Processo:4304/12.4TBVFR.P1
Data do Acordão: 26/01/2015Relator: VIEIRA E CUNHATribunal:trp
Decisão: Meio processual:

I - Para um exercício activo de direitos dos sócios em face da sociedade, existe a regra do artº 222º nº1 CSCom , segundo a qual “os contitulares de quota devem exercer os direitos a ela inerentes através de representante comum”. II – A presença, ao menos formal, de todos os interessados através de representante comum, em termos de sentido, leva à admissão da própria presença efectiva de todos os interessados, chamados pelo contitular da quota que intentou a acção, em intervenção principal provocada litisconsorcial. III - A deliberação de escolha do representante comum deve ser tomada por maioria, nos termos do artº 1407º nº1 CCiv (por contitulares que representem pelo menos metade do capital da quota), mas a lei não exige forma alguma para a escolha do representante comum, que pode assim efectivar-se pela manifestação da posição dos interessados em processo judicial, no respectivo articulado, ratificando, ou não, de acordo com as regras aplicáveis à referida deliberação, a anterior intervenção do Autor.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

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Relator
VIEIRA E CUNHA
Descritores
INTERVENÇÃO PRINCIPAL PROVOCADA SOCIEDADE POR QUOTAS CHAMAMENTO DOS CONTITULARES DA QUOTA
No do documento
Data do Acordão
01/27/2015
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO
Decisão
REVOGADA
Sumário
I - Para um exercício activo de direitos dos sócios em face da sociedade, existe a regra do artº 222º nº1 CSCom , segundo a qual “os contitulares de quota devem exercer os direitos a ela inerentes através de representante comum”. II – A presença, ao menos formal, de todos os interessados através de representante comum, em termos de sentido, leva à admissão da própria presença efectiva de todos os interessados, chamados pelo contitular da quota que intentou a acção, em intervenção principal provocada litisconsorcial. III - A deliberação de escolha do representante comum deve ser tomada por maioria, nos termos do artº 1407º nº1 CCiv (por contitulares que representem pelo menos metade do capital da quota), mas a lei não exige forma alguma para a escolha do representante comum, que pode assim efectivar-se pela manifestação da posição dos interessados em processo judicial, no respectivo articulado, ratificando, ou não, de acordo com as regras aplicáveis à referida deliberação, a anterior intervenção do Autor.
Decisão integral
● Rec. 4304/12.4TBVFR.P1. Relator – Vieira e Cunha. Adjuntos – Desembargadores Maria Eiró e João Proença Costa. Decisão recorrida de 5/6/2014. 

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto

A Questão
Recurso de apelação interposto na acção com processo comum e forma ordinária nº4304/12.1TBVFR, do ex-2º Juízo Cível de Stª Mª da Feira.
Autor – B… (na qualidade de representante comum da quota de € 31.424,27).
Ré – C…, Ldª.

Pedido
Que seja declarada a anulação das deliberações sociais tomadas na Assembleia Geral da sociedade Ré, que decorreu em 21/7/2012, que deliberaram sobre os pontos da convocatória de 3/7/2012 e os aditamentos de 6/7, com averbamento no registo comercial da Ré.

Tese do Autor
É representante, porque contitular, de uma quota do valor nominal de € 31.424,27, no capital social de € 251.394,14 da Requerida.
Esta qualidade está assente junto da Requerida ao longo dos anos, como resultou designadamente de um processo judicial.
Para o dia 21/7/2012 foi convocada uma assembleia geral anual, para deliberar, entre outros pontos, sobre os exercícios de 2010 e 2011, mas o ROC investido não fez anexar, em momento prévio à realização da assembleia geral, certificação de contas relativamente a esses anos, pelo que nos encontrávamos perante uma situação de irregular funcionamento da assembleia, nos termos dos artºs 451º, 248º e 58º nº1 al.c) CSCom, que feria de anulabilidade o que aí se viesse a decidir.
No dia da assembleia, o gerente impediu a entrada na mesma referida assembleia de um sócio e do representante de um outro sócio ente colectivo. 
Visava o gerente, em conluio com outros sócios, revalidar uma deliberação cuja legalidade fora questionada em processo judicial, visando a nomeação de novos gerentes, beneficiando um conjunto de sócios e evitando a respectiva responsabilização por danos.
O comportamento descrito é causa de anulação de deliberação social – artº 58º nº1 al.b) CSCom.
Tese da Ré
O litígio em que a presente acção se insere visa permitir o domínio da sociedade Ré por uma sociedade concorrente, D…, Ldª, sociedade para a qual foram invocadamente transmitidas quotas por alguns sócios, em negócio nulo e ineficaz, relativamente à Ré.
Encontra-se assim a correr termos acção declarativa que visa, entre outros, excluir o Autor de sócio da Ré.
Foi o Autor quem, formalmente, por força de decisão judicial em procedimento cautelar, esteve à frente dos destinos da Ré no ano de 2010, sendo que sempre obedeceu às instruções dos responsáveis da citada concorrente da Ré, a D….
O Autor, enquanto nas funções de gerente, não prestou colaboração ao ROC, e suscitou uma acentuada diminuição das receitas da Ré.
Os sócios comuns às duas sociedades declararam ceder as quotas que possuíam no capital social da Ré à sociedade concorrente, sem obterem o seu consentimento, ou possibilitarem o exercício do direito de preferência (artº 228º nº2 CSCom).
O Autor é parte ilegítima, pois que outros contitulares da respectiva quota não o reconhecem como representante comum, e fizeram-se até representar por terceiros na assembleia geral em causa, como dá nota a própria acta; todavia, e por outro lado, o sócio E… foi o único contitular da quota do Autor que se fez representar na aludida assembleia geral e exerceu os direitos de voto inerentes àquela quota.
O Autor carece assim de legitimidade processual para, isoladamente, instaurar a presente acção.
No mais, impugna motivadamente a alegação do Autor, enquanto fundamento do pedido.

Na decisão proferida no despacho saneador, a Mmª Juiz “a quo”, com fundamento em que, do regime dos artºs 303º, 233º e 224º CSCom, decorre que o contitular de participação social indivisa não pode, por si só, exercer os direitos a essa participação, nem resultando que exista qualquer deliberação dos contitulares a nomearem o Autor como seu representante comum, julgou procedente a excepção dilatória de ilegitimidade activa.
De seguida, o Autor, veio requerer a intervenção principal provocada dos restantes contitulares da quota em causa, com fundamento em que, tratando-se de excepção sanável, a absolvição só deveria ocorrer se a excepção subsistisse e não estivesse sanada (artºs 577º al.e) e 278º nº3 CPCiv), tendo sido omitida diligência obrigatória, e cometida nulidade processual, que pode ser sanada com o chamamento daqueles que têm interesse igual e paralelo ao Autor para intervirem na acção.
A Ré opôs-se à admissão do incidente.
O despacho recorrido esclareceu não se tratar, no caso em apreço, de um caso de ilegitimidade processual activa, pelo facto de o Autor se encontrar desacompanhado dos demais contitulares da quota indivisa (preterição de litisconsórcio necessário activo), a sanar através da intervenção de tais contitulares na demanda, mas antes de estar na lide quem carece do direito de exercício, nos termos do disposto no artº 223º nº1 CSCom; o Autor não prova a existência de qualquer deliberação no sentido de ser nomeado representante comum dos contitulares da quota indivisa, nem para a propositura da presente acção, nem para a representação dos referidos contitulares junto da Ré, como disposto no artº 223º nº4 CSCom.  

Conclusões do Recurso:
i. O artigo 222.º, n.º 1 do C.S.C. é erradamente interpretado e aplicado quando pretende ver na “representação” de quota comum algo que extravase do exercício, em dado momento, de direito societário e em assembleia – aresto da Rel.Porto, de 19.05.2014 (junto aos autos - refª 17026222, a propósito de problema análogo e na vida da Ré!) e autores neste citados;
ii. a legitimidade processual não tem que coincidir com a representação conferida para actuação societária, pois que o direito dos contitulares não é transmitido para o representante, já que se trata, então de direito cujo exercício judicial é definido pelos artigos 1405.º do C.Civil e 26.º, n.ºs 2 e 3 do C.P.C., ao tempo, actualmente art. 30.º, n.º 2 e 3 do C.P.C.
iii. Pense-se na situação de, entre o momento da deliberação e a sua impugnação, morrer ou incapacitar-se o representante comum: não se exercia o direito ou eram os herdeiros do representante que o podiam fazer?!
iv. Perguntar é responder!!
v. Outro entendimento, como parece ter sido o da douta decisão, é errada aplicação dos arts. 1405.º do C.Civil e 26.º, n.ºs 2 e 3 do C.P.C. ao tempo (actual art. 30.º, n.º 2 e 3 do C.P.C.).
vi. Atento o regime dos citados arts. 1405.º do C.Civil e 26.º, n.ºs 2 e 3 do C.P.C. ao tempo (actual art. 30.º, n.º 2 e 3 do C.P.C.), havendo situação de ilegitimidade activa – decisão que transitou em julgado – entender que se trata de ilegitimidade singular
vii. é fazer errada interpretação do regime do artigo 26.º, n.º 3 do C.P.C., ao tempo da propositura da acção – agora art. 30.º, n.º 3 do C.P.C.;
viii. A tratar – se de ilegitimidade activa plural - art. 27.º, n.º 1 do C.P.C., ao tempo, correspondendo agora ao art. 32.º do C.P.C.) - , porque sanável, ix. além da nulidade de omitir a prática de acto que a lei impunha – arts. 288.º, n.º 3 e 265.º, n.º 2 do C.P.C. ao tempo, e agora arts. 278.º, n.º 3, e art. 6.º do C.P.C. –
x. declarar que a intervenção principal provocada dos demais contitulares é meio inadequado é fazer errada interpretação dos arts. 269.º e 270.º do C.P.C., ao tempo da instauração da acção (arts. 261.º e 262.º na nova redacção do C.P.C.),
xi. bem como do regime do art. 6.º, n.ºs 1 e 2 do C.P.C., na redacção actual, atento o que se lê no douto aresto nos autos e o que se explana em 39 e 40;
xii. declarar que a representação é exigida pela vida societária e considerar inverificada a representação numa situação em que a comprovação para esse exercício societário não ocorreu é fazer errada aplicação do regime do art. 508.º, n.º 3 do C.P.C., actualmente art. 590.º, n.º 3 do C.P.C., pois, quando muito, tratar-se-ia de articulado documentalmente insuficiente.
xiii. Há, pois, nulidade – art. 201.º do C.P.C., na redacção ao tempo e art. 195.º na redacção actual;
xiv. Há erro em matéria de facto – art. 655.º do C.P.C, ao tempo e art. 607.º na redacção em vigor do C.P.C. – que leva a contradição entre a decisão e os fundamentos, quando a douta decisão assenta as suas conclusões em que “não resulta[do] do alegado pelo Autor nem dos documentos juntos que exista qualquer deliberação dos contitulares…” (sic), se e quando:
xv. no cabeçalho da acção, já o A invoca a qualidade de representante de quota do valor nominal de € 31.424,27,
xvi. qualidade que alegou e comprovou nos arts. 1º, 2º da petição inicial,
xvii. fazendo apelo à desnecessidade de alegação de tal matéria – art. 3º da mesma petição inicial, e
xviii. quando a Ré afirma – art. 278.º da douta contestação – que o A. “tem chegado a representar a quota de que é contitular isso foi aceite judicialmente (ver acima n.º 34 destas alegações)
xix. a Ré terá “insistido para que ficasse e participasse (!!) na assembleia” - declaração da Ré no art. 195º da douta contestação;
xx. a Ré somente afirma que o A., enquanto representante “nem é reconhecido como tal por todos os seus contitulares”. (sic – arts. 278º, 279º e 173º da douta contestação, ou seja, faz declaração ….de terceiro!! (Veja-se a refutação no aresto citado no n.º 34 das alegações).

Por contra-alegações, a Ré sustenta o bem fundado e a confirmação do douto despacho recorrido.

Factos Provados:
Encontram-se demonstrados os factos supra resumidamente expostos, relativos à alegação das partes e aos fundamentos da decisão recorrida, na sequência da absolvição da instância da Ré, por força da excepção dilatória verificada de ilegitimidade activa.

Fundamentos
Em função da esquematização das conclusões da Recorrente, o único tópico a abordar tem a ver com a possibilidade de chamamento em intervenção principal provocada, no actual momento do processo, dos demais contitulares da quota indivisa que o Autor invocou representar no douto petitório.
Vejamos pois.IComo visto, mostra-se incontestado o fundamento da absolvição da instância da Ré, por ilegitimidade do Autor, com base em:
1º - “decorrer do regime dos artºs 303º, 223º e 224º CSCom que o contitular de uma participação social indivisa não pode, por si, isoladamente, exercer os direitos inerentes a essa participação; esse exercício incumbe aos contitulares da participação social que o devem concretizar através de um representante comum”.
2º - “O Autor, na configuração que faz da sua pretensão, apresentar-se como contitular da quota, invocando ele mesmo um direito de acção – correspondente ao direito da quota – que singularmente não tem”.
3º - “Não estarmos perante um caso de ilegitimidade activa decorrente da falta de intervenção de outros sujeitos que deveriam estar na lide, mas perante a circunstância de estar nela quem carece do direito de exercício, pois a outrem pertence esse mesmo direito” (citámos nos três parágrafos o despacho saneador que invocou a ilegitimidade activa e absolveu a Ré da instância).
Mas o Autor, que entende que a ilegitimidade processual pode ser sanada pela intervenção principal provocada litisconsorcial dos demais contitulares da quota, vem chamá-los, ao abrigo do disposto no artº 261º nº1 CPCiv.
O despacho recorrido, também sustentado na posição processual da Ré, por oposição ao incidente e contra-alegações de recurso, mantém que a ilegitimidade em causa não pode ser suprida com a intervenção dos referidos contitulares da quota, pressupondo antes uma prévia deliberação de todos em matéria de representante comum, que inexiste.
Encontra-se pois resolvida a questão relativa a saber se as normas relativas à representação dos contitulares de quota por representante comum se aplicam, não apenas às relações dos contitulares da quota com a sociedade, mas também no que respeita ao exercício de direitos em juízo, matéria que, de resto, tem sido resolvida pela jurisprudência em sentido afirmativo – cf. Ac.R.E. 2/5/02 Col.III/240, relatado pelo Desemb. Ribeiro Cardoso.  
Quid juris?IIIncidentalmente, a jurisprudência pronunciou-se sobre a matéria. É difícil porém encontrar casos em que essa jurisprudência se tenha pronunciado expressamente sobre a possibilidade de suprir a inexistência de representante comum através do chamamento em intervenção principal dos demais contitulares de quota.
São exemplos daquela pronúncia incidental (que não influiu no decisão final tomada) o Ac.S.T.J. 4/10/94 Bol.440/505 (relatado pelo Consº Cardona Ferreira), o citado Ac.R.E. 2/5/02, e o Ac.R.P. 26/2/09, na base de dados oficial, pº 0837016, relatado pelo Consº Pinto de Almeida. Todavia, o iter do processo que este último acórdão revela muito nos ajudará à formação de uma convicção decisória.
O Ac.R.E. 2/5/02 cit., pronunciando-se embora pela desnecessidade da presença de todos os contitulares na acção, não a exclui nem afasta, ainda que a título supletivo.
O primeiro acórdão em causa, do Supremo Tribunal de Justiça, refere que, “se a lei societária, na sua letra e alcance lógico, exige a presença, ao menos formal, de todos os interessados através de representante comum”, isso, em termos de sentido, “leva à admissão da própria presença efectiva, mas de todos os interessados”, visto o alcance do artº 28º nº1 CPCiv61 acerca do litisconsórcio necessário.
O Prof. Raúl Ventura, Sociedades por Quotas, I/495ss., na exegese do artº 222º nº1 CSCom, entende que, se é verdade que os contitulares de uma quota devem exercer os direitos a ela inerentes através de um representante comum, “não pode excluir-se que os direitos – ou pelo menos alguns deles – não possam ser exercidos por outra forma”.
Concebe-se aliás o exercício dos direitos por meio de uma só pessoa designada para o efeito, ou por todos os contitulares em conjunto, podendo escolher-se, neste caso, entre a unanimidade e a maioria.
Para um exercício activo de direitos dos sócios em face da sociedade, existe efectivamente a regra do artº 222º nº1 CSCom – “os contitulares de quota devem exercer os direitos a ela inerentes através de representante comum”. 
Exceptuam-se as situações a que alude o artº 222º nº4 CSCom (impedimentos do representante comum ou impossibilidade de deliberação, caso em que a nomeação fica deferida ao tribunal – artº 223º nº3) e ainda os direitos de exercício necessariamente individual (v.g., o direito ao uso das coisas sociais ou o direito a ser eleito para certros cargos sociais).
Não é o caso do direito de impugnar deliberações sociais, que não é, por natureza, um direito de exercício individual, diz o Autor (op. cit., pg. 497).
Mas a questão permanece: intentada a acção de anulação de deliberações sociais por um dos contitulares que não comprova a qualidade de representante comum, está vedada a possibilidade de regularização da instância, seja à luz do direito processual, seja mesmo à luz do direito substantivo (as normas dos artºs 222º a 224º CSCom)?
De um ponto de vista estritamente processual (sem olhar à lei substantiva), a matéria repugna, de certa forma:
- o nóvel artº 316º CPCiv “ordena mais logicamente as situações em que é admitida a intervenção principal provocada: litisconsórcio necessário; litisconsórcio voluntário por iniciativa do autor; litisconsórcio voluntário por iniciativa do réu” (Prof. Lebre de Freitas e Drª Isabel Alexandre, Código Anotado, I, artº 316º);
- o artº 320º CPCiv estabelece agora, sem quaisquer restrições, que a relação jurídica litigada é apreciada quanto a todos os intervenientes, constituindo, quanto a todos, caso julgado;
- a um modelo de processo rígido, com formas inflexíveis, sucede um processo de regras mais abertas, focado na simplificação e na agilização processual, mas também na justa composição dos litígios em prazo razoável; ao juiz-espectador/decisor sucede um juiz mais interveniente, enquanto devendo providenciar pelo andamento regular e célere do processo, providenciar oficiosamente pelo suprimento da falta de pressupostos processuais susceptíveis de sanação, determinando a realização dos actos necessários à regularização da instância ou, quando a sanação dependa de acto que deva ser praticado pelas partes, convidando estas a praticá-lo – artº 6º nºs 1 e 2 CPCiv e Prof. M. Teixeira de Sousa, CDP, 43/10ss.IIIA resposta à pergunta que anteriormente formulámos, relativa à possibilidade de regularização da instância neste momento do processo, pela intervenção dos terceiros contitulares da quota social, na inexistência de representante comum, encontra a nosso ver, um argumento favorável de peso, que foi acolhido na fundamentação do citado Ac.R.P. 26/2/09.
Não por força de encontrar uma lacuna na regulamentação legal, que conduzisse designadamente à aplicação analógica do regime excepcional do artº 222º nº4 CSCom, mas porque da intervenção no processo de todos os interessados contitulares se ficará a conhecer da respectiva posição e eventual anuência (ou não) à posição invocada pelo Autor, enquanto representante comum, ou, pelo menos, que como tal se arrogou.
Note-se que a deliberação de escolha do representante comum deve ser tomada por maioria, nos termos do artº 1407º nº1 CCiv (por contitulares que representem pelo menos metade do capital da quota), mas a lei não exige forma alguma para a escolha do representante comum (assim, Prof. Raúl Ventura, op. cit., pg. 513), escolha essa que pode assim efectivar-se pela manifestação da posição dos interessados em processo judicial, no respectivo articulado.
Acresce que as relações dos contitulares com o representante comum apresentam um quadro semelhante aos negócios representativos, pelo que a intervenção dos demais contitulares no processo poderá vir a traduzir a ratificação da actuação do Autor, considerado este como o representante sem poderes – artº 268º nº1 CCiv – ou, noutro diferente âmbito, como o gestor de negócios, que vê a sua gestão aprovada – artº 469º CCiv.
De resto, os indícios dos autos levam a crer que  maioria dos contitulares da quota e do capital aprovam a representação do Autor, como dá mostras o documento de “ratificação” de fls. 464ss. do processo, subscrito por todos os contitulares da quota, à excepção de um único, titular este de 198 em 700 avos da quota comum.
Mas se a maioria dos contitulares da quota, achada pela forma supra descrita, se manifestar contrária à pretensão formulada na acção, haverá a mesma que improceder, no sentido já apontado pelo Ac.R.P. 26/2/09 – porque a intervenção dos demais contitulares no processo não supriu a ilegitimidade do Autor.
De todo o modo, essa intervenção dos demais contitulares esclarecerá definitivamente a posição das partes quanto à representação do Autor, e, por força do disposto no artº 320º CPCiv, a relação jurídica litigada será apreciada quanto a todos os intervenientes, e virá a constituir, quanto a todos, caso julgado.

Resumindo a fundamentação:
I - Para um exercício activo de direitos dos sócios em face da sociedade, existe a regra do artº 222º nº1 CSCom , segundo a qual “os contitulares de quota devem exercer os direitos a ela inerentes através de representante comum”.
II – A presença, ao menos formal, de todos os interessados através de representante comum, em termos de sentido, leva à admissão da própria presença efectiva de todos os interessados, chamados pelo contitular da quota que intentou a acção, em intervenção principal provocada litisconsorcial.
III - A deliberação de escolha do representante comum deve ser tomada por maioria, nos termos do artº 1407º nº1 CCiv (por contitulares que representem pelo menos metade do capital da quota), mas a lei não exige forma alguma para a escolha do representante comum, que pode assim efectivar-se pela manifestação da posição dos interessados em processo judicial, no respectivo articulado, ratificando, ou não, de acordo com as regras aplicáveis à referida deliberação, a anterior intervenção do Autor.

Dispositivo (artº 202º nº1 C.R.P.):
Na procedência do recurso apresentado, revoga-se o douto despacho recorrido, que deverá ser substituído por outro que admita a requerida intervenção principal provocada dos indicados contitulares da quota social, fixe o regime de custas em dívida pelo incidente, em conformidade com o agora decidido, e determine a citação dos chamados. 
Custas do recurso a cargo da Apelada.

Porto, 27/I/2015
Vieira e Cunha
Maria Eiró
João Proença Costa

● Rec. 4304/12.4TBVFR.P1. Relator – Vieira e Cunha. Adjuntos – Desembargadores Maria Eiró e João Proença Costa. Decisão recorrida de 5/6/2014. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto A Questão Recurso de apelação interposto na acção com processo comum e forma ordinária nº4304/12.1TBVFR, do ex-2º Juízo Cível de Stª Mª da Feira. Autor – B… (na qualidade de representante comum da quota de € 31.424,27). Ré – C…, Ldª. Pedido Que seja declarada a anulação das deliberações sociais tomadas na Assembleia Geral da sociedade Ré, que decorreu em 21/7/2012, que deliberaram sobre os pontos da convocatória de 3/7/2012 e os aditamentos de 6/7, com averbamento no registo comercial da Ré. Tese do Autor É representante, porque contitular, de uma quota do valor nominal de € 31.424,27, no capital social de € 251.394,14 da Requerida. Esta qualidade está assente junto da Requerida ao longo dos anos, como resultou designadamente de um processo judicial. Para o dia 21/7/2012 foi convocada uma assembleia geral anual, para deliberar, entre outros pontos, sobre os exercícios de 2010 e 2011, mas o ROC investido não fez anexar, em momento prévio à realização da assembleia geral, certificação de contas relativamente a esses anos, pelo que nos encontrávamos perante uma situação de irregular funcionamento da assembleia, nos termos dos artºs 451º, 248º e 58º nº1 al.c) CSCom, que feria de anulabilidade o que aí se viesse a decidir. No dia da assembleia, o gerente impediu a entrada na mesma referida assembleia de um sócio e do representante de um outro sócio ente colectivo. Visava o gerente, em conluio com outros sócios, revalidar uma deliberação cuja legalidade fora questionada em processo judicial, visando a nomeação de novos gerentes, beneficiando um conjunto de sócios e evitando a respectiva responsabilização por danos. O comportamento descrito é causa de anulação de deliberação social – artº 58º nº1 al.b) CSCom. Tese da Ré O litígio em que a presente acção se insere visa permitir o domínio da sociedade Ré por uma sociedade concorrente, D…, Ldª, sociedade para a qual foram invocadamente transmitidas quotas por alguns sócios, em negócio nulo e ineficaz, relativamente à Ré. Encontra-se assim a correr termos acção declarativa que visa, entre outros, excluir o Autor de sócio da Ré. Foi o Autor quem, formalmente, por força de decisão judicial em procedimento cautelar, esteve à frente dos destinos da Ré no ano de 2010, sendo que sempre obedeceu às instruções dos responsáveis da citada concorrente da Ré, a D…. O Autor, enquanto nas funções de gerente, não prestou colaboração ao ROC, e suscitou uma acentuada diminuição das receitas da Ré. Os sócios comuns às duas sociedades declararam ceder as quotas que possuíam no capital social da Ré à sociedade concorrente, sem obterem o seu consentimento, ou possibilitarem o exercício do direito de preferência (artº 228º nº2 CSCom). O Autor é parte ilegítima, pois que outros contitulares da respectiva quota não o reconhecem como representante comum, e fizeram-se até representar por terceiros na assembleia geral em causa, como dá nota a própria acta; todavia, e por outro lado, o sócio E… foi o único contitular da quota do Autor que se fez representar na aludida assembleia geral e exerceu os direitos de voto inerentes àquela quota. O Autor carece assim de legitimidade processual para, isoladamente, instaurar a presente acção. No mais, impugna motivadamente a alegação do Autor, enquanto fundamento do pedido. Na decisão proferida no despacho saneador, a Mmª Juiz “a quo”, com fundamento em que, do regime dos artºs 303º, 233º e 224º CSCom, decorre que o contitular de participação social indivisa não pode, por si só, exercer os direitos a essa participação, nem resultando que exista qualquer deliberação dos contitulares a nomearem o Autor como seu representante comum, julgou procedente a excepção dilatória de ilegitimidade activa. De seguida, o Autor, veio requerer a intervenção principal provocada dos restantes contitulares da quota em causa, com fundamento em que, tratando-se de excepção sanável, a absolvição só deveria ocorrer se a excepção subsistisse e não estivesse sanada (artºs 577º al.e) e 278º nº3 CPCiv), tendo sido omitida diligência obrigatória, e cometida nulidade processual, que pode ser sanada com o chamamento daqueles que têm interesse igual e paralelo ao Autor para intervirem na acção. A Ré opôs-se à admissão do incidente. O despacho recorrido esclareceu não se tratar, no caso em apreço, de um caso de ilegitimidade processual activa, pelo facto de o Autor se encontrar desacompanhado dos demais contitulares da quota indivisa (preterição de litisconsórcio necessário activo), a sanar através da intervenção de tais contitulares na demanda, mas antes de estar na lide quem carece do direito de exercício, nos termos do disposto no artº 223º nº1 CSCom; o Autor não prova a existência de qualquer deliberação no sentido de ser nomeado representante comum dos contitulares da quota indivisa, nem para a propositura da presente acção, nem para a representação dos referidos contitulares junto da Ré, como disposto no artº 223º nº4 CSCom. Conclusões do Recurso: i. O artigo 222.º, n.º 1 do C.S.C. é erradamente interpretado e aplicado quando pretende ver na “representação” de quota comum algo que extravase do exercício, em dado momento, de direito societário e em assembleia – aresto da Rel.Porto, de 19.05.2014 (junto aos autos - refª 17026222, a propósito de problema análogo e na vida da Ré!) e autores neste citados; ii. a legitimidade processual não tem que coincidir com a representação conferida para actuação societária, pois que o direito dos contitulares não é transmitido para o representante, já que se trata, então de direito cujo exercício judicial é definido pelos artigos 1405.º do C.Civil e 26.º, n.ºs 2 e 3 do C.P.C., ao tempo, actualmente art. 30.º, n.º 2 e 3 do C.P.C. iii. Pense-se na situação de, entre o momento da deliberação e a sua impugnação, morrer ou incapacitar-se o representante comum: não se exercia o direito ou eram os herdeiros do representante que o podiam fazer?! iv. Perguntar é responder!! v. Outro entendimento, como parece ter sido o da douta decisão, é errada aplicação dos arts. 1405.º do C.Civil e 26.º, n.ºs 2 e 3 do C.P.C. ao tempo (actual art. 30.º, n.º 2 e 3 do C.P.C.). vi. Atento o regime dos citados arts. 1405.º do C.Civil e 26.º, n.ºs 2 e 3 do C.P.C. ao tempo (actual art. 30.º, n.º 2 e 3 do C.P.C.), havendo situação de ilegitimidade activa – decisão que transitou em julgado – entender que se trata de ilegitimidade singular vii. é fazer errada interpretação do regime do artigo 26.º, n.º 3 do C.P.C., ao tempo da propositura da acção – agora art. 30.º, n.º 3 do C.P.C.; viii. A tratar – se de ilegitimidade activa plural - art. 27.º, n.º 1 do C.P.C., ao tempo, correspondendo agora ao art. 32.º do C.P.C.) - , porque sanável, ix. além da nulidade de omitir a prática de acto que a lei impunha – arts. 288.º, n.º 3 e 265.º, n.º 2 do C.P.C. ao tempo, e agora arts. 278.º, n.º 3, e art. 6.º do C.P.C. – x. declarar que a intervenção principal provocada dos demais contitulares é meio inadequado é fazer errada interpretação dos arts. 269.º e 270.º do C.P.C., ao tempo da instauração da acção (arts. 261.º e 262.º na nova redacção do C.P.C.), xi. bem como do regime do art. 6.º, n.ºs 1 e 2 do C.P.C., na redacção actual, atento o que se lê no douto aresto nos autos e o que se explana em 39 e 40; xii. declarar que a representação é exigida pela vida societária e considerar inverificada a representação numa situação em que a comprovação para esse exercício societário não ocorreu é fazer errada aplicação do regime do art. 508.º, n.º 3 do C.P.C., actualmente art. 590.º, n.º 3 do C.P.C., pois, quando muito, tratar-se-ia de articulado documentalmente insuficiente. xiii. Há, pois, nulidade – art. 201.º do C.P.C., na redacção ao tempo e art. 195.º na redacção actual; xiv. Há erro em matéria de facto – art. 655.º do C.P.C, ao tempo e art. 607.º na redacção em vigor do C.P.C. – que leva a contradição entre a decisão e os fundamentos, quando a douta decisão assenta as suas conclusões em que “não resulta[do] do alegado pelo Autor nem dos documentos juntos que exista qualquer deliberação dos contitulares…” (sic), se e quando: xv. no cabeçalho da acção, já o A invoca a qualidade de representante de quota do valor nominal de € 31.424,27, xvi. qualidade que alegou e comprovou nos arts. 1º, 2º da petição inicial, xvii. fazendo apelo à desnecessidade de alegação de tal matéria – art. 3º da mesma petição inicial, e xviii. quando a Ré afirma – art. 278.º da douta contestação – que o A. “tem chegado a representar a quota de que é contitular isso foi aceite judicialmente (ver acima n.º 34 destas alegações) xix. a Ré terá “insistido para que ficasse e participasse (!!) na assembleia” - declaração da Ré no art. 195º da douta contestação; xx. a Ré somente afirma que o A., enquanto representante “nem é reconhecido como tal por todos os seus contitulares”. (sic – arts. 278º, 279º e 173º da douta contestação, ou seja, faz declaração ….de terceiro!! (Veja-se a refutação no aresto citado no n.º 34 das alegações). Por contra-alegações, a Ré sustenta o bem fundado e a confirmação do douto despacho recorrido. Factos Provados: Encontram-se demonstrados os factos supra resumidamente expostos, relativos à alegação das partes e aos fundamentos da decisão recorrida, na sequência da absolvição da instância da Ré, por força da excepção dilatória verificada de ilegitimidade activa. Fundamentos Em função da esquematização das conclusões da Recorrente, o único tópico a abordar tem a ver com a possibilidade de chamamento em intervenção principal provocada, no actual momento do processo, dos demais contitulares da quota indivisa que o Autor invocou representar no douto petitório. Vejamos pois.IComo visto, mostra-se incontestado o fundamento da absolvição da instância da Ré, por ilegitimidade do Autor, com base em: 1º - “decorrer do regime dos artºs 303º, 223º e 224º CSCom que o contitular de uma participação social indivisa não pode, por si, isoladamente, exercer os direitos inerentes a essa participação; esse exercício incumbe aos contitulares da participação social que o devem concretizar através de um representante comum”. 2º - “O Autor, na configuração que faz da sua pretensão, apresentar-se como contitular da quota, invocando ele mesmo um direito de acção – correspondente ao direito da quota – que singularmente não tem”. 3º - “Não estarmos perante um caso de ilegitimidade activa decorrente da falta de intervenção de outros sujeitos que deveriam estar na lide, mas perante a circunstância de estar nela quem carece do direito de exercício, pois a outrem pertence esse mesmo direito” (citámos nos três parágrafos o despacho saneador que invocou a ilegitimidade activa e absolveu a Ré da instância). Mas o Autor, que entende que a ilegitimidade processual pode ser sanada pela intervenção principal provocada litisconsorcial dos demais contitulares da quota, vem chamá-los, ao abrigo do disposto no artº 261º nº1 CPCiv. O despacho recorrido, também sustentado na posição processual da Ré, por oposição ao incidente e contra-alegações de recurso, mantém que a ilegitimidade em causa não pode ser suprida com a intervenção dos referidos contitulares da quota, pressupondo antes uma prévia deliberação de todos em matéria de representante comum, que inexiste. Encontra-se pois resolvida a questão relativa a saber se as normas relativas à representação dos contitulares de quota por representante comum se aplicam, não apenas às relações dos contitulares da quota com a sociedade, mas também no que respeita ao exercício de direitos em juízo, matéria que, de resto, tem sido resolvida pela jurisprudência em sentido afirmativo – cf. Ac.R.E. 2/5/02 Col.III/240, relatado pelo Desemb. Ribeiro Cardoso. Quid juris?IIIncidentalmente, a jurisprudência pronunciou-se sobre a matéria. É difícil porém encontrar casos em que essa jurisprudência se tenha pronunciado expressamente sobre a possibilidade de suprir a inexistência de representante comum através do chamamento em intervenção principal dos demais contitulares de quota. São exemplos daquela pronúncia incidental (que não influiu no decisão final tomada) o Ac.S.T.J. 4/10/94 Bol.440/505 (relatado pelo Consº Cardona Ferreira), o citado Ac.R.E. 2/5/02, e o Ac.R.P. 26/2/09, na base de dados oficial, pº 0837016, relatado pelo Consº Pinto de Almeida. Todavia, o iter do processo que este último acórdão revela muito nos ajudará à formação de uma convicção decisória. O Ac.R.E. 2/5/02 cit., pronunciando-se embora pela desnecessidade da presença de todos os contitulares na acção, não a exclui nem afasta, ainda que a título supletivo. O primeiro acórdão em causa, do Supremo Tribunal de Justiça, refere que, “se a lei societária, na sua letra e alcance lógico, exige a presença, ao menos formal, de todos os interessados através de representante comum”, isso, em termos de sentido, “leva à admissão da própria presença efectiva, mas de todos os interessados”, visto o alcance do artº 28º nº1 CPCiv61 acerca do litisconsórcio necessário. O Prof. Raúl Ventura, Sociedades por Quotas, I/495ss., na exegese do artº 222º nº1 CSCom, entende que, se é verdade que os contitulares de uma quota devem exercer os direitos a ela inerentes através de um representante comum, “não pode excluir-se que os direitos – ou pelo menos alguns deles – não possam ser exercidos por outra forma”. Concebe-se aliás o exercício dos direitos por meio de uma só pessoa designada para o efeito, ou por todos os contitulares em conjunto, podendo escolher-se, neste caso, entre a unanimidade e a maioria. Para um exercício activo de direitos dos sócios em face da sociedade, existe efectivamente a regra do artº 222º nº1 CSCom – “os contitulares de quota devem exercer os direitos a ela inerentes através de representante comum”. Exceptuam-se as situações a que alude o artº 222º nº4 CSCom (impedimentos do representante comum ou impossibilidade de deliberação, caso em que a nomeação fica deferida ao tribunal – artº 223º nº3) e ainda os direitos de exercício necessariamente individual (v.g., o direito ao uso das coisas sociais ou o direito a ser eleito para certros cargos sociais). Não é o caso do direito de impugnar deliberações sociais, que não é, por natureza, um direito de exercício individual, diz o Autor (op. cit., pg. 497). Mas a questão permanece: intentada a acção de anulação de deliberações sociais por um dos contitulares que não comprova a qualidade de representante comum, está vedada a possibilidade de regularização da instância, seja à luz do direito processual, seja mesmo à luz do direito substantivo (as normas dos artºs 222º a 224º CSCom)? De um ponto de vista estritamente processual (sem olhar à lei substantiva), a matéria repugna, de certa forma: - o nóvel artº 316º CPCiv “ordena mais logicamente as situações em que é admitida a intervenção principal provocada: litisconsórcio necessário; litisconsórcio voluntário por iniciativa do autor; litisconsórcio voluntário por iniciativa do réu” (Prof. Lebre de Freitas e Drª Isabel Alexandre, Código Anotado, I, artº 316º); - o artº 320º CPCiv estabelece agora, sem quaisquer restrições, que a relação jurídica litigada é apreciada quanto a todos os intervenientes, constituindo, quanto a todos, caso julgado; - a um modelo de processo rígido, com formas inflexíveis, sucede um processo de regras mais abertas, focado na simplificação e na agilização processual, mas também na justa composição dos litígios em prazo razoável; ao juiz-espectador/decisor sucede um juiz mais interveniente, enquanto devendo providenciar pelo andamento regular e célere do processo, providenciar oficiosamente pelo suprimento da falta de pressupostos processuais susceptíveis de sanação, determinando a realização dos actos necessários à regularização da instância ou, quando a sanação dependa de acto que deva ser praticado pelas partes, convidando estas a praticá-lo – artº 6º nºs 1 e 2 CPCiv e Prof. M. Teixeira de Sousa, CDP, 43/10ss.IIIA resposta à pergunta que anteriormente formulámos, relativa à possibilidade de regularização da instância neste momento do processo, pela intervenção dos terceiros contitulares da quota social, na inexistência de representante comum, encontra a nosso ver, um argumento favorável de peso, que foi acolhido na fundamentação do citado Ac.R.P. 26/2/09. Não por força de encontrar uma lacuna na regulamentação legal, que conduzisse designadamente à aplicação analógica do regime excepcional do artº 222º nº4 CSCom, mas porque da intervenção no processo de todos os interessados contitulares se ficará a conhecer da respectiva posição e eventual anuência (ou não) à posição invocada pelo Autor, enquanto representante comum, ou, pelo menos, que como tal se arrogou. Note-se que a deliberação de escolha do representante comum deve ser tomada por maioria, nos termos do artº 1407º nº1 CCiv (por contitulares que representem pelo menos metade do capital da quota), mas a lei não exige forma alguma para a escolha do representante comum (assim, Prof. Raúl Ventura, op. cit., pg. 513), escolha essa que pode assim efectivar-se pela manifestação da posição dos interessados em processo judicial, no respectivo articulado. Acresce que as relações dos contitulares com o representante comum apresentam um quadro semelhante aos negócios representativos, pelo que a intervenção dos demais contitulares no processo poderá vir a traduzir a ratificação da actuação do Autor, considerado este como o representante sem poderes – artº 268º nº1 CCiv – ou, noutro diferente âmbito, como o gestor de negócios, que vê a sua gestão aprovada – artº 469º CCiv. De resto, os indícios dos autos levam a crer que maioria dos contitulares da quota e do capital aprovam a representação do Autor, como dá mostras o documento de “ratificação” de fls. 464ss. do processo, subscrito por todos os contitulares da quota, à excepção de um único, titular este de 198 em 700 avos da quota comum. Mas se a maioria dos contitulares da quota, achada pela forma supra descrita, se manifestar contrária à pretensão formulada na acção, haverá a mesma que improceder, no sentido já apontado pelo Ac.R.P. 26/2/09 – porque a intervenção dos demais contitulares no processo não supriu a ilegitimidade do Autor. De todo o modo, essa intervenção dos demais contitulares esclarecerá definitivamente a posição das partes quanto à representação do Autor, e, por força do disposto no artº 320º CPCiv, a relação jurídica litigada será apreciada quanto a todos os intervenientes, e virá a constituir, quanto a todos, caso julgado. Resumindo a fundamentação: I - Para um exercício activo de direitos dos sócios em face da sociedade, existe a regra do artº 222º nº1 CSCom , segundo a qual “os contitulares de quota devem exercer os direitos a ela inerentes através de representante comum”. II – A presença, ao menos formal, de todos os interessados através de representante comum, em termos de sentido, leva à admissão da própria presença efectiva de todos os interessados, chamados pelo contitular da quota que intentou a acção, em intervenção principal provocada litisconsorcial. III - A deliberação de escolha do representante comum deve ser tomada por maioria, nos termos do artº 1407º nº1 CCiv (por contitulares que representem pelo menos metade do capital da quota), mas a lei não exige forma alguma para a escolha do representante comum, que pode assim efectivar-se pela manifestação da posição dos interessados em processo judicial, no respectivo articulado, ratificando, ou não, de acordo com as regras aplicáveis à referida deliberação, a anterior intervenção do Autor. Dispositivo (artº 202º nº1 C.R.P.): Na procedência do recurso apresentado, revoga-se o douto despacho recorrido, que deverá ser substituído por outro que admita a requerida intervenção principal provocada dos indicados contitulares da quota social, fixe o regime de custas em dívida pelo incidente, em conformidade com o agora decidido, e determine a citação dos chamados. Custas do recurso a cargo da Apelada. Porto, 27/I/2015 Vieira e Cunha Maria Eiró João Proença Costa