Processo:581/08.0TBVNG.P1
Data do Acordão: 04/01/2010Relator: RODRIGUES PIRESTribunal:trp
Decisão: Meio processual:

I - A acção de reivindicação de um imóvel pertencente a ambos os cônjuges tem de ser proposta por ambos ou por um deles com o consentimento do outro; II - Não tendo a mulher do autor prestado o seu consentimento à propositura da acção, uma vez que não o acompanhou nessa propositura e, chamada a intervir, não o quis fazer, haveria que obter decisão judicial de suprimento do consentimento, nos termos dos arts. 28-A, no 2 e 25 do Cód. do Proc. Civil.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
RODRIGUES PIRES
Descritores
ACÇÃO DE REIVINDICAÇÃO IMÓVEL
No do documento
Data do Acordão
01/05/2010
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO.
Decisão
REVOGADA A DECISÃO.
Sumário
I - A acção de reivindicação de um imóvel pertencente a ambos os cônjuges tem de ser proposta por ambos ou por um deles com o consentimento do outro; II - Não tendo a mulher do autor prestado o seu consentimento à propositura da acção, uma vez que não o acompanhou nessa propositura e, chamada a intervir, não o quis fazer, haveria que obter decisão judicial de suprimento do consentimento, nos termos dos arts. 28-A, no 2 e 25 do Cód. do Proc. Civil.
Decisão integral
Proc. nº 581/08.0 TBVNG.P1
Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia – .º Juízo Cível
Apelação
Recorrentes: B………. e mulher C……….
Recorrido: D……….
Relator: Eduardo Rodrigues Pires
Adjuntos: Desembargadores Canelas Brás e Pinto dos Santos

Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto:
RELATÓRIO
O autor D………., solicitando a intervenção principal provocada de sua mulher, E………., intentou contra os réus C………. e mulher, D………., a presente acção declarativa de condenação sob a forma sumária, tendo pedido que lhes seja reconhecido o seu direito de propriedade sobre um prédio urbano sito na Rua ………., nº .., Pedroso, Vila Nova de Gaia, inscrito na matriz predial urbana sob o art. 3356 e que os réus lhes restituam a cave da casa que existe em tal prédio e que ocupam sem que disponham de qualquer título que legitime a sua posse.
Mais pedem a quantia de €100,00, a título de sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso na entrega da coisa reivindicada.
Contestaram os réus, invocando que ocupam a cave em questão ao abrigo de um contrato de arrendamento celebrado há mais de 20 anos.
O autor apresentou articulado de resposta.
Foi admitida a intervenção principal provocada activa de E………. .
Esta, citada, nada disse.
Ao abrigo do disposto no art. 787 do Cód. do Proc. Civil foi dispensada a realização de audiência preliminar.
Proferiu-se despacho saneador, seleccionou-se a matéria de facto assente e organizou-se a base instrutória.
Realizou-se audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo, tendo o tribunal respondido à matéria da base instrutória através do despacho de fls. 87/8, que não teve qualquer reclamação.
Foi depois proferida sentença, na qual se decidiu:
a) reconhecer autor e interveniente como donos e legítimos proprietários do prédio sito na Rua ………., nº .., composto por casa de cave, rés-do-chão e andar, anexos e logradouros, com a área coberta de 91 m2, de anexos de 12 m2 e descoberta de 257 m2, descrito na matriz sob o art. 3356 e descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o nº 02074/141288;
b) condenar os réus a tal reconhecerem;
c) condenar os réus a restituirem a cave de tal prédio, livre de pessoas e bens e à sua custa, ao autor e à interveniente;
d) condenar os réus a indemnizar o autor na quantia de €150,00 por mês desde a data do trânsito em julgado desta sentença e até efectiva entrega da cave, a título de sanção pecuniária compulsória.
Inconformados, os réus interpuseram recurso de apelação desta sentença, tendo finalizado as suas alegações com as segunites conclusões:
1ª A presente acção devia ter sido proposta pelo autor e por sua mulher, ou por um deles com o consentimento do outro.
2ª A mulher do autor (como o próprio reconhece) recusou-se a acompanhá-lo na propositura da acção e, chamada a intervir, não o quis fazer, pelo que apenas com o suprimento judicial do respectivo consentimento poderia ter ficado assegurada a legitimidade do autor.
3ª Foram violadas as disposições dos arts. 28-A, nºs 1 e 2 e 25 do Cód. do Proc. Civil.
4ª A resposta ao quesito 2º deve ser alterada para “provado” e, no que respeita ao quesito 3º, deve ser considerado provado que houve pagamento de renda por parte dos réus aos proprietários da cave, durante muitos anos, o que sucedeu até à recusa do autor em receber a renda, tudo com base no depoimento das testemunhas F………. e G………. .
5ª Estes depoimentos foram corroborados, no que às entregas respeitou, pelo depoimento da mulher do autor, sendo certo que é inverosímil que se tratasse de uma mera “ajuda” para a água e a luz, quer porque não eram contabilizados os gastos, quer por se tratar de montante muito elevado, para a época.
6ª A douta sentença recorrida violou, por errada interpretação e aplicação, o disposto nos arts. 1022 e 1311 do Cód. Civil.
Pretende, por conseguinte, que a sentença recorrida seja revogada, sendo os réus absolvidos da instância ou do pedido.
O autor apresentou resposta, pronunciando-se no sentido da confirmação do decidido.
Cumpre então apreciar e decidir.*FUNDAMENTAÇÃO
Aos presentes autos, face à data da entrada em juízo da petição inicial, é aplicável o regime de recursos resultante do Dec. Lei nº 303/2007, de 24.8.*O âmbito do recurso encontra-se delimitado pelas conclusões que nele foram apresentadas e que atrás se transcreveram – arts. 684, nº 3 e 685 – A, nº 1 do Cód. do Proc. Civil.*QUESTÕES A DECIDIR:
a) Apurar se no presente caso, não existindo acordo dos cônjuges quanto à propositura da acção, teria que haver decisão judicial sobre o suprimento do consentimento, nos termos das disposições combinadas dos arts. 28-A, nº 2 e 25 do Cód. do Proc. Civil, a fim de ficar assegurada a legitimidade activa;
b) Apurar se devem ser alteradas as respostas que foram dadas aos nºs 2 e 3 da base instrutória.*OS FACTOS
A matéria fáctica dada como assente pela 1ª Instância é a seguinte:
1. Descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o nº 02074/141288 e aí definitivamente inscrito, por aquisição, a favor de D………. e E………., encontra-se o prédio urbano sito na Rua ………., nº .., composto por casa de cave, rés-do-chão e andar, anexos e logradouros, com a área coberta de 91 m2, de anexos de 12 m2 e descoberta de 257 m2, descrito na matriz sob o art. 3356.
2. Os réus ocupam a cave desse prédio.
3. Por intermédio do seu mandatário o autor, por correio com registo de 6.10.2005 enviou ao réu e esposa missiva com o seguinte teor: “Represento o seu pai, B………., que me informou que carece para a indispensável obtenção de licença de habitabilidade de efectuar obras na cave do seu prédio e onde v/vive com a família. Desta forma solicito que, dentro do prazo de 15 dias, me comunique se está disponível para libertar a cave, entregando-a livre de pessoas e coisas, para se proceder às indispensáveis obras que, como é do seu conhecimento, passam pelo desaterro da cave. Aguardando a sua resposta.”
4. Os réus, porém, nem nessa data, nem posteriormente fizeram a entrega da cave.*O DIREITO
Estatui o art. 28-A do Cód. do Proc. Civil, no seu nº 1, que «devem ser propostas por marido e mulher, ou por um deles com consentimento do outro, as acções de que possa resultar a perda ou oneração de bens que só por ambos possam ser alienados ou a perda de direitos que só por ambos possam ser exercidos, incluindo as acções que tenham por objecto, directa ou indirectamente, a casa de morada de família.»
Deste modo, para que haja litisconsórcio necessário activo entre os cônjuges requer-se, em primeiro lugar, que as normas de direito substantivo (art. 1682 e segs. do Cód. Civil) exijam a intervenção de ambos em negócios de disposição, ou semelhantes, do direito a que a acção se reporta e, em segundo lugar, que considerado o objecto do processo, a eventual improcedência do pedido tenha um resultado equivalente à perda ou oneração desse direito, seja ele um direito real ou um direito de outra natureza.[1]
Tem assim que ser intentada por ambos os cônjuges – ou por um deles com o consentimento do outro - a acção de reivindicação de um imóvel a ambos pertencente, situação que é a dos presentes autos.[2] 
Acontece que no caso “sub judice” tendo a acção sido proposta apenas pelo marido, este logo na petição inicial, a fim de assegurar o litisconsórcio necessário activo imposto pelo art. 28-A, nº 1 do Cód. do Proc. Civil, veio requerer a intervenção principal da sua mulher, E………. . 
Intervenção principal que viria a ser admitida por despacho de fls. 51/2, sucedendo, porém, que, citada para os efeitos do art. 327 do Cód. do Proc. Civil, a interveniente nada veio dizer.
Isto é, a mulher do autor não interveio nos autos – não apresentou articulado próprio, não declarou fazer seus os articulados do autor, nem tão pouco constituiu mandatário.
Tal como nada disse até ao encerramento da discussão da causa. 
Acresce que na petição inicial o próprio autor alegou no seu art. 4 que “no caso concreto a sua mulher recusou estar na acção ao lado do seu marido”.
Daqui resulta que a mulher do autor não prestou a este o consentimento exigido pelo art. 28-A, nº 1 do Cód. do Proc. Civil, verificando-se existir quanto a este ponto uma situação de falta de acordo.
Ora, neste caso, ter-se-à que atentar no nº 2 do dito art. 28-A, onde se estatui o seguinte: «Na falta de acordo o tribunal decidirá sobre o suprimento do consentimento, tendo em consideração o interesse da família, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no art. 25.»
Este nº 2 corresponde ao nº 2 do art. 18 do Cód. do Proc. Civil, na anterior redacção, prevendo o suprimento judicial do desacordo dos cônjuges quanto à propositura da acção. A parte final do preceito remete para o estatuído no art. 25 acerca da falta de autorização para a parte estar em juízo como autor, o que constitui desvio ou especialidade relativamente à pura aplicação das regras atinentes à legitimidade.
Deste modo, apesar do novo enquadramento sistemático da matéria, que foi deslocada da secção que trata da capacidade judiciária para a que respeita à legitimidade das partes[3], continua a vigorar regime estritamente idêntico ao que decorria do antigo nº 3 do art. 25 do Cód. do Proc. Civil, equiparando-se de modo expresso a falta de consentimento conjugal à necessidade de autorização para o representante da parte estar em juízo como autor.[4]
Como tal, atendendo a que a mulher do autor não prestou o seu consentimento, nem antes da propositura da acção, nem depois quando foi chamada a intervir, haveria que ter dado cumprimento ao que conjugadamente dispõem os arts. 28-A, nº 2 e 25 do Cód. do Proc. Civil.
Ou seja, deveria obter-se o suprimento judicial do consentimento e apenas, uma vez este concedido, no interesse da família, é que o cônjuge autor passaria a ter legitimidade para, só por si, conduzir a acção (cfr. também arts. 1425 do Cód. do Proc. Civil e 1684, nº 3 do Cód. Civil).
Verificando-se que nada disto sucedeu, deverão os réus, conforme por eles explanado nas suas alegações, ser absolvidos da instância, assim se julgando procedente o recurso interposto (cfr. art. 25, nº 2 do Cód. do Proc. Civil). *Refira-se ainda que embora a questão acabada de apreciar seja de encarar como questão nova, porquanto não fora colocada ao tribunal recorrido e por ele analisada[5], não está o tribunal de recurso impedido de conhecê-la, porquanto respeita à legitimidade das partes, matéria esta susceptível de conhecimento oficioso (cfr. art. 495 do Cód. do Proc. Civil).*Quanto à questão a decidir acima enunciada como alínea b), a mesma encontra-se prejudicada face à solução dada à questão a) – cfr. art. 660, nº 2 do Cód. do Proc. Civil.*Sumário (art. 713, nº 7 do Cód. do Proc. Civil):
- A acção de reivindicação de um imóvel pertencente a ambos os cônjuges tem de ser proposta por ambos ou por um deles com o consentimento do outro;
- Não tendo a mulher do autor prestado o seu consentimento à propositura da acção, uma vez que não o acompanhou nessa propositura e, chamada a intervir, não o quis fazer, haveria que obter decisão judicial de suprimento do consentimento, nos termos dos arts. 28-A, nº 2 e 25 do Cód. do Proc. Civil.*DECISÃO
Nos termos expostos, acordam os juízes que constituem este Tribunal em julgar procedente o recurso de apelação interposto pelos réus B………. e mulher C………., revogando-se a sentença recorrida e absolvendo-se os mesmos da instância.
Custas a cargo do autor/recorrido.

Porto, 5.1.2010
Eduardo Manuel B. Martins Rodrigues Pires
Mário João Canelas Brás
Manuel Pinto dos Santos

_________________________
[1] Cfr. Lebre de Freitas e outros, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 1º, 1ª ed., págs. 59/60.
[2] Cfr. Antunes Varela e outros, “Manual de Processo Civil”, 1ª ed., pág. 166; Ac. Rel. Lisboa de 16.2.2006, p. 274/2005-6 e Ac. Rel. Porto de 13.2.2003, p. 0330342, ambos disponíveis in www.dgsi.pt.
[3] A deslocação desta matéria para o terreno da legitimidade das partes impunha-se a partir do momento em que tendo sido equiparados os dois cônjuges em direitos e deveres pelo Dec. Lei nº 496/77, de 25.11., a mulher deixou de poder ter o tratamento de incapaz – cfr. Lebre de Freitas e outros, ob. cit., pág. 59.
[4] Cfr. Lopes do Rego, “Comentários ao Código de Processo Civil”, vol. I, 2ª ed., págs. 63/4. 
[5] Apreciada fora tão só a pertinência do incidente de intervenção principal provocada, que é questão diversa da agora suscitada e que poderia ter solucionado o problema da falta de consentimento da mulher do autor, caso esta, na sequência do chamamento, o tivesse prestado.

Proc. nº 581/08.0 TBVNG.P1 Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia – .º Juízo Cível Apelação Recorrentes: B………. e mulher C………. Recorrido: D………. Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Canelas Brás e Pinto dos Santos Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO O autor D………., solicitando a intervenção principal provocada de sua mulher, E………., intentou contra os réus C………. e mulher, D………., a presente acção declarativa de condenação sob a forma sumária, tendo pedido que lhes seja reconhecido o seu direito de propriedade sobre um prédio urbano sito na Rua ………., nº .., Pedroso, Vila Nova de Gaia, inscrito na matriz predial urbana sob o art. 3356 e que os réus lhes restituam a cave da casa que existe em tal prédio e que ocupam sem que disponham de qualquer título que legitime a sua posse. Mais pedem a quantia de €100,00, a título de sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso na entrega da coisa reivindicada. Contestaram os réus, invocando que ocupam a cave em questão ao abrigo de um contrato de arrendamento celebrado há mais de 20 anos. O autor apresentou articulado de resposta. Foi admitida a intervenção principal provocada activa de E………. . Esta, citada, nada disse. Ao abrigo do disposto no art. 787 do Cód. do Proc. Civil foi dispensada a realização de audiência preliminar. Proferiu-se despacho saneador, seleccionou-se a matéria de facto assente e organizou-se a base instrutória. Realizou-se audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo, tendo o tribunal respondido à matéria da base instrutória através do despacho de fls. 87/8, que não teve qualquer reclamação. Foi depois proferida sentença, na qual se decidiu: a) reconhecer autor e interveniente como donos e legítimos proprietários do prédio sito na Rua ………., nº .., composto por casa de cave, rés-do-chão e andar, anexos e logradouros, com a área coberta de 91 m2, de anexos de 12 m2 e descoberta de 257 m2, descrito na matriz sob o art. 3356 e descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o nº 02074/141288; b) condenar os réus a tal reconhecerem; c) condenar os réus a restituirem a cave de tal prédio, livre de pessoas e bens e à sua custa, ao autor e à interveniente; d) condenar os réus a indemnizar o autor na quantia de €150,00 por mês desde a data do trânsito em julgado desta sentença e até efectiva entrega da cave, a título de sanção pecuniária compulsória. Inconformados, os réus interpuseram recurso de apelação desta sentença, tendo finalizado as suas alegações com as segunites conclusões: 1ª A presente acção devia ter sido proposta pelo autor e por sua mulher, ou por um deles com o consentimento do outro. 2ª A mulher do autor (como o próprio reconhece) recusou-se a acompanhá-lo na propositura da acção e, chamada a intervir, não o quis fazer, pelo que apenas com o suprimento judicial do respectivo consentimento poderia ter ficado assegurada a legitimidade do autor. 3ª Foram violadas as disposições dos arts. 28-A, nºs 1 e 2 e 25 do Cód. do Proc. Civil. 4ª A resposta ao quesito 2º deve ser alterada para “provado” e, no que respeita ao quesito 3º, deve ser considerado provado que houve pagamento de renda por parte dos réus aos proprietários da cave, durante muitos anos, o que sucedeu até à recusa do autor em receber a renda, tudo com base no depoimento das testemunhas F………. e G………. . 5ª Estes depoimentos foram corroborados, no que às entregas respeitou, pelo depoimento da mulher do autor, sendo certo que é inverosímil que se tratasse de uma mera “ajuda” para a água e a luz, quer porque não eram contabilizados os gastos, quer por se tratar de montante muito elevado, para a época. 6ª A douta sentença recorrida violou, por errada interpretação e aplicação, o disposto nos arts. 1022 e 1311 do Cód. Civil. Pretende, por conseguinte, que a sentença recorrida seja revogada, sendo os réus absolvidos da instância ou do pedido. O autor apresentou resposta, pronunciando-se no sentido da confirmação do decidido. Cumpre então apreciar e decidir.*FUNDAMENTAÇÃO Aos presentes autos, face à data da entrada em juízo da petição inicial, é aplicável o regime de recursos resultante do Dec. Lei nº 303/2007, de 24.8.*O âmbito do recurso encontra-se delimitado pelas conclusões que nele foram apresentadas e que atrás se transcreveram – arts. 684, nº 3 e 685 – A, nº 1 do Cód. do Proc. Civil.*QUESTÕES A DECIDIR: a) Apurar se no presente caso, não existindo acordo dos cônjuges quanto à propositura da acção, teria que haver decisão judicial sobre o suprimento do consentimento, nos termos das disposições combinadas dos arts. 28-A, nº 2 e 25 do Cód. do Proc. Civil, a fim de ficar assegurada a legitimidade activa; b) Apurar se devem ser alteradas as respostas que foram dadas aos nºs 2 e 3 da base instrutória.*OS FACTOS A matéria fáctica dada como assente pela 1ª Instância é a seguinte: 1. Descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o nº 02074/141288 e aí definitivamente inscrito, por aquisição, a favor de D………. e E………., encontra-se o prédio urbano sito na Rua ………., nº .., composto por casa de cave, rés-do-chão e andar, anexos e logradouros, com a área coberta de 91 m2, de anexos de 12 m2 e descoberta de 257 m2, descrito na matriz sob o art. 3356. 2. Os réus ocupam a cave desse prédio. 3. Por intermédio do seu mandatário o autor, por correio com registo de 6.10.2005 enviou ao réu e esposa missiva com o seguinte teor: “Represento o seu pai, B………., que me informou que carece para a indispensável obtenção de licença de habitabilidade de efectuar obras na cave do seu prédio e onde v/vive com a família. Desta forma solicito que, dentro do prazo de 15 dias, me comunique se está disponível para libertar a cave, entregando-a livre de pessoas e coisas, para se proceder às indispensáveis obras que, como é do seu conhecimento, passam pelo desaterro da cave. Aguardando a sua resposta.” 4. Os réus, porém, nem nessa data, nem posteriormente fizeram a entrega da cave.*O DIREITO Estatui o art. 28-A do Cód. do Proc. Civil, no seu nº 1, que «devem ser propostas por marido e mulher, ou por um deles com consentimento do outro, as acções de que possa resultar a perda ou oneração de bens que só por ambos possam ser alienados ou a perda de direitos que só por ambos possam ser exercidos, incluindo as acções que tenham por objecto, directa ou indirectamente, a casa de morada de família.» Deste modo, para que haja litisconsórcio necessário activo entre os cônjuges requer-se, em primeiro lugar, que as normas de direito substantivo (art. 1682 e segs. do Cód. Civil) exijam a intervenção de ambos em negócios de disposição, ou semelhantes, do direito a que a acção se reporta e, em segundo lugar, que considerado o objecto do processo, a eventual improcedência do pedido tenha um resultado equivalente à perda ou oneração desse direito, seja ele um direito real ou um direito de outra natureza.[1] Tem assim que ser intentada por ambos os cônjuges – ou por um deles com o consentimento do outro - a acção de reivindicação de um imóvel a ambos pertencente, situação que é a dos presentes autos.[2] Acontece que no caso “sub judice” tendo a acção sido proposta apenas pelo marido, este logo na petição inicial, a fim de assegurar o litisconsórcio necessário activo imposto pelo art. 28-A, nº 1 do Cód. do Proc. Civil, veio requerer a intervenção principal da sua mulher, E………. . Intervenção principal que viria a ser admitida por despacho de fls. 51/2, sucedendo, porém, que, citada para os efeitos do art. 327 do Cód. do Proc. Civil, a interveniente nada veio dizer. Isto é, a mulher do autor não interveio nos autos – não apresentou articulado próprio, não declarou fazer seus os articulados do autor, nem tão pouco constituiu mandatário. Tal como nada disse até ao encerramento da discussão da causa. Acresce que na petição inicial o próprio autor alegou no seu art. 4 que “no caso concreto a sua mulher recusou estar na acção ao lado do seu marido”. Daqui resulta que a mulher do autor não prestou a este o consentimento exigido pelo art. 28-A, nº 1 do Cód. do Proc. Civil, verificando-se existir quanto a este ponto uma situação de falta de acordo. Ora, neste caso, ter-se-à que atentar no nº 2 do dito art. 28-A, onde se estatui o seguinte: «Na falta de acordo o tribunal decidirá sobre o suprimento do consentimento, tendo em consideração o interesse da família, aplicando-se, com as necessárias adaptações, o disposto no art. 25.» Este nº 2 corresponde ao nº 2 do art. 18 do Cód. do Proc. Civil, na anterior redacção, prevendo o suprimento judicial do desacordo dos cônjuges quanto à propositura da acção. A parte final do preceito remete para o estatuído no art. 25 acerca da falta de autorização para a parte estar em juízo como autor, o que constitui desvio ou especialidade relativamente à pura aplicação das regras atinentes à legitimidade. Deste modo, apesar do novo enquadramento sistemático da matéria, que foi deslocada da secção que trata da capacidade judiciária para a que respeita à legitimidade das partes[3], continua a vigorar regime estritamente idêntico ao que decorria do antigo nº 3 do art. 25 do Cód. do Proc. Civil, equiparando-se de modo expresso a falta de consentimento conjugal à necessidade de autorização para o representante da parte estar em juízo como autor.[4] Como tal, atendendo a que a mulher do autor não prestou o seu consentimento, nem antes da propositura da acção, nem depois quando foi chamada a intervir, haveria que ter dado cumprimento ao que conjugadamente dispõem os arts. 28-A, nº 2 e 25 do Cód. do Proc. Civil. Ou seja, deveria obter-se o suprimento judicial do consentimento e apenas, uma vez este concedido, no interesse da família, é que o cônjuge autor passaria a ter legitimidade para, só por si, conduzir a acção (cfr. também arts. 1425 do Cód. do Proc. Civil e 1684, nº 3 do Cód. Civil). Verificando-se que nada disto sucedeu, deverão os réus, conforme por eles explanado nas suas alegações, ser absolvidos da instância, assim se julgando procedente o recurso interposto (cfr. art. 25, nº 2 do Cód. do Proc. Civil). *Refira-se ainda que embora a questão acabada de apreciar seja de encarar como questão nova, porquanto não fora colocada ao tribunal recorrido e por ele analisada[5], não está o tribunal de recurso impedido de conhecê-la, porquanto respeita à legitimidade das partes, matéria esta susceptível de conhecimento oficioso (cfr. art. 495 do Cód. do Proc. Civil).*Quanto à questão a decidir acima enunciada como alínea b), a mesma encontra-se prejudicada face à solução dada à questão a) – cfr. art. 660, nº 2 do Cód. do Proc. Civil.*Sumário (art. 713, nº 7 do Cód. do Proc. Civil): - A acção de reivindicação de um imóvel pertencente a ambos os cônjuges tem de ser proposta por ambos ou por um deles com o consentimento do outro; - Não tendo a mulher do autor prestado o seu consentimento à propositura da acção, uma vez que não o acompanhou nessa propositura e, chamada a intervir, não o quis fazer, haveria que obter decisão judicial de suprimento do consentimento, nos termos dos arts. 28-A, nº 2 e 25 do Cód. do Proc. Civil.*DECISÃO Nos termos expostos, acordam os juízes que constituem este Tribunal em julgar procedente o recurso de apelação interposto pelos réus B………. e mulher C………., revogando-se a sentença recorrida e absolvendo-se os mesmos da instância. Custas a cargo do autor/recorrido. Porto, 5.1.2010 Eduardo Manuel B. Martins Rodrigues Pires Mário João Canelas Brás Manuel Pinto dos Santos _________________________ [1] Cfr. Lebre de Freitas e outros, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 1º, 1ª ed., págs. 59/60. [2] Cfr. Antunes Varela e outros, “Manual de Processo Civil”, 1ª ed., pág. 166; Ac. Rel. Lisboa de 16.2.2006, p. 274/2005-6 e Ac. Rel. Porto de 13.2.2003, p. 0330342, ambos disponíveis in www.dgsi.pt. [3] A deslocação desta matéria para o terreno da legitimidade das partes impunha-se a partir do momento em que tendo sido equiparados os dois cônjuges em direitos e deveres pelo Dec. Lei nº 496/77, de 25.11., a mulher deixou de poder ter o tratamento de incapaz – cfr. Lebre de Freitas e outros, ob. cit., pág. 59. [4] Cfr. Lopes do Rego, “Comentários ao Código de Processo Civil”, vol. I, 2ª ed., págs. 63/4. [5] Apreciada fora tão só a pertinência do incidente de intervenção principal provocada, que é questão diversa da agora suscitada e que poderia ter solucionado o problema da falta de consentimento da mulher do autor, caso esta, na sequência do chamamento, o tivesse prestado.