Processo:6880/11.7TBMAI.P1
Data do Acordão: 03/03/2013Relator: ANA PAULA AMORIMTribunal:trp
Decisão: Meio processual:

Do despacho que admite um meio de prova, cabe recurso de apelação, com subida imediata, em separado e efeito meramente devolutivo (art. 691°/2 i) CPC), motivo pelo qual não constitui um recurso interlocutório e por isso, fica o tribunal impedido de conhecer do objecto do recurso nessa parte.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
ANA PAULA AMORIM
Descritores
MEIO DE PROVA ADMISSÃO RECURSO RECURSO EM SEPARADO RECURSO INTERLUCOTÓRIO
No do documento
Data do Acordão
03/04/2013
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO
Decisão
ALTERADA A DECISÃO
Sumário
Do despacho que admite um meio de prova, cabe recurso de apelação, com subida imediata, em separado e efeito meramente devolutivo (art. 691°/2 i) CPC), motivo pelo qual não constitui um recurso interlocutório e por isso, fica o tribunal impedido de conhecer do objecto do recurso nessa parte.
Decisão integral
Depósito-6880-11.7TBMAI.P1-1348-12TRP
Trib Jud Maia
Proc. 6880/11.7TBMAI
Proc. 1348/12 -TRP
Recorrente: B…, SA
Recorrido: C…, Lda-Juiz Desembargador Relator: Ana Paula Amorim
Juízes Desembargadores Adjuntos: Soares Oliveira
                                                         Ana Paula Carvalho  *
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Acordam neste Tribunal da Relação do Porto (5ª secção – 3ª Cível)

I. Relatório
Na presente acção que segue a forma de processo sumário em que figuram como:
- AUTORA: B…, S.A., com sede na Rua …, n.º . – ., em Lisboa; e
- RÉ: C…, Lda., com sede na …, …, ..., na Maia,
pede a Autora que a condenação da ré no pagamento da quantia de € 13.160,30.
Alega, em síntese, que no âmbito da sua actividade, solicitou à ré que procedesse à recepção, classificação, armazenagem, selecção e subsequente entrega de mercadorias aos consumidores finais, mediante um valor global acordado entre as partes.
No dia 25 de Agosto de 2011, solicitou o transporte de 262 fraques para um consumidor final, sendo que a ré se recusou a fazê-lo, invocando a existência de um saldo a seu favor e informando que ia reter as mercadorias até pagamento da quantia alegadamente em dívida.
Durante a relação comercial existente, a ré nunca solicitou o pagamento de qualquer quantia a título de armazenagem, sendo que tal serviço estava incluído no contrato celebrado.
 Mais refere, que em consequência dessa retenção não pode satisfazer as encomendas da sua cliente, tendo perdido um negócio no montante de € 8.065,50.
Dado o carácter sazonal da mercadoria por si comercializada, não poderá proceder no futuro à venda da mercadoria em apreço.
Em resultado da conduta da ré, viu prejudicado o seu bom nome e a sua imagem comercial, considerando adequado para compensar o dano moram sofrido, a indemnização de € 5.000,00.-Citada a Ré contestou, defendendo-se por impugnação e por excepção, deduzindo pedido reconvencional.
 Para fundamentar a sua pretensão alegou, em síntese, que nos termos do contrato celebrado com a autora, cada operação por si realizada tinha um custo associado, sendo que a armazenagem era negociada caso a caso.
Só depois de comunicar à autora a alteração do tarifário de armazenagem, aquela veio pedir a entrega dos fraques a um pretenso cliente.
A autora não articulou factos que pudessem consubstanciar responsabilidade civil da sua parte.
Refere, ainda, que a armazenagem sempre foi paga fora do acordo estabelecido entre ambas, sendo que a ré mantém em dívida a armazenagem de mercadoria pelo período de noventa e uma semanas, de acordo com o tarifário em vigor.
Alegou, por fim, não saber quando fará a entrega solicitada já que, até agora, continua a exercer o direito de retenção baseado na falta de pagamento de armazenagem do período vencido, sendo que apenas poderá computar tal valor quando efectivamente a mercadoria deixar de estar armazenada nas instalações da Ré, calculando-se, então, o efectivo tempo e a quantia respectiva em débito.
Concluiu, por atribuir à reconvenção, por ilíquida a quantia devida a final, o valor de € 5.001,00, relegando-se para execução de sentença o cálculo certo.
Em reconvenção pede a condenação da Autora no valor que se vier a liquidar em execução de sentença.-Na resposta à contestação a Autora manteve a posição inicial e impugnou a matéria da reconvenção, pedindo a condenação da ré como litigante de má-fé.-Proferiu-se despacho saneador e seleccionou-se a matéria de facto assente e a provar, despacho do qual não coube reclamação. -Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, proferindo-se o despacho que contém as respostas à matéria de facto. -Proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve:

“Pelo exposto, decide-se julgar improcedente a presente acção e, em consequência, absolve-se a ré C…, Lda. do pedido contra si dirigido nestes autos pela autora B…, S.A..
Mais se decide julgar parcialmente procedente o pedido reconvencional e, em consequência, condena-se a autora B…, S.A. a pagar à ré C…, Lda. a quantia de Eur. 8.473,08 (oito mil, quatrocentos e setenta e três euros e oito cêntimos).
Julga-se improcedente o pedido formulado pela autora de condenação da ré como litigante de má-fé, absolvendo esta do pedido contra si formulado a esse propósito.
Custas da acção pela autora, nos termos do artigo 446º do CPC.
Custas do pedido reconvencional pela autora e pela ré, na proporção de 90% para a primeira e de 10% para a segunda, nos termos do artigo 446º do CPC.”-A Autora B…, SA veio interpor recurso da sentença. -Nas alegações que apresentou a recorrente formulou as seguintes conclusões:
A - A Apelante intentou em 21 de Outubro de 2011 Acção Declarativa de Condenação, com Processo Comum na Forma Sumária contra a ora Apelada, peticionando a condenação desta no pagamento da quantia de €13.160,30 (treze mil, cento e sessenta euros e trinta cêntimos);
B. - Vindo a Apelada Contestar tal acção, deduzindo pedido Reconvencional contra a Apelante, no montante de €5.001,00 (cinco mil e um euros);
C. - Vem o Tribunal a Quo condenar a Apelante ao pagamento à Apelada a quantia de €8.473,00 (oito mil, quatrocentos e setenta e três euros) por (…)”julgar parcialmente procedente o pedido reconvencional”(…)!?!?!?!?!?!;
D. - Mesmo admitindo que a Apelante devia qualquer quantia à Apelada, o que apenas academicamente se concebe, NUNCA poderia o Tribunal a Quo condenar a Apelante em quantia superior à peticionada pela Apelada, como fez;
E. - Mais se faça notar, que a Apelada apresentou Testemunha que consta da Certidão do Registo Comercial como Sócio, cfr. Doc 1 que se junta e se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.
F. - A Apelante reagiu, a este arrolamento, sem sucesso, pois, veio a Apelada apresentar Procuração que atesta ser este apenas seu Procurador, Cfr. Doc.2;
G. - O Meritíssimo Juiz do Tribunal a Quo, mesmo contra o registo constante da Competente Conservatória, admitiu o que, no entender da Apelante, configura Depoimento de parte!!;
H. - Sem prescindir e por mera cautela de patrocínio sempre se dirá em súmula, que a aqui Apelante, peticionou a Condenação da Apelada ao pagamento das quantias de €8.065,50, a título de responsabilidade civil contratual (Danos Patrimoniais) e €5.000,00 pelos danos não patrimoniais directamente causados pela Apelada;
I. - Os danos patrimoniais da Apelante, resultam, como alegado em sede própria, do incumprimento do contrato celebrado com a Apelada (“Pick & Pack”), no qual, mediante o pagamento de preço, acordado pelas partes, a Apelada se obrigava a prestar os serviços de recepção de mercadorias propriedade da Apelante, sua classificação, armazenagem, selecção dos diferentes itens a entregar ao diferentes clientes finais da Apelante e o transporte dos mesmos aos sobreditos clientes finais;
J. - O Meritíssimo Tribunal a Quo considerou provado quanto se alegou, cfr. facto 2. da Matéria de Facto provada naquela Douta Sentença;
K.- No âmbito do contrato vigente entre Apelante e Apelada, veio aquela solicitar no 25 de Agosto de 2011, à Apelada, a entrega a cliente final de 262 fraques, cfr. Doc. 1 que se juntou com aquele articulado;
L. - A Apelada, recusou tal ordem da Apelante, invocando existir um saldo devedor a seu favor do montante de €12.150,18, o que lhe conferia um “direito de retenção” das mercadorias propriedade da Apelante;
M. - Tais quantias que a Apelada alegou serem devidas pela Apelante, resultavam, de custos de armazenamento das mercadorias propriedade da Apelante, como se o contrato vigente entre as partes desde o ano 2000 e até à data em que a Apelante solicitou a entrega das mercadorias a um seu cliente final, não compreendesse a globalidade dos serviços supra referidos e, antes, fossem devidos pela Apelante montantes parciais para cada um dos mesmos!
N. - A Apelante, naquele articulado, apresentou prova documental bastante para provar sem margem para qualquer dúvida, que do acordo celebrado entre as aqui Apelante e Apelada “Pick & Pack”, a Apelada prestaria todos os serviços compreendidos no mesmo, contra o pagamento do preço acordado;
O. - O Tribunal a Quo, fazendo “tábua rasa” da prova apresentada, firmando a sua convicção exclusivamente na prova testemunhal, veio a considerar que efectivamente a Apelante devia à Apelada o valor daquela parcela do serviço, ou seja, devia uns quaisquer valores que a Apelada arremessou na sua Contestação;
P. - A Apelada veio apresentar Contestação à P.I. da Apelante, na qual alega que desde o inicio da vigência do Acordo de “Pick & Pack” celebrado com a Apelante, nunca esta tinha procedido ao pagamento de serviços por esta prestados, pelo que se recusava a entregar as mercadorias propriedade da Apelante a cliente final, fazendo a sua retenção, em razão de tais serviços nunca pagos;
Q. - Ora a Apelada, alega serem devidas quantias pela Apelante, por serviços prestados, fora do contrato entre ambos celebrado e que vigorou por mais de dez anos, nomeadamente por agora acrescerem (…)”a estes trabalhos muitos outros solicitados pela A. como empacotamento, refrescar os artigos, passá-los a ferro etc.”;
R. - Não pode a Apelante compreender então, porque não emitiu a Apelada quaisquer facturas à Apelante por esses serviços prestados;
S. - A razão é simples, a Apelada não prestou nunca quaisquer outros serviços para além dos que se encontram vertidos na P.I., tendo cumprido até à ultima solicitação da Apelante, o acordo/contrato de “Pick & Pack” até então em vigor entre ambas e que, como se alegou incluía serviços de recepção de mercadorias propriedade da Apelante, sua classificação, armazenagem, selecção dos diferentes itens a entregar ao diferentes clientes finais da Apelante e o transporte dos mesmos aos sobreditos clientes finais;
T. - A Apelada veio informar a Apelante por email datado de 19 de Agosto de 2011 que (…)”a partir de 02 de Setembro próximo não podem manter armazenados os V/ artigos da lista attach, nas condições actuais de custo, por necessidade de transferência do espaço físico consignado”;
U. - E continua “Podem V. Exas., optar pela retirada desses artigos até à data indicada. 2-09-2011, ou optarem pelo agravamento no respectivo custo que passará a ser de € 0,50 / peça – semana”, cfr. Doc. 7 junto com a P.I.;
V. - Ora a Apelante solicitou a entrega das mercadorias, in casu, 262 fraques, à Apelante no dia 25 de Agosto de 2011 ou seja SETE dias antes do prazo a partir do qual a Apelada passaria a cobrar esta nova taxa, pelo que não poderia nunca aplicar, como fez, à Apelante esta “nova taxa” de armazenamento;
W. - A Douta decisão do Tribunal a Quo, finda por nem sequer esclarecer se a Apelada fica obrigada à entrega à Apelante das mercadorias de sua propriedade;
Y. - A Douta Sentença do Tribunal a Quo, deveria ter condenado a Apelada à entrega imediata das mercadorias à Apelante, ressarcindo-a do negócio que perdeu pelo alegado direito de retenção invocado e alegado em sede de Contestação;
Z. - Mesmo que não se considerassem os danos não patrimoniais sofridos pela Apelante em resultado da conduta da Apelada, sempre se deveria atender aos danos patrimoniais, condenando-se a ora Apelada ao pagamento da quantia de € 8.065,50 (oito mil e sessenta e cinco euros e cinquenta cêntimos). “
Termina as alegações por pedir a revogação da sentença, quanto à condenação no pedido reconvencional e do despacho que admitiu o depoimento da testemunha, condenando-se à contrario a Apelada ao pagamento à Apelante de todas as quantias constantes da sua Petição Inicial e ainda, à entrega imediata das mercadorias de sua propriedade. -A Ré veio apresentar contra-alegações nas quais formulou as seguintes conclusões:
“I) A douta sentença recorrida aplicou correctamente o art.661 nº2 in fine ao condenar em montante pedido e apurado até porque articulado e líquido. (decaído parcialmente). 
II) O valor processual atribuído à Reconvenção de €5.001 destina-se à parte ilíquida a apurar em execução de sentença que computará o valor devido até à entrega dos fraques (que ainda se encontrarem no armazém da recorrida a gerar custos para a recorrente).
III) O sócio de uma sociedade por quotas pode depor como testemunha por não existir impedimento (art.617 do CPC a contrario).
IV) Não havendo registo da prova a mesma e a matéria de facto inerente não são susceptíveis de reapreciação pelo Tribunal ad quem. (de entre outros, art.685-B do CPC).
V) As CONCLUSÕES da Recorrente violam o disposto no art.685-A do CPC.
VI) A junção de documentos, aliás já no processo em 1ª instância, viola o disposto no art.693B,art. 524 e ainda alíneas a) a g), i) a n) do nº2 do art.691 do CPC e VII) Deve, por isso, ser condenada em multa pela prática de acto proibido.
VIII) Litiga com má-fé devendo ser condenada pesadamente por tal.” 
Termina por pedir que não se conceda provimento ao recurso.-O recurso foi admitido como recurso de apelação.-Dispensaram-se os vistos legais.-Cumpre apreciar e decidir.-II. Fundamentação
1. Delimitação do objecto do recurso
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso – art. 685º- A CPC.
As questões a decidir: 
- da omissão de normas legais nas conclusões de recurso;
- admissibilidade dos documentos juntos em sede de alegações de recurso; 
- nulidade da sentença, por condenação em quantia superior ao valor do pedido reconvencional e omissão de pronúncia a respeito da entrega das mercadorias;
- se o sócio e procurador da sociedade é inábil para depor como testemunha;
- reapreciação da decisão da matéria de facto, quanto ao concreto ponto 2 dos factos provados;
- se o contrato celebrado entre Autora e Ré, na modalidade “Pick & Pack” engloba os serviços de “armazenamento” e indemnização a título de danos morais, por incumprimento do contrato;
- valor devido a título de taxa de armazenamento;
- condenação da apelante como litigante de má-fé.-2. Os factos
Com relevância para a apreciação das conclusões de recurso cumpre ter presente os seguintes factos provados no tribunal da primeira instância:
1 - A autora dedica-se à comercialização de diferentes tipos de vestuário, sendo a sua actividade maioritariamente exercida na qualidade de grossista. – alínea a) dos factos assentes.
2 - No decurso do ano de 2000, a autora e a ré celebraram um acordo, mediante o qual a primeira solicitou à segunda a prestação de serviços de recepção de mercadoria, sua classificação, selecção dos diferentes itens a entregar aos diversos clientes finais e consequente transporte dos mesmos. – resposta ao quesito n.º 1 da base instrutória.
3 - No âmbito do acordo celebrado entre a autora e a ré, cada uma das operações de transporte, armazenagem e embalagem tinha um custo associado parcelar. – resposta ao quesito n.º 17 da base instrutória.
4 - O acordo entre a autora e a ré assumia um carácter sazonal, ocorrendo duas vezes por ano, aquando das colecções Outono/Inverno e Primavera/Verão. – resposta ao quesito n.º 18 da base instrutória.
5 - Tendo um tarifário combinado para cada estação. – resposta ao quesito n.º 19 da base instrutória.
6 - Sendo que para os demais serviços, nomeadamente a armazenagem, o tarifário era negociado caso a caso. – resposta ao quesito n.º 20 da base instrutória.
7 - A ré remeteu à autora, que o recebeu, o documento junto a fls. 20 dos autos, datado de 19 de Agosto de 2011, cujo teor se dá por reproduzido. – alínea d) dos factos assentes.
8 - A autora recusou a proposta efectuada no documento mencionado em D). – resposta ao quesito n.º 7 da base instrutória.
9 - No dia 25 de Agosto de 2011, a autora solicitou à ré o transporte de 262 fraques para um seu consumidor final, conforme documento junto a fls. 15 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido. – alínea b) dos factos assentes.
10 - A ré remeteu à autora, que o recebeu, o documento junto a fls. 17 dos autos, datado de 29/8/2011, cujo teor se dá por reproduzido, e mediante o qual comunicou que “os serviços solicitados no v/ fax de hoje terão um custo a ser suportado por V. Exas. no montante de €15.305,68 (…) como alias é do v/ conhecimento.
Assim, para proceder conforme v/ solicitação, deverá ser-nos entregue a quantia de 16.151,52 até ao referido dia um de Setembro 2011 (…)
Dá-se conta a V. Exas. que, na falta de pagamento do valor e na data mencionados, desde já passará naquela data a ser exercido o direito de retenção sobre a V/ mercadoria em depósito nos n/ armazéns para garantia do n/ crédito”. – alínea c) dos factos assentes.
11 - Nas circunstâncias aludidas em B), a ré recusou proceder à entrega solicitada, alegando que existia um saldo devedor a seu favor, no montante de Eur. 12.150,18. – resposta ao quesito n.º 3 da base instrutória.
12 - Tendo informado a autora que por esse motivo iria reter as mercadorias armazenadas nas suas instalações até ao pagamento da quantia mencionada em 3). – resposta ao quesito n.º 4 da base instrutória.
13 - Nas circunstâncias aludidas em B), a autora pediu a entrega dos fraques a um cliente, pelo preço unitário de Eur. 25,00. – resposta ao quesito n.º 21 da base instrutória.
14 - Tendo tal sucedido depois de a ré lhe ter comunicado as alterações de tarifário de armazenagem. – resposta ao quesito n.º 22 da base instrutória.
15 - Os fraques produzidos pela autora são vendidos no D… a Eur. 400,00 a unidade. – resposta ao quesito n.º 23 da base instrutória.
16 - Os fraques aludidos em B) estão na posse da ré desde 22 de Março de 2010. – resposta ao quesito n.º 24 da base instrutória.
17 - Tendo sido convencionado entre a autora e a ré que aquela pagaria pela armazenagem de cada um a quantia semanal de Eur. 0,42. – resposta ao quesito n.º 25 da base instrutória.
18 - Por referência ao transporte e entrega de mercadorias pertencentes à autora, a ré emitiu em nome daquela as facturas juntas a fls. 18 e 19 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido. – resposta ao quesito n.º 5 da base instrutória.
19 - As marcas de vestuário, em razão da constante mudança das tendências da moda, alteram as suas colecções anualmente, apresentando novas colecções. – resposta ao quesito n.º 12 da base instrutória.-3. O direito

- Da omissão de normas legais nas conclusões de recurso –
A apelada no ponto V das conclusões, na resposta às alegações, considera que as conclusões de recurso da apelante violam o disposto no art. 685º-A CPC, pois não enunciam as normas jurídicas violadas ou os fundamentos jurídicos da pretensão do apelante.
Decorre do art. 685º-A CPC que o recorrente tem o ónus de alegar e formular conclusões, sendo certo que, quando o recurso versa sobre questões de direito, deve indicar: as normas jurídicas violadas, o sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada.
Quando o recorrente não tenha procedido a estas especificações, deve o relator proferir despacho de convite ao aperfeiçoamento, com a cominação de rejeição das conclusões nessa parte (art. 685º-A /3 CPC). 
No caso concreto, constata-se que tanto nas conclusões, como na motivação de recurso, a apelante não indicou as normas jurídicas em que funda a sua pretensão, ou que foram indevidamente aplicadas pelo juiz do tribunal “a quo”.
Contudo, o objecto do recurso não se confina à apreciação de questões de direito e por outro lado, a omissão desta formalidade não impediu o exercício do contraditório pela apelada, que bem compreendeu o alcance da impugnação.
Acresce que o despacho de aperfeiçoamento não está coberto pela força do caso julgado, nem se esgotam com a sua prolação os poderes do juiz na apreciação da situação e dos efeitos que devem ser determinados, o que significa, que mesmo que a parte não responda ao convite, pode justificar-se não aplicar a cominação e conhecer do objecto do recurso (neste sentido Abrantes Geraldes “Recursos em Processo Civil – Novo Regime”, pag. 130-131)
Desta forma, por razões de celeridade processual, ao abrigo do art. 266º/1 CPC, opta-se por não proferir despacho de aperfeiçoamento, passando a apreciar-se das demais questões suscitadas nas conclusões da apelante.-- Admissibilidade dos documentos juntos em sede de alegações de recurso -

A apelante juntou com as alegações de recurso dois documentos: uma procuração e uma certidão de matrícula da apelada.
A apelada insurge-se quanto à admissibilidade dos documentos, pois os mesmos já constam dos autos, uma vez que foram juntos em sede de audiência de julgamento.-Cumpre pois decidir.
A junção de documentos em sede de recurso está subordinada ao critério estabelecido no art. 693º-B CPC, no qual se determina:
“1.As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excepcionais a que se refere o art. 524º, no caso de a junção apenas se tornar necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª instância e nos casos previstos nas alíneas a) a g) e i) a n) do nº2 do art. 691º.”
Decorre deste regime que em sede de recurso, nas alegações, as partes podem juntar documentos, quando:
- a sua apresentação não tenha sido possível até esse momento – superveniência objectiva ou subjectiva;
- se destinem a provar factos posteriores ou cuja apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior ao julgamento em 1ª instância;
- se tenha revelado necessária por virtude do julgamento proferido, maxime quando esta se revele de todo surpreendente relativamente ao que seria expectável em face dos elementos já constantes do processo;
- se trate de reapreciar a questão da competência absoluta ou relativa, justificar por que razão determinado meio de prova deve ser admitido ou a contrariar os fundamentos de facto que levaram o juiz a quo a conceder ou rejeitar a providência cautelar.(Abrantes Geraldes “Recursos em Processo Civil – Novo Regime”, pag. 228)
No caso em análise a apelante não indica o motivo pelo qual requereu a junção dos documentos com as alegações, sendo certo que constituem documentos que já constam dos autos e foram juntos na fase de julgamento, na sequência do incidente suscitado sobre a inabilidade da testemunha. 
O presente recurso não tem por objecto a impugnação de decisões previstas nas alíneas a) a g) e i) a n) do nº2 do art. 691º CPC.
Analisados os documentos em confronto com os fundamentos do requerimento em que foi suscitado o incidente e com o teor do despacho proferido em 1ª instância, resulta que o despacho não veio invocar novos e diferentes argumentos.
Como refere Amâncio Ferreira, a junção de documentos em sede de alegações face ao julgamento proferido em 1ª instância, “funda-se no imprevisto da decisão proferida, quer por razões de direito quer por razões de prova (…)” (Manual dos Recursos em Processo Civil, 9º ed., pag. 215).
No caso presente a decisão proferida não se funda em normas jurídicas com cuja aplicação a parte não contava, nem a junção de novo de cópia dos documentos, como meio de prova pode contribuir para apurar factos diferentes daqueles que se mostram provados, com relevância na decisão final e que não foram atendidos por omissão de prova documental.
Conclui-se, assim, que atento o critério previsto no art. 693º-B CPC carece de fundamento legal e não se mostra pertinente a requerida junção dos documentos, pelo que ao abrigo do art. 700º/1 e) CPC, rejeita-se a junção dos documentos, os quais devem ser desentranhados e entregues ao apresentante.
 O acto praticado porque configura um incidente, será tributado com custas a cargo do apelante, nos termos do art. 543º/1 CPC e art. 27º/1/3 RCJ.  -- Nulidade da sentença, por condenação em quantia superior ao valor do pedido reconvencional e omissão de pronúncia, a respeito da entrega das mercadorias -

Nas conclusões de recurso, sob as alínea A) a D), suscita a apelante a questão do conhecimento para além do pedido, na medida em que o juiz do tribunal “a quo” condenou a apelante no pagamento à apelada da quantia de € 8.473,00, quando no pedido reconvencional a apelada pediu a condenação da apelante na quantia de € 5.001,00.
Nas conclusões de recurso sob as alíneas W) e Y) refere, ainda, a apelante que a sentença devia ter condenado a apelada na entrega imediata das mercadorias, o que omitiu.
A apelada defende que a sentença não conheceu para além do pedido, porque o juiz do tribunal “a quo” limitou-se a aplicar o regime previsto no art. 661º/2 CPC.-Analisando.
As nulidades da sentença enquadram-se nos “vícios de limites”, na medida em que face ao regime do art. 668º CPC a sentença não contém tudo o que devia, ou contém mais do que devia. (Professor Castro Mendes “Direito Processual Civil”, pag. 308)
Daqui resulta que não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário, pois apenas se curou das causas de nulidade da sentença, deixando de lado os casos a que a doutrina tem chamado de inexistência da sentença. (Professor Antunes Varela “Manual de Processo Civil, pag. 686)
Nos termos do art. 668º 1 / d) CPC a sentença é nula:

“d) Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.

O vício em causa está relacionado com a norma que disciplina a “ordem de julgamento” – art. 660º/2 CPC.
Com efeito, resulta do regime previsto neste preceito, que o juiz na sentença: 
“deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.”
A respeito do conceito “questões que devesse apreciar” refere o Professor Anselmo de Castro que deve “ser entendida em sentido amplo: envolverá tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das excepções e da causa de pedir (melhor, à fundabilidade ou infundabilidade dumas e doutras) e ás controvérsias que as partes sobre elas suscitem. Esta causa de nulidade completa e integra, assim, de certo modo, a da nulidade por falta de fundamentação. Não basta à regularidade da sentença a fundamentação própria que contiver; importa que trate e aprecie a fundamentação jurídica dada pelas partes. Quer-se que o contraditório propiciado ás partes sob os aspectos jurídicos da causa não deixe de encontrar a devida expressão e resposta na decisão.” (“Direito Processual Civil Declaratório”, vol. III, pag. 142).
Lebre de Freitas por sua vez tem a respeito de tal matéria uma visão algo distinta, pois considera que devendo: “o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (art. 660º/2), o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes da da sentença, que as partes hajam invocado.” (ob. cit., pag.670) 
Para melhor precisar o seu entendimento remete para o estudo do Professor Alberto dos Reis cuja passagem se transcreve:
“Resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação “não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito (art. 511º/1), as partes tenham deduzido ou o próprio juiz possa inicialmente ter admitido: por um lado, através da prova, foi feita a triagem entre as soluções que deixaram de poder ser consideradas e aquelas a que a discussão jurídica ficou reduzida; por outro lado, o juiz não está sujeito às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas (art. 664º) e, uma vez motivadamente tomada determinada orientação, as restantes que as partes hajam defendido, nomeadamente nas suas alegações de direito, não têm de ser separadamente analisadas.” (Alberto do Reis “CPC Anotado”, vol. V, pag. 143).
No mesmo sentido pode ainda ler-se o Professor Antunes Varela na obra já citada (pag. 688).
Seguindo os ensinamentos de Alberto dos Reis e de Lebre de Freitas, atendendo ao regime processual vigente, afigura-se-nos ser esta a interpretação que melhor reflecte a natureza da actividade do Juiz na apreciação e decisão do mérito das questões que lhe são colocadas, pois o juiz não se encontra vinculado às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas.
Resulta desta interpretação que a sentença não padece de nulidade porque não analisou um certo segmento jurídico que a parte apresentou, desde que fundadamente tenha analisado as questões colocadas e aplicado o direito.
No caso concreto, como resulta do pedido formulado pela Autora, não constitui objecto do litígio o direito da Autora à entrega da mercadoria, pois não formulou esse pedido, nem invocou qualquer fundamento para justificar tal pretensão.
A Autora visa com a presente acção tão só obter a indemnização dos prejuízos sofridos pelo facto da Ré não ter cumprido o acordo convencionado de transporte da mercadoria.
O juiz do tribunal “a quo” analisou a pretensão da Autora, ponderando os vários argumentos expostos pelas partes nos autos e não apreciou da obrigação da apelada proceder à entrega da mercadoria à apelante, porque não foi colocada tal questão no processo.
Conclui-se, assim, que o juiz analisou as questões que foram colocadas pela Autora e por isso, a sentença não enferma do vício apontado.-Constitui, ainda, fundamento de nulidade da sentença, nos termos do art. 668º/1 - e) CPC:

“(…) e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.”

Esta causa de nulidade da sentença é a resultante da violação da regra estabelecida no art. 661º/1 CPC sobre os limites da condenação, onde se determina:

“1. A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir.”

Esta norma traduz mais uma manifestação do princípio do dispositivo. Os tribunais são órgãos incumbidos de dirimir os conflitos reais formulados pelas partes, mas não constituem, no foro da jurisdição cível contenciosa, instrumentos de tutela ou curatela de nenhum dos litigantes. (Antunes Varela, ob. cit., pag. 675)
O juiz está limitado pelo pedido das partes e por isso, não pode, na sentença, pronunciar-se sobre mais do que foi pedido ou sobre coisa diversa daquela que foi pedida.
Pode acontecer que em acção de condenação, os factos provados, embora conduzam à condenação do réu, não permitem concretizar inteiramente a prestação devida.
Refere, a este respeito Lebre de Freitas que: “Tal pode acontecer tanto nos casos em que foi deduzido um pedido genérico / iliquido não subsequentemente liquidado como naqueles em que o pedido se apresenta determinado, mas os factos constitutivos da liquidação da obrigação não foram provados.” (“A Acção Declarativa Comum” à luz do Código Revisto, pag. 288).
Contudo, como observa o mesmo autor, o pedido ilíquido, não se confunde com obrigação ilíquida (ob. cit., pag. 35 – nota 8).
O pedido ilíquido respeita a um bem não concretamente determinado.
Na obrigação ilíquida, o objecto é sempre uma prestação cujo quantitativo não está ainda apurado. 
Nestas circunstâncias, a determinação do respectivo valor não está dependente de prévia liquidação, restando apenas proceder ao cálculo na sentença.
No caso concreto, em reconvenção, a Ré-apelada pediu a condenação da Autora no que se liquidar em execução de sentença. 
Transcreve-se, os fundamentos e pedido, para facilitar a compreensão da questão:
“(…)
21) A armazenagem sempre foi paga (como outros serviços no incluídos no acordo bianual antes dito) e a armazenagem é SEMPRE devida fora do aludido acordo bianual.
22) Até hoje é devida armazenagem por 91 semanas de acordo com o tarifário em vigor.
23) Não sabe a R. quando fará a entrega solicitada já que, até agora, continua a exercer o direito de retenção baseado falta de pagamento de armazenagem do período vencido, 
24) Sendo que apenas poderá computar tal valor quando efetivamente a mercadoria deixar de estar armazenada nas instalações da R.,
26) Calculando-se, então, o efetivo tempo e a quantia respectiva em débito.
27) Assim, atribui-se à reconvenção por ilíquida neste momento a quantia devida final o valor de €5.001, relegando-se para execução de sentença o cálculo certo.
Nestes termos, contestando ao mais ofensivo e aceitando-se o útil, deve a acção ser improcedente, procedente a RECONVENÇÃO, condenando-se a A. no valor que se vier a liquidar em execução de sentença.
Valor da Reconvenção:€5.001(cinco mil e um euros)
Valor da Acção:€ 18.161,30(dezoito mil cento e sessenta e um euros e trinta cêntimos).”
Na sentença, em sede de reconvenção, julgou-se procedente o pedido reconvencional e condenou-se a autora B…, S.A. a pagar à ré C…, Lda. a quantia de Eur. 8.473,08 (oito mil, quatrocentos e setenta e três euros e oito cêntimos).
Verifica-se, assim, que o juiz limitou-se a apreciar o pedido formulado, liquidando o valor devido, como contrapartida pelos serviços de armazenagem. A prestação ilíquida estava determinada, pois correspondia ao preço, cujo quantitativo não estava apurado, o qual seria calculado em função do tempo de armazenagem e tarifário praticado pela ré.
Desta forma, o valor apurado, está contido no pedido, pois a apelada em sede de reconvenção pretendia apenas o reembolso da quantia devida pelos serviços prestados de armazenagem, num determinado período temporal. 
O juíz do tribunal “a quo” limitou-se a proferir decisão ponderando os limites do pedido. 
Conclui, assim, que também não se verifica a nulidade suscitada e julgam-se improcedentes as conclusões de recurso sob as alíneas A) a D) e W) a Y).-- Da capacidade do sócio e procurador da sociedade para depor como testemunha -

Nas conclusões de recurso sob as alíneas E) a G) insurge-se o apelante contra o despacho interlocutório que admitiu a depor como testemunha F…, sócio da apelada, com poderes de representação da apelada. 
A apelada considera que tais circunstâncias não impedem a testemunha de depor nessa qualidade, porque não figura como legal representante da apelada.-Analisando.
A respeito da concreta questão o tribunal “ ad quem “ está impedido de conhecer do recurso, porque o mesmo é extemporâneo, operando-se o trânsito em julgado do despacho.
Em conformidade com o art. 691º/2 i) cabe recurso de apelação do despacho de admissão ou rejeição de meios de prova.
O prazo para interposição do recurso é de 15 dias, a contar da notificação do despacho, como determina o art. 691º-A /5 CPC.
Como refere Abrantes Geraldes: “a razão da integração de tais situações no leque das decisões passíveis de recurso autónomo liga-se à necessidade de atenuar os riscos de uma eventual inutilização do processado (…)” (Recursos em Processo Civil – Novo Regime, Almedina, 2ª ed., pag. 186).
A sujeição à regra geral – apreciação deferida, a final – potenciaria o risco de anulação do processado “ quer para produção de meios de prova rejeitados, quer para reformulação da decisão da matéria de facto proferida com base em meios de prova ilegalmente admitidos. (Abrantes Geraldes, ob. cit., pag. 186)
O despacho proferido que admitiu a depor como testemunha o sócio da ré, com poderes para representar a ré, era passível de recurso autónomo, por se tratar de um despacho de admissão de um meio de prova.
 Contudo, a apelante apenas veio reagir contra o despacho em sede de recurso da decisão final e quando já estava ultrapassado o prazo de 15 dias para o fazer.
O trânsito em julgado do despacho obsta ao conhecimento do objecto do recurso, nesta parte.
Improcedem, assim, as conclusões de recurso sob as alíneas E) a G).-- Reapreciação da decisão da matéria de facto, quanto ao concreto ponto 2 dos factos provados –

Nas conclusões de recurso sob as alíneas H) a S) veio a apelante impugnar a decisão da matéria de facto, em relação ao concreto ponto 2 da matéria de facto provada, por entender que o juiz do tribunal “a quo” não procedeu a uma correcta interpretação dos documentos juntos aos autos com a petição, atendendo apenas à prova testemunhal, sendo certo que do teor dos documentos resulta que no contrato celebrado entre as partes na modalidade “Pick & Pack” estavam incluídos os serviços de armazenagem.
A apelada defende que não estão reunidos os pressupostos para proceder à reapreciação da prova, em virtude de não haver registo da prova.-Analisando.
Nos termos do art. 712º/1 CPC a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação:

“a ) Se do processo constarem todos os elementos de prova, que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do art. 685º-B-b), a decisão com base neles proferida.
b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas;
c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.”

O art. 685º-B CPC estabelece os ónus a cargo do recorrente que impugna a decisão da matéria de facto, nos seguintes termos:

“1. Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Quais os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
2. No caso referido na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do nº2 do art. 522º-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição.
3. Na hipótese prevista no número anterior, incumbe ao recorrido, sem prejuízo dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, proceder, na contra-alegação que apresente, à indicação dos depoimentos gravados que infirmem as conclusões do recorrente, podendo, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição. 
(…)”

O art. 522º-C/2 CPC (na redacção do DL 303/2007 de 24/08) determina:

“Quando haja lugar a registo áudio ou vídeo, devem ser assinalados na acta o início e o termo da gravação de cada depoimento, informação ou esclarecimento, de forma a ser possível uma identificação precisa e separada dos mesmos.”

A consagração do duplo grau de jurisdição em matéria de facto, inicialmente prevista no DL 39/95 de 25/02, nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência - visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso.
A lei não consente por isso, como se afirma no preâmbulo do citado diploma que “o recorrente se limitasse a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo, pura e simplesmente, a reapreciação de toda a prova produzida em 1ª instância, manifestando genérica discordância com o decidido”.
Recai, assim, sobre o recorrente um ónus, sob pena de rejeição do recurso, de determinar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, motivar o seu recurso através da transcrição das passagens da gravação que reproduzem os meios de prova que, no seu entendimento, impunham decisão diversa sobre a matéria de facto.
No caso concreto, não estão reunidos os pressupostos de ordem formal para admitir a reapreciação da decisão da matéria de facto, sendo certo que não se verifica o obstáculo apontado pela apelada, pois a prova produzida em sede de audiência de julgamento foi objecto de gravação.
Com efeito, os demais elementos de prova que constam dos autos – prova documental -, nos quais o apelante funda a sua oposição, não permitem só por si, obter decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas ( art. 712º/ b) CPC ).
Como refere Abrantes Geraldes: “Abarcam-se neste segmento as situações em que constem do processo elementos que, por si só, determinem uma decisão diversa e cujo valor probatório seja insusceptível de ser afectado ou perturbado pela análise de outros meios probatórios, como ocorre quando o tribunal recorrido tenha desrespeitado a força probatória plena de certo meio de prova.” (Recursos em Processo Civil – Novo Regime, 2ª edição, pag. 274)
No caso concreto, os documento em causa, constituem documentos particulares, cuja apreciação está sujeita ao princípio da livre apreciação da prova e por isso, não fazem prova plena dos factos alegados, quando além do mais resulta do despacho que fundamentou a decisão, que a prova testemunhal se mostrou determinante para a apreciação dos factos, mas a prova documental que consta dos autos, foi igualmente atendida e devidamente interpretada para fundamentar a decisão, como se concluiu dos seguintes excertos do despacho:

“(…) O seu depoimento foi corroborado pelo teor dos documentos junto ao processo — dos quais resulta a facturação autónoma de armazenagem e que nos diversos tarifários acordados não está previsto o acto de armazenamento como integrando o contrato -, bem como pelo depoimento da testemunha E….
(…)
O tribunal teve também em consideração o teor dos documentos juntos ao processo, designadamente o documento junto a fis. 15 (que permite aferir a data em que a autora solicitou à ré a entrega do vestuário aludido no processo), os documentos de fis. 16 e 17 (que traduzem a quantia cujo pagamento foi exigido pela ré à autora, bem como os factos em que se fundamenta tal pedido), as facturas de fis. 18 e 19 (que retratam serviços prestados pela ré à autora, bem como a forma como os mesmos foram facturados), os documentos de fis. 20 e 54 (que permitem aferir os termos da correspondência trocada entre a autora e a ré) e a factura de fis. 21 e 22 (que alegadamente titula a venda dos fraques em apreço nos autos, mas cujo teor não foi corroborado por qualquer outro meio de prova).
Foram ainda ponderados os documentos juntos ao processo cautelar apenso, designadamente o documento junto a fls. 17 (que permite aferir as negociações entre a autora e a ré), os documentos de fis. 18 e 81 a 86 (que permitem ter a percepção dos serviços integrados no contrato e os respectivos preços parcelares), as facturas de fis. 37, 38, 75 a 80 (que retratam serviços prestados pela ré à autora, bem como a forma como os mesmos foram facturados) e os documentos de fis. 39 a 49 e 82 (que permitem aferir os termos da correspondência trocada entre a autora e a ré).
A matéria de facto não provada assentou na ausência de prova ou na falta de credibilidade da prova produzida.
Com efeito, não foi produzida qualquer prova credivel que permita afirmar que a operação de armazenagem dos fraques estivesse incluída nos acordos sazonais celebrados entre a autora e a ré.
Acresce que tal facto foi infirmado pelo teor das facturas juntas ao processo onde a armazenagem de peças de vestuário é facturada de forma autónoma e pelos preçários juntos ao processo, nos quais entre as várias operações discriminadas não é mencionada a armazenagem de peças de vestuário. (…)”

Constata-se, assim, que a apelante não indicou o concreto erro de julgamento, mais propriamente o documento ou depoimento testemunhal que não foi devidamente interpretado pelo juiz do tribunal “a quo”, quando além do mais nenhum dos documentos juntos com a petição faz prova plena dos factos, ou seja, não permitem concluir que a “armazenagem” estava incluída no contrato “Pick & Pack”.
Acresce que o recorrente não apresentou documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou (art. 712º/1/c ) CPC).
Conclui-se que não estão reunidos os pressupostos de ordem formal para admitir a reapreciação da decisão da matéria de facto, pelo que, se indefere tal pretensão.
Improcedem, desta forma, as conclusões de recurso sob as alíneas H) a S).-- O contrato celebrado entre Autora e Ré, na modalidade “Pick & Pack” engloba os serviços de “armazenamento” e indemnização dos prejuízos sofridos, na modalidade de danos patrimoniais -

Nas alíneas O) a S) e Z) das conclusões de recurso, a apelante para além de suscitar a reapreciação da decisão da matéria de facto, considera, ainda, que não é devida qualquer quantia a título de armazenagem e que lhe assiste o direito a ser indemnizada pelos danos patrimoniais sofridos.
Na sentença considerou-se, perante os factos provados, que o contrato celebrado entre Autora e Ré, não englobava os serviços de “armazenagem”, subordinado a um tarifário próprio. Considerou-se, de igual forma, que não assistia à Autora o direito à indemnização por danos patrimoniais, porque não se provaram os danos alegados.
Mantendo-se inalterada a decisão da matéria de facto e uma vez que a apelante não impugna os fundamentos de direito em que assentou a decisão, a questão suscitada fica prejudicada e nada mais cumpre apreciar a respeito do mérito da decisão. 
Improcedem, também por este motivo, as conclusões de recurso sob as alíneas O) a S) e Z).-- Valor devido a título de taxa de armazenamento -

Nas alíneas T) a V) das conclusões de recurso insurge-se a apelante contra a taxa aplicada pela apelada pelos serviços de armazenamento – € 0,50 -, por entender que a mesma não era devida, na data em que requereu o serviço de transporte. -Analisando.
 A questão que a apelante suscita, assenta em factos novos e que não foram oportunamente alegados pela Autora, nem pela Ré, nem resultam dos factos apurados em sede de julgamento e indicados na sentença.
O recurso, como refere Professor Castro Mendes, consiste no pedido de reponderação sobre certa decisão judicial, apresentada a um órgão judiciariamente superior ou por razões especiais que a lei permite fazer valer (Direito Processual Civil – Recursos, pag. 5).
O recurso ordinário (que nos importa analisar para a situação presente) não é uma nova instância, mas uma mera fase (eventualmente) daquela em que a decisão foi proferida.
O recurso é uma mera fase do mesmo processo e reporta-se à mesma relação jurídica processual ou instância (ob. cit, pag. 24-25 e Alberto dos Reis, Código de Processo Civil ”, vol V, pag. 382, 383).
A respeito do objecto do recurso têm surgido na doutrina duas posições:
- o objecto do recurso é a questão sobre que incidiu a decisão recorrida; e
- o objecto do recurso é a decisão recorrida, que se vai ver se foi aquela que “ex lege” devia ter sido proferida.
O Professor Castro Mendes escreve a este respeito que: “o nosso sistema de recursos inclina-se para a segunda solução – o objecto do recurso é a decisão. Dentro desta orientação tem a nossa jurisprudência repetidamente afirmado que os recursos visam modificar decisões e não criar soluções sobre matéria nova. 
(…) o tribunal de recurso vai reponderar a decisão tal como foi proferida. Em regra deve aplicar a lei vigente ao tempo da decisão e cingir-se aos factos sobre que esta incidiu. Mas esta regra sofre pelo menos duas atenuações:
- a parte pode apresentar ao tribunal de segunda instância e de revisão documentos supervenientes (art. 712º/1/c), 749º, 771º/c));
- as partes podem alterar, ainda em segunda instância, o pedido, de comum acordo (art. 272º CPC)”. (ob cit., pag. 25-26).
A respeito da alegação de factos novos refere expressamente o ilustre professor: “A invocação de factos novos parece só ser possível até ao encerramento da discussão em primeira instância (art. 506º/1, 663º/1 CPC).
Na jurisprudência entre outros sobre esta questão, podem ler-se: os Ac. STJ 07.07.2009, Ac. STJ 20.05.2009, Ac. STJ 28.05.2009, Ac. STJ 11.11.2003 (www, dgsi.pt), merecendo-nos particular relevo o Ac. STJ 28.05.2009 onde se refere:
“E, do específico ponto de vista da instância recursiva, tem-se por certo que, como é jurisprudência uniforme, sendo os recursos meios de impugnação das decisões judiciais, destinados à reapreciação ou reponderação das matérias anteriormente sujeitas à apreciação do tribunal a quo e não meios de renovação da causa através da apresentação de novos fundamentos de sustentação do pedido (matéria não anteriormente alegada) ou formulação de pedidos diferentes (não antes formulados), ou seja, visando os recursos apenas a modificação das decisões relativas a questões apreciadas pelo tribunal recorrido (confirmando-as, revogando-as ou anulando-as) e não criar decisões sobre matéria nova, salvo em sede de matéria indisponível, a novidade de uma questão, relativamente à anteriormente proposta e apreciada pelo tribunal recorrido, tem inerente a consequência de encontrar vedada a respectiva apreciação pelo Tribunal ad quem (art. 676º CPC).”
Ponderando o exposto a respeito do objecto do recurso, verifica-se que os factos que a apelante vem introduzir não podem ser considerados, pois constituem factos novos, já que em sede de resposta a Autora-apelante não os alegou. 
A Autora-apelante limitou-se a alegar que nada deve à R., estando todas as contas com esta devidamente regularizadas. Admitiu que a Ré comunicou em 19 de Agosto de 2011 à A. que a partir de 02 de Setembro passaria a ser cobrada uma taxa de € 0,50, por peça/semana, fazendo menção ao e-mail, a que se alude nas conclusões de recurso. Referiu, ainda, que a R. comunicou à A. a alteração das condições e preços até então vigentes, que consistiam no englobamento de todos os serviços, incluindo os de armazenagem no serviço de “Pick-Pack”. Alegou, ainda, que a R. comunicou à A. que deveria, em alternativa optar pela retirada desses artigos até à data indicado, 2-09-2011, ou aceitar o agravamento no respectivo custo.
Contudo, não questionou o valor apurado e debitado pela Ré, mais propriamente, que a Ré aplicou o novo tarifário a todo o período de armazenagem.
Se os novos factos resultaram da discussão da causa, recaía sobre as partes ao abrigo do art. 264º/3 CPC, suscitar junto do tribunal “a quo”, a sua consideração em sede de decisão, o que também não ocorreu. 
Conclui-se, assim, nos termos do art. 676º CPC, que nenhuma relevância merece, nesta sede, os factos “novos” e novos argumentos de sustentação da defesa da Autora, pois os mesmos não foram considerados na decisão objecto de recurso e ao tribunal de recurso apenas cumpre reapreciar as matérias anteriormente sujeitas à apreciação do tribunal “a quo” ficando por isso vedado a apreciação de novos fundamentos de sustentação do pedido (matéria não anteriormente alegada).
 Improcedem, desta forma, as conclusões de recurso sob as alíneas T) a V).-- Litigância de má-fé –

A apelada termina a resposta às alegações por pedir a condenação da Ré como litigante de má-fé, por considerar infundada a apelação.-Analisando.
A lei enuncia no art. 456º /2 CPC, as situações que qualifica como litigância de má-fé, considerando para esse efeito que litiga de má fé, quem:

“a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.” 

A lei especifica, assim, os comportamentos processuais susceptíveis de infringir os deveres de boa fé processual e de cooperação.
Os comportamentos processuais previstos no art. 456º/2 CPC passam a ser sancionados quer sejam dolosos, quer se devam a negligência grave da parte ou do seu representante ou mandatário, podendo por isso fundar-se em erro grosseiro ou culpa grave (Lopes do Rego “Comentários ao Código de Processo Civil”, pag. 308).
Na análise deste instituto cumpre ter presente o seu enquadramento e inserção no sistema, no sentido de conseguir conciliar a faculdade de usar dos meios judiciais para fazer valer os “supostos” direitos, com a responsabilidade por lide temerária.
Alberto dos Reis refere a este respeito:
“Dizemos “supostos”, porque nunca se pôs, nem poderia pôr, como condição para o exercício do direito de acção ou de defesa que o autor ou o réu seja realmente titular do direito substancial que se arroga. Seria, na verdade, absurdo que se enunciasse esta regra: só pode demandar ou defender-se em juízo “quem tem razão”; ou, por outras palavras, só é licito deduzir no tribunal pedidos ou contestações objectivamente fundados.
Só na altura em que o tribunal emite a sentença, é que vem a saber-se se a pretensão do autor é fundada, se a defesa do réu é conforme ao direito. De modo que exigir, como requisito prévio para a admissibilidade da acção ou da defesa, a demonstração da existência do direito substancial, equivalia, ou a cair numa petição de princípio, ou a fechar a porta a todos os interessados: aos que não têm razão e aos que a têm.
O Estado tem, pois, de abrir o pretório a toda a gente, tem de pôr os seus órgãos jurisdicionais à disposição de quem quer que se arrogue um direito, corresponda ou não a pretensão à verdade e à justiça.” (Código de Processo Civil- Anotado, vol.II, pag. 258-259).
E na análise do instituto, nas considerações gerais, refere ainda, com mais propriedade: “… uma coisa é o direito abstracto de acção ou de defesa, outra o direito concreto de exercer actividade processual. O primeiro não tem limites; é um direito inerente à personalidade humana. O segundo sofre limitações, impostas pela ordem jurídica; e uma das limitações traduz-se nesta exigência de ordem moral: é necessário que o litigante esteja de boa fé ou suponha ter razão.” (ob. cit., pag. 261).
Pedro de Albuquerque no seu estudo sobre litigância de má fé, salienta que: “A proibição de litigância de má fé apresenta-se, assim, como um instituto destinado a assegurar a moralidade e eficácia processual, porquanto com ela se reforça a soberania dos tribunais, o respeito pelas suas decisões e o prestígio da justiça. O dolo ou má fé processual não vicia vontades privadas nem ofende meramente interesses particulares das partes envolvidas. Também não se circunscreve a uma violação sem mais do dever geral de actuar de boa fé. A virtualidade específica da má fé processual é outra diversa e mais grave: a de transformar a irregularidade processual em erro ou irregularidade judicial. “ (Responsabilidade Processual por Litigância de Má Fé, Abuso de Direito e Responsabilidade Civil em Virtude de Actos Praticados no Processo, ed. Almedina, pag. 56).
A actual lei, como se referiu, passou a sancionar a litigância dolosa e a litigância temerária ou com negligência grave. 
A opção legislativa mostra-se justificada no preâmbulo da lei - DL 29-A/95 de 12/12 - onde se dispõe:
“Como reflexo e corolário do princípio da cooperação, consagra-se expressamente o dever de boa fé processual, sancionando-se como litigante de má fé a parte que, não apenas com dolo, mas com negligência grave, deduza pretensão ou oposição manifestamente infundadas, altere, por acção ou omissão, a verdade dos factos relevantes, pratique omissão indesculpável do dever de cooperação ou faça uso reprovável dos instrumentos adjectivos.”
Pedro de Albuquerque, salienta a este respeito, que: “a proibição de litigância de má fé assenta assim, de acordo com o preâmbulo, e na configuração que assume na lei actualmente em vigor, num princípio de natureza puramente processual: o princípio da cooperação que viria a ficar consignado no art. 266º CPC.” (ob.cit., pag. 51).
Os art. 456º e seg. do CPC apenas dizem respeito a ofensas cometidas no exercício da actividade processual a posições também elas processuais ou ao processo em si mesmo.
Trata-se de uma ilicitude baseada na violação de posições e deveres processuais que, a serem atingidos, geram de imediato uma ilicitude sancionável independentemente da existência ou lesão de qualquer ilícito de direito substantivo (Pedro de Albuquerque, ob. cit., pag. 52).
Lebre de Freitas, em comentário ao art. 456º CPC, considera a lide temerária: “ quando as regras de conduta conformes com a boa-fé são violadas, com culpa grave ou erro grosseiro e lide dolosa quando a violação é intencional ou consciente. A litigância temerária é mais do que a litigância imprudente, que se verifica quando a parte excede os limites da prudência normal, actuando culposamente, mas apenas com culpa leve, a qual só excepcionalmente é sancionada, como sucede no domínio particularmente sensível das providências cautelares (art. 390º CPC)” (Código de Processo Civil Anotado, pag. 194).
Na situação concreta, não se aponta à conduta da apelante, em sede de recurso, uma actuação susceptível de censura, porque violadora do princípio da boa-fé processual, pois limitou-se a impugnar os fundamentos da decisão, renovando parte dos argumentos que expôs nos articulados, fazendo uso dos meios e instrumentos que a lei lhe faculta para esse efeito. 
Não resulta dos factos apurados que a apelante agiu revelando saber do infundado da sua pretensão. O facto de não ser acolhida a posição que defende - apenas foi celebrado um contrato, que contempla os serviços de armazenagem -, não significa que a sua conduta processual seja susceptível de censura.
Desta forma, concluímos que não estão reunidos os pressupostos para condenar a apelante, com fundamento em litigância de má-fé.-Nos termos do art. 446º CPC as custas são suportadas:
- na apelação, pela apelante;
- no incidente de litigância de má-fé, pela apelada.-III. Decisão:
Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença.-Julgar improcedente o pedido de condenação da apelada, como litigante de má-fé.- Custas:
- da apelação a cargo da apelante; 
- do incidente de litigância de má-fé, a cargo da apelada.-Desentranhe e devolva ao apresentante-apelante os documentos juntos com as alegações.
Custas do incidente, a cargo do apresentante, fixando-se a taxa de justiça em € 60,00 (sessenta euro) – art. 543º/1 CPC e art. 27º/1/3 RCJ.*
*
*Porto, 04.03.2013
(processei e revi – art. 138º/5 CPC)
Ana Paula Pereira de Amorim
José Alfredo de Vasconcelos Soares de Oliveira
Ana Paula Vasques de Carvalho 
__________________
SUMÁRIO (art. 713°17 CPC):
I. Quando o objecto do recurso não se confina à apreciação de questões de direito e por outro lado, a omissão da indicação das disposições legais nas conclusões e motivação do recurso, não impediu o exercício do contraditório, por motivos de celeridade processual justifica-se dispensar a prolação de despacho de aperfeiçoamento (art. 266°/1 CPC). 
II. A sentença não conhece para além do pedido, quando estamos perante uma obrigação ilíquida e foi proferida decisão de condenação em quantia certa e determinada. 
III. Na obrigação ilíquida, o objecto é sempre uma prestação cujo quantitativo não está ainda apurado. Nestas circunstâncias, a determinação do respectivo valor não está dependente de prévia liquidação, restando apenas proceder ao cálculo na sentença. 
IV. Do despacho que admite um meio de prova, cabe recurso de apelação, com subida imediata, em separado e efeito meramente devolutivo (art. 691°/2 i) CPC), motivo pelo qual não constitui um recurso interlocutório e por isso, fica o tribunal impedido de conhecer do objecto do recurso nessa parte. 
V. Mantendo-se inalterada a decisão de facto e não se impugnando os fundamento de direito, ficam prejudicadas as questões suscitadas. 
VI. O tribunal de recurso tem por função reapreciar a decisão proferida em ia instância, pelo que, está impedido de apreciar novos e diferentes factos e fundamentos de sustentação do pedido — art. 676° CPC. 
VII. Na situação concreta, não se aponta à conduta da apelante, em sede de recurso, uma actuação susceptível de censura, porque violadora do princípio da boa-fé processual, pois limitou-se a impugnar os fundamentos da decisão, renovando parte dos argumentos que expôs nos articulados, fazendo uso dos meios e instrumentos que a lei lhe faculta para esse efeito. 

Ana Paula Pereira de Amorim

Depósito-6880-11.7TBMAI.P1-1348-12TRP Trib Jud Maia Proc. 6880/11.7TBMAI Proc. 1348/12 -TRP Recorrente: B…, SA Recorrido: C…, Lda-Juiz Desembargador Relator: Ana Paula Amorim Juízes Desembargadores Adjuntos: Soares Oliveira Ana Paula Carvalho * * * Acordam neste Tribunal da Relação do Porto (5ª secção – 3ª Cível) I. Relatório Na presente acção que segue a forma de processo sumário em que figuram como: - AUTORA: B…, S.A., com sede na Rua …, n.º . – ., em Lisboa; e - RÉ: C…, Lda., com sede na …, …, ..., na Maia, pede a Autora que a condenação da ré no pagamento da quantia de € 13.160,30. Alega, em síntese, que no âmbito da sua actividade, solicitou à ré que procedesse à recepção, classificação, armazenagem, selecção e subsequente entrega de mercadorias aos consumidores finais, mediante um valor global acordado entre as partes. No dia 25 de Agosto de 2011, solicitou o transporte de 262 fraques para um consumidor final, sendo que a ré se recusou a fazê-lo, invocando a existência de um saldo a seu favor e informando que ia reter as mercadorias até pagamento da quantia alegadamente em dívida. Durante a relação comercial existente, a ré nunca solicitou o pagamento de qualquer quantia a título de armazenagem, sendo que tal serviço estava incluído no contrato celebrado. Mais refere, que em consequência dessa retenção não pode satisfazer as encomendas da sua cliente, tendo perdido um negócio no montante de € 8.065,50. Dado o carácter sazonal da mercadoria por si comercializada, não poderá proceder no futuro à venda da mercadoria em apreço. Em resultado da conduta da ré, viu prejudicado o seu bom nome e a sua imagem comercial, considerando adequado para compensar o dano moram sofrido, a indemnização de € 5.000,00.-Citada a Ré contestou, defendendo-se por impugnação e por excepção, deduzindo pedido reconvencional. Para fundamentar a sua pretensão alegou, em síntese, que nos termos do contrato celebrado com a autora, cada operação por si realizada tinha um custo associado, sendo que a armazenagem era negociada caso a caso. Só depois de comunicar à autora a alteração do tarifário de armazenagem, aquela veio pedir a entrega dos fraques a um pretenso cliente. A autora não articulou factos que pudessem consubstanciar responsabilidade civil da sua parte. Refere, ainda, que a armazenagem sempre foi paga fora do acordo estabelecido entre ambas, sendo que a ré mantém em dívida a armazenagem de mercadoria pelo período de noventa e uma semanas, de acordo com o tarifário em vigor. Alegou, por fim, não saber quando fará a entrega solicitada já que, até agora, continua a exercer o direito de retenção baseado na falta de pagamento de armazenagem do período vencido, sendo que apenas poderá computar tal valor quando efectivamente a mercadoria deixar de estar armazenada nas instalações da Ré, calculando-se, então, o efectivo tempo e a quantia respectiva em débito. Concluiu, por atribuir à reconvenção, por ilíquida a quantia devida a final, o valor de € 5.001,00, relegando-se para execução de sentença o cálculo certo. Em reconvenção pede a condenação da Autora no valor que se vier a liquidar em execução de sentença.-Na resposta à contestação a Autora manteve a posição inicial e impugnou a matéria da reconvenção, pedindo a condenação da ré como litigante de má-fé.-Proferiu-se despacho saneador e seleccionou-se a matéria de facto assente e a provar, despacho do qual não coube reclamação. -Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, proferindo-se o despacho que contém as respostas à matéria de facto. -Proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve: “Pelo exposto, decide-se julgar improcedente a presente acção e, em consequência, absolve-se a ré C…, Lda. do pedido contra si dirigido nestes autos pela autora B…, S.A.. Mais se decide julgar parcialmente procedente o pedido reconvencional e, em consequência, condena-se a autora B…, S.A. a pagar à ré C…, Lda. a quantia de Eur. 8.473,08 (oito mil, quatrocentos e setenta e três euros e oito cêntimos). Julga-se improcedente o pedido formulado pela autora de condenação da ré como litigante de má-fé, absolvendo esta do pedido contra si formulado a esse propósito. Custas da acção pela autora, nos termos do artigo 446º do CPC. Custas do pedido reconvencional pela autora e pela ré, na proporção de 90% para a primeira e de 10% para a segunda, nos termos do artigo 446º do CPC.”-A Autora B…, SA veio interpor recurso da sentença. -Nas alegações que apresentou a recorrente formulou as seguintes conclusões: A - A Apelante intentou em 21 de Outubro de 2011 Acção Declarativa de Condenação, com Processo Comum na Forma Sumária contra a ora Apelada, peticionando a condenação desta no pagamento da quantia de €13.160,30 (treze mil, cento e sessenta euros e trinta cêntimos); B. - Vindo a Apelada Contestar tal acção, deduzindo pedido Reconvencional contra a Apelante, no montante de €5.001,00 (cinco mil e um euros); C. - Vem o Tribunal a Quo condenar a Apelante ao pagamento à Apelada a quantia de €8.473,00 (oito mil, quatrocentos e setenta e três euros) por (…)”julgar parcialmente procedente o pedido reconvencional”(…)!?!?!?!?!?!; D. - Mesmo admitindo que a Apelante devia qualquer quantia à Apelada, o que apenas academicamente se concebe, NUNCA poderia o Tribunal a Quo condenar a Apelante em quantia superior à peticionada pela Apelada, como fez; E. - Mais se faça notar, que a Apelada apresentou Testemunha que consta da Certidão do Registo Comercial como Sócio, cfr. Doc 1 que se junta e se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos. F. - A Apelante reagiu, a este arrolamento, sem sucesso, pois, veio a Apelada apresentar Procuração que atesta ser este apenas seu Procurador, Cfr. Doc.2; G. - O Meritíssimo Juiz do Tribunal a Quo, mesmo contra o registo constante da Competente Conservatória, admitiu o que, no entender da Apelante, configura Depoimento de parte!!; H. - Sem prescindir e por mera cautela de patrocínio sempre se dirá em súmula, que a aqui Apelante, peticionou a Condenação da Apelada ao pagamento das quantias de €8.065,50, a título de responsabilidade civil contratual (Danos Patrimoniais) e €5.000,00 pelos danos não patrimoniais directamente causados pela Apelada; I. - Os danos patrimoniais da Apelante, resultam, como alegado em sede própria, do incumprimento do contrato celebrado com a Apelada (“Pick & Pack”), no qual, mediante o pagamento de preço, acordado pelas partes, a Apelada se obrigava a prestar os serviços de recepção de mercadorias propriedade da Apelante, sua classificação, armazenagem, selecção dos diferentes itens a entregar ao diferentes clientes finais da Apelante e o transporte dos mesmos aos sobreditos clientes finais; J. - O Meritíssimo Tribunal a Quo considerou provado quanto se alegou, cfr. facto 2. da Matéria de Facto provada naquela Douta Sentença; K.- No âmbito do contrato vigente entre Apelante e Apelada, veio aquela solicitar no 25 de Agosto de 2011, à Apelada, a entrega a cliente final de 262 fraques, cfr. Doc. 1 que se juntou com aquele articulado; L. - A Apelada, recusou tal ordem da Apelante, invocando existir um saldo devedor a seu favor do montante de €12.150,18, o que lhe conferia um “direito de retenção” das mercadorias propriedade da Apelante; M. - Tais quantias que a Apelada alegou serem devidas pela Apelante, resultavam, de custos de armazenamento das mercadorias propriedade da Apelante, como se o contrato vigente entre as partes desde o ano 2000 e até à data em que a Apelante solicitou a entrega das mercadorias a um seu cliente final, não compreendesse a globalidade dos serviços supra referidos e, antes, fossem devidos pela Apelante montantes parciais para cada um dos mesmos! N. - A Apelante, naquele articulado, apresentou prova documental bastante para provar sem margem para qualquer dúvida, que do acordo celebrado entre as aqui Apelante e Apelada “Pick & Pack”, a Apelada prestaria todos os serviços compreendidos no mesmo, contra o pagamento do preço acordado; O. - O Tribunal a Quo, fazendo “tábua rasa” da prova apresentada, firmando a sua convicção exclusivamente na prova testemunhal, veio a considerar que efectivamente a Apelante devia à Apelada o valor daquela parcela do serviço, ou seja, devia uns quaisquer valores que a Apelada arremessou na sua Contestação; P. - A Apelada veio apresentar Contestação à P.I. da Apelante, na qual alega que desde o inicio da vigência do Acordo de “Pick & Pack” celebrado com a Apelante, nunca esta tinha procedido ao pagamento de serviços por esta prestados, pelo que se recusava a entregar as mercadorias propriedade da Apelante a cliente final, fazendo a sua retenção, em razão de tais serviços nunca pagos; Q. - Ora a Apelada, alega serem devidas quantias pela Apelante, por serviços prestados, fora do contrato entre ambos celebrado e que vigorou por mais de dez anos, nomeadamente por agora acrescerem (…)”a estes trabalhos muitos outros solicitados pela A. como empacotamento, refrescar os artigos, passá-los a ferro etc.”; R. - Não pode a Apelante compreender então, porque não emitiu a Apelada quaisquer facturas à Apelante por esses serviços prestados; S. - A razão é simples, a Apelada não prestou nunca quaisquer outros serviços para além dos que se encontram vertidos na P.I., tendo cumprido até à ultima solicitação da Apelante, o acordo/contrato de “Pick & Pack” até então em vigor entre ambas e que, como se alegou incluía serviços de recepção de mercadorias propriedade da Apelante, sua classificação, armazenagem, selecção dos diferentes itens a entregar ao diferentes clientes finais da Apelante e o transporte dos mesmos aos sobreditos clientes finais; T. - A Apelada veio informar a Apelante por email datado de 19 de Agosto de 2011 que (…)”a partir de 02 de Setembro próximo não podem manter armazenados os V/ artigos da lista attach, nas condições actuais de custo, por necessidade de transferência do espaço físico consignado”; U. - E continua “Podem V. Exas., optar pela retirada desses artigos até à data indicada. 2-09-2011, ou optarem pelo agravamento no respectivo custo que passará a ser de € 0,50 / peça – semana”, cfr. Doc. 7 junto com a P.I.; V. - Ora a Apelante solicitou a entrega das mercadorias, in casu, 262 fraques, à Apelante no dia 25 de Agosto de 2011 ou seja SETE dias antes do prazo a partir do qual a Apelada passaria a cobrar esta nova taxa, pelo que não poderia nunca aplicar, como fez, à Apelante esta “nova taxa” de armazenamento; W. - A Douta decisão do Tribunal a Quo, finda por nem sequer esclarecer se a Apelada fica obrigada à entrega à Apelante das mercadorias de sua propriedade; Y. - A Douta Sentença do Tribunal a Quo, deveria ter condenado a Apelada à entrega imediata das mercadorias à Apelante, ressarcindo-a do negócio que perdeu pelo alegado direito de retenção invocado e alegado em sede de Contestação; Z. - Mesmo que não se considerassem os danos não patrimoniais sofridos pela Apelante em resultado da conduta da Apelada, sempre se deveria atender aos danos patrimoniais, condenando-se a ora Apelada ao pagamento da quantia de € 8.065,50 (oito mil e sessenta e cinco euros e cinquenta cêntimos). “ Termina as alegações por pedir a revogação da sentença, quanto à condenação no pedido reconvencional e do despacho que admitiu o depoimento da testemunha, condenando-se à contrario a Apelada ao pagamento à Apelante de todas as quantias constantes da sua Petição Inicial e ainda, à entrega imediata das mercadorias de sua propriedade. -A Ré veio apresentar contra-alegações nas quais formulou as seguintes conclusões: “I) A douta sentença recorrida aplicou correctamente o art.661 nº2 in fine ao condenar em montante pedido e apurado até porque articulado e líquido. (decaído parcialmente). II) O valor processual atribuído à Reconvenção de €5.001 destina-se à parte ilíquida a apurar em execução de sentença que computará o valor devido até à entrega dos fraques (que ainda se encontrarem no armazém da recorrida a gerar custos para a recorrente). III) O sócio de uma sociedade por quotas pode depor como testemunha por não existir impedimento (art.617 do CPC a contrario). IV) Não havendo registo da prova a mesma e a matéria de facto inerente não são susceptíveis de reapreciação pelo Tribunal ad quem. (de entre outros, art.685-B do CPC). V) As CONCLUSÕES da Recorrente violam o disposto no art.685-A do CPC. VI) A junção de documentos, aliás já no processo em 1ª instância, viola o disposto no art.693B,art. 524 e ainda alíneas a) a g), i) a n) do nº2 do art.691 do CPC e VII) Deve, por isso, ser condenada em multa pela prática de acto proibido. VIII) Litiga com má-fé devendo ser condenada pesadamente por tal.” Termina por pedir que não se conceda provimento ao recurso.-O recurso foi admitido como recurso de apelação.-Dispensaram-se os vistos legais.-Cumpre apreciar e decidir.-II. Fundamentação 1. Delimitação do objecto do recurso O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso – art. 685º- A CPC. As questões a decidir: - da omissão de normas legais nas conclusões de recurso; - admissibilidade dos documentos juntos em sede de alegações de recurso; - nulidade da sentença, por condenação em quantia superior ao valor do pedido reconvencional e omissão de pronúncia a respeito da entrega das mercadorias; - se o sócio e procurador da sociedade é inábil para depor como testemunha; - reapreciação da decisão da matéria de facto, quanto ao concreto ponto 2 dos factos provados; - se o contrato celebrado entre Autora e Ré, na modalidade “Pick & Pack” engloba os serviços de “armazenamento” e indemnização a título de danos morais, por incumprimento do contrato; - valor devido a título de taxa de armazenamento; - condenação da apelante como litigante de má-fé.-2. Os factos Com relevância para a apreciação das conclusões de recurso cumpre ter presente os seguintes factos provados no tribunal da primeira instância: 1 - A autora dedica-se à comercialização de diferentes tipos de vestuário, sendo a sua actividade maioritariamente exercida na qualidade de grossista. – alínea a) dos factos assentes. 2 - No decurso do ano de 2000, a autora e a ré celebraram um acordo, mediante o qual a primeira solicitou à segunda a prestação de serviços de recepção de mercadoria, sua classificação, selecção dos diferentes itens a entregar aos diversos clientes finais e consequente transporte dos mesmos. – resposta ao quesito n.º 1 da base instrutória. 3 - No âmbito do acordo celebrado entre a autora e a ré, cada uma das operações de transporte, armazenagem e embalagem tinha um custo associado parcelar. – resposta ao quesito n.º 17 da base instrutória. 4 - O acordo entre a autora e a ré assumia um carácter sazonal, ocorrendo duas vezes por ano, aquando das colecções Outono/Inverno e Primavera/Verão. – resposta ao quesito n.º 18 da base instrutória. 5 - Tendo um tarifário combinado para cada estação. – resposta ao quesito n.º 19 da base instrutória. 6 - Sendo que para os demais serviços, nomeadamente a armazenagem, o tarifário era negociado caso a caso. – resposta ao quesito n.º 20 da base instrutória. 7 - A ré remeteu à autora, que o recebeu, o documento junto a fls. 20 dos autos, datado de 19 de Agosto de 2011, cujo teor se dá por reproduzido. – alínea d) dos factos assentes. 8 - A autora recusou a proposta efectuada no documento mencionado em D). – resposta ao quesito n.º 7 da base instrutória. 9 - No dia 25 de Agosto de 2011, a autora solicitou à ré o transporte de 262 fraques para um seu consumidor final, conforme documento junto a fls. 15 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido. – alínea b) dos factos assentes. 10 - A ré remeteu à autora, que o recebeu, o documento junto a fls. 17 dos autos, datado de 29/8/2011, cujo teor se dá por reproduzido, e mediante o qual comunicou que “os serviços solicitados no v/ fax de hoje terão um custo a ser suportado por V. Exas. no montante de €15.305,68 (…) como alias é do v/ conhecimento. Assim, para proceder conforme v/ solicitação, deverá ser-nos entregue a quantia de 16.151,52 até ao referido dia um de Setembro 2011 (…) Dá-se conta a V. Exas. que, na falta de pagamento do valor e na data mencionados, desde já passará naquela data a ser exercido o direito de retenção sobre a V/ mercadoria em depósito nos n/ armazéns para garantia do n/ crédito”. – alínea c) dos factos assentes. 11 - Nas circunstâncias aludidas em B), a ré recusou proceder à entrega solicitada, alegando que existia um saldo devedor a seu favor, no montante de Eur. 12.150,18. – resposta ao quesito n.º 3 da base instrutória. 12 - Tendo informado a autora que por esse motivo iria reter as mercadorias armazenadas nas suas instalações até ao pagamento da quantia mencionada em 3). – resposta ao quesito n.º 4 da base instrutória. 13 - Nas circunstâncias aludidas em B), a autora pediu a entrega dos fraques a um cliente, pelo preço unitário de Eur. 25,00. – resposta ao quesito n.º 21 da base instrutória. 14 - Tendo tal sucedido depois de a ré lhe ter comunicado as alterações de tarifário de armazenagem. – resposta ao quesito n.º 22 da base instrutória. 15 - Os fraques produzidos pela autora são vendidos no D… a Eur. 400,00 a unidade. – resposta ao quesito n.º 23 da base instrutória. 16 - Os fraques aludidos em B) estão na posse da ré desde 22 de Março de 2010. – resposta ao quesito n.º 24 da base instrutória. 17 - Tendo sido convencionado entre a autora e a ré que aquela pagaria pela armazenagem de cada um a quantia semanal de Eur. 0,42. – resposta ao quesito n.º 25 da base instrutória. 18 - Por referência ao transporte e entrega de mercadorias pertencentes à autora, a ré emitiu em nome daquela as facturas juntas a fls. 18 e 19 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido. – resposta ao quesito n.º 5 da base instrutória. 19 - As marcas de vestuário, em razão da constante mudança das tendências da moda, alteram as suas colecções anualmente, apresentando novas colecções. – resposta ao quesito n.º 12 da base instrutória.-3. O direito - Da omissão de normas legais nas conclusões de recurso – A apelada no ponto V das conclusões, na resposta às alegações, considera que as conclusões de recurso da apelante violam o disposto no art. 685º-A CPC, pois não enunciam as normas jurídicas violadas ou os fundamentos jurídicos da pretensão do apelante. Decorre do art. 685º-A CPC que o recorrente tem o ónus de alegar e formular conclusões, sendo certo que, quando o recurso versa sobre questões de direito, deve indicar: as normas jurídicas violadas, o sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada. Quando o recorrente não tenha procedido a estas especificações, deve o relator proferir despacho de convite ao aperfeiçoamento, com a cominação de rejeição das conclusões nessa parte (art. 685º-A /3 CPC). No caso concreto, constata-se que tanto nas conclusões, como na motivação de recurso, a apelante não indicou as normas jurídicas em que funda a sua pretensão, ou que foram indevidamente aplicadas pelo juiz do tribunal “a quo”. Contudo, o objecto do recurso não se confina à apreciação de questões de direito e por outro lado, a omissão desta formalidade não impediu o exercício do contraditório pela apelada, que bem compreendeu o alcance da impugnação. Acresce que o despacho de aperfeiçoamento não está coberto pela força do caso julgado, nem se esgotam com a sua prolação os poderes do juiz na apreciação da situação e dos efeitos que devem ser determinados, o que significa, que mesmo que a parte não responda ao convite, pode justificar-se não aplicar a cominação e conhecer do objecto do recurso (neste sentido Abrantes Geraldes “Recursos em Processo Civil – Novo Regime”, pag. 130-131) Desta forma, por razões de celeridade processual, ao abrigo do art. 266º/1 CPC, opta-se por não proferir despacho de aperfeiçoamento, passando a apreciar-se das demais questões suscitadas nas conclusões da apelante.-- Admissibilidade dos documentos juntos em sede de alegações de recurso - A apelante juntou com as alegações de recurso dois documentos: uma procuração e uma certidão de matrícula da apelada. A apelada insurge-se quanto à admissibilidade dos documentos, pois os mesmos já constam dos autos, uma vez que foram juntos em sede de audiência de julgamento.-Cumpre pois decidir. A junção de documentos em sede de recurso está subordinada ao critério estabelecido no art. 693º-B CPC, no qual se determina: “1.As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excepcionais a que se refere o art. 524º, no caso de a junção apenas se tornar necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª instância e nos casos previstos nas alíneas a) a g) e i) a n) do nº2 do art. 691º.” Decorre deste regime que em sede de recurso, nas alegações, as partes podem juntar documentos, quando: - a sua apresentação não tenha sido possível até esse momento – superveniência objectiva ou subjectiva; - se destinem a provar factos posteriores ou cuja apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior ao julgamento em 1ª instância; - se tenha revelado necessária por virtude do julgamento proferido, maxime quando esta se revele de todo surpreendente relativamente ao que seria expectável em face dos elementos já constantes do processo; - se trate de reapreciar a questão da competência absoluta ou relativa, justificar por que razão determinado meio de prova deve ser admitido ou a contrariar os fundamentos de facto que levaram o juiz a quo a conceder ou rejeitar a providência cautelar.(Abrantes Geraldes “Recursos em Processo Civil – Novo Regime”, pag. 228) No caso em análise a apelante não indica o motivo pelo qual requereu a junção dos documentos com as alegações, sendo certo que constituem documentos que já constam dos autos e foram juntos na fase de julgamento, na sequência do incidente suscitado sobre a inabilidade da testemunha. O presente recurso não tem por objecto a impugnação de decisões previstas nas alíneas a) a g) e i) a n) do nº2 do art. 691º CPC. Analisados os documentos em confronto com os fundamentos do requerimento em que foi suscitado o incidente e com o teor do despacho proferido em 1ª instância, resulta que o despacho não veio invocar novos e diferentes argumentos. Como refere Amâncio Ferreira, a junção de documentos em sede de alegações face ao julgamento proferido em 1ª instância, “funda-se no imprevisto da decisão proferida, quer por razões de direito quer por razões de prova (…)” (Manual dos Recursos em Processo Civil, 9º ed., pag. 215). No caso presente a decisão proferida não se funda em normas jurídicas com cuja aplicação a parte não contava, nem a junção de novo de cópia dos documentos, como meio de prova pode contribuir para apurar factos diferentes daqueles que se mostram provados, com relevância na decisão final e que não foram atendidos por omissão de prova documental. Conclui-se, assim, que atento o critério previsto no art. 693º-B CPC carece de fundamento legal e não se mostra pertinente a requerida junção dos documentos, pelo que ao abrigo do art. 700º/1 e) CPC, rejeita-se a junção dos documentos, os quais devem ser desentranhados e entregues ao apresentante. O acto praticado porque configura um incidente, será tributado com custas a cargo do apelante, nos termos do art. 543º/1 CPC e art. 27º/1/3 RCJ. -- Nulidade da sentença, por condenação em quantia superior ao valor do pedido reconvencional e omissão de pronúncia, a respeito da entrega das mercadorias - Nas conclusões de recurso, sob as alínea A) a D), suscita a apelante a questão do conhecimento para além do pedido, na medida em que o juiz do tribunal “a quo” condenou a apelante no pagamento à apelada da quantia de € 8.473,00, quando no pedido reconvencional a apelada pediu a condenação da apelante na quantia de € 5.001,00. Nas conclusões de recurso sob as alíneas W) e Y) refere, ainda, a apelante que a sentença devia ter condenado a apelada na entrega imediata das mercadorias, o que omitiu. A apelada defende que a sentença não conheceu para além do pedido, porque o juiz do tribunal “a quo” limitou-se a aplicar o regime previsto no art. 661º/2 CPC.-Analisando. As nulidades da sentença enquadram-se nos “vícios de limites”, na medida em que face ao regime do art. 668º CPC a sentença não contém tudo o que devia, ou contém mais do que devia. (Professor Castro Mendes “Direito Processual Civil”, pag. 308) Daqui resulta que não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário, pois apenas se curou das causas de nulidade da sentença, deixando de lado os casos a que a doutrina tem chamado de inexistência da sentença. (Professor Antunes Varela “Manual de Processo Civil, pag. 686) Nos termos do art. 668º 1 / d) CPC a sentença é nula: “d) Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”. O vício em causa está relacionado com a norma que disciplina a “ordem de julgamento” – art. 660º/2 CPC. Com efeito, resulta do regime previsto neste preceito, que o juiz na sentença: “deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.” A respeito do conceito “questões que devesse apreciar” refere o Professor Anselmo de Castro que deve “ser entendida em sentido amplo: envolverá tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das excepções e da causa de pedir (melhor, à fundabilidade ou infundabilidade dumas e doutras) e ás controvérsias que as partes sobre elas suscitem. Esta causa de nulidade completa e integra, assim, de certo modo, a da nulidade por falta de fundamentação. Não basta à regularidade da sentença a fundamentação própria que contiver; importa que trate e aprecie a fundamentação jurídica dada pelas partes. Quer-se que o contraditório propiciado ás partes sob os aspectos jurídicos da causa não deixe de encontrar a devida expressão e resposta na decisão.” (“Direito Processual Civil Declaratório”, vol. III, pag. 142). Lebre de Freitas por sua vez tem a respeito de tal matéria uma visão algo distinta, pois considera que devendo: “o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (art. 660º/2), o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes da da sentença, que as partes hajam invocado.” (ob. cit., pag.670) Para melhor precisar o seu entendimento remete para o estudo do Professor Alberto dos Reis cuja passagem se transcreve: “Resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação “não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito (art. 511º/1), as partes tenham deduzido ou o próprio juiz possa inicialmente ter admitido: por um lado, através da prova, foi feita a triagem entre as soluções que deixaram de poder ser consideradas e aquelas a que a discussão jurídica ficou reduzida; por outro lado, o juiz não está sujeito às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas (art. 664º) e, uma vez motivadamente tomada determinada orientação, as restantes que as partes hajam defendido, nomeadamente nas suas alegações de direito, não têm de ser separadamente analisadas.” (Alberto do Reis “CPC Anotado”, vol. V, pag. 143). No mesmo sentido pode ainda ler-se o Professor Antunes Varela na obra já citada (pag. 688). Seguindo os ensinamentos de Alberto dos Reis e de Lebre de Freitas, atendendo ao regime processual vigente, afigura-se-nos ser esta a interpretação que melhor reflecte a natureza da actividade do Juiz na apreciação e decisão do mérito das questões que lhe são colocadas, pois o juiz não se encontra vinculado às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas. Resulta desta interpretação que a sentença não padece de nulidade porque não analisou um certo segmento jurídico que a parte apresentou, desde que fundadamente tenha analisado as questões colocadas e aplicado o direito. No caso concreto, como resulta do pedido formulado pela Autora, não constitui objecto do litígio o direito da Autora à entrega da mercadoria, pois não formulou esse pedido, nem invocou qualquer fundamento para justificar tal pretensão. A Autora visa com a presente acção tão só obter a indemnização dos prejuízos sofridos pelo facto da Ré não ter cumprido o acordo convencionado de transporte da mercadoria. O juiz do tribunal “a quo” analisou a pretensão da Autora, ponderando os vários argumentos expostos pelas partes nos autos e não apreciou da obrigação da apelada proceder à entrega da mercadoria à apelante, porque não foi colocada tal questão no processo. Conclui-se, assim, que o juiz analisou as questões que foram colocadas pela Autora e por isso, a sentença não enferma do vício apontado.-Constitui, ainda, fundamento de nulidade da sentença, nos termos do art. 668º/1 - e) CPC: “(…) e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.” Esta causa de nulidade da sentença é a resultante da violação da regra estabelecida no art. 661º/1 CPC sobre os limites da condenação, onde se determina: “1. A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir.” Esta norma traduz mais uma manifestação do princípio do dispositivo. Os tribunais são órgãos incumbidos de dirimir os conflitos reais formulados pelas partes, mas não constituem, no foro da jurisdição cível contenciosa, instrumentos de tutela ou curatela de nenhum dos litigantes. (Antunes Varela, ob. cit., pag. 675) O juiz está limitado pelo pedido das partes e por isso, não pode, na sentença, pronunciar-se sobre mais do que foi pedido ou sobre coisa diversa daquela que foi pedida. Pode acontecer que em acção de condenação, os factos provados, embora conduzam à condenação do réu, não permitem concretizar inteiramente a prestação devida. Refere, a este respeito Lebre de Freitas que: “Tal pode acontecer tanto nos casos em que foi deduzido um pedido genérico / iliquido não subsequentemente liquidado como naqueles em que o pedido se apresenta determinado, mas os factos constitutivos da liquidação da obrigação não foram provados.” (“A Acção Declarativa Comum” à luz do Código Revisto, pag. 288). Contudo, como observa o mesmo autor, o pedido ilíquido, não se confunde com obrigação ilíquida (ob. cit., pag. 35 – nota 8). O pedido ilíquido respeita a um bem não concretamente determinado. Na obrigação ilíquida, o objecto é sempre uma prestação cujo quantitativo não está ainda apurado. Nestas circunstâncias, a determinação do respectivo valor não está dependente de prévia liquidação, restando apenas proceder ao cálculo na sentença. No caso concreto, em reconvenção, a Ré-apelada pediu a condenação da Autora no que se liquidar em execução de sentença. Transcreve-se, os fundamentos e pedido, para facilitar a compreensão da questão: “(…) 21) A armazenagem sempre foi paga (como outros serviços no incluídos no acordo bianual antes dito) e a armazenagem é SEMPRE devida fora do aludido acordo bianual. 22) Até hoje é devida armazenagem por 91 semanas de acordo com o tarifário em vigor. 23) Não sabe a R. quando fará a entrega solicitada já que, até agora, continua a exercer o direito de retenção baseado falta de pagamento de armazenagem do período vencido, 24) Sendo que apenas poderá computar tal valor quando efetivamente a mercadoria deixar de estar armazenada nas instalações da R., 26) Calculando-se, então, o efetivo tempo e a quantia respectiva em débito. 27) Assim, atribui-se à reconvenção por ilíquida neste momento a quantia devida final o valor de €5.001, relegando-se para execução de sentença o cálculo certo. Nestes termos, contestando ao mais ofensivo e aceitando-se o útil, deve a acção ser improcedente, procedente a RECONVENÇÃO, condenando-se a A. no valor que se vier a liquidar em execução de sentença. Valor da Reconvenção:€5.001(cinco mil e um euros) Valor da Acção:€ 18.161,30(dezoito mil cento e sessenta e um euros e trinta cêntimos).” Na sentença, em sede de reconvenção, julgou-se procedente o pedido reconvencional e condenou-se a autora B…, S.A. a pagar à ré C…, Lda. a quantia de Eur. 8.473,08 (oito mil, quatrocentos e setenta e três euros e oito cêntimos). Verifica-se, assim, que o juiz limitou-se a apreciar o pedido formulado, liquidando o valor devido, como contrapartida pelos serviços de armazenagem. A prestação ilíquida estava determinada, pois correspondia ao preço, cujo quantitativo não estava apurado, o qual seria calculado em função do tempo de armazenagem e tarifário praticado pela ré. Desta forma, o valor apurado, está contido no pedido, pois a apelada em sede de reconvenção pretendia apenas o reembolso da quantia devida pelos serviços prestados de armazenagem, num determinado período temporal. O juíz do tribunal “a quo” limitou-se a proferir decisão ponderando os limites do pedido. Conclui, assim, que também não se verifica a nulidade suscitada e julgam-se improcedentes as conclusões de recurso sob as alíneas A) a D) e W) a Y).-- Da capacidade do sócio e procurador da sociedade para depor como testemunha - Nas conclusões de recurso sob as alíneas E) a G) insurge-se o apelante contra o despacho interlocutório que admitiu a depor como testemunha F…, sócio da apelada, com poderes de representação da apelada. A apelada considera que tais circunstâncias não impedem a testemunha de depor nessa qualidade, porque não figura como legal representante da apelada.-Analisando. A respeito da concreta questão o tribunal “ ad quem “ está impedido de conhecer do recurso, porque o mesmo é extemporâneo, operando-se o trânsito em julgado do despacho. Em conformidade com o art. 691º/2 i) cabe recurso de apelação do despacho de admissão ou rejeição de meios de prova. O prazo para interposição do recurso é de 15 dias, a contar da notificação do despacho, como determina o art. 691º-A /5 CPC. Como refere Abrantes Geraldes: “a razão da integração de tais situações no leque das decisões passíveis de recurso autónomo liga-se à necessidade de atenuar os riscos de uma eventual inutilização do processado (…)” (Recursos em Processo Civil – Novo Regime, Almedina, 2ª ed., pag. 186). A sujeição à regra geral – apreciação deferida, a final – potenciaria o risco de anulação do processado “ quer para produção de meios de prova rejeitados, quer para reformulação da decisão da matéria de facto proferida com base em meios de prova ilegalmente admitidos. (Abrantes Geraldes, ob. cit., pag. 186) O despacho proferido que admitiu a depor como testemunha o sócio da ré, com poderes para representar a ré, era passível de recurso autónomo, por se tratar de um despacho de admissão de um meio de prova. Contudo, a apelante apenas veio reagir contra o despacho em sede de recurso da decisão final e quando já estava ultrapassado o prazo de 15 dias para o fazer. O trânsito em julgado do despacho obsta ao conhecimento do objecto do recurso, nesta parte. Improcedem, assim, as conclusões de recurso sob as alíneas E) a G).-- Reapreciação da decisão da matéria de facto, quanto ao concreto ponto 2 dos factos provados – Nas conclusões de recurso sob as alíneas H) a S) veio a apelante impugnar a decisão da matéria de facto, em relação ao concreto ponto 2 da matéria de facto provada, por entender que o juiz do tribunal “a quo” não procedeu a uma correcta interpretação dos documentos juntos aos autos com a petição, atendendo apenas à prova testemunhal, sendo certo que do teor dos documentos resulta que no contrato celebrado entre as partes na modalidade “Pick & Pack” estavam incluídos os serviços de armazenagem. A apelada defende que não estão reunidos os pressupostos para proceder à reapreciação da prova, em virtude de não haver registo da prova.-Analisando. Nos termos do art. 712º/1 CPC a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação: “a ) Se do processo constarem todos os elementos de prova, que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do art. 685º-B-b), a decisão com base neles proferida. b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas; c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.” O art. 685º-B CPC estabelece os ónus a cargo do recorrente que impugna a decisão da matéria de facto, nos seguintes termos: “1. Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Quais os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. 2. No caso referido na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do nº2 do art. 522º-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição. 3. Na hipótese prevista no número anterior, incumbe ao recorrido, sem prejuízo dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, proceder, na contra-alegação que apresente, à indicação dos depoimentos gravados que infirmem as conclusões do recorrente, podendo, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição. (…)” O art. 522º-C/2 CPC (na redacção do DL 303/2007 de 24/08) determina: “Quando haja lugar a registo áudio ou vídeo, devem ser assinalados na acta o início e o termo da gravação de cada depoimento, informação ou esclarecimento, de forma a ser possível uma identificação precisa e separada dos mesmos.” A consagração do duplo grau de jurisdição em matéria de facto, inicialmente prevista no DL 39/95 de 25/02, nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência - visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso. A lei não consente por isso, como se afirma no preâmbulo do citado diploma que “o recorrente se limitasse a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo, pura e simplesmente, a reapreciação de toda a prova produzida em 1ª instância, manifestando genérica discordância com o decidido”. Recai, assim, sobre o recorrente um ónus, sob pena de rejeição do recurso, de determinar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar, motivar o seu recurso através da transcrição das passagens da gravação que reproduzem os meios de prova que, no seu entendimento, impunham decisão diversa sobre a matéria de facto. No caso concreto, não estão reunidos os pressupostos de ordem formal para admitir a reapreciação da decisão da matéria de facto, sendo certo que não se verifica o obstáculo apontado pela apelada, pois a prova produzida em sede de audiência de julgamento foi objecto de gravação. Com efeito, os demais elementos de prova que constam dos autos – prova documental -, nos quais o apelante funda a sua oposição, não permitem só por si, obter decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas ( art. 712º/ b) CPC ). Como refere Abrantes Geraldes: “Abarcam-se neste segmento as situações em que constem do processo elementos que, por si só, determinem uma decisão diversa e cujo valor probatório seja insusceptível de ser afectado ou perturbado pela análise de outros meios probatórios, como ocorre quando o tribunal recorrido tenha desrespeitado a força probatória plena de certo meio de prova.” (Recursos em Processo Civil – Novo Regime, 2ª edição, pag. 274) No caso concreto, os documento em causa, constituem documentos particulares, cuja apreciação está sujeita ao princípio da livre apreciação da prova e por isso, não fazem prova plena dos factos alegados, quando além do mais resulta do despacho que fundamentou a decisão, que a prova testemunhal se mostrou determinante para a apreciação dos factos, mas a prova documental que consta dos autos, foi igualmente atendida e devidamente interpretada para fundamentar a decisão, como se concluiu dos seguintes excertos do despacho: “(…) O seu depoimento foi corroborado pelo teor dos documentos junto ao processo — dos quais resulta a facturação autónoma de armazenagem e que nos diversos tarifários acordados não está previsto o acto de armazenamento como integrando o contrato -, bem como pelo depoimento da testemunha E…. (…) O tribunal teve também em consideração o teor dos documentos juntos ao processo, designadamente o documento junto a fis. 15 (que permite aferir a data em que a autora solicitou à ré a entrega do vestuário aludido no processo), os documentos de fis. 16 e 17 (que traduzem a quantia cujo pagamento foi exigido pela ré à autora, bem como os factos em que se fundamenta tal pedido), as facturas de fis. 18 e 19 (que retratam serviços prestados pela ré à autora, bem como a forma como os mesmos foram facturados), os documentos de fis. 20 e 54 (que permitem aferir os termos da correspondência trocada entre a autora e a ré) e a factura de fis. 21 e 22 (que alegadamente titula a venda dos fraques em apreço nos autos, mas cujo teor não foi corroborado por qualquer outro meio de prova). Foram ainda ponderados os documentos juntos ao processo cautelar apenso, designadamente o documento junto a fls. 17 (que permite aferir as negociações entre a autora e a ré), os documentos de fis. 18 e 81 a 86 (que permitem ter a percepção dos serviços integrados no contrato e os respectivos preços parcelares), as facturas de fis. 37, 38, 75 a 80 (que retratam serviços prestados pela ré à autora, bem como a forma como os mesmos foram facturados) e os documentos de fis. 39 a 49 e 82 (que permitem aferir os termos da correspondência trocada entre a autora e a ré). A matéria de facto não provada assentou na ausência de prova ou na falta de credibilidade da prova produzida. Com efeito, não foi produzida qualquer prova credivel que permita afirmar que a operação de armazenagem dos fraques estivesse incluída nos acordos sazonais celebrados entre a autora e a ré. Acresce que tal facto foi infirmado pelo teor das facturas juntas ao processo onde a armazenagem de peças de vestuário é facturada de forma autónoma e pelos preçários juntos ao processo, nos quais entre as várias operações discriminadas não é mencionada a armazenagem de peças de vestuário. (…)” Constata-se, assim, que a apelante não indicou o concreto erro de julgamento, mais propriamente o documento ou depoimento testemunhal que não foi devidamente interpretado pelo juiz do tribunal “a quo”, quando além do mais nenhum dos documentos juntos com a petição faz prova plena dos factos, ou seja, não permitem concluir que a “armazenagem” estava incluída no contrato “Pick & Pack”. Acresce que o recorrente não apresentou documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou (art. 712º/1/c ) CPC). Conclui-se que não estão reunidos os pressupostos de ordem formal para admitir a reapreciação da decisão da matéria de facto, pelo que, se indefere tal pretensão. Improcedem, desta forma, as conclusões de recurso sob as alíneas H) a S).-- O contrato celebrado entre Autora e Ré, na modalidade “Pick & Pack” engloba os serviços de “armazenamento” e indemnização dos prejuízos sofridos, na modalidade de danos patrimoniais - Nas alíneas O) a S) e Z) das conclusões de recurso, a apelante para além de suscitar a reapreciação da decisão da matéria de facto, considera, ainda, que não é devida qualquer quantia a título de armazenagem e que lhe assiste o direito a ser indemnizada pelos danos patrimoniais sofridos. Na sentença considerou-se, perante os factos provados, que o contrato celebrado entre Autora e Ré, não englobava os serviços de “armazenagem”, subordinado a um tarifário próprio. Considerou-se, de igual forma, que não assistia à Autora o direito à indemnização por danos patrimoniais, porque não se provaram os danos alegados. Mantendo-se inalterada a decisão da matéria de facto e uma vez que a apelante não impugna os fundamentos de direito em que assentou a decisão, a questão suscitada fica prejudicada e nada mais cumpre apreciar a respeito do mérito da decisão. Improcedem, também por este motivo, as conclusões de recurso sob as alíneas O) a S) e Z).-- Valor devido a título de taxa de armazenamento - Nas alíneas T) a V) das conclusões de recurso insurge-se a apelante contra a taxa aplicada pela apelada pelos serviços de armazenamento – € 0,50 -, por entender que a mesma não era devida, na data em que requereu o serviço de transporte. -Analisando. A questão que a apelante suscita, assenta em factos novos e que não foram oportunamente alegados pela Autora, nem pela Ré, nem resultam dos factos apurados em sede de julgamento e indicados na sentença. O recurso, como refere Professor Castro Mendes, consiste no pedido de reponderação sobre certa decisão judicial, apresentada a um órgão judiciariamente superior ou por razões especiais que a lei permite fazer valer (Direito Processual Civil – Recursos, pag. 5). O recurso ordinário (que nos importa analisar para a situação presente) não é uma nova instância, mas uma mera fase (eventualmente) daquela em que a decisão foi proferida. O recurso é uma mera fase do mesmo processo e reporta-se à mesma relação jurídica processual ou instância (ob. cit, pag. 24-25 e Alberto dos Reis, Código de Processo Civil ”, vol V, pag. 382, 383). A respeito do objecto do recurso têm surgido na doutrina duas posições: - o objecto do recurso é a questão sobre que incidiu a decisão recorrida; e - o objecto do recurso é a decisão recorrida, que se vai ver se foi aquela que “ex lege” devia ter sido proferida. O Professor Castro Mendes escreve a este respeito que: “o nosso sistema de recursos inclina-se para a segunda solução – o objecto do recurso é a decisão. Dentro desta orientação tem a nossa jurisprudência repetidamente afirmado que os recursos visam modificar decisões e não criar soluções sobre matéria nova. (…) o tribunal de recurso vai reponderar a decisão tal como foi proferida. Em regra deve aplicar a lei vigente ao tempo da decisão e cingir-se aos factos sobre que esta incidiu. Mas esta regra sofre pelo menos duas atenuações: - a parte pode apresentar ao tribunal de segunda instância e de revisão documentos supervenientes (art. 712º/1/c), 749º, 771º/c)); - as partes podem alterar, ainda em segunda instância, o pedido, de comum acordo (art. 272º CPC)”. (ob cit., pag. 25-26). A respeito da alegação de factos novos refere expressamente o ilustre professor: “A invocação de factos novos parece só ser possível até ao encerramento da discussão em primeira instância (art. 506º/1, 663º/1 CPC). Na jurisprudência entre outros sobre esta questão, podem ler-se: os Ac. STJ 07.07.2009, Ac. STJ 20.05.2009, Ac. STJ 28.05.2009, Ac. STJ 11.11.2003 (www, dgsi.pt), merecendo-nos particular relevo o Ac. STJ 28.05.2009 onde se refere: “E, do específico ponto de vista da instância recursiva, tem-se por certo que, como é jurisprudência uniforme, sendo os recursos meios de impugnação das decisões judiciais, destinados à reapreciação ou reponderação das matérias anteriormente sujeitas à apreciação do tribunal a quo e não meios de renovação da causa através da apresentação de novos fundamentos de sustentação do pedido (matéria não anteriormente alegada) ou formulação de pedidos diferentes (não antes formulados), ou seja, visando os recursos apenas a modificação das decisões relativas a questões apreciadas pelo tribunal recorrido (confirmando-as, revogando-as ou anulando-as) e não criar decisões sobre matéria nova, salvo em sede de matéria indisponível, a novidade de uma questão, relativamente à anteriormente proposta e apreciada pelo tribunal recorrido, tem inerente a consequência de encontrar vedada a respectiva apreciação pelo Tribunal ad quem (art. 676º CPC).” Ponderando o exposto a respeito do objecto do recurso, verifica-se que os factos que a apelante vem introduzir não podem ser considerados, pois constituem factos novos, já que em sede de resposta a Autora-apelante não os alegou. A Autora-apelante limitou-se a alegar que nada deve à R., estando todas as contas com esta devidamente regularizadas. Admitiu que a Ré comunicou em 19 de Agosto de 2011 à A. que a partir de 02 de Setembro passaria a ser cobrada uma taxa de € 0,50, por peça/semana, fazendo menção ao e-mail, a que se alude nas conclusões de recurso. Referiu, ainda, que a R. comunicou à A. a alteração das condições e preços até então vigentes, que consistiam no englobamento de todos os serviços, incluindo os de armazenagem no serviço de “Pick-Pack”. Alegou, ainda, que a R. comunicou à A. que deveria, em alternativa optar pela retirada desses artigos até à data indicado, 2-09-2011, ou aceitar o agravamento no respectivo custo. Contudo, não questionou o valor apurado e debitado pela Ré, mais propriamente, que a Ré aplicou o novo tarifário a todo o período de armazenagem. Se os novos factos resultaram da discussão da causa, recaía sobre as partes ao abrigo do art. 264º/3 CPC, suscitar junto do tribunal “a quo”, a sua consideração em sede de decisão, o que também não ocorreu. Conclui-se, assim, nos termos do art. 676º CPC, que nenhuma relevância merece, nesta sede, os factos “novos” e novos argumentos de sustentação da defesa da Autora, pois os mesmos não foram considerados na decisão objecto de recurso e ao tribunal de recurso apenas cumpre reapreciar as matérias anteriormente sujeitas à apreciação do tribunal “a quo” ficando por isso vedado a apreciação de novos fundamentos de sustentação do pedido (matéria não anteriormente alegada). Improcedem, desta forma, as conclusões de recurso sob as alíneas T) a V).-- Litigância de má-fé – A apelada termina a resposta às alegações por pedir a condenação da Ré como litigante de má-fé, por considerar infundada a apelação.-Analisando. A lei enuncia no art. 456º /2 CPC, as situações que qualifica como litigância de má-fé, considerando para esse efeito que litiga de má fé, quem: “a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar; b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa; c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação; d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.” A lei especifica, assim, os comportamentos processuais susceptíveis de infringir os deveres de boa fé processual e de cooperação. Os comportamentos processuais previstos no art. 456º/2 CPC passam a ser sancionados quer sejam dolosos, quer se devam a negligência grave da parte ou do seu representante ou mandatário, podendo por isso fundar-se em erro grosseiro ou culpa grave (Lopes do Rego “Comentários ao Código de Processo Civil”, pag. 308). Na análise deste instituto cumpre ter presente o seu enquadramento e inserção no sistema, no sentido de conseguir conciliar a faculdade de usar dos meios judiciais para fazer valer os “supostos” direitos, com a responsabilidade por lide temerária. Alberto dos Reis refere a este respeito: “Dizemos “supostos”, porque nunca se pôs, nem poderia pôr, como condição para o exercício do direito de acção ou de defesa que o autor ou o réu seja realmente titular do direito substancial que se arroga. Seria, na verdade, absurdo que se enunciasse esta regra: só pode demandar ou defender-se em juízo “quem tem razão”; ou, por outras palavras, só é licito deduzir no tribunal pedidos ou contestações objectivamente fundados. Só na altura em que o tribunal emite a sentença, é que vem a saber-se se a pretensão do autor é fundada, se a defesa do réu é conforme ao direito. De modo que exigir, como requisito prévio para a admissibilidade da acção ou da defesa, a demonstração da existência do direito substancial, equivalia, ou a cair numa petição de princípio, ou a fechar a porta a todos os interessados: aos que não têm razão e aos que a têm. O Estado tem, pois, de abrir o pretório a toda a gente, tem de pôr os seus órgãos jurisdicionais à disposição de quem quer que se arrogue um direito, corresponda ou não a pretensão à verdade e à justiça.” (Código de Processo Civil- Anotado, vol.II, pag. 258-259). E na análise do instituto, nas considerações gerais, refere ainda, com mais propriedade: “… uma coisa é o direito abstracto de acção ou de defesa, outra o direito concreto de exercer actividade processual. O primeiro não tem limites; é um direito inerente à personalidade humana. O segundo sofre limitações, impostas pela ordem jurídica; e uma das limitações traduz-se nesta exigência de ordem moral: é necessário que o litigante esteja de boa fé ou suponha ter razão.” (ob. cit., pag. 261). Pedro de Albuquerque no seu estudo sobre litigância de má fé, salienta que: “A proibição de litigância de má fé apresenta-se, assim, como um instituto destinado a assegurar a moralidade e eficácia processual, porquanto com ela se reforça a soberania dos tribunais, o respeito pelas suas decisões e o prestígio da justiça. O dolo ou má fé processual não vicia vontades privadas nem ofende meramente interesses particulares das partes envolvidas. Também não se circunscreve a uma violação sem mais do dever geral de actuar de boa fé. A virtualidade específica da má fé processual é outra diversa e mais grave: a de transformar a irregularidade processual em erro ou irregularidade judicial. “ (Responsabilidade Processual por Litigância de Má Fé, Abuso de Direito e Responsabilidade Civil em Virtude de Actos Praticados no Processo, ed. Almedina, pag. 56). A actual lei, como se referiu, passou a sancionar a litigância dolosa e a litigância temerária ou com negligência grave. A opção legislativa mostra-se justificada no preâmbulo da lei - DL 29-A/95 de 12/12 - onde se dispõe: “Como reflexo e corolário do princípio da cooperação, consagra-se expressamente o dever de boa fé processual, sancionando-se como litigante de má fé a parte que, não apenas com dolo, mas com negligência grave, deduza pretensão ou oposição manifestamente infundadas, altere, por acção ou omissão, a verdade dos factos relevantes, pratique omissão indesculpável do dever de cooperação ou faça uso reprovável dos instrumentos adjectivos.” Pedro de Albuquerque, salienta a este respeito, que: “a proibição de litigância de má fé assenta assim, de acordo com o preâmbulo, e na configuração que assume na lei actualmente em vigor, num princípio de natureza puramente processual: o princípio da cooperação que viria a ficar consignado no art. 266º CPC.” (ob.cit., pag. 51). Os art. 456º e seg. do CPC apenas dizem respeito a ofensas cometidas no exercício da actividade processual a posições também elas processuais ou ao processo em si mesmo. Trata-se de uma ilicitude baseada na violação de posições e deveres processuais que, a serem atingidos, geram de imediato uma ilicitude sancionável independentemente da existência ou lesão de qualquer ilícito de direito substantivo (Pedro de Albuquerque, ob. cit., pag. 52). Lebre de Freitas, em comentário ao art. 456º CPC, considera a lide temerária: “ quando as regras de conduta conformes com a boa-fé são violadas, com culpa grave ou erro grosseiro e lide dolosa quando a violação é intencional ou consciente. A litigância temerária é mais do que a litigância imprudente, que se verifica quando a parte excede os limites da prudência normal, actuando culposamente, mas apenas com culpa leve, a qual só excepcionalmente é sancionada, como sucede no domínio particularmente sensível das providências cautelares (art. 390º CPC)” (Código de Processo Civil Anotado, pag. 194). Na situação concreta, não se aponta à conduta da apelante, em sede de recurso, uma actuação susceptível de censura, porque violadora do princípio da boa-fé processual, pois limitou-se a impugnar os fundamentos da decisão, renovando parte dos argumentos que expôs nos articulados, fazendo uso dos meios e instrumentos que a lei lhe faculta para esse efeito. Não resulta dos factos apurados que a apelante agiu revelando saber do infundado da sua pretensão. O facto de não ser acolhida a posição que defende - apenas foi celebrado um contrato, que contempla os serviços de armazenagem -, não significa que a sua conduta processual seja susceptível de censura. Desta forma, concluímos que não estão reunidos os pressupostos para condenar a apelante, com fundamento em litigância de má-fé.-Nos termos do art. 446º CPC as custas são suportadas: - na apelação, pela apelante; - no incidente de litigância de má-fé, pela apelada.-III. Decisão: Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença.-Julgar improcedente o pedido de condenação da apelada, como litigante de má-fé.- Custas: - da apelação a cargo da apelante; - do incidente de litigância de má-fé, a cargo da apelada.-Desentranhe e devolva ao apresentante-apelante os documentos juntos com as alegações. Custas do incidente, a cargo do apresentante, fixando-se a taxa de justiça em € 60,00 (sessenta euro) – art. 543º/1 CPC e art. 27º/1/3 RCJ.* * *Porto, 04.03.2013 (processei e revi – art. 138º/5 CPC) Ana Paula Pereira de Amorim José Alfredo de Vasconcelos Soares de Oliveira Ana Paula Vasques de Carvalho __________________ SUMÁRIO (art. 713°17 CPC): I. Quando o objecto do recurso não se confina à apreciação de questões de direito e por outro lado, a omissão da indicação das disposições legais nas conclusões e motivação do recurso, não impediu o exercício do contraditório, por motivos de celeridade processual justifica-se dispensar a prolação de despacho de aperfeiçoamento (art. 266°/1 CPC). II. A sentença não conhece para além do pedido, quando estamos perante uma obrigação ilíquida e foi proferida decisão de condenação em quantia certa e determinada. III. Na obrigação ilíquida, o objecto é sempre uma prestação cujo quantitativo não está ainda apurado. Nestas circunstâncias, a determinação do respectivo valor não está dependente de prévia liquidação, restando apenas proceder ao cálculo na sentença. IV. Do despacho que admite um meio de prova, cabe recurso de apelação, com subida imediata, em separado e efeito meramente devolutivo (art. 691°/2 i) CPC), motivo pelo qual não constitui um recurso interlocutório e por isso, fica o tribunal impedido de conhecer do objecto do recurso nessa parte. V. Mantendo-se inalterada a decisão de facto e não se impugnando os fundamento de direito, ficam prejudicadas as questões suscitadas. VI. O tribunal de recurso tem por função reapreciar a decisão proferida em ia instância, pelo que, está impedido de apreciar novos e diferentes factos e fundamentos de sustentação do pedido — art. 676° CPC. VII. Na situação concreta, não se aponta à conduta da apelante, em sede de recurso, uma actuação susceptível de censura, porque violadora do princípio da boa-fé processual, pois limitou-se a impugnar os fundamentos da decisão, renovando parte dos argumentos que expôs nos articulados, fazendo uso dos meios e instrumentos que a lei lhe faculta para esse efeito. Ana Paula Pereira de Amorim