O facto da exclusão contida no nº2, al. d) do art. 7º do DL nº 522/85, de 31.12, com a redacção do DL nº 130/94, de 19.05, se limitar à indemnização pelos danos decorrentes de lesões materiais significa que o legislador não terá querido excluir a indemnização a título de danos não patrimoniais.
Processo nº 108/08.4TBMCN.P1 (apelação) 3ª secção Relator: Madeira Pinto (363) Adjuntos: Amélia Ameixoeira Carlos Portela*1-RELATÓRIO: B………. e filhos, C……… e D…………, intentaram a presente acção sob a forma de processo ordinário contra E………., S.A., pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de 19 000,00€, a favor da primeira autora e de 15 000,00 €, a favor de cada um dos restantes autores, acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a citação da ré, a título de danos morais por cada um deles sofridos em consequência de acidente de viação que vitimou F………., respectivamente seu marido e pai, ocorrido no dia 19 de Novembro de 2006, na EN 211, ao Km. 8,50, na freguesia de Fornos, Marco de Canavezes, em que foram intervenientes o veículo ligeiro de passageiros de matricula ..-..-CX, pertencente e conduzido pelo F………, que havia transferido a responsabilidade civil decorrente da circulação daquele veículo para a Ré e o ligeiro de passageiros de matricula ..-..-EM, pertencente e conduzido por G………., imputando a culpa na produção do acidente à conduta negligente daquele primeiro condutor. Alegam que entre a vitima e os autores existiam fortes laços de e sentimentos de recíproca afeição; que todos os autores muito sentiram a morte do marido e pai, respectivamente, sofrendo com ela grande abalo psicológico e profundo desgosto. Devidamente citada a Ré contestou, aceitando a versão do acidente alegada pelos autores, mas impugnando o montante dos danos peticionados pelos autores e a sua obrigação de indemnizar esses danos, concluindo pela improcedência da acção e a sua absolvição do pedido. Replicaram os autores, mantendo a posição da petição inicial. Elaborou-se o despacho saneador, com selecção da matéria de facto assente e controvertida com relevo para a decisão final, o qual não foi objecto de reclamação. Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, tendo sido dada a resposta à matéria de facto controvertida, a qual não foi objecto de qualquer reclamação. Foi proferida sentença, julgando a acção totalmente improcedente. Desta sentença foi interposto o presente recurso pelos autores, tendo nas alegações de recurso apresentado as seguintes CONCLUSÕES: …………. …………. …………. Houve contra alegações da recorrida, no sentido da manutenção do julgado. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.*I.2.OS FACTOS: Vêem provados na sentença recorrida os seguintes factos: 1) No dia 19 de Novembro de 2006, cerca das 11.15 horas, na EN n.º 211, Km 8,50, Fornos, Marco de Canaveses, ocorreu um embate em que foram intervenientes os veículos ligeiros de passageiros de matrícula ..-..-CX, conduzido por F………. e o de matrícula ..-..-EM, propriedade e conduzido por G………. (als. A) e B) dos factos assentes); 2) Por contrato de seguro para o efeito celebrado válido e eficaz na data do acidente, F……….., havia transferido a responsabilidade civil emergente de circulação rodoviária do veículo ..-..-CX para a Companhia de Seguros E………., SA, aqui Ré, contrato esse titulado pela apólice nº 5070/83….. (al. C) dos factos assentes); 3) Por contrato de seguro para o efeito celebrado válido e eficaz na data do acidente, G……….., havia transferido a responsabilidade civil emergente de circulação rodoviária do veículo ..-..-EM para a Companhia H………, contrato esse titulado pela apólice nº10640…. (al. D) dos factos assentes); 4) Nas circunstâncias de tempo e lugar supra mencionados, o condutor do CX seguia na referida EN, no sentido Soalhães/Porto (al. E) dos factos provados); 5) Por sua vez o EM seguia em sentido contrário, ou seja, no sentido Porto/Soalhães (al. F) dos factos assentes) 6) Ao Km 8,50, na localidade de Fornos, Marco de Canaveses, a via tem duas faixas de rodagem, uma em cada sentido (al. G) dos factos assentes); 7) O condutor do CX, ao descrever uma curva à sua esquerda, atento o sentido que seguia, perdeu o controlo do veículo e entrou em despiste invadindo a faixa do sentido oposto e foi embater no EM (als. H) e I) dos factos assentes); 8) A faixa de rodagem da E. N. 211 tinha a largura de cerca de 7,30 metros (al. J) dos factos ssentes); 9) O pavimento era em asfalto e em bom estado de conservação (al. L) dos factos assentes); 10) No momento do embate o tempo era bom e o pavimento estava seco (al. M) dos factos assentes); 11) Em resultado directo do embate acima descrito, o condutor do CX, F……….., veio a falecer (al. N) dos factos assentes); 12) F……….. era casado com B…………, aqui Autora, sob o regime da comunhão geral de bens (al. O) dos factos assentes); 13) Desse casamento nasceram dois filhos D………. e C………., aqui Autores (al. P) dos factos assentes); 14) Os Autores sentiram desgosto com a morte do falecido F…….. (al. Q) dos factos assentes); 15) O veículo CX foi adquirido na constância do matrimónio entre a Autora B……… e o falecido F……… (al. R) dos factos assentes); 16) O falecido F…….. era um homem digno, sendo o enlevo dos Autores (resposta ao facto 1º da BI) 17) Entre o falecido e os Autores existia uma ligação sentimental, sendo forte e recíproca a afeição que mutuamente nutriam (resposta ao facto 2º da BI); 18) Os Autores sentiram a morte do falecido com dor, desgosto e abalo psicológico (resposta ao facto 3º da BI); 19) Os Autores eram amigos do falecido F……….., estando a ele ligados por laços de afeição, amor e carinho (resposta ao facto 4º da BI); 20) O falecido era pessoa forte e saudável e nunca padeceu de qualquer deformidade ou enfermidade (resposta ao facto 5º da BI);*II- DO RECURSO Como é pacífico, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação dos recorrentes, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso – artºs 684º, nº 3 e 690º, nºs 1 e 3, do código de processo civil; Nos recursos apreciam-se questões e não razões; O recurso está limitado pela questão e decisão recorrida; A matéria de facto dada como provada na sentença recorrida não foi impugnada pelos apelantes, nos termos devidos e de acordo com o disposto nos artºs 690º, nº 1 e 690º-a, nºs 1 e 2, CPC, pelo que se tem como assente para a apreciação do seu recurso. Isto posto, as questões que importa decidir são: - a existência e na afirmativa o âmbito de responsabilidade da ré. Vejamos. A sentença recorrida, conhecendo da dinâmica do acidente dos autos, ocorrido em 19.11.2006, em que foram intervenientes o veículo ligeiro de passageiros de matricula ..-..-CX, conduzido por F………., que havia transferido a responsabilidade civil decorrente da circulação daquele veículo para a Ré e o ligeiro de passageiros de matricula ..-..-EM, pertencente e conduzido por G………, imputa a culpa na produção do acidente à conduta negligente culposa daquele primeiro condutor. Face à matéria provada sob o número 2 e o teor da respectiva apólice junta a fls 39, o referido G………, marido e pai dos autores, respectivamente, tinha transferido a responsabilidade civil para com terceiros, incluindo ocupantes, mesmo familiares (todos os ocupantes) para a Companhia de Seguros E………., SA, em virtude da circulação do mesmo, encontrando-se o contrato de seguro válido e eficaz na data do acidente. A referida seguradora foi demandada directamente e responde nos precisos termos em que deva responder o condutor do referido veículo, seu segurado, por força do contrato de seguro de responsabilidade civil obrigatória e facultativo (quanto a ocupantes familiares do segurado, tomador do seguro e condutor do veículo ..-..-CX), ao abrigo do disposto no DL nº 522/85 e alterações subsequentes. Isto posto, perante os factos provados, a sentença recorrida considerou que apenas o condutor do CX é de atribuir a culpa efectiva e exclusiva na produção do acidente dos autos, que ao conduzir o veículo CX entrou em despiste e, invadindo a faixa contrária, foi embater no veículo EM que ali circulava. Ignoram-se quaisquer outras circunstâncias relativas ao cuidado e condução do condutor do CX que respondam à pergunta: porque é que o despiste ocorreu? Cremos que nessas circunstâncias não poderia haver juízo de culpa efectiva e exclusiva sobre aquele condutor e deveria funcionar a responsabilidade pelo risco, repartida por igual forma entre ambos os condutores-proprietáros dos veículos intervenientes, de acordo com as regras do artº 499º ss Código Civil, maxime artº 506º. Mas, o juízo de culpa contido na sentença recorrida não foi posto em causa no recurso interposto apenas pelos autores e foi aceite pela ré seguradora, pois não recorreu da sentença. Não cabe a este tribunal alterar esse juízo, dado não ser questão objecto do recurso e não poder dela o tribunal conhecer oficiosamente. Da apólice junta aos autos constata-se que o contrato de seguro em causa é um contrato de seguro automóvel cujo tomador é a vítima na qualidade de proprietário do veículo e que garante a responsabilidade civil decorrente da circulação do veículo CX quanto aos danos causados a terceiros e quanto aos danos causados a pessoas transportadas no veículo inclusive familiares do segurado tomador do seguro. De acordo com o disposto no artº 7º, nº 2, alínea d) do DL 522/85 de 31.12, com a redacção do DL 130/94 de 19.05, aplicável ao acidente dos autos, excluem-se da garantia do seguro automóvel obrigatório quaisquer danos decorrentes de lesões materiais causados ao cônjuge e descendentes, entre outras pessoas. O facto da exclusão contida no nº 2, alínea d) se limitar à indemnização pelos danos decorrentes de lesões materiais, significa que o legislador não terá querido excluir a indemnização a título de danos não patrimoniais. A garantia do seguro não exclui os danos próprios de natureza não patrimonial sofridos pelo cônjuge e filhos do condutor do veículo decorrentes da sua morte, consistentes no sofrimento, desgosto e tristeza que essa mesma morte lhes provocou. Este entendimento parece reforçado no confronto com o nº 3 do mesmo artº 7º onde se exclui, especificamente, qualquer indemnização ao responsável culposo do acidente por danos não patrimoniais. Na verdade, tendo os AA., a qualidade de esposa não separada de pessoas e bens e de filhos do condutor do CX, falecido em virtude do acidente de viação dos autos, não estando tal direito de indemnização excluído no artº 7º do DL 522/85, temos de concluir que os AA. têm direito a ser indemnizados, na qualidade de terceiros, que efectivamente são, não transportados no veículo sinistrado, pelos danos próprios sofridos com a morte do seu marido e pai, nos termos do disposto no artº 496º, nº 3 do CC Neste sentido, entre outros, os seguintes arestos, todos em www.dgsi.pt RP, Proc. 0851587 de 12.05.2008; RP, Proc. 0151845 de 28.01.2002; RC, Proc. 140/1998.C1 de 16.01.2007; RC. Proc. 241/1998.C1 de 12-06-2007 STJ, Proc. 08B3796 de 08.01.2009; STJ, Proc. 05B1612 de 16.06.2005; STJ, Proc. 03A2692 de 07.10.2003; STJ, Proc. 03A2664 de 21.10.2003; No mesmo sentido ver Ac STJ de 25.06.2009, mesmo que se tratasse de responsabilidade pelo risco e não sendo os familiares transportados no veículo sinistrado. Assim sendo, resultaram provados (números 14 a 19 da sentença) apenas danos não patrimoniais sofridos por cada um dos autores em consequência da morte do condutor e legítimo detentor do veículo interveniente, matrícula ..-..-CX. Dispõe o art. 496º do Código Civil: “1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. 2. Por morte da vítima, o direito à indemnização por danos não patrimoniais cabe, em conjunto, ao cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens e aos filhos (...). 3. O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos número anterior.” “Danos não patrimoniais - são os prejuízos (como dores físicas, desgostos morais, vexames, perda de prestígio ou de reputação, complexos de ordem estética) que, sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a honra, o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização” (A.Varela, “Das Obrigações, 6ª ed., l.°-571). Como refere, “inter alia”, o Ac. do STJ, de 30.10.96, in BMJ 460-444: “(...) No caso dos danos não patrimoniais, a indemnização reveste uma natureza acentuadamente mista, pois “visa reparar, de algum modo, mais que indemnizar os danos sofridos pela pessoa lesada”, não lhe sendo, porém, estranha a “ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente”. O quantitativo da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais terá de ser calculado, sempre, “segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e às do lesado e do titular da indemnização», «aos padrões da indemnização geralmente adoptados na jurisprudência, as flutuações de valor da moeda, etc”. O n.° 3 do artigo 496.° C.Civil manda fixar o montante da indemnização por danos não patrimoniais de forma equitativa, ponderadas as circunstâncias mencionadas no art. 494º do mesmo diploma. A sua apreciação deve ter em consideração a extensão e gravidade dos prejuízos, bem como o grau de culpabilidade do responsável, sua situação económica e do lesado e demais circunstâncias do caso. Este tipo de indemnização será fixado segundo o prudente arbítrio do julgador, temperado com os critérios objectivos a que se alude no art. 494º. Como afirma Dario Martins de Almeida, Manual de Acidentes de Viação, 2ª ed.73/74,” pretende-se encontrar somente aquilo que, no caso concreto, pode ser a solução mais justa; a equidade está assim limitada sempre pelos imperativos da justiça real (a justiça ajustada às circunstâncias), em oposição à justiça meramente formal. Por isso se entende que a equidade é sempre uma forma de justiça. …A equidade é, pois, a expressão da justiça num dado caso concreto”. Como é sabido, a satisfação dos danos não patrimoniais não é uma verdadeira indemnização, visto não ser um equivalente do dano, tratando-se antes de atribuir ao lesado uma satisfação ou compensação que não é susceptível de equivalente. “É, assim, razoável que no seu cálculo, se tenham em atenção, além da natureza e intensidade do dano causado, as outras circunstâncias do caso concreto que a equidade aconselha sejam tomadas em consideração e, em especial, a situação patrimonial das partes e o grau de culpa do lesante”- Vaz Serra, RLJ, Ano 113º, p. 104. Com a indemnização por danos não patrimoniais tem-se em vista compensar de alguma forma o lesado pelos sofrimentos e inibições que sofrera em consequência do evento danoso, compensação que só será alcançada se a indemnização for significativa e não meramente simbólica. Ora, ficou provado que cada um dos autores sofreu desgosto, dor e abalo psicológico pela perda do seu marido e pai, respectivamente, não havendo circunstâncias de facto a ponderar no sentido de que tal sofrimento seja fora dos padrões normais a considerar em circunstâncias semelhantes ou que haja a distinguir os “sofrimentos” da esposa e dos filhos ora autores relativamente ao seu ente querido. Importa considerar igualmente que o acidente foi provocado pela própria vítima, condutor do CX. Considerando todo este quadro, bem como os montantes adoptados jurisprudencialmente em situações similares, afigura-se razoável e equitativo fixar em 10.000,00€ para cada um dos autores a compensação devida pelo dano não patrimonial próprio consistente no sofrimento pela perda do marido e pai, respectivamente, no acidente de viação dos autos. Sobre estes montantes compensatórios são devidos juros de mora, contados desde a citação da ré, de acordo com o disposto no nº 3 do art. 805º C.Civil. Com efeito o referido montante indemnizatório foi valorado à data da propositura da acção e não actualizado na data deste acórdão, visto que o referido dano moral se reporta aquela data e nenhuns elementos de facto futuros foram ponderados (não haviam sequer sido alegados), nomeadamente sofrimento e tristeza que tivesse perdurado e alterado a forma de vida e humor dos autores. Só se o montante arbitrado estivesse actualizado é que os juros seriam devidos apenas desde a data da prolação da sentença, sob pena de se valorar duplamente os danos e de se conflituar com a orientação expressa no acórdão uniformizador de jurisprudência nº 4/2002, de 9 de Maio. Concluindo, consideramos parcialmente procedentes as conclusões do recurso. *4-DECISÃO: Nestes termos, acordam os juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência, revogar a sentença recorrida e condenar a ré a pagar a cada um dos autores o montante de 10.000,00€ pelo dano moral por cada um sofrido em virtude da morte do seu familiar no acidente de viação dos autos, acrescido de juros de mora contados desde a citação da ré até integral pagamento e à taxa legal.*Custas pelos apelantes e apelada, no recurso e na acção de acordo com os decaimentos. Porto, 08-07-2010 Manuel Lopes Madeira Pinto Maria Amélia Condeço Ameixoeira Carlos Jorge Ferreira Portela
Processo nº 108/08.4TBMCN.P1 (apelação) 3ª secção Relator: Madeira Pinto (363) Adjuntos: Amélia Ameixoeira Carlos Portela*1-RELATÓRIO: B………. e filhos, C……… e D…………, intentaram a presente acção sob a forma de processo ordinário contra E………., S.A., pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de 19 000,00€, a favor da primeira autora e de 15 000,00 €, a favor de cada um dos restantes autores, acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a citação da ré, a título de danos morais por cada um deles sofridos em consequência de acidente de viação que vitimou F………., respectivamente seu marido e pai, ocorrido no dia 19 de Novembro de 2006, na EN 211, ao Km. 8,50, na freguesia de Fornos, Marco de Canavezes, em que foram intervenientes o veículo ligeiro de passageiros de matricula ..-..-CX, pertencente e conduzido pelo F………, que havia transferido a responsabilidade civil decorrente da circulação daquele veículo para a Ré e o ligeiro de passageiros de matricula ..-..-EM, pertencente e conduzido por G………., imputando a culpa na produção do acidente à conduta negligente daquele primeiro condutor. Alegam que entre a vitima e os autores existiam fortes laços de e sentimentos de recíproca afeição; que todos os autores muito sentiram a morte do marido e pai, respectivamente, sofrendo com ela grande abalo psicológico e profundo desgosto. Devidamente citada a Ré contestou, aceitando a versão do acidente alegada pelos autores, mas impugnando o montante dos danos peticionados pelos autores e a sua obrigação de indemnizar esses danos, concluindo pela improcedência da acção e a sua absolvição do pedido. Replicaram os autores, mantendo a posição da petição inicial. Elaborou-se o despacho saneador, com selecção da matéria de facto assente e controvertida com relevo para a decisão final, o qual não foi objecto de reclamação. Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, tendo sido dada a resposta à matéria de facto controvertida, a qual não foi objecto de qualquer reclamação. Foi proferida sentença, julgando a acção totalmente improcedente. Desta sentença foi interposto o presente recurso pelos autores, tendo nas alegações de recurso apresentado as seguintes CONCLUSÕES: …………. …………. …………. Houve contra alegações da recorrida, no sentido da manutenção do julgado. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.*I.2.OS FACTOS: Vêem provados na sentença recorrida os seguintes factos: 1) No dia 19 de Novembro de 2006, cerca das 11.15 horas, na EN n.º 211, Km 8,50, Fornos, Marco de Canaveses, ocorreu um embate em que foram intervenientes os veículos ligeiros de passageiros de matrícula ..-..-CX, conduzido por F………. e o de matrícula ..-..-EM, propriedade e conduzido por G………. (als. A) e B) dos factos assentes); 2) Por contrato de seguro para o efeito celebrado válido e eficaz na data do acidente, F……….., havia transferido a responsabilidade civil emergente de circulação rodoviária do veículo ..-..-CX para a Companhia de Seguros E………., SA, aqui Ré, contrato esse titulado pela apólice nº 5070/83….. (al. C) dos factos assentes); 3) Por contrato de seguro para o efeito celebrado válido e eficaz na data do acidente, G……….., havia transferido a responsabilidade civil emergente de circulação rodoviária do veículo ..-..-EM para a Companhia H………, contrato esse titulado pela apólice nº10640…. (al. D) dos factos assentes); 4) Nas circunstâncias de tempo e lugar supra mencionados, o condutor do CX seguia na referida EN, no sentido Soalhães/Porto (al. E) dos factos provados); 5) Por sua vez o EM seguia em sentido contrário, ou seja, no sentido Porto/Soalhães (al. F) dos factos assentes) 6) Ao Km 8,50, na localidade de Fornos, Marco de Canaveses, a via tem duas faixas de rodagem, uma em cada sentido (al. G) dos factos assentes); 7) O condutor do CX, ao descrever uma curva à sua esquerda, atento o sentido que seguia, perdeu o controlo do veículo e entrou em despiste invadindo a faixa do sentido oposto e foi embater no EM (als. H) e I) dos factos assentes); 8) A faixa de rodagem da E. N. 211 tinha a largura de cerca de 7,30 metros (al. J) dos factos ssentes); 9) O pavimento era em asfalto e em bom estado de conservação (al. L) dos factos assentes); 10) No momento do embate o tempo era bom e o pavimento estava seco (al. M) dos factos assentes); 11) Em resultado directo do embate acima descrito, o condutor do CX, F……….., veio a falecer (al. N) dos factos assentes); 12) F……….. era casado com B…………, aqui Autora, sob o regime da comunhão geral de bens (al. O) dos factos assentes); 13) Desse casamento nasceram dois filhos D………. e C………., aqui Autores (al. P) dos factos assentes); 14) Os Autores sentiram desgosto com a morte do falecido F…….. (al. Q) dos factos assentes); 15) O veículo CX foi adquirido na constância do matrimónio entre a Autora B……… e o falecido F……… (al. R) dos factos assentes); 16) O falecido F…….. era um homem digno, sendo o enlevo dos Autores (resposta ao facto 1º da BI) 17) Entre o falecido e os Autores existia uma ligação sentimental, sendo forte e recíproca a afeição que mutuamente nutriam (resposta ao facto 2º da BI); 18) Os Autores sentiram a morte do falecido com dor, desgosto e abalo psicológico (resposta ao facto 3º da BI); 19) Os Autores eram amigos do falecido F……….., estando a ele ligados por laços de afeição, amor e carinho (resposta ao facto 4º da BI); 20) O falecido era pessoa forte e saudável e nunca padeceu de qualquer deformidade ou enfermidade (resposta ao facto 5º da BI);*II- DO RECURSO Como é pacífico, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação dos recorrentes, não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso – artºs 684º, nº 3 e 690º, nºs 1 e 3, do código de processo civil; Nos recursos apreciam-se questões e não razões; O recurso está limitado pela questão e decisão recorrida; A matéria de facto dada como provada na sentença recorrida não foi impugnada pelos apelantes, nos termos devidos e de acordo com o disposto nos artºs 690º, nº 1 e 690º-a, nºs 1 e 2, CPC, pelo que se tem como assente para a apreciação do seu recurso. Isto posto, as questões que importa decidir são: - a existência e na afirmativa o âmbito de responsabilidade da ré. Vejamos. A sentença recorrida, conhecendo da dinâmica do acidente dos autos, ocorrido em 19.11.2006, em que foram intervenientes o veículo ligeiro de passageiros de matricula ..-..-CX, conduzido por F………., que havia transferido a responsabilidade civil decorrente da circulação daquele veículo para a Ré e o ligeiro de passageiros de matricula ..-..-EM, pertencente e conduzido por G………, imputa a culpa na produção do acidente à conduta negligente culposa daquele primeiro condutor. Face à matéria provada sob o número 2 e o teor da respectiva apólice junta a fls 39, o referido G………, marido e pai dos autores, respectivamente, tinha transferido a responsabilidade civil para com terceiros, incluindo ocupantes, mesmo familiares (todos os ocupantes) para a Companhia de Seguros E………., SA, em virtude da circulação do mesmo, encontrando-se o contrato de seguro válido e eficaz na data do acidente. A referida seguradora foi demandada directamente e responde nos precisos termos em que deva responder o condutor do referido veículo, seu segurado, por força do contrato de seguro de responsabilidade civil obrigatória e facultativo (quanto a ocupantes familiares do segurado, tomador do seguro e condutor do veículo ..-..-CX), ao abrigo do disposto no DL nº 522/85 e alterações subsequentes. Isto posto, perante os factos provados, a sentença recorrida considerou que apenas o condutor do CX é de atribuir a culpa efectiva e exclusiva na produção do acidente dos autos, que ao conduzir o veículo CX entrou em despiste e, invadindo a faixa contrária, foi embater no veículo EM que ali circulava. Ignoram-se quaisquer outras circunstâncias relativas ao cuidado e condução do condutor do CX que respondam à pergunta: porque é que o despiste ocorreu? Cremos que nessas circunstâncias não poderia haver juízo de culpa efectiva e exclusiva sobre aquele condutor e deveria funcionar a responsabilidade pelo risco, repartida por igual forma entre ambos os condutores-proprietáros dos veículos intervenientes, de acordo com as regras do artº 499º ss Código Civil, maxime artº 506º. Mas, o juízo de culpa contido na sentença recorrida não foi posto em causa no recurso interposto apenas pelos autores e foi aceite pela ré seguradora, pois não recorreu da sentença. Não cabe a este tribunal alterar esse juízo, dado não ser questão objecto do recurso e não poder dela o tribunal conhecer oficiosamente. Da apólice junta aos autos constata-se que o contrato de seguro em causa é um contrato de seguro automóvel cujo tomador é a vítima na qualidade de proprietário do veículo e que garante a responsabilidade civil decorrente da circulação do veículo CX quanto aos danos causados a terceiros e quanto aos danos causados a pessoas transportadas no veículo inclusive familiares do segurado tomador do seguro. De acordo com o disposto no artº 7º, nº 2, alínea d) do DL 522/85 de 31.12, com a redacção do DL 130/94 de 19.05, aplicável ao acidente dos autos, excluem-se da garantia do seguro automóvel obrigatório quaisquer danos decorrentes de lesões materiais causados ao cônjuge e descendentes, entre outras pessoas. O facto da exclusão contida no nº 2, alínea d) se limitar à indemnização pelos danos decorrentes de lesões materiais, significa que o legislador não terá querido excluir a indemnização a título de danos não patrimoniais. A garantia do seguro não exclui os danos próprios de natureza não patrimonial sofridos pelo cônjuge e filhos do condutor do veículo decorrentes da sua morte, consistentes no sofrimento, desgosto e tristeza que essa mesma morte lhes provocou. Este entendimento parece reforçado no confronto com o nº 3 do mesmo artº 7º onde se exclui, especificamente, qualquer indemnização ao responsável culposo do acidente por danos não patrimoniais. Na verdade, tendo os AA., a qualidade de esposa não separada de pessoas e bens e de filhos do condutor do CX, falecido em virtude do acidente de viação dos autos, não estando tal direito de indemnização excluído no artº 7º do DL 522/85, temos de concluir que os AA. têm direito a ser indemnizados, na qualidade de terceiros, que efectivamente são, não transportados no veículo sinistrado, pelos danos próprios sofridos com a morte do seu marido e pai, nos termos do disposto no artº 496º, nº 3 do CC Neste sentido, entre outros, os seguintes arestos, todos em www.dgsi.pt RP, Proc. 0851587 de 12.05.2008; RP, Proc. 0151845 de 28.01.2002; RC, Proc. 140/1998.C1 de 16.01.2007; RC. Proc. 241/1998.C1 de 12-06-2007 STJ, Proc. 08B3796 de 08.01.2009; STJ, Proc. 05B1612 de 16.06.2005; STJ, Proc. 03A2692 de 07.10.2003; STJ, Proc. 03A2664 de 21.10.2003; No mesmo sentido ver Ac STJ de 25.06.2009, mesmo que se tratasse de responsabilidade pelo risco e não sendo os familiares transportados no veículo sinistrado. Assim sendo, resultaram provados (números 14 a 19 da sentença) apenas danos não patrimoniais sofridos por cada um dos autores em consequência da morte do condutor e legítimo detentor do veículo interveniente, matrícula ..-..-CX. Dispõe o art. 496º do Código Civil: “1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. 2. Por morte da vítima, o direito à indemnização por danos não patrimoniais cabe, em conjunto, ao cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens e aos filhos (...). 3. O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos número anterior.” “Danos não patrimoniais - são os prejuízos (como dores físicas, desgostos morais, vexames, perda de prestígio ou de reputação, complexos de ordem estética) que, sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a honra, o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização” (A.Varela, “Das Obrigações, 6ª ed., l.°-571). Como refere, “inter alia”, o Ac. do STJ, de 30.10.96, in BMJ 460-444: “(...) No caso dos danos não patrimoniais, a indemnização reveste uma natureza acentuadamente mista, pois “visa reparar, de algum modo, mais que indemnizar os danos sofridos pela pessoa lesada”, não lhe sendo, porém, estranha a “ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente”. O quantitativo da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais terá de ser calculado, sempre, “segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e às do lesado e do titular da indemnização», «aos padrões da indemnização geralmente adoptados na jurisprudência, as flutuações de valor da moeda, etc”. O n.° 3 do artigo 496.° C.Civil manda fixar o montante da indemnização por danos não patrimoniais de forma equitativa, ponderadas as circunstâncias mencionadas no art. 494º do mesmo diploma. A sua apreciação deve ter em consideração a extensão e gravidade dos prejuízos, bem como o grau de culpabilidade do responsável, sua situação económica e do lesado e demais circunstâncias do caso. Este tipo de indemnização será fixado segundo o prudente arbítrio do julgador, temperado com os critérios objectivos a que se alude no art. 494º. Como afirma Dario Martins de Almeida, Manual de Acidentes de Viação, 2ª ed.73/74,” pretende-se encontrar somente aquilo que, no caso concreto, pode ser a solução mais justa; a equidade está assim limitada sempre pelos imperativos da justiça real (a justiça ajustada às circunstâncias), em oposição à justiça meramente formal. Por isso se entende que a equidade é sempre uma forma de justiça. …A equidade é, pois, a expressão da justiça num dado caso concreto”. Como é sabido, a satisfação dos danos não patrimoniais não é uma verdadeira indemnização, visto não ser um equivalente do dano, tratando-se antes de atribuir ao lesado uma satisfação ou compensação que não é susceptível de equivalente. “É, assim, razoável que no seu cálculo, se tenham em atenção, além da natureza e intensidade do dano causado, as outras circunstâncias do caso concreto que a equidade aconselha sejam tomadas em consideração e, em especial, a situação patrimonial das partes e o grau de culpa do lesante”- Vaz Serra, RLJ, Ano 113º, p. 104. Com a indemnização por danos não patrimoniais tem-se em vista compensar de alguma forma o lesado pelos sofrimentos e inibições que sofrera em consequência do evento danoso, compensação que só será alcançada se a indemnização for significativa e não meramente simbólica. Ora, ficou provado que cada um dos autores sofreu desgosto, dor e abalo psicológico pela perda do seu marido e pai, respectivamente, não havendo circunstâncias de facto a ponderar no sentido de que tal sofrimento seja fora dos padrões normais a considerar em circunstâncias semelhantes ou que haja a distinguir os “sofrimentos” da esposa e dos filhos ora autores relativamente ao seu ente querido. Importa considerar igualmente que o acidente foi provocado pela própria vítima, condutor do CX. Considerando todo este quadro, bem como os montantes adoptados jurisprudencialmente em situações similares, afigura-se razoável e equitativo fixar em 10.000,00€ para cada um dos autores a compensação devida pelo dano não patrimonial próprio consistente no sofrimento pela perda do marido e pai, respectivamente, no acidente de viação dos autos. Sobre estes montantes compensatórios são devidos juros de mora, contados desde a citação da ré, de acordo com o disposto no nº 3 do art. 805º C.Civil. Com efeito o referido montante indemnizatório foi valorado à data da propositura da acção e não actualizado na data deste acórdão, visto que o referido dano moral se reporta aquela data e nenhuns elementos de facto futuros foram ponderados (não haviam sequer sido alegados), nomeadamente sofrimento e tristeza que tivesse perdurado e alterado a forma de vida e humor dos autores. Só se o montante arbitrado estivesse actualizado é que os juros seriam devidos apenas desde a data da prolação da sentença, sob pena de se valorar duplamente os danos e de se conflituar com a orientação expressa no acórdão uniformizador de jurisprudência nº 4/2002, de 9 de Maio. Concluindo, consideramos parcialmente procedentes as conclusões do recurso. *4-DECISÃO: Nestes termos, acordam os juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência, revogar a sentença recorrida e condenar a ré a pagar a cada um dos autores o montante de 10.000,00€ pelo dano moral por cada um sofrido em virtude da morte do seu familiar no acidente de viação dos autos, acrescido de juros de mora contados desde a citação da ré até integral pagamento e à taxa legal.*Custas pelos apelantes e apelada, no recurso e na acção de acordo com os decaimentos. Porto, 08-07-2010 Manuel Lopes Madeira Pinto Maria Amélia Condeço Ameixoeira Carlos Jorge Ferreira Portela