I - Contrato de adesão é aquele em que um dos contraentes, não tendo participação na preparação das respectivas cláusulas, se limita a aceitar o texto que o outro contraente, normalmente uma empresa de apreciável dimensão, pré-elaborou e apresenta já impresso, em geral, à generalidade do público interessado, sendo ainda certo que, por regra, tais contratos apresentam-se impregnados de uma defesa exaustiva do interesse da parte emitente ou pré-disponente em contraponto com uma flagrante alijamento dos direitos e expectativas da parte cliente/aderente. II - O contrato em causa nos autos deve ser qualificado como um verdadeiro contrato de adesão, ora individualizado, e o seu clausulado, designadamente o ponto 5.7.4 é tipicamente uma cláusula contratual geral e deve ser escrutinada à luz do respectivo regime jurídico. III - A cláusula que, em contrato de adesão, estipula que “em caso de denúncia antecipada pelo cliente, (…) terá direito a uma indemnização por danos (…) no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado” impõe consequências patrimoniais gravosas ao aderente/cliente, devendo, como tal ser considerada uma cláusula penal desproporcionada aos danos a ressarcir. IV - Tal cláusula conduz necessariamente a uma desproporção sensível e flagrante entre o montante da pena e o montante dos danos a reparar, atendendo ao quadro negocial padronizado em que o contrato se integra, contrariando o princípio da boa-fé a que alude o art.º 15.º do DL n.º 446/85, de 25.10, sendo proibida nos termos previstos na al. c), do art.º 19.º do mesmo diploma e consequentemente nula.
Apelação Processo n.º 1801/12.2 TBPVZ.P1 Tribunal Judicial de Póvoa de Varzim – 3.º Juízo Cível Recorrente – B…., Ld.ª Recorrido - Condomínio do Edifício n…. da Rua C….., Póvoa do Varzim. Relatora – Anabela Dias da Silva Adjuntas – Desemb. Maria do Carmo Domingues Desemb. José Bernardino de Carvalho Acordam no Tribunal da Relação do Porto (1.ªsecção cível) I – “B......., Ld.ª”, com sede no …., Apartado …, …., Mem Martins, propôs no Tribunal Judicial da Póvoa de Varzim a presente acção declarativa de condenação, com forma de processo sumário, contra “Condomínio do Edifício n.º ….”, com sede na Rua C…., n.º …, Póvoa de Varzim, pedindo a condenação do réu a pagar-lhe a quantia de €4.646,40, acrescida dos juros vencidos, à taxa legal e contabilizados até 8.08.2012, no valor de €732,99 e, bem assim, dos vincendos, desde 9.08.2012, e até integral pagamento (calculados sobre o capital em dívida, isto é, €4.646,40). Alegou para tanto e, em síntese, que tem como actividades principais o fornecimento, a montagem e a conservação de elevadores e que, com data de 12.10.2009, o réu celebrou com a autora um contrato de conservação de elevadores, denominado “Contrato B….. Controlo OC”, nos termos do qual, e com a duração inicial de cinco anos, renováveis por iguais períodos, a autora obrigava-se a conservar os dois elevadores instalados no edifício do réu. Os serviços contratados tinham o valor mensal inicial de €80,00, acrescido de IVA. Após o compromisso contratual livremente assumido com a autora, o réu, por carta datada de 16 de Outubro de 2009, e recepcionada pela autora a 20 de Outubro de 2009, rescindiu o contrato que celebrara e que constitui a causa de pedir nos presentes autos, sem que nada o fizesse prever e ao arrepio do contrato celebrado com a autora, tendo celebrado contrato com outra empresa de manutenção de ascensores para efectuar a manutenção dos elevadores. Mais alega que não reconhece qualquer justa causa de resolução, porquanto negociou com o réu, durante meses, de forma ética e responsável, o contrato em causa, que foi livremente aceite pelo administrador do réu. Pelo que, facturou a sanção contratual, devida nos termos da cláusula “5.7.4.” e enviou a factura, no valor de €4.646,40, ao réu, mas este não a pagou. *O réu pessoal e regularmente citado, veio contestar pedindo a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido. Para tanto, alegou, em síntese, que desconhece a autora, nunca esteve nas suas instalações, não conhece os seus representantes ou administradores, nem negociou rigorosamente nada com estes, porque o processo negocial se resumiu a uma insistência durante algum tempo de alguém que se apresentou como sendo vendedor dos serviços da autora, de manutenção de elevadores, que “massacrou” o administrador do condomínio aqui réu para celebrar contrato, sendo que, após insistências por telefone e por contacto pessoal, convenceu o administrador a assinar o contrato junto aos autos com a promessa de que a assinatura era um mero pro forma e que o contrato só seria vigente após a comunicação para o efeito pelo administrador do condomínio, já que o administrador do condomínio sempre referiu ao suposto vendedor da autora que não tinha capacidade para poder contratar o serviço sem a aprovação da Assembleia de Condóminos. O documento que integra o contrato junto foi entregue pelo suposto vendedor ao administrador do condomínio, e foi assinado no meio da rua junto à entrada do condomínio, pelo que o administrador do condomínio e os administradores da autora nunca estiveram em simultâneo na sede ou nas delegações da empresa aqui autora, nem em qualquer outro lugar, tendo a autora entregue a terceiro a condução do negócio, tendo como única pretensão obter a assinatura no contrato, não acautelando sequer de verificar os poderes de contratação do administrador. Terminou defendendo que o contrato foi celebrado à distância, nos termos do art.º 2.º do D.L. n.º 143/2001 de 26 de Abril e que o réu dispunha do prazo de 14 dias para proceder à resolução do contrato, direito que exerceu tempestivamente, não tendo a autora prestado qualquer serviço ao réu, nem aquela alega qualquer prejuízo que tenha sofrido, sendo certo que sempre tal cláusula penal teria que ser objecto de redução nos termos do art.º 812.º do C.Civil.*A autora veio responder, invocando não terem sido individualizadas as excepções, por parte do réu, bem como impugnou a qualificação jurídica do contrato, feita pelo réu, defendendo que não se aplica o regime dos contratos à distância. Defende a autora que é uma empresa devidamente estruturada e organizada, por sectores e departamentos, onde se incluem os técnicos comerciais, que asseguram a ligação, quotidiana, entre a companhia e os seus clientes, e que têm como atribuições, entre outras, a prospecção de mercado tendo em vista o alargamento da carteira de clientes, recebendo para o efeito formação. Por outro lado, alega, ao ser celebrado este tipo de contrato com o cliente, é-lhe explicado o seu conteúdo e o cliente, não se conformando com alguma cláusula, pode derrogá-la, sendo que o contrato celebrado resulta de um processo de negociações entre os contraentes. Pelo que, refere, o que sucedeu neste caso foi que a concorrente da autora com quem o réu anteriormente celebrara contrato, ao ver um cliente sair-lhe da carteira, ofereceu uma proposta mais baixa, a que o réu não resistiu. No mais impugna a restante alegação do réu, e defendeu a fórmula para encontrar a cláusula penal fixada e a improcedência da defesa por excepção invocada pelo réu.*Foi proferido despacho saneador e dispensada a selecção da matéria de facto e elaboração da base instrutória.*Realizou-se o julgamento da matéria de facto, após o que foi proferida a respectiva sentença, onde se “julgou improcedente a presente acção e, em consequência, absolveu-se o réu “Condomínio do Edifício n.º ….”, do pedido contra si formulado nestes autos pela autora “B......., Ld.ª”. *Inconformada com tal decisão dela veio a autora interpor recurso de apelação pedindo a sua revogação e substituição por outra que julgue a acção procedente e condene o réu no pedido. A apelante juntou aos autos as suas alegações que terminam com as seguintes conclusões: 1. A A. celebrou com o R. um contrato de manutenção de dois elevadores deste; 2. O pôs termo ao contrato dos autos antes do termo do prazo contratado; 3. A A. facturou a cláusula penal contratualmente prevista, cujo pagamento veio reclamar nesta Acção; 4. O Julgador a quo decidiu (e bem) não se aplicar ao contrato dos autos o regime dos contratos à distância, nomeadamente o período de reflexão estabelecido, pelo que nada obstaria à aplicação da cláusula penal convencionada; 5. Porém, absolveu o R. do pagamento da factura relativa a sanção contratual por entender a referida cláusula nula, ao abrigo do regime das cláusulas contratuais gerais; 6. É quanto a esta absolvição que nos insurgimos; 7. O Julgador a quo qualificou o contrato como de adesão, determinando a nulidade da cláusula penal contratada; 8. Contudo, nenhuma das partes alegou que o contrato foi celebrado sem negociação do respectivo conteúdo (porque não poderiam, com verdade, fazê-lo); 9. O ónus da prova constante do n.º 3 do art.º 5.º do DL n.º 446/85, de 25.10 que, no caso, recaía sobre a A. não afasta o ónus de alegação, que, no caso, não podia deixar de recair sobre o R.; 10. De facto, seria irrazoável que se exigisse que a A. fizesse prova sobre matéria nunca invocada; 11. Além disso, o simples facto de um contrato constar de um pré-impresso não o caracteriza como de adesão; 12. A qualificação feita ao contrato dos autos, salvo o devido respeito, partiu de um pressuposto absolutamente errado, qual seja o de assumir que o mesmo é um Contrato de Adesão e, como tal, sujeito à disciplina do RJCCG, pese embora nada nos autos permitisse uma certeza quanto a tal qualificação; 13. Nem sequer foi a A. convidada a pronunciar-se sobre tal possibilidade, dando-lhe oportunidade de provar que, no caso em apreço, o conteúdo contratual proposto era passível de alteração, como o exigiria o princípio do contraditório (n.º 3 do art.º 3.º do CPC); 14. Pois que ao cliente, a cada cliente, de per si, assiste o direito de contratar coisa diversa ao figurino de base proposto, fazendo inscrever as derrogações e/ou aditamentos negociados, que se passarão a aplicar, substituindo aquelas; 15. Por outro lado, a A. celebra e sempre está disposta a celebrar textos contratuais da lavra dos seus clientes, sinal evidente que é possível negociar individualmente cada uma das condições da relação contratual que se pretende estabelecer; 16. Acresce que o próprio contrato revela que houve negociação efectiva entre A. e R., de tal forma que foi derrogada a cláusula relativa ao preço, ao contratar-se um ano de prestação gratuita de serviços, mediante a redacção de uma condição particular (Tal circunstância leva a crer que o R. tinha a possibilidade de negociar o restante clausulado geral, nomeadamente a relativa à cláusula penal); 17. Tal negociação resultou também da interpretação conjugada da al g) da matéria de facto provada, bem como do depoimento da testemunha da A., …. (cujo depoimento se encontra gravado em 10:37:27 a 11:11:57), e ainda do depoimento de parte (conforme redução a escrito constante da acta da sessão de audiência de discussão e julgamento); 18. Por isso, entende a A. que, na selecção da meteria de facto relevante que resultou provada, deveriam ser aditados dois ponto com a seguinte redacção: - As cláusulas gerais do contrato eram passíveis de alteração pelo R.; - Na sequência de negociações prévias à assinatura referida em 2), em sede de “Condições Contratuais Específicas”, no campo relativo às “Condições Particulares”, acordaram A. e R. que “no período de 01.11.2009 a 30.10.2010 a manutenção será gratuita”; 19. Como bem refere o douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18.06.2013: “Não são cláusulas contratuais gerais as cláusulas constantes de um contrato que, além de condições gerais, contém condições específicas que as partes puderam negociar entre si, tendo também negociado pelo menos uma daquelas condições gerais.” (proferido no âmbito do proc. 25382/10.2 T2SNT.L1, tendo por relator João Ramos e Sousa, ao que e sabe não publicado; 20. Assim, o contrato dos autos não é um mero Contrato de Adesão (do tipo dos praticados, por exemplo, para os telemóveis, instituições financeiras ou para os seguros, como a regra da normalidade social o sugere), sujeito ao RJCCG, antes se lhe aplicam as regras do Direito das Obrigações, com as legais consequências; 21. A cláusula penal contratada assume a dupla vertente coercitiva e ressarcitória; 22. Tal cláusula visa, em lugar de discutir os prejuízos de uma saída precipitada e injustificada de um dado contrato de uma carteira de clientes, o que levaria anos a demonstrar, definir logo a fórmula do seu cálculo, como a doutrina acolhe e sem margens para dúvidas e/ou discussões; 23. A A. está dimensionada (através da sua equipa de técnicos, administrativos, stock de peças, parque automóvel e ferramentas) para atender – bem – os seus clientes e se um deles resolve pôr termo ao seu contrato, sem justa causa para o efeito, já sabe que incorre numa sanção predefinida que aceitou ao contratar sem mais discussões; 24. A circunstância de o cliente saber previamente qual a sanção em que incorre, caso queira pôr termo à relação contratual com a A. de forma injustificada, é, paradoxalmente, uma segurança para ele cliente: em lugar de a A. ter que quantificar depois os prejuízos resultantes dessa atitude do cliente, e poderem vir a constituir uma surpresa – que até podia ser para mais – ao serem reclamados, o cliente assim já sabe qual a quantificação exacta dessa sua atitude insensata e injustificada; 25. Não existe, pois, qualquer desproporcionalidade da cláusula penal contratada, que é, assim, válida e eficaz; 26. Razão pela qual deve o presente recurso proceder, condenando-se o R. no pagamento da cláusula penal, como peticionado.*Não há contra-alegações. II – Da 1.ª instância chegam-nos assentes os seguintes factos: a) A autora tem como actividades, principais, o fornecimento, a montagem e a conservação de elevadores; b) Com data de 12.10.2009, o réu celebrou com a autora um contrato de conservação de elevadores, denominado “Contrato B…. Controlo OC”, nos termos que constam do documento junto aos autos a fls.7 e seguintes, e que aqui se dá por integralmente reproduzido; c) Nos termos desse contrato, e com a duração inicial de 5 anos, renováveis por iguais períodos, a autora obrigava-se a conservar os dois elevadores, instalados no edifício do réu, o qual se identifica como segue: tipo de contrato: SXB204/5; facturação: trimestral; duração do contrato: início em 01.11.2009 e termo inicial em 30.10.2014; d) Os serviços contratados tinham o valor mensal inicial de €80,00, acrescido de IVA; e) O réu remeteu à autora carta datada de 16 de Outubro de 2009, e recepcionada pela autora a 20 de Outubro de 2009, mediante a qual declarava rescindir “do contrato que foi celebrado” com a autora, nos termos que constam do documento cuja cópia se encontra junta aos autos a fls.10 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; f) O réu actuou em conformidade com o aludido em e) por ter decidido manter o acordo que celebrara anteriormente com a empresa que prestava serviços semelhantes aos aludidos no acordo referido em b); g) As negociações entre a autora e o réu decorreram durante meses até ser subscrito o acordo aludido em b); h) A autora facturou o valor referente a sanção contratual a que alude a cláusula “5.7.4.” do acordo referido em b) e enviou ao réu a factura n.º FCN10902387, em causa nos autos; i) A autora e o réu trocaram a correspondência a que se referem os documentos juntos aos autos a fls.10 verso, 11 e 11 verso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; j) O réu não procedeu ao pagamento à autora da factura aludida em h), cuja cópia se encontra junta a fls.12 dos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, no valor de €4.646,40; k) A autora solicitou ao réu o pagamento da referida factura, designadamente através das cartas cujas cópias se encontram juntas aos autos a fls.12 verso e 13, e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; l) As conversações com vista ao contrato aludido em b) foram estabelecidas entre o administrador do condomínio réu e o comercial da autora e foi este que, após tal acordo ter sido subscrito pelo administrador do condomínio, levou o documento a que se alude em b) para ser assinado pelo legal representante da autora, não tendo o administrador do condomínio se deslocado às instalações da autora; m) O referido comercial da autora contactou o administrador do condomínio réu, quer por telefone quer pessoalmente, com vista a obter o acordo aludido em b), até este ser subscrito pelo administrador do réu; n) O administrador do condomínio e os administradores da autora nunca estiveram em simultâneo na sede ou nas delegações da empresa aqui autora; o) A autora não chegou a prestar, efectivamente, serviços de manutenção e conservação de elevadores ao réu; p) A autora é uma empresa estruturada e organizada por sectores e departamentos, onde se incluem os técnicos comerciais, que asseguram a ligação, quotidiana, entre a companhia e os seus clientes; q) Incluem-se nas atribuições destes colaboradores, entre outras, a prospecção de mercado tendo em vista o alargamento da carteira de clientes; r) Os referidos técnicos recebem formação a aplicar no contacto com os clientes, efectivos e potenciais; s) O conteúdo do contrato aludido em b) foi dado a conhecer ao administrador do condomínio réu desde a fase da negociação até à celebração do mesmo; t) O administrador do condomínio réu subscreveu e carimbou o contrato aludido em b); u) A empresa concorrente da autora, com quem o réu tinha celebrado contrato anteriormente, propôs ao réu melhor oferta de serviços e preços do que o que anteriormente existia. III – Como é sabido o objecto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente (art.ºs 5.º, 635.º n.º3 e 639.º n.ºs 1 e 3, do N.C.P.Civil), para além do que é de conhecimento oficioso, e porque os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, ele é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida. Sendo que ao presente recurso ainda é aplicável o regime processual no NCPC, por a decisão em crise ter sido proferida antes de 1 de Setembro de 2013.*Ora, visto o teor das alegações da apelante são questões a decidir nos autos: 1.ª- Da nulidade da sentença, por alegado excesso de pronúncia. 2.ª – Da qualificação do contrato. 3.ª – Da cláusula penal estipulada.*1.ªquestão – Da nulidade da sentença – excesso de pronúncia. Diz a apelante que o tribunal recorrido não poderia ultrapassar a falta de alegação das partes e decidir que a cláusula penal em apreço deveria ser analisada à luz do regime das cláusulas contratuais gerais e, sem sequer permitir que a ora apelante pudesse fazer a prova da efectiva negociação do clausulado contratual. Pelo que, ao assim se ter agido, feriu-se a sentença de nulidade, nos termos do disposto na al. d) do n.º 1 do art.º 615.º do C.P.Civil. Vejamos. Como é sabido, segundo o disposto no art.º 615º n.º1 al. d) do C.P.Civil, a sentença é nula se deixa de conhecer na sentença de questões de que devia tomar conhecimento ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Ora, este vício traduz-se no incumprimento ou desrespeito por parte do julgador, do dever prescrito no art.º 608.º n.º2 do C.P.Civil, cfr. Antunes Varela, in “Manual de Processo Civil”, pág 690 e Rodrigues Bastos, in “Notas ao Código de Processo Civil”, vol. III, pág. 247, segundo o qual deve o juiz resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outra e não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. Importa, porém, ter em linha de conta que uma coisa são os argumentos ou as razões de facto e ou de direito e outra, essencialmente diversa, as questões de facto ou de direito. As questões a que se reporta a alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do C.P.Civil são os pontos de facto e ou de direito relevantes no quadro do litígio, ou seja, os concernentes ao pedido, à causa de pedir e às excepções do respectivo litígio. Ou, como se decidiu nos Acs do STJ de 8.01.2004 e 5.02.2004, ambos in www.dgsi.pt, “essas questões centram-se nos pontos fáctico-jurídicos que estruturam as posições das partes na causa, designadamente os que se prendem com a causa de pedir, o pedido e as excepções”. Ora visto o teor da contestação junta aos autos pelo réu, não é verdade que o mesmo não tenha alegado que a cláusula penal em causa não tenha sido objecto de negociação entre as partes. Para tanto, veja-se o que consta dos art.ºs 2.º a 11.º de tal peça, onde o réu conclui que todo o iter contratual não foi objecto de “qualquer negociação ética e responsável”. Sendo certo também que como consta da resposta da autora, esta tomou posição sobre tal matéria, dizendo, em síntese, que ao ser celebrado este tipo de contrato com o cliente, é-lhe explicado o seu conteúdo e o cliente, não se conformando com alguma cláusula, pode derrogá-la, pelo que se autora melhor não se defendeu “sibi imputet”. Dizendo-se a este propósito na sentença recorrida que “No caso dos autos, recaía sobre a autora o ónus de alegar e provar que a citada cláusula do contrato resultou de negociação prévia entre as partes. E tal não foi sequer expressamente alegado pela autora, mesmo quando na resposta que apresentou respondeu às excepções invocadas pelo réu, referindo apenas que se o réu pretendesse derrogar qualquer norma poderia fazê-lo, o que não se provou, nem seria provável que tal possibilidade coubesse ao réu, nomeadamente quanto à cláusula aqui em causa”. Por outro lado, e como também resulta expressamente da decisão recorrida a apreciação da validade ou invalidade da cláusula penal em apreço pode e deve ser feita oficiosamente pelo tribunal, dispensando-se a alegação da parte interessada nesse sentido, ou seja, consignou a esse propósito a 1.ª instância que “De referir, finalmente, que, e tal como se defendeu no Ac. da R.P., de 19.02.2004 (também disponível em www.dgsi.pt), nos contratos de adesão as cláusulas penais manifestamente desproporcionais aos danos, não são redutíveis, mas nulas. Como tal, o tribunal pode declarar a respectiva nulidade, oficiosamente.”, por força do disposto no art.º 286.º do C.Civil. Pelo que, sem necessidade de outros considerandos, o tribunal recorrido pronunciou-se sobre o que devia apreciar e decidir, pelo que se não verifica a apontada nulidade da sentença recorrida. Improcedem as respectivas conclusões da apelante. *2.ªquestão – Da qualificação do contrato. Está assente nos autos que a autora, ora apelante, que tem como actividades, principais, o fornecimento, a montagem e a conservação de elevadores, no dia 12.10.2009, celebrou com o réu um contrato de conservação de elevadores, denominado “Contrato B…. Controlo OC”, nos termos do documento junto a fls.7 e seguintes dos autos, designadamente com a duração inicial de 5 anos, renováveis por iguais períodos, com início em 1.11.2009 e termo inicial em 30.10.2014; obrigando-se a autora a conservar os dois elevadores, instalados no edifício do réu, sendo a facturação trimestral e tendo os serviços contratados o valor mensal inicial de €80,00, acrescido de IVA. Trata-se, pois, de um contrato de prestação de serviços, que tinha por objecto a execução de trabalhos de assistência, manutenção e conservação dos elevadores do réu. Tais contratos subsumem-se à figura jurídica prevista no art.º 1154.º do C.Civil, aplicando-se-lhes o regime jurídico do contrato de mandato, “ex vi” do art.º 1156.º do C.Civil, e o que demais as partes contrataram. Diz a apelante que a 1.ª instância, sem qualquer justificação, considerou que o contrato de manutenção “sub judice” era um contrato de adesão, todavia, nenhuma alegação das partes e nenhuma prova produzida permitia chegar a tal conclusão. Desde já há que deixar consignado que a qualificação de certo contrato é matéria de Direito, logo não carece o juiz de alegação das partes neste ou naquele sentido no que toca a à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, bastando, no caso concreto, os factos alegados pelas partes no que concerne ao contrato celebrado, documentados pelo teor de fls. 7 e seguintes dos autos. Sobre o que de ve entender por contrato de adesão, veja-se o Ac. do STJ de 17.02.2011, in www.dgsi.pt, onde se pode ler que “os "contratos de adesão", instrumentos reguladores por excelência da massificação, tenham merecido a atenção dos Estados com vista a procurar minorar, tanto quanto possível, as desigualdades provocadas por abusos de regulamentação e capciosidades em consequência do modo como são por vezes intencionalmente redigidos pelos respectivos proponentes. Fruto desta tendência, o DL n.º 446/85 de 25 de Outubro, de inspiração germânica, surgiu entre nós como a primeira tentativa de disciplinar as cláusulas contratuais gerais insertas nos contratos – estatuindo que "as cláusulas gerais elaboradas sem prévia negociação individual que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem respectivamente a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente Diploma" – cfr. artigo 1º nº 1”. Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, vol. I, pág. 265, defines contratos de adesão como sendo aqueles em que um dos contraentes (o cliente ou consumidor) “não tendo a menor participação ou preparação das respectivas cláusulas, se limita a aceitar o texto que o outro contraente oferece, em massa, ao público interessado”. O contrato de adesão é resultante da evolução económico-social que trouxe consigo o abalar dos quadros tradicionais do contrato concebido em termos quase exclusivos de um acordo celebrado entre vontades após prévia negociação. A massificação do comércio jurídico e o fornecimento de bens e serviços em larga escala, tornados bens de primeira necessidade, não se compadece já com as morosas e personalizadas fases de negociação prévia moldadas à luz do figurino liberal. Assim, o crescimento desmesurado do comércio, tornou premente e necessária a criação de novos instrumentos jurídicos em ordem a dar resposta eficaz às necessidades surgidas com o eclodir na nova realidade socio-económica. Consequentemente, as grandes empresas uniformizaram os seus contratos de molde a “acelerar as operações necessárias à colocação dos produtos e a planificar nos diferentes aspectos, as vantagens e as adscrições que lhes advêm do tráfico jurídico”. Todavia, e a breve trecho se fez sentir a necessidade de regulamentar este tipo de contratação, muitas vezes agressiva e desequilibrada; como refere Galvão Telles, in “Manual dos Contratos em Geral”, Actualizado, pag. 334: “a homogeneização das relações económicas provoca sem dúvida um desequilíbrio entre as partes contratantes (…) que reclamam a intervenção tutelar do legislador para que o contrato não deixe de ser, como cumpre, um instrumento de justiça. É essa a função disciplinadora dos instrumentos normativos destinados a conformar o conteúdo dos contratos de adesão com determinados fins que o legislador tem em vista restringindo a sua aplicação e alcance, ao mesmo tempo que através delas visa proceder ao respectivo controlo em ordem a garantir a eticidade do seu conteúdo. Cabem neste último escopo além do mais as normas tendentes a proteger o contratante aderente, necessariamente mais débil, das disfunções provocadas pela desigualdade contratual das partes”. Como bem evidencia o Prof. Oliveira Ascensão, in “Teoria Geral do Direito Civil”, vol. III, pág.364, “O contrato de adesão é uma manifestação fatal da sociedade de massas. O contrato de adesão oferece por outro lado grandes perigos. A parte que predispõe os termos contratuais está naturalmente tentada a considerar muito mais os seus interesses que os do aderente. Os contratos de adesão costumam ser assim caracterizados por uma defesa exaustiva dos interesses do emitente, e um desinteresse marcado pelo que respeita ao aderente”. E, por isso, para que as cláusulas gerais e pré-estabelecidas se possam considerar parte integrante desses contratos é necessário que sejam aceites pela outra parte, o que só pode, evidentemente, ocorrer se esta tiver conhecimento dessas componentes da proposta negocial, pois que sem esse conhecimento não se pode falar de uma livre, consciente e correcta formação de vontade, daí que o dever de comunicação, na íntegra, dos projectos negociais, seja uma simples decorrência do princípio da boa-fé contratual, cfr. art.º 227.º do C.Civil. Entendendo-se, pois, por contrato de adesão aquele em que um dos contraentes, não tendo participação na preparação das respectivas cláusulas, se limita a aceitar o texto que o outro contraente, normalmente uma empresa de apreciável dimensão, pré-elaborou e apresenta já impresso, em geral, à generalidade do público interessado, sendo ainda certo que, por regra, tais contratos apresentam-se impregnados de uma defesa exaustiva do interesse da parte emitente ou pré-disponente em contraponto com uma flagrante alijamento dos direitos e expectativas da parte cliente/aderente. Não nos restam dúvidas de que o contrato em apreço nos autos, em termos de formação e interpretação, é um contrato de adesão, ou seja, é um contrato cujas cláusulas contratuais gerais foram previamente elaboradas pela autora/apelante sem qualquer possibilidade de negociação com o réu, que se limitou a aceitá-las, sendo além disso, um documento que encerra uma disciplina contratual minuciosamente gizada, em bloco e em série, elaborada previamente pela proponente/autora/ apelante, destinando-se a uma generalidade de destinatários, e que, no seu essencial, perante um qualquer cliente, não é objecto de qualquer alteração ou modificação relevante. É, pois, um contrato-tipo, em que as condições gerais estão previamente elaboradas por um dos contraentes e o outro contratante se limita a elas aderir, o que já não ocorre com as condições particulares e específicas, aspectos que, total ou parcialmente, podem variar de contrato para contrato e, assim, implicam necessariamente negociação e acordo entre as partes. Como tal, trata-se de um contrato sujeito ao regime jurídico constante do DL n.º 446/85, de 25.10, pois a parte substancial e relevante do mesmo é formado a partir de cláusulas contratuais gerais. Improcedem as respectivas conclusões da apelante. *3.ªquestão – Da cláusula penal. Sob a cláusula 5.7.4 do contrato de assistência e manutenção de elevadores em causa nos autos estipula-se que “Uma vez que a natureza, âmbito e duração dos serviços contratados, é elemento conformante da dimensão da estrutura empresarial da B….., em caso de denúncia antecipada do presente Contrato pelo CLIENTE, a B…. terá direito a uma indemnização por danos, que será imediatamente facturada, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado”. Ora, está assente nos autos que o contrato em causa foi celebrado no dia 12.10.2009, e que segundo os seus termos, o mesmo tinha uma duração inicial de 5 anos, renováveis por iguais períodos, com início em 1.11.2009 e termo inicial em 30.10.2014, que a respectiva facturação era trimestral, sendo o preço mensal inicial de €80,00, acrescido de IVA. Como acima já se deixou consignado, e sem que a autora tenha prestado qualquer serviço, o réu remeteu à autora uma carta data de 18.10.2009, recebida a 20.10.2009, pela qual declarava pretender “rescindir” o contrato em causa, e que o réu assim agiu por ter decidido manter o acordo que celebrara anteriormente com a uma outra empresa que prestava serviços semelhantes aos da autora. E estribada na supra referida cláusula 5.7.4. a autora facturou, sob o n.º FCN10902387, ao réu, o valor de €4.545,40, referente a tal sanção contratual por denúncia antecipada do contrato. A 1.ª instância, por vai da decisão recorrida, veio a julgar a cláusula “5.7.4”, em causa nula, por desproporcionada aos danos a ressarcir, por força do disposto na alínea c) do art.º 19.º do DL n.º 446/85, pelo que, sendo relativamente proibida, seria igualmente nula, ex vi do art.º12 do mesmo diploma, tendo para tanto referido, correctamente e a propósito, que “Conclui-se, pois, que há um notório abuso da posição da autora, proponente de tal cláusula inserta no contrato em causa, cuja aplicação acarreta um forte desequilíbrio entre situações idênticas de incumprimento, e que devem fundamentar, segundo os juízos da razoabilidade, a nulidade da cláusula (…) Tal cláusula deva ser considerada proibida, por ofender a al. c) do artigo 19.º do D.L. nº 446/85, pelo que não poderá ser atendida para efeitos de atribuição da indemnização peticionada, sendo que a autora apenas fundamentou a sua pretensão com recurso a tal cláusula. Por outro lado, não se vislumbra que na situação em apreço, atentas as circunstâncias aludidas e o momento em que o réu comunicou à autora a sua pretensão de cessar o contrato – poucos dias após a sua assinatura pelo réu e mesmo antes do início previsto para a sua vigência – hajam danos sofridos. De referir, finalmente, que (…), nos contratos de adesão as cláusulas penais manifestamente desproporcionais aos danos, não são redutíveis, mas nulas. Como tal, o tribunal pode declarar a respectiva nulidade, oficiosamente (…)”. *Insurge-se agora a autora apelante contra o assim decidido, mas sem qualquer razão, aliás como vem sendo recorrente a nível da nossa jurisprudência, deixando-se desde já consignado que, no caso em apreço, nenhuma censura nos merece a decisão alcançada na sentença recorrida, nem a respectiva fundamentação. Alega a apelante que a fórmula de cálculo encontrada na cláusula em causa é perfeitamente justificável e explica-se pelo facto de, em vez, da autora ter de alegar e provar, em cada caso, danos concretos e de se estabelecer só o quantum sancionatório, acorda com os seus clientes a criação dessa fórmula que tem a grande vantagem de dar aos clientes a prévia noção da sanção em que incorrem se não houver justa causa para a rescisão. E que até se poderia cogitar o caso de a autora ter danos superiores, mas não os poderá peticionar, o que funciona em evidente benefício e segurança dos seus clientes. Mais defende a apelante que se dimensionou para garantir o cumprimento integral do contrato celebrado, perspectivando os benefícios que obteria com os lucros provenientes desse cumprimento e não obstante ser uma empresa líder de mercado, com uma boa estrutura técnica, também é verdade que cada elevador constante da sua carteira é tratado de forma igual, não sendo indiferente para a mesma prestar assistência a mais ou menos dois elevadores, pois se todos os seus clientes decidissem extinguir o contrato que os vincula, na mesma data, a autora deixaria de obter qualquer rendimento, tendo de manter todos os compromissos (laborais, de fornecedores, etc) a que se havia vinculado. Sem esquecer que para começar a prestar serviços a cada novo elevador, a autora tem de reestruturar-se, através da constante avaliação do número dos seus trabalhadores, tendo mais de 600 trabalhadores efectivos, organização do trabalho técnico e administrativo, pela aquisição do material necessário, pela estruturação do seu parque automóvel, etc e ao não receber o pagamento da contrapartida convencionada, a autora deixou de auferir os lucros previstos, jamais podendo ser totalmente ressarcida, tendo um investimento sem o retorno no prazo que antevira, pelo que tem de ser ressarcida pela frustração da expectativa de ver um contrato integralmente cumprido por parte do cliente, quando havia uma livre vinculação a um determinado prazo.*A estas alegações da autora/apelante já se respondeu cabalmente na decisão recorrida, pelo que nos limitamos a aqui reproduzir alguns excertos. E assim, “(…) a referida cláusula 5.7.4 mostra-se inserida num conjunto de cláusulas previamente elaboradas, claramente não sujeitas a negociação individual e cujo conteúdo o destinatário não pôde, por certo, influenciar (…) da simples leitura e análise do contrato em causa, resulta a existência de cláusulas pré-elaboradas pela aqui autora que, pela sua tipologia e inserção formal no texto do documento, não foram por certo objecto duma negociação individual cláusula a cláusula.(…), o conteúdo do documento junto pela autora traduz uma disciplina contratual minuciosamente gizada, em bloco e em série, elaborada previamente pela proponente, destinando-se a uma generalidade de destinatários, tendendo, no seu essencial, a não ser objecto de modificação relevante ou significativa”. Concluindo-se que “(…)na situação em apreço se apurou, não obstante a negociação ocorrida entre autora e réu e o conhecimento que foi dado a este do conteúdo do contrato, não há dúvida de que as cláusulas que nele foram inseridas pela autora, segundo um modelo pré-elaborado, universal ou standardizado, só teoricamente seriam alteráveis ou negociáveis”. E mais adiante diz-se ainda que “(…)recaía sobre a autora o ónus de alegar e provar que a citada cláusula do contrato resultou de negociação prévia entre as partes. E tal não foi sequer expressamente alegado pela autora, mesmo quando na resposta que apresentou respondeu às excepções invocadas pelo réu, referindo apenas que se o réu pretendesse derrogar qualquer norma poderia fazê-lo, o que não se provou, nem seria provável que tal possibilidade coubesse ao réu, nomeadamente quanto à cláusula aqui em causa”. Consigna-se depois, na sentença recorrida que, no caso concreto, se está perante o pagamento de sanção pecuniária e que “(…)atento o teor de tal cláusula penal e as consequências que da sua aplicação advêm para o cliente ou aderente, no caso o aqui réu, não pode deixar de considerar-se que se está perante uma desproporção significativa entre o montante da pena e o montante dos danos a reparar. A cláusula em apreço impõe, pois, consequências patrimoniais gravosas ao aderente (…) devendo, como tal ser considerada uma cláusula penal desproporcionada aos danos a ressarcir. A aludida cláusula 5.7.4. revela um manifesto desequilíbrio contratual de interesses, pois a aqui autora limita-se a acautelar os seus interesses negociais ao inserir cláusulas padronizadas insusceptíveis de negociação, conduzindo a uma fidelização forçada dos clientes ao longo dos anos sob pena de se verem obrigados ao pagamento de uma pesada penalização em caso de resolução negocial, alcançando a proponente desta cláusula não só parte dos lucros esperados pelo cumprimento integral do contrato, ao mesmo tempo que liberta a sua estrutura empresarial do cumprimento do referido contrato, já que deixa de ter de suportar as despesas inerentes à manutenção, designadamente, com equipamentos, materiais, tempo de trabalho, etc., antecipando o recebimento das quantias que deveriam ser aferidas até ao termo do contrato. Relativamente ao quantum indemnizatório fixado, a priori, por via da dita cláusula, diz-se na decisão recorrida que “(…) embora os danos concretos em cada situação não possam por si só relevar, como se disse – certo é que em situações como a presente, nem sequer há que invocar as expectativas que a angariação do réu como cliente possa ter suscitado na autora, pois poucos dias após a assinatura de tal contrato pelo administrador do réu, já este dava conta à autora da sua intenção de não pretender manter o contrato, e sendo certo que, na sequência de tal, a autora nunca chegou a iniciar a prestação dos serviços em causa. Pelo que, também a referência feita em tal cláusula, pela autora, à sua estrutura empresarial e duração do contrato, numa situação como a presente, não pode relevar. (…) a sanção concretamente cominada para o caso, que como se disse equivale ao cumprimento integral do contrato pelo cliente no que respeita à satisfação integral das quantias previstas como se tivesse ocorrido a execução da prestação pela autora pelo período convencionado, não pode ser considerada representativa, ainda que aproximativamente, do prejuízo normal ou típico que advém da prestação do serviço pela autora tal qual esta se mostra equacionada no quadro contratual. Nada justifica que uma tal extensão ressarcitiva se imponha em exclusivo benefício da autora, como parte pré-disponente, como compensação de supostas perdas com a logística humana e material posta ao serviço do contrato celebrado com o réu. Não se extrai do tal quadro padronizado que essa logística tenha sido propositadamente criada ou afecta a este contrato, pelo que, em condições normais, ela continuará com natural utilidade e proveito para a satisfação dos interesses da autora nas relações estabelecidas ou a estabelecer com outros clientes”. Considera-se ainda na sentença da 1.ª instância que “(…)no contrato em apreço, na sua cláusula 5.6., que se refere às situações de eventual incumprimento imputável à aqui autora, prevê-se que esta apenas responderá até à concorrência do valor de três meses de facturação, como máximo de indemnização a pagar ao cliente. Já quando se trata de incumprimento por parte do cliente, a indemnização é substancialmente diferente e com consequências bem mais gravosas (…)”. Tendo-se, por fim, concluído que “(…)há um notório abuso da posição da autora, proponente de tal cláusula inserta no contrato em causa, cuja aplicação acarreta um forte desequilíbrio entre situações idênticas de incumprimento, e que devem fundamentar, segundo os juízos da razoabilidade, a nulidade da cláusula(…)”.*Mas vejamos, sem contudo nos alongarmos, já que, como se disse, sufragamos a posição e a fundamentação constante da decisão recorrida. Como se sabe, a cláusula penal consiste, na definição constante do art.º 810.º nº 1 do C.Civil, na faculdade que as partes gozam de fixar, por acordo, o montante da indemnização exigível, ou, na convenção através da qual as partes fixam o montante da indemnização a satisfazer, em caso de eventual inexecução do contrato, cfr. Galvão Telles, in “Direito das Obrigações”, pág. 437. A cláusula penal tem a natureza de uma cláusula acessória e quer pela sua localização sistemática, e, muito particularmente, pela sua articulação lógica com o n.º 1 do art.º 811.º, o art.º 810.º n.º 1, também, do C.Civil, ao referir-se à “indemnização exigível”, cujo montante pode ser, previamente definido, através de cláusula penal, tem em vista as situações de inadimplemento, cumprimento a destempo ou cumprimento defeituoso da obrigação. A cláusula penal resulta de um acordo das partes e tem como finalidade a fixação antecipada de uma indemnização, compensatória ou moratória, pelo incumprimento ou retardamento no cumprimento da obrigação, com intuito de se evitarem futuras dúvidas e litígios entre as partes, quanto à determinação do montante da indemnização, cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil Anotado”, vol. II, pág. 75. Reveste uma função, fundamentalmente, ressarcitiva e tarifada, de natureza compulsória, agindo como meio de pressão sobre o devedor, mediante a ameaça de uma sanção pecuniária, com vista ao cumprimento pontual das obrigações que assumiu, mesmo que se prove que do seu incumprimento ou mora não adveio qualquer dano, cfr. Ferrer Correia e Henrique Mesquita, in “A Obra Intelectual como Objecto do Contrato de Empreitada”, ROA, Ano 45.º, 129 e ss; que não importa averiguar, em consequência da inexecução da obrigação ou da violação do contrato, nem determinar o seu montante, na hipótese da sua verificação, e bem assim como, igualmente, o respectivo nexo causal. A cláusula penal “destinando-se a substituir a indemnização que seria arbitrada pelo juiz, é exigível nos mesmos casos em que essa indemnização poderia ser reclamada, supondo, portanto, em termos gerais, a inexecução da obrigação e a culpa do devedor, isto é, só pode ser efectivada se este, culposamente, não tiver cumprido o contrato”, cfr. Galvão Telles, in obra citada, pág. 439. A cláusula penal (indemnizatória) como refere Pinto Monteiro, in “Cláusula Penal e Indemnização”, pág. 457 constitui “uma liquidação convencional antecipada dos prejuízos em caso de inexecução do contrato. Na situação de incumprimento, se estipulada uma cláusula penal, a indemnização corresponderá ao valor pactuado, a não ser que haja lugar à sua redução, face ao disposto no art.º 812.º do C.Civil, ou seja, convencionado o ressarcimento do dano excedente, nos termos do art.º 811.º n.º 2, do C.Civil, e é para esta última situação que se limita o valor da indemnização, nos termos do n.º 3 deste preceito, que não tem a ver com o valor da pena, quando não é pactuada a indemnização pelo dano excedente. Trata-se, pois, de uma cláusula indemnizatória. Esta, embora não tenha uma função coercitiva ou de compulsão ao cumprimento, acaba por produzir também esse efeito, na medida em que alerta o devedor para os riscos que corre em caso de inexecução do contrato e, por isso, estimula o cumprimento voluntário das obrigações assumidas. Trata-se de uma indemnização fixada a forfait, invariável, só redutível por razões de equidade”.*Insurge-se a apelante contra a aplicação em sede de sentença recorrida do regime das cláusulas contratuais gerais do DL n.º 446/85 de 25.10, com as alterações dos DL n.º 220/95 de 31.08, 249/99 de 7.07 e 323/2001 de 17.12, à cláusula 5.7.4 em apreço, dizendo que o contrato em causa foi efectiva e directamente negociado entre as partes, sendo que até tem aposta uma alteração do clausulado pré-elaborado, inscrito nas condições particulares (campo que no pré impresso se encontra em branco e se destina à inscrição das alterações e derrogações especificamente contratadas), no qual se estabelece o período de um ano de prestação de serviços de modo gratuito. Sendo ainda certo que o réu logrou negociar pelo menos uma das condições gerais, no que respeita ao pagamento do preço e início de facturação, o que segundo a apelante leva a crer que o réu tinha a possibilidade de negociar o restante clausulado geral, nomeadamente a relativa à cláusula penal. Como é sabido o que sobressai do regime do DL n.º 446/85, de 25.10, não é a maior ou menor generalidade das cláusulas contratuais, mas antes o seu carácter não negociável ou não influenciável por parte de, pelo menos, um dos contraentes, dessas das cláusulas. Preceitua o n.º1 do art.º 1.º do DL n.º 446/85 de 25.10 que “As cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respectivamente, a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente diploma”. E explicita o n.º 2 que “O presente diploma aplica-se igualmente às cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pôde influenciar”. Terminando o n.º3 estatuindo que “O ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo”. Pode-se definir as Cláusulas Contratuais Gerais (CCG) como sendo as normas minuciosamente elaboradas para serem inseridas, em bloco, num número massificado e padronizado de contratos em que intervém ou participa como contraente a entidade para esse efeito as pré-elaborou. Sendo formalmente apresentadas em documentos pré-impressos, pelo contraente que os elaborou a uma generalidade de contratantes, sem que estes tivessem tido qualquer possibilidade de contribuir para a sua formulação, ou de as alterar, modificar ou excluir do global do “pack” proposto. E assim para se chamar à colação o regime das Cláusulas Contratuais Gerais (CCG) há que primeiramente apurar se certa cláusula foi ou não objecto de negociação e discussão entre as partes, no sentido de poder ser modificada, excluída, ou aceite nos termos propostos. Pelo que, para a apreciação da validade de uma única cláusula do conteúdo de um contrato segundo o regime das CCG, não seja necessário estar-se perante um contrato de adesão propriamente dito, pois o que releva são as cláusulas em si e não a natureza do contrato, não obstante resultar da prática negocial que aquelas são, por regra, inseridas neste tipo de contratos. Mas sempre se dirá como se escreveu no Ac. da Relação de Coimbra de 20.11.2012, in www.dgsi.pt, que “a característica da inserção em formulário ou num modelo pré-elaborado e impresso do conjunto das cláusulas determinantes da vontade negocial das partes leva naturalmente a que o intérprete presuma a sua não negociabilidade, devendo essa configuração levar à qualificação do contrato como de adesão”. No caso em apreço, resulta assente nos autos que “as negociações entre a autora e o réu decorreram durante meses até ser subscrito o acordo”, ou seja, o contrato de assistência e manutenção de elevadores em causa. Por outro lado, está provado que o “comercial da autora contactou o administrador do condomínio réu, quer por telefone quer pessoalmente, com vista a obter o acordo” em apreço e, “até este ser subscrito pelo administrador do réu”. Finalmente provou-se que “o conteúdo do contrato (…) foi dado a conhecer ao administrador do condomínio réu desde a fase da negociação até à celebração do mesmo”. E assim sendo, parece que o réu teve durante meses a possibilidade de analisar as cláusulas do contrato, as quais lhe foram dadas a conhecer. Mas, recaía sobre a autora, ora apelante, o ónus de alegar e provar que a citada cláusula do contrato resultou de negociação prévia entre as partes, e tal prova, como resulta do acervo factual apurado, não foi feita nos autos. Todavia, vendo o teor do documento que contém o texto contratual em apreço nos autos, referente a uma prestação de serviço de assistência e manutenção de elevadores, dúvidas não temos de que as respectivas cláusulas aí foram pré-inseridas pela ora apelante, fazendo parte de um modelo contratual pré-elaborado, universal ou standardizado, admitindo apenas pequenas inserções pontuais relativas ao caso concreto, sem possibilidade de serem individualmente negociáveis, modificadas ou alteradas. Pelo que como acima já se deixou consignado, o contrato em causa deve ser qualificado como um verdadeiro contrato de adesão, ora individualizado, e o seu clausulado, designadamente o ponto 5.7.4 é tipicamente uma cláusula contratual geral e deve ser escrutinada à luz do respectivo regime jurídico, designadamente sob o prisma do dever de informação pré-contratual, do ónus de comunicação (art.º 5.º n.º3) e do dever de informação prévia (art.º 6.º) e, sobre o conteúdo das cláusulas, sendo aqui o dever de informação pré-contratual mais abrangente, incluindo também o esclarecimento do sentido das cláusula predispostas, independentemente de qualquer concreto juízo em função de critérios de boa-fé. De harmonia com o disposto no DL n.º 446/85 de 25.10, de entre as cláusulas contratuais gerais proibidas, existem aquelas que são absolutamente proibidas e as que são só relativamente proibidas. As cláusulas relativamente proibidas, (que interessam ao presente recurso) quer nas relações entre empresários ou entidades equiparadas (art.º 19.º) quer nas relações com consumidores finais (art.º 22.º) são-no desde que integram as situações descritas na lei e “consoante o quadro negocial padronizado”. Ao fixar os limites de conteúdo das cláusulas contratuais gerais, o DL. n.º 446/85, de 25.10, consagrou a boa-fé como o princípio geral de controlo, cfr. art.ºs 15.º e 16.º, enumerando-se nos art.ºs 18.º a 22.º um elenco de cláusulas absoluta ou relativamente proibidas. Preceitua o art.º 19.º al. c) do referido DL que são declaradas (relativamente) proibidas, consoante aquele quadro negocial padronizado, as “cláusulas penais desproporcionadas aos danos a ressarcir”. Vejamos, pois, se a cláusula penal em análise viola o princípio da boa-fé, pela “desproporção” relativamente aos danos a ressarcir. Como foi ponderado no Ac. do STJ de 12.06.2007, in www.dgsi.pt, o apelo ao quadro negocial padronizado, significa que a valoração a fazer deverá ter como referência, não o contrato singular ou as circunstâncias do caso, mas o tipo de negócio em causa e os elementos que normativamente o caracterizam, no interior de todo o regulamento contratual genericamente predisposto. Há assim que estabelecer uma relação entre o montante dos danos a ressarci e a pena fixada contratualmente, de modo a que se possa dizer que há uma equivalência entre os dois valores, para tanto atendendo-se não ao caso concreto, mas aos danos que “normal e tipicamente resultam, dentro do quadro negocial padronizado, em que o contrato se integra” segundo “critérios objectivos, numa avaliação prospectiva guiada por cálculos de proporcionalidade e valores médios e usuais, tendo em conta factores que, em casos daquele género, habitualmente relevam na produção e na medida dos prejuízos”. Quanto ao que se deve entender por “desproporcionada”, na expressão da al. b), do art.º 19.º do DL 446/85, de 25.10, e sem entrarmos na discussão doutrinal e jurisprudencial pendente sobre tal questão, entendemos que, na esteira do supra referido Ac. do STJ de 12.06.2007 e dos Profs. Menezes Cordeiro e Almeida e Costa, in “Cláusulas Contratuais Gerais. Anotação ao Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro”, pág. 47 “(…)o qualificativo “desproporcionado” não aponta para uma pura e simples superioridade das penas preestabelecidas em relação ao montante dos danos. Pelo contrário, deve entender-se, de harmonia com as exigências do tráfico e segundo um juízo de razoabilidade, que a hipótese em análise só ficará preenchida quando se detectar uma desproporção sensível (…)”, (na acepção de notória, mas que não tem de ser excessiva, manifesta, grave). No caso concreto, sem dúvidas que tem de se concluir que uma cláusula que, em contrato de adesão, estipula que “em caso de denúncia antecipada pelo cliente, (…) terá direito a uma indemnização por danos (…) no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado” impõe consequências patrimoniais gravosas ao aderente/cliente, devendo, como tal ser considerada uma cláusula penal desproporcionada aos danos a ressarcir. Na realidade tal cláusula ofende o princípio da boa fé contratual uma vez que patenteia um manifesto desequilíbrio contratual de interesses uma vez que a autora ora apelante se limita a acautelar os seus interesses negociais ao inserir cláusulas padronizadas insusceptíveis de negociação, conduzindo a uma fidelização forçada dos clientes ao longo dos anos sob pena de se verem obrigados ao pagamento de uma pesada penalização em caso de resolução negocial. Veja-se a título de exemplo o manifesto desequilíbrio entre o preceituado na cláusula 5.6 (incumprimento imputável à B.......) e na cláusula em análise, sendo que para o caso de denúncia antecipada por parte da B......., nada está previsto, e para o caso de incumprimento que lhe seja imputável, ela apenas responderá “(...) até à concorrência do valor de 3 meses de facturação (...) como máximo de indemnização a pagar ao cliente. Destarte temos de concluir que o que pretende a autora/apelante com a cláusula em análise é a penalização do cliente, mais do que salvaguardar uma reparação proporcionada ao dano, que evidentemente teve com a denúncia do contrato por parte do réu. E assim sendo tal conduz necessariamente a uma desproporção sensível e flagrante entre o montante da pena e o montante dos danos a reparar, atendendo ao quadro negocial padronizado em que o contrato se integra, contrariando o princípio da boa-fé a que alude o art.º 15.º do DL n.º 446/85, de 25.10, e sendo proibida nos termos previstos na al. c), do art.º 19.º do mesmo diploma, e consequentemente nula, pois que a perda de um cliente, como é o caso dos autos, não importa para a apelante a necessidade de dispensa de pessoal ou a perda de utilidade de material, equipamentos ou qualquer logística. Sem dúvidas poderá exigir algum ajustamento à gestão, mas dentro da dinâmica do próprio comércio, à perda de um cliente seguir-se-á, normalmente, a angariação de um outro. Sem esquecer como se refere na decisão recorrida que “(…)nem sequer há que invocar as expectativas que a angariação do réu como cliente possa ter suscitado na autora, pois poucos dias após a assinatura de tal contrato pelo administrador do réu, já este dava conta à autora da sua intenção de não pretender manter o contrato, e sendo certo que, na sequência de tal, a autora nunca chegou a iniciar a prestação dos serviços em causa. Pelo que, também a referência feita em tal cláusula, pela autora, à sua estrutura empresarial e duração do contrato, numa situação como a presente, não pode relevar”. Improcedem, pois, as derradeiras conclusões da apelante. Sumário – I - Contrato de adesão é aquele em que um dos contraentes, não tendo participação na preparação das respectivas cláusulas, se limita a aceitar o texto que o outro contraente, normalmente uma empresa de apreciável dimensão, pré-elaborou e apresenta já impresso, em geral, à generalidade do público interessado, sendo ainda certo que, por regra, tais contratos apresentam-se impregnados de uma defesa exaustiva do interesse da parte emitente ou pré-disponente em contraponto com uma flagrante alijamento dos direitos e expectativas da parte cliente/aderente. II - O contrato em causa nos autos deve ser qualificado como um verdadeiro contrato de adesão, ora individualizado, e o seu clausulado, designadamente o ponto 5.7.4 é tipicamente uma cláusula contratual geral e deve ser escrutinada à luz do respectivo regime jurídico. III - A cláusula que, em contrato de adesão, estipula que “em caso de denúncia antecipada pelo cliente, (…) terá direito a uma indemnização por danos (…) no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado” impõe consequências patrimoniais gravosas ao aderente/cliente, devendo, como tal ser considerada uma cláusula penal desproporcionada aos danos a ressarcir. IV - Tal cláusula conduz necessariamente a uma desproporção sensível e flagrante entre o montante da pena e o montante dos danos a reparar, atendendo ao quadro negocial padronizado em que o contrato se integra, contrariando o princípio da boa-fé a que alude o art.º 15.º do DL n.º 446/85, de 25.10, sendo proibida nos termos previstos na al. c), do art.º 19.º do mesmo diploma e consequentemente nula. IV – Pelo exposto, decide-se julgar a presente apelação improcedente e em confirmar a decisão recorrida. Custas pela apelante. Porto, 2014.04.08 Anabela Dias da Silva Maria do Carmo Domingues José Carvalho
Apelação Processo n.º 1801/12.2 TBPVZ.P1 Tribunal Judicial de Póvoa de Varzim – 3.º Juízo Cível Recorrente – B…., Ld.ª Recorrido - Condomínio do Edifício n…. da Rua C….., Póvoa do Varzim. Relatora – Anabela Dias da Silva Adjuntas – Desemb. Maria do Carmo Domingues Desemb. José Bernardino de Carvalho Acordam no Tribunal da Relação do Porto (1.ªsecção cível) I – “B......., Ld.ª”, com sede no …., Apartado …, …., Mem Martins, propôs no Tribunal Judicial da Póvoa de Varzim a presente acção declarativa de condenação, com forma de processo sumário, contra “Condomínio do Edifício n.º ….”, com sede na Rua C…., n.º …, Póvoa de Varzim, pedindo a condenação do réu a pagar-lhe a quantia de €4.646,40, acrescida dos juros vencidos, à taxa legal e contabilizados até 8.08.2012, no valor de €732,99 e, bem assim, dos vincendos, desde 9.08.2012, e até integral pagamento (calculados sobre o capital em dívida, isto é, €4.646,40). Alegou para tanto e, em síntese, que tem como actividades principais o fornecimento, a montagem e a conservação de elevadores e que, com data de 12.10.2009, o réu celebrou com a autora um contrato de conservação de elevadores, denominado “Contrato B….. Controlo OC”, nos termos do qual, e com a duração inicial de cinco anos, renováveis por iguais períodos, a autora obrigava-se a conservar os dois elevadores instalados no edifício do réu. Os serviços contratados tinham o valor mensal inicial de €80,00, acrescido de IVA. Após o compromisso contratual livremente assumido com a autora, o réu, por carta datada de 16 de Outubro de 2009, e recepcionada pela autora a 20 de Outubro de 2009, rescindiu o contrato que celebrara e que constitui a causa de pedir nos presentes autos, sem que nada o fizesse prever e ao arrepio do contrato celebrado com a autora, tendo celebrado contrato com outra empresa de manutenção de ascensores para efectuar a manutenção dos elevadores. Mais alega que não reconhece qualquer justa causa de resolução, porquanto negociou com o réu, durante meses, de forma ética e responsável, o contrato em causa, que foi livremente aceite pelo administrador do réu. Pelo que, facturou a sanção contratual, devida nos termos da cláusula “5.7.4.” e enviou a factura, no valor de €4.646,40, ao réu, mas este não a pagou. *O réu pessoal e regularmente citado, veio contestar pedindo a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido. Para tanto, alegou, em síntese, que desconhece a autora, nunca esteve nas suas instalações, não conhece os seus representantes ou administradores, nem negociou rigorosamente nada com estes, porque o processo negocial se resumiu a uma insistência durante algum tempo de alguém que se apresentou como sendo vendedor dos serviços da autora, de manutenção de elevadores, que “massacrou” o administrador do condomínio aqui réu para celebrar contrato, sendo que, após insistências por telefone e por contacto pessoal, convenceu o administrador a assinar o contrato junto aos autos com a promessa de que a assinatura era um mero pro forma e que o contrato só seria vigente após a comunicação para o efeito pelo administrador do condomínio, já que o administrador do condomínio sempre referiu ao suposto vendedor da autora que não tinha capacidade para poder contratar o serviço sem a aprovação da Assembleia de Condóminos. O documento que integra o contrato junto foi entregue pelo suposto vendedor ao administrador do condomínio, e foi assinado no meio da rua junto à entrada do condomínio, pelo que o administrador do condomínio e os administradores da autora nunca estiveram em simultâneo na sede ou nas delegações da empresa aqui autora, nem em qualquer outro lugar, tendo a autora entregue a terceiro a condução do negócio, tendo como única pretensão obter a assinatura no contrato, não acautelando sequer de verificar os poderes de contratação do administrador. Terminou defendendo que o contrato foi celebrado à distância, nos termos do art.º 2.º do D.L. n.º 143/2001 de 26 de Abril e que o réu dispunha do prazo de 14 dias para proceder à resolução do contrato, direito que exerceu tempestivamente, não tendo a autora prestado qualquer serviço ao réu, nem aquela alega qualquer prejuízo que tenha sofrido, sendo certo que sempre tal cláusula penal teria que ser objecto de redução nos termos do art.º 812.º do C.Civil.*A autora veio responder, invocando não terem sido individualizadas as excepções, por parte do réu, bem como impugnou a qualificação jurídica do contrato, feita pelo réu, defendendo que não se aplica o regime dos contratos à distância. Defende a autora que é uma empresa devidamente estruturada e organizada, por sectores e departamentos, onde se incluem os técnicos comerciais, que asseguram a ligação, quotidiana, entre a companhia e os seus clientes, e que têm como atribuições, entre outras, a prospecção de mercado tendo em vista o alargamento da carteira de clientes, recebendo para o efeito formação. Por outro lado, alega, ao ser celebrado este tipo de contrato com o cliente, é-lhe explicado o seu conteúdo e o cliente, não se conformando com alguma cláusula, pode derrogá-la, sendo que o contrato celebrado resulta de um processo de negociações entre os contraentes. Pelo que, refere, o que sucedeu neste caso foi que a concorrente da autora com quem o réu anteriormente celebrara contrato, ao ver um cliente sair-lhe da carteira, ofereceu uma proposta mais baixa, a que o réu não resistiu. No mais impugna a restante alegação do réu, e defendeu a fórmula para encontrar a cláusula penal fixada e a improcedência da defesa por excepção invocada pelo réu.*Foi proferido despacho saneador e dispensada a selecção da matéria de facto e elaboração da base instrutória.*Realizou-se o julgamento da matéria de facto, após o que foi proferida a respectiva sentença, onde se “julgou improcedente a presente acção e, em consequência, absolveu-se o réu “Condomínio do Edifício n.º ….”, do pedido contra si formulado nestes autos pela autora “B......., Ld.ª”. *Inconformada com tal decisão dela veio a autora interpor recurso de apelação pedindo a sua revogação e substituição por outra que julgue a acção procedente e condene o réu no pedido. A apelante juntou aos autos as suas alegações que terminam com as seguintes conclusões: 1. A A. celebrou com o R. um contrato de manutenção de dois elevadores deste; 2. O pôs termo ao contrato dos autos antes do termo do prazo contratado; 3. A A. facturou a cláusula penal contratualmente prevista, cujo pagamento veio reclamar nesta Acção; 4. O Julgador a quo decidiu (e bem) não se aplicar ao contrato dos autos o regime dos contratos à distância, nomeadamente o período de reflexão estabelecido, pelo que nada obstaria à aplicação da cláusula penal convencionada; 5. Porém, absolveu o R. do pagamento da factura relativa a sanção contratual por entender a referida cláusula nula, ao abrigo do regime das cláusulas contratuais gerais; 6. É quanto a esta absolvição que nos insurgimos; 7. O Julgador a quo qualificou o contrato como de adesão, determinando a nulidade da cláusula penal contratada; 8. Contudo, nenhuma das partes alegou que o contrato foi celebrado sem negociação do respectivo conteúdo (porque não poderiam, com verdade, fazê-lo); 9. O ónus da prova constante do n.º 3 do art.º 5.º do DL n.º 446/85, de 25.10 que, no caso, recaía sobre a A. não afasta o ónus de alegação, que, no caso, não podia deixar de recair sobre o R.; 10. De facto, seria irrazoável que se exigisse que a A. fizesse prova sobre matéria nunca invocada; 11. Além disso, o simples facto de um contrato constar de um pré-impresso não o caracteriza como de adesão; 12. A qualificação feita ao contrato dos autos, salvo o devido respeito, partiu de um pressuposto absolutamente errado, qual seja o de assumir que o mesmo é um Contrato de Adesão e, como tal, sujeito à disciplina do RJCCG, pese embora nada nos autos permitisse uma certeza quanto a tal qualificação; 13. Nem sequer foi a A. convidada a pronunciar-se sobre tal possibilidade, dando-lhe oportunidade de provar que, no caso em apreço, o conteúdo contratual proposto era passível de alteração, como o exigiria o princípio do contraditório (n.º 3 do art.º 3.º do CPC); 14. Pois que ao cliente, a cada cliente, de per si, assiste o direito de contratar coisa diversa ao figurino de base proposto, fazendo inscrever as derrogações e/ou aditamentos negociados, que se passarão a aplicar, substituindo aquelas; 15. Por outro lado, a A. celebra e sempre está disposta a celebrar textos contratuais da lavra dos seus clientes, sinal evidente que é possível negociar individualmente cada uma das condições da relação contratual que se pretende estabelecer; 16. Acresce que o próprio contrato revela que houve negociação efectiva entre A. e R., de tal forma que foi derrogada a cláusula relativa ao preço, ao contratar-se um ano de prestação gratuita de serviços, mediante a redacção de uma condição particular (Tal circunstância leva a crer que o R. tinha a possibilidade de negociar o restante clausulado geral, nomeadamente a relativa à cláusula penal); 17. Tal negociação resultou também da interpretação conjugada da al g) da matéria de facto provada, bem como do depoimento da testemunha da A., …. (cujo depoimento se encontra gravado em 10:37:27 a 11:11:57), e ainda do depoimento de parte (conforme redução a escrito constante da acta da sessão de audiência de discussão e julgamento); 18. Por isso, entende a A. que, na selecção da meteria de facto relevante que resultou provada, deveriam ser aditados dois ponto com a seguinte redacção: - As cláusulas gerais do contrato eram passíveis de alteração pelo R.; - Na sequência de negociações prévias à assinatura referida em 2), em sede de “Condições Contratuais Específicas”, no campo relativo às “Condições Particulares”, acordaram A. e R. que “no período de 01.11.2009 a 30.10.2010 a manutenção será gratuita”; 19. Como bem refere o douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18.06.2013: “Não são cláusulas contratuais gerais as cláusulas constantes de um contrato que, além de condições gerais, contém condições específicas que as partes puderam negociar entre si, tendo também negociado pelo menos uma daquelas condições gerais.” (proferido no âmbito do proc. 25382/10.2 T2SNT.L1, tendo por relator João Ramos e Sousa, ao que e sabe não publicado; 20. Assim, o contrato dos autos não é um mero Contrato de Adesão (do tipo dos praticados, por exemplo, para os telemóveis, instituições financeiras ou para os seguros, como a regra da normalidade social o sugere), sujeito ao RJCCG, antes se lhe aplicam as regras do Direito das Obrigações, com as legais consequências; 21. A cláusula penal contratada assume a dupla vertente coercitiva e ressarcitória; 22. Tal cláusula visa, em lugar de discutir os prejuízos de uma saída precipitada e injustificada de um dado contrato de uma carteira de clientes, o que levaria anos a demonstrar, definir logo a fórmula do seu cálculo, como a doutrina acolhe e sem margens para dúvidas e/ou discussões; 23. A A. está dimensionada (através da sua equipa de técnicos, administrativos, stock de peças, parque automóvel e ferramentas) para atender – bem – os seus clientes e se um deles resolve pôr termo ao seu contrato, sem justa causa para o efeito, já sabe que incorre numa sanção predefinida que aceitou ao contratar sem mais discussões; 24. A circunstância de o cliente saber previamente qual a sanção em que incorre, caso queira pôr termo à relação contratual com a A. de forma injustificada, é, paradoxalmente, uma segurança para ele cliente: em lugar de a A. ter que quantificar depois os prejuízos resultantes dessa atitude do cliente, e poderem vir a constituir uma surpresa – que até podia ser para mais – ao serem reclamados, o cliente assim já sabe qual a quantificação exacta dessa sua atitude insensata e injustificada; 25. Não existe, pois, qualquer desproporcionalidade da cláusula penal contratada, que é, assim, válida e eficaz; 26. Razão pela qual deve o presente recurso proceder, condenando-se o R. no pagamento da cláusula penal, como peticionado.*Não há contra-alegações. II – Da 1.ª instância chegam-nos assentes os seguintes factos: a) A autora tem como actividades, principais, o fornecimento, a montagem e a conservação de elevadores; b) Com data de 12.10.2009, o réu celebrou com a autora um contrato de conservação de elevadores, denominado “Contrato B…. Controlo OC”, nos termos que constam do documento junto aos autos a fls.7 e seguintes, e que aqui se dá por integralmente reproduzido; c) Nos termos desse contrato, e com a duração inicial de 5 anos, renováveis por iguais períodos, a autora obrigava-se a conservar os dois elevadores, instalados no edifício do réu, o qual se identifica como segue: tipo de contrato: SXB204/5; facturação: trimestral; duração do contrato: início em 01.11.2009 e termo inicial em 30.10.2014; d) Os serviços contratados tinham o valor mensal inicial de €80,00, acrescido de IVA; e) O réu remeteu à autora carta datada de 16 de Outubro de 2009, e recepcionada pela autora a 20 de Outubro de 2009, mediante a qual declarava rescindir “do contrato que foi celebrado” com a autora, nos termos que constam do documento cuja cópia se encontra junta aos autos a fls.10 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; f) O réu actuou em conformidade com o aludido em e) por ter decidido manter o acordo que celebrara anteriormente com a empresa que prestava serviços semelhantes aos aludidos no acordo referido em b); g) As negociações entre a autora e o réu decorreram durante meses até ser subscrito o acordo aludido em b); h) A autora facturou o valor referente a sanção contratual a que alude a cláusula “5.7.4.” do acordo referido em b) e enviou ao réu a factura n.º FCN10902387, em causa nos autos; i) A autora e o réu trocaram a correspondência a que se referem os documentos juntos aos autos a fls.10 verso, 11 e 11 verso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; j) O réu não procedeu ao pagamento à autora da factura aludida em h), cuja cópia se encontra junta a fls.12 dos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, no valor de €4.646,40; k) A autora solicitou ao réu o pagamento da referida factura, designadamente através das cartas cujas cópias se encontram juntas aos autos a fls.12 verso e 13, e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; l) As conversações com vista ao contrato aludido em b) foram estabelecidas entre o administrador do condomínio réu e o comercial da autora e foi este que, após tal acordo ter sido subscrito pelo administrador do condomínio, levou o documento a que se alude em b) para ser assinado pelo legal representante da autora, não tendo o administrador do condomínio se deslocado às instalações da autora; m) O referido comercial da autora contactou o administrador do condomínio réu, quer por telefone quer pessoalmente, com vista a obter o acordo aludido em b), até este ser subscrito pelo administrador do réu; n) O administrador do condomínio e os administradores da autora nunca estiveram em simultâneo na sede ou nas delegações da empresa aqui autora; o) A autora não chegou a prestar, efectivamente, serviços de manutenção e conservação de elevadores ao réu; p) A autora é uma empresa estruturada e organizada por sectores e departamentos, onde se incluem os técnicos comerciais, que asseguram a ligação, quotidiana, entre a companhia e os seus clientes; q) Incluem-se nas atribuições destes colaboradores, entre outras, a prospecção de mercado tendo em vista o alargamento da carteira de clientes; r) Os referidos técnicos recebem formação a aplicar no contacto com os clientes, efectivos e potenciais; s) O conteúdo do contrato aludido em b) foi dado a conhecer ao administrador do condomínio réu desde a fase da negociação até à celebração do mesmo; t) O administrador do condomínio réu subscreveu e carimbou o contrato aludido em b); u) A empresa concorrente da autora, com quem o réu tinha celebrado contrato anteriormente, propôs ao réu melhor oferta de serviços e preços do que o que anteriormente existia. III – Como é sabido o objecto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente (art.ºs 5.º, 635.º n.º3 e 639.º n.ºs 1 e 3, do N.C.P.Civil), para além do que é de conhecimento oficioso, e porque os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, ele é delimitado pelo conteúdo da decisão recorrida. Sendo que ao presente recurso ainda é aplicável o regime processual no NCPC, por a decisão em crise ter sido proferida antes de 1 de Setembro de 2013.*Ora, visto o teor das alegações da apelante são questões a decidir nos autos: 1.ª- Da nulidade da sentença, por alegado excesso de pronúncia. 2.ª – Da qualificação do contrato. 3.ª – Da cláusula penal estipulada.*1.ªquestão – Da nulidade da sentença – excesso de pronúncia. Diz a apelante que o tribunal recorrido não poderia ultrapassar a falta de alegação das partes e decidir que a cláusula penal em apreço deveria ser analisada à luz do regime das cláusulas contratuais gerais e, sem sequer permitir que a ora apelante pudesse fazer a prova da efectiva negociação do clausulado contratual. Pelo que, ao assim se ter agido, feriu-se a sentença de nulidade, nos termos do disposto na al. d) do n.º 1 do art.º 615.º do C.P.Civil. Vejamos. Como é sabido, segundo o disposto no art.º 615º n.º1 al. d) do C.P.Civil, a sentença é nula se deixa de conhecer na sentença de questões de que devia tomar conhecimento ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Ora, este vício traduz-se no incumprimento ou desrespeito por parte do julgador, do dever prescrito no art.º 608.º n.º2 do C.P.Civil, cfr. Antunes Varela, in “Manual de Processo Civil”, pág 690 e Rodrigues Bastos, in “Notas ao Código de Processo Civil”, vol. III, pág. 247, segundo o qual deve o juiz resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outra e não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. Importa, porém, ter em linha de conta que uma coisa são os argumentos ou as razões de facto e ou de direito e outra, essencialmente diversa, as questões de facto ou de direito. As questões a que se reporta a alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do C.P.Civil são os pontos de facto e ou de direito relevantes no quadro do litígio, ou seja, os concernentes ao pedido, à causa de pedir e às excepções do respectivo litígio. Ou, como se decidiu nos Acs do STJ de 8.01.2004 e 5.02.2004, ambos in www.dgsi.pt, “essas questões centram-se nos pontos fáctico-jurídicos que estruturam as posições das partes na causa, designadamente os que se prendem com a causa de pedir, o pedido e as excepções”. Ora visto o teor da contestação junta aos autos pelo réu, não é verdade que o mesmo não tenha alegado que a cláusula penal em causa não tenha sido objecto de negociação entre as partes. Para tanto, veja-se o que consta dos art.ºs 2.º a 11.º de tal peça, onde o réu conclui que todo o iter contratual não foi objecto de “qualquer negociação ética e responsável”. Sendo certo também que como consta da resposta da autora, esta tomou posição sobre tal matéria, dizendo, em síntese, que ao ser celebrado este tipo de contrato com o cliente, é-lhe explicado o seu conteúdo e o cliente, não se conformando com alguma cláusula, pode derrogá-la, pelo que se autora melhor não se defendeu “sibi imputet”. Dizendo-se a este propósito na sentença recorrida que “No caso dos autos, recaía sobre a autora o ónus de alegar e provar que a citada cláusula do contrato resultou de negociação prévia entre as partes. E tal não foi sequer expressamente alegado pela autora, mesmo quando na resposta que apresentou respondeu às excepções invocadas pelo réu, referindo apenas que se o réu pretendesse derrogar qualquer norma poderia fazê-lo, o que não se provou, nem seria provável que tal possibilidade coubesse ao réu, nomeadamente quanto à cláusula aqui em causa”. Por outro lado, e como também resulta expressamente da decisão recorrida a apreciação da validade ou invalidade da cláusula penal em apreço pode e deve ser feita oficiosamente pelo tribunal, dispensando-se a alegação da parte interessada nesse sentido, ou seja, consignou a esse propósito a 1.ª instância que “De referir, finalmente, que, e tal como se defendeu no Ac. da R.P., de 19.02.2004 (também disponível em www.dgsi.pt), nos contratos de adesão as cláusulas penais manifestamente desproporcionais aos danos, não são redutíveis, mas nulas. Como tal, o tribunal pode declarar a respectiva nulidade, oficiosamente.”, por força do disposto no art.º 286.º do C.Civil. Pelo que, sem necessidade de outros considerandos, o tribunal recorrido pronunciou-se sobre o que devia apreciar e decidir, pelo que se não verifica a apontada nulidade da sentença recorrida. Improcedem as respectivas conclusões da apelante. *2.ªquestão – Da qualificação do contrato. Está assente nos autos que a autora, ora apelante, que tem como actividades, principais, o fornecimento, a montagem e a conservação de elevadores, no dia 12.10.2009, celebrou com o réu um contrato de conservação de elevadores, denominado “Contrato B…. Controlo OC”, nos termos do documento junto a fls.7 e seguintes dos autos, designadamente com a duração inicial de 5 anos, renováveis por iguais períodos, com início em 1.11.2009 e termo inicial em 30.10.2014; obrigando-se a autora a conservar os dois elevadores, instalados no edifício do réu, sendo a facturação trimestral e tendo os serviços contratados o valor mensal inicial de €80,00, acrescido de IVA. Trata-se, pois, de um contrato de prestação de serviços, que tinha por objecto a execução de trabalhos de assistência, manutenção e conservação dos elevadores do réu. Tais contratos subsumem-se à figura jurídica prevista no art.º 1154.º do C.Civil, aplicando-se-lhes o regime jurídico do contrato de mandato, “ex vi” do art.º 1156.º do C.Civil, e o que demais as partes contrataram. Diz a apelante que a 1.ª instância, sem qualquer justificação, considerou que o contrato de manutenção “sub judice” era um contrato de adesão, todavia, nenhuma alegação das partes e nenhuma prova produzida permitia chegar a tal conclusão. Desde já há que deixar consignado que a qualificação de certo contrato é matéria de Direito, logo não carece o juiz de alegação das partes neste ou naquele sentido no que toca a à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, bastando, no caso concreto, os factos alegados pelas partes no que concerne ao contrato celebrado, documentados pelo teor de fls. 7 e seguintes dos autos. Sobre o que de ve entender por contrato de adesão, veja-se o Ac. do STJ de 17.02.2011, in www.dgsi.pt, onde se pode ler que “os "contratos de adesão", instrumentos reguladores por excelência da massificação, tenham merecido a atenção dos Estados com vista a procurar minorar, tanto quanto possível, as desigualdades provocadas por abusos de regulamentação e capciosidades em consequência do modo como são por vezes intencionalmente redigidos pelos respectivos proponentes. Fruto desta tendência, o DL n.º 446/85 de 25 de Outubro, de inspiração germânica, surgiu entre nós como a primeira tentativa de disciplinar as cláusulas contratuais gerais insertas nos contratos – estatuindo que "as cláusulas gerais elaboradas sem prévia negociação individual que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem respectivamente a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente Diploma" – cfr. artigo 1º nº 1”. Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, vol. I, pág. 265, defines contratos de adesão como sendo aqueles em que um dos contraentes (o cliente ou consumidor) “não tendo a menor participação ou preparação das respectivas cláusulas, se limita a aceitar o texto que o outro contraente oferece, em massa, ao público interessado”. O contrato de adesão é resultante da evolução económico-social que trouxe consigo o abalar dos quadros tradicionais do contrato concebido em termos quase exclusivos de um acordo celebrado entre vontades após prévia negociação. A massificação do comércio jurídico e o fornecimento de bens e serviços em larga escala, tornados bens de primeira necessidade, não se compadece já com as morosas e personalizadas fases de negociação prévia moldadas à luz do figurino liberal. Assim, o crescimento desmesurado do comércio, tornou premente e necessária a criação de novos instrumentos jurídicos em ordem a dar resposta eficaz às necessidades surgidas com o eclodir na nova realidade socio-económica. Consequentemente, as grandes empresas uniformizaram os seus contratos de molde a “acelerar as operações necessárias à colocação dos produtos e a planificar nos diferentes aspectos, as vantagens e as adscrições que lhes advêm do tráfico jurídico”. Todavia, e a breve trecho se fez sentir a necessidade de regulamentar este tipo de contratação, muitas vezes agressiva e desequilibrada; como refere Galvão Telles, in “Manual dos Contratos em Geral”, Actualizado, pag. 334: “a homogeneização das relações económicas provoca sem dúvida um desequilíbrio entre as partes contratantes (…) que reclamam a intervenção tutelar do legislador para que o contrato não deixe de ser, como cumpre, um instrumento de justiça. É essa a função disciplinadora dos instrumentos normativos destinados a conformar o conteúdo dos contratos de adesão com determinados fins que o legislador tem em vista restringindo a sua aplicação e alcance, ao mesmo tempo que através delas visa proceder ao respectivo controlo em ordem a garantir a eticidade do seu conteúdo. Cabem neste último escopo além do mais as normas tendentes a proteger o contratante aderente, necessariamente mais débil, das disfunções provocadas pela desigualdade contratual das partes”. Como bem evidencia o Prof. Oliveira Ascensão, in “Teoria Geral do Direito Civil”, vol. III, pág.364, “O contrato de adesão é uma manifestação fatal da sociedade de massas. O contrato de adesão oferece por outro lado grandes perigos. A parte que predispõe os termos contratuais está naturalmente tentada a considerar muito mais os seus interesses que os do aderente. Os contratos de adesão costumam ser assim caracterizados por uma defesa exaustiva dos interesses do emitente, e um desinteresse marcado pelo que respeita ao aderente”. E, por isso, para que as cláusulas gerais e pré-estabelecidas se possam considerar parte integrante desses contratos é necessário que sejam aceites pela outra parte, o que só pode, evidentemente, ocorrer se esta tiver conhecimento dessas componentes da proposta negocial, pois que sem esse conhecimento não se pode falar de uma livre, consciente e correcta formação de vontade, daí que o dever de comunicação, na íntegra, dos projectos negociais, seja uma simples decorrência do princípio da boa-fé contratual, cfr. art.º 227.º do C.Civil. Entendendo-se, pois, por contrato de adesão aquele em que um dos contraentes, não tendo participação na preparação das respectivas cláusulas, se limita a aceitar o texto que o outro contraente, normalmente uma empresa de apreciável dimensão, pré-elaborou e apresenta já impresso, em geral, à generalidade do público interessado, sendo ainda certo que, por regra, tais contratos apresentam-se impregnados de uma defesa exaustiva do interesse da parte emitente ou pré-disponente em contraponto com uma flagrante alijamento dos direitos e expectativas da parte cliente/aderente. Não nos restam dúvidas de que o contrato em apreço nos autos, em termos de formação e interpretação, é um contrato de adesão, ou seja, é um contrato cujas cláusulas contratuais gerais foram previamente elaboradas pela autora/apelante sem qualquer possibilidade de negociação com o réu, que se limitou a aceitá-las, sendo além disso, um documento que encerra uma disciplina contratual minuciosamente gizada, em bloco e em série, elaborada previamente pela proponente/autora/ apelante, destinando-se a uma generalidade de destinatários, e que, no seu essencial, perante um qualquer cliente, não é objecto de qualquer alteração ou modificação relevante. É, pois, um contrato-tipo, em que as condições gerais estão previamente elaboradas por um dos contraentes e o outro contratante se limita a elas aderir, o que já não ocorre com as condições particulares e específicas, aspectos que, total ou parcialmente, podem variar de contrato para contrato e, assim, implicam necessariamente negociação e acordo entre as partes. Como tal, trata-se de um contrato sujeito ao regime jurídico constante do DL n.º 446/85, de 25.10, pois a parte substancial e relevante do mesmo é formado a partir de cláusulas contratuais gerais. Improcedem as respectivas conclusões da apelante. *3.ªquestão – Da cláusula penal. Sob a cláusula 5.7.4 do contrato de assistência e manutenção de elevadores em causa nos autos estipula-se que “Uma vez que a natureza, âmbito e duração dos serviços contratados, é elemento conformante da dimensão da estrutura empresarial da B….., em caso de denúncia antecipada do presente Contrato pelo CLIENTE, a B…. terá direito a uma indemnização por danos, que será imediatamente facturada, no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado”. Ora, está assente nos autos que o contrato em causa foi celebrado no dia 12.10.2009, e que segundo os seus termos, o mesmo tinha uma duração inicial de 5 anos, renováveis por iguais períodos, com início em 1.11.2009 e termo inicial em 30.10.2014, que a respectiva facturação era trimestral, sendo o preço mensal inicial de €80,00, acrescido de IVA. Como acima já se deixou consignado, e sem que a autora tenha prestado qualquer serviço, o réu remeteu à autora uma carta data de 18.10.2009, recebida a 20.10.2009, pela qual declarava pretender “rescindir” o contrato em causa, e que o réu assim agiu por ter decidido manter o acordo que celebrara anteriormente com a uma outra empresa que prestava serviços semelhantes aos da autora. E estribada na supra referida cláusula 5.7.4. a autora facturou, sob o n.º FCN10902387, ao réu, o valor de €4.545,40, referente a tal sanção contratual por denúncia antecipada do contrato. A 1.ª instância, por vai da decisão recorrida, veio a julgar a cláusula “5.7.4”, em causa nula, por desproporcionada aos danos a ressarcir, por força do disposto na alínea c) do art.º 19.º do DL n.º 446/85, pelo que, sendo relativamente proibida, seria igualmente nula, ex vi do art.º12 do mesmo diploma, tendo para tanto referido, correctamente e a propósito, que “Conclui-se, pois, que há um notório abuso da posição da autora, proponente de tal cláusula inserta no contrato em causa, cuja aplicação acarreta um forte desequilíbrio entre situações idênticas de incumprimento, e que devem fundamentar, segundo os juízos da razoabilidade, a nulidade da cláusula (…) Tal cláusula deva ser considerada proibida, por ofender a al. c) do artigo 19.º do D.L. nº 446/85, pelo que não poderá ser atendida para efeitos de atribuição da indemnização peticionada, sendo que a autora apenas fundamentou a sua pretensão com recurso a tal cláusula. Por outro lado, não se vislumbra que na situação em apreço, atentas as circunstâncias aludidas e o momento em que o réu comunicou à autora a sua pretensão de cessar o contrato – poucos dias após a sua assinatura pelo réu e mesmo antes do início previsto para a sua vigência – hajam danos sofridos. De referir, finalmente, que (…), nos contratos de adesão as cláusulas penais manifestamente desproporcionais aos danos, não são redutíveis, mas nulas. Como tal, o tribunal pode declarar a respectiva nulidade, oficiosamente (…)”. *Insurge-se agora a autora apelante contra o assim decidido, mas sem qualquer razão, aliás como vem sendo recorrente a nível da nossa jurisprudência, deixando-se desde já consignado que, no caso em apreço, nenhuma censura nos merece a decisão alcançada na sentença recorrida, nem a respectiva fundamentação. Alega a apelante que a fórmula de cálculo encontrada na cláusula em causa é perfeitamente justificável e explica-se pelo facto de, em vez, da autora ter de alegar e provar, em cada caso, danos concretos e de se estabelecer só o quantum sancionatório, acorda com os seus clientes a criação dessa fórmula que tem a grande vantagem de dar aos clientes a prévia noção da sanção em que incorrem se não houver justa causa para a rescisão. E que até se poderia cogitar o caso de a autora ter danos superiores, mas não os poderá peticionar, o que funciona em evidente benefício e segurança dos seus clientes. Mais defende a apelante que se dimensionou para garantir o cumprimento integral do contrato celebrado, perspectivando os benefícios que obteria com os lucros provenientes desse cumprimento e não obstante ser uma empresa líder de mercado, com uma boa estrutura técnica, também é verdade que cada elevador constante da sua carteira é tratado de forma igual, não sendo indiferente para a mesma prestar assistência a mais ou menos dois elevadores, pois se todos os seus clientes decidissem extinguir o contrato que os vincula, na mesma data, a autora deixaria de obter qualquer rendimento, tendo de manter todos os compromissos (laborais, de fornecedores, etc) a que se havia vinculado. Sem esquecer que para começar a prestar serviços a cada novo elevador, a autora tem de reestruturar-se, através da constante avaliação do número dos seus trabalhadores, tendo mais de 600 trabalhadores efectivos, organização do trabalho técnico e administrativo, pela aquisição do material necessário, pela estruturação do seu parque automóvel, etc e ao não receber o pagamento da contrapartida convencionada, a autora deixou de auferir os lucros previstos, jamais podendo ser totalmente ressarcida, tendo um investimento sem o retorno no prazo que antevira, pelo que tem de ser ressarcida pela frustração da expectativa de ver um contrato integralmente cumprido por parte do cliente, quando havia uma livre vinculação a um determinado prazo.*A estas alegações da autora/apelante já se respondeu cabalmente na decisão recorrida, pelo que nos limitamos a aqui reproduzir alguns excertos. E assim, “(…) a referida cláusula 5.7.4 mostra-se inserida num conjunto de cláusulas previamente elaboradas, claramente não sujeitas a negociação individual e cujo conteúdo o destinatário não pôde, por certo, influenciar (…) da simples leitura e análise do contrato em causa, resulta a existência de cláusulas pré-elaboradas pela aqui autora que, pela sua tipologia e inserção formal no texto do documento, não foram por certo objecto duma negociação individual cláusula a cláusula.(…), o conteúdo do documento junto pela autora traduz uma disciplina contratual minuciosamente gizada, em bloco e em série, elaborada previamente pela proponente, destinando-se a uma generalidade de destinatários, tendendo, no seu essencial, a não ser objecto de modificação relevante ou significativa”. Concluindo-se que “(…)na situação em apreço se apurou, não obstante a negociação ocorrida entre autora e réu e o conhecimento que foi dado a este do conteúdo do contrato, não há dúvida de que as cláusulas que nele foram inseridas pela autora, segundo um modelo pré-elaborado, universal ou standardizado, só teoricamente seriam alteráveis ou negociáveis”. E mais adiante diz-se ainda que “(…)recaía sobre a autora o ónus de alegar e provar que a citada cláusula do contrato resultou de negociação prévia entre as partes. E tal não foi sequer expressamente alegado pela autora, mesmo quando na resposta que apresentou respondeu às excepções invocadas pelo réu, referindo apenas que se o réu pretendesse derrogar qualquer norma poderia fazê-lo, o que não se provou, nem seria provável que tal possibilidade coubesse ao réu, nomeadamente quanto à cláusula aqui em causa”. Consigna-se depois, na sentença recorrida que, no caso concreto, se está perante o pagamento de sanção pecuniária e que “(…)atento o teor de tal cláusula penal e as consequências que da sua aplicação advêm para o cliente ou aderente, no caso o aqui réu, não pode deixar de considerar-se que se está perante uma desproporção significativa entre o montante da pena e o montante dos danos a reparar. A cláusula em apreço impõe, pois, consequências patrimoniais gravosas ao aderente (…) devendo, como tal ser considerada uma cláusula penal desproporcionada aos danos a ressarcir. A aludida cláusula 5.7.4. revela um manifesto desequilíbrio contratual de interesses, pois a aqui autora limita-se a acautelar os seus interesses negociais ao inserir cláusulas padronizadas insusceptíveis de negociação, conduzindo a uma fidelização forçada dos clientes ao longo dos anos sob pena de se verem obrigados ao pagamento de uma pesada penalização em caso de resolução negocial, alcançando a proponente desta cláusula não só parte dos lucros esperados pelo cumprimento integral do contrato, ao mesmo tempo que liberta a sua estrutura empresarial do cumprimento do referido contrato, já que deixa de ter de suportar as despesas inerentes à manutenção, designadamente, com equipamentos, materiais, tempo de trabalho, etc., antecipando o recebimento das quantias que deveriam ser aferidas até ao termo do contrato. Relativamente ao quantum indemnizatório fixado, a priori, por via da dita cláusula, diz-se na decisão recorrida que “(…) embora os danos concretos em cada situação não possam por si só relevar, como se disse – certo é que em situações como a presente, nem sequer há que invocar as expectativas que a angariação do réu como cliente possa ter suscitado na autora, pois poucos dias após a assinatura de tal contrato pelo administrador do réu, já este dava conta à autora da sua intenção de não pretender manter o contrato, e sendo certo que, na sequência de tal, a autora nunca chegou a iniciar a prestação dos serviços em causa. Pelo que, também a referência feita em tal cláusula, pela autora, à sua estrutura empresarial e duração do contrato, numa situação como a presente, não pode relevar. (…) a sanção concretamente cominada para o caso, que como se disse equivale ao cumprimento integral do contrato pelo cliente no que respeita à satisfação integral das quantias previstas como se tivesse ocorrido a execução da prestação pela autora pelo período convencionado, não pode ser considerada representativa, ainda que aproximativamente, do prejuízo normal ou típico que advém da prestação do serviço pela autora tal qual esta se mostra equacionada no quadro contratual. Nada justifica que uma tal extensão ressarcitiva se imponha em exclusivo benefício da autora, como parte pré-disponente, como compensação de supostas perdas com a logística humana e material posta ao serviço do contrato celebrado com o réu. Não se extrai do tal quadro padronizado que essa logística tenha sido propositadamente criada ou afecta a este contrato, pelo que, em condições normais, ela continuará com natural utilidade e proveito para a satisfação dos interesses da autora nas relações estabelecidas ou a estabelecer com outros clientes”. Considera-se ainda na sentença da 1.ª instância que “(…)no contrato em apreço, na sua cláusula 5.6., que se refere às situações de eventual incumprimento imputável à aqui autora, prevê-se que esta apenas responderá até à concorrência do valor de três meses de facturação, como máximo de indemnização a pagar ao cliente. Já quando se trata de incumprimento por parte do cliente, a indemnização é substancialmente diferente e com consequências bem mais gravosas (…)”. Tendo-se, por fim, concluído que “(…)há um notório abuso da posição da autora, proponente de tal cláusula inserta no contrato em causa, cuja aplicação acarreta um forte desequilíbrio entre situações idênticas de incumprimento, e que devem fundamentar, segundo os juízos da razoabilidade, a nulidade da cláusula(…)”.*Mas vejamos, sem contudo nos alongarmos, já que, como se disse, sufragamos a posição e a fundamentação constante da decisão recorrida. Como se sabe, a cláusula penal consiste, na definição constante do art.º 810.º nº 1 do C.Civil, na faculdade que as partes gozam de fixar, por acordo, o montante da indemnização exigível, ou, na convenção através da qual as partes fixam o montante da indemnização a satisfazer, em caso de eventual inexecução do contrato, cfr. Galvão Telles, in “Direito das Obrigações”, pág. 437. A cláusula penal tem a natureza de uma cláusula acessória e quer pela sua localização sistemática, e, muito particularmente, pela sua articulação lógica com o n.º 1 do art.º 811.º, o art.º 810.º n.º 1, também, do C.Civil, ao referir-se à “indemnização exigível”, cujo montante pode ser, previamente definido, através de cláusula penal, tem em vista as situações de inadimplemento, cumprimento a destempo ou cumprimento defeituoso da obrigação. A cláusula penal resulta de um acordo das partes e tem como finalidade a fixação antecipada de uma indemnização, compensatória ou moratória, pelo incumprimento ou retardamento no cumprimento da obrigação, com intuito de se evitarem futuras dúvidas e litígios entre as partes, quanto à determinação do montante da indemnização, cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil Anotado”, vol. II, pág. 75. Reveste uma função, fundamentalmente, ressarcitiva e tarifada, de natureza compulsória, agindo como meio de pressão sobre o devedor, mediante a ameaça de uma sanção pecuniária, com vista ao cumprimento pontual das obrigações que assumiu, mesmo que se prove que do seu incumprimento ou mora não adveio qualquer dano, cfr. Ferrer Correia e Henrique Mesquita, in “A Obra Intelectual como Objecto do Contrato de Empreitada”, ROA, Ano 45.º, 129 e ss; que não importa averiguar, em consequência da inexecução da obrigação ou da violação do contrato, nem determinar o seu montante, na hipótese da sua verificação, e bem assim como, igualmente, o respectivo nexo causal. A cláusula penal “destinando-se a substituir a indemnização que seria arbitrada pelo juiz, é exigível nos mesmos casos em que essa indemnização poderia ser reclamada, supondo, portanto, em termos gerais, a inexecução da obrigação e a culpa do devedor, isto é, só pode ser efectivada se este, culposamente, não tiver cumprido o contrato”, cfr. Galvão Telles, in obra citada, pág. 439. A cláusula penal (indemnizatória) como refere Pinto Monteiro, in “Cláusula Penal e Indemnização”, pág. 457 constitui “uma liquidação convencional antecipada dos prejuízos em caso de inexecução do contrato. Na situação de incumprimento, se estipulada uma cláusula penal, a indemnização corresponderá ao valor pactuado, a não ser que haja lugar à sua redução, face ao disposto no art.º 812.º do C.Civil, ou seja, convencionado o ressarcimento do dano excedente, nos termos do art.º 811.º n.º 2, do C.Civil, e é para esta última situação que se limita o valor da indemnização, nos termos do n.º 3 deste preceito, que não tem a ver com o valor da pena, quando não é pactuada a indemnização pelo dano excedente. Trata-se, pois, de uma cláusula indemnizatória. Esta, embora não tenha uma função coercitiva ou de compulsão ao cumprimento, acaba por produzir também esse efeito, na medida em que alerta o devedor para os riscos que corre em caso de inexecução do contrato e, por isso, estimula o cumprimento voluntário das obrigações assumidas. Trata-se de uma indemnização fixada a forfait, invariável, só redutível por razões de equidade”.*Insurge-se a apelante contra a aplicação em sede de sentença recorrida do regime das cláusulas contratuais gerais do DL n.º 446/85 de 25.10, com as alterações dos DL n.º 220/95 de 31.08, 249/99 de 7.07 e 323/2001 de 17.12, à cláusula 5.7.4 em apreço, dizendo que o contrato em causa foi efectiva e directamente negociado entre as partes, sendo que até tem aposta uma alteração do clausulado pré-elaborado, inscrito nas condições particulares (campo que no pré impresso se encontra em branco e se destina à inscrição das alterações e derrogações especificamente contratadas), no qual se estabelece o período de um ano de prestação de serviços de modo gratuito. Sendo ainda certo que o réu logrou negociar pelo menos uma das condições gerais, no que respeita ao pagamento do preço e início de facturação, o que segundo a apelante leva a crer que o réu tinha a possibilidade de negociar o restante clausulado geral, nomeadamente a relativa à cláusula penal. Como é sabido o que sobressai do regime do DL n.º 446/85, de 25.10, não é a maior ou menor generalidade das cláusulas contratuais, mas antes o seu carácter não negociável ou não influenciável por parte de, pelo menos, um dos contraentes, dessas das cláusulas. Preceitua o n.º1 do art.º 1.º do DL n.º 446/85 de 25.10 que “As cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual que proponentes ou destinatários indeterminados se limitem, respectivamente, a subscrever ou aceitar, regem-se pelo presente diploma”. E explicita o n.º 2 que “O presente diploma aplica-se igualmente às cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pôde influenciar”. Terminando o n.º3 estatuindo que “O ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo”. Pode-se definir as Cláusulas Contratuais Gerais (CCG) como sendo as normas minuciosamente elaboradas para serem inseridas, em bloco, num número massificado e padronizado de contratos em que intervém ou participa como contraente a entidade para esse efeito as pré-elaborou. Sendo formalmente apresentadas em documentos pré-impressos, pelo contraente que os elaborou a uma generalidade de contratantes, sem que estes tivessem tido qualquer possibilidade de contribuir para a sua formulação, ou de as alterar, modificar ou excluir do global do “pack” proposto. E assim para se chamar à colação o regime das Cláusulas Contratuais Gerais (CCG) há que primeiramente apurar se certa cláusula foi ou não objecto de negociação e discussão entre as partes, no sentido de poder ser modificada, excluída, ou aceite nos termos propostos. Pelo que, para a apreciação da validade de uma única cláusula do conteúdo de um contrato segundo o regime das CCG, não seja necessário estar-se perante um contrato de adesão propriamente dito, pois o que releva são as cláusulas em si e não a natureza do contrato, não obstante resultar da prática negocial que aquelas são, por regra, inseridas neste tipo de contratos. Mas sempre se dirá como se escreveu no Ac. da Relação de Coimbra de 20.11.2012, in www.dgsi.pt, que “a característica da inserção em formulário ou num modelo pré-elaborado e impresso do conjunto das cláusulas determinantes da vontade negocial das partes leva naturalmente a que o intérprete presuma a sua não negociabilidade, devendo essa configuração levar à qualificação do contrato como de adesão”. No caso em apreço, resulta assente nos autos que “as negociações entre a autora e o réu decorreram durante meses até ser subscrito o acordo”, ou seja, o contrato de assistência e manutenção de elevadores em causa. Por outro lado, está provado que o “comercial da autora contactou o administrador do condomínio réu, quer por telefone quer pessoalmente, com vista a obter o acordo” em apreço e, “até este ser subscrito pelo administrador do réu”. Finalmente provou-se que “o conteúdo do contrato (…) foi dado a conhecer ao administrador do condomínio réu desde a fase da negociação até à celebração do mesmo”. E assim sendo, parece que o réu teve durante meses a possibilidade de analisar as cláusulas do contrato, as quais lhe foram dadas a conhecer. Mas, recaía sobre a autora, ora apelante, o ónus de alegar e provar que a citada cláusula do contrato resultou de negociação prévia entre as partes, e tal prova, como resulta do acervo factual apurado, não foi feita nos autos. Todavia, vendo o teor do documento que contém o texto contratual em apreço nos autos, referente a uma prestação de serviço de assistência e manutenção de elevadores, dúvidas não temos de que as respectivas cláusulas aí foram pré-inseridas pela ora apelante, fazendo parte de um modelo contratual pré-elaborado, universal ou standardizado, admitindo apenas pequenas inserções pontuais relativas ao caso concreto, sem possibilidade de serem individualmente negociáveis, modificadas ou alteradas. Pelo que como acima já se deixou consignado, o contrato em causa deve ser qualificado como um verdadeiro contrato de adesão, ora individualizado, e o seu clausulado, designadamente o ponto 5.7.4 é tipicamente uma cláusula contratual geral e deve ser escrutinada à luz do respectivo regime jurídico, designadamente sob o prisma do dever de informação pré-contratual, do ónus de comunicação (art.º 5.º n.º3) e do dever de informação prévia (art.º 6.º) e, sobre o conteúdo das cláusulas, sendo aqui o dever de informação pré-contratual mais abrangente, incluindo também o esclarecimento do sentido das cláusula predispostas, independentemente de qualquer concreto juízo em função de critérios de boa-fé. De harmonia com o disposto no DL n.º 446/85 de 25.10, de entre as cláusulas contratuais gerais proibidas, existem aquelas que são absolutamente proibidas e as que são só relativamente proibidas. As cláusulas relativamente proibidas, (que interessam ao presente recurso) quer nas relações entre empresários ou entidades equiparadas (art.º 19.º) quer nas relações com consumidores finais (art.º 22.º) são-no desde que integram as situações descritas na lei e “consoante o quadro negocial padronizado”. Ao fixar os limites de conteúdo das cláusulas contratuais gerais, o DL. n.º 446/85, de 25.10, consagrou a boa-fé como o princípio geral de controlo, cfr. art.ºs 15.º e 16.º, enumerando-se nos art.ºs 18.º a 22.º um elenco de cláusulas absoluta ou relativamente proibidas. Preceitua o art.º 19.º al. c) do referido DL que são declaradas (relativamente) proibidas, consoante aquele quadro negocial padronizado, as “cláusulas penais desproporcionadas aos danos a ressarcir”. Vejamos, pois, se a cláusula penal em análise viola o princípio da boa-fé, pela “desproporção” relativamente aos danos a ressarcir. Como foi ponderado no Ac. do STJ de 12.06.2007, in www.dgsi.pt, o apelo ao quadro negocial padronizado, significa que a valoração a fazer deverá ter como referência, não o contrato singular ou as circunstâncias do caso, mas o tipo de negócio em causa e os elementos que normativamente o caracterizam, no interior de todo o regulamento contratual genericamente predisposto. Há assim que estabelecer uma relação entre o montante dos danos a ressarci e a pena fixada contratualmente, de modo a que se possa dizer que há uma equivalência entre os dois valores, para tanto atendendo-se não ao caso concreto, mas aos danos que “normal e tipicamente resultam, dentro do quadro negocial padronizado, em que o contrato se integra” segundo “critérios objectivos, numa avaliação prospectiva guiada por cálculos de proporcionalidade e valores médios e usuais, tendo em conta factores que, em casos daquele género, habitualmente relevam na produção e na medida dos prejuízos”. Quanto ao que se deve entender por “desproporcionada”, na expressão da al. b), do art.º 19.º do DL 446/85, de 25.10, e sem entrarmos na discussão doutrinal e jurisprudencial pendente sobre tal questão, entendemos que, na esteira do supra referido Ac. do STJ de 12.06.2007 e dos Profs. Menezes Cordeiro e Almeida e Costa, in “Cláusulas Contratuais Gerais. Anotação ao Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro”, pág. 47 “(…)o qualificativo “desproporcionado” não aponta para uma pura e simples superioridade das penas preestabelecidas em relação ao montante dos danos. Pelo contrário, deve entender-se, de harmonia com as exigências do tráfico e segundo um juízo de razoabilidade, que a hipótese em análise só ficará preenchida quando se detectar uma desproporção sensível (…)”, (na acepção de notória, mas que não tem de ser excessiva, manifesta, grave). No caso concreto, sem dúvidas que tem de se concluir que uma cláusula que, em contrato de adesão, estipula que “em caso de denúncia antecipada pelo cliente, (…) terá direito a uma indemnização por danos (…) no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado” impõe consequências patrimoniais gravosas ao aderente/cliente, devendo, como tal ser considerada uma cláusula penal desproporcionada aos danos a ressarcir. Na realidade tal cláusula ofende o princípio da boa fé contratual uma vez que patenteia um manifesto desequilíbrio contratual de interesses uma vez que a autora ora apelante se limita a acautelar os seus interesses negociais ao inserir cláusulas padronizadas insusceptíveis de negociação, conduzindo a uma fidelização forçada dos clientes ao longo dos anos sob pena de se verem obrigados ao pagamento de uma pesada penalização em caso de resolução negocial. Veja-se a título de exemplo o manifesto desequilíbrio entre o preceituado na cláusula 5.6 (incumprimento imputável à B.......) e na cláusula em análise, sendo que para o caso de denúncia antecipada por parte da B......., nada está previsto, e para o caso de incumprimento que lhe seja imputável, ela apenas responderá “(...) até à concorrência do valor de 3 meses de facturação (...) como máximo de indemnização a pagar ao cliente. Destarte temos de concluir que o que pretende a autora/apelante com a cláusula em análise é a penalização do cliente, mais do que salvaguardar uma reparação proporcionada ao dano, que evidentemente teve com a denúncia do contrato por parte do réu. E assim sendo tal conduz necessariamente a uma desproporção sensível e flagrante entre o montante da pena e o montante dos danos a reparar, atendendo ao quadro negocial padronizado em que o contrato se integra, contrariando o princípio da boa-fé a que alude o art.º 15.º do DL n.º 446/85, de 25.10, e sendo proibida nos termos previstos na al. c), do art.º 19.º do mesmo diploma, e consequentemente nula, pois que a perda de um cliente, como é o caso dos autos, não importa para a apelante a necessidade de dispensa de pessoal ou a perda de utilidade de material, equipamentos ou qualquer logística. Sem dúvidas poderá exigir algum ajustamento à gestão, mas dentro da dinâmica do próprio comércio, à perda de um cliente seguir-se-á, normalmente, a angariação de um outro. Sem esquecer como se refere na decisão recorrida que “(…)nem sequer há que invocar as expectativas que a angariação do réu como cliente possa ter suscitado na autora, pois poucos dias após a assinatura de tal contrato pelo administrador do réu, já este dava conta à autora da sua intenção de não pretender manter o contrato, e sendo certo que, na sequência de tal, a autora nunca chegou a iniciar a prestação dos serviços em causa. Pelo que, também a referência feita em tal cláusula, pela autora, à sua estrutura empresarial e duração do contrato, numa situação como a presente, não pode relevar”. Improcedem, pois, as derradeiras conclusões da apelante. Sumário – I - Contrato de adesão é aquele em que um dos contraentes, não tendo participação na preparação das respectivas cláusulas, se limita a aceitar o texto que o outro contraente, normalmente uma empresa de apreciável dimensão, pré-elaborou e apresenta já impresso, em geral, à generalidade do público interessado, sendo ainda certo que, por regra, tais contratos apresentam-se impregnados de uma defesa exaustiva do interesse da parte emitente ou pré-disponente em contraponto com uma flagrante alijamento dos direitos e expectativas da parte cliente/aderente. II - O contrato em causa nos autos deve ser qualificado como um verdadeiro contrato de adesão, ora individualizado, e o seu clausulado, designadamente o ponto 5.7.4 é tipicamente uma cláusula contratual geral e deve ser escrutinada à luz do respectivo regime jurídico. III - A cláusula que, em contrato de adesão, estipula que “em caso de denúncia antecipada pelo cliente, (…) terá direito a uma indemnização por danos (…) no valor da totalidade das prestações do preço previstas até ao termo do prazo contratado” impõe consequências patrimoniais gravosas ao aderente/cliente, devendo, como tal ser considerada uma cláusula penal desproporcionada aos danos a ressarcir. IV - Tal cláusula conduz necessariamente a uma desproporção sensível e flagrante entre o montante da pena e o montante dos danos a reparar, atendendo ao quadro negocial padronizado em que o contrato se integra, contrariando o princípio da boa-fé a que alude o art.º 15.º do DL n.º 446/85, de 25.10, sendo proibida nos termos previstos na al. c), do art.º 19.º do mesmo diploma e consequentemente nula. IV – Pelo exposto, decide-se julgar a presente apelação improcedente e em confirmar a decisão recorrida. Custas pela apelante. Porto, 2014.04.08 Anabela Dias da Silva Maria do Carmo Domingues José Carvalho