I. A forma escrita constitui uma formalidade ad substantiam da revogação por mútuo acordo do contrato de trabalho. Na sua falta ocorre nulidade e o contrato não pode considerar-se cessado. II. Deste modo, uma declaração genérica de recebimento de créditos laborais, porque ainda emitida na pendência da relação laboral, não pode valer como remissão abdicativa mas como simples quitação, com repercussão meramente probatória.
Processo nº 808/09.1TTOAZ.P1 Apelação Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 87) Adjunto: Desembargador Machado da Silva (reg. nº 1.592) Adjunto: Desembargadora Fernanda Soares Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B…, residente em Estarreja, intentou a presente acção declarativa de condenação, emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra “C…, Ldª” com sede em Vila Franca de Xira, pedindo o reconhecimento da ilicitude do seu despedimento e a condenação da Ré a pagar-lhe compensação pelo despedimento, danos não patrimoniais, créditos retributivos vencidos à data da cessação do contrato de trabalho, relativos a trabalho suplementar, retribuição especial, prémio TIR e férias e subsídio de férias do ano da admissão e férias e subsídio de férias vencidos no ano da cessação, bem como dos proporcionais de férias e de subsídio de férias e de Natal proporcionais, no montante global de € 55.678,35, ou subsidiariamente, no montante de a quantia de € 20.001,84, e todas as retribuições devidas desde a data do despedimento e até ao trânsito em julgado da decisão, tudo acrescido dos juros de mora, à taxa legal. Em síntese, o Autor alegou que em 1.9.2007 celebrou com a Ré um contrato de trabalho a termo certo, para desempenhar as funções de motorista de pesados, do serviço nacional e internacional. Em 05.01.2009 a Ré comunicou verbalmente ao Autor e a um outro colega que não tinha trabalho para eles e que por isso tinham de se ir embora, o que constitui um despedimento ilícito. Mesmo que se entendesse, ao invés, ter ocorrido a extinção do posto de trabalho, a mesma seria ilícita por violação do disposto nos artigos 398º a 401º, 403º, nº1 e nº2 e 423º a 425º, todos do Código do Trabalho de 2003. A Ré contestou, impugnando a matéria de facto em que o Autor estriba os seus créditos, e sustentando ainda que ambas as partes acordaram na rescisão do contrato e que na decorrência desta, o Autor declarou que todos os créditos a que tinha direito se encontravam liquidados. Terminou pedindo a condenação do Autor como litigante de má-fé. O Autor respondeu, no essencial, impugnando ter havido rescisão do contrato de trabalho por mútuo acordo, invocando a nulidade da pretensa rescisão, a irrenunciabilidade dos créditos a que se refere a declaração de quitação, por ter sido emitida na vigência da relação laboral, e pedindo também a condenação da Ré como litigante de má-fé. Foi proferido saneador tabelar, realizada a audiência de julgamento com gravação da prova, e respondida a matéria de facto, sendo depois proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a Ré de todos os pedidos. Inconformado, interpôs o A. o presente recurso, apresentando a final as seguintes conclusões: 1ª - A escalpelização hermenêutica da sentença, ora, recorrida, descortina, salvo o devido respeito que muito é, equívocos continentais ao nível da subsunção e interpretação jurídicas e descobre falências fácticas manifestas. 2ª - A convicção do julgador há-de formar-se, após, uma ponderação serena de todos os meios de prova produzidos, guiado sempre, por padrões de probabilidade, e nunca de certeza absoluta, num processo lógico-dedutivo de montagem do mosaico fáctico, perspectivado pelas regras da experiência comum. 3ª - Assim, andou mal a Mm.ª Juiz do Tribunal “a quo”, ao julgar como provado o Ponto J. dos factos provados da Sentença, decidindo, para além da prova, mas pior que isto, contra a prova, contrariando o teor literal do documento junto aos autos e reproduzido no Ponto K. dos Factos Provados, e, ainda, prova testemunhal sedimentada no depoimento de D…, que esteve presente na reunião com a R. no dia 05/01/2009 a acompanhar o A (Vide depoimento digitalmente gravado no sistema Habilus). 4ª - Para repor a verdade factual, teria o Tribunal “a quo” de considerar como não provado, que o A. não acordou com a R. o recebimento de qualquer quantia, antes lhe foi imposta sob a cominação do brocardo “ou isto ou nada”, e muito menos que tal quantia tivesse sido objecto de negociação e discussão, e muito menos, ainda, explicada, e muito menos ainda, que se destinava ao ressarcimento pela cessação do contrato de trabalho. 5ª - Entende, com humildade o A., e com o devido respeito, que a resposta negativa dada aos factos vertidos nos Pontos A., B. G. e H. da decisão sobre a matéria de facto, foi feita contra a prova documental (Vide documento emitido pela Segurança Social e junta aos autos em 25/05/2010), e contra o relato sério e convincente das testemunhas D… (que esteve presente na reunião acompanhando o A.); E… (que relatou com razão de ciência o modus operandi da R. para promover o despedimento dos seus colegas, e inclusive o seu, que ocorreu no mesmo dia do do A.) e de F… (indicada pela própria R., que referiu a vontade desta em mandar embora alguns trabalhadores por falta de serviço). (Vide depoimentos digitalmente gravados no sistema Habilus) impondo-se, assim, a resposta positiva a tal factualidade. 6ª - A prova é, ainda, profusa, abundante e convincente, para considerar-se como provada a matéria factual vertida nos Pontos C., D. e E. da decisão sobre a matéria de facto, encontrando guarida nos depoimentos testemunhais impressivos de D… e de F…. (Vide depoimentos digitalmente gravados no sistema Habilus). 7ª - Andou mal o Tribunal “a quo” ao julgar procedente a excepção peremptória de pagamento, conferindo validade à declaração transcrita em K) dos Factos provados na Sentença, correspondente a uma declaração de quitação e não a qualquer remissão abdicativa, fazendo naufragar todos os pedidos do A. 8ª - O Tribunal “a quo” considerou que no tal documento, o A. declara estarem pagas todas e quaisquer quantias devidas pela cessação do contrato de trabalho. (Cfr. Ponto J. dos Factos Provados), o que só por equívoco se compreenderá tal decisão, tamanha a disparidade com o teor literal do referido documento. 9ª - Em nenhum passo daquela declaração se encontra referência, mesmo que resquiciamente, à cessação do contrato de trabalho, pelo que é abusivo, concluir que o valor recebido fosse correspectivo dessa mesma cessação. 10ª - Naquele documento faz-se referência expressa que a declaração se reporta à liquidação de verbas até 31 de Dezembro de 2008!!!!, sabendo que o contrato de trabalho cessou por despedimento no dia 05/01/2009. 11ª - Naquele documento, o A. faz referência expressa que não lhe são devidas verbas respeitantes a cláusula 74, cláusula 41, férias, subsídio de férias, férias não gozadas, subsídio de Natal e ordenado de Dezembro, obviamente reportadas a 31/12/2008, tendo-o feito de forma taxativa e não enunciativa, pois, não utilizou qualquer advérbio de modo, como, nomeadamente, designadamente, entre outros. Assim, é imperiosa a conclusão, até pelas regras da lógica, que naquele documento não se faz qualquer referência à liquidação de verbas respeitantes, v.g. a indemnização por antiguidade pela cessação do contrato de trabalho; trabalho suplementar não pago; diferenças salariais; indemnização por danos morais; compensação a que faz referência o artigo 437º do CT; proporcionais de subsídio de férias e de Natal, as quais forçosa, óbvia e apodicticamente, estão excluídas do campo de aplicação daquela declaração de quitação. 12ª - Naquele documento não se faz qualquer referência ao montante da quantia liquidada, e ao modo de pagamento, como se impõe numa declaração de quitação, retirando-lhe valor probatório. 13ª - Ditam os factos, que, na data da assinatura do referido documento, foi entregue ao A. um cheque no valor de 876,40 €, que, jamais, seria apto a remunerar os créditos laborais do A., pelo que o mesmo só pode ter sido outorgado por coacção moral e erro, conforme já alegado, tornando-o anulável nos termos gerais de Direito. 14ª - Esta declaração de quitação vem capciosamente cercear indirectamente o direito do A. poder legitimamente sindicar a ilicitude do despedimento e consequentes créditos laborais daí emergentes, como aliás, a improcedência da acção é exemplo paradigmático, violando assim, esta interpretação lata das disposições conjugadas dos artigos 280º e 787º ambos do CC, no sentido de atribuir eficácia probatória e liberatória a uma declaração de quitação genérica as normas constantes dos artigos 53º e 58º da CRP, que para os devidos efeitos aqui expressamente se invoca. 15ª - Não estava o Tribunal “a quo” em condições de saber a que título recebeu o A. a quantia indicada no documento n.º 17 junto pela R. e muito menos, imputar que o A. terá recebido a quantia por conta da cessação do contrato de trabalho. Importava, pois, averiguar qual o valor exacto da quantia colocada à disposição do A. depois do acto de assinatura do referido documento de quitação e a que se destinava (afinal pagava o quê??), e que o Tribunal recorrido postergou. 16ª - Violou, assim, diz-se com o devido respeito, a Sentença recorrida, os artigos 236º, 238º, 280º e 787º todos do CC; artigos 53º e 58º da CRP; artigo 653º, n.º2 do CPC; e artigos 249º, 398º ex vi artigo 404º, 401º, 429º alíneas a), b) e c), 436º, 437º, n.º4 e 439º todos do CT. Termos em que Deve dar-se provimento ao presente Recurso e ipso facto: a) Revogar-se a Sentença recorrida, julgando improcedente a excepção peremptória de pagamento e ordenando que o Tribunal conheça dos pedidos formulados pelo A. b) Subsidiariamente, se assim não se entender, deverá anular-se o Julgamento, ordenando-se a sua repetição, para aferir, in concreto, a que título é que a R. pagou ao A. aquando da outorga da declaração de quitação e montante exacto da quantia percebida. Não foram apresentadas contra-alegações. O Exmº Senhor Procurador Geral Adjunto nesta Relação pronunciou-se no sentido do recurso merecer provimento. Admitido o recurso e corridos os vistos, por despacho do relator foi ordenada a notificação das partes para os termos do disposto no nº 2 do artigo 715º do C. Processo Civil. O Autor veio apresentar alegações nas quais concluiu: A) Reconhecer-se o Despedimento operado pela Ré como Ilícito, logo sem Justa Causa. B) Deve a R. ser condenada a pagar ao A. a quantia global de 55.678,35 € acrescida de juros de mora à taxa legal. C) Ou quando assim se não entenda, Subsidiariamente, ser a Ré condenada a pagar ao Autor a quantia de 20.001,84 €. D) Deverá a Ré ser condenada, ainda, no pagamento de todas as retribuições intercalares devidas, nomeadamente, vencimentos base, subsídio de alimentação, férias, subsídio de férias e proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, vencidas e vincendas desde a data do seu despedimento até à data do trânsito em julgado, como obriga o nº 1 do artigo 437º do Código do Trabalho. E) Deverá a Ré ser, ainda, condenada no pagamento das custas, bem como, em juros de mora, à taxa legal. A Ré veio reafirmar a confirmação da decisão recorrida. Cumpre decidir. II. Matéria de facto A matéria de facto dada como provada na 1ª instância é a seguinte: A. Entre A. e R. foi celebrado um Contrato de Trabalho a Termo Certo, que teve inicio a 01/09/2007 segundo o qual, o A. pela contrapartida da prestação do seu trabalho, no desempenho das funções inerentes à categoria profissional de Motorista de Pesados Nacional e Internacional, receberia da R. uma retribuição base mensal de acrescidos das demais remunerações previstas no CCT. B. O Autor exercia as suas funções sob a direcção, fiscalização e autoridade da R. quer no território nacional quer fora dele tendo como Horário Normal de Trabalho acordado 40 Horas semanais, repartidas por cinco dias da semana. C. A R. exerce a actividade económica de transporte rodoviário, nacional e internacional, de mercadorias. D. Na execução do referido contrato de trabalho, o Autor desempenhou sempre as funções que lhe estavam atribuídas. E. No dia 05/01/2009, a Ré, na pessoa do Gerente G…, convocou o Autor telefonicamente, e disse-lhe, já na sede da empresa, e diante de outro trabalhador chamado D…, que esta atravessava graves dificuldades financeiras, e que em consequência das mesmas, "não há trabalho para vocês" e que caso continuassem a trabalhar apenas lhes poderia pagar o salário base e nenhumas ajudas de custo. F. O Autor auferia um Vencimento Base Mensal de 875,00€, ao qual acrescia uma quantia variável apelidada de "Ajudas de Custo" nos recibos de vencimento. G. À data referida em E) o Autor auferia, mensalmente, a título de ajudas de custo, quantia não inferior a 1600 €. H. O Autor não possui qualquer outro meio de subsistência que não os que obtém dos rendimentos do seu trabalho. I. O Autor trabalhou, sob as ordens e direcção da Ré, nos seguintes 39 Domingos - 25/09/07, 02/10/07, 30/10/07, 06/11/07, 13/11/07, 20/11/07, 22/11/07, 28/01/08, 11/02/08, 19/02/08, 22/02/08, 03/03/08, 11/03/08, 13/03/08, 01/04/08, 1/04/08, 29/04/08, 20/05/08, 30/05/08, 09/06/08, 22/06/08, 29/06/08, 06/07/08, 13/07/08, 20/07/08, 27/07/08, 03/08/08, 31/08/08, 07/09/08, 14/09/08, 21/09/08, 28/09/08, 12/10/08, 02/11/08, 09/11/08, 23/11/08, 30/11/08, 07/12/08, 14/12/08. J. Na data referida em E) o Autor acordou com a Ré no recebimento de uma quantia, então discutida e explicada, pela cessação do contrato de trabalho e para pagamento de retribuições devidas em função dessa cessação, quantia essa que recebeu nesse dia. (eliminada) K. O Autor assinou, na referida data, a declaração de fls. 112 onde se lê "Eu abaixo assinado, B…, portador do bi nº …….. emitido pelo arquivo de identificação de Aveiro em 31/01/2006, válido até 28/02/2011, venho pela presente declarar, para os fins julgados convenientes, que nesta data me foram liquidadas todas as verbas que me eram devidas pela empresa C…, Ldª e que se reportavam a 31 de Dezembro de 2008. Mais, declaro que não me são devidas quaisquer verbas respeitantes a cláusula 74, cláusula 41, férias, subsídio de férias, férias não gozadas, subsídio de Natal e ordenado de Dezembro. Declaro ainda que perante a referida empresa não tenho qualquer direito resultante da lei de trabalho aplicável que não me tenha já sido inteiramente satisfeito pela referida empresa. Declaro também que os direitos que me assistiam foram explicados, que os mesmos foram por mim entendidos e que a empresa acima designada os assistiu completa e satisfatoriamente. Por tudo ser verdade assino a presente declaração e entrego-a à empresa para servir de comprovativo de todos os factos por mim mencionados neste documento." L. A Ré pagou ao Autor a quantia de 1 916, 64 € relativos a subsídios de férias e de Natal de 2007 e 2008. M. O Autor recomeçou a trabalhar como motorista noutra empresa de transportes cerca de 15 dias após o referido em E) N. O montante pago mensalmente pela Ré a título de ajudas de custo era calculado em função dos Kms percorridos pelo Autor e não visava apenas o pagamento de despesas por ele feitas em viagem mas retribui-lo em função do trabalho prestado. Alínea O (aditada) “Na data referida em E), o gerente da Ré disse ao Autor e outro trabalhador presente “Vocês vão ter que se ir embora”. Alínea P (aditada) - “Na reunião referida em E) o gerente da Ré disse ao Autor que se não aceitasse o acordo não receberia nada nem subsídio de desemprego”. III. Direito Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 684º, nº 3, e 685º-A, nº 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi do disposto nos artigos 1º, nº 2, al. a), e 87º do Código de Processo do Trabalho, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso, as questões a decidir são: a) reapreciação da matéria de facto; b) natureza, validade e efeitos jurídicos da declaração de fls. 112 dos autos (e dependendo desta, ou de ambas, o apuramento de eventuais créditos do recorrente). a) Da acta de julgamento não consta o início e o fim dos depoimentos, mas o recorrente indica os concretos pontos de facto que entende deverem ser reapreciados e os depoimentos e documentos em que tal reapreciação se funda, nada obstando por isso à reapreciação da prova, a qual todavia, se há-de fazer com a cautela que a não imediação impõe, perscrutando erros notórios. Pretende o recorrente que a matéria da alínea J dos factos provados devia ser dada como não provada, e que a matéria constante das alíneas A, B, C, D, E, G e H dos factos não provados deve ao invés considerar-se provada. Lê-se na alínea J) dos factos provados: “Na data referida em E) o Autor acordou com a Ré no recebimento de uma quantia, então discutida e explicada, pela cessação do contrato de trabalho e para pagamento de retribuições devidas em função dessa cessação, quantia essa que recebeu nesse dia”. No despacho de resposta à matéria de facto, a Mmª Juiz a quo consignou: “Não se provaram quaisquer outros factos com relevância para a decisão entre eles: A) Que, na data referida em E), o gerente da Ré tenha dito ao Autor e outro trabalhador presente “Vocês vão ter que se ir embora” B) Que, na data referida em E), o Autor tenha dito que “as coisas não podiam ser feitas dessa forma, e que não desejava deixar de trabalhar para a Ré, mas aquela mostrou-se intransigente, mantendo a sua posição. C) Que o Autor tem sofrido um grande desgaste psicológico desde tal data e que tal se reflecte negativamente no seu estado físico e mental. D) Que esse desgaste tem aumentado o estado de ansiedade em que vive, por não ter recebido o Subsídio de Desemprego. E) Que a cessação do contrato de trabalho fez o Autor sentir hipotecado o sustento do seu agregado familiar, provocando um elevado estado de nervos e de depressão que se irá agravar com o decurso do tempo, afectando a sua lenta recuperação. G) Que na reunião referida em E) o gerente da Ré tenha dito ao Autor que se não aceitasse o acordo referido no documento transcrito em K) não receberia nada nem subsídio de desemprego. H) Que o Autor sentiu pânico e que apenas anuiu a assiná-lo por ter receio de ficar sem qualquer meio de subsistência. Este tribunal procedeu à audição integral de todos os depoimentos prestados em audiência, a saber D…, colega do A. a quem sucedeu o mesmo que o A., na mesma ocasião, H…, esposa do A., D… e E… do A., ambos ex-trabalhadores, tendo o segundo saído da empresa de modo idêntico ao do A., e tendo tido também acção contra a Ré, recentemente (à data do julgamento) finda. Foi ainda ouvido o depoimento da testemunha F…, administrativa, que continua a trabalhar na Ré. A testemunha D… era autor, noutro processo idêntico a este, contra a Ré, que, sem apensação, foi julgado no mesmo dia e hora, tendo aliás as gravações misturado os respectivos depoimentos. Relativamente à alínea J, podemos retirar dos depoimentos produzidos que apenas a testemunha D… assistiu à reunião. A testemunha F… afirmou ter presenciado (através de divisórias abertas) uma reunião meses antes, em que a Ré comunicou a alguns motoristas, entre eles ao A., que dada a falta de trabalho, possivelmente iria parar alguns carros e que por isso os motoristas respectivos deixariam de ter trabalho e ficariam sem receber ajudas de custo, o que eles não queriam, porque ficariam sem parte substancial dos seus réditos. Esta mesma testemunha não assistiu à reunião de 5 de Janeiro, e portanto não pode afirmar, como afirmou, o acordo entre o A. e a R., nesse dia, para cessar o contrato. E portanto não pode afirmar que as contas foram feitas e explicadas, nem o que é que foi pago, nem pode desmentir nada do que disse a testemunha D…. Apesar de tudo, pode-se aproveitar do seu depoimento que a questão da falta de trabalho não era nova, e que o A. já estava ciente do iminente risco de ficar sem trabalho. A testemunha D… – A. na acção que foi julgada na mesma ocasião – com evidente interesse no desfecho desta – disse que a Ré afirmou que não havia mais trabalho, que fez as contas ao A. e que, por esse valor, este acordou cessar o contrato, que a Ré fez o A. assinar a declaração de fls. 112 e que a tirou da mão do A., e que a seguir lhe entregou um cheque de valor mais baixo que o acordado e que lhe disse que se quisesse mais dinheiro que fosse para tribunal; que no próprio dia o A. contactou um advogado. Ora, apesar do evidente interesse, não há razão para duvidar deste depoimento: - ele não foi no sentido que o A. (e ele mesmo) foram despedidos sem mais, mas no sentido de que, sob essa alegação, acordaram cessar o contrato e que depois foram enganados com um valor mais baixo. É certo que na declaração de fls. 112 nada, rigorosamente, nada consta sobre os valores acordados pela cessação do contrato nem sobre os valores devidos em função da cessação do contrato, até porque a declaração é de 31.12.2008 e a reunião dá-se em 5.1.2009. Mas do depoimento da testemunha E…, que corroborou o do D… (contando a mesma versão relativamente ao que lhe aconteceu a ele mesmo) resulta que pelo menos desde Dezembro que (ele, pelo menos) estava sem trabalhar, em casa, à espera de ver se era chamado (em Janeiro). Muito provavelmente acontecia o mesmo com o A. Note-se que a cessação de contratos do A., do D… e do E… foi no mesmo dia. Não podemos todavia retirar da declaração escrita em causa que ela nada teve com a cessação, porque era anterior – precisamente porque não se fazem declarações destas durante a normal pendência duma relação laboral. Em suma, consideramos que do depoimento da testemunha D…, e do paralelo depoimento da testemunha E…, se retira que na reunião do dia 5.1, o A. e a Ré acordaram cessar o contrato de trabalho contra o recebimento duma quantia que foi explicada (“na altura, fez as contas, à nossa frente, explicou, era o ordenado, ajudas de custo, incluindo kms (…) e mais um valor de mandar embora mais o fundo de desemprego”). Não podemos no entanto ir mais longe, ou seja, dar como provado que essa quantia foi discutida (fez-lhe as contas não significa que elas tenham sido discutidas), nem que se destinasse ao pagamento das retribuições devidas em função da cessação do contrato (neste aspecto, a declaração de fls. 112 não o autoriza) nem que essa quantia tenha sido recebida nesse dia, precisamente porque ignoramos qual a quantia e porque receber um cheque dum valor menor que o acordado não é seguramente receber a quantia acordada. Poderíamos assim ficar uma redacção alterada para “Na data referida em E) o Autor acordou com a Ré no recebimento de uma quantia, então explicada, pela cessação do contrato de trabalho”. Porém, a prova do acordo de cessação do contrato de trabalho, ou dito pelo modo legalmente previsto, isto é, a prova do acordo de revogação do contrato de trabalho, porque este depende da forma escrita – artº 394º do CT – não pode ser feita por testemunhas – artigos 220º e 393º, nº 1 do C. Civil. Mesmo que se admita que é possível provar por testemunhas que o acordo não revestiu forma escrita, não consta da alínea J ora sob apreciação que o acordo tenha sido verbal. Deste modo, não podem sequer ser valorados os depoimentos das testemunhas, pelo que todo o teor da alínea J tem de ser eliminado. Relativamente às alíneas C, D e E dos factos não provados, a prova principal produzida foi o depoimento da esposa do A. e não vemos nesse depoimento um mínimo de consistência, independentemente do normal nervosismo e da reserva que os familiares sentem ao falar sobre situações que também os afectaram. A esposa do A. limitou-se a responder às perguntas que lhe foram feitas e não explicou com um mínimo de detalhe, nem se lhe sentiu convicção, a afectação psicológica do A. (que haveria de ser traduzida em algo mais que conceitos vagos). Os outros depoimentos (D… e E…) não foram também minimamente detalhados, e a afectação psicológica varia de pessoa para pessoa, não sendo uma consequência inelutável, e não deixando de ser certo que o facto de se arranjar trabalho quinze dias depois não se concilia bem com um estado anímico desvalido. De resto, como não estamos de posse da parte visual do depoimento, não nos parece possível censurar a convicção do tribunal. Relativamente à alínea A dos factos não provados, cremos que é muito credível, compaginando o depoimento de F…, sobre a reunião anterior, com os depoimentos de D… e de E…, que o gerente da Ré tenha dito ao A. e a outro trabalhador presente “Vocês vão ter que se ir embora”. Adita-se assim à matéria de facto provada o facto O), com o seguinte teor: “Na data referida em E), o gerente da Ré disse ao Autor e outro trabalhador presente “Vocês vão ter que se ir embora”. Quanto à alínea B) não vemos que a única testemunha presente, D…, tenha dito que o A. tivesse dito que as coisas não podiam ser feitas daquela forma e que não desejava deixar de trabalhar para a Ré, nem que aquela se tenha mostrado intransigente, mantendo a sua posição. Pelo contrário, a testemunha afirmou que por “aquele valor” o A. concordara (com a cessação). No que toca à alínea G, socorrendo-nos do depoimento da testemunha D…, e considerando uma normalidade de coisas, na reunião em que o empregador chama os trabalhadores para acordar na cessação de contrato, evidentemente os há-de tentar convencer a cessarem os contratos, razão pela qual nos parece verosimilhante o depoimento da referida testemunha, no sentido de que ou recebem isto agora ou depois podem não receber nada, posso já não ter como vos pagar, e portanto aditamos à matéria de facto provada uma alínea P, com o seguinte teor: “Na reunião referida em E) o gerente da Ré disse ao Autor que se não aceitasse o acordo não receberia nada nem subsídio de desemprego”. Porém, no que toca à alínea H) “Que o Autor sentiu pânico e que apenas anuiu a assiná-lo por ter receio de ficar sem qualquer meio de subsistência”, já o depoimento da testemunha D…, única presencial, se mostra completamente omisso, nada havendo pois a alterar. b) Atenta a data dos factos, aplica-se ao caso dos autos a disciplina do Código do Trabalho aprovado pela Lei 99/2003. Dispõe o artº 393º deste diploma que o empregador e o trabalhador podem fazer cessar o contrato por acordo, nos termos do artigo seguinte, do qual consta que “1) O acordo de cessação deve constar de documento assinado por ambas as partes, ficando cada uma com um exemplar” e consta ainda que “Se, no acordo de cessação, ou conjuntamente com este, as partes estabelecerem uma compensação de natureza global para o trabalhador, presume-se que naquela foram pelas partes incluídos e liquidados os créditos já vencidos à data da cessação do contrato ou exigíveis em virtude dessa cessação”. Constituindo a matéria de cessação do contrato de trabalho disciplina legal imperativa, nos termos do artº 383º do CT 2003, e sendo certo que a declaração negocial revogatória está legalmente sujeita à forma escrita e que na sua falta é nula – por aplicação do disposto nos artigos 394º nº 1 citado e do artº 220º do Código Civil – não podemos concordar com a decisão recorrida, quando afirma que esta nulidade não aproveita ao recorrente, porque ele subscreveu a declaração transcrita em K) dos factos provados. É que por força do artº 289º do Código Civil e porque a forma escrita constitui uma formalidade ad substantiam da revogação do contrato de trabalho, precisamente enquanto se destina a rodear das maiores cautelas a ponderação do trabalhador sobre a gravidade e consequências da sua declaração[1] (o que resulta cristalino da faculdade de revogar a declaração revogatória), não se pode dizer que o contrato de trabalho tenha cessado. A relevância da nulidade do acordo de revogação do contrato de trabalho é que os efeitos da declaração transcrita na alínea K) dos factos provados, devem ler-se reportados à vigência do contrato de trabalho. Ora, em tal declaração o trabalhador não só não faz qualquer referência à cessação do contrato nem a quaisquer créditos dela derivados, como usa uma fórmula genérica “nesta data me foram liquidadas todas as verbas que me eram devidas pela empresa C…, Ldª e que se reportavam a 31 de Dezembro de 2008. (…) Declaro ainda que perante a referida empresa não tenho qualquer direito resultante da lei de trabalho aplicável que não me tenha já sido inteiramente satisfeito pela referida empresa. Declaro também que os direitos que me assistiam foram explicados, que os mesmos foram por mim entendidos e que a empresa acima designada os assistiu completa e satisfatoriamente”. Considerando as declarações genéricas em causa, emitidas na pendência da relação laboral – é a consequência lógico-jurídica da nulidade do acordo de revogação do contrato de trabalho e da afirmação do despedimento em data posterior à da declaração (5 de Janeiro) – não podem elas valer, porque produzidas no domínio da não liberdade do trabalhador e por força da protecção legal da retribuição – que é indisponível, parcialmente impenhorável, irrenunciável, não compensável e imprescritível – e do princípio da segurança do emprego, como remissão abdicativa, nos termos do artº 863º nº 1 do Código Civil, dos créditos laborais. Neste sentido vejam-se em www.dgsi.pt os acórdãos do STJ de 25.11.2009 e de 20.1.2010, e os acórdãos desta Relação de 18.10.2010. Neste sentido e consultável no mesmo sítio, decidimos já em 14.3.2011. Este mesmo não valor estende-se às demais declarações constantes do documento em causa. Na verdade, declarar “(…) que não me são devidas quaisquer verbas respeitantes a cláusula 74, cláusula 41, férias, subsídio de férias, férias não gozadas, subsídio de Natal e ordenado de Dezembro” posto que não melhor identificados, mais que não seja pelo ano a que se reportam, continua a constituir uma declaração genérica (repare-se aliás que em lado algum da declaração em causa o A. menciona a quantia que recebeu). Deste modo, e valendo ainda aqui a consideração da falta de liberdade do trabalhador, seja na vertente estrita de falta de condição de oposição ao empregador, seja na vertente subjacente de indisponibilidade da totalidade do tempo que condiciona a própria informação sobre os direitos, não podemos atribuir a esta parte da declaração a natureza de remissão abdicativa. Cumpre portanto conhecer dos pedidos formulados pelo Autor. Relativamente ao despedimento ilícito, sendo o despedimento uma declaração de vontade do empregador ao trabalhador destinada a fazer cessar o contrato de trabalho para o futuro, quer expressa quer tácita, isto é, que derive dum comportamento do empregador do qual se conclua a sua vontade de fazer cessar o contrato, os factos apurados são apenas que no dia 05/01/2009, a Ré, na pessoa do Gerente G…, convocou o Autor telefonicamente, e disse-lhe, já na sede da empresa, e diante de outro trabalhador chamado D…, que esta atravessava graves dificuldades financeiras, e que em consequência das mesmas, "não há trabalho para vocês" e “Vocês vão ter que se ir embora” e ainda que disse ao Autor que se não aceitasse o acordo não receberia nada nem subsídio de desemprego. Não há portanto nenhuma declaração expressa inequívoca: “não há trabalho” não é o mesmo que dizer “não te dou doravante trabalho”, uma coisa não implica a outra. Do mesmo modo, e no sentido em que reapreciamos a matéria de facto, dizer “vocês vão ter que se ir embora” só significa, em bom rigor, que sois vós, trabalhadores, que têm de decidir ir-se embora, o que é diferente de dizer “vão-se embora”. Por outro lado, do comportamento da Ré, em causa, não se pode concluir que a Ré despede o autor, precisamente porque pode só estar a convidá-lo a sair, por acordo – é a tese da Ré – ou a resolver o contrato por violação do dever de ocupação efectiva ou, mais adiante, por salários que vierem a não ser pagos. Cremos portanto que não há prova inequívoca de que o A. foi despedido, até porque o gerente também disse que se o A. não aceitasse só lhe poderia pagar o salário mas já não as ajudas de custo, e em consequência fenecem todos os pedidos relacionados com o despedimento ilícito, incluindo o de indemnização por danos não patrimoniais, cujos aliás também não se provaram. Diga-se ainda que a matéria apurada também não permite concluir por uma extinção do posto de trabalho, precisamente porque era necessário que, dalgum modo, houvesse essa explicitação de que o posto de trabalho seria extinto – e de novo, dizer que não há trabalho não implica a decisão da entidade empregadora de extinguir o posto de trabalho. Aliás, é usual que antes de se iniciar formalmente um processo de extinção do posto de trabalho o empregador inicie contactos com os trabalhadores no sentido da revogação por mútuo acordo dos respectivos contratos, e se assim acontecer, não se chega logicamente a falar em extinção de posto de trabalho, não havendo lugar às considerações sobre a observância dos preceitos legais correspondentes. Por seu turno, com a eliminação da alínea J dos factos provados, a Ré também não provou – nem poderia, como vimos – a cessação do contrato por mútuo acordo, pelo que temos de considerar, para os efeitos destes autos, que não se provou a cessação do contrato. Deste modo, todos os pedidos relacionados com esta cessação improcedem também. Resta por último analisar os restantes créditos salariais reclamados pelo Autor. Para tanto, temos de determinar previamente a retribuição do A., e o que se provou, a este respeito, foi que o Autor auferia o vencimento base mensal de € 875,00, ao qual acrescia uma quantia variável mencionada como “ajudas de custo”, nos recibos de vencimento, e que em 05.01.2009 auferia, mensalmente, a título de ajudas de custo, quantia não inferior a € 1.600,00. Provou-se ainda que o montante pago mensalmente pela Ré a título de ajudas de custo era calculado em função dos Kms percorridos pelo Autor e não visava apenas o pagamento de despesas por ele feitas em viagem mas retribui-lo em função do trabalho prestado. Às relações estabelecidas entre o Autor e a Ré é aplicável o CCTV celebrado entre a ANTRAM e a FESTRU, publicado no BTE nº 9 de 08.03.1980 e posteriores alterações. A alteração da remuneração dos motoristas de transportes internacionais rodoviários de mercadorias prevista na regulamentação colectiva do trabalho em vigor para o sector, só é válida se ficar demonstrado que dela resulta um regime retributivo mais favorável para o trabalhador[2]. Era à Ré que competia provar, nos termos do artº 342º nº 2 do Código Civil, que o sistema retributivo acordado com o Autor era mais favorável do que o estabelecido pela convenção colectiva. O pagamento sob a rubrica “ajudas de custo” traduz, conforme alínea N dos factos provados, um pagamento ao Km, sendo contrário ao determinado na referida convenção colectiva, e é por isso nulo. Assim, apenas se pode atender à remuneração base mensal de € 875,00 e às demais prestações complementares previstas na CCTV, peticionadas, decaindo os créditos reclamados a título principal. A título subsidiário o A. peticionou o vencimento relativo a cinco dias de Janeiro de 2009 no montante de € 201,96, e como incumbia à Ré provar ter efectuado o pagamento, o que não aconteceu, tem o A. direito a €875,00 : 30 x 5, ou seja, a €145,84. Pediu ainda a retribuição de férias e o subsídio de férias vencidos em 1.1.2009 no montante de € 1.750,00, ou seja, €875,00 x 2, que a Ré não provou ter pago e que por isso assiste ao A. o direito a receber. Pediu ainda a retribuição de férias e o subsídio de férias respeitantes ao ano da admissão no total de € 646,27. A este propósito provou-se que a Ré pagou ao Autor a quantia de € 1.916,64 relativa a subsídios de férias e de Natal de 2007 e 2008. Assim, como o A. foi admitido em 1.9.2007, teria direito a 8 dias de férias respeitantes a 2007, no valor de €233,33, cujo subsídio assim, comprovadamente, se mostra pago. Relativamente à retribuição de tal período, a Ré não provou que a tivesse pago ao A. pelo que tem este direito a €233,33. O A. reclamou também o pagamento do trabalho suplementar prestado em 39 domingos, no montante de €3.151,20. Provou-se tal trabalho e a Ré não provou o seu pagamento. Deste modo, considerando a retribuição diária de € 29,16 (€875,00 : 30), o A. tem direito a € 2.274,48 (€29,16 x 200% = €58,32 x 39). Peticionou o A. o montante de €6.058,00 a título de cláusula 74º nº 7 do CCTV, relativa a toda a duração contratual, ou seja 16 meses, pagamento que a Ré não logrou provar. Assim, e porque tal cláusula é calculada tendo em conta o montante da retribuição horária, multiplicada por 30 dias, por ser devida em todos os dias do mês[3], o valor em dívida é de € 12.115,20 (€875,00 x 12 = €10.500,00; 52 x 8h = 416; 10.500,00 : 416 = €25,24) x 30 dias x 16 meses). Finalmente o A. reclamou o pagamento de €1.908,00 de prémio TIR durante todo o tempo de duração contratual, que a Ré não provou ter pago. Desse modo são devidos €1.696,00 (€106,00 x 16). Às quantias parcelares acrescem os juros legais, à taxa de 4% ao ano, a contar da data do vencimento de cada uma delas – artigo 805º, nº 2, al. a) do C. Civil e artigos 269º e 364º do CT de 2003 – e até integral pagamento. Assim, tem o A. direito à quantia global de €18.214,85. IV. Decisão Nos termos supra expostos acordam conceder provimento parcial ao recurso e revogar a sentença recorrida, substituindo-a pelo presente acórdão que julga a acção parcialmente procedente por parcialmente provada e em consequência condena a Recorrida a pagar ao Recorrente a quantia global de €18.214,85 (dezoito mil e duzentos e catorze euros e oitenta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde o vencimento de cada uma das prestações dela integrantes e até integral pagamento. Custas por Recorrente e Recorrida, em ambas as instâncias, na proporção de 2/3 e de 1/3 respectivamente. Porto, 7.11.2011 Eduardo Petersen Silva José Carlos Dinis Machado da Silva Maria Fernanda Pereira Soares ____________ [1] Cfr. neste sentido, João Leal Amado, in Revogação do Contrato de Trabalho (Nótula sobre os Arts. 393º a 395º do CT), Prontuário do Direito do Trabalho, CEJ, nº 69, págs.54/55. [2] V. Ac. STJ de 14.03.2006, CJ, acórdãos do STJ, ano 2006, tomo 1, página 259. [3] V. Acórdão do STJ de 29.10.2003 publicado em Sumários de acórdãos do STJ, nº74, Outubro de 2003, página 250. ____________ Sumário: I. A forma escrita constitui uma formalidade ad substantiam da revogação por mútuo acordo do contrato de trabalho. Na sua falta ocorre nulidade e o contrato não pode considerar-se cessado. II. Deste modo, uma declaração genérica de recebimento de créditos laborais, porque ainda emitida na pendência da relação laboral, não pode valer como remissão abdicativa mas como simples quitação, com repercussão meramente probatória. a) Eduardo Petersen Silva (Processado e revisto com recurso a meios informáticos (artigo 138º nº 5 do Código de Processo Civil).
Processo nº 808/09.1TTOAZ.P1 Apelação Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 87) Adjunto: Desembargador Machado da Silva (reg. nº 1.592) Adjunto: Desembargadora Fernanda Soares Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B…, residente em Estarreja, intentou a presente acção declarativa de condenação, emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra “C…, Ldª” com sede em Vila Franca de Xira, pedindo o reconhecimento da ilicitude do seu despedimento e a condenação da Ré a pagar-lhe compensação pelo despedimento, danos não patrimoniais, créditos retributivos vencidos à data da cessação do contrato de trabalho, relativos a trabalho suplementar, retribuição especial, prémio TIR e férias e subsídio de férias do ano da admissão e férias e subsídio de férias vencidos no ano da cessação, bem como dos proporcionais de férias e de subsídio de férias e de Natal proporcionais, no montante global de € 55.678,35, ou subsidiariamente, no montante de a quantia de € 20.001,84, e todas as retribuições devidas desde a data do despedimento e até ao trânsito em julgado da decisão, tudo acrescido dos juros de mora, à taxa legal. Em síntese, o Autor alegou que em 1.9.2007 celebrou com a Ré um contrato de trabalho a termo certo, para desempenhar as funções de motorista de pesados, do serviço nacional e internacional. Em 05.01.2009 a Ré comunicou verbalmente ao Autor e a um outro colega que não tinha trabalho para eles e que por isso tinham de se ir embora, o que constitui um despedimento ilícito. Mesmo que se entendesse, ao invés, ter ocorrido a extinção do posto de trabalho, a mesma seria ilícita por violação do disposto nos artigos 398º a 401º, 403º, nº1 e nº2 e 423º a 425º, todos do Código do Trabalho de 2003. A Ré contestou, impugnando a matéria de facto em que o Autor estriba os seus créditos, e sustentando ainda que ambas as partes acordaram na rescisão do contrato e que na decorrência desta, o Autor declarou que todos os créditos a que tinha direito se encontravam liquidados. Terminou pedindo a condenação do Autor como litigante de má-fé. O Autor respondeu, no essencial, impugnando ter havido rescisão do contrato de trabalho por mútuo acordo, invocando a nulidade da pretensa rescisão, a irrenunciabilidade dos créditos a que se refere a declaração de quitação, por ter sido emitida na vigência da relação laboral, e pedindo também a condenação da Ré como litigante de má-fé. Foi proferido saneador tabelar, realizada a audiência de julgamento com gravação da prova, e respondida a matéria de facto, sendo depois proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a Ré de todos os pedidos. Inconformado, interpôs o A. o presente recurso, apresentando a final as seguintes conclusões: 1ª - A escalpelização hermenêutica da sentença, ora, recorrida, descortina, salvo o devido respeito que muito é, equívocos continentais ao nível da subsunção e interpretação jurídicas e descobre falências fácticas manifestas. 2ª - A convicção do julgador há-de formar-se, após, uma ponderação serena de todos os meios de prova produzidos, guiado sempre, por padrões de probabilidade, e nunca de certeza absoluta, num processo lógico-dedutivo de montagem do mosaico fáctico, perspectivado pelas regras da experiência comum. 3ª - Assim, andou mal a Mm.ª Juiz do Tribunal “a quo”, ao julgar como provado o Ponto J. dos factos provados da Sentença, decidindo, para além da prova, mas pior que isto, contra a prova, contrariando o teor literal do documento junto aos autos e reproduzido no Ponto K. dos Factos Provados, e, ainda, prova testemunhal sedimentada no depoimento de D…, que esteve presente na reunião com a R. no dia 05/01/2009 a acompanhar o A (Vide depoimento digitalmente gravado no sistema Habilus). 4ª - Para repor a verdade factual, teria o Tribunal “a quo” de considerar como não provado, que o A. não acordou com a R. o recebimento de qualquer quantia, antes lhe foi imposta sob a cominação do brocardo “ou isto ou nada”, e muito menos que tal quantia tivesse sido objecto de negociação e discussão, e muito menos, ainda, explicada, e muito menos ainda, que se destinava ao ressarcimento pela cessação do contrato de trabalho. 5ª - Entende, com humildade o A., e com o devido respeito, que a resposta negativa dada aos factos vertidos nos Pontos A., B. G. e H. da decisão sobre a matéria de facto, foi feita contra a prova documental (Vide documento emitido pela Segurança Social e junta aos autos em 25/05/2010), e contra o relato sério e convincente das testemunhas D… (que esteve presente na reunião acompanhando o A.); E… (que relatou com razão de ciência o modus operandi da R. para promover o despedimento dos seus colegas, e inclusive o seu, que ocorreu no mesmo dia do do A.) e de F… (indicada pela própria R., que referiu a vontade desta em mandar embora alguns trabalhadores por falta de serviço). (Vide depoimentos digitalmente gravados no sistema Habilus) impondo-se, assim, a resposta positiva a tal factualidade. 6ª - A prova é, ainda, profusa, abundante e convincente, para considerar-se como provada a matéria factual vertida nos Pontos C., D. e E. da decisão sobre a matéria de facto, encontrando guarida nos depoimentos testemunhais impressivos de D… e de F…. (Vide depoimentos digitalmente gravados no sistema Habilus). 7ª - Andou mal o Tribunal “a quo” ao julgar procedente a excepção peremptória de pagamento, conferindo validade à declaração transcrita em K) dos Factos provados na Sentença, correspondente a uma declaração de quitação e não a qualquer remissão abdicativa, fazendo naufragar todos os pedidos do A. 8ª - O Tribunal “a quo” considerou que no tal documento, o A. declara estarem pagas todas e quaisquer quantias devidas pela cessação do contrato de trabalho. (Cfr. Ponto J. dos Factos Provados), o que só por equívoco se compreenderá tal decisão, tamanha a disparidade com o teor literal do referido documento. 9ª - Em nenhum passo daquela declaração se encontra referência, mesmo que resquiciamente, à cessação do contrato de trabalho, pelo que é abusivo, concluir que o valor recebido fosse correspectivo dessa mesma cessação. 10ª - Naquele documento faz-se referência expressa que a declaração se reporta à liquidação de verbas até 31 de Dezembro de 2008!!!!, sabendo que o contrato de trabalho cessou por despedimento no dia 05/01/2009. 11ª - Naquele documento, o A. faz referência expressa que não lhe são devidas verbas respeitantes a cláusula 74, cláusula 41, férias, subsídio de férias, férias não gozadas, subsídio de Natal e ordenado de Dezembro, obviamente reportadas a 31/12/2008, tendo-o feito de forma taxativa e não enunciativa, pois, não utilizou qualquer advérbio de modo, como, nomeadamente, designadamente, entre outros. Assim, é imperiosa a conclusão, até pelas regras da lógica, que naquele documento não se faz qualquer referência à liquidação de verbas respeitantes, v.g. a indemnização por antiguidade pela cessação do contrato de trabalho; trabalho suplementar não pago; diferenças salariais; indemnização por danos morais; compensação a que faz referência o artigo 437º do CT; proporcionais de subsídio de férias e de Natal, as quais forçosa, óbvia e apodicticamente, estão excluídas do campo de aplicação daquela declaração de quitação. 12ª - Naquele documento não se faz qualquer referência ao montante da quantia liquidada, e ao modo de pagamento, como se impõe numa declaração de quitação, retirando-lhe valor probatório. 13ª - Ditam os factos, que, na data da assinatura do referido documento, foi entregue ao A. um cheque no valor de 876,40 €, que, jamais, seria apto a remunerar os créditos laborais do A., pelo que o mesmo só pode ter sido outorgado por coacção moral e erro, conforme já alegado, tornando-o anulável nos termos gerais de Direito. 14ª - Esta declaração de quitação vem capciosamente cercear indirectamente o direito do A. poder legitimamente sindicar a ilicitude do despedimento e consequentes créditos laborais daí emergentes, como aliás, a improcedência da acção é exemplo paradigmático, violando assim, esta interpretação lata das disposições conjugadas dos artigos 280º e 787º ambos do CC, no sentido de atribuir eficácia probatória e liberatória a uma declaração de quitação genérica as normas constantes dos artigos 53º e 58º da CRP, que para os devidos efeitos aqui expressamente se invoca. 15ª - Não estava o Tribunal “a quo” em condições de saber a que título recebeu o A. a quantia indicada no documento n.º 17 junto pela R. e muito menos, imputar que o A. terá recebido a quantia por conta da cessação do contrato de trabalho. Importava, pois, averiguar qual o valor exacto da quantia colocada à disposição do A. depois do acto de assinatura do referido documento de quitação e a que se destinava (afinal pagava o quê??), e que o Tribunal recorrido postergou. 16ª - Violou, assim, diz-se com o devido respeito, a Sentença recorrida, os artigos 236º, 238º, 280º e 787º todos do CC; artigos 53º e 58º da CRP; artigo 653º, n.º2 do CPC; e artigos 249º, 398º ex vi artigo 404º, 401º, 429º alíneas a), b) e c), 436º, 437º, n.º4 e 439º todos do CT. Termos em que Deve dar-se provimento ao presente Recurso e ipso facto: a) Revogar-se a Sentença recorrida, julgando improcedente a excepção peremptória de pagamento e ordenando que o Tribunal conheça dos pedidos formulados pelo A. b) Subsidiariamente, se assim não se entender, deverá anular-se o Julgamento, ordenando-se a sua repetição, para aferir, in concreto, a que título é que a R. pagou ao A. aquando da outorga da declaração de quitação e montante exacto da quantia percebida. Não foram apresentadas contra-alegações. O Exmº Senhor Procurador Geral Adjunto nesta Relação pronunciou-se no sentido do recurso merecer provimento. Admitido o recurso e corridos os vistos, por despacho do relator foi ordenada a notificação das partes para os termos do disposto no nº 2 do artigo 715º do C. Processo Civil. O Autor veio apresentar alegações nas quais concluiu: A) Reconhecer-se o Despedimento operado pela Ré como Ilícito, logo sem Justa Causa. B) Deve a R. ser condenada a pagar ao A. a quantia global de 55.678,35 € acrescida de juros de mora à taxa legal. C) Ou quando assim se não entenda, Subsidiariamente, ser a Ré condenada a pagar ao Autor a quantia de 20.001,84 €. D) Deverá a Ré ser condenada, ainda, no pagamento de todas as retribuições intercalares devidas, nomeadamente, vencimentos base, subsídio de alimentação, férias, subsídio de férias e proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, vencidas e vincendas desde a data do seu despedimento até à data do trânsito em julgado, como obriga o nº 1 do artigo 437º do Código do Trabalho. E) Deverá a Ré ser, ainda, condenada no pagamento das custas, bem como, em juros de mora, à taxa legal. A Ré veio reafirmar a confirmação da decisão recorrida. Cumpre decidir. II. Matéria de facto A matéria de facto dada como provada na 1ª instância é a seguinte: A. Entre A. e R. foi celebrado um Contrato de Trabalho a Termo Certo, que teve inicio a 01/09/2007 segundo o qual, o A. pela contrapartida da prestação do seu trabalho, no desempenho das funções inerentes à categoria profissional de Motorista de Pesados Nacional e Internacional, receberia da R. uma retribuição base mensal de acrescidos das demais remunerações previstas no CCT. B. O Autor exercia as suas funções sob a direcção, fiscalização e autoridade da R. quer no território nacional quer fora dele tendo como Horário Normal de Trabalho acordado 40 Horas semanais, repartidas por cinco dias da semana. C. A R. exerce a actividade económica de transporte rodoviário, nacional e internacional, de mercadorias. D. Na execução do referido contrato de trabalho, o Autor desempenhou sempre as funções que lhe estavam atribuídas. E. No dia 05/01/2009, a Ré, na pessoa do Gerente G…, convocou o Autor telefonicamente, e disse-lhe, já na sede da empresa, e diante de outro trabalhador chamado D…, que esta atravessava graves dificuldades financeiras, e que em consequência das mesmas, "não há trabalho para vocês" e que caso continuassem a trabalhar apenas lhes poderia pagar o salário base e nenhumas ajudas de custo. F. O Autor auferia um Vencimento Base Mensal de 875,00€, ao qual acrescia uma quantia variável apelidada de "Ajudas de Custo" nos recibos de vencimento. G. À data referida em E) o Autor auferia, mensalmente, a título de ajudas de custo, quantia não inferior a 1600 €. H. O Autor não possui qualquer outro meio de subsistência que não os que obtém dos rendimentos do seu trabalho. I. O Autor trabalhou, sob as ordens e direcção da Ré, nos seguintes 39 Domingos - 25/09/07, 02/10/07, 30/10/07, 06/11/07, 13/11/07, 20/11/07, 22/11/07, 28/01/08, 11/02/08, 19/02/08, 22/02/08, 03/03/08, 11/03/08, 13/03/08, 01/04/08, 1/04/08, 29/04/08, 20/05/08, 30/05/08, 09/06/08, 22/06/08, 29/06/08, 06/07/08, 13/07/08, 20/07/08, 27/07/08, 03/08/08, 31/08/08, 07/09/08, 14/09/08, 21/09/08, 28/09/08, 12/10/08, 02/11/08, 09/11/08, 23/11/08, 30/11/08, 07/12/08, 14/12/08. J. Na data referida em E) o Autor acordou com a Ré no recebimento de uma quantia, então discutida e explicada, pela cessação do contrato de trabalho e para pagamento de retribuições devidas em função dessa cessação, quantia essa que recebeu nesse dia. (eliminada) K. O Autor assinou, na referida data, a declaração de fls. 112 onde se lê "Eu abaixo assinado, B…, portador do bi nº …….. emitido pelo arquivo de identificação de Aveiro em 31/01/2006, válido até 28/02/2011, venho pela presente declarar, para os fins julgados convenientes, que nesta data me foram liquidadas todas as verbas que me eram devidas pela empresa C…, Ldª e que se reportavam a 31 de Dezembro de 2008. Mais, declaro que não me são devidas quaisquer verbas respeitantes a cláusula 74, cláusula 41, férias, subsídio de férias, férias não gozadas, subsídio de Natal e ordenado de Dezembro. Declaro ainda que perante a referida empresa não tenho qualquer direito resultante da lei de trabalho aplicável que não me tenha já sido inteiramente satisfeito pela referida empresa. Declaro também que os direitos que me assistiam foram explicados, que os mesmos foram por mim entendidos e que a empresa acima designada os assistiu completa e satisfatoriamente. Por tudo ser verdade assino a presente declaração e entrego-a à empresa para servir de comprovativo de todos os factos por mim mencionados neste documento." L. A Ré pagou ao Autor a quantia de 1 916, 64 € relativos a subsídios de férias e de Natal de 2007 e 2008. M. O Autor recomeçou a trabalhar como motorista noutra empresa de transportes cerca de 15 dias após o referido em E) N. O montante pago mensalmente pela Ré a título de ajudas de custo era calculado em função dos Kms percorridos pelo Autor e não visava apenas o pagamento de despesas por ele feitas em viagem mas retribui-lo em função do trabalho prestado. Alínea O (aditada) “Na data referida em E), o gerente da Ré disse ao Autor e outro trabalhador presente “Vocês vão ter que se ir embora”. Alínea P (aditada) - “Na reunião referida em E) o gerente da Ré disse ao Autor que se não aceitasse o acordo não receberia nada nem subsídio de desemprego”. III. Direito Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 684º, nº 3, e 685º-A, nº 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi do disposto nos artigos 1º, nº 2, al. a), e 87º do Código de Processo do Trabalho, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso, as questões a decidir são: a) reapreciação da matéria de facto; b) natureza, validade e efeitos jurídicos da declaração de fls. 112 dos autos (e dependendo desta, ou de ambas, o apuramento de eventuais créditos do recorrente). a) Da acta de julgamento não consta o início e o fim dos depoimentos, mas o recorrente indica os concretos pontos de facto que entende deverem ser reapreciados e os depoimentos e documentos em que tal reapreciação se funda, nada obstando por isso à reapreciação da prova, a qual todavia, se há-de fazer com a cautela que a não imediação impõe, perscrutando erros notórios. Pretende o recorrente que a matéria da alínea J dos factos provados devia ser dada como não provada, e que a matéria constante das alíneas A, B, C, D, E, G e H dos factos não provados deve ao invés considerar-se provada. Lê-se na alínea J) dos factos provados: “Na data referida em E) o Autor acordou com a Ré no recebimento de uma quantia, então discutida e explicada, pela cessação do contrato de trabalho e para pagamento de retribuições devidas em função dessa cessação, quantia essa que recebeu nesse dia”. No despacho de resposta à matéria de facto, a Mmª Juiz a quo consignou: “Não se provaram quaisquer outros factos com relevância para a decisão entre eles: A) Que, na data referida em E), o gerente da Ré tenha dito ao Autor e outro trabalhador presente “Vocês vão ter que se ir embora” B) Que, na data referida em E), o Autor tenha dito que “as coisas não podiam ser feitas dessa forma, e que não desejava deixar de trabalhar para a Ré, mas aquela mostrou-se intransigente, mantendo a sua posição. C) Que o Autor tem sofrido um grande desgaste psicológico desde tal data e que tal se reflecte negativamente no seu estado físico e mental. D) Que esse desgaste tem aumentado o estado de ansiedade em que vive, por não ter recebido o Subsídio de Desemprego. E) Que a cessação do contrato de trabalho fez o Autor sentir hipotecado o sustento do seu agregado familiar, provocando um elevado estado de nervos e de depressão que se irá agravar com o decurso do tempo, afectando a sua lenta recuperação. G) Que na reunião referida em E) o gerente da Ré tenha dito ao Autor que se não aceitasse o acordo referido no documento transcrito em K) não receberia nada nem subsídio de desemprego. H) Que o Autor sentiu pânico e que apenas anuiu a assiná-lo por ter receio de ficar sem qualquer meio de subsistência. Este tribunal procedeu à audição integral de todos os depoimentos prestados em audiência, a saber D…, colega do A. a quem sucedeu o mesmo que o A., na mesma ocasião, H…, esposa do A., D… e E… do A., ambos ex-trabalhadores, tendo o segundo saído da empresa de modo idêntico ao do A., e tendo tido também acção contra a Ré, recentemente (à data do julgamento) finda. Foi ainda ouvido o depoimento da testemunha F…, administrativa, que continua a trabalhar na Ré. A testemunha D… era autor, noutro processo idêntico a este, contra a Ré, que, sem apensação, foi julgado no mesmo dia e hora, tendo aliás as gravações misturado os respectivos depoimentos. Relativamente à alínea J, podemos retirar dos depoimentos produzidos que apenas a testemunha D… assistiu à reunião. A testemunha F… afirmou ter presenciado (através de divisórias abertas) uma reunião meses antes, em que a Ré comunicou a alguns motoristas, entre eles ao A., que dada a falta de trabalho, possivelmente iria parar alguns carros e que por isso os motoristas respectivos deixariam de ter trabalho e ficariam sem receber ajudas de custo, o que eles não queriam, porque ficariam sem parte substancial dos seus réditos. Esta mesma testemunha não assistiu à reunião de 5 de Janeiro, e portanto não pode afirmar, como afirmou, o acordo entre o A. e a R., nesse dia, para cessar o contrato. E portanto não pode afirmar que as contas foram feitas e explicadas, nem o que é que foi pago, nem pode desmentir nada do que disse a testemunha D…. Apesar de tudo, pode-se aproveitar do seu depoimento que a questão da falta de trabalho não era nova, e que o A. já estava ciente do iminente risco de ficar sem trabalho. A testemunha D… – A. na acção que foi julgada na mesma ocasião – com evidente interesse no desfecho desta – disse que a Ré afirmou que não havia mais trabalho, que fez as contas ao A. e que, por esse valor, este acordou cessar o contrato, que a Ré fez o A. assinar a declaração de fls. 112 e que a tirou da mão do A., e que a seguir lhe entregou um cheque de valor mais baixo que o acordado e que lhe disse que se quisesse mais dinheiro que fosse para tribunal; que no próprio dia o A. contactou um advogado. Ora, apesar do evidente interesse, não há razão para duvidar deste depoimento: - ele não foi no sentido que o A. (e ele mesmo) foram despedidos sem mais, mas no sentido de que, sob essa alegação, acordaram cessar o contrato e que depois foram enganados com um valor mais baixo. É certo que na declaração de fls. 112 nada, rigorosamente, nada consta sobre os valores acordados pela cessação do contrato nem sobre os valores devidos em função da cessação do contrato, até porque a declaração é de 31.12.2008 e a reunião dá-se em 5.1.2009. Mas do depoimento da testemunha E…, que corroborou o do D… (contando a mesma versão relativamente ao que lhe aconteceu a ele mesmo) resulta que pelo menos desde Dezembro que (ele, pelo menos) estava sem trabalhar, em casa, à espera de ver se era chamado (em Janeiro). Muito provavelmente acontecia o mesmo com o A. Note-se que a cessação de contratos do A., do D… e do E… foi no mesmo dia. Não podemos todavia retirar da declaração escrita em causa que ela nada teve com a cessação, porque era anterior – precisamente porque não se fazem declarações destas durante a normal pendência duma relação laboral. Em suma, consideramos que do depoimento da testemunha D…, e do paralelo depoimento da testemunha E…, se retira que na reunião do dia 5.1, o A. e a Ré acordaram cessar o contrato de trabalho contra o recebimento duma quantia que foi explicada (“na altura, fez as contas, à nossa frente, explicou, era o ordenado, ajudas de custo, incluindo kms (…) e mais um valor de mandar embora mais o fundo de desemprego”). Não podemos no entanto ir mais longe, ou seja, dar como provado que essa quantia foi discutida (fez-lhe as contas não significa que elas tenham sido discutidas), nem que se destinasse ao pagamento das retribuições devidas em função da cessação do contrato (neste aspecto, a declaração de fls. 112 não o autoriza) nem que essa quantia tenha sido recebida nesse dia, precisamente porque ignoramos qual a quantia e porque receber um cheque dum valor menor que o acordado não é seguramente receber a quantia acordada. Poderíamos assim ficar uma redacção alterada para “Na data referida em E) o Autor acordou com a Ré no recebimento de uma quantia, então explicada, pela cessação do contrato de trabalho”. Porém, a prova do acordo de cessação do contrato de trabalho, ou dito pelo modo legalmente previsto, isto é, a prova do acordo de revogação do contrato de trabalho, porque este depende da forma escrita – artº 394º do CT – não pode ser feita por testemunhas – artigos 220º e 393º, nº 1 do C. Civil. Mesmo que se admita que é possível provar por testemunhas que o acordo não revestiu forma escrita, não consta da alínea J ora sob apreciação que o acordo tenha sido verbal. Deste modo, não podem sequer ser valorados os depoimentos das testemunhas, pelo que todo o teor da alínea J tem de ser eliminado. Relativamente às alíneas C, D e E dos factos não provados, a prova principal produzida foi o depoimento da esposa do A. e não vemos nesse depoimento um mínimo de consistência, independentemente do normal nervosismo e da reserva que os familiares sentem ao falar sobre situações que também os afectaram. A esposa do A. limitou-se a responder às perguntas que lhe foram feitas e não explicou com um mínimo de detalhe, nem se lhe sentiu convicção, a afectação psicológica do A. (que haveria de ser traduzida em algo mais que conceitos vagos). Os outros depoimentos (D… e E…) não foram também minimamente detalhados, e a afectação psicológica varia de pessoa para pessoa, não sendo uma consequência inelutável, e não deixando de ser certo que o facto de se arranjar trabalho quinze dias depois não se concilia bem com um estado anímico desvalido. De resto, como não estamos de posse da parte visual do depoimento, não nos parece possível censurar a convicção do tribunal. Relativamente à alínea A dos factos não provados, cremos que é muito credível, compaginando o depoimento de F…, sobre a reunião anterior, com os depoimentos de D… e de E…, que o gerente da Ré tenha dito ao A. e a outro trabalhador presente “Vocês vão ter que se ir embora”. Adita-se assim à matéria de facto provada o facto O), com o seguinte teor: “Na data referida em E), o gerente da Ré disse ao Autor e outro trabalhador presente “Vocês vão ter que se ir embora”. Quanto à alínea B) não vemos que a única testemunha presente, D…, tenha dito que o A. tivesse dito que as coisas não podiam ser feitas daquela forma e que não desejava deixar de trabalhar para a Ré, nem que aquela se tenha mostrado intransigente, mantendo a sua posição. Pelo contrário, a testemunha afirmou que por “aquele valor” o A. concordara (com a cessação). No que toca à alínea G, socorrendo-nos do depoimento da testemunha D…, e considerando uma normalidade de coisas, na reunião em que o empregador chama os trabalhadores para acordar na cessação de contrato, evidentemente os há-de tentar convencer a cessarem os contratos, razão pela qual nos parece verosimilhante o depoimento da referida testemunha, no sentido de que ou recebem isto agora ou depois podem não receber nada, posso já não ter como vos pagar, e portanto aditamos à matéria de facto provada uma alínea P, com o seguinte teor: “Na reunião referida em E) o gerente da Ré disse ao Autor que se não aceitasse o acordo não receberia nada nem subsídio de desemprego”. Porém, no que toca à alínea H) “Que o Autor sentiu pânico e que apenas anuiu a assiná-lo por ter receio de ficar sem qualquer meio de subsistência”, já o depoimento da testemunha D…, única presencial, se mostra completamente omisso, nada havendo pois a alterar. b) Atenta a data dos factos, aplica-se ao caso dos autos a disciplina do Código do Trabalho aprovado pela Lei 99/2003. Dispõe o artº 393º deste diploma que o empregador e o trabalhador podem fazer cessar o contrato por acordo, nos termos do artigo seguinte, do qual consta que “1) O acordo de cessação deve constar de documento assinado por ambas as partes, ficando cada uma com um exemplar” e consta ainda que “Se, no acordo de cessação, ou conjuntamente com este, as partes estabelecerem uma compensação de natureza global para o trabalhador, presume-se que naquela foram pelas partes incluídos e liquidados os créditos já vencidos à data da cessação do contrato ou exigíveis em virtude dessa cessação”. Constituindo a matéria de cessação do contrato de trabalho disciplina legal imperativa, nos termos do artº 383º do CT 2003, e sendo certo que a declaração negocial revogatória está legalmente sujeita à forma escrita e que na sua falta é nula – por aplicação do disposto nos artigos 394º nº 1 citado e do artº 220º do Código Civil – não podemos concordar com a decisão recorrida, quando afirma que esta nulidade não aproveita ao recorrente, porque ele subscreveu a declaração transcrita em K) dos factos provados. É que por força do artº 289º do Código Civil e porque a forma escrita constitui uma formalidade ad substantiam da revogação do contrato de trabalho, precisamente enquanto se destina a rodear das maiores cautelas a ponderação do trabalhador sobre a gravidade e consequências da sua declaração[1] (o que resulta cristalino da faculdade de revogar a declaração revogatória), não se pode dizer que o contrato de trabalho tenha cessado. A relevância da nulidade do acordo de revogação do contrato de trabalho é que os efeitos da declaração transcrita na alínea K) dos factos provados, devem ler-se reportados à vigência do contrato de trabalho. Ora, em tal declaração o trabalhador não só não faz qualquer referência à cessação do contrato nem a quaisquer créditos dela derivados, como usa uma fórmula genérica “nesta data me foram liquidadas todas as verbas que me eram devidas pela empresa C…, Ldª e que se reportavam a 31 de Dezembro de 2008. (…) Declaro ainda que perante a referida empresa não tenho qualquer direito resultante da lei de trabalho aplicável que não me tenha já sido inteiramente satisfeito pela referida empresa. Declaro também que os direitos que me assistiam foram explicados, que os mesmos foram por mim entendidos e que a empresa acima designada os assistiu completa e satisfatoriamente”. Considerando as declarações genéricas em causa, emitidas na pendência da relação laboral – é a consequência lógico-jurídica da nulidade do acordo de revogação do contrato de trabalho e da afirmação do despedimento em data posterior à da declaração (5 de Janeiro) – não podem elas valer, porque produzidas no domínio da não liberdade do trabalhador e por força da protecção legal da retribuição – que é indisponível, parcialmente impenhorável, irrenunciável, não compensável e imprescritível – e do princípio da segurança do emprego, como remissão abdicativa, nos termos do artº 863º nº 1 do Código Civil, dos créditos laborais. Neste sentido vejam-se em www.dgsi.pt os acórdãos do STJ de 25.11.2009 e de 20.1.2010, e os acórdãos desta Relação de 18.10.2010. Neste sentido e consultável no mesmo sítio, decidimos já em 14.3.2011. Este mesmo não valor estende-se às demais declarações constantes do documento em causa. Na verdade, declarar “(…) que não me são devidas quaisquer verbas respeitantes a cláusula 74, cláusula 41, férias, subsídio de férias, férias não gozadas, subsídio de Natal e ordenado de Dezembro” posto que não melhor identificados, mais que não seja pelo ano a que se reportam, continua a constituir uma declaração genérica (repare-se aliás que em lado algum da declaração em causa o A. menciona a quantia que recebeu). Deste modo, e valendo ainda aqui a consideração da falta de liberdade do trabalhador, seja na vertente estrita de falta de condição de oposição ao empregador, seja na vertente subjacente de indisponibilidade da totalidade do tempo que condiciona a própria informação sobre os direitos, não podemos atribuir a esta parte da declaração a natureza de remissão abdicativa. Cumpre portanto conhecer dos pedidos formulados pelo Autor. Relativamente ao despedimento ilícito, sendo o despedimento uma declaração de vontade do empregador ao trabalhador destinada a fazer cessar o contrato de trabalho para o futuro, quer expressa quer tácita, isto é, que derive dum comportamento do empregador do qual se conclua a sua vontade de fazer cessar o contrato, os factos apurados são apenas que no dia 05/01/2009, a Ré, na pessoa do Gerente G…, convocou o Autor telefonicamente, e disse-lhe, já na sede da empresa, e diante de outro trabalhador chamado D…, que esta atravessava graves dificuldades financeiras, e que em consequência das mesmas, "não há trabalho para vocês" e “Vocês vão ter que se ir embora” e ainda que disse ao Autor que se não aceitasse o acordo não receberia nada nem subsídio de desemprego. Não há portanto nenhuma declaração expressa inequívoca: “não há trabalho” não é o mesmo que dizer “não te dou doravante trabalho”, uma coisa não implica a outra. Do mesmo modo, e no sentido em que reapreciamos a matéria de facto, dizer “vocês vão ter que se ir embora” só significa, em bom rigor, que sois vós, trabalhadores, que têm de decidir ir-se embora, o que é diferente de dizer “vão-se embora”. Por outro lado, do comportamento da Ré, em causa, não se pode concluir que a Ré despede o autor, precisamente porque pode só estar a convidá-lo a sair, por acordo – é a tese da Ré – ou a resolver o contrato por violação do dever de ocupação efectiva ou, mais adiante, por salários que vierem a não ser pagos. Cremos portanto que não há prova inequívoca de que o A. foi despedido, até porque o gerente também disse que se o A. não aceitasse só lhe poderia pagar o salário mas já não as ajudas de custo, e em consequência fenecem todos os pedidos relacionados com o despedimento ilícito, incluindo o de indemnização por danos não patrimoniais, cujos aliás também não se provaram. Diga-se ainda que a matéria apurada também não permite concluir por uma extinção do posto de trabalho, precisamente porque era necessário que, dalgum modo, houvesse essa explicitação de que o posto de trabalho seria extinto – e de novo, dizer que não há trabalho não implica a decisão da entidade empregadora de extinguir o posto de trabalho. Aliás, é usual que antes de se iniciar formalmente um processo de extinção do posto de trabalho o empregador inicie contactos com os trabalhadores no sentido da revogação por mútuo acordo dos respectivos contratos, e se assim acontecer, não se chega logicamente a falar em extinção de posto de trabalho, não havendo lugar às considerações sobre a observância dos preceitos legais correspondentes. Por seu turno, com a eliminação da alínea J dos factos provados, a Ré também não provou – nem poderia, como vimos – a cessação do contrato por mútuo acordo, pelo que temos de considerar, para os efeitos destes autos, que não se provou a cessação do contrato. Deste modo, todos os pedidos relacionados com esta cessação improcedem também. Resta por último analisar os restantes créditos salariais reclamados pelo Autor. Para tanto, temos de determinar previamente a retribuição do A., e o que se provou, a este respeito, foi que o Autor auferia o vencimento base mensal de € 875,00, ao qual acrescia uma quantia variável mencionada como “ajudas de custo”, nos recibos de vencimento, e que em 05.01.2009 auferia, mensalmente, a título de ajudas de custo, quantia não inferior a € 1.600,00. Provou-se ainda que o montante pago mensalmente pela Ré a título de ajudas de custo era calculado em função dos Kms percorridos pelo Autor e não visava apenas o pagamento de despesas por ele feitas em viagem mas retribui-lo em função do trabalho prestado. Às relações estabelecidas entre o Autor e a Ré é aplicável o CCTV celebrado entre a ANTRAM e a FESTRU, publicado no BTE nº 9 de 08.03.1980 e posteriores alterações. A alteração da remuneração dos motoristas de transportes internacionais rodoviários de mercadorias prevista na regulamentação colectiva do trabalho em vigor para o sector, só é válida se ficar demonstrado que dela resulta um regime retributivo mais favorável para o trabalhador[2]. Era à Ré que competia provar, nos termos do artº 342º nº 2 do Código Civil, que o sistema retributivo acordado com o Autor era mais favorável do que o estabelecido pela convenção colectiva. O pagamento sob a rubrica “ajudas de custo” traduz, conforme alínea N dos factos provados, um pagamento ao Km, sendo contrário ao determinado na referida convenção colectiva, e é por isso nulo. Assim, apenas se pode atender à remuneração base mensal de € 875,00 e às demais prestações complementares previstas na CCTV, peticionadas, decaindo os créditos reclamados a título principal. A título subsidiário o A. peticionou o vencimento relativo a cinco dias de Janeiro de 2009 no montante de € 201,96, e como incumbia à Ré provar ter efectuado o pagamento, o que não aconteceu, tem o A. direito a €875,00 : 30 x 5, ou seja, a €145,84. Pediu ainda a retribuição de férias e o subsídio de férias vencidos em 1.1.2009 no montante de € 1.750,00, ou seja, €875,00 x 2, que a Ré não provou ter pago e que por isso assiste ao A. o direito a receber. Pediu ainda a retribuição de férias e o subsídio de férias respeitantes ao ano da admissão no total de € 646,27. A este propósito provou-se que a Ré pagou ao Autor a quantia de € 1.916,64 relativa a subsídios de férias e de Natal de 2007 e 2008. Assim, como o A. foi admitido em 1.9.2007, teria direito a 8 dias de férias respeitantes a 2007, no valor de €233,33, cujo subsídio assim, comprovadamente, se mostra pago. Relativamente à retribuição de tal período, a Ré não provou que a tivesse pago ao A. pelo que tem este direito a €233,33. O A. reclamou também o pagamento do trabalho suplementar prestado em 39 domingos, no montante de €3.151,20. Provou-se tal trabalho e a Ré não provou o seu pagamento. Deste modo, considerando a retribuição diária de € 29,16 (€875,00 : 30), o A. tem direito a € 2.274,48 (€29,16 x 200% = €58,32 x 39). Peticionou o A. o montante de €6.058,00 a título de cláusula 74º nº 7 do CCTV, relativa a toda a duração contratual, ou seja 16 meses, pagamento que a Ré não logrou provar. Assim, e porque tal cláusula é calculada tendo em conta o montante da retribuição horária, multiplicada por 30 dias, por ser devida em todos os dias do mês[3], o valor em dívida é de € 12.115,20 (€875,00 x 12 = €10.500,00; 52 x 8h = 416; 10.500,00 : 416 = €25,24) x 30 dias x 16 meses). Finalmente o A. reclamou o pagamento de €1.908,00 de prémio TIR durante todo o tempo de duração contratual, que a Ré não provou ter pago. Desse modo são devidos €1.696,00 (€106,00 x 16). Às quantias parcelares acrescem os juros legais, à taxa de 4% ao ano, a contar da data do vencimento de cada uma delas – artigo 805º, nº 2, al. a) do C. Civil e artigos 269º e 364º do CT de 2003 – e até integral pagamento. Assim, tem o A. direito à quantia global de €18.214,85. IV. Decisão Nos termos supra expostos acordam conceder provimento parcial ao recurso e revogar a sentença recorrida, substituindo-a pelo presente acórdão que julga a acção parcialmente procedente por parcialmente provada e em consequência condena a Recorrida a pagar ao Recorrente a quantia global de €18.214,85 (dezoito mil e duzentos e catorze euros e oitenta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde o vencimento de cada uma das prestações dela integrantes e até integral pagamento. Custas por Recorrente e Recorrida, em ambas as instâncias, na proporção de 2/3 e de 1/3 respectivamente. Porto, 7.11.2011 Eduardo Petersen Silva José Carlos Dinis Machado da Silva Maria Fernanda Pereira Soares ____________ [1] Cfr. neste sentido, João Leal Amado, in Revogação do Contrato de Trabalho (Nótula sobre os Arts. 393º a 395º do CT), Prontuário do Direito do Trabalho, CEJ, nº 69, págs.54/55. [2] V. Ac. STJ de 14.03.2006, CJ, acórdãos do STJ, ano 2006, tomo 1, página 259. [3] V. Acórdão do STJ de 29.10.2003 publicado em Sumários de acórdãos do STJ, nº74, Outubro de 2003, página 250. ____________ Sumário: I. A forma escrita constitui uma formalidade ad substantiam da revogação por mútuo acordo do contrato de trabalho. Na sua falta ocorre nulidade e o contrato não pode considerar-se cessado. II. Deste modo, uma declaração genérica de recebimento de créditos laborais, porque ainda emitida na pendência da relação laboral, não pode valer como remissão abdicativa mas como simples quitação, com repercussão meramente probatória. a) Eduardo Petersen Silva (Processado e revisto com recurso a meios informáticos (artigo 138º nº 5 do Código de Processo Civil).