Processo:385/08.0TTOAZ.P1
Data do Acordão: 21/02/2010Relator: PAULA LEAL DE CARVALHOTribunal:trp
Decisão: Meio processual:

I - Consubstanciando a relação jurídica entre o Estado e o trabalhador um contrato de trabalho e não um contrato de prestação de serviços, não lhe é aplicável o art. 100, nº 6, do DL 184/89, de 14.06, na redacção dada pela Lei 25/98, de 26.05. II - No domínio do DL 427/89, de 07.12 (alterado pelo DL 218/98, de 17.06), era proibida a celebração, pelo Estado, de contrato de trabalho por tempo indeterminado, proibição essa que é absoluta, englobando por isso, a contratação tácita a contratação originária e a contratação por conversão” (Acórdão do STJ de 10.12.09, www.dgsi.pt. Proc. 6/08. 1TTPTG.S1). III - A Lei 23/04, de 22.06 veio admitir, no seio da administração Pública, o contrato de trabalho sem termo, condicionando, porém, a sua celebração a diversos requisitos, designadamente à forma escrita e à observância de um prévio processo de selecção de candidatos subordinado aos princípios da publicitação da oferta de trabalho, da igualdade de condições e oportunidades, com fundamentação da decisão de contratação em critérios objectivos (art. 5º da referida lei). IV - Porém, não obstante essa admissibilidade, tendo em conta o entendimento sufragado, com força obrigatória geral, nos Acórdãos do Tribunal Constitucional 368/2000 (DR IS-A, de 30.11.2000) e 61/2004 (DR IS-A, de 27.02.2004), bem como a jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça (cfr., por todos, Acórdãos de 14.1107, 18.06.08, 01.10.08, 26.11.08, 01.07.09, 25.11.09 e 03.02.10, ii w si. t, Processos 0852451, 06S2445m 08S1536, 08S1982, 08S3443, 1846/06.1YRCBR.S1 e 387/09OYFLSB), a contratação sem termo pelo Estado, seja ela tácita, originária ou por conversão, será inconstitucional, por violação do art. 47°, n° 2, da CRP, se não observar um prévio processo concursório que garanta o referido princípio de igualdade de condições e de oportunidade de acesso. V - Como consequência de um despedimento ilícito ocorrido no âmbito de um contrato de trabalho nulo, o trabalhador tem direito ás retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao momento em que a invocação da nulidade foi notificada ao trabalhador ou, não sendo invocada, até ao momento em que é declarada oficiosamente pelo tribunal. VI - A nulidade do contrato de trabalho impede, em caso de despedimento ilícito, a reintegração, mas confere o direito à indemnização de antiguidade caso por ela o trabalhador haja optado até à sentença, não cabendo, porém, no âmbito dos poderes oficiosos do tribunal condenar no pagamento dessa indemnização se o trabalhador, tendo embora formulado, em alternativa, o pedido de reintegração ou indemnização, não procedeu a essa opção até ao referido momento.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
PAULA LEAL DE CARVALHO
Descritores
ESTADO CONTRATO DE TRABALHO DESPEDIMENTO ILÍCITO
No do documento
Data do Acordão
02/22/2010
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO.
Decisão
PROVIDO PARCIALMENTE.
Sumário
I - Consubstanciando a relação jurídica entre o Estado e o trabalhador um contrato de trabalho e não um contrato de prestação de serviços, não lhe é aplicável o art. 100, nº 6, do DL 184/89, de 14.06, na redacção dada pela Lei 25/98, de 26.05. II - No domínio do DL 427/89, de 07.12 (alterado pelo DL 218/98, de 17.06), era proibida a celebração, pelo Estado, de contrato de trabalho por tempo indeterminado, proibição essa que é absoluta, englobando por isso, a contratação tácita a contratação originária e a contratação por conversão” (Acórdão do STJ de 10.12.09, www.dgsi.pt. Proc. 6/08. 1TTPTG.S1). III - A Lei 23/04, de 22.06 veio admitir, no seio da administração Pública, o contrato de trabalho sem termo, condicionando, porém, a sua celebração a diversos requisitos, designadamente à forma escrita e à observância de um prévio processo de selecção de candidatos subordinado aos princípios da publicitação da oferta de trabalho, da igualdade de condições e oportunidades, com fundamentação da decisão de contratação em critérios objectivos (art. 5º da referida lei). IV - Porém, não obstante essa admissibilidade, tendo em conta o entendimento sufragado, com força obrigatória geral, nos Acórdãos do Tribunal Constitucional 368/2000 (DR IS-A, de 30.11.2000) e 61/2004 (DR IS-A, de 27.02.2004), bem como a jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça (cfr., por todos, Acórdãos de 14.1107, 18.06.08, 01.10.08, 26.11.08, 01.07.09, 25.11.09 e 03.02.10, ii w si. t, Processos 0852451, 06S2445m 08S1536, 08S1982, 08S3443, 1846/06.1YRCBR.S1 e 387/09OYFLSB), a contratação sem termo pelo Estado, seja ela tácita, originária ou por conversão, será inconstitucional, por violação do art. 47°, n° 2, da CRP, se não observar um prévio processo concursório que garanta o referido princípio de igualdade de condições e de oportunidade de acesso. V - Como consequência de um despedimento ilícito ocorrido no âmbito de um contrato de trabalho nulo, o trabalhador tem direito ás retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao momento em que a invocação da nulidade foi notificada ao trabalhador ou, não sendo invocada, até ao momento em que é declarada oficiosamente pelo tribunal. VI - A nulidade do contrato de trabalho impede, em caso de despedimento ilícito, a reintegração, mas confere o direito à indemnização de antiguidade caso por ela o trabalhador haja optado até à sentença, não cabendo, porém, no âmbito dos poderes oficiosos do tribunal condenar no pagamento dessa indemnização se o trabalhador, tendo embora formulado, em alternativa, o pedido de reintegração ou indemnização, não procedeu a essa opção até ao referido momento.
Decisão integral
Procº nº 385/08.0TTOAZ.P1 Apelação  
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 278)
Adjuntos: Des. André da Silva
                Des. Machado da Silva (Reg. nº 1360)



Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:


I. Relatório:


B………., intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra o ESTADO PORTUGUÊS, pedindo que: 
-Seja declarada a existência, validade e eficácia de um contrato de trabalho subordinado sem termo entre si e a C………. vigente desde 18.1.1999 e, em consequência, declarada a ilicitude do seu despedimento, por não ter sido precedido de processo disciplinar e o R. condenado: 
a) no pagamento dos subsídios de férias e de Natal vencidos durante a vigência do contrato, no total de € 9.636,02. 
b) no pagamento da importância correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde da data do despedimento até à efectiva execução da sentença. 
c) na reintegração sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, ou caso venha a exercer o seu direito de opção, na indemnização prevista no art. 439º, nº1 do C.Trabalho. 
d) no pagamento da indemnização por danos morais na quantia de € 5.363,98. 
Para tanto alegou, em síntese, que: 
Em 18.1.1999, celebrou com a C………. um contrato para exercer para esta o controlo de processamento de materiais de risco específico e subprodutos de animais de talho e caça nas unidades de transformação de subprodutos, sendo tal contrato denominado de Prestação de Serviços em Regime de Tarefa celebrado pelo prazo de 5 meses; em 17.6.1999 outorgou novo contrato com o mesmo objecto, desta feita designado de Contrato de Prestação de Serviços em Regime de Avença, o qual teve sucessivos aditamentos até 31.3.2006, data em que subscreveu outro contrato intitulado de prestação de serviços em regime de avença para o exercício das mesmas funções, contrato esse que foi rescindido por comunicação de 2.5.2007, com efeitos a partir de 30.6.2007. 
Não obstante a designação dos contratos durante todo o referido período nunca exerceu as suas funções para que foi contratada de forma independente e com autonomia técnica mas antes sob as ordens, direcção e fiscalização da C………., pelo que o contrato realmente existente sempre foi um contrato de trabalho subordinado. 

O Estado, representado pelo Ministério Público, aos 17.07.2008, contestou, por excepção, invocando a incompetência material do Tribunal, e por impugnação, aduzindo que a A. nunca actuou na dependência e sob a autoridade e direcção do R., sendo por isso de prestação de serviços a relação contratual com a mesma estabelecida e que, caso venha a entender-se que o contrato existente foi um contrato de trabalho subordinado, o mesmo será nulo por violação de normas imperativas e, em consequência, só produz efeitos durante o período que está em execução, podendo qualquer das partes pôr-lhe termo a todo instante, pelo que a comunicação de rescisão não traduz qualquer despedimento ilícito e a pretensão da A., só poderá proceder relativamente aos subsídios de férias e de Natal peticionados. 

A contestação foi notificada à A., por correio registado expedido aos 28.07.2008, tendo esta respondido no sentido da improcedência da excepção.

Foi proferido o despacho saneador, no qual se julgou improcedente a excepção de incompetência do Tribunal em razão da matéria, afirmando-se a validade e regularidade da instância. 

Dispensada a selecção da matéria de facto, realizada a audiência de discussão e julgamento, decidida a matéria de facto, que não foi objecto de qualquer reclamação, proferiu-se sentença absolvendo o réu de todos os pedidos contra ele formulados. 

Inconformada, veio a Autora recorrer, formulando, a final das suas alegações, as seguintes conclusões:
I. Contrato de trabalho é aquele mediante o qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta (cfr. arts. 1º da L.C.T., 10º do Código do Trabalho e 1152º do Código Civil).
É pacífico que a subordinação jurídica do trabalhador à sua entidade patronal constitui o elemento essencial caracterizador do contrato de trabalho, subordinação que a douta sentença sob recurso peremptoriamente reconhece ter existido.
De facto, a concatenação dos diversos elementos factuais (mormente, pontos 23. a 29. dos factos provados) quanto ao modo de organização da actividade profissional da Recorrente, levam-nos, indiscutivelmente, à qualificação do contrato em causa como um verdadeiro e próprio contrato de trabalho subordinado, apesar do nomen juris que lhe foi atribuído, o qual terá de ser considerado sem termo, uma vez que à data da comunicação da rescisão unilateral (datada de 02/05/2007 – cfr. ponto 20. dos factos provados), “não existia qualquer contrato escrito em vigor desde 31/03/2007” (cfr. ponto 21. Dos factos provados) – artigo 131º, n.º 4 do Código do Trabalho.
I.1 – Mostram-se violados os artigos 10º do Código do Trabalho e 1152º do Código Civil, artigo 131º, n.º 4 do Código do Trabalho, bem como o artigo 10º do D.L. 184/89 de 2 de Junho, por errada interpretação.
II. Estando perante um contrato de trabalho subordinado, não tem aplicação o regime previsto no artigo 10.º, n.º 6, do Decreto-Lei n.º 184/89, de 14 de Junho, convocado na douta sentença sob recurso.
Ao estabelecer que “são nulos todos os contratos de prestação de serviços, seja qual for a forma utilizada, para o exercício de actividades subordinadas, sem prejuízo da produção de todos os seus efeitos como se fossem válidos em relação ao tempo durante o qual estiveram em execução”, estriba-se no necessário pressuposto de que outro contrato não haja sido o contrato efectivamente celebrado – Acórdãos do STJ de 12-02-2009 e de 25-03-2009, respectivamente, processos 08S2583 e 08S3260 in www.dgsi.pt.
Estando perante um contrato de trabalho subordinado, a consequência é esse contrato passar a reger-se pelas leis laborais de direito privado ou pelo regime da constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego público, consignado no Decreto-Lei nº 427/89, consoante o contrato em causa possa ser considerado como contrato de trabalho por tempo indeterminado ou contrato de trabalho a termo certo, nos termos previstos no art.º 115.º do Código do Trabalho: “o contrato de trabalho declarado nulo ou anulado produz, efeitos como se fosse válido em relação ao tempo durante o qual esteve em execução (…)”.
No caso vertente, sendo o contrato em causa necessariamente qualificado como de trabalho, deve em consequência ser o Recorrido condenado no pagamento dos subsídios de férias e de Natal referentes ao período de vigência do contrato, no montante pedido de 9.636,02€ (nove mil seiscentos e trinta e seis euros e dois cêntimos), ao qual acrescem os juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, uma vez que, conforme consta do ponto 30. dos factos provados “a C………., desde a data da contratação da A., sempre lhe pagou a remuneração apenas durante 12 meses por ano, nunca lhe tendo pago qualquer quantia a título de subsídio de férias ou de Natal”.
De resto, salvo melhor opinião, outra conclusão não é possível, sob pena de a mesma redundar numa absoluta injustiça e num ilegítimo benefício para o infractor que acabaria por ver assim prevalecer os efeitos do contrato ficcionado – através da designação do qual pretendia assumir uma posição contratual menos gravosa – sobre o efectivamente executado.
II.1 - Mostra-se violado, por errada interpretação o artigo 10º do D.L. 184/89 de 2 de Junho, bem como art.º 254º e 255º do CT.
III. Conforme as conclusões precedentes, no caso concreto estamos perante um contrato de trabalho subordinado e não de prestação de serviços como foi designado pelas partes.
No caso vertente, o Recorrido nunca invocou qualquer nulidade do contrato para colocar termo à relação contratual laboral que mantinha com a Recorrente, limitando-se a denunciar unilateralmente o contrato de trabalho sem observação das disposições legais (cfr. ponto 20. dos factos provados), não tendo, designadamente, sido precedido de processo disciplinar (arts. 382 e ss do CT).
Assim, nos termos do disposto nos artigos 436º, 437º, 438º e 439º do Código do Trabalho, tem a Recorrente direito ao pagamento da importância correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do seu despedimento até ao trânsito em julgado da decisão, acrescida dos juros legais, bem como à sua reintegração, nos termos legais. A ser entendido que a especificidade da entidade contratante - o Estado - impossibilita a reintegração, deve o Julgador, ao invés de se limitar a absolver o Estado, aplicar, oficiosamente, a alternativa consagrada na lei, condenando-a a efectuar o pagamento de uma indemnização de antiguidade, a qual, face aos termos em que foi feito o despedimento, deverá ser fixada em 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade.
III.1 – Mostram-se violados, os artigos 116º, 382º e seguintes, 436º, 437º, 438º e 439º, todos do Código do Trabalho, os quais impunham e impõem a consideração da ilicitude do despedimento da Recorrente com as legais consequências.
IV. Consta dos factos provados, sob 31.: “a A. mercê do período de tempo porque se prolongou a relação contratual acreditou que acabaria por ser integrada na Função Pública”.
Durante os oito anos e meio em que a Recorrente esteve ao serviço do recorrido (desde 18/01/1999 até 30/06/2007) tendo sempre cumprido “as sua tarefas com zelo, dedicação e empenhamento” (23. dos factos provados) criou naturalmente a confiança e expectativa de que iria integrar os quadros de pessoal efectivo daquele.
A frustração dessa relevante expectativa na sua carreira profissional, dimensão manifestamente fundamental da realização pessoal de cada indivíduo, não pode pois deixar de ser indemnizada em termos de danos morais, a valorar nos termos gerais, perante os quais se mostram adequados os peticionados €5 363,98.
IV.1 – Mostra-se violado o disposto no art. 496º do Código Civil.

O Recorrido contra-alegou pugnando pelo não provimento do recurso ou, quando assim se não entenda, pela sua condenação, apenas, no pagamento dos subsídios de férias e de Natal relativos ao período efectivo de execução do contrato.

O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto teve “vista” no processo.

Foram colhidos os vistos legais.*II. Matéria de Facto Provada 
É a seguinte a matéria de facto dada como provada na 1ª instância:

1. Em 18/01/1999, a A. celebrou com a C………., um contrato para exercer para esta o controlo de processamento de materiais de risco específico e subprodutos dos animais de talho e caça (mamíferos) nas unidades de transformação de sub produtos. 

2. Tal contrato foi reduzido a escrito, epigrafado de “Contrato de Prestação de Serviços em Regime de Tarefa” e consta do mesmo, inserto a fls 27 dos autos, que era celebrado ao abrigo do disposto no art. 17º do DL n.º 41/84, de 3 de Fevereiro, dando-se aqui por integralmente reproduzido o respectivo teor. 

3. Inicialmente foi outorgado pelo prazo de 5 meses, com o motivo de nos serviços da aludida C……… não existirem funcionários ou agentes em número suficiente e em condições materiais e legais adequadas ao exercício das funções para que a A. foi contratada (cfr. cláusula terceira e quarta), comprometendo-se a C………. a pagar à A., mensalmente, a quantia de 90.000$00 (448,92€) – cfr. cláusula segunda. 

4. Em 17/06/1999, a A. celebrou com a mesma entidade novo contrato, que se mostra junto a fls 28, desta feita denominado de “Contrato de Prestação de Serviços em Regime de Avença”, para, no mesmo local, desempenhar as mesmas funções, descritas em 1., mediante o pagamento da mesma importância. 

5. Este contrato foi celebrado para o período de 17/06/1999 a 31/12/1999 e sob a invocação dos mesmos motivos indicados no primeiro contrato. 

6. A este segundo contrato foi, com a data de 01/01/2000, feito um aditamento, inserto a fls 29, segundo o qual a cláusula segunda passaria a referir que a quantia a pagar pela C………. à A. no final de cada mês seria de 95.000$00 (473,86€), 

7. E da cláusula quarta e sétima passaria a constar que o contrato seria válido de 01/01/2000 a 31/12/2000. 

8. Com data de 12/02/2001, foi outorgado um novo aditamento ao contrato de avença, inserto a fls 30, segundo o qual o contrato passava a vigorar pelo período de 01/01/2001 a 31/12/2001 – nova redacção da cláusula quarta e sétima – e a quantia a pagar mensalmente pela C………. à A., passava a ser de 115.700$00 (577,11€) – nova redacção da cláusula segunda. 

9. Datado de 25/01/2002, foi outorgado mais um aditamento ao contrato de avença, inserto a fls 31, através do qual o dito contrato passava a vigorar pelo período de 01/01/2002 a 31/12/2002 (nova redacção da cláusula quarta e sétima), mantendo-se todas as outras condições, designadamente, quanto à quantia a pagar mensalmente pela C………. à A.. 

10. Com data de 04/11/2002, foi outorgado um novo aditamento ao contrato de avença, inserto a fls 32 verso, pelo qual o contrato passou a ser válido até 31/12/2003. 

11. Mais uma vez, datado de 05/01/2004, foi subscrito novo aditamento ao contrato de avença, inserto a fls 34, segundo o qual o contrato passaria a ser válido até 31/12/2004. 

12. Em 14/01/2005, foi outorgado um novo aditamento ao contrato de avença, inserto a fls 35 verso, que prorrogou “até 31/12/2005, a vigência do contrato de avença celebrado, em 18/01/1999, para o exercício de funções de “CONTROLO DE SUBPRODUTOS”. 

13. Com data de 13/02/2006, foi firmado um novo aditamento ao contrato de avença, inserto a fls 36, pelo qual a vigência do contrato foi prorrogada até 31/03/2006. 

14. Este aditamento foi remetido por carta, inserta a fls 37, como habitualmente com data posterior à do início da vigência do aditamento, segundo a qual o contrato apenas seria prorrogado por essa última vez, de 01/01/2006 a 31/03/2006. 

15. Mas, com data 01/04/2006, a A. e a C………., outorgaram um novo “Contrato de Prestação de Serviços em Regime de Avença”, inserto a fls 38. 

16. Nos termos deste contrato, para vigorar entre 01/04/2006 e 31/03/2007, a A. ia desempenhar as “tarefas inerentes ao controlo de subprodutos higidos, de material de risco específico (MRE) e de abate de Bovinos com mais de 30 meses, visando colmatar a inexistência de funcionários ou agentes, nos serviços da C1………., em número suficiente e em condições materiais e legais adequadas ao exercício daquelas funções” – cfr. cláusula primeira e sexta. 

17. Como contrapartida, a C………. pagava à A. a quantia mensal de 662,86 euros – cfr. cláusula segunda. 

18. A A. exerceria as suas funções na D………., sita em ………., e teria que cumprir o respectivo horário de funcionamento, sem prejuízo de, no decurso da vigência do contrato, lhe vir a ser atribuído novo local de trabalho – cfr. cláusula terceira. 

19. Foi acordado também que a A. poderia, por razões ponderosas ao serviço, ser chamada “a realizar, cumulativamente, tarefas em local diverso, havendo lugar à compensação pelos trabalhos prestados a mais e de eventuais despesas de deslocação, processados a título de honorários, e apurados de acordo com as regras legais aplicáveis a funcionários e agentes para idênticas situações” – cfr. cláusula quarta. 

20. Entretanto, datada de 2/05/2007, a A. recebeu uma carta, inserta a fls 39, assinada pelo Director Regional respectivo, a qual comunica a rescisão unilateral do contrato com efeitos a partir de 30/06/2007. 

21. Não existia qualquer contrato escrito em vigor desde 31/03/2007. 

22. Posteriormente, por carta com data de 21/05/2007, foi remetido à A. um aditamento ao contrato de avença, datado de 28/02/2007, inserto a fls 40 v, segundo o qual “mantêm-se inalteradas as cláusulas contratuais constantes do contrato celebrado em 01.04.2006, passando o mesmo a vigorar até 30.06.2007. 

23. A A., desde 18/1/1999 até 30/06/2007, manteve-se ininterruptamente ao serviço da C………. e sempre cumpriu as suas tarefas com zelo, dedicação e empenhamento. 

24. Desde a data da contratação da A., esta esteve sempre sujeita às ordens, direcção e fiscalização da C………. . 

25. Assim, quanto ao local de prestação de trabalho: a A. executava o seu trabalho inicialmente na empresa “E………., Lda”, conforme disposição da C………., que a partir de 01/04/2007 ordenou a sua transferência para a “F……….., Lda”, onde passou a prestar funções; 

26. A A. comparecia nas instalações da “E………., Lda”, de segunda a sábado, das 6h00 às 12h00, e depois na “F……….., Lda”, das 8h00 às 16h00, com interrupção para almoço das 12h00 às 13h00, conforme definido pela entidade empregadora, a C……….; 

27.O trabalho da A. consistia no controlo sanitário das carcaças e subprodutos como farinhas, que, respectivamente, entravam e saiam das referidas empresas, tendo a A. que elaborar mapas, os quais eram feitos mediante orientações, instruções e ordens precisas da C………., directamente emanadas do seu responsável hierárquico, na altura, o Sr. Dr. G………., utilizando para o efeito, na empresa E………., Lda”, os modelos fornecidos pela C……… que preenchia à mão, e na empresa “F………, Lda.”, um computador e sistema informático, propriedade do H……… .

28. Três a quatro vezes por ano, a A. e os seus colegas eram convocados para reuniões, nas quais eram dadas instruções e explicados procedimentos a adoptar no exercício das funções a realizar. 

29. O trabalho da A. era sujeito a fiscalização, a qual era levada a cabo, designadamente, pelo Sr. Dr. G………., o seu superior hierárquico, bem como pelo Sr. I………, secretário, e pelo Veterinário que acompanhava este nas inspecções que regularmente eram feitas, e durante as quais eram anotadas falhas, lapsos ou erros técnicos eventualmente cometidos pela A. e atrasos nas entregas dos mapas que esta tinha que elaborar até ao dia 8 de cada mês, sendo a A. igualmente controlada quanto à assiduidade e pontualidade em função do respectivo horário, tal como sucedia com os colegas que trabalhavam nas mesmas circunstâncias, tendo um deles sido dispensado, por sucessivamente incumprir o horário de trabalho. 

30. A C………., desde a data da contratação da A., sempre lhe pagou a remuneração apenas durante 12 meses por ano, nunca lhe tendo pago qualquer quantia a título de subsídio de férias e de Natal. 

31. A A. mercê do período de tempo porque se prolongou a relação contratual acreditou que acabaria por ser integrada na Função Pública. *III. Do Direito

1. Nos termos do disposto nos artºs 684º, nº 3, e 685º-A, nº 1, do CPC, na redacção introduzida pelo DL 303/2007, de 24.08, aplicáveis ex vi do disposto nos artºs 1º, nº 2, al. a), e 87º do CPT (de 2000), as conclusões formuladas pelo recorrente delimitam o objecto do recurso, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso. E, daí, que sejam as seguintes as questões a apreciar:

A. Se, consubstanciando a relação jurídica havida entre as partes um contrato de trabalho, não tem aplicação o art. 10º, nº 6, do DL 184/89, de 14.06, na redacção dada pela Lei 25/98, de 26.05;
B. Se são devidos os subsídios de férias e de natal;
C. Do despedimento ilícito e suas consequências;
D. Dos danos não patrimoniais.

2. Da 1ª questão
Se, consubstanciando a relação jurídica havida entre as partes um contrato de trabalho, não tem aplicação o art. 10º, nº 6, do DL 184/89, de 14.06, na redacção dada pela Lei 25/98, de 26.05.

2.1. O entendimento da sentença recorrida[1] foi, em síntese, o seguinte: pese embora denominados de contratos de prestação de serviços, a relação entre as partes desenrolou-se de forma subordinada, característica própria do contrato de trabalho, pelo que, tendo o réu Estado recorrido ilegalmente à celebração de contratos de prestação de serviços, a situação caía sob a alçada do nº 6 do art. 10º do DL 184/89, de 02.06, na redacção dada pela Lei 25/98, de 26.05, o que determina a nulidade dos referidos contratos; produzindo o contrato nulo, nos termos desse preceito, os seus efeitos como se válido fosse em relação ao tempo durante o qual esteve em execução, esses efeitos são os que resultam do contrato tal como ele foi celebrado entre as partes; assim, o trabalhador, por referência ao período de execução do contrato, não pode reclamar quaisquer direitos que lhe pudessem derivar da qualificação jurídica da relação contratual como contrato de trabalho, designadamente retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal e indemnização de antiguidade.

A sentença recorrida não põe em causa que, não obstante o nomen juris atribuído pelas partes aos contratos, a relação jurídica entre elas mantida foi executada de forma subordinada, correspondendo, materialmente, a um contrato de trabalho, o que não é também questionado pelo Réu nas contra-alegações, nas quais aliás refere que “um juízo de globalidade sobre os elementos factuais quanto ao modo de organização da actividade profissional da Recorrente, leva-nos, indiscutivelmente, à qualificação do contrato em causa como um verdadeiro e próprio contrato de trabalho;”, realçando para o efeito, o que consta dos nºs 25, 27, 28 e 29 dos factos provados e acrescentando “(…) Resulta assim com toda a evidência que a Recorrente não actuava como profissional liberal, mas antes como uma trabalhadora subordinada, em nada inquinando esta conclusão o facto de a Recorrente por exemplo nunca ter recebido os subsídios de férias e de Natal, sendo remunerada apenas doze vezes por ano (…)” e citando a esse propósito, o Acórdão do STJ de 15.02.2005, in www.dgsi.pt, Processo 04S3583.
Ou seja, não está em causa no recurso que a relação jurídica havida pelas partes deva ser, do ponto de vista substantivo ou de direito material, qualificada como consubstanciando um contrato de trabalho e não um contrato de prestação de serviços, qualificação essa que, de todo o modo, é a que, em nosso entender, decorre da conjugação da factualidade apurada e do disposto no art. 1º da LCT, aprovada pelo DL 49.408, de 24.11.69, nos termos do qual “contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta.” (e com base no qual deverá ser aferida a qualificação da natureza do contrato, iniciado aos 18.01.1999, atento o disposto nos arts. 3º, nº 1 e 8º, nº 1, da Lei 99/2003, de 27.08 e 7º, nº 1, da Lei 7/2009, de 12.02 uma vez que não se extrai da matéria de facto provada que as partes tivessem alterado, a partir de 01.12.2003, os termos dessa Relação – cfr., por todos, Acórdão do STJ de 10.12.2009. in www.dgsi.pt, Proc. 6/08.1TTPTG.S1).

2.2. O que está, pois, verdadeiramente em causa é se, ao caso, é aplicável o nº 6 do art. 10º do DL 184/89, de 02.06, na redacção dada pela Lei 25/98, de 26.05 e, sendo-o, se tal significa que, não obstante efectiva e materialmente vinculados por um contrato de trabalho (apesar do nomen juris que lhe atribuíram ser de prestação de serviços, tarefa ou avença), não poderão ser reconhecidos ao trabalhador quaisquer direitos laborais.

Sobre questão idêntica, pronunciou-se o Supremo Tribunal de Justiça no seu recente Acórdão de 10.12.2009, in www.dgsi.pt (Processo nº 6/08.1TTPTG.S1), que sufragamos e que passamos a transcrever: 
“3.3. É certo que o artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho, na redacção introduzida pela Lei n.º 25/98, de 26 de Maio, determina que «[s]ão nulos todos os contratos de prestação de serviços, seja qual for a forma utilizada, para o exercício de actividades subordinadas, sem prejuízo da produção de todos os seus efeitos como se fossem válidos em relação ao tempo durante o qual estiveram em execução» (n.º 6) e prevê um regime específico destinado a sancionar a celebração de contratos de prestação de serviços fora do regime legalmente instituído, fazendo recair sobre os dirigentes que os celebrem ou autorizem, a responsabilidade civil e disciplinar pela prática de actos ilícitos, bem como a responsabilidade financeira, que se efectiva através da entrega nos cofres do Estado do quantitativo igual ao que tiver sido abonado ao pessoal ilegalmente contratado (n.os 7 e 8).
Acresce que o acórdão deste Supremo Tribunal, de 8 de Novembro de 2006, proferido no Processo n.º 1544/06, da 4.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt, como documento n.º SJ200611080015444, decidiu que, em consequência da declaração de nulidade do contrato de prestação de serviço firmado por parte da Administração, «o trabalhador não pode reclamar quaisquer diferenças salariais ou direitos estatutários que se não compreendam no quadro jurídico do contrato efectivamente celebrado, do mesmo modo que não pode exigir quaisquer direitos remuneratórios e indemnizatórios supervenientes à extinção do contrato, que pudessem derivar da diversa qualificação jurídica atribuível à relação contratual», sendo que «[a] única sanção estabelecida para a indevida celebração de contratos de prestação de serviços, por parte da Administração, é a prevista nos nºs 6 e 7 do citado artigo 10.º, que faz recair sobre os dirigentes que celebrem ou autorizem a celebração desses contratos a responsabilidade civil e disciplinar pela prática dos actos ilícitos, com a consequente cessação da respectiva comissão de serviço, bem como a correspondente responsabilidade financeira, efectivada através da entrega nos cofres do Estado do quantitativo igual ao que tiver sido abonado ao pessoal ilegalmente contratado».
Todavia, esta orientação jurisprudencial foi, entretanto, abandonada.
Conforme é afirmado no recente acórdão deste Supremo Tribunal, de 30 de Setembro de 2009, Processo n.º 4646/06.5TTLSB.L1.S., da 4.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt, «não se afigura que deva ser objecto de cobrança de aplicação ao caso o dispositivo constante do n.º 6 do art. 10.º do Decreto-Lei n.º 184/89, em termos de ser interpretado no sentido de os efeitos do contrato celebrado entre as partes, uma vez declarado ele nulo, se haverem de ter como válidos relativamente ao tempo em que esse contrato esteve em execução, mas reportados à espécie contratual que deflui do nomen nele aposto, pois que, em verdade, o que se passou foi a celebração, desde o início, de um contrato de trabalho entre a autora e o réu».
De facto, tendo-se concluído que a relação contratual estabelecida entre as partes revestiu a natureza de contrato de trabalho, não tem aplicação, no caso sujeito, o disposto no n.º 6 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 184/89, pelo que improcedem as conclusões IV) a VI) e VII), na parte atinente, da alegação do recurso de revista.”

O douto acórdão acabado de transcrever, revendo anterior posição (na qual se sustentou a sentença recorrida), dá, pois, cabal resposta à questão ora em apreço. Assim sendo, no caso, consubstanciando a relação jurídica havida entre as partes um verdadeiro contrato de trabalho, não lhe é aplicável o citado art. 10º, nº 6., assim procedendo, nesta parte, as conclusões do recurso

3. Da 2ª questão
Se são devidos os subsídios de férias e de natal;

Face á conclusão extraída na questão anterior – a de que a relação jurídica mantida entre as partes consubstancia um contrato de trabalho e que não lhe é aplicável o art. 10º, nº 6, do DL 184/89 (na redacção introduzida pela Lei 25/98) – impõe-se retirar as devidas consequências.
Uma das primeiras, prender-se-á com a da validade, ou não, do referido contrato de trabalho e que será apreciada a propósito da 3ª questão, havendo agora, para efeitos de apreciação do direito aos reclamados subsídios de férias e de Natal, que ter em conta, apenas, que, mesmo que tal contrato fosse nulo (como o é, em nosso entendimento), tal não obstará a que à A. deva ser reconhecido o direito às prestações ora em apreço.
Com efeito, tanto o art. 15º da LCT, como o art. 115, nº 1, do CT, dispõe, de forma idêntica, que o contrato de trabalho declarado nulo ou anulado produz efeitos como se válido fosse em relação ao tempo durante o qual esteve em execução. Daí que, em matéria de subsídios de férias e de Natal, haja que se aplicar o que na legislação laboral se prevê. 
Dispunha o DL 874/76, de 28.12., que: os trabalhadores têm direito a um período de férias de 22 dias úteis, reportando-se as férias ao trabalho prestado no ano civil anterior, vencendo-se no dia 1 de Janeiro de cada ano civil e tendo o trabalhador, se admitido no 1º semestre do ano civil, direito a 8 dias úteis de férias após 60 dias de trabalho efectivo (arts. 1º, nºs 1 e 2, 3º, nºs 1 e 3 e 4º, nº 1); a retribuição correspondente ao período de férias não pode ser inferior à que os trabalhadores receberiam se estivessem em serviço efectivo (art. 6º, nº 1); além da retribuição, os trabalhadores têm direito a um subsídio de férias de montante igual ao da retribuição (art. 6º, nº 2); no ano da cessação do contrato o subsídio de férias é proporcional ao tempo de serviço prestado nesse ano (art. 10º, nº 1).
Nos termos do CT/2003, mantém-se quer o direito a 22 dias úteis de férias (no mínimo), quer à retribuição igual à que os trabalhadores receberiam se estivessem em serviço efectivo (art. 255º, nº 1) e ao subsídio de férias, passando este, porém, a corresponder à retribuição-base acrescida das demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho (art. 255º, nº 2).
Quanto ao subsídio de natal, estava ele previsto no DL 88/96, de 03.07, nos termos do qual todos os trabalhadores têm direito a subsídio de Natal de valor igual ao da retribuição, que deverá ser pago até 15 de Dezembro (art. 2º, nº 1) e sendo proporcional ao tempo de serviço prestado nos anos de admissão do trabalhador e da cessação do contrato (art. 2º, nº 2, als. a) e c)). A sua atribuição mantém-se no CT/2003, dispondo o art. 254º que ele corresponderá a um mês de retribuição.

Assim sendo, tem a A. direito, a título de subsídios de férias e de Natal referentes aos anos de 1999 a 30.06.2007 (incluindo os “proporcionais” dessas prestações correspondentes ao período de 01.01.2007 a 30.06.2007, data da cessação do contrato), ao montante global de €9.636,02 que peticionou.
Esclareça-se que, relativamente aos proporcionais, considerando que a A. auferia a retribuição de €662,86 e que o contrato cessou aos 30.06.2007, ser-lhe-ia devida a quantia de €331,43 em relação a cada um deles. Acontece que a A., em relação a cada um, apenas peticionou o montante de €165,71, pelo que entendemos ser este o devido (165,71 x 2). 
Nos termos dos arts. 804º, 805º, nº 2, al. a), 806º e559º, todos do Cód. Civil, a A. tem ainda direito, sobre o montante em dívida, aos juros de mora, à taxa legal, desde a data do vencimento de cada uma dessas prestações até integral pagamento.

4. Da 3ª questão 
Do despedimento ilícito e suas consequências;

4.1. Entende a A. que foi ilicitamente despedida, porque sem justa causa e sem processo disciplinar, pelo que considera ter direito às retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à do trânsito em julgado da sentença e, bem assim, à reintegração. 
Subsidiariamente, para o caso de se entender que a especificidade da entidade contratante – o Estado – impede a reintegração, entende que o tribunal, oficiosamente, deverá condenar o réu na alternativa consagrada na lei, qual seja na indemnização de antiguidade, que deverá ser graduada em 45 dias de retribuição base por cada ano completo ou fracção de antiguidade.

4.2. No caso, a relação laboral vigorou desde 18.01.1999 a 30.06.2007, sendo que, de 18.01.99 a 31.03.07, foram, por escrito, celebrados três contratos denominados de prestação de serviços (em 18.01.99, 17.06.99 e 31.03.07), pelos períodos nele determinados e havendo, o segundo, sido objecto de 7 aditamentos, visando, essencialmente, a prorrogação dos prazos por que foram celebrados (e, em alguns casos, também a alteração da retribuição). De 31.03.07 a 30.06.07 (data esta em que, por iniciativa do Réu, cessou a relação jurídico-laboral) não existiu qualquer documento escrito a titular essa relação.

4.3.A matéria da constituição, modificação e extinção da relação jurídica na Administração Pública foi, no que importa ao recurso, sucessivamente regulada, pelos DL 184/89, de 2 de Junho, alterado pela Lei 25/98, de 26 de Maio, e pelo DL 427/89, de 7 de Dezembro[2], diploma este alterado pelo DL 218/98, de 17 de Junho. Entretanto, foi publicada a Lei 23/04, de 22.06, que entrou em vigor aos 22.07.04 (cfr. art. 31º) e que veio definir o regime jurídico do contrato de trabalho nas pessoas colectivas públicas.

4.3.1. No domínio da legislação vigente até à Lei 23/04, não era admissível a contratação sem termo na Administração Pública, como decorre dos arts. 9º do DL 184/89, de 02.06 e 14º e 43º, nº 1, do DL 427/89, de 07.12. . E, por outro lado, a contratação a termo obedecia, como regra geral, a um processo prévio de selecção de candidatos sujeito ao princípio da publicidade (cfr. arts. 9º, nº 3, do DL 184/89 e 19º do DL 427/89).
Acresce que, nos termos do art. 18º do DL 427/89, na redacção introduzida pelo DL 218/98, o contrato a termo visava a satisfação de necessidades transitórias dos serviços de duração determinada (nº 1), definindo-se no 2 as situações em que era lícito recorrer à contratação a termo e dispondo-se nos nºs 4 e 5 que:
- No nº 4 que: “4 – O contrato de trabalho a termo certo a que se refere o presente diploma não se converte, em caso algum, em contrato sem termo.”;
- E, no nº 5, que. “5- A celebração de contrato de trabalho a termo certo com violação do disposto no presente diploma implica a sua nulidade e constitui os dirigentes em responsabilidade civil, disciplinar e financeira pela prática de actos ilícitos, sendo ainda fundamento para a cessação da comissão de serviço nos termos da lei.”
Decorre, pois, do referido, que, no domínio do DL 427/89, era proibida a celebração por parte do Réu – Estado - de contratos de trabalho por tempo indeterminado, proibição essa que “é absoluta, englobando, por isso, a contratação tácita, a contratação originária e a contratação por conversão” (Acórdão do STJ de 10.12.2009, já citado).

Ora, assim sendo, o contrato de trabalho entre A. e Réu, iniciado em 1999 (que, para além do mais, não foi reduzido a escrito ou, pelo menos – caso se atenda aos escritos que titularam a alegada prestação de serviços – não se encontra justificada nos termos legalmente exigidos, que visava a satisfação de necessidades permanentes e que excedeu o prazo por que seria celebrado e o número de renovações admitidas[3]) estava, atento o disposto no art. 294º do Cód. Civil, ferido de nulidade, não sendo admissível a consideração ou conversão do contrato de trabalho em causa em contrato por tempo indeterminado.

4.3.2. Entretanto, aos 22.07.2004, entrou em vigor a Lei 23/2004, de 22.06, que passou a prever a possibilidade de contratação sem termo no seio da Administração Pública. Ora, assim sendo, coloca-se, a nosso ver, a questão de saber se se terá deixado de verificar o impedimento, que até então ocorria, relativo à existência da contratação sem termo da A. É que, dispondo o art. 118º, nº 1, do Código do Trabalho[4] que “Cessando a causa da invalidade durante a execução do contrato, este considera-se convalidado desde o início”, impõe-se tal apreciação (cfr. Acórdão do STJ de 26.11.08, in www.dgsi.pt, Proc. 08S1982).

Em tal diploma passou a dispor-se:
- No art. 1º, nºs 1 e 2, que: “1- A presente lei define o regime jurídico do contrato de trabalho nas pessoas colectivas públicas” e que, “2-Podem celebrar contratos de trabalho o Estado e outras pessoas colectivas públicas nos termos da presente lei.”.
- No art. 2º, nº 1, que “1- Aos contratos de trabalho celebrados por pessoas colectivas públicas é aplicável o regime do Código do Trabalho e respectiva legislação com as especificidades constantes da presente lei”.
- No art. 5º, define-se a obrigatoriedade de sujeição da contratação por tempo indeterminado a um processo prévio de selecção subordinado aos princípios da publicitação da oferta de trabalho, da igualdade de condições e oportunidades e fundamentação da decisão de contratação em critérios objectivos.
- No art. 8º, sujeita-se a celebração dos contratos de trabalho a forma escrita;
- No art. 9º, para além do mais que dele consta, definem-se as situações em que é lícita a contratação a termo resolutivo e determina-se a sujeição da contratação a um processo de selecção simplificado, precedido de publicitação da oferta e de decisão reduzida a escrito e fundamentada em critérios objectivos de selecção.
- e, no art. 10º, sob a epígrafe “Regras especiais aplicáveis ao contrato de trabalho a termo resolutivo”, que:
1 – O contrato de trabalho a termo resolutivo certo celebrado por pessoas colectivas públicas não está sujeito a renovação automática.
2 – O contrato de trabalho a termo resolutivo celebrado por pessoas colectivas públicas não se converte, em caso algum, em contrato por tempo indeterminado, caducando no termo do prazo máximo de duração previsto no Código do Trabalho.
3 – A celebração de contratos de trabalho a termo resolutivo com violação do disposto na presente lei implica a sua nulidade e gera responsabilidade civil, disciplinar e financeira dos titulares dos orgãos que celebraram os contratos de trabalho.

A contratação da A., à luz da Lei 23/2004, continua a não obedecer aos requisitos legais exigidos, quer porque, enquanto contratação por tempo indeterminado, não foi reduzida a escrito e não observando, ou não resultando dos autos que haja observado (sendo que, nos termos do art. 342º, nº 1, do Cód. Civil, à A. competia o ónus de alegação e prova dos factos correspondentes), o prévio processo concursório e a existência e limites do quadro de pessoal (cfr. art. 7º, nºs 1 e 4), quer porque, enquanto contrato a termo, os vícios de que já padecia a contratação continuam a verificar-se, para além de que, desde 31.03.2007 a 30.06.2007, inexistia até qualquer escrito que titulasse a relação contratual. 
E, não fosse o réu o Estado, mas sim uma entidade privada, dúvidas não restariam de que o contrato de trabalho existente entre as partes deveria ser considerado como sendo por tempo indeterminado, nada obstando a que, em caso de ilicitude do despedimento, a A. fosse reintegrada.
Em nossa e salvo melhor opinião, tal não é, contudo, possível no caso em apreço, ainda que no âmbito do citado diploma. 
Vejamos porquê.

Para além do art. 8º, nº 3, e 10º, nº 2, da Lei 23/2004 determinarem, respectivamente, a nulidade do contrato de trabalho não reduzido a escrito e a não conversão do contrato a termo em contrato de trabalho sem termo, entendemos que um outro impedimento existe.
Com efeito, e como já referido, o art. 5º do citado diploma sujeita a contratação por tempo indeterminado a um processo prévio de selecção subordinado aos princípios da publicitação da oferta de trabalho, da igualdade de condições e oportunidades e fundamentação da decisão de contratação em critérios objectivos, exigência essa que mais não visa do que dar cumprimento ao comando constitucional constante do art. 47º, nº 2, da CRP, nos termos do qual “2 – Todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso”, na interpretação constante que dele tem sido feita pelo Tribunal Constitucional.
Como é sabido, sobre a querela jurídica relativa à questão da convertibilidade do contrato de trabalho a termo em sem termo no seio da Administração Pública, o Tribunal Constitucional, no seu Acórdão, com força obrigatória geral, nº 368/2000, (DR I Série-A, de 30.11.00), pronunciou-se no sentido da inconstitucionalidade do art. 14º, nº 3, do então DL 427/89 (na redacção anterior ao DL 218/98), “na interpretação segundo a qual os contratos de trabalho a termo celebrados pelo Estado se convertem em contratos de trabalho sem termo, uma vez ultrapassado o limite máximo de duração total fixado na lei geral sobre contratos de trabalho a termo, por violação do disposto no nº 2 do artigo 47º da Constituição”. E, no que concerne aos institutos públicos, também o referido Tribunal, no Acórdão nº 61/2004 (DR, 1ª Série-A, de 27.02.04), declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade do art. 22º do DL 342/99, de 25 de Agosto, que cria o Instituto Português de Conservação e Restauro, “na medida em que admite a possibilidade de contratação do pessoal técnico superior e do pessoal técnico especializado em conservação e restauro mediante contrato individual de trabalho, sem que preveja qualquer procedimento de recrutamento e selecção dos candidatos à contratação que garanta o acesso em condições de liberdade e igualdade, (…)”, também por violação do nº 2 do art. 47º da Constituição.
No mesmo sentido aponta, igualmente o Acórdão do STJ de 26.11.08, in www.dgsi.pt (Processo 08S1982) que, transcrevendo o acórdão do TC nº 683/99 (cfr., de modo idêntico, o Acórdão do TC 61/2004), refere o seguinte:
“(…) 
Este não pode, por outro lado, ser procedimentalmente organizado, ou decidido, em condições ou segundo critérios discriminatórios, conducentes a privilégios ou preferências arbitrárias, pela sua previsão ou pela desconsideração de parâmetros ou elementos que devam ser relevantes (…). 
É certo que o direito de acesso previsto no artigo 47.º, n.º 2, não proíbe toda e qualquer diferenciação, desde que fundada razoavelmente em valores com relevância constitucional – como exemplos pode referir-se a preferência no recrutamento de deficientes ou na colocação de cônjuges um junto do outro (assim G. Canotilho/V. Moreira, Constituição..., cit., pág. 265). Poderá discutir-se se do princípio consagrado no artigo 47.º, n.º 2, resulta, como concretização dos princípios de igualdade e liberdade, que os critérios de acesso (em regra, de decisão de um concurso) tenham de ser exclusivamente meritocráticos, ou se pode conceder-se preferência a candidatos devido a características diversas das suas capacidades ou mérito, desde que não importem qualquer preferência arbitrária ou discriminatória – assim, por exemplo, o facto de serem oriundos de uma determinada região, ou de terem outra característica (por exemplo, uma deficiência) reputada relevante para os fins prosseguidos pelo Estado. 
Seja como for, pode dizer-se que a previsão da regra do concurso, associada aos princípios da igualdade e liberdade no acesso à função pública, funda uma preferência geral por critérios relativos ao mérito e à capacidade dos candidatos (…). 
E o concurso é justamente previsto como regra por se tratar do procedimento de selecção que, em regra, com maior transparência e rigor se adequa a uma escolha dos mais capazes – onde o concurso não existe e a Administração pode escolher livremente os funcionários não se reconhece, assim, um direito de acesso (Gomes Canotilho/Vital Moreira, ob. e loc. cits., anotação XI; sobre o fundamento do procedimento concursal, v. também Ana Fernanda Neves, Relação jurídica de emprego público, cit., págs. 147 e seguintes). 
Assim, para respeito do direito de igualdade no acesso à função pública, o estabelecimento de excepções à regra do concurso não pode estar na simples discricionariedade do legislador, que é justamente limitada com a imposição de tal princípio. Caso contrário, este princípio do concurso – fundamentado, como se viu, no próprio direito de igualdade no acesso à função pública (e no direito a um procedimento justo de selecção) – poderia ser inteiramente frustrado. Antes tais excepções terão de justificar-se com base em princípios materiais, para não defraudar o requisito constitucional (assim Gomes Canotilho/Vital Moreira, loc. cit.; Ana F. Neves, ob. cit., págs. 153-4).». 
E, sobre o conceito de função pública para efeitos do art. 47º, nº 2, da CRP discorre o Acórdão do TC 61/2004, nos seguintes termos:
“Seguindo, uma vez mais, a argumentação desenvolvida no Acórdão nº 406/2003, recordar-se-á que uma solução intermédia parece ser defendida por J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, quando referem (Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.a ed., Coimbra, 1993, p. 264, n. VIII ao artigo 47º):
«A definição constitucional do conceito de função pública suscita alguns problemas, dada a diversidade de sentidos com que as leis ordinárias utilizam a expressão e dada a pluralidade de critérios (funcionais, formais) defendidos para a sua caracterização material.
Todavia, não há razões para contestar que o conceito constitucional corresponde aqui ao sentido amplo da expressão em direito administrativo, designando qualquer actividade exercida ao serviço de uma pessoa colectiva pública (Estado, Região Autónoma, autarquia local, instituto público, associação pública, etc.), qualquer que seja o regime jurídico da relação de emprego (desde que distinto do regime comum do contrato individual de trabalho), independentemente do seu carácter provisório ou definitivo, permanente ou transitório.»
No entanto, Vital Moreira, mais tarde, viria a pronunciar-se em sentido mais amplo («Projecto de lei quadro dos institutos públicos — Relatório final e proposta de lei quadro», grupo de trabalho para os institutos públicos, Ministério da Reforma do Estado e da Administração Pública, Fevereiro de 2001, nº 4, p. 50, nota ao artigo 45º), adoptando uma posição que tem também sido defendida pelo Tribunal Constitucional, ao ponderar que:
«No entanto, mesmo quando admissível o regime do contrato de trabalho, nem a Administração Pública pode considerar-se uma entidade patronal privada nem os trabalhadores podem ser considerados como trabalhadores comuns.
No que respeita à Administração, existem princípios constitucionais válidos para toda a actividade administrativa, mesmo a de ‘gestão privada’, ou seja, submetida ao direito privado. Entre eles contam-se a necessária prossecução do interesse público, bem como os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé (artigo 266º, nº 2, da Constituição), todos eles com especial incidência na questão do recrutamento do pessoal.
Além disso, estabelecendo a Constituição que ‘todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso’ (CRP, artigo 47º, nº 2), seria naturalmente uma verdadeira fraude à Constituição se a adopção do regime de contrato individual de trabalho incluísse uma plena liberdade de escolha e recrutamento dos trabalhadores da Administração Pública com regime de direito laboral comum, sem qualquer requisito procedimental tendente a garantir a observância dos princípios da igualdade e da imparcialidade.»
Estas últimas considerações afiguram-se inteiramente procedentes, principalmente quando, como é o caso, o regime laboral do contrato individual de trabalho se reporta a um instituto público que mais não é que um serviço público personalizado.
Com efeito, a exigência constitucional de «acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso» apresenta duas vertentes.
Por um lado, numa vertente subjectiva, traduz um direito de acesso à função pública garantido a todos os cidadãos; por outro lado, numa vertente objectiva, constitui uma garantia institucional destinada a assegurar a imparcialidade dos agentes administrativos, ou seja, que «os trabalhadores da Administração Pública e demais agentes do Estado e outras entidades públicas estão exclusivamente ao serviço do interesse público» (nº 1 do artigo 269º da CRP). Na verdade, procedimentos selecção e recrutamento que garantam a igualdade e a liberdade de acesso à função pública têm também a virtualidade de impedir que essa selecção e recrutamento se façam segundo critérios que facilitariam a ocupação da Administração Pública por cidadãos exclusiva ou quase exclusivamente afectos a certo grupo ou tendência, com o risco de colocarem a mesma Administração na sua dependência, pondo em causa a necessidade de actuação «com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé» (nº 2 do artigo 266º da CRP).
Esta perspectiva é particularmente importante quando se trate de recrutamento e selecção de pessoal para entidades que exerçam materialmente funções públicas, como acontece com o IPCR (cf., supra, nº 4.1).
(…)
Ainda que se entenda que para o recrutamento de pessoal sujeito ao regime do contrato individual de trabalho se não justifica a realização de um concurso público, nem por isso se pode deixar de reconhecer que a selecção e o recrutamento desse pessoal deverá sempre ter lugar através de procedimentos administrativos que assegurem a referida liberdade e igualdade de acesso.”.

Tais considerações, tecidas no âmbito de uma entidade que tinha a natureza de instituto público, têm inteira aplicação, até por maioria de razão, no domínio da administração directa do Estado. 

Ou seja, e pese embora, desde a Lei 23/04, seja possível, no seio da Administração Pública, o contrato individual de trabalho sem termo, da conjugação da doutrina constante dos dois citados acórdãos (cfr., também no mesmo sentido, Acórdão do STJ de 25.11.09, in www.dgsi.pt, Processo nº 1846/06.1YRCBR.S1) é, em nossa e salvo melhor opinião, possível concluir-se no sentido da inconstitucionalidade, por violação do artº 47º, nº 2, da CRP, da interpretação segundo a qual seria permitida, no seio da Administração Pública, a contratação sem termo, seja tácita, originária ou por conversão,  sem prévio processo de recrutamento de candidatos à contratação que garanta o acesso em condições de liberdade e igualdade. 

4.3.3. No caso, a A. não alegou, nem se provou, que a sua contratação, inicial ou subsequente, houvesse sido precedida de qualquer processo de recrutamento nos termos acima referidos, designadamente do previsto nos diplomas em vigor à data da sua contratação (DL 427/89 e, posteriormente, Lei 23/04), sendo que a ela competia, porque constitutivo do seu direito, o ónus de alegação e prova de tal facto (art. 342º, nº 1, do Cód. Civil). 
Embora a propósito da Lei 23/04, mas cujas considerações são transponíveis para o caso, nas conclusões IV, V e VI do sumário do Acórdão do STJ de 26.11.08, já citado, refere-se que:
IV – A contratação nos termos da Lei n.º 23/2004, exige que a celebração do contrato de trabalho por tempo indeterminado observe a forma escrita, sob pena de nulidade (artigo 8.º), que exista, para o efeito, por parte das pessoas colectivas públicas que contratam, um quadro de pessoal próprio e a contratação seja feita nos limites desse quadro (artigo 7.º), e que exista um processo prévio de selecção, de que se destaca a publicitação da oferta de trabalho e a decisão de contratação fundada em critérios objectivos de selecção (artigo 5.º).
V – Cabe ao trabalhador, como facto constitutivo do direito a ser considerado trabalhador por tempo indeterminado, a alegação e prova de que o acordo de vontades fonte da relação laboral que vigorou entre as partes foi reduzido a escrito, que houve o processo prévio de recrutamento e selecção com vista à sua contratação e que no organismo público que o contratou existia o referido quadro de pessoal próprio.
VI – Não tendo sido feita a prova desses factos, não pode o contrato de trabalho por tempo indeterminado, nulo, convalidar-se por força da entrada em vigor da Lei n.º 23/2004.
Assim sendo, entendemos que, no caso e sob pena de violação do disposto nos artºs 47º, nº 2, da CRP, a conversão da contratação a termo em contrato de trabalho sem termo (ou a convalidação de eventual nulidade da contratação da A.) não é possível.

4.4. O contrato de trabalho em apreço veio a cessar por iniciativa do Réu que, por carta datada de 02.05.2007, comunica a “rescisão” do mesmo com efeitos a partir de 30.06.2007.
Atenta a data da cessação do contrato, à mesma é aplicável o CT de 2003.
Pelas razões que se deixaram acima apontadas o contrato de trabalho entre A. e Réu deverá ser considerado como sem termo, embora nulo, e não a termo certo, como parece defender o réu nas contra-alegações. Aliás, e para além do mais que já se disse, até porque, após 31.03.2007, a A. se manteve ao serviço sem qualquer contrato reduzido a escrito (cfr. nº 21 dos factos provados), estando-se perante uma relação jurídico-laboral que, de facto, se foi mantendo, porém à margem ou à revelia do enquadramento jurídico que a permitiria e a que, porque nula, são aplicáveis os artsº 115º e 116º do Cód. Trabalho – cfr., neste sentido, Maria do Rosário Palma Ramalho e Pedro Madeira de Brito[5], bem como Liberal Fernandes[6], in ob. citada, a págs. 91/92, onde refere o seguinte: «Por isso, mantendo-se a produção dos efeitos do contrato a termo celebrado pela Administração para além do prazo máximo previsto (no essencial, a prestação de trabalho e o pagamento da retribuição), porquanto atenta contra a norma (imperativa) que proíbe a renovação tácita do contrato a termo (e mesmo a renovação expressa, quando o contrato atinge determinada duração) e, por maioria de razão, a respectiva conversão. (…). Trata-se de uma nulidade que, apesar de subsistir enquanto se prolongar a prestação de trabalho, não impede que o contrato de trabalho produza os seus efeitos como se fosse válido enquanto o vício não for invocado e a actividade de trabalho não cessar. (art. 15º, nº 1, da LCT», admitindo ainda o referido Autor a possibilidade de aplicação do disposto no então art. 15º, nº 6, da LCT (no mesmo sentido cfr. Acórdão da Relação de Évora de 13.2.01, in CJ, 2001, tomo V, pág. 293, (hoje, art. 116º, nº 3, do CT). [7] 

Dispõem os arts. 115º, nº 1, e 116º, nº 1, do CT que o contrato de trabalho declarado nulo ou anulado produz efeitos como se fosse válido em relação ao tempo durante o qual esteve em execução (art. 115º, nº 1) e que aos factos extintivos ocorridos antes da declaração de nulidade ou anulação do contrato de trabalho aplicam-se as normas sobre cessação do contrato. (art. 116º, nº 1).
Nos termos do art. 286º do Cód. Civil, a nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo Tribunal. 
Contudo, no caso, o Réu, aquando da comunicação à A. de que o contrato cessava aos 30.06.07, não invocou a nulidade da relação laboral, antes se limitando a fazê-la cessar nos termos descritos, nulidade essa que apenas veio invocar na contestação.
O despedimento consubstancia-se numa declaração do empregador dirigida ao trabalhador em que aquele manifesta a sua intenção de pôr termo ao contrato, declaração essa que tem natureza receptícia.
Na comunicação do Réu à A. de 02.05.07, aquele manifesta, clara e expressamente, a sua intenção de pôr termo ao contrato com efeitos a partir de 30.06.07, declaração essa que consubstancia um despedimento. E, este, não foi precedido de processo disciplinar, nem de invocação de justa causa, pelo que deverá ser considerado ilícito – cfr. art. 429º do CT.
Estamos, assim, perante um caso em que, no âmbito de uma relação laboral nula e antes de ter ocorrido a declaração dessa nulidade, foi perpetrado um despedimento ilícito, e não perante a caducidade de um contrato de trabalho a termo, como defende o Réu nas contra-alegações. 
Como se refere no Acórdão desta Relação de 18.06.07, proferido na Apelação 1040/06.4., «os arts. 115º, nº 1, e 116º, nº 1, do CT correspondem ao preceituado no art.15º, n.ºs 1 e 3, da LCT, no âmbito dos quais, e no que concerne à articulação entre a invalidade do contrato de trabalho e as normas que disciplinam a extinção do mesmo, mormente em caso de despedimento ilícito ocorrido antes de ser declarada a nulidade, se vinha entendendo que se não poderia ordenar a reintegração do trabalhador, consequência natural desse tipo de despedimento, e simultaneamente declarar a invalidade do contrato. 
E, por isso, a questão colocava-se somente no que diz respeito à determinação do termo da indemnização e outros efeitos decorrentes do despedimento ilícito, como é o caso dos salários intercalares, que seriam assim de manter. »
Nesse sentido se pronunciou Romano Martinez, Direito do Trabalho, Almedina, 2002, pág. 424, segundo o qual “Se, não obstante a invalidade do contrato, uma das partes tiver posto termo ao negócio jurídico com base noutra causa que não a invalidade, por exemplo despedimento, encontram aplicação as regras de cessação do contrato de trabalho. Assim, se num determinado contrato de trabalho nulo, o empregador não invocar a invalidade e despedir o trabalhador, há o dever de pagar uma indemnização, nos termos gerais do art. 13 da LCCT. Por outras palavras, aplicam-se as regras do despedimento como se o contrato fosse válido, sendo devida indemnização no termos gerais”. 
E, na mesma linha, se pronunciou, também, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25.09.2002, in www.dgsi.pt (Proc. nº 02S1366), o qual analisa, aprofundamente, as consequências da ilicitude de despedimento levado a cabo antes da declaração da nulidade do contrato de trabalho, aresto esse em que, para além do mais que dele consta, se entendeu, conforme nele sumariado, que:
I - Tendo a sentença, que declarou a ilicitude do despedimento do autor, simultaneamente declarado a nulidade do contrato de trabalho, por considerar que o seu objecto era contrário à lei, mas tendo, por aplicação do disposto no n. 3 do artigo 15. do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49408, de 24 de Novembro de 1969 (LCT), condenado a ré a pagar a indemnização de antiguidade e os salários intercalares, se a ré interpõe recurso de apelação sustentando que, por força da declarada nulidade do contrato, não são devidos nem aquela indemnização nem estes salários, forma-se caso julgado sobre a decisão que declarou a nulidade do contrato se o autor não a impugna, quer através de recurso subordinado, quer nas contra-alegações relativas à apelação da ré, ao abrigo do n. 1 do artigo 684-A do Código de Processo Civil.
II - A remissão do citado n. 3 do artigo 15. para o regime da cessação do contrato de trabalho constante da LCT vale actualmente como remissão para o Regime Jurídico da Cessação do Contrato Individual de Trabalho e da Celebração e Caducidade do Contrato de Trabalho a Termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, que é, assim, aplicável aos actos extintivos (no caso, despedimento) de contratos inválidos, ocorridos antes da declaração de nulidade ou da anulação, com as necessárias adaptações.
III - Uma dessas adaptações resulta da inviabilidade de o tribunal determinar a reintegração do trabalhador despedido, pois o tribunal não pode impor a manutenção de um contrato declarado nulo; porém, esta inviabilidade da reintegração não afecta o direito à indemnização de antiguidade (desde que por esta o trabalhador tenha optado) e aos salários intercalares, entendendo-se que o período de tempo em que o
trabalhador esteve impedido de prestar a sua actividade por facto imputável à entidade patronal (despedimento ilícito) deve ser considerado como período de execução do contrato.
IV - O termo final a considerar para efeitos do cálculo da indemnização de antiguidade e dos salários intercalares, quando a entidade patronal haja invocado a nulidade do contrato antes da prolação da decisão judicial que decretou a ilicitude do despedimento e essa invocação haja sido julgada procedente pela mesma decisão, é, não a data desta decisão, mas a data em que aquela invocação foi notificada ao trabalhador.

4.4.1. Transpondo a doutrina constante dos pontos II, III e IV do mencionado Acórdão do STJ, acima transcritos, para o caso em apreço[8], a A., nos termos do disposto no art. 437º do CT, tem direito, em consequência da ilicitude do despedimento, a  receber  as retribuições que deixou de auferir desde os 30 dias anteriores à propositura da acção, ou seja, desde 11.05.2008  (o despedimento ocorreu aos 30.06.2007 e a acção foi intentada aos 11.06.08) até 31.07.08, data em que lhe foi notificada a contestação, articulado este no qual o Réu invoca a nulidade, que vem a ser confirmada pelo presente acórdão (a contestação foi notificada por correio expedido aos 28.07.08 – cfr. fls. 87-, presumindo-se recebida no 3º dia útil subsequente).

Assim, a título de retribuições entre 11.05.08 até 31.07.2008, tem a A direito a receber a quantia global de €1.767,63.
Sobre esta quantia, tem a A. direito a juros de mora, à taxa legal, desde a data o vencimento de cada uma das retribuições que a integram – art.805º, nº 2, al. a), do Cód. Civil, sendo certo as referidas retribuições se reportam a período anterior ao do encerramento da audiência de discussão e julgamento.

No caso, e como decorre do que já se deixou exposto, não é admissível a reintegração, sendo que, nos termos do art. 439º, nº 1, do CT, a A. teria ainda direito, como consequência da ilicitude do despedimento e em substituição da reintegração, a receber indemnização a fixar entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade (contados até à referida data da notificação da contestação).
Acontece que a A., tendo embora, na petição inicial, formulado tal pedido, fê-lo apenas em alternativa à reintegração conforme “direito de opção” que viesse a exercer, opção essa que não veio a fazer e que, a nosso ver, sempre poderia ter sido efectuada a título subsidiário, ou seja, para o caso de se vir a entender não ser a reintegração admissível, tal como, aliás, o veio a referir nas alegações de recurso, embora de forma extemporânea (cfr. art. 438º, nº 1, do CT, nos termos do qual a opção deverá ser feita até à sentença).
Considerando o principio do dispositivo e o disposto no artº 661º, nº 1, do CPC, afigura-se-nos que não pode o Tribunal condenar em tal prestação, sendo certo que, por via da cessação da relação laboral, cessou a natureza indisponível dos créditos laborais (Acórdãos do STJ de 25.09.02, já cit. e, mais recentemente, o de 25.11.09 www.dgsi.pt, Proc. 1846/06.1YRCBR.S1). E, salvo melhor opinião, não cabe convocar-se ou apelar-se aos poderes oficiosos do tribunal, uma vez que estes, em matéria que está na disponibilidade das partes, têm como limite o princípio do dispositivo, não sendo aplicável, ao caso, o disposto no art. 74º do CPT.

5. Da 4ª questão
Dos danos não patrimoniais

A A. peticionou o pagamento da quantia de €5.363,98 a título de danos não patrimoniais.
Nos termos do disposto no art. 436º, nº 1, al. a), do CT em caso de ilicitude do despedimento, o trabalhador tem direito a ser indemnizado, também, pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência do mesmo, sendo tais danos ressarcíveis desde que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito – art. 496º do Cód. Civil.
Pressuposto desse direito é que existam danos, que estes assumam gravidade que seja merecedora da tutela do direito e que exista um nexo causal entre o evento e o dano, competindo ao autor o ónus de alegação e prova dos referidos pressupostos – art. 342º, nº 1, do Cód. Civil.
No caso, apenas se provou que a A., mercê do período de tempo porque se prolongou a relação contratual, acreditou que acabaria por ser integrada na Função Pública.(nº 31), nada mais tendo logrado provar, mormente o que alegava nos nºs 40 (perca de uma outra oportunidade de emprego e que o Director Geral lhe tivesse dito que, no máximo, ao fim de 7 anos estaria nos quadros) e 41 (que o comportamento do Réu a “abalou profundamente” e que “se sente ainda hoje profundamente frustrada, desanimada, ansiosa e angustiada em relação ao seu futuro profissional, não tendo até à data encontrado emprego”) da petição inicial, que foram dados como não provados.
Ora, pese embora a expectativa da A. de que, face ao tempo que perdurou a relação laboral, seria integrada na função pública, expectativa essa, diga-se, criada pelo réu que, não obstante à revelia da lei, manteve essa relação por tão largo período de tempo, a verdade é que não ficaram provados quaisquer danos, de natureza não patrimonial, que tivessem decorrido da frustração dessa expectativa, bem como do despedimento ilícito que promoveu antes da invocação da nulidade do contrato.
E, assim sendo, é de manter, nesta parte, a decisão recorrida.*IV. Decisão

Em face do exposto, acorda-se em conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência:
A) Revoga-se a decisão recorrida na parte em que julgou improcedente o pedido de declaração da existência de um contrato de trabalho sem termo e em que absolveu o Réu dos pedidos relativos aos subsídios de férias e de natal e à inexistência de despedimento ilícito, que é substituída pelo presente acórdão, em que se decide:
1) Declarar a existência, entre a A. e Réu, de um contrato de trabalho sem termo, no período de 18.01.1999 a 30.06.2007;
2) Declarar a nulidade do referido contrato de trabalho.
3) Julgar ilícito o despedimento da A.
4) Condenar o réu, Estado Português, a pagar à A., B……….:
- A quantia de €9.636,02, a título de subsídios de férias e de Natal vencidas de 1999 a 30.06.2007 e proporcionais, acrescida de juros de mora, á taxa legal, desde a data do vencimento de cada uma dessas prestações até integral pagamento.
- A quantia de €1.767,63, a título de retribuições desde 11.05.08 até 31.07.08, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data do vencimento de cada uma das retribuições que a integram até integral pagamento.
B) Confirmar, quanto ao demais peticionado, a sentença recorrida, embora com diferente fundamentação.

Custas pela A. e Réu, na proporção do decaimento.

Porto, 22.02.10
Paula Alexandra Pinheiro Gaspar Leal Sotto Mayor de Carvalho
Luís Dias André da Silva
José Carlos Dinis Machado da Silva

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[1] Estribado nos Acórdãos da Relação de Lisboa de 04.02.09 (Proc. 10849/2008-4) e do STJ de 08.11.2006 (Proc. 06S1544), ambos in www.dgsi.pt.
[2] Entretanto revogado pela Lei 12-A/2008, de 27.02.
[3] Cfr. arts. 42º, nº 1, al. e) e 44, nº 2, do DL 64-A/89, de 27.02, e 3º da Lei 38/96, de 31.08, na redacção original e posteriormente dada pela Lei 18/2001, de 03.07, e arts. 14º, nº 3,18º, nº 2 e 20º do DL 427/89, alterado pelo DL 409/91, de 17.10.
[4] Já em vigor aquando da entrada em vigor da Lei 23/2004 e aplicável aos contratos de trabalho que se encontrem em execução àquela data.
[5] Contrato de Trabalho na Administração Pública, Anotação à Lei nº 23/2004, de 22 de Junho, 2ª Edição Actualizada, Almedina, em anotação ao citado art. 10º (págs. 57 a 61).
[6] Questões Laborais, 2002, págs. 91/92.
[7] Acrescente-se que, ainda que se considerasse que a manutenção, de facto, dos efeitos da relação laboral após a caducidade do contrato de trabalho a termo consubstanciaria a constituição de uma nova relação laboral, sempre seria ela nula, designadamente por preterição da forma escrita (art. 8º, nºs 1 e 3, da Lei 23/04).
[8] A doutrina de tal Acórdão, embora proferida no âmbito do DL 64-A/89, de 27.02, mantém actualidade no domínio do Código do Trabalho já que são idênticas as previsões normativas constantes de ambos os diplomas.


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Procº nº 385/08.0TTOAZ.P1 Apelação 
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 278)
SUMÁRIO
I. Consubstanciando a relação jurídica entre o Estado e o trabalhador um contrato de trabalho e não um contrato de prestação de serviços, não lhe é aplicável o art. 10º, nº 6m do DL 184/89, de 14.06, na redacção dada pela Lei 25/98, de 26.05.
II. No domínio do DL 427/89, de 07.12 (alterado pelo DL 218/98, de 17.06), era proibida a celebração, pelo Estado, de contrato de trabalho por tempo indeterminado, proibição essa que é “absoluta, englobando, por isso, a contratação tácita, a contratação originária e a contratação por conversão” (Acórdão do STJ de 10.12.09, www.dgsi.pt, Proc. 6/08.1TTPTG.S1).
III. A Lei 23/04, de 22.06 veio admitir, no seio da administração Pública, o contrato de trabalho sem termo, condicionando, porém, a sua celebração a diversos requisitos, designadamente à forma escrita e à observância de um prévio processo de selecção de candidatos subordinado aos princípios da publicitação da oferta de trabalho, da igualdade de condições e oportunidades, com fundamentação da decisão de contratação em critérios objectivos (art. 5º da referida lei). 
IV. Porém, não obstante essa admissibilidade, tendo em conta o entendimento sufragado, com força obrigatória geral, nos Acórdãos do Tribunal Constitucional 368/2000 (DR IS-A, de 30.11.2000) e 61/2004 (DR IS-A, de 27.02.2004), bem como a jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça (cfr., por todos, Acórdãos de 14.11.07, 18.06.08, 01.10.08, 26.11.08, 01.07.09, 25.11.09 e 03.02.10, in www.dgsi.pt, Processos 08S2451, 06S2445m 08S1536, 08S1982, 08S3443, 1846/06.1YRCBR.S1 e 387/09.0YFLSB), a contratação sem termo pelo Estado, seja ela tácita, originária ou por conversão, será inconstitucional, por violação do art. 47º, nº 2, da CRP, se não observar um prévio processo concursório que garanta o referido princípio de igualdade de condições e de oportunidade de acesso.
V. Como consequência de um despedimento ilícito ocorrido no âmbito de um contrato de trabalho nulo, o trabalhador tem direito às retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao momento em que a invocação da nulidade foi notificada ao trabalhador ou, não sendo invocada, até ao momento em que é declarada oficiosamente pelo tribunal.
VI. A nulidade do contrato de trabalho impede, em caso de despedimento ilícito, a reintegração, mas confere o direito à indemnização de antiguidade caso por ela o trabalhador haja optado até à sentença, não cabendo, porém, no âmbito dos poderes oficiosos do tribunal condenar no pagamento dessa indemnização se o trabalhador, tendo embora formulado, em alternativa, o pedido de reintegração ou indemnização, não procedeu a essa opção até ao referido momento.

Paula Alexandra Pinheiro Gaspar Leal Sotto Mayor de Carvalho

Procº nº 385/08.0TTOAZ.P1 Apelação Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 278) Adjuntos: Des. André da Silva Des. Machado da Silva (Reg. nº 1360) Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B………., intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra o ESTADO PORTUGUÊS, pedindo que: -Seja declarada a existência, validade e eficácia de um contrato de trabalho subordinado sem termo entre si e a C………. vigente desde 18.1.1999 e, em consequência, declarada a ilicitude do seu despedimento, por não ter sido precedido de processo disciplinar e o R. condenado: a) no pagamento dos subsídios de férias e de Natal vencidos durante a vigência do contrato, no total de € 9.636,02. b) no pagamento da importância correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde da data do despedimento até à efectiva execução da sentença. c) na reintegração sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, ou caso venha a exercer o seu direito de opção, na indemnização prevista no art. 439º, nº1 do C.Trabalho. d) no pagamento da indemnização por danos morais na quantia de € 5.363,98. Para tanto alegou, em síntese, que: Em 18.1.1999, celebrou com a C………. um contrato para exercer para esta o controlo de processamento de materiais de risco específico e subprodutos de animais de talho e caça nas unidades de transformação de subprodutos, sendo tal contrato denominado de Prestação de Serviços em Regime de Tarefa celebrado pelo prazo de 5 meses; em 17.6.1999 outorgou novo contrato com o mesmo objecto, desta feita designado de Contrato de Prestação de Serviços em Regime de Avença, o qual teve sucessivos aditamentos até 31.3.2006, data em que subscreveu outro contrato intitulado de prestação de serviços em regime de avença para o exercício das mesmas funções, contrato esse que foi rescindido por comunicação de 2.5.2007, com efeitos a partir de 30.6.2007. Não obstante a designação dos contratos durante todo o referido período nunca exerceu as suas funções para que foi contratada de forma independente e com autonomia técnica mas antes sob as ordens, direcção e fiscalização da C………., pelo que o contrato realmente existente sempre foi um contrato de trabalho subordinado. O Estado, representado pelo Ministério Público, aos 17.07.2008, contestou, por excepção, invocando a incompetência material do Tribunal, e por impugnação, aduzindo que a A. nunca actuou na dependência e sob a autoridade e direcção do R., sendo por isso de prestação de serviços a relação contratual com a mesma estabelecida e que, caso venha a entender-se que o contrato existente foi um contrato de trabalho subordinado, o mesmo será nulo por violação de normas imperativas e, em consequência, só produz efeitos durante o período que está em execução, podendo qualquer das partes pôr-lhe termo a todo instante, pelo que a comunicação de rescisão não traduz qualquer despedimento ilícito e a pretensão da A., só poderá proceder relativamente aos subsídios de férias e de Natal peticionados. A contestação foi notificada à A., por correio registado expedido aos 28.07.2008, tendo esta respondido no sentido da improcedência da excepção. Foi proferido o despacho saneador, no qual se julgou improcedente a excepção de incompetência do Tribunal em razão da matéria, afirmando-se a validade e regularidade da instância. Dispensada a selecção da matéria de facto, realizada a audiência de discussão e julgamento, decidida a matéria de facto, que não foi objecto de qualquer reclamação, proferiu-se sentença absolvendo o réu de todos os pedidos contra ele formulados. Inconformada, veio a Autora recorrer, formulando, a final das suas alegações, as seguintes conclusões: I. Contrato de trabalho é aquele mediante o qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta (cfr. arts. 1º da L.C.T., 10º do Código do Trabalho e 1152º do Código Civil). É pacífico que a subordinação jurídica do trabalhador à sua entidade patronal constitui o elemento essencial caracterizador do contrato de trabalho, subordinação que a douta sentença sob recurso peremptoriamente reconhece ter existido. De facto, a concatenação dos diversos elementos factuais (mormente, pontos 23. a 29. dos factos provados) quanto ao modo de organização da actividade profissional da Recorrente, levam-nos, indiscutivelmente, à qualificação do contrato em causa como um verdadeiro e próprio contrato de trabalho subordinado, apesar do nomen juris que lhe foi atribuído, o qual terá de ser considerado sem termo, uma vez que à data da comunicação da rescisão unilateral (datada de 02/05/2007 – cfr. ponto 20. dos factos provados), “não existia qualquer contrato escrito em vigor desde 31/03/2007” (cfr. ponto 21. Dos factos provados) – artigo 131º, n.º 4 do Código do Trabalho. I.1 – Mostram-se violados os artigos 10º do Código do Trabalho e 1152º do Código Civil, artigo 131º, n.º 4 do Código do Trabalho, bem como o artigo 10º do D.L. 184/89 de 2 de Junho, por errada interpretação. II. Estando perante um contrato de trabalho subordinado, não tem aplicação o regime previsto no artigo 10.º, n.º 6, do Decreto-Lei n.º 184/89, de 14 de Junho, convocado na douta sentença sob recurso. Ao estabelecer que “são nulos todos os contratos de prestação de serviços, seja qual for a forma utilizada, para o exercício de actividades subordinadas, sem prejuízo da produção de todos os seus efeitos como se fossem válidos em relação ao tempo durante o qual estiveram em execução”, estriba-se no necessário pressuposto de que outro contrato não haja sido o contrato efectivamente celebrado – Acórdãos do STJ de 12-02-2009 e de 25-03-2009, respectivamente, processos 08S2583 e 08S3260 in www.dgsi.pt. Estando perante um contrato de trabalho subordinado, a consequência é esse contrato passar a reger-se pelas leis laborais de direito privado ou pelo regime da constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego público, consignado no Decreto-Lei nº 427/89, consoante o contrato em causa possa ser considerado como contrato de trabalho por tempo indeterminado ou contrato de trabalho a termo certo, nos termos previstos no art.º 115.º do Código do Trabalho: “o contrato de trabalho declarado nulo ou anulado produz, efeitos como se fosse válido em relação ao tempo durante o qual esteve em execução (…)”. No caso vertente, sendo o contrato em causa necessariamente qualificado como de trabalho, deve em consequência ser o Recorrido condenado no pagamento dos subsídios de férias e de Natal referentes ao período de vigência do contrato, no montante pedido de 9.636,02€ (nove mil seiscentos e trinta e seis euros e dois cêntimos), ao qual acrescem os juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal, uma vez que, conforme consta do ponto 30. dos factos provados “a C………., desde a data da contratação da A., sempre lhe pagou a remuneração apenas durante 12 meses por ano, nunca lhe tendo pago qualquer quantia a título de subsídio de férias ou de Natal”. De resto, salvo melhor opinião, outra conclusão não é possível, sob pena de a mesma redundar numa absoluta injustiça e num ilegítimo benefício para o infractor que acabaria por ver assim prevalecer os efeitos do contrato ficcionado – através da designação do qual pretendia assumir uma posição contratual menos gravosa – sobre o efectivamente executado. II.1 - Mostra-se violado, por errada interpretação o artigo 10º do D.L. 184/89 de 2 de Junho, bem como art.º 254º e 255º do CT. III. Conforme as conclusões precedentes, no caso concreto estamos perante um contrato de trabalho subordinado e não de prestação de serviços como foi designado pelas partes. No caso vertente, o Recorrido nunca invocou qualquer nulidade do contrato para colocar termo à relação contratual laboral que mantinha com a Recorrente, limitando-se a denunciar unilateralmente o contrato de trabalho sem observação das disposições legais (cfr. ponto 20. dos factos provados), não tendo, designadamente, sido precedido de processo disciplinar (arts. 382 e ss do CT). Assim, nos termos do disposto nos artigos 436º, 437º, 438º e 439º do Código do Trabalho, tem a Recorrente direito ao pagamento da importância correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do seu despedimento até ao trânsito em julgado da decisão, acrescida dos juros legais, bem como à sua reintegração, nos termos legais. A ser entendido que a especificidade da entidade contratante - o Estado - impossibilita a reintegração, deve o Julgador, ao invés de se limitar a absolver o Estado, aplicar, oficiosamente, a alternativa consagrada na lei, condenando-a a efectuar o pagamento de uma indemnização de antiguidade, a qual, face aos termos em que foi feito o despedimento, deverá ser fixada em 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade. III.1 – Mostram-se violados, os artigos 116º, 382º e seguintes, 436º, 437º, 438º e 439º, todos do Código do Trabalho, os quais impunham e impõem a consideração da ilicitude do despedimento da Recorrente com as legais consequências. IV. Consta dos factos provados, sob 31.: “a A. mercê do período de tempo porque se prolongou a relação contratual acreditou que acabaria por ser integrada na Função Pública”. Durante os oito anos e meio em que a Recorrente esteve ao serviço do recorrido (desde 18/01/1999 até 30/06/2007) tendo sempre cumprido “as sua tarefas com zelo, dedicação e empenhamento” (23. dos factos provados) criou naturalmente a confiança e expectativa de que iria integrar os quadros de pessoal efectivo daquele. A frustração dessa relevante expectativa na sua carreira profissional, dimensão manifestamente fundamental da realização pessoal de cada indivíduo, não pode pois deixar de ser indemnizada em termos de danos morais, a valorar nos termos gerais, perante os quais se mostram adequados os peticionados €5 363,98. IV.1 – Mostra-se violado o disposto no art. 496º do Código Civil. O Recorrido contra-alegou pugnando pelo não provimento do recurso ou, quando assim se não entenda, pela sua condenação, apenas, no pagamento dos subsídios de férias e de Natal relativos ao período efectivo de execução do contrato. O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto teve “vista” no processo. Foram colhidos os vistos legais.*II. Matéria de Facto Provada É a seguinte a matéria de facto dada como provada na 1ª instância: 1. Em 18/01/1999, a A. celebrou com a C………., um contrato para exercer para esta o controlo de processamento de materiais de risco específico e subprodutos dos animais de talho e caça (mamíferos) nas unidades de transformação de sub produtos. 2. Tal contrato foi reduzido a escrito, epigrafado de “Contrato de Prestação de Serviços em Regime de Tarefa” e consta do mesmo, inserto a fls 27 dos autos, que era celebrado ao abrigo do disposto no art. 17º do DL n.º 41/84, de 3 de Fevereiro, dando-se aqui por integralmente reproduzido o respectivo teor. 3. Inicialmente foi outorgado pelo prazo de 5 meses, com o motivo de nos serviços da aludida C……… não existirem funcionários ou agentes em número suficiente e em condições materiais e legais adequadas ao exercício das funções para que a A. foi contratada (cfr. cláusula terceira e quarta), comprometendo-se a C………. a pagar à A., mensalmente, a quantia de 90.000$00 (448,92€) – cfr. cláusula segunda. 4. Em 17/06/1999, a A. celebrou com a mesma entidade novo contrato, que se mostra junto a fls 28, desta feita denominado de “Contrato de Prestação de Serviços em Regime de Avença”, para, no mesmo local, desempenhar as mesmas funções, descritas em 1., mediante o pagamento da mesma importância. 5. Este contrato foi celebrado para o período de 17/06/1999 a 31/12/1999 e sob a invocação dos mesmos motivos indicados no primeiro contrato. 6. A este segundo contrato foi, com a data de 01/01/2000, feito um aditamento, inserto a fls 29, segundo o qual a cláusula segunda passaria a referir que a quantia a pagar pela C………. à A. no final de cada mês seria de 95.000$00 (473,86€), 7. E da cláusula quarta e sétima passaria a constar que o contrato seria válido de 01/01/2000 a 31/12/2000. 8. Com data de 12/02/2001, foi outorgado um novo aditamento ao contrato de avença, inserto a fls 30, segundo o qual o contrato passava a vigorar pelo período de 01/01/2001 a 31/12/2001 – nova redacção da cláusula quarta e sétima – e a quantia a pagar mensalmente pela C………. à A., passava a ser de 115.700$00 (577,11€) – nova redacção da cláusula segunda. 9. Datado de 25/01/2002, foi outorgado mais um aditamento ao contrato de avença, inserto a fls 31, através do qual o dito contrato passava a vigorar pelo período de 01/01/2002 a 31/12/2002 (nova redacção da cláusula quarta e sétima), mantendo-se todas as outras condições, designadamente, quanto à quantia a pagar mensalmente pela C………. à A.. 10. Com data de 04/11/2002, foi outorgado um novo aditamento ao contrato de avença, inserto a fls 32 verso, pelo qual o contrato passou a ser válido até 31/12/2003. 11. Mais uma vez, datado de 05/01/2004, foi subscrito novo aditamento ao contrato de avença, inserto a fls 34, segundo o qual o contrato passaria a ser válido até 31/12/2004. 12. Em 14/01/2005, foi outorgado um novo aditamento ao contrato de avença, inserto a fls 35 verso, que prorrogou “até 31/12/2005, a vigência do contrato de avença celebrado, em 18/01/1999, para o exercício de funções de “CONTROLO DE SUBPRODUTOS”. 13. Com data de 13/02/2006, foi firmado um novo aditamento ao contrato de avença, inserto a fls 36, pelo qual a vigência do contrato foi prorrogada até 31/03/2006. 14. Este aditamento foi remetido por carta, inserta a fls 37, como habitualmente com data posterior à do início da vigência do aditamento, segundo a qual o contrato apenas seria prorrogado por essa última vez, de 01/01/2006 a 31/03/2006. 15. Mas, com data 01/04/2006, a A. e a C………., outorgaram um novo “Contrato de Prestação de Serviços em Regime de Avença”, inserto a fls 38. 16. Nos termos deste contrato, para vigorar entre 01/04/2006 e 31/03/2007, a A. ia desempenhar as “tarefas inerentes ao controlo de subprodutos higidos, de material de risco específico (MRE) e de abate de Bovinos com mais de 30 meses, visando colmatar a inexistência de funcionários ou agentes, nos serviços da C1………., em número suficiente e em condições materiais e legais adequadas ao exercício daquelas funções” – cfr. cláusula primeira e sexta. 17. Como contrapartida, a C………. pagava à A. a quantia mensal de 662,86 euros – cfr. cláusula segunda. 18. A A. exerceria as suas funções na D………., sita em ………., e teria que cumprir o respectivo horário de funcionamento, sem prejuízo de, no decurso da vigência do contrato, lhe vir a ser atribuído novo local de trabalho – cfr. cláusula terceira. 19. Foi acordado também que a A. poderia, por razões ponderosas ao serviço, ser chamada “a realizar, cumulativamente, tarefas em local diverso, havendo lugar à compensação pelos trabalhos prestados a mais e de eventuais despesas de deslocação, processados a título de honorários, e apurados de acordo com as regras legais aplicáveis a funcionários e agentes para idênticas situações” – cfr. cláusula quarta. 20. Entretanto, datada de 2/05/2007, a A. recebeu uma carta, inserta a fls 39, assinada pelo Director Regional respectivo, a qual comunica a rescisão unilateral do contrato com efeitos a partir de 30/06/2007. 21. Não existia qualquer contrato escrito em vigor desde 31/03/2007. 22. Posteriormente, por carta com data de 21/05/2007, foi remetido à A. um aditamento ao contrato de avença, datado de 28/02/2007, inserto a fls 40 v, segundo o qual “mantêm-se inalteradas as cláusulas contratuais constantes do contrato celebrado em 01.04.2006, passando o mesmo a vigorar até 30.06.2007. 23. A A., desde 18/1/1999 até 30/06/2007, manteve-se ininterruptamente ao serviço da C………. e sempre cumpriu as suas tarefas com zelo, dedicação e empenhamento. 24. Desde a data da contratação da A., esta esteve sempre sujeita às ordens, direcção e fiscalização da C………. . 25. Assim, quanto ao local de prestação de trabalho: a A. executava o seu trabalho inicialmente na empresa “E………., Lda”, conforme disposição da C………., que a partir de 01/04/2007 ordenou a sua transferência para a “F……….., Lda”, onde passou a prestar funções; 26. A A. comparecia nas instalações da “E………., Lda”, de segunda a sábado, das 6h00 às 12h00, e depois na “F……….., Lda”, das 8h00 às 16h00, com interrupção para almoço das 12h00 às 13h00, conforme definido pela entidade empregadora, a C……….; 27.O trabalho da A. consistia no controlo sanitário das carcaças e subprodutos como farinhas, que, respectivamente, entravam e saiam das referidas empresas, tendo a A. que elaborar mapas, os quais eram feitos mediante orientações, instruções e ordens precisas da C………., directamente emanadas do seu responsável hierárquico, na altura, o Sr. Dr. G………., utilizando para o efeito, na empresa E………., Lda”, os modelos fornecidos pela C……… que preenchia à mão, e na empresa “F………, Lda.”, um computador e sistema informático, propriedade do H……… . 28. Três a quatro vezes por ano, a A. e os seus colegas eram convocados para reuniões, nas quais eram dadas instruções e explicados procedimentos a adoptar no exercício das funções a realizar. 29. O trabalho da A. era sujeito a fiscalização, a qual era levada a cabo, designadamente, pelo Sr. Dr. G………., o seu superior hierárquico, bem como pelo Sr. I………, secretário, e pelo Veterinário que acompanhava este nas inspecções que regularmente eram feitas, e durante as quais eram anotadas falhas, lapsos ou erros técnicos eventualmente cometidos pela A. e atrasos nas entregas dos mapas que esta tinha que elaborar até ao dia 8 de cada mês, sendo a A. igualmente controlada quanto à assiduidade e pontualidade em função do respectivo horário, tal como sucedia com os colegas que trabalhavam nas mesmas circunstâncias, tendo um deles sido dispensado, por sucessivamente incumprir o horário de trabalho. 30. A C………., desde a data da contratação da A., sempre lhe pagou a remuneração apenas durante 12 meses por ano, nunca lhe tendo pago qualquer quantia a título de subsídio de férias e de Natal. 31. A A. mercê do período de tempo porque se prolongou a relação contratual acreditou que acabaria por ser integrada na Função Pública. *III. Do Direito 1. Nos termos do disposto nos artºs 684º, nº 3, e 685º-A, nº 1, do CPC, na redacção introduzida pelo DL 303/2007, de 24.08, aplicáveis ex vi do disposto nos artºs 1º, nº 2, al. a), e 87º do CPT (de 2000), as conclusões formuladas pelo recorrente delimitam o objecto do recurso, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso. E, daí, que sejam as seguintes as questões a apreciar: A. Se, consubstanciando a relação jurídica havida entre as partes um contrato de trabalho, não tem aplicação o art. 10º, nº 6, do DL 184/89, de 14.06, na redacção dada pela Lei 25/98, de 26.05; B. Se são devidos os subsídios de férias e de natal; C. Do despedimento ilícito e suas consequências; D. Dos danos não patrimoniais. 2. Da 1ª questão Se, consubstanciando a relação jurídica havida entre as partes um contrato de trabalho, não tem aplicação o art. 10º, nº 6, do DL 184/89, de 14.06, na redacção dada pela Lei 25/98, de 26.05. 2.1. O entendimento da sentença recorrida[1] foi, em síntese, o seguinte: pese embora denominados de contratos de prestação de serviços, a relação entre as partes desenrolou-se de forma subordinada, característica própria do contrato de trabalho, pelo que, tendo o réu Estado recorrido ilegalmente à celebração de contratos de prestação de serviços, a situação caía sob a alçada do nº 6 do art. 10º do DL 184/89, de 02.06, na redacção dada pela Lei 25/98, de 26.05, o que determina a nulidade dos referidos contratos; produzindo o contrato nulo, nos termos desse preceito, os seus efeitos como se válido fosse em relação ao tempo durante o qual esteve em execução, esses efeitos são os que resultam do contrato tal como ele foi celebrado entre as partes; assim, o trabalhador, por referência ao período de execução do contrato, não pode reclamar quaisquer direitos que lhe pudessem derivar da qualificação jurídica da relação contratual como contrato de trabalho, designadamente retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal e indemnização de antiguidade. A sentença recorrida não põe em causa que, não obstante o nomen juris atribuído pelas partes aos contratos, a relação jurídica entre elas mantida foi executada de forma subordinada, correspondendo, materialmente, a um contrato de trabalho, o que não é também questionado pelo Réu nas contra-alegações, nas quais aliás refere que “um juízo de globalidade sobre os elementos factuais quanto ao modo de organização da actividade profissional da Recorrente, leva-nos, indiscutivelmente, à qualificação do contrato em causa como um verdadeiro e próprio contrato de trabalho;”, realçando para o efeito, o que consta dos nºs 25, 27, 28 e 29 dos factos provados e acrescentando “(…) Resulta assim com toda a evidência que a Recorrente não actuava como profissional liberal, mas antes como uma trabalhadora subordinada, em nada inquinando esta conclusão o facto de a Recorrente por exemplo nunca ter recebido os subsídios de férias e de Natal, sendo remunerada apenas doze vezes por ano (…)” e citando a esse propósito, o Acórdão do STJ de 15.02.2005, in www.dgsi.pt, Processo 04S3583. Ou seja, não está em causa no recurso que a relação jurídica havida pelas partes deva ser, do ponto de vista substantivo ou de direito material, qualificada como consubstanciando um contrato de trabalho e não um contrato de prestação de serviços, qualificação essa que, de todo o modo, é a que, em nosso entender, decorre da conjugação da factualidade apurada e do disposto no art. 1º da LCT, aprovada pelo DL 49.408, de 24.11.69, nos termos do qual “contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa, sob a autoridade e direcção desta.” (e com base no qual deverá ser aferida a qualificação da natureza do contrato, iniciado aos 18.01.1999, atento o disposto nos arts. 3º, nº 1 e 8º, nº 1, da Lei 99/2003, de 27.08 e 7º, nº 1, da Lei 7/2009, de 12.02 uma vez que não se extrai da matéria de facto provada que as partes tivessem alterado, a partir de 01.12.2003, os termos dessa Relação – cfr., por todos, Acórdão do STJ de 10.12.2009. in www.dgsi.pt, Proc. 6/08.1TTPTG.S1). 2.2. O que está, pois, verdadeiramente em causa é se, ao caso, é aplicável o nº 6 do art. 10º do DL 184/89, de 02.06, na redacção dada pela Lei 25/98, de 26.05 e, sendo-o, se tal significa que, não obstante efectiva e materialmente vinculados por um contrato de trabalho (apesar do nomen juris que lhe atribuíram ser de prestação de serviços, tarefa ou avença), não poderão ser reconhecidos ao trabalhador quaisquer direitos laborais. Sobre questão idêntica, pronunciou-se o Supremo Tribunal de Justiça no seu recente Acórdão de 10.12.2009, in www.dgsi.pt (Processo nº 6/08.1TTPTG.S1), que sufragamos e que passamos a transcrever: “3.3. É certo que o artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho, na redacção introduzida pela Lei n.º 25/98, de 26 de Maio, determina que «[s]ão nulos todos os contratos de prestação de serviços, seja qual for a forma utilizada, para o exercício de actividades subordinadas, sem prejuízo da produção de todos os seus efeitos como se fossem válidos em relação ao tempo durante o qual estiveram em execução» (n.º 6) e prevê um regime específico destinado a sancionar a celebração de contratos de prestação de serviços fora do regime legalmente instituído, fazendo recair sobre os dirigentes que os celebrem ou autorizem, a responsabilidade civil e disciplinar pela prática de actos ilícitos, bem como a responsabilidade financeira, que se efectiva através da entrega nos cofres do Estado do quantitativo igual ao que tiver sido abonado ao pessoal ilegalmente contratado (n.os 7 e 8). Acresce que o acórdão deste Supremo Tribunal, de 8 de Novembro de 2006, proferido no Processo n.º 1544/06, da 4.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt, como documento n.º SJ200611080015444, decidiu que, em consequência da declaração de nulidade do contrato de prestação de serviço firmado por parte da Administração, «o trabalhador não pode reclamar quaisquer diferenças salariais ou direitos estatutários que se não compreendam no quadro jurídico do contrato efectivamente celebrado, do mesmo modo que não pode exigir quaisquer direitos remuneratórios e indemnizatórios supervenientes à extinção do contrato, que pudessem derivar da diversa qualificação jurídica atribuível à relação contratual», sendo que «[a] única sanção estabelecida para a indevida celebração de contratos de prestação de serviços, por parte da Administração, é a prevista nos nºs 6 e 7 do citado artigo 10.º, que faz recair sobre os dirigentes que celebrem ou autorizem a celebração desses contratos a responsabilidade civil e disciplinar pela prática dos actos ilícitos, com a consequente cessação da respectiva comissão de serviço, bem como a correspondente responsabilidade financeira, efectivada através da entrega nos cofres do Estado do quantitativo igual ao que tiver sido abonado ao pessoal ilegalmente contratado». Todavia, esta orientação jurisprudencial foi, entretanto, abandonada. Conforme é afirmado no recente acórdão deste Supremo Tribunal, de 30 de Setembro de 2009, Processo n.º 4646/06.5TTLSB.L1.S., da 4.ª Secção, disponível em www.dgsi.pt, «não se afigura que deva ser objecto de cobrança de aplicação ao caso o dispositivo constante do n.º 6 do art. 10.º do Decreto-Lei n.º 184/89, em termos de ser interpretado no sentido de os efeitos do contrato celebrado entre as partes, uma vez declarado ele nulo, se haverem de ter como válidos relativamente ao tempo em que esse contrato esteve em execução, mas reportados à espécie contratual que deflui do nomen nele aposto, pois que, em verdade, o que se passou foi a celebração, desde o início, de um contrato de trabalho entre a autora e o réu». De facto, tendo-se concluído que a relação contratual estabelecida entre as partes revestiu a natureza de contrato de trabalho, não tem aplicação, no caso sujeito, o disposto no n.º 6 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 184/89, pelo que improcedem as conclusões IV) a VI) e VII), na parte atinente, da alegação do recurso de revista.” O douto acórdão acabado de transcrever, revendo anterior posição (na qual se sustentou a sentença recorrida), dá, pois, cabal resposta à questão ora em apreço. Assim sendo, no caso, consubstanciando a relação jurídica havida entre as partes um verdadeiro contrato de trabalho, não lhe é aplicável o citado art. 10º, nº 6., assim procedendo, nesta parte, as conclusões do recurso 3. Da 2ª questão Se são devidos os subsídios de férias e de natal; Face á conclusão extraída na questão anterior – a de que a relação jurídica mantida entre as partes consubstancia um contrato de trabalho e que não lhe é aplicável o art. 10º, nº 6, do DL 184/89 (na redacção introduzida pela Lei 25/98) – impõe-se retirar as devidas consequências. Uma das primeiras, prender-se-á com a da validade, ou não, do referido contrato de trabalho e que será apreciada a propósito da 3ª questão, havendo agora, para efeitos de apreciação do direito aos reclamados subsídios de férias e de Natal, que ter em conta, apenas, que, mesmo que tal contrato fosse nulo (como o é, em nosso entendimento), tal não obstará a que à A. deva ser reconhecido o direito às prestações ora em apreço. Com efeito, tanto o art. 15º da LCT, como o art. 115, nº 1, do CT, dispõe, de forma idêntica, que o contrato de trabalho declarado nulo ou anulado produz efeitos como se válido fosse em relação ao tempo durante o qual esteve em execução. Daí que, em matéria de subsídios de férias e de Natal, haja que se aplicar o que na legislação laboral se prevê. Dispunha o DL 874/76, de 28.12., que: os trabalhadores têm direito a um período de férias de 22 dias úteis, reportando-se as férias ao trabalho prestado no ano civil anterior, vencendo-se no dia 1 de Janeiro de cada ano civil e tendo o trabalhador, se admitido no 1º semestre do ano civil, direito a 8 dias úteis de férias após 60 dias de trabalho efectivo (arts. 1º, nºs 1 e 2, 3º, nºs 1 e 3 e 4º, nº 1); a retribuição correspondente ao período de férias não pode ser inferior à que os trabalhadores receberiam se estivessem em serviço efectivo (art. 6º, nº 1); além da retribuição, os trabalhadores têm direito a um subsídio de férias de montante igual ao da retribuição (art. 6º, nº 2); no ano da cessação do contrato o subsídio de férias é proporcional ao tempo de serviço prestado nesse ano (art. 10º, nº 1). Nos termos do CT/2003, mantém-se quer o direito a 22 dias úteis de férias (no mínimo), quer à retribuição igual à que os trabalhadores receberiam se estivessem em serviço efectivo (art. 255º, nº 1) e ao subsídio de férias, passando este, porém, a corresponder à retribuição-base acrescida das demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho (art. 255º, nº 2). Quanto ao subsídio de natal, estava ele previsto no DL 88/96, de 03.07, nos termos do qual todos os trabalhadores têm direito a subsídio de Natal de valor igual ao da retribuição, que deverá ser pago até 15 de Dezembro (art. 2º, nº 1) e sendo proporcional ao tempo de serviço prestado nos anos de admissão do trabalhador e da cessação do contrato (art. 2º, nº 2, als. a) e c)). A sua atribuição mantém-se no CT/2003, dispondo o art. 254º que ele corresponderá a um mês de retribuição. Assim sendo, tem a A. direito, a título de subsídios de férias e de Natal referentes aos anos de 1999 a 30.06.2007 (incluindo os “proporcionais” dessas prestações correspondentes ao período de 01.01.2007 a 30.06.2007, data da cessação do contrato), ao montante global de €9.636,02 que peticionou. Esclareça-se que, relativamente aos proporcionais, considerando que a A. auferia a retribuição de €662,86 e que o contrato cessou aos 30.06.2007, ser-lhe-ia devida a quantia de €331,43 em relação a cada um deles. Acontece que a A., em relação a cada um, apenas peticionou o montante de €165,71, pelo que entendemos ser este o devido (165,71 x 2). Nos termos dos arts. 804º, 805º, nº 2, al. a), 806º e559º, todos do Cód. Civil, a A. tem ainda direito, sobre o montante em dívida, aos juros de mora, à taxa legal, desde a data do vencimento de cada uma dessas prestações até integral pagamento. 4. Da 3ª questão Do despedimento ilícito e suas consequências; 4.1. Entende a A. que foi ilicitamente despedida, porque sem justa causa e sem processo disciplinar, pelo que considera ter direito às retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à do trânsito em julgado da sentença e, bem assim, à reintegração. Subsidiariamente, para o caso de se entender que a especificidade da entidade contratante – o Estado – impede a reintegração, entende que o tribunal, oficiosamente, deverá condenar o réu na alternativa consagrada na lei, qual seja na indemnização de antiguidade, que deverá ser graduada em 45 dias de retribuição base por cada ano completo ou fracção de antiguidade. 4.2. No caso, a relação laboral vigorou desde 18.01.1999 a 30.06.2007, sendo que, de 18.01.99 a 31.03.07, foram, por escrito, celebrados três contratos denominados de prestação de serviços (em 18.01.99, 17.06.99 e 31.03.07), pelos períodos nele determinados e havendo, o segundo, sido objecto de 7 aditamentos, visando, essencialmente, a prorrogação dos prazos por que foram celebrados (e, em alguns casos, também a alteração da retribuição). De 31.03.07 a 30.06.07 (data esta em que, por iniciativa do Réu, cessou a relação jurídico-laboral) não existiu qualquer documento escrito a titular essa relação. 4.3.A matéria da constituição, modificação e extinção da relação jurídica na Administração Pública foi, no que importa ao recurso, sucessivamente regulada, pelos DL 184/89, de 2 de Junho, alterado pela Lei 25/98, de 26 de Maio, e pelo DL 427/89, de 7 de Dezembro[2], diploma este alterado pelo DL 218/98, de 17 de Junho. Entretanto, foi publicada a Lei 23/04, de 22.06, que entrou em vigor aos 22.07.04 (cfr. art. 31º) e que veio definir o regime jurídico do contrato de trabalho nas pessoas colectivas públicas. 4.3.1. No domínio da legislação vigente até à Lei 23/04, não era admissível a contratação sem termo na Administração Pública, como decorre dos arts. 9º do DL 184/89, de 02.06 e 14º e 43º, nº 1, do DL 427/89, de 07.12. . E, por outro lado, a contratação a termo obedecia, como regra geral, a um processo prévio de selecção de candidatos sujeito ao princípio da publicidade (cfr. arts. 9º, nº 3, do DL 184/89 e 19º do DL 427/89). Acresce que, nos termos do art. 18º do DL 427/89, na redacção introduzida pelo DL 218/98, o contrato a termo visava a satisfação de necessidades transitórias dos serviços de duração determinada (nº 1), definindo-se no 2 as situações em que era lícito recorrer à contratação a termo e dispondo-se nos nºs 4 e 5 que: - No nº 4 que: “4 – O contrato de trabalho a termo certo a que se refere o presente diploma não se converte, em caso algum, em contrato sem termo.”; - E, no nº 5, que. “5- A celebração de contrato de trabalho a termo certo com violação do disposto no presente diploma implica a sua nulidade e constitui os dirigentes em responsabilidade civil, disciplinar e financeira pela prática de actos ilícitos, sendo ainda fundamento para a cessação da comissão de serviço nos termos da lei.” Decorre, pois, do referido, que, no domínio do DL 427/89, era proibida a celebração por parte do Réu – Estado - de contratos de trabalho por tempo indeterminado, proibição essa que “é absoluta, englobando, por isso, a contratação tácita, a contratação originária e a contratação por conversão” (Acórdão do STJ de 10.12.2009, já citado). Ora, assim sendo, o contrato de trabalho entre A. e Réu, iniciado em 1999 (que, para além do mais, não foi reduzido a escrito ou, pelo menos – caso se atenda aos escritos que titularam a alegada prestação de serviços – não se encontra justificada nos termos legalmente exigidos, que visava a satisfação de necessidades permanentes e que excedeu o prazo por que seria celebrado e o número de renovações admitidas[3]) estava, atento o disposto no art. 294º do Cód. Civil, ferido de nulidade, não sendo admissível a consideração ou conversão do contrato de trabalho em causa em contrato por tempo indeterminado. 4.3.2. Entretanto, aos 22.07.2004, entrou em vigor a Lei 23/2004, de 22.06, que passou a prever a possibilidade de contratação sem termo no seio da Administração Pública. Ora, assim sendo, coloca-se, a nosso ver, a questão de saber se se terá deixado de verificar o impedimento, que até então ocorria, relativo à existência da contratação sem termo da A. É que, dispondo o art. 118º, nº 1, do Código do Trabalho[4] que “Cessando a causa da invalidade durante a execução do contrato, este considera-se convalidado desde o início”, impõe-se tal apreciação (cfr. Acórdão do STJ de 26.11.08, in www.dgsi.pt, Proc. 08S1982). Em tal diploma passou a dispor-se: - No art. 1º, nºs 1 e 2, que: “1- A presente lei define o regime jurídico do contrato de trabalho nas pessoas colectivas públicas” e que, “2-Podem celebrar contratos de trabalho o Estado e outras pessoas colectivas públicas nos termos da presente lei.”. - No art. 2º, nº 1, que “1- Aos contratos de trabalho celebrados por pessoas colectivas públicas é aplicável o regime do Código do Trabalho e respectiva legislação com as especificidades constantes da presente lei”. - No art. 5º, define-se a obrigatoriedade de sujeição da contratação por tempo indeterminado a um processo prévio de selecção subordinado aos princípios da publicitação da oferta de trabalho, da igualdade de condições e oportunidades e fundamentação da decisão de contratação em critérios objectivos. - No art. 8º, sujeita-se a celebração dos contratos de trabalho a forma escrita; - No art. 9º, para além do mais que dele consta, definem-se as situações em que é lícita a contratação a termo resolutivo e determina-se a sujeição da contratação a um processo de selecção simplificado, precedido de publicitação da oferta e de decisão reduzida a escrito e fundamentada em critérios objectivos de selecção. - e, no art. 10º, sob a epígrafe “Regras especiais aplicáveis ao contrato de trabalho a termo resolutivo”, que: 1 – O contrato de trabalho a termo resolutivo certo celebrado por pessoas colectivas públicas não está sujeito a renovação automática. 2 – O contrato de trabalho a termo resolutivo celebrado por pessoas colectivas públicas não se converte, em caso algum, em contrato por tempo indeterminado, caducando no termo do prazo máximo de duração previsto no Código do Trabalho. 3 – A celebração de contratos de trabalho a termo resolutivo com violação do disposto na presente lei implica a sua nulidade e gera responsabilidade civil, disciplinar e financeira dos titulares dos orgãos que celebraram os contratos de trabalho. A contratação da A., à luz da Lei 23/2004, continua a não obedecer aos requisitos legais exigidos, quer porque, enquanto contratação por tempo indeterminado, não foi reduzida a escrito e não observando, ou não resultando dos autos que haja observado (sendo que, nos termos do art. 342º, nº 1, do Cód. Civil, à A. competia o ónus de alegação e prova dos factos correspondentes), o prévio processo concursório e a existência e limites do quadro de pessoal (cfr. art. 7º, nºs 1 e 4), quer porque, enquanto contrato a termo, os vícios de que já padecia a contratação continuam a verificar-se, para além de que, desde 31.03.2007 a 30.06.2007, inexistia até qualquer escrito que titulasse a relação contratual. E, não fosse o réu o Estado, mas sim uma entidade privada, dúvidas não restariam de que o contrato de trabalho existente entre as partes deveria ser considerado como sendo por tempo indeterminado, nada obstando a que, em caso de ilicitude do despedimento, a A. fosse reintegrada. Em nossa e salvo melhor opinião, tal não é, contudo, possível no caso em apreço, ainda que no âmbito do citado diploma. Vejamos porquê. Para além do art. 8º, nº 3, e 10º, nº 2, da Lei 23/2004 determinarem, respectivamente, a nulidade do contrato de trabalho não reduzido a escrito e a não conversão do contrato a termo em contrato de trabalho sem termo, entendemos que um outro impedimento existe. Com efeito, e como já referido, o art. 5º do citado diploma sujeita a contratação por tempo indeterminado a um processo prévio de selecção subordinado aos princípios da publicitação da oferta de trabalho, da igualdade de condições e oportunidades e fundamentação da decisão de contratação em critérios objectivos, exigência essa que mais não visa do que dar cumprimento ao comando constitucional constante do art. 47º, nº 2, da CRP, nos termos do qual “2 – Todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso”, na interpretação constante que dele tem sido feita pelo Tribunal Constitucional. Como é sabido, sobre a querela jurídica relativa à questão da convertibilidade do contrato de trabalho a termo em sem termo no seio da Administração Pública, o Tribunal Constitucional, no seu Acórdão, com força obrigatória geral, nº 368/2000, (DR I Série-A, de 30.11.00), pronunciou-se no sentido da inconstitucionalidade do art. 14º, nº 3, do então DL 427/89 (na redacção anterior ao DL 218/98), “na interpretação segundo a qual os contratos de trabalho a termo celebrados pelo Estado se convertem em contratos de trabalho sem termo, uma vez ultrapassado o limite máximo de duração total fixado na lei geral sobre contratos de trabalho a termo, por violação do disposto no nº 2 do artigo 47º da Constituição”. E, no que concerne aos institutos públicos, também o referido Tribunal, no Acórdão nº 61/2004 (DR, 1ª Série-A, de 27.02.04), declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade do art. 22º do DL 342/99, de 25 de Agosto, que cria o Instituto Português de Conservação e Restauro, “na medida em que admite a possibilidade de contratação do pessoal técnico superior e do pessoal técnico especializado em conservação e restauro mediante contrato individual de trabalho, sem que preveja qualquer procedimento de recrutamento e selecção dos candidatos à contratação que garanta o acesso em condições de liberdade e igualdade, (…)”, também por violação do nº 2 do art. 47º da Constituição. No mesmo sentido aponta, igualmente o Acórdão do STJ de 26.11.08, in www.dgsi.pt (Processo 08S1982) que, transcrevendo o acórdão do TC nº 683/99 (cfr., de modo idêntico, o Acórdão do TC 61/2004), refere o seguinte: “(…) Este não pode, por outro lado, ser procedimentalmente organizado, ou decidido, em condições ou segundo critérios discriminatórios, conducentes a privilégios ou preferências arbitrárias, pela sua previsão ou pela desconsideração de parâmetros ou elementos que devam ser relevantes (…). É certo que o direito de acesso previsto no artigo 47.º, n.º 2, não proíbe toda e qualquer diferenciação, desde que fundada razoavelmente em valores com relevância constitucional – como exemplos pode referir-se a preferência no recrutamento de deficientes ou na colocação de cônjuges um junto do outro (assim G. Canotilho/V. Moreira, Constituição..., cit., pág. 265). Poderá discutir-se se do princípio consagrado no artigo 47.º, n.º 2, resulta, como concretização dos princípios de igualdade e liberdade, que os critérios de acesso (em regra, de decisão de um concurso) tenham de ser exclusivamente meritocráticos, ou se pode conceder-se preferência a candidatos devido a características diversas das suas capacidades ou mérito, desde que não importem qualquer preferência arbitrária ou discriminatória – assim, por exemplo, o facto de serem oriundos de uma determinada região, ou de terem outra característica (por exemplo, uma deficiência) reputada relevante para os fins prosseguidos pelo Estado. Seja como for, pode dizer-se que a previsão da regra do concurso, associada aos princípios da igualdade e liberdade no acesso à função pública, funda uma preferência geral por critérios relativos ao mérito e à capacidade dos candidatos (…). E o concurso é justamente previsto como regra por se tratar do procedimento de selecção que, em regra, com maior transparência e rigor se adequa a uma escolha dos mais capazes – onde o concurso não existe e a Administração pode escolher livremente os funcionários não se reconhece, assim, um direito de acesso (Gomes Canotilho/Vital Moreira, ob. e loc. cits., anotação XI; sobre o fundamento do procedimento concursal, v. também Ana Fernanda Neves, Relação jurídica de emprego público, cit., págs. 147 e seguintes). Assim, para respeito do direito de igualdade no acesso à função pública, o estabelecimento de excepções à regra do concurso não pode estar na simples discricionariedade do legislador, que é justamente limitada com a imposição de tal princípio. Caso contrário, este princípio do concurso – fundamentado, como se viu, no próprio direito de igualdade no acesso à função pública (e no direito a um procedimento justo de selecção) – poderia ser inteiramente frustrado. Antes tais excepções terão de justificar-se com base em princípios materiais, para não defraudar o requisito constitucional (assim Gomes Canotilho/Vital Moreira, loc. cit.; Ana F. Neves, ob. cit., págs. 153-4).». E, sobre o conceito de função pública para efeitos do art. 47º, nº 2, da CRP discorre o Acórdão do TC 61/2004, nos seguintes termos: “Seguindo, uma vez mais, a argumentação desenvolvida no Acórdão nº 406/2003, recordar-se-á que uma solução intermédia parece ser defendida por J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, quando referem (Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.a ed., Coimbra, 1993, p. 264, n. VIII ao artigo 47º): «A definição constitucional do conceito de função pública suscita alguns problemas, dada a diversidade de sentidos com que as leis ordinárias utilizam a expressão e dada a pluralidade de critérios (funcionais, formais) defendidos para a sua caracterização material. Todavia, não há razões para contestar que o conceito constitucional corresponde aqui ao sentido amplo da expressão em direito administrativo, designando qualquer actividade exercida ao serviço de uma pessoa colectiva pública (Estado, Região Autónoma, autarquia local, instituto público, associação pública, etc.), qualquer que seja o regime jurídico da relação de emprego (desde que distinto do regime comum do contrato individual de trabalho), independentemente do seu carácter provisório ou definitivo, permanente ou transitório.» No entanto, Vital Moreira, mais tarde, viria a pronunciar-se em sentido mais amplo («Projecto de lei quadro dos institutos públicos — Relatório final e proposta de lei quadro», grupo de trabalho para os institutos públicos, Ministério da Reforma do Estado e da Administração Pública, Fevereiro de 2001, nº 4, p. 50, nota ao artigo 45º), adoptando uma posição que tem também sido defendida pelo Tribunal Constitucional, ao ponderar que: «No entanto, mesmo quando admissível o regime do contrato de trabalho, nem a Administração Pública pode considerar-se uma entidade patronal privada nem os trabalhadores podem ser considerados como trabalhadores comuns. No que respeita à Administração, existem princípios constitucionais válidos para toda a actividade administrativa, mesmo a de ‘gestão privada’, ou seja, submetida ao direito privado. Entre eles contam-se a necessária prossecução do interesse público, bem como os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé (artigo 266º, nº 2, da Constituição), todos eles com especial incidência na questão do recrutamento do pessoal. Além disso, estabelecendo a Constituição que ‘todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso’ (CRP, artigo 47º, nº 2), seria naturalmente uma verdadeira fraude à Constituição se a adopção do regime de contrato individual de trabalho incluísse uma plena liberdade de escolha e recrutamento dos trabalhadores da Administração Pública com regime de direito laboral comum, sem qualquer requisito procedimental tendente a garantir a observância dos princípios da igualdade e da imparcialidade.» Estas últimas considerações afiguram-se inteiramente procedentes, principalmente quando, como é o caso, o regime laboral do contrato individual de trabalho se reporta a um instituto público que mais não é que um serviço público personalizado. Com efeito, a exigência constitucional de «acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso» apresenta duas vertentes. Por um lado, numa vertente subjectiva, traduz um direito de acesso à função pública garantido a todos os cidadãos; por outro lado, numa vertente objectiva, constitui uma garantia institucional destinada a assegurar a imparcialidade dos agentes administrativos, ou seja, que «os trabalhadores da Administração Pública e demais agentes do Estado e outras entidades públicas estão exclusivamente ao serviço do interesse público» (nº 1 do artigo 269º da CRP). Na verdade, procedimentos selecção e recrutamento que garantam a igualdade e a liberdade de acesso à função pública têm também a virtualidade de impedir que essa selecção e recrutamento se façam segundo critérios que facilitariam a ocupação da Administração Pública por cidadãos exclusiva ou quase exclusivamente afectos a certo grupo ou tendência, com o risco de colocarem a mesma Administração na sua dependência, pondo em causa a necessidade de actuação «com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé» (nº 2 do artigo 266º da CRP). Esta perspectiva é particularmente importante quando se trate de recrutamento e selecção de pessoal para entidades que exerçam materialmente funções públicas, como acontece com o IPCR (cf., supra, nº 4.1). (…) Ainda que se entenda que para o recrutamento de pessoal sujeito ao regime do contrato individual de trabalho se não justifica a realização de um concurso público, nem por isso se pode deixar de reconhecer que a selecção e o recrutamento desse pessoal deverá sempre ter lugar através de procedimentos administrativos que assegurem a referida liberdade e igualdade de acesso.”. Tais considerações, tecidas no âmbito de uma entidade que tinha a natureza de instituto público, têm inteira aplicação, até por maioria de razão, no domínio da administração directa do Estado. Ou seja, e pese embora, desde a Lei 23/04, seja possível, no seio da Administração Pública, o contrato individual de trabalho sem termo, da conjugação da doutrina constante dos dois citados acórdãos (cfr., também no mesmo sentido, Acórdão do STJ de 25.11.09, in www.dgsi.pt, Processo nº 1846/06.1YRCBR.S1) é, em nossa e salvo melhor opinião, possível concluir-se no sentido da inconstitucionalidade, por violação do artº 47º, nº 2, da CRP, da interpretação segundo a qual seria permitida, no seio da Administração Pública, a contratação sem termo, seja tácita, originária ou por conversão, sem prévio processo de recrutamento de candidatos à contratação que garanta o acesso em condições de liberdade e igualdade. 4.3.3. No caso, a A. não alegou, nem se provou, que a sua contratação, inicial ou subsequente, houvesse sido precedida de qualquer processo de recrutamento nos termos acima referidos, designadamente do previsto nos diplomas em vigor à data da sua contratação (DL 427/89 e, posteriormente, Lei 23/04), sendo que a ela competia, porque constitutivo do seu direito, o ónus de alegação e prova de tal facto (art. 342º, nº 1, do Cód. Civil). Embora a propósito da Lei 23/04, mas cujas considerações são transponíveis para o caso, nas conclusões IV, V e VI do sumário do Acórdão do STJ de 26.11.08, já citado, refere-se que: IV – A contratação nos termos da Lei n.º 23/2004, exige que a celebração do contrato de trabalho por tempo indeterminado observe a forma escrita, sob pena de nulidade (artigo 8.º), que exista, para o efeito, por parte das pessoas colectivas públicas que contratam, um quadro de pessoal próprio e a contratação seja feita nos limites desse quadro (artigo 7.º), e que exista um processo prévio de selecção, de que se destaca a publicitação da oferta de trabalho e a decisão de contratação fundada em critérios objectivos de selecção (artigo 5.º). V – Cabe ao trabalhador, como facto constitutivo do direito a ser considerado trabalhador por tempo indeterminado, a alegação e prova de que o acordo de vontades fonte da relação laboral que vigorou entre as partes foi reduzido a escrito, que houve o processo prévio de recrutamento e selecção com vista à sua contratação e que no organismo público que o contratou existia o referido quadro de pessoal próprio. VI – Não tendo sido feita a prova desses factos, não pode o contrato de trabalho por tempo indeterminado, nulo, convalidar-se por força da entrada em vigor da Lei n.º 23/2004. Assim sendo, entendemos que, no caso e sob pena de violação do disposto nos artºs 47º, nº 2, da CRP, a conversão da contratação a termo em contrato de trabalho sem termo (ou a convalidação de eventual nulidade da contratação da A.) não é possível. 4.4. O contrato de trabalho em apreço veio a cessar por iniciativa do Réu que, por carta datada de 02.05.2007, comunica a “rescisão” do mesmo com efeitos a partir de 30.06.2007. Atenta a data da cessação do contrato, à mesma é aplicável o CT de 2003. Pelas razões que se deixaram acima apontadas o contrato de trabalho entre A. e Réu deverá ser considerado como sem termo, embora nulo, e não a termo certo, como parece defender o réu nas contra-alegações. Aliás, e para além do mais que já se disse, até porque, após 31.03.2007, a A. se manteve ao serviço sem qualquer contrato reduzido a escrito (cfr. nº 21 dos factos provados), estando-se perante uma relação jurídico-laboral que, de facto, se foi mantendo, porém à margem ou à revelia do enquadramento jurídico que a permitiria e a que, porque nula, são aplicáveis os artsº 115º e 116º do Cód. Trabalho – cfr., neste sentido, Maria do Rosário Palma Ramalho e Pedro Madeira de Brito[5], bem como Liberal Fernandes[6], in ob. citada, a págs. 91/92, onde refere o seguinte: «Por isso, mantendo-se a produção dos efeitos do contrato a termo celebrado pela Administração para além do prazo máximo previsto (no essencial, a prestação de trabalho e o pagamento da retribuição), porquanto atenta contra a norma (imperativa) que proíbe a renovação tácita do contrato a termo (e mesmo a renovação expressa, quando o contrato atinge determinada duração) e, por maioria de razão, a respectiva conversão. (…). Trata-se de uma nulidade que, apesar de subsistir enquanto se prolongar a prestação de trabalho, não impede que o contrato de trabalho produza os seus efeitos como se fosse válido enquanto o vício não for invocado e a actividade de trabalho não cessar. (art. 15º, nº 1, da LCT», admitindo ainda o referido Autor a possibilidade de aplicação do disposto no então art. 15º, nº 6, da LCT (no mesmo sentido cfr. Acórdão da Relação de Évora de 13.2.01, in CJ, 2001, tomo V, pág. 293, (hoje, art. 116º, nº 3, do CT). [7] Dispõem os arts. 115º, nº 1, e 116º, nº 1, do CT que o contrato de trabalho declarado nulo ou anulado produz efeitos como se fosse válido em relação ao tempo durante o qual esteve em execução (art. 115º, nº 1) e que aos factos extintivos ocorridos antes da declaração de nulidade ou anulação do contrato de trabalho aplicam-se as normas sobre cessação do contrato. (art. 116º, nº 1). Nos termos do art. 286º do Cód. Civil, a nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo Tribunal. Contudo, no caso, o Réu, aquando da comunicação à A. de que o contrato cessava aos 30.06.07, não invocou a nulidade da relação laboral, antes se limitando a fazê-la cessar nos termos descritos, nulidade essa que apenas veio invocar na contestação. O despedimento consubstancia-se numa declaração do empregador dirigida ao trabalhador em que aquele manifesta a sua intenção de pôr termo ao contrato, declaração essa que tem natureza receptícia. Na comunicação do Réu à A. de 02.05.07, aquele manifesta, clara e expressamente, a sua intenção de pôr termo ao contrato com efeitos a partir de 30.06.07, declaração essa que consubstancia um despedimento. E, este, não foi precedido de processo disciplinar, nem de invocação de justa causa, pelo que deverá ser considerado ilícito – cfr. art. 429º do CT. Estamos, assim, perante um caso em que, no âmbito de uma relação laboral nula e antes de ter ocorrido a declaração dessa nulidade, foi perpetrado um despedimento ilícito, e não perante a caducidade de um contrato de trabalho a termo, como defende o Réu nas contra-alegações. Como se refere no Acórdão desta Relação de 18.06.07, proferido na Apelação 1040/06.4., «os arts. 115º, nº 1, e 116º, nº 1, do CT correspondem ao preceituado no art.15º, n.ºs 1 e 3, da LCT, no âmbito dos quais, e no que concerne à articulação entre a invalidade do contrato de trabalho e as normas que disciplinam a extinção do mesmo, mormente em caso de despedimento ilícito ocorrido antes de ser declarada a nulidade, se vinha entendendo que se não poderia ordenar a reintegração do trabalhador, consequência natural desse tipo de despedimento, e simultaneamente declarar a invalidade do contrato. E, por isso, a questão colocava-se somente no que diz respeito à determinação do termo da indemnização e outros efeitos decorrentes do despedimento ilícito, como é o caso dos salários intercalares, que seriam assim de manter. » Nesse sentido se pronunciou Romano Martinez, Direito do Trabalho, Almedina, 2002, pág. 424, segundo o qual “Se, não obstante a invalidade do contrato, uma das partes tiver posto termo ao negócio jurídico com base noutra causa que não a invalidade, por exemplo despedimento, encontram aplicação as regras de cessação do contrato de trabalho. Assim, se num determinado contrato de trabalho nulo, o empregador não invocar a invalidade e despedir o trabalhador, há o dever de pagar uma indemnização, nos termos gerais do art. 13 da LCCT. Por outras palavras, aplicam-se as regras do despedimento como se o contrato fosse válido, sendo devida indemnização no termos gerais”. E, na mesma linha, se pronunciou, também, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25.09.2002, in www.dgsi.pt (Proc. nº 02S1366), o qual analisa, aprofundamente, as consequências da ilicitude de despedimento levado a cabo antes da declaração da nulidade do contrato de trabalho, aresto esse em que, para além do mais que dele consta, se entendeu, conforme nele sumariado, que: I - Tendo a sentença, que declarou a ilicitude do despedimento do autor, simultaneamente declarado a nulidade do contrato de trabalho, por considerar que o seu objecto era contrário à lei, mas tendo, por aplicação do disposto no n. 3 do artigo 15. do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49408, de 24 de Novembro de 1969 (LCT), condenado a ré a pagar a indemnização de antiguidade e os salários intercalares, se a ré interpõe recurso de apelação sustentando que, por força da declarada nulidade do contrato, não são devidos nem aquela indemnização nem estes salários, forma-se caso julgado sobre a decisão que declarou a nulidade do contrato se o autor não a impugna, quer através de recurso subordinado, quer nas contra-alegações relativas à apelação da ré, ao abrigo do n. 1 do artigo 684-A do Código de Processo Civil. II - A remissão do citado n. 3 do artigo 15. para o regime da cessação do contrato de trabalho constante da LCT vale actualmente como remissão para o Regime Jurídico da Cessação do Contrato Individual de Trabalho e da Celebração e Caducidade do Contrato de Trabalho a Termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, que é, assim, aplicável aos actos extintivos (no caso, despedimento) de contratos inválidos, ocorridos antes da declaração de nulidade ou da anulação, com as necessárias adaptações. III - Uma dessas adaptações resulta da inviabilidade de o tribunal determinar a reintegração do trabalhador despedido, pois o tribunal não pode impor a manutenção de um contrato declarado nulo; porém, esta inviabilidade da reintegração não afecta o direito à indemnização de antiguidade (desde que por esta o trabalhador tenha optado) e aos salários intercalares, entendendo-se que o período de tempo em que o trabalhador esteve impedido de prestar a sua actividade por facto imputável à entidade patronal (despedimento ilícito) deve ser considerado como período de execução do contrato. IV - O termo final a considerar para efeitos do cálculo da indemnização de antiguidade e dos salários intercalares, quando a entidade patronal haja invocado a nulidade do contrato antes da prolação da decisão judicial que decretou a ilicitude do despedimento e essa invocação haja sido julgada procedente pela mesma decisão, é, não a data desta decisão, mas a data em que aquela invocação foi notificada ao trabalhador. 4.4.1. Transpondo a doutrina constante dos pontos II, III e IV do mencionado Acórdão do STJ, acima transcritos, para o caso em apreço[8], a A., nos termos do disposto no art. 437º do CT, tem direito, em consequência da ilicitude do despedimento, a receber as retribuições que deixou de auferir desde os 30 dias anteriores à propositura da acção, ou seja, desde 11.05.2008 (o despedimento ocorreu aos 30.06.2007 e a acção foi intentada aos 11.06.08) até 31.07.08, data em que lhe foi notificada a contestação, articulado este no qual o Réu invoca a nulidade, que vem a ser confirmada pelo presente acórdão (a contestação foi notificada por correio expedido aos 28.07.08 – cfr. fls. 87-, presumindo-se recebida no 3º dia útil subsequente). Assim, a título de retribuições entre 11.05.08 até 31.07.2008, tem a A direito a receber a quantia global de €1.767,63. Sobre esta quantia, tem a A. direito a juros de mora, à taxa legal, desde a data o vencimento de cada uma das retribuições que a integram – art.805º, nº 2, al. a), do Cód. Civil, sendo certo as referidas retribuições se reportam a período anterior ao do encerramento da audiência de discussão e julgamento. No caso, e como decorre do que já se deixou exposto, não é admissível a reintegração, sendo que, nos termos do art. 439º, nº 1, do CT, a A. teria ainda direito, como consequência da ilicitude do despedimento e em substituição da reintegração, a receber indemnização a fixar entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade (contados até à referida data da notificação da contestação). Acontece que a A., tendo embora, na petição inicial, formulado tal pedido, fê-lo apenas em alternativa à reintegração conforme “direito de opção” que viesse a exercer, opção essa que não veio a fazer e que, a nosso ver, sempre poderia ter sido efectuada a título subsidiário, ou seja, para o caso de se vir a entender não ser a reintegração admissível, tal como, aliás, o veio a referir nas alegações de recurso, embora de forma extemporânea (cfr. art. 438º, nº 1, do CT, nos termos do qual a opção deverá ser feita até à sentença). Considerando o principio do dispositivo e o disposto no artº 661º, nº 1, do CPC, afigura-se-nos que não pode o Tribunal condenar em tal prestação, sendo certo que, por via da cessação da relação laboral, cessou a natureza indisponível dos créditos laborais (Acórdãos do STJ de 25.09.02, já cit. e, mais recentemente, o de 25.11.09 www.dgsi.pt, Proc. 1846/06.1YRCBR.S1). E, salvo melhor opinião, não cabe convocar-se ou apelar-se aos poderes oficiosos do tribunal, uma vez que estes, em matéria que está na disponibilidade das partes, têm como limite o princípio do dispositivo, não sendo aplicável, ao caso, o disposto no art. 74º do CPT. 5. Da 4ª questão Dos danos não patrimoniais A A. peticionou o pagamento da quantia de €5.363,98 a título de danos não patrimoniais. Nos termos do disposto no art. 436º, nº 1, al. a), do CT em caso de ilicitude do despedimento, o trabalhador tem direito a ser indemnizado, também, pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência do mesmo, sendo tais danos ressarcíveis desde que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito – art. 496º do Cód. Civil. Pressuposto desse direito é que existam danos, que estes assumam gravidade que seja merecedora da tutela do direito e que exista um nexo causal entre o evento e o dano, competindo ao autor o ónus de alegação e prova dos referidos pressupostos – art. 342º, nº 1, do Cód. Civil. No caso, apenas se provou que a A., mercê do período de tempo porque se prolongou a relação contratual, acreditou que acabaria por ser integrada na Função Pública.(nº 31), nada mais tendo logrado provar, mormente o que alegava nos nºs 40 (perca de uma outra oportunidade de emprego e que o Director Geral lhe tivesse dito que, no máximo, ao fim de 7 anos estaria nos quadros) e 41 (que o comportamento do Réu a “abalou profundamente” e que “se sente ainda hoje profundamente frustrada, desanimada, ansiosa e angustiada em relação ao seu futuro profissional, não tendo até à data encontrado emprego”) da petição inicial, que foram dados como não provados. Ora, pese embora a expectativa da A. de que, face ao tempo que perdurou a relação laboral, seria integrada na função pública, expectativa essa, diga-se, criada pelo réu que, não obstante à revelia da lei, manteve essa relação por tão largo período de tempo, a verdade é que não ficaram provados quaisquer danos, de natureza não patrimonial, que tivessem decorrido da frustração dessa expectativa, bem como do despedimento ilícito que promoveu antes da invocação da nulidade do contrato. E, assim sendo, é de manter, nesta parte, a decisão recorrida.*IV. Decisão Em face do exposto, acorda-se em conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência: A) Revoga-se a decisão recorrida na parte em que julgou improcedente o pedido de declaração da existência de um contrato de trabalho sem termo e em que absolveu o Réu dos pedidos relativos aos subsídios de férias e de natal e à inexistência de despedimento ilícito, que é substituída pelo presente acórdão, em que se decide: 1) Declarar a existência, entre a A. e Réu, de um contrato de trabalho sem termo, no período de 18.01.1999 a 30.06.2007; 2) Declarar a nulidade do referido contrato de trabalho. 3) Julgar ilícito o despedimento da A. 4) Condenar o réu, Estado Português, a pagar à A., B……….: - A quantia de €9.636,02, a título de subsídios de férias e de Natal vencidas de 1999 a 30.06.2007 e proporcionais, acrescida de juros de mora, á taxa legal, desde a data do vencimento de cada uma dessas prestações até integral pagamento. - A quantia de €1.767,63, a título de retribuições desde 11.05.08 até 31.07.08, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data do vencimento de cada uma das retribuições que a integram até integral pagamento. B) Confirmar, quanto ao demais peticionado, a sentença recorrida, embora com diferente fundamentação. Custas pela A. e Réu, na proporção do decaimento. Porto, 22.02.10 Paula Alexandra Pinheiro Gaspar Leal Sotto Mayor de Carvalho Luís Dias André da Silva José Carlos Dinis Machado da Silva ____________________________ [1] Estribado nos Acórdãos da Relação de Lisboa de 04.02.09 (Proc. 10849/2008-4) e do STJ de 08.11.2006 (Proc. 06S1544), ambos in www.dgsi.pt. [2] Entretanto revogado pela Lei 12-A/2008, de 27.02. [3] Cfr. arts. 42º, nº 1, al. e) e 44, nº 2, do DL 64-A/89, de 27.02, e 3º da Lei 38/96, de 31.08, na redacção original e posteriormente dada pela Lei 18/2001, de 03.07, e arts. 14º, nº 3,18º, nº 2 e 20º do DL 427/89, alterado pelo DL 409/91, de 17.10. [4] Já em vigor aquando da entrada em vigor da Lei 23/2004 e aplicável aos contratos de trabalho que se encontrem em execução àquela data. [5] Contrato de Trabalho na Administração Pública, Anotação à Lei nº 23/2004, de 22 de Junho, 2ª Edição Actualizada, Almedina, em anotação ao citado art. 10º (págs. 57 a 61). [6] Questões Laborais, 2002, págs. 91/92. [7] Acrescente-se que, ainda que se considerasse que a manutenção, de facto, dos efeitos da relação laboral após a caducidade do contrato de trabalho a termo consubstanciaria a constituição de uma nova relação laboral, sempre seria ela nula, designadamente por preterição da forma escrita (art. 8º, nºs 1 e 3, da Lei 23/04). [8] A doutrina de tal Acórdão, embora proferida no âmbito do DL 64-A/89, de 27.02, mantém actualidade no domínio do Código do Trabalho já que são idênticas as previsões normativas constantes de ambos os diplomas. __________________________ Procº nº 385/08.0TTOAZ.P1 Apelação Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 278) SUMÁRIO I. Consubstanciando a relação jurídica entre o Estado e o trabalhador um contrato de trabalho e não um contrato de prestação de serviços, não lhe é aplicável o art. 10º, nº 6m do DL 184/89, de 14.06, na redacção dada pela Lei 25/98, de 26.05. II. No domínio do DL 427/89, de 07.12 (alterado pelo DL 218/98, de 17.06), era proibida a celebração, pelo Estado, de contrato de trabalho por tempo indeterminado, proibição essa que é “absoluta, englobando, por isso, a contratação tácita, a contratação originária e a contratação por conversão” (Acórdão do STJ de 10.12.09, www.dgsi.pt, Proc. 6/08.1TTPTG.S1). III. A Lei 23/04, de 22.06 veio admitir, no seio da administração Pública, o contrato de trabalho sem termo, condicionando, porém, a sua celebração a diversos requisitos, designadamente à forma escrita e à observância de um prévio processo de selecção de candidatos subordinado aos princípios da publicitação da oferta de trabalho, da igualdade de condições e oportunidades, com fundamentação da decisão de contratação em critérios objectivos (art. 5º da referida lei). IV. Porém, não obstante essa admissibilidade, tendo em conta o entendimento sufragado, com força obrigatória geral, nos Acórdãos do Tribunal Constitucional 368/2000 (DR IS-A, de 30.11.2000) e 61/2004 (DR IS-A, de 27.02.2004), bem como a jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça (cfr., por todos, Acórdãos de 14.11.07, 18.06.08, 01.10.08, 26.11.08, 01.07.09, 25.11.09 e 03.02.10, in www.dgsi.pt, Processos 08S2451, 06S2445m 08S1536, 08S1982, 08S3443, 1846/06.1YRCBR.S1 e 387/09.0YFLSB), a contratação sem termo pelo Estado, seja ela tácita, originária ou por conversão, será inconstitucional, por violação do art. 47º, nº 2, da CRP, se não observar um prévio processo concursório que garanta o referido princípio de igualdade de condições e de oportunidade de acesso. V. Como consequência de um despedimento ilícito ocorrido no âmbito de um contrato de trabalho nulo, o trabalhador tem direito às retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao momento em que a invocação da nulidade foi notificada ao trabalhador ou, não sendo invocada, até ao momento em que é declarada oficiosamente pelo tribunal. VI. A nulidade do contrato de trabalho impede, em caso de despedimento ilícito, a reintegração, mas confere o direito à indemnização de antiguidade caso por ela o trabalhador haja optado até à sentença, não cabendo, porém, no âmbito dos poderes oficiosos do tribunal condenar no pagamento dessa indemnização se o trabalhador, tendo embora formulado, em alternativa, o pedido de reintegração ou indemnização, não procedeu a essa opção até ao referido momento. Paula Alexandra Pinheiro Gaspar Leal Sotto Mayor de Carvalho