I - O vencimento imediato das prestações previsto no art. 781° do CCiv. só tem lugar mediante interpelação, nesse sentido (devido à não realização de alguma das prestações já vencidas), do credor ao devedor. II - Quando o credor lança mão de tal antecipação do cumprimento da obrigação, não tem direito a exigir do devedor o chamado «interusurium», ou seja, os frutos naturais ou civis correspondentes ao período da antecipação, entre os quais se contam os juros remuneratórios convencionados nos contratos de mútuo bancário. III - É a estas situações que se reporta o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n° 7/2009, de 25/03. IV - Quando, apesar do não pagamento de uma das prestações da obrigação (reembolso do mútuo), o banco credor não interpela o devedor nos termos e para os efeitos do citado art. 781°, continuando as demais prestações e vencerem-se nas datas acordadas (sem que, também elas, sejam pagas), já não funciona a jurisprudência do referido AUJ; neste caso, o banco credor tem direito a exigir do devedor, além do capital, os juros remuneratórios (e demais despesas) incluídos no montante de cada uma das prestações vencidas e não pagas. V - E pode, ainda, exigir, nos termos do n° 3 do art. 560° do CCiv., os juros de mora referentes a cada uma dessas prestações vencidas e não pagas, desde o dia seguinte ao do vencimento de cada uma delas.
Pc. 144/09.3TBVLP.P1 – 2ª Sec. (apelação) ________________________ Relator: M. Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Francisco Matos Des. Maria João Areias * * *Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B....., com sede na Suíça, instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma sumária, contra C..... e mulher, D....., residentes em Valpaços, pedindo a condenação destes a pagarem-lhe a quantia de 28.519,54 € (vinte e oito mil, quinhentos e dezanove euros e cinquenta e quatro cêntimos), acrescido dos juros vincendos, até integral e efectivo pagamento. Para tal, alegou que: . celebrou com o réu marido um contrato de crédito pessoal, mediante o qual lhe emprestou a quantia de 25.000,00 CHF (francos suíços), tendo o demandado ficado obrigado a reembolsar esta quantia, acrescida de juros à taxa de 5,75% ao ano e das despesas administrativas e do seguro à taxa de 3,50% ao ano, em 48 prestações mensais de 625,15 e cada, a pagar até ao dia 30 de cada mês a partir de 30/06/1999; . o réu pagou as primeiras 20 mensalidades, mas não pagou as restantes; . apesar de o ter interpelado e de ter recorrido aos procedimentos administrativos legais (na Suíça) com vista à satisfação do crédito, o réu não regularizou a dívida; . a ré mulher é também responsável pela satisfação do crédito, por estar casada com o demandado sob o regime de comunhão de adquiridos, por a dívida ter sido contraída na constância do casamento e se ter destinado a fazer face às necessidades familiares de ambos. Os réus, citados, contestaram a acção por excepção (peremptória) e por impugnação, tendo alegado que o montante do crédito que está em dívida é de 17.504,20 CHF, que o banco autor não fundamentou a parte do pedido que excede este valor e que a responsabilidade pelo pagamento da dívida encontra-se transferida para a E….”, com a qual o réu marido celebrou um contrato de seguro aquando da outorga do contrato de crédito invocado na p. i.. Concluiu pugnando, em primeira linha, pela procedência das excepções peremptórias que invocou e, em segundo lugar, pela improcedência da acção, em qualquer caso com as legais consequências. Requereu, ainda, a intervenção principal provocada da seguradora “E….” como parte passiva. O banco autor respondeu às excepções peremptórias arguidas pelos réus e ao indicado incidente de intervenção de terceiros, tendo concluído pela improcedência daquelas e pelo indeferimento deste. Admitida a intervenção da “E…..” a título acessório (e não, como requerido, a título principal), foi a mesma citada mas não apresentou qualquer articulado/requerimento. Foi proferido despacho saneador tabelar e foram seleccionados os factos assentes e os controvertidos, estes formando a base instrutória, tendo aqueles sido objecto de reclamação por parte do banco autor. Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, no termo do qual foi proferido despacho de resposta aos quesitos da base instrutória. Seguiu-se a prolação da sentença que decidiu assim: “A) – Julga-se a presente acção parcialmente procedente, por só parcialmente provada, termos em que vai o réu C..... condenado a pagar ao autor B..... a quantia de CHF 23’172,60 (vinte e três mil cento e setenta e dois francos suíços e sessenta cêntimos), ao que acresce juros vencidos e vincendos desde 30 de Junho de 2003 até efectivo e integral pagamento, à taxa de 9,25%, devendo o pagamento deste montante ser feito nos respectivos contravalores em escudos ao câmbio do dia em que tiver lugar, dentro do limite do pedido de € 28.519,54 (vinte e oito mil quinhentos e dezanove euros e cinquenta e quatro cêntimos), acrescido de juros vincendos à taxa de 9,25%, contados desde a data da entrada da petição inicial até integral e efectivo pagamento. B) – No mais, julgando-se a acção improcedente, por não provada, vão os réus e a interveniente companhia de seguros “E….” absolvidos do contra si peticionado. Custas da acção pelo autor e réu na proporção do respectivo decaimento. Registe-se e notifique-se”. Inconformado com tal decisão, interpôs o réu C….. o recurso de apelação em apreço, cuja motivação culminou com as seguintes conclusões: “A) Da Acção A- O A. B....., pessoa colectiva de direito suíço, com sede em ….., em …., Suíça, interpôs, contra o aqui Réu - C..... e D....., sua mulher, acção de condenação, sob a forma sumária, na sequência de haver celebrado com o Réu marido, em 19 de Maio de 1999, um contrato designado por “Contrato de crédito pessoal nº C 3247.12.93 (H 815.15.67)”, mediante o qual lhe mutuou a quantia de CHF 25.000,00 (vinte e cinco mil francos suíços), acrescida de juros à taxa de 5,75% ao ano, despesas administrativas e de seguro à taxa de 3,50% ao ano, o que corresponde a uma taxa efectiva global de 9,25%, tudo no valor de CHF 5.007,20 (cinco mil e sete francos suíços e vinte cêntimos), sendo o valor de empréstimo, no final do contrato do valor global de CHF 30.007,20; B- E o R. declarou restituir-lhe tal quantia em 48 (quarenta e oito) prestações mensais, iguais e sucessivas, no valor de CHF 625,15 (seiscentos e vinte e cinco francos suíços e quinze cêntimos) cada uma, vencendo-se a primeira prestação no dia 30 de Junho de 1999 e a última no dia 30 de Junho de 2003; C- O Réu procedeu ao pagamento de 20 mensalidades, no valor de CHF 12.503,00, sendo que o pagamento da 20ª ocorreu em 23/02/2001. D- Após os procedimentos legais de execução e penhora ocorridos na Suíça, para cobrança da dívida em 14/12/2004 e 04/11/2005, respectivamente, encetou contacto através de carta enviada ao Réu para sua morada em Portugal. E- Veio a interpor a presente acção pedindo a sua condenação, no pagamento global da quantia de € 28.419,54. F- A sentença, e para o que interessa no presente recurso, veio a considerar parcialmente provada a acção e condenou o Réu a pagar ao A. a quantia de CHF 23.172,60, ao que acresce juros vencidos e vincendos desde 30 de Junho de 2003 até efectivo e integral pagamento à taxa de 9,25%, devendo o pagamento deste montante ser feito nos respectivos contra-valores em escudos (mero lapso, sendo Euros) ao câmbio do dia em que tiver lugar, dentro do limite do pedido de € 28.519,54, acrescido de juros vincendos à taxa de 9,25% contados desde a data da entrada da petição inicial até integral e efectivo pagamento. B) Dos juros remuneratórios e capitalização de juros G- A Juiz “a quo”, na fundamentação da sentença, considerou que o A. interpelou o Réu, quer por carta enviada para este em Portugal, quer pelo procedimento de execução, instaurado na Suíça e consequentemente ocorreu o vencimento de todas as prestações aquando do não pagamento da primeira, vencendo desde então juros” e convoca o art. 781º do C.C. - fls. 11 da sentença; H- E fixa temporalmente o vencimento do capital em 30/03/2001, calculando juros de mora desde essa data até 30/06/2003 (data em que o contrato terminaria), mas tendo por base a quantia de CHF 17.504,20, ou seja, como se o contrato se mantivesse até ao termo do prazo contratado e não tivesse havido vencimento antecipado do capital. I- Ora, na quantia de CHF 17.504,20 estão já incluídos juros remuneratórios, pré-calculados e incluídos, com o capital, nas prestações estabelecidas (conjuntamente com o capital) no pressuposto do cumprimento integral do contrato, que consiste em o mutuário ir liquidando prestações constantes, diluindo e antecipando o pagamento dos juros remuneratórios desde o momento em que passa a dispor do capital. J- Tais juros remuneratórios não são assim devidos, porquanto o A. renunciou ao beneficio do prazo, fazendo vencer-se, com o não pagamento da 21ª prestação, todas as restantes, mas apenas a título de capital. Logo, K- Por a obrigação de juros, ligada ao tempo e programa contratual, não se ter vencido, nem ter sequer nascido, também não há lugar à capitalização de juros nos termos previstos no art. 5º nº 4 do DL nº 344/78 de 17/11 e art. 560º nº 3 do CC. L- Para tal era necessário convenção posterior ao vencimento ou notificação judicial feita ao devedor para capitalizar os juros vencidos, o que não se provou nos autos, nem o A. sequer o alegou. Pelo que, M- E por tudo supra exposto, há contradição entre a fundamentação e a decisão, pois a Juiz “a quo” parte do pressuposto de que ocorreu o vencimento do capital remanescente, aquando do pagamento pelo Réu da 20ª prestação e última, em 23/02/2001 e o não pagamento da 21ª que correria em 30/03/2001 e depois, condena o réu a pagar o capital e juros remuneratórios já incluídos na quantia de CHF 17.504,20 e sobre estes os juros moratórios, que mais não é que a capitalização dos juros ou “juros de juros”, configurando anatocismo, previsto no art. 560º. N- Em suma, fundamenta num sentido e decide em sentido contrário. O- Pelo que, deverá ser apurada a quantia devida a título de capital vencido e posteriormente sobre o mesmo acrescerão os juros à taxa contratada desde 30/03/2001 até à entrada da acção em 27/05/2009, e a partir daí à taxa de juro legal até efectivo e integral pagamento. P- Foram violadas as seguintes normas: a) Artºs 781º, 1.142º, 1.146º e 560º do Código Civil; b) Artº 5º, nº 4 do DL nº 344/78 de 17/11; c) O Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 05/05/2009 do STJ. Assim, nestes termos e nos melhores de direito, deve ser revogada a sentença proferida pelo tribunal a quo, e consequentemente, ser considerada procedente, por provado, o presente recurso, decidindo esse venerando tribunal em conformidade”. O banco autor contra-alegou em defesa da confirmação da decisão recorrida. * * * II. Questões a apreciar e decidir: Sabendo-se que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente [art. 684º nº 3 e 685º-A nºs 1 e 3 do CPC, na redacção aqui aplicável, dada pelo DL 303/2007, de 24/08, atenta a data da instauração da acção], as questões que importa apreciar e decidir consistem em saber: . Se a sentença condenou o recorrente a pagar juros remuneratórios que não são devidos; . Se procedeu também a indevida capitalização de juros. [Consigna-se que, apesar do referido na conclusão M, não se conhecerá da eventual nulidade da sentença, prevista na al. c) do nº 1 do art. 668º do CPC, por o recorrente não ter invocado expressamente este vício – cfr. conclusões M a P]. * * * III. Factos provados: A) Na decisão recorrida foram dados como provados os seguintes factos [que não vêm postos em causa, nem enfermam dos vícios previstos no nº 4 do art. 712º do CPC]: 1. A autora é uma sociedade comercial de direito suíça que prossegue a actividade bancária, tendo por objecto a prática de todas as operações permitidas às instituições de crédito. 2. O réu marido dedica-se actualmente, em Portugal, à actividade de exploração agrícola. 3. No exercido da sua actividade comercial, e a pedido dos réus, a autora celebrou com o réu marido, em 19 de Maio de 1999, um acordo designado por “contrato de crédito pessoal nº C 3247.12.93 (H 815.15.67)”. 4. Nos termos de tal acordo a autora declarou emprestar ao réu a quantia de CHF 25.000,00 (vinte e cinco mil francos suíços). 5. E o réu declarou restituir-lhe tal quantia, acrescida de juros, despesas administrativas e de seguro no valor de CHF 5.007,20 (cinco mil e sete francos suíços e vinte cêntimos), perfazendo o montante global de CHF 30.007,20 (trinta mil e sete francos suíços e vinte cêntimos). 6. Declarou ainda o réu marido que a quantia referida em 5. seria paga em 48 (quarenta e oito) prestações mensais, iguais e sucessivas, no valor de CHF 625,15 (seiscentos e vinte e cinco francos suíços e quinze cêntimos) cada uma. 7. Desse acordo consta ainda que “o mutuário compromete-se a reembolsar esta quantia, acrescida dos juros (5,75% ao ano), das despesas administrativas e do seguro em caso de morte, desemprego após despedimento (3,50% ao ano), ou seja, uma taxa efectiva global de 9,25%, sem atrasos e sem interpelação prévia, em 48 mensalidades de Frs 625,15 cada uma, a pagar no dia 30 de cada mês o mais tardar, a partir de 30.06.1999.” 8. Na sequência do acordo referido em 4. foi celebrado um acordo com a Companhia de Seguros denominada “E….”, com sede na Avenue …. …. – …. – CH - 1001 Lausanne, designado por contrato de seguro, titulado pela Apólice nº 186 400, cujo teor se dá por integralmente reproduzido. 9. De acordo com o estipulado, a autora entregou a quantia referida em 4. ao réu marido através da respectiva transferência para a conta bancária deste último, no dia 19 de Maio de 1999. 10. Vencendo-se a primeira prestação no dia 30 do mês seguinte ao da efectiva liberação do capital na conta do réu marido (por aquela ter ocorrido após o dia 16), ou seja, no dia 30 de Junho de 1999. 11. Os réus procederam ao pagamento das primeiras 20 mensalidades. 12. Do documento de fls.101 designado por "pedido de execução" constam os seguintes dizeres: "Ao serviço de execuções de Genebra cantão de Genebra"; "Devedor: Senhor C....., nascido em 05.01.1955, …. …."; "Credor: B...../Departamento Contencioso Quai de L´Ille 17, 1211 Genebra 2"; "Título e data do crédito ou causa da obrigação: 1) Montante devido pelo contrato de crédito pessoal nº H815.15.67 de 19.05.1999, respectivamente sobre a conta interna BCG e Nº C3247.12.93, de acordo com os artigos 1 do contrato e 3 das suas condições gerais, 2) juros vencidos e não pagos em 14.12.2004, 3) despesas de aviso vencidas e não pagas em 14.12.2004". 13. Do documento de fls. 111 designado por "auto de penhora", constam os seguintes dizeres "O Serviço não encontrou quaisquer bens penhoráveis pertencentes ao devedor na morada deste. Não foi possível proceder à penhora do salário. Decorre dos avisos de penhora enviados aos diversos bancos sediados em Genebra que o devedor não é titular de qualquer conta nem detentor de contas-poupança." 14. Mais consta que “devedor C….. …crédito: capital…F30368,40 Juros…1481,65 Notificação … 180,85 Penhora….F 220,70 (…) Total ….F 32251,60” 15. Os réus contraíram casamento entre si, em 8 de Maio de 1976, sob o regime da comunhão de bens adquiridos. 16. A autora encetou um contacto, através de carta de interpelação enviada para o réu, em Portugal, com o intuito de solicitar a regularização da situação por parte do réu. B) Em conformidade com o disposto nos arts. 659º nº 3 e 713º nº 2 do CPC, consideram-se, ainda, provados os seguintes factos: 17. O procedimento executivo referido em 12 foi instaurado em 14/12/2004 [cfr. docs. de fls. 35, 104 e 108]. 18. A carta de interpelação referida em 16 foi enviada ao réu a 31/07/2008 e recepcionada por este em 01/08/2008 [cfr. docs. juntos a fls. 95 a 98; foi com base nestes documentos que a 1ª instância deu como provado aquele nº 16, como se afere da «motivação» do despacho de resposta aos quesitos da BI constante de fls. 304 a 306]. 19. O conteúdo de tal missiva [na parte relevante] é o seguinte: “Vimos pela presente, enquanto mandatários do B....., interpelar V. Exa., para o pagamento de: € 19.719,74 (dezanove mil setecentos e dezanove euros e setenta e quatro cêntimos), acrescido de juros no valor de € 5.531,72 (cinco mil quinhentos e vinte e um euros e setenta e dois cêntimos), contabilizados a partir de 07.11.2005, valor este relativo ao crédito pessoal nº C 3247.12.93 (H 815.15.67), celebrado a 19.05.1999. A título de despesas e encargos bancários são devidas as quantias de € 1.222,85 (mil duzentos e vinte e dois euros e oitenta e cinco cêntimos), O que tudo perfaz uma dívida no valor total de € 26.464,31 (vinte e seis mil quatrocentos e sessenta e quatro euros e trinta e um cêntimos). Apesar de estarmos mandatados para proceder judicialmente, parece-nos de toda a conveniência que a solução passe pelo pagamento voluntário da dívida em apreço no prazo máximo de 8 dias, evitando-se assim a sua cobrança judicial e consequentemente novas custas (…)”. * * * IV. Apreciação jurídica: 1. Nos autos está em causa um contrato de crédito pessoal, sob a forma de mútuo bancário [a sentença recorrida qualificou-o como tal e declarou, fundadamente, que lhe é aplicável a lei portuguesa, questões com que se conformaram as partes e que, por isso, não estão aqui em apreciação, remetendo-se, quanto a elas, para o que ali se decidiu], celebrado entre o banco autor e o réu, aqui recorrente, em 19/05/1999, mediante o qual o primeiro se obrigou a emprestar ao segundo a quantia de 25.000,00 CHF (francos suíços) e o segundo se vinculou a reembolsar tal quantia, acrescida de juros remuneratórios à taxa de 5,75%/ano e de despesas administrativas e de seguro, à taxa de 3,50%/ano, num total de 5.007,20 CHF [somando tudo a quantia de 30.007,20 CHF, no prazo de 48 meses, através de outras tantas mensalidades, iguais e sucessivas, de 625,15 CHF cada, a partir de 30/06/1999. O réu pagou apenas 20 das prestações a que se obrigou; não pagou a 21ª prestação nem nenhuma das seguintes. Com esta atitude constituiu-se, inequivocamente, em mora, nos termos dos arts. 804º nº 2 e 805º nº 2 al. a), ambos do CCiv. [trata-se de obrigação com prazo –prestações – certo]. Por estar em causa obrigação liquidável em prestações, há, ainda, que ter em conta o disposto no art. 781º do mesmo diploma legal, segundo o qual “se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas”. Trata-se de norma supletiva que admite convenção diversa das partes – art. 405º nº 1 do CCiv.. No caso, não se apurou que no apontado contrato as partes tenham estabelecido qualquer cláusula relativamente a tal assunto, nem que tenham afastado a aplicação daquele regime supletivo. A propósito daquele art. 781º, depois de se citar doutrina adequada, exarou-se na sentença, a dado passo, o seguinte: “(…), resultou provado que o autor/credor encetou um contacto, através de carta de interpelação enviada para o réu, em Portugal, com o intuito de solicitar a regularização da situação por parte do réu (facto apurado em 17), o que, até à presente data, não sucedeu. Acresce que o autor instaurou ainda a execução apurada em 12. Consequentemente, ocorreu o vencimento de todas as prestações aquando do não pagamento da primeira, vencendo desde então juros” [cfr. pg. 12 da sentença – fls. 341 dos autos]. Esta afirmação não se mostra, contudo, inteiramente consonante com a factologia provada, nem com os melhores ensinamentos da doutrina, incluindo a citada na própria sentença. Vejamos porquê. 2. O saudoso Prof. Antunes Varela [in “Das Obrigações em Geral”, vol. II, 7ª ed., pgs. 53-54], interpretando aquele preceito legal, ensinava que: “Se o comprador faltar ao pagamento de qualquer delas [de qualquer das prestações acordadas], imediatamente se vencerão, por força do preceito transcrito (…), todas as que ainda estejam em dívida. O inadimplemento do devedor, quebrando a relação de confiança em que assenta o plano de pagamento escalonado no tempo, justifica a perda do benefício do prazo quanto a todas as prestações previstas para futuro. O credor fica, por conseguinte, com o direito de exigir a realização, não apenas da prestação a que o devedor faltou, mas de todas as prestações restantes, cujo prazo ainda se não tenha vencido. Assim se deve interpretar o texto do artigo 781º, e não no sentido de que, vencendo-se imediatamente, ex vi legis, as prestações restantes, o devedor começa desde esse momento, ao arrepio da doutrina geral do artigo 805º, nº 1, a responder pelos danos moratórios. O vencimento imediato das prestações cujo prazo ainda se não vencera constitui um benefício que a lei concede – mas não decreta ela própria – ao credor, não prescindindo consequentemente da interpelação do devedor. A interpelação do devedor para que cumpra imediatamente toda a obrigação (realizando todas as prestações restantes) constitui a manifestação da vontade do credor em aproveitar o benefício que a lei lhe atribui”. E quanto às consequências da interpelação do credor para que o devedor cumpra imediatamente toda a obrigação, ensina o Prof. Menezes Cordeiro [in “Tratado de Direito Civil Português”, II, Direito das Obrigações, tomo IV, 2010, pg. 40] que “quando haja antecipação do cumprimento, suscita-se o problema da atribuição do interusurium, isto é, da atribuição dos frutos naturais ou civis correspondentes ao período da antecipação”, acrescentando que “quando o credor possa antecipar o cumprimento, nos casos em que a lei lho permite, o interusurium compete, logicamente, ao devedor”. 3. Mas será que «in casu» o banco autor lançou mão do mecanismo previsto no citado art. 781º? Na sentença deu-se resposta afirmativa a esta questão chamando à colação a carta de interpelação referida no nº 16 dos factos provados e o procedimento de execução mencionado no nº 12, a que o banco autor recorreu. Enunciemos os factos relevantes. A dívida era pagável em 48 prestações mensais e sucessivas, no montante de 625,15 CHF cada. O respectivo prazo de pagamento decorreria entre 30/06/1999 [data da 1ª prestação] e 30/06/2003 [data em que deveria ser paga a 48ª prestação]. O réu só pagou até à 20ª prestação, presumindo-se que esta teve lugar no final de Fevereiro de 2001 [no doc. junto a fls. 31 e 32 consta que a mesma foi paga a 23/02/2001]. Apesar de não ter satisfeito as prestações seguintes [da 21ª à 48ª], a verdade é que o banco autor nada fez até ao vencimento da última, pois as únicas interpelações apuradas foram as duas que atrás se deixaram sinalizadas: a instauração do procedimento executivo [que vale como interpelação judicial] e o contacto através da missiva fotocopiada a fls. 95-96. Mas estas, porque tiveram lugar já depois do vencimento da última das indicadas prestações [aquele procedimento foi instaurado a 14/12/2004 e a citação do aqui réu no seu âmbito, se efectivamente teve lugar, ocorreu em data posterior; a missiva referida em segundo lugar foi recebida pelo réu em 01/08/2008], não podiam ter como efeito, nem tiveram [veja-se, por ex., o conteúdo da dita missiva transcrito no último número dos factos provados do ponto III], o vencimento antecipado de nenhuma delas, previsto no art. 781º. E não tendo havido tal vencimento antecipado [pelo contrário, apesar da respectiva falta de pagamento, cada uma das 21ª à 48ª prestações foi-se vencendo apenas na data em que o demandado se tinha obrigado a pagar cada uma delas, ou seja, no dia 30 de cada um dos meses que mediaram entre 30/03/2001 e 30/06/2003], não se coloca a questão de saber se o banco autor tem o direito de exigir, nesta acção, além do capital mutuado, também o «interusurium» de que fala o segundo Autor supra citado, ou seja, no caso, os juros remuneratórios e as despesas que foram incluídos nos montantes das prestações mensais que o réu se vinculou a pagar; é evidente que tem direito a exigir deste tais juros e despesas. Juros e despesas estes em que, apesar da incorrecta afirmação/conclusão atrás transcrita, a douta sentença condenou – e bem - o ora recorrente, não havendo nesta condenação qualquer violação do preceituado no citado art. 781º, como acabámos de ver. 4. O recorrente sustenta, no entanto, que, ao assim ter decidido, a Mma. Julgadora «a quo» desrespeitou o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do STJ nº 7/2009, de 25/03/2009 [publicado na 1ª Série do DR de 05/05/2009]. Proclamou-se neste AUJ que “no contrato de mútuo oneroso liquidável em prestações, o vencimento imediato destas ao abrigo de cláusula de redacção conforme ao art. 781º do Código Civil não implica a obrigação de pagamento dos juros remuneratórios nelas incorporados”. Isto depois de nele se terem enunciado as seguintes “premissas nucleares” que suportam esta Jurisprudência [transcrevem-se as que aqui relevam]: “A obrigação de capital constitui nos contratos de mútuo oneroso, comercial ou bancário, liquidável em prestações, uma obrigação de prestação fraccionada ou repartida, efectuando-se o seu cumprimento por partes, em momentos temporais diferentes, mas sem deixar de ter por objecto uma só prestação inicialmente estipulada, a realizar em fracções; Diversamente, os juros remuneratórios enquanto rendimento de uma obrigação de capital, proporcional ao valor desse mesmo capital e ao tempo pelo qual o mutuante dele está privado, cumpre a sua função na medida em que exista e enquanto exista a obrigação de capital; A obrigação de juros remuneratórios só se vai vencendo à medida em que o tempo a faz nascer pela disponibilidade do capital; Se o mutuante, face ao não pagamento de uma prestação, encurta o período de tempo pelo qual disponibilizou o capital e pretende recuperá-lo, de imediato e na totalidade o que subsistir, só receberá o capital emprestado e a remuneração desse empréstimo através dos juros, até ao momento em que o recuperar, por via do accionamento do mecanismo previsto no art.º 781.º do C. Civil; (…) O mutuante, caso opte pela percepção dos juros remuneratórios convencionados, terá de aguardar pelo decurso do tempo previsto para a duração do contrato e como tal, abster-se de fazer uso da faculdade prevista no art.º 781º do Código Civil, por directa referência à lei ou a cláusula de teor idêntico inserida no contrato; Prevalecendo-se do vencimento imediato, o ressarcimento do mutuante ficará confinado aos juros moratórios, conforme as taxas acordadas e com respeito ao seu limite legal e à cláusula penal que haja sido convencionada; (…)”. Basta atentar em cada uma destas premissas e à sua sequência para se ver que a decisão recorrida não incumpriu a Jurisprudência fixada em tal AUJ, desde logo, porque «in casu», como já afirmámos, por falta de interpelação do banco autor nesse sentido, não houve vencimento antecipado das 21ª à 48ª prestações que o réu se havia obrigado a pagar [em reembolso do crédito que o banco autor lhe concedeu], as quais continuaram a vencer-se, sequencialmente, nas datas que para tal haviam sido estipuladas; e o que naquele douto aresto se apreciou e decidiu foi saber se “num contrato de mútuo oneroso comercial (…), vencidas todas as prestações em razão da falta de alguma delas, por accionamento da respectiva cláusula pelo mutuante, são ou não devidos, além do capital ainda em dívida, os juros remuneratórios que estavam incluídos nas mesmas prestações, respeitantes a prazo que ainda não tenha decorrido no momento do vencimento antecipado” [cfr. o que nele se exarou no início do seu ponto V]. Deste modo, com a fundamentação que fica expressa, nenhuma censura há que imputar à douta sentença recorrida por ter condenado o réu a pagar os indicados juros remuneratórios e demais despesas acordadas relativamente às 28 prestações que este não pagou nas datas dos respectivos vencimentos. 5. Resta a questão da capitalização de juros, contra a qual o recorrente também se insurge. A sentença fundamentou este segmento condenatório nos seguintes termos: “(…), quanto aos juros de mora, a capitalização de juros é permitida, atento o disposto no artigo 560.º, n.º 3, do Código Civil e no artigo 5.º, n.º 4, do citado Decreto-Lei n.º 344/78 e ainda, conforme o decidido no ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, de 17 de Maio de 1988, publicado na Tribuna de Justiça de Julho/Agosto de 1988, página 37. Assim, considerando que as prestações eram devidas no dia 30 de cada mês o mais tardar, a partir de 30 de Junho de 1999, e que foram pagas as 20 primeiras mensalidades, temos que são devidos juros desde 30 de Março de 2001. Neste âmbito, porém, durante o tempo que correu desde 30 de Março de 2001 até 30 de Junho de 1999 (data do fim de duração do contrato) [aqui há manifesto lapso de escrita, pois quis-se dizer 30 de Junho de 2003], convém distinguir entre capital e juros e demais despesas incluídas no montante global de CHF 17.504,20 (dezassete mil quinhentos e quatro francos e vinte cêntimos). De facto, de molde a evitar a dificuldade dos juros remuneratórios, dever-se-á, por um lado, contabilizar os juros devidos sobre o capital desde 30 de Março de 2001 até 30 de Junho de 2003. Por outro lado, dever-se-á calcular os juros devidos sobre os juros e demais despesas (incluídos no montante global) respectivos desde o vencimento de cada uma das prestações de 30 de Março de 2001 até 30 de Junho de 2003. Temos, assim, que até 30 de Junho de 2003 são devidos juros de mora no montante de CHF 5’266,85, ao que acresce juros vencidos e vincendos desde essa data até efectivo e integral pagamento, à taxa de 9,25%”. Estamos de acordo com a admissibilidade legal da capitalização de juros no caso em apreço, em atenção ao disposto nos normativos e no douto aresto citados no excerto acabado de transcrever. E concordamos, igualmente, com o cômputo dos juros de mora relativamente ao montante efectivamente em dívida resultante da soma do valor do capital não reembolsado, referente às 21ª a 48ª prestações [não pagas], dos respectivos juros remuneratórios e das demais despesas convencionadas, já que o montante em dívida inclui todas estas parcelas. Tais juros de mora incidem, entre 30/03/2001 [data em que se venceu a 21ª prestação] e 30/06/2003 [data do vencimento da última prestação], sobre cada uma das prestações mensalmente vencidas e não pagas e a partir deste última data sobre o montante global em dívida. Foi este o cálculo que foi feito na douta sentença. Como o recorrente não põe em causa o valor nela apurado a título de juros de mora, nada mais resta se não concluir que a douta apelação também não merece acolhimento neste segmento. Improcede, assim, «in totum», o recurso.* *Síntese conclusiva: . O vencimento imediato das prestações previsto no art. 781º do CCiv. só tem lugar mediante interpelação, nesse sentido (devido à não realização de alguma das prestações já vencidas), do credor ao devedor. . Quando o credor lança mão de tal antecipação do cumprimento da obrigação, não tem direito a exigir do devedor o chamado «interusurium», ou seja, os frutos naturais ou civis correspondentes ao período da antecipação, entre os quais se contam os juros remuneratórios convencionados nos contratos de mútuo bancário. . É a estas situações que se reporta o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 7/2009, de 25/03. . Quando, apesar do não pagamento de uma das prestações da obrigação (reembolso do mútuo), o banco credor não interpela o devedor nos termos e para os efeitos do citado art. 781º, continuando as demais prestações e vencerem-se nas datas acordadas (sem que, também elas, sejam pagas), já não funciona a jurisprudência do referido AUJ; neste caso, o banco credor tem direito a exigir do devedor, além do capital, os juros remuneratórios (e demais despesas) incluídos no montante de cada uma das prestações vencidas e não pagas. . E pode, ainda, exigir, nos termos do nº 3 do art. 560º do CCiv., os juros de mora referentes a cada uma dessas prestações vencidas e não pagas, desde o dia seguinte ao do vencimento de cada uma delas. * * * V. Decisão: Em conformidade com o exposto, os Juízes desta secção cível da Relação do Porto acordam em: 1º) Julgar improcedente a apelação e confirmar a decisão recorrida [embora, quanto a uma das questões apreciadas, com fundamentação algo diversa]. 2º) Condenar o recorrente nas custas desta fase recursória. * * * Porto, 2013/03/21 Manuel Pinto dos Santos Francisco José Rodrigues de Matos Maria João Fontinha Areias Cardoso
Pc. 144/09.3TBVLP.P1 – 2ª Sec. (apelação) ________________________ Relator: M. Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Francisco Matos Des. Maria João Areias * * *Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B....., com sede na Suíça, instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma sumária, contra C..... e mulher, D....., residentes em Valpaços, pedindo a condenação destes a pagarem-lhe a quantia de 28.519,54 € (vinte e oito mil, quinhentos e dezanove euros e cinquenta e quatro cêntimos), acrescido dos juros vincendos, até integral e efectivo pagamento. Para tal, alegou que: . celebrou com o réu marido um contrato de crédito pessoal, mediante o qual lhe emprestou a quantia de 25.000,00 CHF (francos suíços), tendo o demandado ficado obrigado a reembolsar esta quantia, acrescida de juros à taxa de 5,75% ao ano e das despesas administrativas e do seguro à taxa de 3,50% ao ano, em 48 prestações mensais de 625,15 e cada, a pagar até ao dia 30 de cada mês a partir de 30/06/1999; . o réu pagou as primeiras 20 mensalidades, mas não pagou as restantes; . apesar de o ter interpelado e de ter recorrido aos procedimentos administrativos legais (na Suíça) com vista à satisfação do crédito, o réu não regularizou a dívida; . a ré mulher é também responsável pela satisfação do crédito, por estar casada com o demandado sob o regime de comunhão de adquiridos, por a dívida ter sido contraída na constância do casamento e se ter destinado a fazer face às necessidades familiares de ambos. Os réus, citados, contestaram a acção por excepção (peremptória) e por impugnação, tendo alegado que o montante do crédito que está em dívida é de 17.504,20 CHF, que o banco autor não fundamentou a parte do pedido que excede este valor e que a responsabilidade pelo pagamento da dívida encontra-se transferida para a E….”, com a qual o réu marido celebrou um contrato de seguro aquando da outorga do contrato de crédito invocado na p. i.. Concluiu pugnando, em primeira linha, pela procedência das excepções peremptórias que invocou e, em segundo lugar, pela improcedência da acção, em qualquer caso com as legais consequências. Requereu, ainda, a intervenção principal provocada da seguradora “E….” como parte passiva. O banco autor respondeu às excepções peremptórias arguidas pelos réus e ao indicado incidente de intervenção de terceiros, tendo concluído pela improcedência daquelas e pelo indeferimento deste. Admitida a intervenção da “E…..” a título acessório (e não, como requerido, a título principal), foi a mesma citada mas não apresentou qualquer articulado/requerimento. Foi proferido despacho saneador tabelar e foram seleccionados os factos assentes e os controvertidos, estes formando a base instrutória, tendo aqueles sido objecto de reclamação por parte do banco autor. Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, no termo do qual foi proferido despacho de resposta aos quesitos da base instrutória. Seguiu-se a prolação da sentença que decidiu assim: “A) – Julga-se a presente acção parcialmente procedente, por só parcialmente provada, termos em que vai o réu C..... condenado a pagar ao autor B..... a quantia de CHF 23’172,60 (vinte e três mil cento e setenta e dois francos suíços e sessenta cêntimos), ao que acresce juros vencidos e vincendos desde 30 de Junho de 2003 até efectivo e integral pagamento, à taxa de 9,25%, devendo o pagamento deste montante ser feito nos respectivos contravalores em escudos ao câmbio do dia em que tiver lugar, dentro do limite do pedido de € 28.519,54 (vinte e oito mil quinhentos e dezanove euros e cinquenta e quatro cêntimos), acrescido de juros vincendos à taxa de 9,25%, contados desde a data da entrada da petição inicial até integral e efectivo pagamento. B) – No mais, julgando-se a acção improcedente, por não provada, vão os réus e a interveniente companhia de seguros “E….” absolvidos do contra si peticionado. Custas da acção pelo autor e réu na proporção do respectivo decaimento. Registe-se e notifique-se”. Inconformado com tal decisão, interpôs o réu C….. o recurso de apelação em apreço, cuja motivação culminou com as seguintes conclusões: “A) Da Acção A- O A. B....., pessoa colectiva de direito suíço, com sede em ….., em …., Suíça, interpôs, contra o aqui Réu - C..... e D....., sua mulher, acção de condenação, sob a forma sumária, na sequência de haver celebrado com o Réu marido, em 19 de Maio de 1999, um contrato designado por “Contrato de crédito pessoal nº C 3247.12.93 (H 815.15.67)”, mediante o qual lhe mutuou a quantia de CHF 25.000,00 (vinte e cinco mil francos suíços), acrescida de juros à taxa de 5,75% ao ano, despesas administrativas e de seguro à taxa de 3,50% ao ano, o que corresponde a uma taxa efectiva global de 9,25%, tudo no valor de CHF 5.007,20 (cinco mil e sete francos suíços e vinte cêntimos), sendo o valor de empréstimo, no final do contrato do valor global de CHF 30.007,20; B- E o R. declarou restituir-lhe tal quantia em 48 (quarenta e oito) prestações mensais, iguais e sucessivas, no valor de CHF 625,15 (seiscentos e vinte e cinco francos suíços e quinze cêntimos) cada uma, vencendo-se a primeira prestação no dia 30 de Junho de 1999 e a última no dia 30 de Junho de 2003; C- O Réu procedeu ao pagamento de 20 mensalidades, no valor de CHF 12.503,00, sendo que o pagamento da 20ª ocorreu em 23/02/2001. D- Após os procedimentos legais de execução e penhora ocorridos na Suíça, para cobrança da dívida em 14/12/2004 e 04/11/2005, respectivamente, encetou contacto através de carta enviada ao Réu para sua morada em Portugal. E- Veio a interpor a presente acção pedindo a sua condenação, no pagamento global da quantia de € 28.419,54. F- A sentença, e para o que interessa no presente recurso, veio a considerar parcialmente provada a acção e condenou o Réu a pagar ao A. a quantia de CHF 23.172,60, ao que acresce juros vencidos e vincendos desde 30 de Junho de 2003 até efectivo e integral pagamento à taxa de 9,25%, devendo o pagamento deste montante ser feito nos respectivos contra-valores em escudos (mero lapso, sendo Euros) ao câmbio do dia em que tiver lugar, dentro do limite do pedido de € 28.519,54, acrescido de juros vincendos à taxa de 9,25% contados desde a data da entrada da petição inicial até integral e efectivo pagamento. B) Dos juros remuneratórios e capitalização de juros G- A Juiz “a quo”, na fundamentação da sentença, considerou que o A. interpelou o Réu, quer por carta enviada para este em Portugal, quer pelo procedimento de execução, instaurado na Suíça e consequentemente ocorreu o vencimento de todas as prestações aquando do não pagamento da primeira, vencendo desde então juros” e convoca o art. 781º do C.C. - fls. 11 da sentença; H- E fixa temporalmente o vencimento do capital em 30/03/2001, calculando juros de mora desde essa data até 30/06/2003 (data em que o contrato terminaria), mas tendo por base a quantia de CHF 17.504,20, ou seja, como se o contrato se mantivesse até ao termo do prazo contratado e não tivesse havido vencimento antecipado do capital. I- Ora, na quantia de CHF 17.504,20 estão já incluídos juros remuneratórios, pré-calculados e incluídos, com o capital, nas prestações estabelecidas (conjuntamente com o capital) no pressuposto do cumprimento integral do contrato, que consiste em o mutuário ir liquidando prestações constantes, diluindo e antecipando o pagamento dos juros remuneratórios desde o momento em que passa a dispor do capital. J- Tais juros remuneratórios não são assim devidos, porquanto o A. renunciou ao beneficio do prazo, fazendo vencer-se, com o não pagamento da 21ª prestação, todas as restantes, mas apenas a título de capital. Logo, K- Por a obrigação de juros, ligada ao tempo e programa contratual, não se ter vencido, nem ter sequer nascido, também não há lugar à capitalização de juros nos termos previstos no art. 5º nº 4 do DL nº 344/78 de 17/11 e art. 560º nº 3 do CC. L- Para tal era necessário convenção posterior ao vencimento ou notificação judicial feita ao devedor para capitalizar os juros vencidos, o que não se provou nos autos, nem o A. sequer o alegou. Pelo que, M- E por tudo supra exposto, há contradição entre a fundamentação e a decisão, pois a Juiz “a quo” parte do pressuposto de que ocorreu o vencimento do capital remanescente, aquando do pagamento pelo Réu da 20ª prestação e última, em 23/02/2001 e o não pagamento da 21ª que correria em 30/03/2001 e depois, condena o réu a pagar o capital e juros remuneratórios já incluídos na quantia de CHF 17.504,20 e sobre estes os juros moratórios, que mais não é que a capitalização dos juros ou “juros de juros”, configurando anatocismo, previsto no art. 560º. N- Em suma, fundamenta num sentido e decide em sentido contrário. O- Pelo que, deverá ser apurada a quantia devida a título de capital vencido e posteriormente sobre o mesmo acrescerão os juros à taxa contratada desde 30/03/2001 até à entrada da acção em 27/05/2009, e a partir daí à taxa de juro legal até efectivo e integral pagamento. P- Foram violadas as seguintes normas: a) Artºs 781º, 1.142º, 1.146º e 560º do Código Civil; b) Artº 5º, nº 4 do DL nº 344/78 de 17/11; c) O Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 05/05/2009 do STJ. Assim, nestes termos e nos melhores de direito, deve ser revogada a sentença proferida pelo tribunal a quo, e consequentemente, ser considerada procedente, por provado, o presente recurso, decidindo esse venerando tribunal em conformidade”. O banco autor contra-alegou em defesa da confirmação da decisão recorrida. * * * II. Questões a apreciar e decidir: Sabendo-se que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente [art. 684º nº 3 e 685º-A nºs 1 e 3 do CPC, na redacção aqui aplicável, dada pelo DL 303/2007, de 24/08, atenta a data da instauração da acção], as questões que importa apreciar e decidir consistem em saber: . Se a sentença condenou o recorrente a pagar juros remuneratórios que não são devidos; . Se procedeu também a indevida capitalização de juros. [Consigna-se que, apesar do referido na conclusão M, não se conhecerá da eventual nulidade da sentença, prevista na al. c) do nº 1 do art. 668º do CPC, por o recorrente não ter invocado expressamente este vício – cfr. conclusões M a P]. * * * III. Factos provados: A) Na decisão recorrida foram dados como provados os seguintes factos [que não vêm postos em causa, nem enfermam dos vícios previstos no nº 4 do art. 712º do CPC]: 1. A autora é uma sociedade comercial de direito suíça que prossegue a actividade bancária, tendo por objecto a prática de todas as operações permitidas às instituições de crédito. 2. O réu marido dedica-se actualmente, em Portugal, à actividade de exploração agrícola. 3. No exercido da sua actividade comercial, e a pedido dos réus, a autora celebrou com o réu marido, em 19 de Maio de 1999, um acordo designado por “contrato de crédito pessoal nº C 3247.12.93 (H 815.15.67)”. 4. Nos termos de tal acordo a autora declarou emprestar ao réu a quantia de CHF 25.000,00 (vinte e cinco mil francos suíços). 5. E o réu declarou restituir-lhe tal quantia, acrescida de juros, despesas administrativas e de seguro no valor de CHF 5.007,20 (cinco mil e sete francos suíços e vinte cêntimos), perfazendo o montante global de CHF 30.007,20 (trinta mil e sete francos suíços e vinte cêntimos). 6. Declarou ainda o réu marido que a quantia referida em 5. seria paga em 48 (quarenta e oito) prestações mensais, iguais e sucessivas, no valor de CHF 625,15 (seiscentos e vinte e cinco francos suíços e quinze cêntimos) cada uma. 7. Desse acordo consta ainda que “o mutuário compromete-se a reembolsar esta quantia, acrescida dos juros (5,75% ao ano), das despesas administrativas e do seguro em caso de morte, desemprego após despedimento (3,50% ao ano), ou seja, uma taxa efectiva global de 9,25%, sem atrasos e sem interpelação prévia, em 48 mensalidades de Frs 625,15 cada uma, a pagar no dia 30 de cada mês o mais tardar, a partir de 30.06.1999.” 8. Na sequência do acordo referido em 4. foi celebrado um acordo com a Companhia de Seguros denominada “E….”, com sede na Avenue …. …. – …. – CH - 1001 Lausanne, designado por contrato de seguro, titulado pela Apólice nº 186 400, cujo teor se dá por integralmente reproduzido. 9. De acordo com o estipulado, a autora entregou a quantia referida em 4. ao réu marido através da respectiva transferência para a conta bancária deste último, no dia 19 de Maio de 1999. 10. Vencendo-se a primeira prestação no dia 30 do mês seguinte ao da efectiva liberação do capital na conta do réu marido (por aquela ter ocorrido após o dia 16), ou seja, no dia 30 de Junho de 1999. 11. Os réus procederam ao pagamento das primeiras 20 mensalidades. 12. Do documento de fls.101 designado por "pedido de execução" constam os seguintes dizeres: "Ao serviço de execuções de Genebra cantão de Genebra"; "Devedor: Senhor C....., nascido em 05.01.1955, …. …."; "Credor: B...../Departamento Contencioso Quai de L´Ille 17, 1211 Genebra 2"; "Título e data do crédito ou causa da obrigação: 1) Montante devido pelo contrato de crédito pessoal nº H815.15.67 de 19.05.1999, respectivamente sobre a conta interna BCG e Nº C3247.12.93, de acordo com os artigos 1 do contrato e 3 das suas condições gerais, 2) juros vencidos e não pagos em 14.12.2004, 3) despesas de aviso vencidas e não pagas em 14.12.2004". 13. Do documento de fls. 111 designado por "auto de penhora", constam os seguintes dizeres "O Serviço não encontrou quaisquer bens penhoráveis pertencentes ao devedor na morada deste. Não foi possível proceder à penhora do salário. Decorre dos avisos de penhora enviados aos diversos bancos sediados em Genebra que o devedor não é titular de qualquer conta nem detentor de contas-poupança." 14. Mais consta que “devedor C….. …crédito: capital…F30368,40 Juros…1481,65 Notificação … 180,85 Penhora….F 220,70 (…) Total ….F 32251,60” 15. Os réus contraíram casamento entre si, em 8 de Maio de 1976, sob o regime da comunhão de bens adquiridos. 16. A autora encetou um contacto, através de carta de interpelação enviada para o réu, em Portugal, com o intuito de solicitar a regularização da situação por parte do réu. B) Em conformidade com o disposto nos arts. 659º nº 3 e 713º nº 2 do CPC, consideram-se, ainda, provados os seguintes factos: 17. O procedimento executivo referido em 12 foi instaurado em 14/12/2004 [cfr. docs. de fls. 35, 104 e 108]. 18. A carta de interpelação referida em 16 foi enviada ao réu a 31/07/2008 e recepcionada por este em 01/08/2008 [cfr. docs. juntos a fls. 95 a 98; foi com base nestes documentos que a 1ª instância deu como provado aquele nº 16, como se afere da «motivação» do despacho de resposta aos quesitos da BI constante de fls. 304 a 306]. 19. O conteúdo de tal missiva [na parte relevante] é o seguinte: “Vimos pela presente, enquanto mandatários do B....., interpelar V. Exa., para o pagamento de: € 19.719,74 (dezanove mil setecentos e dezanove euros e setenta e quatro cêntimos), acrescido de juros no valor de € 5.531,72 (cinco mil quinhentos e vinte e um euros e setenta e dois cêntimos), contabilizados a partir de 07.11.2005, valor este relativo ao crédito pessoal nº C 3247.12.93 (H 815.15.67), celebrado a 19.05.1999. A título de despesas e encargos bancários são devidas as quantias de € 1.222,85 (mil duzentos e vinte e dois euros e oitenta e cinco cêntimos), O que tudo perfaz uma dívida no valor total de € 26.464,31 (vinte e seis mil quatrocentos e sessenta e quatro euros e trinta e um cêntimos). Apesar de estarmos mandatados para proceder judicialmente, parece-nos de toda a conveniência que a solução passe pelo pagamento voluntário da dívida em apreço no prazo máximo de 8 dias, evitando-se assim a sua cobrança judicial e consequentemente novas custas (…)”. * * * IV. Apreciação jurídica: 1. Nos autos está em causa um contrato de crédito pessoal, sob a forma de mútuo bancário [a sentença recorrida qualificou-o como tal e declarou, fundadamente, que lhe é aplicável a lei portuguesa, questões com que se conformaram as partes e que, por isso, não estão aqui em apreciação, remetendo-se, quanto a elas, para o que ali se decidiu], celebrado entre o banco autor e o réu, aqui recorrente, em 19/05/1999, mediante o qual o primeiro se obrigou a emprestar ao segundo a quantia de 25.000,00 CHF (francos suíços) e o segundo se vinculou a reembolsar tal quantia, acrescida de juros remuneratórios à taxa de 5,75%/ano e de despesas administrativas e de seguro, à taxa de 3,50%/ano, num total de 5.007,20 CHF [somando tudo a quantia de 30.007,20 CHF, no prazo de 48 meses, através de outras tantas mensalidades, iguais e sucessivas, de 625,15 CHF cada, a partir de 30/06/1999. O réu pagou apenas 20 das prestações a que se obrigou; não pagou a 21ª prestação nem nenhuma das seguintes. Com esta atitude constituiu-se, inequivocamente, em mora, nos termos dos arts. 804º nº 2 e 805º nº 2 al. a), ambos do CCiv. [trata-se de obrigação com prazo –prestações – certo]. Por estar em causa obrigação liquidável em prestações, há, ainda, que ter em conta o disposto no art. 781º do mesmo diploma legal, segundo o qual “se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas”. Trata-se de norma supletiva que admite convenção diversa das partes – art. 405º nº 1 do CCiv.. No caso, não se apurou que no apontado contrato as partes tenham estabelecido qualquer cláusula relativamente a tal assunto, nem que tenham afastado a aplicação daquele regime supletivo. A propósito daquele art. 781º, depois de se citar doutrina adequada, exarou-se na sentença, a dado passo, o seguinte: “(…), resultou provado que o autor/credor encetou um contacto, através de carta de interpelação enviada para o réu, em Portugal, com o intuito de solicitar a regularização da situação por parte do réu (facto apurado em 17), o que, até à presente data, não sucedeu. Acresce que o autor instaurou ainda a execução apurada em 12. Consequentemente, ocorreu o vencimento de todas as prestações aquando do não pagamento da primeira, vencendo desde então juros” [cfr. pg. 12 da sentença – fls. 341 dos autos]. Esta afirmação não se mostra, contudo, inteiramente consonante com a factologia provada, nem com os melhores ensinamentos da doutrina, incluindo a citada na própria sentença. Vejamos porquê. 2. O saudoso Prof. Antunes Varela [in “Das Obrigações em Geral”, vol. II, 7ª ed., pgs. 53-54], interpretando aquele preceito legal, ensinava que: “Se o comprador faltar ao pagamento de qualquer delas [de qualquer das prestações acordadas], imediatamente se vencerão, por força do preceito transcrito (…), todas as que ainda estejam em dívida. O inadimplemento do devedor, quebrando a relação de confiança em que assenta o plano de pagamento escalonado no tempo, justifica a perda do benefício do prazo quanto a todas as prestações previstas para futuro. O credor fica, por conseguinte, com o direito de exigir a realização, não apenas da prestação a que o devedor faltou, mas de todas as prestações restantes, cujo prazo ainda se não tenha vencido. Assim se deve interpretar o texto do artigo 781º, e não no sentido de que, vencendo-se imediatamente, ex vi legis, as prestações restantes, o devedor começa desde esse momento, ao arrepio da doutrina geral do artigo 805º, nº 1, a responder pelos danos moratórios. O vencimento imediato das prestações cujo prazo ainda se não vencera constitui um benefício que a lei concede – mas não decreta ela própria – ao credor, não prescindindo consequentemente da interpelação do devedor. A interpelação do devedor para que cumpra imediatamente toda a obrigação (realizando todas as prestações restantes) constitui a manifestação da vontade do credor em aproveitar o benefício que a lei lhe atribui”. E quanto às consequências da interpelação do credor para que o devedor cumpra imediatamente toda a obrigação, ensina o Prof. Menezes Cordeiro [in “Tratado de Direito Civil Português”, II, Direito das Obrigações, tomo IV, 2010, pg. 40] que “quando haja antecipação do cumprimento, suscita-se o problema da atribuição do interusurium, isto é, da atribuição dos frutos naturais ou civis correspondentes ao período da antecipação”, acrescentando que “quando o credor possa antecipar o cumprimento, nos casos em que a lei lho permite, o interusurium compete, logicamente, ao devedor”. 3. Mas será que «in casu» o banco autor lançou mão do mecanismo previsto no citado art. 781º? Na sentença deu-se resposta afirmativa a esta questão chamando à colação a carta de interpelação referida no nº 16 dos factos provados e o procedimento de execução mencionado no nº 12, a que o banco autor recorreu. Enunciemos os factos relevantes. A dívida era pagável em 48 prestações mensais e sucessivas, no montante de 625,15 CHF cada. O respectivo prazo de pagamento decorreria entre 30/06/1999 [data da 1ª prestação] e 30/06/2003 [data em que deveria ser paga a 48ª prestação]. O réu só pagou até à 20ª prestação, presumindo-se que esta teve lugar no final de Fevereiro de 2001 [no doc. junto a fls. 31 e 32 consta que a mesma foi paga a 23/02/2001]. Apesar de não ter satisfeito as prestações seguintes [da 21ª à 48ª], a verdade é que o banco autor nada fez até ao vencimento da última, pois as únicas interpelações apuradas foram as duas que atrás se deixaram sinalizadas: a instauração do procedimento executivo [que vale como interpelação judicial] e o contacto através da missiva fotocopiada a fls. 95-96. Mas estas, porque tiveram lugar já depois do vencimento da última das indicadas prestações [aquele procedimento foi instaurado a 14/12/2004 e a citação do aqui réu no seu âmbito, se efectivamente teve lugar, ocorreu em data posterior; a missiva referida em segundo lugar foi recebida pelo réu em 01/08/2008], não podiam ter como efeito, nem tiveram [veja-se, por ex., o conteúdo da dita missiva transcrito no último número dos factos provados do ponto III], o vencimento antecipado de nenhuma delas, previsto no art. 781º. E não tendo havido tal vencimento antecipado [pelo contrário, apesar da respectiva falta de pagamento, cada uma das 21ª à 48ª prestações foi-se vencendo apenas na data em que o demandado se tinha obrigado a pagar cada uma delas, ou seja, no dia 30 de cada um dos meses que mediaram entre 30/03/2001 e 30/06/2003], não se coloca a questão de saber se o banco autor tem o direito de exigir, nesta acção, além do capital mutuado, também o «interusurium» de que fala o segundo Autor supra citado, ou seja, no caso, os juros remuneratórios e as despesas que foram incluídos nos montantes das prestações mensais que o réu se vinculou a pagar; é evidente que tem direito a exigir deste tais juros e despesas. Juros e despesas estes em que, apesar da incorrecta afirmação/conclusão atrás transcrita, a douta sentença condenou – e bem - o ora recorrente, não havendo nesta condenação qualquer violação do preceituado no citado art. 781º, como acabámos de ver. 4. O recorrente sustenta, no entanto, que, ao assim ter decidido, a Mma. Julgadora «a quo» desrespeitou o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do STJ nº 7/2009, de 25/03/2009 [publicado na 1ª Série do DR de 05/05/2009]. Proclamou-se neste AUJ que “no contrato de mútuo oneroso liquidável em prestações, o vencimento imediato destas ao abrigo de cláusula de redacção conforme ao art. 781º do Código Civil não implica a obrigação de pagamento dos juros remuneratórios nelas incorporados”. Isto depois de nele se terem enunciado as seguintes “premissas nucleares” que suportam esta Jurisprudência [transcrevem-se as que aqui relevam]: “A obrigação de capital constitui nos contratos de mútuo oneroso, comercial ou bancário, liquidável em prestações, uma obrigação de prestação fraccionada ou repartida, efectuando-se o seu cumprimento por partes, em momentos temporais diferentes, mas sem deixar de ter por objecto uma só prestação inicialmente estipulada, a realizar em fracções; Diversamente, os juros remuneratórios enquanto rendimento de uma obrigação de capital, proporcional ao valor desse mesmo capital e ao tempo pelo qual o mutuante dele está privado, cumpre a sua função na medida em que exista e enquanto exista a obrigação de capital; A obrigação de juros remuneratórios só se vai vencendo à medida em que o tempo a faz nascer pela disponibilidade do capital; Se o mutuante, face ao não pagamento de uma prestação, encurta o período de tempo pelo qual disponibilizou o capital e pretende recuperá-lo, de imediato e na totalidade o que subsistir, só receberá o capital emprestado e a remuneração desse empréstimo através dos juros, até ao momento em que o recuperar, por via do accionamento do mecanismo previsto no art.º 781.º do C. Civil; (…) O mutuante, caso opte pela percepção dos juros remuneratórios convencionados, terá de aguardar pelo decurso do tempo previsto para a duração do contrato e como tal, abster-se de fazer uso da faculdade prevista no art.º 781º do Código Civil, por directa referência à lei ou a cláusula de teor idêntico inserida no contrato; Prevalecendo-se do vencimento imediato, o ressarcimento do mutuante ficará confinado aos juros moratórios, conforme as taxas acordadas e com respeito ao seu limite legal e à cláusula penal que haja sido convencionada; (…)”. Basta atentar em cada uma destas premissas e à sua sequência para se ver que a decisão recorrida não incumpriu a Jurisprudência fixada em tal AUJ, desde logo, porque «in casu», como já afirmámos, por falta de interpelação do banco autor nesse sentido, não houve vencimento antecipado das 21ª à 48ª prestações que o réu se havia obrigado a pagar [em reembolso do crédito que o banco autor lhe concedeu], as quais continuaram a vencer-se, sequencialmente, nas datas que para tal haviam sido estipuladas; e o que naquele douto aresto se apreciou e decidiu foi saber se “num contrato de mútuo oneroso comercial (…), vencidas todas as prestações em razão da falta de alguma delas, por accionamento da respectiva cláusula pelo mutuante, são ou não devidos, além do capital ainda em dívida, os juros remuneratórios que estavam incluídos nas mesmas prestações, respeitantes a prazo que ainda não tenha decorrido no momento do vencimento antecipado” [cfr. o que nele se exarou no início do seu ponto V]. Deste modo, com a fundamentação que fica expressa, nenhuma censura há que imputar à douta sentença recorrida por ter condenado o réu a pagar os indicados juros remuneratórios e demais despesas acordadas relativamente às 28 prestações que este não pagou nas datas dos respectivos vencimentos. 5. Resta a questão da capitalização de juros, contra a qual o recorrente também se insurge. A sentença fundamentou este segmento condenatório nos seguintes termos: “(…), quanto aos juros de mora, a capitalização de juros é permitida, atento o disposto no artigo 560.º, n.º 3, do Código Civil e no artigo 5.º, n.º 4, do citado Decreto-Lei n.º 344/78 e ainda, conforme o decidido no ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, de 17 de Maio de 1988, publicado na Tribuna de Justiça de Julho/Agosto de 1988, página 37. Assim, considerando que as prestações eram devidas no dia 30 de cada mês o mais tardar, a partir de 30 de Junho de 1999, e que foram pagas as 20 primeiras mensalidades, temos que são devidos juros desde 30 de Março de 2001. Neste âmbito, porém, durante o tempo que correu desde 30 de Março de 2001 até 30 de Junho de 1999 (data do fim de duração do contrato) [aqui há manifesto lapso de escrita, pois quis-se dizer 30 de Junho de 2003], convém distinguir entre capital e juros e demais despesas incluídas no montante global de CHF 17.504,20 (dezassete mil quinhentos e quatro francos e vinte cêntimos). De facto, de molde a evitar a dificuldade dos juros remuneratórios, dever-se-á, por um lado, contabilizar os juros devidos sobre o capital desde 30 de Março de 2001 até 30 de Junho de 2003. Por outro lado, dever-se-á calcular os juros devidos sobre os juros e demais despesas (incluídos no montante global) respectivos desde o vencimento de cada uma das prestações de 30 de Março de 2001 até 30 de Junho de 2003. Temos, assim, que até 30 de Junho de 2003 são devidos juros de mora no montante de CHF 5’266,85, ao que acresce juros vencidos e vincendos desde essa data até efectivo e integral pagamento, à taxa de 9,25%”. Estamos de acordo com a admissibilidade legal da capitalização de juros no caso em apreço, em atenção ao disposto nos normativos e no douto aresto citados no excerto acabado de transcrever. E concordamos, igualmente, com o cômputo dos juros de mora relativamente ao montante efectivamente em dívida resultante da soma do valor do capital não reembolsado, referente às 21ª a 48ª prestações [não pagas], dos respectivos juros remuneratórios e das demais despesas convencionadas, já que o montante em dívida inclui todas estas parcelas. Tais juros de mora incidem, entre 30/03/2001 [data em que se venceu a 21ª prestação] e 30/06/2003 [data do vencimento da última prestação], sobre cada uma das prestações mensalmente vencidas e não pagas e a partir deste última data sobre o montante global em dívida. Foi este o cálculo que foi feito na douta sentença. Como o recorrente não põe em causa o valor nela apurado a título de juros de mora, nada mais resta se não concluir que a douta apelação também não merece acolhimento neste segmento. Improcede, assim, «in totum», o recurso.* *Síntese conclusiva: . O vencimento imediato das prestações previsto no art. 781º do CCiv. só tem lugar mediante interpelação, nesse sentido (devido à não realização de alguma das prestações já vencidas), do credor ao devedor. . Quando o credor lança mão de tal antecipação do cumprimento da obrigação, não tem direito a exigir do devedor o chamado «interusurium», ou seja, os frutos naturais ou civis correspondentes ao período da antecipação, entre os quais se contam os juros remuneratórios convencionados nos contratos de mútuo bancário. . É a estas situações que se reporta o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 7/2009, de 25/03. . Quando, apesar do não pagamento de uma das prestações da obrigação (reembolso do mútuo), o banco credor não interpela o devedor nos termos e para os efeitos do citado art. 781º, continuando as demais prestações e vencerem-se nas datas acordadas (sem que, também elas, sejam pagas), já não funciona a jurisprudência do referido AUJ; neste caso, o banco credor tem direito a exigir do devedor, além do capital, os juros remuneratórios (e demais despesas) incluídos no montante de cada uma das prestações vencidas e não pagas. . E pode, ainda, exigir, nos termos do nº 3 do art. 560º do CCiv., os juros de mora referentes a cada uma dessas prestações vencidas e não pagas, desde o dia seguinte ao do vencimento de cada uma delas. * * * V. Decisão: Em conformidade com o exposto, os Juízes desta secção cível da Relação do Porto acordam em: 1º) Julgar improcedente a apelação e confirmar a decisão recorrida [embora, quanto a uma das questões apreciadas, com fundamentação algo diversa]. 2º) Condenar o recorrente nas custas desta fase recursória. * * * Porto, 2013/03/21 Manuel Pinto dos Santos Francisco José Rodrigues de Matos Maria João Fontinha Areias Cardoso