequada ao aumento da esperança de vida que tem vindo a aumentar nas sociedades ocidentais, de que fazemos parte, com o inerente prolongamento do período de vida activa. Devido a este aumento da idade de vida activa, também o factor dos métodos matemáticos ou das tabelas financeiras a ponderar tem que ser superior ao que foi considerado na 1ª instância. Depois, também não concordamos com a retribuição que relevou para o tribunal recorrido, já que o prémio de produtividade e o subsídio de alimentação que o autor auferia mensal e regularmente [cfr. nº 30) dos factos provados] não podem deixar de integrar aquele conceito de “retribuição”, como, aliás, o proclamam as leis laborais, além de que aquele só deixou de os auferir em virtude do acidente causado pela condutora do veículo segurado na ré. Temos sérias reservas quanto à dedução de 1/3, correspondente à percentagem dos rendimentos que o autor gastará consigo nas suas despesas pessoais, ao longo da vida – considerada no segundo momento a que atrás se aludiu -, já que, em nosso entender (e repensando posição que anteriormente seguimos), tal dedução só deve ter lugar em caso de morte da vítima (o que não é, felizmente, o caso), pois só nesta situação devem ser deduzidas despesas que esta teria consigo própria mas que já não existirão devido ao seu decesso. Nos casos em que o lesado sobrevive e fica incapacitado (como aqui acontece) não vemos como possa deduzir-se uma despesa que ele continuará a ter e que terá de suportar com os seus réditos. No que diz respeito aos factores atendidos na terceira fase (ou 3º momento), nada temos a apontar, a não ser mencionar que a esperança de vida a considerar se situa actualmente, no nosso País e quanto aos indivíduos do sexo masculino, nos 76 anos, conforme dados fornecidos pelo INE em 2008 [cfr. tb o Ac. do STJ de 03/03/2009, supra citado]. Ponderando então todos estes dados/factores entendemos que a indemnização justa, adequada e equilibrada para o concreto caso a que nos reportamos deve ser fixada em € 40.000,00 e não nos € 30.000,00 arbitrados na sentença recorrida, a qual, assim, se revoga parcialmente, com a consequente parcial procedência, nesta parte, da apelação.* *2. Se a indemnização fixada a título de reparação por danos não patrimoniais merece censura. A segunda questão a apreciar tem a ver com o «quantum» atribuído na 1ª instância como compensação pelos danos morais sofridos pelo demandante, discordando ambas as partes dos € 35.000,00 ali taxados. É sabido que os danos não patrimoniais indemnizáveis são aqueles que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito - art. 496º nº 1 -, e que no ressarcimento dos mesmos não existe uma genuína indemnização, pois, ao invés desta que visa essencialmente preencher uma lacuna no património do lesado, destina-se aquela a aumentar um património intacto para que, com tal acréscimo, o lesado encontre compensação para a dor, a fim de restabelecer um desequilíbrio no âmbito imedível da felicidade humana, o que impõe que o seu montante - «quantum» - deva ser proporcional à gravidade do dano, ponderando-se, para tal, nas regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e do criterioso sopesar das realidades da vida, em conformidade com o preceituado no nº 3 daquele art. 496º [assim, Prof. Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, vol. I, 9ª ed., pgs. 627 a 630 e Dario M. de Almeida, in “Manual de Acidentes de Viação”, pgs. 274 e segs.]. Mas na fixação desta indemnização interfere, ainda, uma componente punitiva, de reprovação ou castigo, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, da conduta do agente, como vem sendo salientado pela doutrina e pela jurisprudência, sendo certo que «in casu» a condutora do veículo segurado na ré foi a causadora única do sinistro [assim, i. a., Acs. do STJ de 30/10/1996, in BMJ 460/444 e de 19/05/2009, proc. 298/06.0TBSJM.S1, in www.dgsi.pt/jstj; neste último aludem-se também aos ensinamentos, no mesmo sentido, dos Profs. Meneses Cordeiro, in “Direito das Obrigações”, 2º vol., pg. 288 – segundo o qual “a cominação de uma obrigação de indemnizar danos morais representa sempre um sofrimento para o obrigado; nessa medida, a indemnização por danos morais reveste uma certa função punitiva” -, Galvão Telles, in “Direito das Obrigações”, pg. 387 – que sustenta que “a indemnização por danos não patrimoniais é uma «pena privada», estabelecida no interesse da vítima” -, Meneses Leitão, in “Direito das Obrigações”, vol I, pg. 299 e Pinto Monteiro, no estudo “Sobre a Reparação dos Danos Morais”, in RPDC, nº 1, 1º ano, Setembro de 1992, pg. 21]. Para cabal fixação do montante compensatório a que o autor tem direito, há que ter em conta toda a factologia que se mostra descrita nos nºs 6) a 14), 18) a 27) e 34) a 42) do ponto III deste acórdão e o que dela decorre, particularmente, que: • o demandante passou um ano e meio em internamentos, intervenções cirúrgicas (que foram quatro, todas com anestesia geral) e tratamentos de recuperação (dolorosos, intensivos e incómodos); • terá de suportar durante toda a vida a significativa incapacidade física de que é portador, com tudo o que isso lhe trará de limitativo na sua vivência pessoal, de relacionamento social e laboral (lembremos até que perdeu o emprego que tinha, por a entidade patronal ter posto termo ao contrato de trabalho devido à prolongada ausência decorrente das incapacidades temporárias por que passou em consequência das lesões que sofreu), já que inúmeras actividades haverá que poderia desenvolver se não sofresse da incapacidade que o acompanhará, mas que, assim, estarão, à partida, afastadas do seu horizonte laboral; • terá muitos momentos de angústia, de sofrimento psíquico e de dor emocional por causa da sua limitação física e dos sinais exteriores (nove cicatrizes visíveis em parte do seu corpo) que o deformam e lhe trarão à memória os difíceis momentos do acidente e do período de tratamentos e de recuperação subsequente. Perante todo este quadro circunstancial, pensamos, com o devido respeito pelas opiniões dos recorrentes (autor e ré), que o montante fixado na sentença recorrida - € 35.000,00 – se apresenta criterioso e bem fundado, sendo, por isso, de manter, com a inerente improcedência, nesta parte, de ambas as apelações. Em conclusão, há apenas que alterar a quantia devida a título de indemnização pela perda parcial da capacidade de ganho do autor. ***V. Decisão: Em conformidade com o exposto, os Juízes desta secção cível da Relação do Porto acordam em: 1º) Julgar parcialmente procedente a apelação e revogar, também em parte, a decisão recorrida, alterando-se a indemnização pelo dano futuro da IPG de que o autor ficou afectado para a quantia de € 40.000,00 (quarenta mil euros), mantendo-se o mais que ali foi decidido. 2º) Condenar os recorrentes nas custas, na proporção do respectivo decaimento.***Porto, 2009/06/02 Manuel Pinto dos Santos Cândido Pelágio Castro de Lemos Augusto José B. Marques de Castilho