Processo:1378/14.4TBMAI.P1
Data do Acordão: 26/01/2015Relator: M. PINTO DOS SANTOSTribunal:trp
Decisão: Meio processual:

I - A violação do princípio do contraditório é geradora da nulidade processual prevista no art. 195º nº 1 do Novo CPC se influir no exame ou na decisão proferida. II - Quando o acto afectado de nulidade se encontra coberto por decisão que se lhe seguiu, tal nulidade pode ser objecto de recurso e pode ser declarada pelo Tribunal da Relação.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
M. PINTO DOS SANTOS
Descritores
NULIDADE PROCESSUAL VIOLAÇÃO DO CONTRADITÓRIO MODO DE ARGUIÇÃO
No do documento
Data do Acordão
01/27/2015
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO
Decisão
REVOGADA
Sumário
I - A violação do princípio do contraditório é geradora da nulidade processual prevista no art. 195º nº 1 do Novo CPC se influir no exame ou na decisão proferida. II - Quando o acto afectado de nulidade se encontra coberto por decisão que se lhe seguiu, tal nulidade pode ser objecto de recurso e pode ser declarada pelo Tribunal da Relação.
Decisão integral
Proc. 1378/14.4TBMAI.P1 – 2ª Secção
(Apelação)
_________________________________
Relator: Pinto dos Santos
Adjuntos: Des. Francisco Matos
                Des. Maria de Jesus Pereira*         *         *Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório:

1. O «iter» processual:
A 13/03/2014, B… instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra C… e mulher, D…, referindo, na parte inicial da petição inicial, que havia requerido apoio judiciário em 04/09/2013 e que, por falta de decisão atempada dos serviços da segurança social, o mesmo deveria considerar-se tacitamente deferido.
Porque a cópia do pedido de apoio judiciário que juntou não tinha nenhuma indicação de que tivesse sido enviado e/ou recebido nos serviços da segurança social, a Mma. Juiz «a quo» ordenou a notificação do autor para que, em 10 dias, suprisse essa falta, juntando nova cópia daquele pedido.
Mais solicitou à segurança social informação acerca da decisão proferida quanto a tal pedido.

O autor juntou, depois, cópia do referido pedido, informando que o mesmo foi enviado por fax aos serviços da segurança social, juntando a respectiva cópia a fls. 57 e segs. e constando de fls. 68 um registo de fax, datado das 15,05 horas do dia 31/10/2013, endereçado a uma tal “E…” [desconhece-se quem seja esta pessoa e se tem alguma ligação à Seg. Soc.].

A segurança social informou, por sua vez, que a pretensão do autor foi objecto, em 29/05/2013, de proposta de indeferimento, da qual aquele foi notificado e que depois, na ausência de resposta ao mesmo, tal proposta foi convertida em decisão definitiva de indeferimento, da qual também foi notificado e não recorreu.

Veio depois o autor informar que a decisão acabada de referir diz respeito a um pedido de apoio judiciário anterior e acrescentou que, em 31/10/2013, apresentou, por fax, um novo pedido à segurança social e que o mesmo não foi objecto de qualquer decisão por parte dos serviços de tal organismo até à data da propositura desta acção. 

A solicitação do Tribunal, a segurança social informou, ainda, que, na segunda data indicada pelo autor [31/10/2013], não deu entrada nos respectivos serviços qualquer requerimento/pedido do autor.

Sem que o autor fosse notificado desta informação, a Mma. Juiz proferiu, com data de 20/10/2014, o seguinte despacho:
“De acordo ainda com o nº 4 do artº 552º do CPC, o autor deve juntar à petição inicial o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça (...). A falta de junção destes documentos tem a consequência prevista no artº 558º, al. f) do CPC, que dispõe que a secretaria recusa o recebimento da petição inicial indicando por escrito o fundamento da rejeição, quando (...) "Não tenha sido comprovado o prévio pagamento da taxa de justiça devida ou a concessão de apoio judiciário (...).
No caso «sub judice« e uma vez que a Secretaria não recusou a mesma, não resta ao Tribunal senão ordenar agora o desentranhamento da petição inicial, pois para além de não ter sido demonstrado o prévio pagamento da Taxa de justiça, também ao autor não havia sido concedido o benefício de apoio judiciário.
Nos termos e fundamentos supra expendidos decido ordenar o desentranhamento da petição inicial, deixando no lugar cópia da mesma, e em consequência determinar o arquivamento dos autos.
Nos termos do disposto no nº1 do artº 315º do C.P.C, fixo o valor da causa em 30.000,01€.
Registe e notifique.”*
*2. O recurso:
De tal despacho, interpôs o autor o recurso de apelação em apreço, cujas alegações culminou com as seguintes conclusões:
“A - Andou mal a Meritíssima Juiz a quo na prolação da sua sentença, quanto à aplicação do normativo legal aplicado à sentença Segurança Social por entender que a Secretaria devia ter recusado o recebimento da petição inicial por não ter sido comprovado o prévio pagamento da taxa de justiça ou a concessão de apoio judiciário em conformidade com o disposto na alínea f) do Art. 558º do C.P.C..
B - Não tendo tal sucedido, foi ordenado pela Meritíssima Juiz o desentranhamento da petição inicial, determinando o arquivamento dos autos o que, salvo o devido respeito, demonstra não ter feito uma análise correta dos documentos juntos aos processo, quer pelo aqui Apelante quer pela Segurança Social.
C - Verifica-se uma violação do princípio do contraditório, pois que a Segurança Social em Julho de 2014 juntou documentos aos autos que não foram dados a conhecer ao aqui Apelante, ficando este impossibilitado de exercer o contraditório como era de seu legitimo direito.
D - O Apelante com a petição inicial juntou comprovativo do pedido de protecção jurídica enviado para a Segurança Social em 31 de Outubro de 2013, alegando desde logo na referida peça processual o deferimento tácito do mesmo, com base no disposto no Artº 25º da Lei 34/2004 de 29 de Julho, com a redação que lhe foi introduzida pela Lei 47/2007, de 28 de Agosto.
E - Tendo sido apresentada a petição inicial em 13 de Março de 2014, ou seja, passados mais de 4 meses e meio do envio do pedido de protecção jurídica, dúvidas não teve o Apelante que o mesmo se encontrava dentro da previsão do nº 2 do já citado preceito, pelo que era de todo legítimo alegar o deferimento tácito.
F - A Segurança Social erradamente forneceu resposta sobre um requerimento apresentado em 14 de Fevereiro de 2013, conforme fls 70 e segs., nada dizendo sobre o requerimento junto aos autos pelo Apelante datado de 31 de Outubro de 2013.
G - Na verdade, é impossível a Segurança Social ter dado resposta em 24-05-2013 a um requerimento que só deu entrada em 31 de Outubro de 2013, havendo manifesto lapso por parte da Segurança Social.
H - A Segurança Social, que seja do conhecimento do Apelante, nunca deu resposta ao Requerimento que foi enviado em 31 de Outubro de 2013, sendo esse o Requerimento que se encontra em causa e não outro.
I - O Apelante notificado da informação prestada pela Segurança Social em 23-04-2014, pugnou em requerimento datado de 29-04-2014, no sentido que o tribunal obtivesse uma resposta quanto ao requerimento de protecção jurídica apresentado em 31-10-2013, uma vez que a informação prestada não era correcta, pois não dizia sequer respeito a este pedido de protecção jurídica.
J - O Tribunal a quo consciente também da falta de resposta ao solicitado, notificou novamente a Segurança Social através dos ofícios datados de 05-05-2014, 03-06-2014, 12-06-2014, 01-07-2014 e 08-07-2014 para dar resposta quanto ao pedido de protecção jurídica apresentado pelo Apelante em 31-10-2013.
K - A Segurança Social continuou a insistir no mesmo erro, informando o douto tribunal da decisão que recaiu sobre o requerimento de protecção jurídica apresentado em 14 de Fevereiro de 2013, nunca dando resposta ao pedido de protecção jurídica datado de 31-10-2014.
L - Saliente-se que o Apelante não foi notificado de todas as respostas da Segurança Social juntas aos autos após 29-04-2014, ficando assim impedido de exercer o contraditório e, caso fosse notificado de decisão de indeferimento teria o Apelante apresentado impugnação judicial nos termos do nº 2 do Art. 26º da citada Lei, exercendo o seu direito de defesa.
M - De igual modo, e se fosse o caso de se entender que teria havia decisão de indeferimento sobre o pedido apresentado, o que por mera hipótese de raciocínio se concede, o Apelante sempre teria de ser notificado dessa mesma decisão para proceder ao pagamento da taxa de justiça devida, como decorre do disposto no nº 3 do Art. 24º da Lei 34/2004, de 29/7.
N - Pelo contrário, foi o Apelante surpreendido pela sentença proferida que decide pelo desentranhamento da petição e o arquivamento dos autos, sem nunca ter sido notificado da decisão de indeferimento do pedido de protecção jurídica apresentado em 31-10-2014.
O - A Meritíssima Juiz tem o dever de apreciar e analisar a prova junta aos autos, pelo que se o tribunal tivesse conjugado o teor dos documentos juntos pela Segurança Social com o requerimento de protecção jurídica junta pelo Apelante teria decidido de forma diversa.
P - A sentença proferida carece de absoluta falta de fundamentação, o que conduz à nulidade da mesma.
Q - Estabelece a alínea b) do nº 1 do Art. 668º do C.P.C. que “É nula a sentença quando: não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;” nulidade essa que aqui expressamente se invoca, pois que a sentença objecto do presente recurso tem total falta de fundamentação de facto e de direito porquanto não discrimina os factos que considera provados nem indica as normas jurídicas aplicáveis aos factos em concreto, limitando-se a referir num único parágrafo factos que nem sequer correspondem à verdade.
R - A Meritíssima Juiz fez tábua rasa de todo o processado, ou seja, dos documentos, requerimentos, ofícios e respostas da Segurança Social, limitando-se a dizer que não feito o pagamento da taxa de justiça nem comprovado o benefício de apoio judiciário, contrariamente ao que resulta dos autos.
S - Para além da invocada nulidade por total falta de fundamentação da sentença, a Meritíssima Juiz ao proferir sentença sem ter dado oportunidade ao aqui Apelante de se pronunciar sobre as respostas da Segurança Social após 29 de Abril de 2014, violou o princípio do contraditório contemplado no nº 3 do Artº 3 º do C.P.C., o que consubstancia uma nulidade processual, que desde já também se invoca.
T - Deveria o Apelante ter sido notificado para se pronunciar sobre as respostas da Segurança Social o que permitiria esclarecer o Tribunal sobre o persistente erro daquela instituição que parece que deliberadamente e em clara desobediência à Meritíssima Juiz persistiu em manter uma inverdade incompreensível e da qual apenas resultam prejuízos para o Apelante e, consequentemente resultaria decisão diversa da ora proferida pelo Tribunal a quo.
U - “A violação do disposto no nº 3 do artigo 3º do Cód. De Proc. Civil, integrando a violação do princípio do contraditório, é susceptível de consubstanciar a prática de uma nulidade processual, quando a subjacente irregularidade cometida se mostre capaz de influir no exame ou decisão da causa.” - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11.01.2011.
V - “Na estruturação de um processo justo o tribunal deve prevenir e, na medida do possível, obviar a que os pleiteantes sejam surpreendidos com decisões para as quais as suas exposições, factuais e jurídicas, não foram tomadas em consideração.” - Acórdão da Relação de Coimbra de 03.11.2012.
W - Sendo o contraditório um princípio basilar que alicerça o processo civil a sua violação gera nulidade processual que se invoca, e que no caso em concreto, gerou ainda prejuízo irreparável para o Apelante que vê sucumbir a sua legítima pretensão.
X - A Segurança Social dispunha de 2 dias úteis para confirmar ou não a formação do acto tácito de deferimento do pedido de protecção jurídica, conforme estipula o nº 4 do Art. 25º da Lei nº 34/2004 com as alterações produzidas pela Lei 47/2007 de 28 de Agosto, e não tendo cumprido tal prazo em qualquer das interpelações efectuadas pelo Tribunal, deveria a Meritíssima Juiz considerar o deferimento tácito do referido pedido e ordenado o prosseguimento dos autos.
Y - Não o tendo feito, causou graves prejuízos ao aqui Apelante, que viu a sua acção parada durante cerca de sete meses, sendo certo que, no decurso deste período o ali Réu intentou acção contra o aqui Apelante que viu preteridas as suas legítimas pretensões.
Z - De igual modo, deveria sempre o Tribunal através da Secretaria ter notificado o Apelante para proceder ao pagamento da taxa de justiça nos termos do disposto no artº 24 nº 3 da Lei 34/2004, com as alterações produzidas pela Lei 47/2007 de 28 de Agosto, dado que o Apelante em momento algum foi notificado da decisão de indeferimento do pedido de protecção jurídica apresentado em 31 de Outubro de 2013.
AA - O Tribunal a quo violou o principio da igualdade e direito fundamental de acesso à justiça, consagrados respectivamente nos artºs 13º e 20º da Constituição.
AB - Mesmo que se encontrasse ultrapassado o prazo de 10 dias para juntar o comprovativo do pagamento da taxa de justiça, deveria a secretaria ter notificado o Apelante para, em 10 dias efectuar o pagamento omitido, com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 10 UC.
AC - O Apelante nunca foi notificado da decisão de indeferimento do pedido de apoio judiciário, conforme consta dos autos, pelo que não estando verificados todos os requisitos necessários para o desentranhamento da petição inicial, a Meritíssima Juiz não poderia ter ordenado o desentranhamento da mesma e procedido ao «arquivamento dos autos», sem antes ter dado a possibilidade ao aqui Apelante de vir suprir o montante da taxa de justiça inicial em falta.
AD - Salvo melhor opinião, é o que resulta da conexão entre o artº 28º do CCJ e o disposto no Artº 145 nº 3 do CPC, não sendo de decidir pelo desentranhamento da peça, sem antes convidar o apelante a efectuar o pagamento da taxa de justiça inicial.
AE - Deveria a Meritíssima Juiz antes de ter proferir sentença de «arquivamento» ter ordenado a notificação do Apelante das respostas da Segurança Social, de forma a que o mesmo se pronunciasse ou, se fosse caso para isso, pudesse em tempo útil proceder ao pagamento da taxa de justiça inicial.
AF - Em suma, nunca poderia a Meritíssima Juiz a quo decidir como na sentença porquanto estava obrigada a dar cumprimento ao preceituado na Lei nº 34/2004 com as alterações introduzidas pela Lei nº 47/2007 de 28 de Agosto, devendo considerar o deferimento tácito do pedido de protecção jurídica decorridos os dois dias úteis após a notificação à Segurança Social.
AG - Bem como deveria a Meritíssima Juiz a quo ter dado cumprimento ao princípio do contraditório, plasmado no nº 3 do Art. 3º do C.P.C., notificando o Apelante das respostas da Segurança Social.
AH - Em última análise sempre deveria a Meritíssima Juiz ter dado cumprimento ao nº 3 do Art. 145º do C.P.C., notificando o Apelante para vir aos autos proceder ao pagamento da taxa de justiça em falta.
Termos em que deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, substituindo-a por outra em que a Meritíssima Juiz a quo considere o deferimento tácito do pedido de protecção jurídica apresentado pelo Apelante ou, em no limite que ordene a notificação do Apelante para proceder à autoliquidação da taxa de justiça inicial, no prazo de 10 dias, seguindo-se os ulteriores termos legais, assim fazendo V. Exas. inteira e sã Justiça.”

Não houve contra-alegações.*         *         *II. Circunstancialismo fáctico:

O circunstancialismo fáctico a ter em conta é o que ficou descrito no item 1 do ponto anterior deste acórdão.*         *         *III. Apreciação jurídica:

O recorrente suscita, nas conclusões das alegações, as seguintes questões:
● Foi violado o princípio do contraditório e cometida, assim, uma nulidade processual que deve ser declarada?
● A decisão recorrida padece de nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto e/ou de direito?
● A petição inicial podia ter sido mandada desentranhar, como foi, ou, antes disso, havia outras diligências que deviam ter sido feitas/ordenadas?

Comecemos pela primeira questão enunciada.
O recorrente sustenta que o Tribunal «a quo» inobservou o princípio do contraditório, por não o ter notificado da informação prestada, a fls. 92, pela segurança social, na qual esta deu notícia de que na data referida por aquele [31/10/2013] nenhum pedido de apoio judiciário, por ele formulado, deu entrada nos seus serviços, e acrescenta que, assim, incorreu em nulidade processual que esta Relação deve declarar.
Não há dúvida que o art. 3º do Novo CPC [que é o aplicável ao caso, na medida em que a acção foi instaurada em 13/03/2014 – cfr. arts. 5º nº 1 e 8º da Lei nº 41/2013, de 26/06, que aprovou aquele diploma legal] consagra, como antes o art. 3º do CPC revogado, o princípio do contraditório nos seus nºs 2 a 4, impondo que, salvo nos casos excepcionais previstos na lei, nenhuma providência ou decisão deve ser proferida sem que as partes sejam previamente ouvidas sobre o assunto, evitando-se, assim, decisões surpresa [segundo o Prof. Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil Anotado, vol 1º, 1999, pg. 8, “o escopo principal do princípio do contraditório deixou de ser a defesa, no sentido negativo de oposição ou resistência à actuação alheia, para passar a ser a influência, no sentido positivo de direito de influir activamente no desenvolvimento e no êxito do processo”].
No caso, como exarado no item 1 do ponto I deste acórdão, o autor não foi notificado da referida informação da segurança social, tendo a Mma. Juiz «a quo» proferido a decisão recorrida sem que aquele tivesse tido oportunidade de se pronunciar sobre a mesma, a qual contraria o que ele havia referido em anterior requerimento.
Parece, assim, inquestionável que, quanto a tal informação, não foi, efectivamente, cumprido o aludido princípio do contraditório.
A violação deste princípio só é geradora da nulidade processual prevista no art. 195º nº 1 do Novo CPC se influir no exame ou na decisão proferida. E, no caso, influiu.
Com efeito, perante a divergência entre o que o autor havia referido em anterior requerimento e a informação que a segurança social prestou, o que se impunha, em primeiro lugar, era ouvir o demandante sobre essa divergência. E depois, em função da resposta daquele, caso a divergência persistisse, outras diligências se impunham, ao abrigo, então, do princípio do inquisitório consagrado no art. 411º do Novo CPC, designadamente, a remessa àquela entidade de cópia do requerimento de fls. 57 e segs. e do registo de fax junto a fls. 68 [indagando, igualmente, se a pessoa aí referida era, à data, funcionária dos respectivos serviços e se o pedido do autor lhe foi dirigido a ela e ali recebido], a fim de se esclarecer, de uma vez por todas [ultrapassando a impertinência das respostas da segurança social constantes de fls. 79, 86 e 89, em que, sistematicamente, omitiu informação sobre a eventual entrada de um novo pedido de apoio judiciário no dia 31/10/2013, não respondendo à solicitação do Tribunal, o que só acabou por fazer na informação de fls. 92], se houve ou não o segundo pedido alegado pelo autor e, na afirmativa, se o mesmo deu entrada nos ditos serviços na data anunciada por este e se foi ou não objecto de decisão até à data da propositura desta acção. 
Só depois estaria o Tribunal em condições de aferir se houve ou não, como o autor alegou na parte inicial da p. i. [a data que aí referiu como de dedução do segundo pedido de apoio judiciário, foi depois, a fls. 76, corrigida], deferimento tácito desse pedido, nos termos previstos no nº 2 do art. 25º da Lei nº 34/2004, de 29/07, com as alterações introduzidas pela Lei nº 47/2007, de 28/08, o que implicaria, na afirmativa, a dispensa do pagamento da taxa de justiça devida pela interposição da acção, estabelecida nos arts. 530º nº 1 e 552º nº 3 do Novo CPC e que, assim, não houvesse lugar ao desentranhamento do articulado que foi ordenado no despacho recorrido.
Daqui se constata, portanto, que a omissão do contraditório, por si e porque levou à omissão de outras diligências que a ele poderiam/deveriam seguir-se, influiu, directa e necessariamente, na decisão que foi proferida e que é objecto deste recurso, constituindo nulidade processual enquadrável no nº 1 do citado art. 195º.
Aqui chegados há, no entanto, que questionar se esta nulidade podia ser suscitada por via recursória e colocada directamente a este Tribunal da Relação, ou se, em vez disso, devia ter sido primeiramente invocada perante o Tribunal onde foi cometida [1ª instância] e só da respectiva decisão poderia, depois, ser interposto recurso para esta 2ª instância.
Isto porque, como é sabido, em princípio, das nulidades cabe reclamação e não recurso [daí o postulado tradicional: dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se”] e a reclamação é, também em princípio, dirigida ao Juiz do tribunal que cometeu ou onde foi cometida a nulidade.
Apesar destas duas regras básicas, o Prof. Alberto dos Reis [in Código de Processo Civil Anotado, vol. V, 1984, reimpr., pg. 424] ensinava que “A reclamação por nulidade tem cabimento quando as partes ou os funcionários judiciais praticam ou omitem actos que a lei não admite ou prescreve; mas se a nulidade é consequência de decisão do tribunal, se é o tribunal que profere despacho ou acórdão com infracção de disposição de lei, a parte prejudicada não deve reagir mediante reclamação por nulidade, mas mediante interposição de recurso. É que, na hipótese, a nulidade está coberta por uma decisão judicial e o que importa é impugnar a decisão contrária à lei; ora as decisões impugnam-se por meio de recursos (…)  e não por meio de arguição de nulidade de processo”.  
Também o Prof. Manuel de Andrade [in Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pg. 183] entendia que “se a nulidade está coberta por uma decisão judicial que ordenou, autorizou ou sancionou, expressa ou implicitamente, a prática de qualquer acto que a lei impõe, o meio próprio para a arguir não é a simples reclamação, mas o recurso competente a interpor e a tramitar como qualquer outro do mesmo tipo. Trata-se em suma da consagração do brocardo: «dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se».
Igual entendimento perfilham os Profs. Antunes Varela [in Manual de Processo Civil, 1985, pg. 393] e Anselmo de Castro [in Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, 1982, pg. 134]. O primeiro, refere que “se entretanto, o acto afectado de nulidade for coberto por qualquer decisão judicial, o meio próprio de o impugnar deixará de ser a reclamação (para o próprio juiz) e passará a ser o recurso da decisão”. O segundo, diz que “tradicionalmente entende-se que a arguição da nulidade só é admissível quando a infracção processual não está, ainda que indirecta ou implicitamente, coberta por qualquer despacho judicial; se há um despacho que pressuponha o acto viciado, diz-se, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade cometida, não é a arguição ou reclamação por nulidade, mas a impugnação do respectivo despacho pela interposição do competente recurso (…)”.
«In casu», não há dúvida alguma que o acto afectado de nulidade se encontra coberto pela decisão que se lhe seguiu – a decisão recorrida -, daí resultando, em conformidade com os ensinamentos doutrinais que ficaram enunciados, que tal nulidade podia ser objecto do recurso em apreço, como foi, e que a mesma pode ser declarada por este Tribunal da Relação [neste sentido, veja-se o Ac. da Relação de Lisboa de 11/01/2011, proc. 286/09.5T2AMD-B.L1, disponível in www.dgsi.pt/jtrl e o Ac. desta Relação do Porto de 24/04/2012, proc. 10336/11.0TBVNG-B.P1, disponível in www.dgsi.pt/jtrp, relatado pelo aqui relator, embora relativo a processo de insolvência].
Deste modo, procedendo esta primeira questão do recurso e impondo-se a anulação da decisão, para que seja cumprido o contraditório omitido e, se for caso disso, para que se ordenem as diligências que ficaram referenciadas [e/ou outras que se mostrem necessárias], fica prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas pelo recorrente, atinentes à própria decisão ora anulada.  *
*Síntese conclusiva:
● A violação do princípio do contraditório é geradora da nulidade processual prevista no art. 195º nº 1 do Novo CPC se influir no exame ou na decisão proferida.
● Quando o acto afectado de nulidade se encontra coberto por decisão que se lhe seguiu, tal nulidade pode ser objecto de recurso e pode ser declarada pelo Tribunal da Relação.*         *         *IV. Decisão:

Nestes termos, os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação do Porto acordam em:
1º) Julgar procedente o recurso e anular a decisão recorrida, por verificação da indicada nulidade processual, determinando-se que o contraditório que foi omitido seja cumprido e que se sigam os demais termos legais, em conformidade com o que fixou exarado supra.
2º) Sem custas, por o recurso proceder e não ter sido o recorrente a dar-lhe causa.*         *         *Porto, 2015/01/27
M. Pinto dos Santos
Francisco Matos
Maria de Jesus Pereira

Proc. 1378/14.4TBMAI.P1 – 2ª Secção (Apelação) _________________________________ Relator: Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Francisco Matos Des. Maria de Jesus Pereira* * *Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: 1. O «iter» processual: A 13/03/2014, B… instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra C… e mulher, D…, referindo, na parte inicial da petição inicial, que havia requerido apoio judiciário em 04/09/2013 e que, por falta de decisão atempada dos serviços da segurança social, o mesmo deveria considerar-se tacitamente deferido. Porque a cópia do pedido de apoio judiciário que juntou não tinha nenhuma indicação de que tivesse sido enviado e/ou recebido nos serviços da segurança social, a Mma. Juiz «a quo» ordenou a notificação do autor para que, em 10 dias, suprisse essa falta, juntando nova cópia daquele pedido. Mais solicitou à segurança social informação acerca da decisão proferida quanto a tal pedido. O autor juntou, depois, cópia do referido pedido, informando que o mesmo foi enviado por fax aos serviços da segurança social, juntando a respectiva cópia a fls. 57 e segs. e constando de fls. 68 um registo de fax, datado das 15,05 horas do dia 31/10/2013, endereçado a uma tal “E…” [desconhece-se quem seja esta pessoa e se tem alguma ligação à Seg. Soc.]. A segurança social informou, por sua vez, que a pretensão do autor foi objecto, em 29/05/2013, de proposta de indeferimento, da qual aquele foi notificado e que depois, na ausência de resposta ao mesmo, tal proposta foi convertida em decisão definitiva de indeferimento, da qual também foi notificado e não recorreu. Veio depois o autor informar que a decisão acabada de referir diz respeito a um pedido de apoio judiciário anterior e acrescentou que, em 31/10/2013, apresentou, por fax, um novo pedido à segurança social e que o mesmo não foi objecto de qualquer decisão por parte dos serviços de tal organismo até à data da propositura desta acção. A solicitação do Tribunal, a segurança social informou, ainda, que, na segunda data indicada pelo autor [31/10/2013], não deu entrada nos respectivos serviços qualquer requerimento/pedido do autor. Sem que o autor fosse notificado desta informação, a Mma. Juiz proferiu, com data de 20/10/2014, o seguinte despacho: “De acordo ainda com o nº 4 do artº 552º do CPC, o autor deve juntar à petição inicial o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça (...). A falta de junção destes documentos tem a consequência prevista no artº 558º, al. f) do CPC, que dispõe que a secretaria recusa o recebimento da petição inicial indicando por escrito o fundamento da rejeição, quando (...) "Não tenha sido comprovado o prévio pagamento da taxa de justiça devida ou a concessão de apoio judiciário (...). No caso «sub judice« e uma vez que a Secretaria não recusou a mesma, não resta ao Tribunal senão ordenar agora o desentranhamento da petição inicial, pois para além de não ter sido demonstrado o prévio pagamento da Taxa de justiça, também ao autor não havia sido concedido o benefício de apoio judiciário. Nos termos e fundamentos supra expendidos decido ordenar o desentranhamento da petição inicial, deixando no lugar cópia da mesma, e em consequência determinar o arquivamento dos autos. Nos termos do disposto no nº1 do artº 315º do C.P.C, fixo o valor da causa em 30.000,01€. Registe e notifique.”* *2. O recurso: De tal despacho, interpôs o autor o recurso de apelação em apreço, cujas alegações culminou com as seguintes conclusões: “A - Andou mal a Meritíssima Juiz a quo na prolação da sua sentença, quanto à aplicação do normativo legal aplicado à sentença Segurança Social por entender que a Secretaria devia ter recusado o recebimento da petição inicial por não ter sido comprovado o prévio pagamento da taxa de justiça ou a concessão de apoio judiciário em conformidade com o disposto na alínea f) do Art. 558º do C.P.C.. B - Não tendo tal sucedido, foi ordenado pela Meritíssima Juiz o desentranhamento da petição inicial, determinando o arquivamento dos autos o que, salvo o devido respeito, demonstra não ter feito uma análise correta dos documentos juntos aos processo, quer pelo aqui Apelante quer pela Segurança Social. C - Verifica-se uma violação do princípio do contraditório, pois que a Segurança Social em Julho de 2014 juntou documentos aos autos que não foram dados a conhecer ao aqui Apelante, ficando este impossibilitado de exercer o contraditório como era de seu legitimo direito. D - O Apelante com a petição inicial juntou comprovativo do pedido de protecção jurídica enviado para a Segurança Social em 31 de Outubro de 2013, alegando desde logo na referida peça processual o deferimento tácito do mesmo, com base no disposto no Artº 25º da Lei 34/2004 de 29 de Julho, com a redação que lhe foi introduzida pela Lei 47/2007, de 28 de Agosto. E - Tendo sido apresentada a petição inicial em 13 de Março de 2014, ou seja, passados mais de 4 meses e meio do envio do pedido de protecção jurídica, dúvidas não teve o Apelante que o mesmo se encontrava dentro da previsão do nº 2 do já citado preceito, pelo que era de todo legítimo alegar o deferimento tácito. F - A Segurança Social erradamente forneceu resposta sobre um requerimento apresentado em 14 de Fevereiro de 2013, conforme fls 70 e segs., nada dizendo sobre o requerimento junto aos autos pelo Apelante datado de 31 de Outubro de 2013. G - Na verdade, é impossível a Segurança Social ter dado resposta em 24-05-2013 a um requerimento que só deu entrada em 31 de Outubro de 2013, havendo manifesto lapso por parte da Segurança Social. H - A Segurança Social, que seja do conhecimento do Apelante, nunca deu resposta ao Requerimento que foi enviado em 31 de Outubro de 2013, sendo esse o Requerimento que se encontra em causa e não outro. I - O Apelante notificado da informação prestada pela Segurança Social em 23-04-2014, pugnou em requerimento datado de 29-04-2014, no sentido que o tribunal obtivesse uma resposta quanto ao requerimento de protecção jurídica apresentado em 31-10-2013, uma vez que a informação prestada não era correcta, pois não dizia sequer respeito a este pedido de protecção jurídica. J - O Tribunal a quo consciente também da falta de resposta ao solicitado, notificou novamente a Segurança Social através dos ofícios datados de 05-05-2014, 03-06-2014, 12-06-2014, 01-07-2014 e 08-07-2014 para dar resposta quanto ao pedido de protecção jurídica apresentado pelo Apelante em 31-10-2013. K - A Segurança Social continuou a insistir no mesmo erro, informando o douto tribunal da decisão que recaiu sobre o requerimento de protecção jurídica apresentado em 14 de Fevereiro de 2013, nunca dando resposta ao pedido de protecção jurídica datado de 31-10-2014. L - Saliente-se que o Apelante não foi notificado de todas as respostas da Segurança Social juntas aos autos após 29-04-2014, ficando assim impedido de exercer o contraditório e, caso fosse notificado de decisão de indeferimento teria o Apelante apresentado impugnação judicial nos termos do nº 2 do Art. 26º da citada Lei, exercendo o seu direito de defesa. M - De igual modo, e se fosse o caso de se entender que teria havia decisão de indeferimento sobre o pedido apresentado, o que por mera hipótese de raciocínio se concede, o Apelante sempre teria de ser notificado dessa mesma decisão para proceder ao pagamento da taxa de justiça devida, como decorre do disposto no nº 3 do Art. 24º da Lei 34/2004, de 29/7. N - Pelo contrário, foi o Apelante surpreendido pela sentença proferida que decide pelo desentranhamento da petição e o arquivamento dos autos, sem nunca ter sido notificado da decisão de indeferimento do pedido de protecção jurídica apresentado em 31-10-2014. O - A Meritíssima Juiz tem o dever de apreciar e analisar a prova junta aos autos, pelo que se o tribunal tivesse conjugado o teor dos documentos juntos pela Segurança Social com o requerimento de protecção jurídica junta pelo Apelante teria decidido de forma diversa. P - A sentença proferida carece de absoluta falta de fundamentação, o que conduz à nulidade da mesma. Q - Estabelece a alínea b) do nº 1 do Art. 668º do C.P.C. que “É nula a sentença quando: não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;” nulidade essa que aqui expressamente se invoca, pois que a sentença objecto do presente recurso tem total falta de fundamentação de facto e de direito porquanto não discrimina os factos que considera provados nem indica as normas jurídicas aplicáveis aos factos em concreto, limitando-se a referir num único parágrafo factos que nem sequer correspondem à verdade. R - A Meritíssima Juiz fez tábua rasa de todo o processado, ou seja, dos documentos, requerimentos, ofícios e respostas da Segurança Social, limitando-se a dizer que não feito o pagamento da taxa de justiça nem comprovado o benefício de apoio judiciário, contrariamente ao que resulta dos autos. S - Para além da invocada nulidade por total falta de fundamentação da sentença, a Meritíssima Juiz ao proferir sentença sem ter dado oportunidade ao aqui Apelante de se pronunciar sobre as respostas da Segurança Social após 29 de Abril de 2014, violou o princípio do contraditório contemplado no nº 3 do Artº 3 º do C.P.C., o que consubstancia uma nulidade processual, que desde já também se invoca. T - Deveria o Apelante ter sido notificado para se pronunciar sobre as respostas da Segurança Social o que permitiria esclarecer o Tribunal sobre o persistente erro daquela instituição que parece que deliberadamente e em clara desobediência à Meritíssima Juiz persistiu em manter uma inverdade incompreensível e da qual apenas resultam prejuízos para o Apelante e, consequentemente resultaria decisão diversa da ora proferida pelo Tribunal a quo. U - “A violação do disposto no nº 3 do artigo 3º do Cód. De Proc. Civil, integrando a violação do princípio do contraditório, é susceptível de consubstanciar a prática de uma nulidade processual, quando a subjacente irregularidade cometida se mostre capaz de influir no exame ou decisão da causa.” - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11.01.2011. V - “Na estruturação de um processo justo o tribunal deve prevenir e, na medida do possível, obviar a que os pleiteantes sejam surpreendidos com decisões para as quais as suas exposições, factuais e jurídicas, não foram tomadas em consideração.” - Acórdão da Relação de Coimbra de 03.11.2012. W - Sendo o contraditório um princípio basilar que alicerça o processo civil a sua violação gera nulidade processual que se invoca, e que no caso em concreto, gerou ainda prejuízo irreparável para o Apelante que vê sucumbir a sua legítima pretensão. X - A Segurança Social dispunha de 2 dias úteis para confirmar ou não a formação do acto tácito de deferimento do pedido de protecção jurídica, conforme estipula o nº 4 do Art. 25º da Lei nº 34/2004 com as alterações produzidas pela Lei 47/2007 de 28 de Agosto, e não tendo cumprido tal prazo em qualquer das interpelações efectuadas pelo Tribunal, deveria a Meritíssima Juiz considerar o deferimento tácito do referido pedido e ordenado o prosseguimento dos autos. Y - Não o tendo feito, causou graves prejuízos ao aqui Apelante, que viu a sua acção parada durante cerca de sete meses, sendo certo que, no decurso deste período o ali Réu intentou acção contra o aqui Apelante que viu preteridas as suas legítimas pretensões. Z - De igual modo, deveria sempre o Tribunal através da Secretaria ter notificado o Apelante para proceder ao pagamento da taxa de justiça nos termos do disposto no artº 24 nº 3 da Lei 34/2004, com as alterações produzidas pela Lei 47/2007 de 28 de Agosto, dado que o Apelante em momento algum foi notificado da decisão de indeferimento do pedido de protecção jurídica apresentado em 31 de Outubro de 2013. AA - O Tribunal a quo violou o principio da igualdade e direito fundamental de acesso à justiça, consagrados respectivamente nos artºs 13º e 20º da Constituição. AB - Mesmo que se encontrasse ultrapassado o prazo de 10 dias para juntar o comprovativo do pagamento da taxa de justiça, deveria a secretaria ter notificado o Apelante para, em 10 dias efectuar o pagamento omitido, com acréscimo de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 10 UC. AC - O Apelante nunca foi notificado da decisão de indeferimento do pedido de apoio judiciário, conforme consta dos autos, pelo que não estando verificados todos os requisitos necessários para o desentranhamento da petição inicial, a Meritíssima Juiz não poderia ter ordenado o desentranhamento da mesma e procedido ao «arquivamento dos autos», sem antes ter dado a possibilidade ao aqui Apelante de vir suprir o montante da taxa de justiça inicial em falta. AD - Salvo melhor opinião, é o que resulta da conexão entre o artº 28º do CCJ e o disposto no Artº 145 nº 3 do CPC, não sendo de decidir pelo desentranhamento da peça, sem antes convidar o apelante a efectuar o pagamento da taxa de justiça inicial. AE - Deveria a Meritíssima Juiz antes de ter proferir sentença de «arquivamento» ter ordenado a notificação do Apelante das respostas da Segurança Social, de forma a que o mesmo se pronunciasse ou, se fosse caso para isso, pudesse em tempo útil proceder ao pagamento da taxa de justiça inicial. AF - Em suma, nunca poderia a Meritíssima Juiz a quo decidir como na sentença porquanto estava obrigada a dar cumprimento ao preceituado na Lei nº 34/2004 com as alterações introduzidas pela Lei nº 47/2007 de 28 de Agosto, devendo considerar o deferimento tácito do pedido de protecção jurídica decorridos os dois dias úteis após a notificação à Segurança Social. AG - Bem como deveria a Meritíssima Juiz a quo ter dado cumprimento ao princípio do contraditório, plasmado no nº 3 do Art. 3º do C.P.C., notificando o Apelante das respostas da Segurança Social. AH - Em última análise sempre deveria a Meritíssima Juiz ter dado cumprimento ao nº 3 do Art. 145º do C.P.C., notificando o Apelante para vir aos autos proceder ao pagamento da taxa de justiça em falta. Termos em que deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, substituindo-a por outra em que a Meritíssima Juiz a quo considere o deferimento tácito do pedido de protecção jurídica apresentado pelo Apelante ou, em no limite que ordene a notificação do Apelante para proceder à autoliquidação da taxa de justiça inicial, no prazo de 10 dias, seguindo-se os ulteriores termos legais, assim fazendo V. Exas. inteira e sã Justiça.” Não houve contra-alegações.* * *II. Circunstancialismo fáctico: O circunstancialismo fáctico a ter em conta é o que ficou descrito no item 1 do ponto anterior deste acórdão.* * *III. Apreciação jurídica: O recorrente suscita, nas conclusões das alegações, as seguintes questões: ● Foi violado o princípio do contraditório e cometida, assim, uma nulidade processual que deve ser declarada? ● A decisão recorrida padece de nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto e/ou de direito? ● A petição inicial podia ter sido mandada desentranhar, como foi, ou, antes disso, havia outras diligências que deviam ter sido feitas/ordenadas? Comecemos pela primeira questão enunciada. O recorrente sustenta que o Tribunal «a quo» inobservou o princípio do contraditório, por não o ter notificado da informação prestada, a fls. 92, pela segurança social, na qual esta deu notícia de que na data referida por aquele [31/10/2013] nenhum pedido de apoio judiciário, por ele formulado, deu entrada nos seus serviços, e acrescenta que, assim, incorreu em nulidade processual que esta Relação deve declarar. Não há dúvida que o art. 3º do Novo CPC [que é o aplicável ao caso, na medida em que a acção foi instaurada em 13/03/2014 – cfr. arts. 5º nº 1 e 8º da Lei nº 41/2013, de 26/06, que aprovou aquele diploma legal] consagra, como antes o art. 3º do CPC revogado, o princípio do contraditório nos seus nºs 2 a 4, impondo que, salvo nos casos excepcionais previstos na lei, nenhuma providência ou decisão deve ser proferida sem que as partes sejam previamente ouvidas sobre o assunto, evitando-se, assim, decisões surpresa [segundo o Prof. Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil Anotado, vol 1º, 1999, pg. 8, “o escopo principal do princípio do contraditório deixou de ser a defesa, no sentido negativo de oposição ou resistência à actuação alheia, para passar a ser a influência, no sentido positivo de direito de influir activamente no desenvolvimento e no êxito do processo”]. No caso, como exarado no item 1 do ponto I deste acórdão, o autor não foi notificado da referida informação da segurança social, tendo a Mma. Juiz «a quo» proferido a decisão recorrida sem que aquele tivesse tido oportunidade de se pronunciar sobre a mesma, a qual contraria o que ele havia referido em anterior requerimento. Parece, assim, inquestionável que, quanto a tal informação, não foi, efectivamente, cumprido o aludido princípio do contraditório. A violação deste princípio só é geradora da nulidade processual prevista no art. 195º nº 1 do Novo CPC se influir no exame ou na decisão proferida. E, no caso, influiu. Com efeito, perante a divergência entre o que o autor havia referido em anterior requerimento e a informação que a segurança social prestou, o que se impunha, em primeiro lugar, era ouvir o demandante sobre essa divergência. E depois, em função da resposta daquele, caso a divergência persistisse, outras diligências se impunham, ao abrigo, então, do princípio do inquisitório consagrado no art. 411º do Novo CPC, designadamente, a remessa àquela entidade de cópia do requerimento de fls. 57 e segs. e do registo de fax junto a fls. 68 [indagando, igualmente, se a pessoa aí referida era, à data, funcionária dos respectivos serviços e se o pedido do autor lhe foi dirigido a ela e ali recebido], a fim de se esclarecer, de uma vez por todas [ultrapassando a impertinência das respostas da segurança social constantes de fls. 79, 86 e 89, em que, sistematicamente, omitiu informação sobre a eventual entrada de um novo pedido de apoio judiciário no dia 31/10/2013, não respondendo à solicitação do Tribunal, o que só acabou por fazer na informação de fls. 92], se houve ou não o segundo pedido alegado pelo autor e, na afirmativa, se o mesmo deu entrada nos ditos serviços na data anunciada por este e se foi ou não objecto de decisão até à data da propositura desta acção. Só depois estaria o Tribunal em condições de aferir se houve ou não, como o autor alegou na parte inicial da p. i. [a data que aí referiu como de dedução do segundo pedido de apoio judiciário, foi depois, a fls. 76, corrigida], deferimento tácito desse pedido, nos termos previstos no nº 2 do art. 25º da Lei nº 34/2004, de 29/07, com as alterações introduzidas pela Lei nº 47/2007, de 28/08, o que implicaria, na afirmativa, a dispensa do pagamento da taxa de justiça devida pela interposição da acção, estabelecida nos arts. 530º nº 1 e 552º nº 3 do Novo CPC e que, assim, não houvesse lugar ao desentranhamento do articulado que foi ordenado no despacho recorrido. Daqui se constata, portanto, que a omissão do contraditório, por si e porque levou à omissão de outras diligências que a ele poderiam/deveriam seguir-se, influiu, directa e necessariamente, na decisão que foi proferida e que é objecto deste recurso, constituindo nulidade processual enquadrável no nº 1 do citado art. 195º. Aqui chegados há, no entanto, que questionar se esta nulidade podia ser suscitada por via recursória e colocada directamente a este Tribunal da Relação, ou se, em vez disso, devia ter sido primeiramente invocada perante o Tribunal onde foi cometida [1ª instância] e só da respectiva decisão poderia, depois, ser interposto recurso para esta 2ª instância. Isto porque, como é sabido, em princípio, das nulidades cabe reclamação e não recurso [daí o postulado tradicional: dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se”] e a reclamação é, também em princípio, dirigida ao Juiz do tribunal que cometeu ou onde foi cometida a nulidade. Apesar destas duas regras básicas, o Prof. Alberto dos Reis [in Código de Processo Civil Anotado, vol. V, 1984, reimpr., pg. 424] ensinava que “A reclamação por nulidade tem cabimento quando as partes ou os funcionários judiciais praticam ou omitem actos que a lei não admite ou prescreve; mas se a nulidade é consequência de decisão do tribunal, se é o tribunal que profere despacho ou acórdão com infracção de disposição de lei, a parte prejudicada não deve reagir mediante reclamação por nulidade, mas mediante interposição de recurso. É que, na hipótese, a nulidade está coberta por uma decisão judicial e o que importa é impugnar a decisão contrária à lei; ora as decisões impugnam-se por meio de recursos (…) e não por meio de arguição de nulidade de processo”. Também o Prof. Manuel de Andrade [in Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pg. 183] entendia que “se a nulidade está coberta por uma decisão judicial que ordenou, autorizou ou sancionou, expressa ou implicitamente, a prática de qualquer acto que a lei impõe, o meio próprio para a arguir não é a simples reclamação, mas o recurso competente a interpor e a tramitar como qualquer outro do mesmo tipo. Trata-se em suma da consagração do brocardo: «dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se». Igual entendimento perfilham os Profs. Antunes Varela [in Manual de Processo Civil, 1985, pg. 393] e Anselmo de Castro [in Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, 1982, pg. 134]. O primeiro, refere que “se entretanto, o acto afectado de nulidade for coberto por qualquer decisão judicial, o meio próprio de o impugnar deixará de ser a reclamação (para o próprio juiz) e passará a ser o recurso da decisão”. O segundo, diz que “tradicionalmente entende-se que a arguição da nulidade só é admissível quando a infracção processual não está, ainda que indirecta ou implicitamente, coberta por qualquer despacho judicial; se há um despacho que pressuponha o acto viciado, diz-se, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade cometida, não é a arguição ou reclamação por nulidade, mas a impugnação do respectivo despacho pela interposição do competente recurso (…)”. «In casu», não há dúvida alguma que o acto afectado de nulidade se encontra coberto pela decisão que se lhe seguiu – a decisão recorrida -, daí resultando, em conformidade com os ensinamentos doutrinais que ficaram enunciados, que tal nulidade podia ser objecto do recurso em apreço, como foi, e que a mesma pode ser declarada por este Tribunal da Relação [neste sentido, veja-se o Ac. da Relação de Lisboa de 11/01/2011, proc. 286/09.5T2AMD-B.L1, disponível in www.dgsi.pt/jtrl e o Ac. desta Relação do Porto de 24/04/2012, proc. 10336/11.0TBVNG-B.P1, disponível in www.dgsi.pt/jtrp, relatado pelo aqui relator, embora relativo a processo de insolvência]. Deste modo, procedendo esta primeira questão do recurso e impondo-se a anulação da decisão, para que seja cumprido o contraditório omitido e, se for caso disso, para que se ordenem as diligências que ficaram referenciadas [e/ou outras que se mostrem necessárias], fica prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas pelo recorrente, atinentes à própria decisão ora anulada. * *Síntese conclusiva: ● A violação do princípio do contraditório é geradora da nulidade processual prevista no art. 195º nº 1 do Novo CPC se influir no exame ou na decisão proferida. ● Quando o acto afectado de nulidade se encontra coberto por decisão que se lhe seguiu, tal nulidade pode ser objecto de recurso e pode ser declarada pelo Tribunal da Relação.* * *IV. Decisão: Nestes termos, os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação do Porto acordam em: 1º) Julgar procedente o recurso e anular a decisão recorrida, por verificação da indicada nulidade processual, determinando-se que o contraditório que foi omitido seja cumprido e que se sigam os demais termos legais, em conformidade com o que fixou exarado supra. 2º) Sem custas, por o recurso proceder e não ter sido o recorrente a dar-lhe causa.* * *Porto, 2015/01/27 M. Pinto dos Santos Francisco Matos Maria de Jesus Pereira