Processo:560/14.9T8AMT.P1
Data do Acordão: 09/03/2015Relator: M. PINTO DOS SANTOSTribunal:trp
Decisão: Meio processual:

I - A inversão do contencioso, nos procedimentos cautelares [nos que a admitem], depende da verificação de dois pressupostos: que a matéria adquirida no procedimento permita que o juiz forme a convicção segura acerca da existência do direito acautelado e que a natureza da providência decretada seja adequada a realizar a composição definitiva do litígio. II - O primeiro destes pressupostos não se basta com a prova meramente perfunctória do «fumus boni juris», exigindo sim que a mesma se situe num patamar de exigência idêntico ao que é necessário para as decisões da matéria de facto nas acções de processo comum, pois só assim é admissível que o Julgador fique com a convicção segura da existência do direito acautelado e, por via disso, dispense o requerente da propositura da acção declarativa de que o procedimento cautelar seria dependente. III - Os direitos inerentes à quota indivisa não podem ser exercidos, junto da sociedade respectiva, por todos os contitulares da mesma, só podendo ser exercidos pelo representante comum destes. IV - A nomeação do representante comum da quota indivisa não pode ter lugar em assembleia geral extraordinária da sociedade, por se tratar de acto extra-societário; não se formando a maioria necessária para o efeito [entre os contitulares da quota], essa nomeação não passa pela convocação de qualquer assembleia geral da sociedade, mas sim pelo recurso à via judicial. V - O óbito do único gerente da sociedade por quotas não provoca o vazio no exercício dos poderes de gerência; estes poderes passam integralmente, a título provisório, para os sócios da mesma, até que novo(s) gerente(s) venha(m) a ser designado(s). VI - A requerente só poderia convocar assembleia geral extraordinária da sociedade, com vista à sua nomeação como gerente, se já estivesse nomeada como representante comum dos herdeiros, contitulares da quota indivisa.

Profissão: Data de nascimento: 1/1/1970
Tipo de evento:
Descricao acidente:

Importancias a pagar seguradora:

Relator
M. PINTO DOS SANTOS
Descritores
PROCEDIMENTO CAUTELAR COMUM INVERSÃO DO CONTENCIOSO QUOTA INDIVISA EXERCÍCIO DOS DIREITOS INERENTES À QUOTA ÓBITO DO ÚNICO GERENTE DA SOCIEDADE POR QUOTAS ASSUNÇÃO DOS PODERES DE GERÊNCIA
No do documento
Data do Acordão
03/10/2015
Votação
UNANIMIDADE
Texto integral
S
Meio processual
APELAÇÃO
Decisão
REVOGADA EM PARTE
Sumário
I - A inversão do contencioso, nos procedimentos cautelares [nos que a admitem], depende da verificação de dois pressupostos: que a matéria adquirida no procedimento permita que o juiz forme a convicção segura acerca da existência do direito acautelado e que a natureza da providência decretada seja adequada a realizar a composição definitiva do litígio. II - O primeiro destes pressupostos não se basta com a prova meramente perfunctória do «fumus boni juris», exigindo sim que a mesma se situe num patamar de exigência idêntico ao que é necessário para as decisões da matéria de facto nas acções de processo comum, pois só assim é admissível que o Julgador fique com a convicção segura da existência do direito acautelado e, por via disso, dispense o requerente da propositura da acção declarativa de que o procedimento cautelar seria dependente. III - Os direitos inerentes à quota indivisa não podem ser exercidos, junto da sociedade respectiva, por todos os contitulares da mesma, só podendo ser exercidos pelo representante comum destes. IV - A nomeação do representante comum da quota indivisa não pode ter lugar em assembleia geral extraordinária da sociedade, por se tratar de acto extra-societário; não se formando a maioria necessária para o efeito [entre os contitulares da quota], essa nomeação não passa pela convocação de qualquer assembleia geral da sociedade, mas sim pelo recurso à via judicial. V - O óbito do único gerente da sociedade por quotas não provoca o vazio no exercício dos poderes de gerência; estes poderes passam integralmente, a título provisório, para os sócios da mesma, até que novo(s) gerente(s) venha(m) a ser designado(s). VI - A requerente só poderia convocar assembleia geral extraordinária da sociedade, com vista à sua nomeação como gerente, se já estivesse nomeada como representante comum dos herdeiros, contitulares da quota indivisa.
Decisão integral
Proc. 560/14.9T8AMT.P1 – 2ª Secção
(apelação)
_________________________________
Relator: Pinto dos Santos
Adjuntos: Des. Francisco Matos
                Des. Maria de Jesus Pereira*         *         *Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório:

B…, por si e na qualidade de legal representante das suas filhas menores, C… e D…, intentou o presente procedimento cautelar comum contra E…, pedindo que, sem observância do contraditório inicial, atenta a urgência do procedimento e o perigo de lesão grave e irreparável: 
a) Seja nomeada representante comum dos herdeiros, como cabeça-de-casal, nos termos do art. 223º do CSC; 
b) Seja nomeada gerente da sociedade “F..., Lda.”;
Alegou, para tal, que:
● ela, as suas representadas e a requerida são as únicas e universais herdeiras de G… [a requerente estava casada com este segundo o regime da comunhão de adquiridos e ele é pai das restantes], que faleceu, com testamento, em 19/11/2014:
● o G… e a requerida eram os únicos sócios da sociedade comercial “F…, Lda.”, e ele era o único gerente desta, tendo tal cargo ficado vago com o seu decesso;
● no sentido de nomear um representante comum dos herdeiros e um gerente, a requerente convocou uma assembleia geral extraordinária da sociedade, que teve lugar a 12/12/2014;
● a requerida foi devidamente convocada e, na assembleia, a mesma recusou-se a assinar a acta;
● perante tal atitude, a assembleia foi encerrada, por não ser possível deliberar de acordo com a ordem do dia;
● a referida sociedade está paralisada, por falta de um gerente que possa apor a sua assinatura nos documentos de relevo;
● por via disso, não é possível pagar salários aos 43 empregados da F…, pagar aos fornecedores de areia, cimento ou combustível, pagar a electricidade, pagar os compromissos bancários assumidos, nem pagar os impostos, nomeadamente, o IVA mensal;
● há o perigo real e efectivo desta situação de “vazio de poder” se manter por muito tempo, se for convocada uma nova assembleia geral, ou se for necessário recorrer à acção judicial comum, o que pode inviabilizar o futuro da sociedade e conduzi-la a uma situação de insolvência;
● embora a requerente, de acordo com o art. 1053º e segs. do Novo CPC, possa requerer, em tribunal, a sua nomeação como representante comum dos herdeiros, enquanto a quota se mantiver indivisa e como gerente da sociedade, a eventual demora da decisão judicial poderá inviabilizar o efeito prático da mesma.

Sem audição da requerida, realizou-se a audiência de produção da prova arrolada pela requerente, tendo esta, no seu decurso, requerido a inversão do contencioso.

Foi depois proferida decisão que deferiu a providência cautelar nos seguintes termos:
“Julgo procedente, por provada, a presente providência cautelar e, em consequência: 
a) Nomeio a requerente B… como representante comum dos herdeiros, como cabeça-de-casal, nos termos do art. 223 n.º 3 do CSC; 
b) Nomeio a requerente B…, gerente da sociedade “F…, Lda.”;
c) Decreto a inversão do contencioso, antecipando o juízo da causa principal. Custas pela requerente. 
Comunique à sociedade e à Conservatória do Registo Comercial de Felgueiras.
Registe e notifique.”

Notificada e inconformada com tal decisão, interpôs a requerida o recurso de apelação em apreço, cujas alegações culminou com as seguintes conclusões:  
“I. De acordo com o alegado supra em I), vista a inexistência de fundamentação na sentença recorrida sobre a convicção segura acerca do direito acautelado – nos termos do art. 369º do C.P.C. -, a sentença padece de nulidade quanto à decretada inversão do contencioso, plasmada esta na al. b) do nº 1 e no nº 4 do art. 615º do C.P.C., que deve ser declarada; 
II. No que respeita à nomeação da recorrida como representante da quota comum, esse é acto extra-sociedade, que podia ter sido tomado por maioria à qual não era necessária a anuência da recorrente, pelo que, não corresponde ao decidido que nesta parte tenha sido a actuação da recorrente a paralisar a sociedade. 
III. Assim, e nesta parte, conforme resulta de II) supra, o decidido viola o vertido nos arts. 22º, 223º e 224º do C.S.C. e art. 1407º do C.C., impondo-se a sua revogação. 
IV. Por outro lado, é manifesto que ainda nesta parte, e de acordo o invocado em II supra, os fundamentos estão em contradição com o decidido, ocorrendo nulidade da sentença, nos termos do art. 615º, nº 1, al. c) do C.P.C., que se pretende seja declarada. 
V. Por fim e no que ao ponto III) da motivação supra se refere, é manifesto também que a recorrente não tinha competência para convocar a reunião da sociedade, a decisão não levou em conta que, na falta do gerente assumem tal qualidade todos os sócios, que é imputável à recorrida a inexistência de representante comum da quota, como supra se defendeu, além de que não está facticamente demonstrado um único evento que revele a paralisação da empresa, sendo certo que a recorrente, sócia originária, qualidade que a recorrida nunca teve, nunca se furtou a conduzi-la.
VI. A recorrente simplesmente não tem que se subjugar aos instintos desenfreados da recorrida na sua pretensão de afastamento daquela do giro societário, não tem que a admitir como sócia que não é, não tem que aceitar que esta convoque, ilegalmente, assembleias gerais ou se assuma como presidente de tal assembleia, ignorando e passando por cima da qualidade de sócia que esta tem desde o início da sociedade e aquela, sua madrasta, nunca teve. 
VII. A douta sentença violou, assim, pois e nesta parte, o vertido nos arts. 21º, nº 1, al. b), 248º, nº 1, 252º, nº 2, 253º do C.S.C. e 1407º do C.C., pelo que, nesta parte, se impõe e requer a sua revogação. 
VIII. Deve ser levado em conta o vertido supra em IV) da motivação, e a recorrida sancionada condignamente, nos termos do art. 542º, nº 2 do C.P.C. 
E assim, V. Exas., Venerandos Desembargadores, dando provimento ao presente recurso, com o mui douto suprimento dos altos conhecimentos que se reconhecem, farão a costumada, Justiça!”

A requerente/recorrida contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e pela confirmação do decidido.*         *         *II. Questões a apreciar e decidir:

Face às conclusões das alegações da recorrente [que delimitam o «thema decidendum» a cargo desta 2ª instância, conforme dispõem os arts. 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2 do Novo CPC, aqui aplicável, por já se encontrar em vigor à data da instauração do procedimento], as questões a apreciar e decidir são as seguintes:
● Se é de manter a decretada inversão do contencioso;
● Se o Tribunal podia ter nomeado a requerente como representante comum dos herdeiros do falecido gerente da sociedade;
● Se ocorrem os pressupostos para o decretamento da nomeação da requerente como gerente da sociedade;
● Se há que condenar a requerente/recorrida como litigante de má fé.*         *         *III. Circunstancialismo fáctico:

A decisão recorrida considerou “indiciariamente demonstrados” os seguintes factos:
1º- A requerente, as suas representadas e a requerida são as únicas herdeiras de G…, ex-cônjuge da requerente, com quem casou no regime da comunhão de adquiridos e pai das restantes, e que faleceu, com testamento, no passado dia 19 de Novembro de 2014, como consta da escritura de habilitação de herdeiros de fls. 11. 
2º- O G… e a requerida E… eram os únicos sócios da sociedade comercial que gira sob a firma “F…, Lda.”, NIPC n.º ………, com sede no …, freguesia …, concelho de Felgueiras.
3º- O falecido G… era o único gerente daquela sociedade, que se obrigava com a sua assinatura e, após o seu óbito, o cargo de gerente ficou vago. 
4º- No sentido de nomear um representante comum e um gerente, foi convocada a Assembleia Geral Extraordinária, que teve lugar no passado dia 12 do corrente, pelas 17 horas [esclarece-se que esta convocatória foi feita pela requerente, como decorre de fls. 17].
5º- A requerida foi devidamente convocada por carta registada datada de 24/11/2014, junta a fls. 17. 
6º- Estando presentes a requerente, a requerida e o secretário da assembleia, a requerida afirmou que não assinava a acta, como consta do teor da Acta n.º 49 junta a fls. 19. 
7º- Perante tal atitude foi encerrada a assembleia, por não ser possível deliberar de acordo com a ordem do dia. 
8º- O giro da sociedade está paralisado, por falta de um gerente que possa apor a sua assinatura nos documentos necessários para a actividade da sociedade. 
9º- Devido à falta de um gerente não é possível pagar salários aos 43 empregados da F…. 
10º- Não é possível pagar aos fornecedores de areia, cimento ou combustível. 
11º- Não é possível pagar a electricidade. 
12º- Não é possível pagar os compromissos bancários assumidos enquanto o Sr. G… geriu a F…. 
13º- Não é possível pagar os impostos, nomeadamente, o IVA mensal.*         *         *IV. Apreciação jurídica: 

1. Se é de manter a decretada inversão do contencioso.
Na 1ª conclusão das doutas alegações, a recorrente sustenta que a douta decisão recorrida é nula, nos termos da al. b) do nº 1 do art. 615º do Novo CPC, por não ter fundamentado o decretamento da inversão do contencioso, previsto no art. 369º do mesmo corpo de normas.
A recorrida contrapõe, nas doutas contra-alegações, que tal segmento decisório [al. c) da parte decisória da decisão recorrida] “encontra-se perfeitamente plasmado na motivação constante da douta sentença em crise, não sendo necessário motivar autonomamente a inversão do contencioso, para além do que a lei pretende com a instituição dessa figura, qual seja, que a providência a decretar será adequada a realizar a composição definitiva do litígio e isso terá de resultar do grau de convicção expresso na decisão de decretar a providência”.

Apreciando esta questão, adiantamos desde já que o que está em causa não é propriamente a nulidade da decisão recorrida no segmento ora em análise, mas sim a sua correcção ou incorrecção perante as exigências da lei.
Na verdade, a nulidade prevista na al. b) do nº 1 do art. 615º do Novo CPC – não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão – só se verifica quando a fundamentação seja totalmente omitida [há unanimidade na jurisprudência e na doutrina quanto a isto], não abarcando os casos de fundamentação incompleta nem a fundamentação imperfeita; estas relevam já noutra sede - erro de julgamento.
No caso, o Tribunal fundamentou o decretamento da inversão do contencioso, afirmando que esta se impunha pelo facto de “ainda em vida do anterior gerente era a requerente que seguia a actividade societária” [cfr. 1º parágrafo da última página da decisão recorrida].
Daqui resulta que o Tribunal abordou a questão, ainda que muito superficialmente, na fundamentação da decisão, inexistindo, assim, omissão total de fundamentação daquele decretamento.
O que se verifica, como veremos de seguida, é que o fundamento invocado nada tem que ver com os pressupostos de que a lei processual faz depender aquela inversão. Essa errónea fundamentação não releva para os efeitos da al. b) do nº 1 do citado art. 615º, mas sim em sede de erro de julgamento que fundamentará, não a nulidade do segmento decisório em referência, mas sim a revogação da decisão nessa parte.
Como o Tribunal não está vinculado às qualificações jurídicas das partes – nº 3 do art. 5º do Novo CPC – e os articulados estão sujeitos às regras interpretativas enunciadas nos arts. 236º a 239º do CCiv., nada impede que este Tribunal da Relação conclua no sentido da revogação da decisão na parte em apreço, em vez de declarar a nulidade parcial invocada pela recorrente.
Vejamos então porque é que a referida fundamentação não obedece às exigências legais.
O art. 369º do Novo CPC prevê, pela primeira vez, no nosso ordenamento processual civil e, mais concretamente, no âmbito dos procedimentos cautelares [embora não seja extensível a todos, conforme se afere do nº 4 do art. 376º], a figura da inversão do contencioso, admitindo que, “mediante requerimento, o juiz, na decisão que decrete a providência”, possa “dispensar o requerente do ónus de propositura da acção principal se a matéria adquirida no procedimento lhe permitir formar convicção segura acerca da existência do direito acautelado e se a natureza da providência decretada for adequada a realizar a composição definitiva do litígio”.
Com esta figura quebrou-se o princípio que vigorou nos Códigos de Processo anteriores “segundo o qual estes [os procedimentos cautelares] são – sempre e necessariamente – dependência de uma causa principal, obrigatoriamente proposta pelo requerente com vista a evitar a caducidade da providência cautelar decretada em seu benefício”, sendo certo que “esta tradicional configuração normativa conduz(ia) frequentemente a situações em que, na prática, se tenha de repetir inteiramente, no âmbito da acção principal, a mesma controvérsia que tinha acabado de ser apreciada e decidida no âmbito do procedimento cautelar – sendo duvidoso que o mero argumento, extraído do facto de, na causa principal, o requerido gozar de garantias processuais formais superiores às que caracterizam o procedimento cautelar, possa justificar cabalmente os custos e demoras decorrentes desta duplicação de procedimentos, ao menos nos casos em que, apesar das menores garantias formais, a decisão cautelar possa ter, na prática, solucionado efectivamente o litígio que opunha as partes” [Cons. Lopes do Rego, in Revista Julgar, nº 16, Jan.-Abr. 2012, “Os princípios orientadores da reforma do processo civil em curso”, pg. 109].
No caso, não vem colocada qualquer questão quanto à tempestividade do requerimento da requerente com vista ao decretamento da inversão do contencioso. O nº 2 do art. 369º permite que tal requerimento seja feito até ao encerramento da audiência final e tal requisito foi observado, pois a requerente apresentou-o no decurso da audiência de produção da prova, como consta da acta respectiva [cfr. fls. 26].
Do nº 1 do mesmo preceito decorre que aquela inversão depende da verificação de dois pressupostos:
- que a matéria adquirida no procedimento permita que o juiz forme a convicção segura acerca da existência do direito acautelado;
- e que a natureza da providência decretada seja adequada a realizar a composição definitiva do litígio.
Relativamente a este último pressuposto, é evidente a sua verificação «in casu», pois o objectivo principal da requerente era a sua nomeação como gerente da sociedade atrás identificada e essa pretensão foi deferida e decretada.
Quanto ao primeiro, temos como certo que a sua verificação exige que a convicção do Julgador seja mais forte, mais consistente, que a que normalmente é necessária para o decretamento das providências cautelares; e para que tal aconteça, a prova não pode ser meramente perfunctória, baseada no «fumus boni juris», que basta para o deferimento das providências cautelares em geral, sem a inversão do contencioso. Tal prova tem de situar-se num patamar de exigência idêntico ao que é necessário para as decisões da matéria de facto nas acções de processo comum, pois só assim é admissível que o Julgador fique com a convicção segura da existência do direito acautelado e, por via disso, dispense o requerente da propositura da acção declarativa de que o procedimento cautelar seria dependente. 
Ora, no caso «sub judice» claramente não existiu essa prova reforçada, pois foi ouvida apenas uma única testemunha [técnico oficial de contas da sociedade supra identificada] e, quanto a prova documental, apenas foi tida em conta a que consta dos autos, ou seja, a escritura de habilitação de herdeiros do falecido marido da requerente e pai das requerentes menores e da requerida, junta a fls. 10 a 13, o testamento outorgado por aquele, junto a fls. 14 a 16, a convocatória da assembleia geral extraordinária referida nos factos provados, junta a fls. 17, a cópia do registo do envio pelo correio dessa convocatória, junta a fls. 18 e a acta daquela assembleia geral, junta a fls. 19-20. 
Nenhuma prova documental relativa à concreta actividade da sociedade foi junta aos autos ou sequer exibida na audiência de produção da prova, comprovativa, designadamente, de fornecimentos, de despesas e de compromissos, incluindo fiscais, que se encontrem por pagar desde o decesso do gerente da sociedade. E só uma prova assente nessa documentação permitiria ao Julgador formar uma convicção segura acerca da factualidade que consta dos nºs 8º a 13º dos factos provados. Assim, estribada unicamente no testemunho prestado pelo referido TOC [os documentos juntos aos autos não relevaram no apuramento daqueles factos], tal prova não passou o patamar meramente indiciário ou perfunctório.
Isso mesmo é o que, aliás, resulta da fundamentação da factologia dada como provada na decisão recorrida, onde, depois de se afirmar, no respectivo intróito, que “Considero indiciariamente demonstrados os seguintes factos” [itálico nosso], se alude, várias vezes, à circunstância de o decretamento da providência cautelar se bastar com uma prova meramente indiciária – cfr. pgs. 3 e 4 da decisão; fls. 30 e 31 dos autos -, nenhuma referência existindo de que a Mma. Juiz «a quo» tenha considerado que a prova produzida haja ultrapassado esse nível básico indiciário.
Surge, pois, inequívoco que a materialidade fáctica dada como provada radicou tão-só em prova indiciária e não em prova segura/consistente; e só esta permitiria que a requerida inversão do contencioso fosse decretada.
Não se verifica, por conseguinte, o primeiro pressuposto exigido pelo nº 1 do art. 369º do Novo CPC, pelo que aquela inversão não podia ter sido decretada.
Consequentemente, a decisão recorrida tem de ser revogada neste segmento.*
*2. Se a decisão recorrida podia nomear a requerente como representante comum dos herdeiros do falecido gerente da sociedade.
A decisão recorrida deferiu também o pedido da requerente no sentido de ser nomeada como representante comum dos herdeiros do seu falecido marido e gerente da indicada sociedade, para que, em nome dos contitulares da quota que ele detinha na sociedade, possa exercer os direitos a ela [quota] inerentes.
Na base de tal pretensão da requerente está a recusa da requerida em ter assinado a acta da assembleia geral extraordinária convocada por aquela, que tinha por objectivos a nomeação da mesma como “representante comum da quota do falecido” e a “eleição de gerente” da sociedade [cfr. doc. junto a fls. 17].
A recorrente entende, no ponto II [nºs 12 a 27] do corpo das alegações e nas conclusões II a IV destas, que aquela nomeação não era um acto societário que pudesse ser apreciado/decidido na dita assembleia geral e que a recusa em ter assinado a respectiva acta não fundamenta o recurso à via judicial, e a este procedimento cautelar, para a obtenção dessa nomeação. 

Da conjugação dos factos provados com o teor da acta junta a fls. 19-20, resulta que o falecido marido da requerente e pai das requerentes menores e da requerida, além de gerente da referida sociedade por quotas, era sócio desta, detendo nela uma quota de 740.000,00€ [a quota da requerida – a outra sócia da sociedade – é de 10.000,00€].
Dessa quota são contitulares, face ao decesso daquele, a requerente, as suas representadas menores e a requerida [ensina Raul Ventura, in Sociedades por Quotas, vol. I, 2ª ed., pg. 496, que a contitularidade da quota pode ser originária ou derivada e que esta “pode resultar de qualquer facto lícito”, designadamente de herança ou legado].
De acordo com o nº 1 do art. 222º do Código das Sociedades Comerciais [CSC], os contitulares de quota devem exercer os direitos a ela inerentes através de representante comum.
Deste preceito resulta, por um lado, que os direitos inerentes à quota não podem ser exercidos, junto da sociedade respectiva, por todos os contitulares da mesma e, por outro, que tais direitos só podem ser exercidos pelo representante comum destes.
E o art. 223º do CSC contém os modos de nomeação desse representante comum, prevendo quatro, a saber: por lei, por disposição testamentária, por nomeação dos contitulares, por nomeação do tribunal – nºs 1 e 3.
No caso, o testamento do sócio falecido não contém qualquer referência a tal nomeação, pelo que esta teria de ser feita nos termos previstos na parte final do nº 1 e no nº 2 daquele preceito legal, com referência ao art. 1407º do CCiv.. Ou seja, o representante comum teria de ser eleito por maioria, em deliberação tomada entre todos os contitulares da quota.
Esta deliberação, como é bom de ver-se, é extra-societária, na medida em que nada tem a ver com a sociedade; só depois de designado o representante comum e de comunicada a sua nomeação à sociedade – nº 4 do art. 223º -, é que ele poderá exercer perante esta “todos os poderes inerentes à quota indivisa”, à excepção dos que se encontram indicados na 2ª parte do nº 5 e no nº 6 do mesmo normativo.
O recurso à nomeação do representante comum por via judicial só é admitido quando não seja possível por deliberação entre os contitulares – nº 3 [sobre o que fica dito quanto aos modos e forma de nomeação do representante comum, veja-se Raul Ventura, obr. e vol. cit., pgs. 516-521].  
Daqui resulta que a nomeação da requerente como representante comum da quota do falecido G… não poderia ter lugar na assembleia geral extraordinária da sociedade que ela própria requereu; tal nomeação, sendo acto extra-societário, teria de ter lugar fora da sociedade, em deliberação tomada entre todos os contitulares da quota. Não podendo formar-se essa maioria, a requerente só tinha um caminho a seguir, que não passava pela convocação da dita assembleia: teria de requerer a sua nomeação como representante comum ao tribunal.
Neste procedimento, a requerente não radica o pedido da sua nomeação como tal na impossibilidade de, em deliberação entre os contitulares da quota, se formar maioria. Funda-a sim no facto de tal desiderato não ter sido alcançado na assembleia geral que convocou, em virtude da recusa da requerida.
Como aquela nomeação não poderia ter lugar nessa assembleia geral, logo se vê que não foi por causa da atitude [recusa] da requerida que a requerente não era, à data da instauração do procedimento cautelar, a representante comum dos contitulares da quota indivisa. E não se fundando o pedido da requerente na impossibilidade de ser nomeada como tal em deliberação [extra-societária, repete-se] para a qual estivessem convocados os contitulares da quota [a sua pretensão estriba-se apenas no facto dessa nomeação ter sido recusada pela requerida na mencionada assembleia], facilmente se conclui que não podia recorrer, para tal efeito, à via judicial, nem a este procedimento cautelar, já que a dependência deste relativamente a uma outra acção [a acção principal], nos termos do nº 1 do art. 364º do Novo CPC, faz com que ele só seja possível quando o direito a acautelar possa fundamentar também a instauração dessa acção. 
Deste modo, assiste, igualmente, razão à recorrente neste ponto.
O que fica exposto não leva, no entanto, à nulidade da decisão nesta parte, como aquela defende no nº 27 do corpo das alegações e na conclusão IV, mas sim à revogação da decretada nomeação da requerente como representante comum dos herdeiros contitulares da quota indivisa.
Com este esclarecimento, o recurso procede, igualmente, nesta parte.*
*3. Se ocorrem os pressupostos para o decretamento da nomeação da requerente como gerente da sociedade.
Na decisão recorrida foi a requerente, ainda, nomeada gerente da indicada sociedade, por se ter considerado que a recusa da requerida, na aludida assembleia geral, foi causa da não nomeação da primeira nessas funções e da manutenção da impossibilidade de, assim, sem gerente, a sociedade manter o seu giro comercial, por não poder cumprir as obrigações assumidas nem sequer pagar aos seus trabalhadores.
A recorrente, no ponto III [nºs 28 a 57] das alegações e nas conclusões V a VII, contrapõe que o decesso do identificado gerente não gerou o vazio directivo [de gerência] na sociedade, pois passou a caber-lhe a ela, única sócia, o exercício das funções de gerência e que a não nomeação de um novo gerente não lhe é imputável, mas sim à requerente, por esta não ser ainda a representante comum dos herdeiros contitulares da quota indivisa e, por via isso, não poder convocar nem participar, como sócia [e representante dos demais sócios], nas assembleias gerais da sociedade.

Comecemos este ponto pela indicação dos pressupostos de procedência dos procedimentos cautelares comuns e, por conseguinte, da que aqui está em causa.
Segundo o art. 362º do Novo CPC, “sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efectividade do direito ameaçado” [nº 1], podendo o direito que o requerente pretende acautelar ser um “direito já existente” ou vir a emergir “de decisão a proferir em acção constitutiva, já proposta ou a propor” [nº 2].
São, assim, pressupostos do seu decretamento/procedência:
● a probabilidade séria da existência do direito invocado pelo requerente;
● o fundado receio de que a conduta do requerido causa grave lesão nesse seu direito (ou no respectivo exercício);
● e que tal lesão seja dificilmente reparável.
Se quanto ao primeiro pressuposto a doutrina e a jurisprudência se bastam, por causa da provisoriedade da medida cautelar e da sua instrumentalidade relativamente à acção de que é dependência [art. 364º nº 1 do NCPC], com uma prova sumária ou um juízo de verosimilhança da existência do direito ameaçado, o já mencionado «fumus boni juris» [isto, claro está, não sendo de decretar a inversão do contencioso, como também se depreende do que atrás se disse], já quanto à gravidade da lesão e à dificuldade da respectiva reparação [neste conceito de «lesão» abarcam-se quer os danos patrimoniais ou com repercussão patrimonial, quer os prejuízos imateriais ou morais], o designado «periculum in mora», essas exigências [e os correspondentes ónus de alegação e da prova, a cargo de quem requer a providência] são bem maiores, devendo levar à formação de um juízo senão de certeza e segurança absoluta sobre a sua realidade, pelo menos de probabilidade mais forte e convincente, pois a lesão/dano a acautelar “não pode apenas consistir ou traduzir-se em meros incómodos, ou meras ofensas normativas e formais, …, antes devendo implicar concretas desvantagens, destruição, diminuição ou desvalor”, ou seja, “um prejuízo objectivo, efectivo, verdadeiro, real, substancial” que tem de ser grave e de difícil reparação [cfr. Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, pgs. 6, 7, 35 e 36, Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, III vol., 1998, pgs. 82 a 88, Acs. desta Relação do Porto de 17/12/2008, proc. 0825051, de 19/12/2007, proc. 0722393 e de 25/10/2007, proc. 0734974, disponíveis in www.dgsi.pt/jtrp e da Rel. de Lisboa de 26/06/2008, proc. 4959/2008-2, disponível in www.dgsi.pt/jtrl]. 
É, aliás, o que resulta da utilização das expressões “fundado receio”, “lesão grave” e “dificilmente reparável” que o legislador utiliza no referido normativo, as quais exigem apoio consistente em factos [que o requerente da providência tem que alegar e provar] que permitam afirmar, com objectividade e distanciamento – e não com base em apreciações subjectivas e emocionais -, a seriedade e actualidade da ameaça e a necessidade de serem adoptadas medidas tendentes a evitar o prejuízo [Abrantes Geraldes, ob. e vol. cit., pg. 87 e Ac. desta Relação de 17/12/2008, supra citado]. 
Por isso é que, para demonstração dos pressupostos que vimos afirmando, o requerente, além de alegar os factos que sumariamente demonstrem a existência ou a emergência do direito em que fundamenta a sua pretensão cautelar, tem, igualmente, que alegar e provar factos concretos que integrem os conceitos de “lesão grave” ou “lesão dificilmente reparável”, concretizando o mais possível o prejuízo invocado, para que o Tribunal possa aferir se é “grave”, e a repercussão que o mesmo poderá ter na sua esfera jurídica, para que se concretize a difícil reparação do dano na acção de que o procedimento cautelar é dependência, de modo a fundamentar o recurso à providência antecipatória [que é a modalidade que está aqui em causa e que se verifica quando devido à urgência da situação carecida de tutela, o tribunal antecipa, ainda que numa composição provisória, a realização do direito que previsivelmente será reconhecido na acção principal].

Acontece, contudo, que no caso «sub judice» os referidos pressupostos não se verificam, pois:
● por um lado, a requerente não pode lançar mão da via judicial para a nomeação de gerente à sociedade
● e, por outro, a sua não nomeação na assembleia geral extraordinária que convocou não pode ser imputável à recusa da requerida fixada no nº 6º dos factos provados.
Expliquemos porquê.
Estabelece o nº 1 do art. 253º do CSC que por óbito dos gerentes das sociedades por quotas [com a falta definitiva de todos os gerentes], os sócios [todos eles] assumem os poderes de gerência, até que seja(m) designado(s) novo(s) gerente(s).
Como diz um dos Autor atrás citados [Raul Ventura, obr. cit., vol. III, pgs. 46-48], deste preceito não resulta que “faltando definitivamente todos os gerentes, todos os sócios passam a ser gerentes; diz [é] que todos os sócios «assumem os poderes de gerência» e que o fazem por força da lei”, acrescentando que “esta última parte mostra ser desnecessária qualquer designação; a própria lei automaticamente faz os sócios assumirem esses poderes”. E refere, ainda que “os poderes assumidos pelos sócios são todos os que pertencem aos gerentes que os sócios substituem. Se todos esses poderes dos gerentes são necessários, segundo a lei, para a vida da sociedade, todos eles continuam a sê-lo se a sociedade for gerida pelos sócios”.
Deste excerto uma constatação se retira de imediato, com relevância para o caso em apreço: a morte do gerente da dita sociedade não provocou um vazio no exercício dos poderes de gerência; estes poderes passaram integralmente, a título provisório, para a requerida, única sócia da sociedade, até que novo ou novos gerentes venham a ser designados. Não se compreende, assim, o que consta dos nºs 8º e segs. dos factos provados, pois todos os actos aí referenciados passaram, por lei, a poder ser exercidos pela requerida [sendo certo que não vem dado como provado que a requerida não os exerce ou que não quer ou não pode exercê-los, mas sim que o não exercício dos actos ali indicados se deve à falta de gerente da sociedade]. 
Além disso, alerta o mesmo Professor, “importante é verificar que para a hipótese de falta permanente de todos os gerentes, o CSC não prevê a nomeação judicial; a assunção dos poderes de gerência por todos os sócios torna desnecessária essa nomeação. Nem se diga que a solução é incómoda quando for elevado o número de sócios. Antes de mais, a falta de gerentes é imputável aos sócios, que podem proceder à eleição quando quiserem (…)” [Obr. e vol. cit., pg. 48].  
Ou seja, a falta definitiva dos gerentes das sociedades por quotas, além de não gerar o vazio no exercício das respectivas funções, é facilmente suprível pela designação, pelos sócios dos novos gerentes, pelos meios legais, entre os quais cabem as assembleias gerais – arts. 246º nº 2 al. a) e 247º nº 1 do CSC. Por isso, nem sequer está previsto o recurso à via judicial para a nomeação de gerentes em tal situação.
Porque na assembleia geral extraordinária convocada pela requerente não foi feita a sua designação como gerente da sociedade, ainda poderia pensar-se que tal se teria devido à recusa da requerida assinalada nos nºs 6º e 7º dos factos provados [a douta decisão recorrida parece ter navegado nestas águas].
Mas só assim seria se a assembleia tivesse sido convocada legalmente; que é como quem diz, se tivesse sido convocada por quem para tal tinha poderes/legitimidade.
E, como decorre do que se exarou no item 2 deste ponto IV, a requerente não tinha poderes para o efeito, pois não era – nem agiu como tal – representante comum dos herdeiros da quota indivisa; e só nesta qualidade poderia, por si e como representante dos demais contitulares da quota, convocar a assembleia geral extraordinária, com vista à sua nomeação como gerente, exercendo, só assim, um direito que cabe aos sócios. 
É, assim, manifesto que não é por causa da recusa da requerida que a requerente não é gerente da sociedade; mas sim porque ela, requerente, não promoveu, nos termos em que devia, a sua nomeação como representante comum dos herdeiros da quota indivisa e porque, sem esta qualidade, não pode convocar assembleias gerais da sociedade com vista à designação de novo gerente.
Juntando a isto que a designação de novo gerente não cabe, nestes casos, aos tribunais [estes só intervêm no caso previsto na 2ª parte do nº 3 do art. 253º, que aqui não interessa], mas sim aos sócios, só podemos concluir que no caso não estão verificados os pressupostos de que poderia a procedência da pretensão da requerente que temos vindo a analisar.
Como tal, a providência decretada não pode manter-se, tendo de ser revogada a decisão recorrida.*
*4. Se há que condenar a requerente/recorrida como litigante de má fé.
Finalmente, pretende a recorrente, no ponto IV das alegações [nºs 58 e 59] e na conclusão VIII, a condenação da recorrida como litigante de má fé.
Aqui não lhe assiste razão.
Para que alguma parte processual possa ser condenada como litigante de má fé, exige o art. 542º do NCPC duas coisas: que a actuação processual dessa parte integre a previsão de alguma das alíneas do nº 2 desse normativo e, além disso, que essa actuação lhe seja imputável a título de dolo ou de negligência grave ou grosseira.
Ora, se é verdade que, objectivamente, a conduta da requerente poderia reconduzir-se ao disposto nas als. a) e d) daquele nº 2, já quanto ao elemento subjectivo nada nos diz que a mesma tenha agido dolosamente ou, pelo menos, com negligência grave/grosseira.
Daí que, sem necessidade de outros considerandos, tenha que soçobrar tal pretensão da recorrente.     *
*Síntese conclusiva:
● A inversão do contencioso, nos procedimentos cautelares [nos que a admitem], depende da verificação de dois pressupostos: que a matéria adquirida no procedimento permita que o juiz forme a convicção segura acerca da existência do direito acautelado e que a natureza da providência decretada seja adequada a realizar a composição definitiva do litígio.
● O primeiro destes pressupostos não se basta com a prova meramente perfunctória do «fumus boni juris», exigindo sim que a mesma se situe num patamar de exigência idêntico ao que é necessário para as decisões da matéria de facto nas acções de processo comum, pois só assim é admissível que o Julgador fique com a convicção segura da existência do direito acautelado e, por via disso, dispense o requerente da propositura da acção declarativa de que o procedimento cautelar seria dependente. 
● Os direitos inerentes à quota indivisa não podem ser exercidos, junto da sociedade respectiva, por todos os contitulares da mesma, só podendo ser exercidos pelo representante comum destes.
● A nomeação do representante comum da quota indivisa não pode ter lugar em assembleia geral extraordinária da sociedade, por se tratar de acto extra-societário; não se formando a maioria necessária para o efeito [entre os contitulares da quota], essa nomeação não passa pela convocação de qualquer assembleia geral da sociedade, mas sim pelo recurso à via judicial.
● O óbito do único gerente da sociedade por quotas não provoca o vazio no exercício dos poderes de gerência; estes poderes passam integralmente, a título provisório, para os sócios da mesma, até que novo(s) gerente(s) venha(m) a ser designado(s). 
● A requerente só poderia convocar assembleia geral extraordinária da sociedade, com vista à sua nomeação como gerente, se já estivesse nomeada como representante comum dos herdeiros, contitulares da quota indivisa.*         *         *V. Decisão:

Em conformidade que o exposto, os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação do Porto acordam em:
1º) Julgar procedente o recurso [excepto no segmento atinente à má fé] e revogar a decisão recorrida, com a consequente improcedência do procedimento cautelar.
2º) Condenar a recorrente nas custas, nas duas instâncias.*         *         *Porto, 2015/03/10
M. Pinto dos Santos
Francisco Matos
Maria de Jesus Pereira
__________
[Nota do relator: A condenação da recorrente em custas deveu-se a manifesto lapso de escrita e foi oficiosamente rectificada, por posterior acórdão do mesmo Colectivo, ficando as custas, como não podia deixar de ser, a cargo da recorrida]

Proc. 560/14.9T8AMT.P1 – 2ª Secção (apelação) _________________________________ Relator: Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Francisco Matos Des. Maria de Jesus Pereira* * *Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B…, por si e na qualidade de legal representante das suas filhas menores, C… e D…, intentou o presente procedimento cautelar comum contra E…, pedindo que, sem observância do contraditório inicial, atenta a urgência do procedimento e o perigo de lesão grave e irreparável: a) Seja nomeada representante comum dos herdeiros, como cabeça-de-casal, nos termos do art. 223º do CSC; b) Seja nomeada gerente da sociedade “F..., Lda.”; Alegou, para tal, que: ● ela, as suas representadas e a requerida são as únicas e universais herdeiras de G… [a requerente estava casada com este segundo o regime da comunhão de adquiridos e ele é pai das restantes], que faleceu, com testamento, em 19/11/2014: ● o G… e a requerida eram os únicos sócios da sociedade comercial “F…, Lda.”, e ele era o único gerente desta, tendo tal cargo ficado vago com o seu decesso; ● no sentido de nomear um representante comum dos herdeiros e um gerente, a requerente convocou uma assembleia geral extraordinária da sociedade, que teve lugar a 12/12/2014; ● a requerida foi devidamente convocada e, na assembleia, a mesma recusou-se a assinar a acta; ● perante tal atitude, a assembleia foi encerrada, por não ser possível deliberar de acordo com a ordem do dia; ● a referida sociedade está paralisada, por falta de um gerente que possa apor a sua assinatura nos documentos de relevo; ● por via disso, não é possível pagar salários aos 43 empregados da F…, pagar aos fornecedores de areia, cimento ou combustível, pagar a electricidade, pagar os compromissos bancários assumidos, nem pagar os impostos, nomeadamente, o IVA mensal; ● há o perigo real e efectivo desta situação de “vazio de poder” se manter por muito tempo, se for convocada uma nova assembleia geral, ou se for necessário recorrer à acção judicial comum, o que pode inviabilizar o futuro da sociedade e conduzi-la a uma situação de insolvência; ● embora a requerente, de acordo com o art. 1053º e segs. do Novo CPC, possa requerer, em tribunal, a sua nomeação como representante comum dos herdeiros, enquanto a quota se mantiver indivisa e como gerente da sociedade, a eventual demora da decisão judicial poderá inviabilizar o efeito prático da mesma. Sem audição da requerida, realizou-se a audiência de produção da prova arrolada pela requerente, tendo esta, no seu decurso, requerido a inversão do contencioso. Foi depois proferida decisão que deferiu a providência cautelar nos seguintes termos: “Julgo procedente, por provada, a presente providência cautelar e, em consequência: a) Nomeio a requerente B… como representante comum dos herdeiros, como cabeça-de-casal, nos termos do art. 223 n.º 3 do CSC; b) Nomeio a requerente B…, gerente da sociedade “F…, Lda.”; c) Decreto a inversão do contencioso, antecipando o juízo da causa principal. Custas pela requerente. Comunique à sociedade e à Conservatória do Registo Comercial de Felgueiras. Registe e notifique.” Notificada e inconformada com tal decisão, interpôs a requerida o recurso de apelação em apreço, cujas alegações culminou com as seguintes conclusões: “I. De acordo com o alegado supra em I), vista a inexistência de fundamentação na sentença recorrida sobre a convicção segura acerca do direito acautelado – nos termos do art. 369º do C.P.C. -, a sentença padece de nulidade quanto à decretada inversão do contencioso, plasmada esta na al. b) do nº 1 e no nº 4 do art. 615º do C.P.C., que deve ser declarada; II. No que respeita à nomeação da recorrida como representante da quota comum, esse é acto extra-sociedade, que podia ter sido tomado por maioria à qual não era necessária a anuência da recorrente, pelo que, não corresponde ao decidido que nesta parte tenha sido a actuação da recorrente a paralisar a sociedade. III. Assim, e nesta parte, conforme resulta de II) supra, o decidido viola o vertido nos arts. 22º, 223º e 224º do C.S.C. e art. 1407º do C.C., impondo-se a sua revogação. IV. Por outro lado, é manifesto que ainda nesta parte, e de acordo o invocado em II supra, os fundamentos estão em contradição com o decidido, ocorrendo nulidade da sentença, nos termos do art. 615º, nº 1, al. c) do C.P.C., que se pretende seja declarada. V. Por fim e no que ao ponto III) da motivação supra se refere, é manifesto também que a recorrente não tinha competência para convocar a reunião da sociedade, a decisão não levou em conta que, na falta do gerente assumem tal qualidade todos os sócios, que é imputável à recorrida a inexistência de representante comum da quota, como supra se defendeu, além de que não está facticamente demonstrado um único evento que revele a paralisação da empresa, sendo certo que a recorrente, sócia originária, qualidade que a recorrida nunca teve, nunca se furtou a conduzi-la. VI. A recorrente simplesmente não tem que se subjugar aos instintos desenfreados da recorrida na sua pretensão de afastamento daquela do giro societário, não tem que a admitir como sócia que não é, não tem que aceitar que esta convoque, ilegalmente, assembleias gerais ou se assuma como presidente de tal assembleia, ignorando e passando por cima da qualidade de sócia que esta tem desde o início da sociedade e aquela, sua madrasta, nunca teve. VII. A douta sentença violou, assim, pois e nesta parte, o vertido nos arts. 21º, nº 1, al. b), 248º, nº 1, 252º, nº 2, 253º do C.S.C. e 1407º do C.C., pelo que, nesta parte, se impõe e requer a sua revogação. VIII. Deve ser levado em conta o vertido supra em IV) da motivação, e a recorrida sancionada condignamente, nos termos do art. 542º, nº 2 do C.P.C. E assim, V. Exas., Venerandos Desembargadores, dando provimento ao presente recurso, com o mui douto suprimento dos altos conhecimentos que se reconhecem, farão a costumada, Justiça!” A requerente/recorrida contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e pela confirmação do decidido.* * *II. Questões a apreciar e decidir: Face às conclusões das alegações da recorrente [que delimitam o «thema decidendum» a cargo desta 2ª instância, conforme dispõem os arts. 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2 do Novo CPC, aqui aplicável, por já se encontrar em vigor à data da instauração do procedimento], as questões a apreciar e decidir são as seguintes: ● Se é de manter a decretada inversão do contencioso; ● Se o Tribunal podia ter nomeado a requerente como representante comum dos herdeiros do falecido gerente da sociedade; ● Se ocorrem os pressupostos para o decretamento da nomeação da requerente como gerente da sociedade; ● Se há que condenar a requerente/recorrida como litigante de má fé.* * *III. Circunstancialismo fáctico: A decisão recorrida considerou “indiciariamente demonstrados” os seguintes factos: 1º- A requerente, as suas representadas e a requerida são as únicas herdeiras de G…, ex-cônjuge da requerente, com quem casou no regime da comunhão de adquiridos e pai das restantes, e que faleceu, com testamento, no passado dia 19 de Novembro de 2014, como consta da escritura de habilitação de herdeiros de fls. 11. 2º- O G… e a requerida E… eram os únicos sócios da sociedade comercial que gira sob a firma “F…, Lda.”, NIPC n.º ………, com sede no …, freguesia …, concelho de Felgueiras. 3º- O falecido G… era o único gerente daquela sociedade, que se obrigava com a sua assinatura e, após o seu óbito, o cargo de gerente ficou vago. 4º- No sentido de nomear um representante comum e um gerente, foi convocada a Assembleia Geral Extraordinária, que teve lugar no passado dia 12 do corrente, pelas 17 horas [esclarece-se que esta convocatória foi feita pela requerente, como decorre de fls. 17]. 5º- A requerida foi devidamente convocada por carta registada datada de 24/11/2014, junta a fls. 17. 6º- Estando presentes a requerente, a requerida e o secretário da assembleia, a requerida afirmou que não assinava a acta, como consta do teor da Acta n.º 49 junta a fls. 19. 7º- Perante tal atitude foi encerrada a assembleia, por não ser possível deliberar de acordo com a ordem do dia. 8º- O giro da sociedade está paralisado, por falta de um gerente que possa apor a sua assinatura nos documentos necessários para a actividade da sociedade. 9º- Devido à falta de um gerente não é possível pagar salários aos 43 empregados da F…. 10º- Não é possível pagar aos fornecedores de areia, cimento ou combustível. 11º- Não é possível pagar a electricidade. 12º- Não é possível pagar os compromissos bancários assumidos enquanto o Sr. G… geriu a F…. 13º- Não é possível pagar os impostos, nomeadamente, o IVA mensal.* * *IV. Apreciação jurídica: 1. Se é de manter a decretada inversão do contencioso. Na 1ª conclusão das doutas alegações, a recorrente sustenta que a douta decisão recorrida é nula, nos termos da al. b) do nº 1 do art. 615º do Novo CPC, por não ter fundamentado o decretamento da inversão do contencioso, previsto no art. 369º do mesmo corpo de normas. A recorrida contrapõe, nas doutas contra-alegações, que tal segmento decisório [al. c) da parte decisória da decisão recorrida] “encontra-se perfeitamente plasmado na motivação constante da douta sentença em crise, não sendo necessário motivar autonomamente a inversão do contencioso, para além do que a lei pretende com a instituição dessa figura, qual seja, que a providência a decretar será adequada a realizar a composição definitiva do litígio e isso terá de resultar do grau de convicção expresso na decisão de decretar a providência”. Apreciando esta questão, adiantamos desde já que o que está em causa não é propriamente a nulidade da decisão recorrida no segmento ora em análise, mas sim a sua correcção ou incorrecção perante as exigências da lei. Na verdade, a nulidade prevista na al. b) do nº 1 do art. 615º do Novo CPC – não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão – só se verifica quando a fundamentação seja totalmente omitida [há unanimidade na jurisprudência e na doutrina quanto a isto], não abarcando os casos de fundamentação incompleta nem a fundamentação imperfeita; estas relevam já noutra sede - erro de julgamento. No caso, o Tribunal fundamentou o decretamento da inversão do contencioso, afirmando que esta se impunha pelo facto de “ainda em vida do anterior gerente era a requerente que seguia a actividade societária” [cfr. 1º parágrafo da última página da decisão recorrida]. Daqui resulta que o Tribunal abordou a questão, ainda que muito superficialmente, na fundamentação da decisão, inexistindo, assim, omissão total de fundamentação daquele decretamento. O que se verifica, como veremos de seguida, é que o fundamento invocado nada tem que ver com os pressupostos de que a lei processual faz depender aquela inversão. Essa errónea fundamentação não releva para os efeitos da al. b) do nº 1 do citado art. 615º, mas sim em sede de erro de julgamento que fundamentará, não a nulidade do segmento decisório em referência, mas sim a revogação da decisão nessa parte. Como o Tribunal não está vinculado às qualificações jurídicas das partes – nº 3 do art. 5º do Novo CPC – e os articulados estão sujeitos às regras interpretativas enunciadas nos arts. 236º a 239º do CCiv., nada impede que este Tribunal da Relação conclua no sentido da revogação da decisão na parte em apreço, em vez de declarar a nulidade parcial invocada pela recorrente. Vejamos então porque é que a referida fundamentação não obedece às exigências legais. O art. 369º do Novo CPC prevê, pela primeira vez, no nosso ordenamento processual civil e, mais concretamente, no âmbito dos procedimentos cautelares [embora não seja extensível a todos, conforme se afere do nº 4 do art. 376º], a figura da inversão do contencioso, admitindo que, “mediante requerimento, o juiz, na decisão que decrete a providência”, possa “dispensar o requerente do ónus de propositura da acção principal se a matéria adquirida no procedimento lhe permitir formar convicção segura acerca da existência do direito acautelado e se a natureza da providência decretada for adequada a realizar a composição definitiva do litígio”. Com esta figura quebrou-se o princípio que vigorou nos Códigos de Processo anteriores “segundo o qual estes [os procedimentos cautelares] são – sempre e necessariamente – dependência de uma causa principal, obrigatoriamente proposta pelo requerente com vista a evitar a caducidade da providência cautelar decretada em seu benefício”, sendo certo que “esta tradicional configuração normativa conduz(ia) frequentemente a situações em que, na prática, se tenha de repetir inteiramente, no âmbito da acção principal, a mesma controvérsia que tinha acabado de ser apreciada e decidida no âmbito do procedimento cautelar – sendo duvidoso que o mero argumento, extraído do facto de, na causa principal, o requerido gozar de garantias processuais formais superiores às que caracterizam o procedimento cautelar, possa justificar cabalmente os custos e demoras decorrentes desta duplicação de procedimentos, ao menos nos casos em que, apesar das menores garantias formais, a decisão cautelar possa ter, na prática, solucionado efectivamente o litígio que opunha as partes” [Cons. Lopes do Rego, in Revista Julgar, nº 16, Jan.-Abr. 2012, “Os princípios orientadores da reforma do processo civil em curso”, pg. 109]. No caso, não vem colocada qualquer questão quanto à tempestividade do requerimento da requerente com vista ao decretamento da inversão do contencioso. O nº 2 do art. 369º permite que tal requerimento seja feito até ao encerramento da audiência final e tal requisito foi observado, pois a requerente apresentou-o no decurso da audiência de produção da prova, como consta da acta respectiva [cfr. fls. 26]. Do nº 1 do mesmo preceito decorre que aquela inversão depende da verificação de dois pressupostos: - que a matéria adquirida no procedimento permita que o juiz forme a convicção segura acerca da existência do direito acautelado; - e que a natureza da providência decretada seja adequada a realizar a composição definitiva do litígio. Relativamente a este último pressuposto, é evidente a sua verificação «in casu», pois o objectivo principal da requerente era a sua nomeação como gerente da sociedade atrás identificada e essa pretensão foi deferida e decretada. Quanto ao primeiro, temos como certo que a sua verificação exige que a convicção do Julgador seja mais forte, mais consistente, que a que normalmente é necessária para o decretamento das providências cautelares; e para que tal aconteça, a prova não pode ser meramente perfunctória, baseada no «fumus boni juris», que basta para o deferimento das providências cautelares em geral, sem a inversão do contencioso. Tal prova tem de situar-se num patamar de exigência idêntico ao que é necessário para as decisões da matéria de facto nas acções de processo comum, pois só assim é admissível que o Julgador fique com a convicção segura da existência do direito acautelado e, por via disso, dispense o requerente da propositura da acção declarativa de que o procedimento cautelar seria dependente. Ora, no caso «sub judice» claramente não existiu essa prova reforçada, pois foi ouvida apenas uma única testemunha [técnico oficial de contas da sociedade supra identificada] e, quanto a prova documental, apenas foi tida em conta a que consta dos autos, ou seja, a escritura de habilitação de herdeiros do falecido marido da requerente e pai das requerentes menores e da requerida, junta a fls. 10 a 13, o testamento outorgado por aquele, junto a fls. 14 a 16, a convocatória da assembleia geral extraordinária referida nos factos provados, junta a fls. 17, a cópia do registo do envio pelo correio dessa convocatória, junta a fls. 18 e a acta daquela assembleia geral, junta a fls. 19-20. Nenhuma prova documental relativa à concreta actividade da sociedade foi junta aos autos ou sequer exibida na audiência de produção da prova, comprovativa, designadamente, de fornecimentos, de despesas e de compromissos, incluindo fiscais, que se encontrem por pagar desde o decesso do gerente da sociedade. E só uma prova assente nessa documentação permitiria ao Julgador formar uma convicção segura acerca da factualidade que consta dos nºs 8º a 13º dos factos provados. Assim, estribada unicamente no testemunho prestado pelo referido TOC [os documentos juntos aos autos não relevaram no apuramento daqueles factos], tal prova não passou o patamar meramente indiciário ou perfunctório. Isso mesmo é o que, aliás, resulta da fundamentação da factologia dada como provada na decisão recorrida, onde, depois de se afirmar, no respectivo intróito, que “Considero indiciariamente demonstrados os seguintes factos” [itálico nosso], se alude, várias vezes, à circunstância de o decretamento da providência cautelar se bastar com uma prova meramente indiciária – cfr. pgs. 3 e 4 da decisão; fls. 30 e 31 dos autos -, nenhuma referência existindo de que a Mma. Juiz «a quo» tenha considerado que a prova produzida haja ultrapassado esse nível básico indiciário. Surge, pois, inequívoco que a materialidade fáctica dada como provada radicou tão-só em prova indiciária e não em prova segura/consistente; e só esta permitiria que a requerida inversão do contencioso fosse decretada. Não se verifica, por conseguinte, o primeiro pressuposto exigido pelo nº 1 do art. 369º do Novo CPC, pelo que aquela inversão não podia ter sido decretada. Consequentemente, a decisão recorrida tem de ser revogada neste segmento.* *2. Se a decisão recorrida podia nomear a requerente como representante comum dos herdeiros do falecido gerente da sociedade. A decisão recorrida deferiu também o pedido da requerente no sentido de ser nomeada como representante comum dos herdeiros do seu falecido marido e gerente da indicada sociedade, para que, em nome dos contitulares da quota que ele detinha na sociedade, possa exercer os direitos a ela [quota] inerentes. Na base de tal pretensão da requerente está a recusa da requerida em ter assinado a acta da assembleia geral extraordinária convocada por aquela, que tinha por objectivos a nomeação da mesma como “representante comum da quota do falecido” e a “eleição de gerente” da sociedade [cfr. doc. junto a fls. 17]. A recorrente entende, no ponto II [nºs 12 a 27] do corpo das alegações e nas conclusões II a IV destas, que aquela nomeação não era um acto societário que pudesse ser apreciado/decidido na dita assembleia geral e que a recusa em ter assinado a respectiva acta não fundamenta o recurso à via judicial, e a este procedimento cautelar, para a obtenção dessa nomeação. Da conjugação dos factos provados com o teor da acta junta a fls. 19-20, resulta que o falecido marido da requerente e pai das requerentes menores e da requerida, além de gerente da referida sociedade por quotas, era sócio desta, detendo nela uma quota de 740.000,00€ [a quota da requerida – a outra sócia da sociedade – é de 10.000,00€]. Dessa quota são contitulares, face ao decesso daquele, a requerente, as suas representadas menores e a requerida [ensina Raul Ventura, in Sociedades por Quotas, vol. I, 2ª ed., pg. 496, que a contitularidade da quota pode ser originária ou derivada e que esta “pode resultar de qualquer facto lícito”, designadamente de herança ou legado]. De acordo com o nº 1 do art. 222º do Código das Sociedades Comerciais [CSC], os contitulares de quota devem exercer os direitos a ela inerentes através de representante comum. Deste preceito resulta, por um lado, que os direitos inerentes à quota não podem ser exercidos, junto da sociedade respectiva, por todos os contitulares da mesma e, por outro, que tais direitos só podem ser exercidos pelo representante comum destes. E o art. 223º do CSC contém os modos de nomeação desse representante comum, prevendo quatro, a saber: por lei, por disposição testamentária, por nomeação dos contitulares, por nomeação do tribunal – nºs 1 e 3. No caso, o testamento do sócio falecido não contém qualquer referência a tal nomeação, pelo que esta teria de ser feita nos termos previstos na parte final do nº 1 e no nº 2 daquele preceito legal, com referência ao art. 1407º do CCiv.. Ou seja, o representante comum teria de ser eleito por maioria, em deliberação tomada entre todos os contitulares da quota. Esta deliberação, como é bom de ver-se, é extra-societária, na medida em que nada tem a ver com a sociedade; só depois de designado o representante comum e de comunicada a sua nomeação à sociedade – nº 4 do art. 223º -, é que ele poderá exercer perante esta “todos os poderes inerentes à quota indivisa”, à excepção dos que se encontram indicados na 2ª parte do nº 5 e no nº 6 do mesmo normativo. O recurso à nomeação do representante comum por via judicial só é admitido quando não seja possível por deliberação entre os contitulares – nº 3 [sobre o que fica dito quanto aos modos e forma de nomeação do representante comum, veja-se Raul Ventura, obr. e vol. cit., pgs. 516-521]. Daqui resulta que a nomeação da requerente como representante comum da quota do falecido G… não poderia ter lugar na assembleia geral extraordinária da sociedade que ela própria requereu; tal nomeação, sendo acto extra-societário, teria de ter lugar fora da sociedade, em deliberação tomada entre todos os contitulares da quota. Não podendo formar-se essa maioria, a requerente só tinha um caminho a seguir, que não passava pela convocação da dita assembleia: teria de requerer a sua nomeação como representante comum ao tribunal. Neste procedimento, a requerente não radica o pedido da sua nomeação como tal na impossibilidade de, em deliberação entre os contitulares da quota, se formar maioria. Funda-a sim no facto de tal desiderato não ter sido alcançado na assembleia geral que convocou, em virtude da recusa da requerida. Como aquela nomeação não poderia ter lugar nessa assembleia geral, logo se vê que não foi por causa da atitude [recusa] da requerida que a requerente não era, à data da instauração do procedimento cautelar, a representante comum dos contitulares da quota indivisa. E não se fundando o pedido da requerente na impossibilidade de ser nomeada como tal em deliberação [extra-societária, repete-se] para a qual estivessem convocados os contitulares da quota [a sua pretensão estriba-se apenas no facto dessa nomeação ter sido recusada pela requerida na mencionada assembleia], facilmente se conclui que não podia recorrer, para tal efeito, à via judicial, nem a este procedimento cautelar, já que a dependência deste relativamente a uma outra acção [a acção principal], nos termos do nº 1 do art. 364º do Novo CPC, faz com que ele só seja possível quando o direito a acautelar possa fundamentar também a instauração dessa acção. Deste modo, assiste, igualmente, razão à recorrente neste ponto. O que fica exposto não leva, no entanto, à nulidade da decisão nesta parte, como aquela defende no nº 27 do corpo das alegações e na conclusão IV, mas sim à revogação da decretada nomeação da requerente como representante comum dos herdeiros contitulares da quota indivisa. Com este esclarecimento, o recurso procede, igualmente, nesta parte.* *3. Se ocorrem os pressupostos para o decretamento da nomeação da requerente como gerente da sociedade. Na decisão recorrida foi a requerente, ainda, nomeada gerente da indicada sociedade, por se ter considerado que a recusa da requerida, na aludida assembleia geral, foi causa da não nomeação da primeira nessas funções e da manutenção da impossibilidade de, assim, sem gerente, a sociedade manter o seu giro comercial, por não poder cumprir as obrigações assumidas nem sequer pagar aos seus trabalhadores. A recorrente, no ponto III [nºs 28 a 57] das alegações e nas conclusões V a VII, contrapõe que o decesso do identificado gerente não gerou o vazio directivo [de gerência] na sociedade, pois passou a caber-lhe a ela, única sócia, o exercício das funções de gerência e que a não nomeação de um novo gerente não lhe é imputável, mas sim à requerente, por esta não ser ainda a representante comum dos herdeiros contitulares da quota indivisa e, por via isso, não poder convocar nem participar, como sócia [e representante dos demais sócios], nas assembleias gerais da sociedade. Comecemos este ponto pela indicação dos pressupostos de procedência dos procedimentos cautelares comuns e, por conseguinte, da que aqui está em causa. Segundo o art. 362º do Novo CPC, “sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efectividade do direito ameaçado” [nº 1], podendo o direito que o requerente pretende acautelar ser um “direito já existente” ou vir a emergir “de decisão a proferir em acção constitutiva, já proposta ou a propor” [nº 2]. São, assim, pressupostos do seu decretamento/procedência: ● a probabilidade séria da existência do direito invocado pelo requerente; ● o fundado receio de que a conduta do requerido causa grave lesão nesse seu direito (ou no respectivo exercício); ● e que tal lesão seja dificilmente reparável. Se quanto ao primeiro pressuposto a doutrina e a jurisprudência se bastam, por causa da provisoriedade da medida cautelar e da sua instrumentalidade relativamente à acção de que é dependência [art. 364º nº 1 do NCPC], com uma prova sumária ou um juízo de verosimilhança da existência do direito ameaçado, o já mencionado «fumus boni juris» [isto, claro está, não sendo de decretar a inversão do contencioso, como também se depreende do que atrás se disse], já quanto à gravidade da lesão e à dificuldade da respectiva reparação [neste conceito de «lesão» abarcam-se quer os danos patrimoniais ou com repercussão patrimonial, quer os prejuízos imateriais ou morais], o designado «periculum in mora», essas exigências [e os correspondentes ónus de alegação e da prova, a cargo de quem requer a providência] são bem maiores, devendo levar à formação de um juízo senão de certeza e segurança absoluta sobre a sua realidade, pelo menos de probabilidade mais forte e convincente, pois a lesão/dano a acautelar “não pode apenas consistir ou traduzir-se em meros incómodos, ou meras ofensas normativas e formais, …, antes devendo implicar concretas desvantagens, destruição, diminuição ou desvalor”, ou seja, “um prejuízo objectivo, efectivo, verdadeiro, real, substancial” que tem de ser grave e de difícil reparação [cfr. Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil Anotado, vol. 2º, pgs. 6, 7, 35 e 36, Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, III vol., 1998, pgs. 82 a 88, Acs. desta Relação do Porto de 17/12/2008, proc. 0825051, de 19/12/2007, proc. 0722393 e de 25/10/2007, proc. 0734974, disponíveis in www.dgsi.pt/jtrp e da Rel. de Lisboa de 26/06/2008, proc. 4959/2008-2, disponível in www.dgsi.pt/jtrl]. É, aliás, o que resulta da utilização das expressões “fundado receio”, “lesão grave” e “dificilmente reparável” que o legislador utiliza no referido normativo, as quais exigem apoio consistente em factos [que o requerente da providência tem que alegar e provar] que permitam afirmar, com objectividade e distanciamento – e não com base em apreciações subjectivas e emocionais -, a seriedade e actualidade da ameaça e a necessidade de serem adoptadas medidas tendentes a evitar o prejuízo [Abrantes Geraldes, ob. e vol. cit., pg. 87 e Ac. desta Relação de 17/12/2008, supra citado]. Por isso é que, para demonstração dos pressupostos que vimos afirmando, o requerente, além de alegar os factos que sumariamente demonstrem a existência ou a emergência do direito em que fundamenta a sua pretensão cautelar, tem, igualmente, que alegar e provar factos concretos que integrem os conceitos de “lesão grave” ou “lesão dificilmente reparável”, concretizando o mais possível o prejuízo invocado, para que o Tribunal possa aferir se é “grave”, e a repercussão que o mesmo poderá ter na sua esfera jurídica, para que se concretize a difícil reparação do dano na acção de que o procedimento cautelar é dependência, de modo a fundamentar o recurso à providência antecipatória [que é a modalidade que está aqui em causa e que se verifica quando devido à urgência da situação carecida de tutela, o tribunal antecipa, ainda que numa composição provisória, a realização do direito que previsivelmente será reconhecido na acção principal]. Acontece, contudo, que no caso «sub judice» os referidos pressupostos não se verificam, pois: ● por um lado, a requerente não pode lançar mão da via judicial para a nomeação de gerente à sociedade ● e, por outro, a sua não nomeação na assembleia geral extraordinária que convocou não pode ser imputável à recusa da requerida fixada no nº 6º dos factos provados. Expliquemos porquê. Estabelece o nº 1 do art. 253º do CSC que por óbito dos gerentes das sociedades por quotas [com a falta definitiva de todos os gerentes], os sócios [todos eles] assumem os poderes de gerência, até que seja(m) designado(s) novo(s) gerente(s). Como diz um dos Autor atrás citados [Raul Ventura, obr. cit., vol. III, pgs. 46-48], deste preceito não resulta que “faltando definitivamente todos os gerentes, todos os sócios passam a ser gerentes; diz [é] que todos os sócios «assumem os poderes de gerência» e que o fazem por força da lei”, acrescentando que “esta última parte mostra ser desnecessária qualquer designação; a própria lei automaticamente faz os sócios assumirem esses poderes”. E refere, ainda que “os poderes assumidos pelos sócios são todos os que pertencem aos gerentes que os sócios substituem. Se todos esses poderes dos gerentes são necessários, segundo a lei, para a vida da sociedade, todos eles continuam a sê-lo se a sociedade for gerida pelos sócios”. Deste excerto uma constatação se retira de imediato, com relevância para o caso em apreço: a morte do gerente da dita sociedade não provocou um vazio no exercício dos poderes de gerência; estes poderes passaram integralmente, a título provisório, para a requerida, única sócia da sociedade, até que novo ou novos gerentes venham a ser designados. Não se compreende, assim, o que consta dos nºs 8º e segs. dos factos provados, pois todos os actos aí referenciados passaram, por lei, a poder ser exercidos pela requerida [sendo certo que não vem dado como provado que a requerida não os exerce ou que não quer ou não pode exercê-los, mas sim que o não exercício dos actos ali indicados se deve à falta de gerente da sociedade]. Além disso, alerta o mesmo Professor, “importante é verificar que para a hipótese de falta permanente de todos os gerentes, o CSC não prevê a nomeação judicial; a assunção dos poderes de gerência por todos os sócios torna desnecessária essa nomeação. Nem se diga que a solução é incómoda quando for elevado o número de sócios. Antes de mais, a falta de gerentes é imputável aos sócios, que podem proceder à eleição quando quiserem (…)” [Obr. e vol. cit., pg. 48]. Ou seja, a falta definitiva dos gerentes das sociedades por quotas, além de não gerar o vazio no exercício das respectivas funções, é facilmente suprível pela designação, pelos sócios dos novos gerentes, pelos meios legais, entre os quais cabem as assembleias gerais – arts. 246º nº 2 al. a) e 247º nº 1 do CSC. Por isso, nem sequer está previsto o recurso à via judicial para a nomeação de gerentes em tal situação. Porque na assembleia geral extraordinária convocada pela requerente não foi feita a sua designação como gerente da sociedade, ainda poderia pensar-se que tal se teria devido à recusa da requerida assinalada nos nºs 6º e 7º dos factos provados [a douta decisão recorrida parece ter navegado nestas águas]. Mas só assim seria se a assembleia tivesse sido convocada legalmente; que é como quem diz, se tivesse sido convocada por quem para tal tinha poderes/legitimidade. E, como decorre do que se exarou no item 2 deste ponto IV, a requerente não tinha poderes para o efeito, pois não era – nem agiu como tal – representante comum dos herdeiros da quota indivisa; e só nesta qualidade poderia, por si e como representante dos demais contitulares da quota, convocar a assembleia geral extraordinária, com vista à sua nomeação como gerente, exercendo, só assim, um direito que cabe aos sócios. É, assim, manifesto que não é por causa da recusa da requerida que a requerente não é gerente da sociedade; mas sim porque ela, requerente, não promoveu, nos termos em que devia, a sua nomeação como representante comum dos herdeiros da quota indivisa e porque, sem esta qualidade, não pode convocar assembleias gerais da sociedade com vista à designação de novo gerente. Juntando a isto que a designação de novo gerente não cabe, nestes casos, aos tribunais [estes só intervêm no caso previsto na 2ª parte do nº 3 do art. 253º, que aqui não interessa], mas sim aos sócios, só podemos concluir que no caso não estão verificados os pressupostos de que poderia a procedência da pretensão da requerente que temos vindo a analisar. Como tal, a providência decretada não pode manter-se, tendo de ser revogada a decisão recorrida.* *4. Se há que condenar a requerente/recorrida como litigante de má fé. Finalmente, pretende a recorrente, no ponto IV das alegações [nºs 58 e 59] e na conclusão VIII, a condenação da recorrida como litigante de má fé. Aqui não lhe assiste razão. Para que alguma parte processual possa ser condenada como litigante de má fé, exige o art. 542º do NCPC duas coisas: que a actuação processual dessa parte integre a previsão de alguma das alíneas do nº 2 desse normativo e, além disso, que essa actuação lhe seja imputável a título de dolo ou de negligência grave ou grosseira. Ora, se é verdade que, objectivamente, a conduta da requerente poderia reconduzir-se ao disposto nas als. a) e d) daquele nº 2, já quanto ao elemento subjectivo nada nos diz que a mesma tenha agido dolosamente ou, pelo menos, com negligência grave/grosseira. Daí que, sem necessidade de outros considerandos, tenha que soçobrar tal pretensão da recorrente. * *Síntese conclusiva: ● A inversão do contencioso, nos procedimentos cautelares [nos que a admitem], depende da verificação de dois pressupostos: que a matéria adquirida no procedimento permita que o juiz forme a convicção segura acerca da existência do direito acautelado e que a natureza da providência decretada seja adequada a realizar a composição definitiva do litígio. ● O primeiro destes pressupostos não se basta com a prova meramente perfunctória do «fumus boni juris», exigindo sim que a mesma se situe num patamar de exigência idêntico ao que é necessário para as decisões da matéria de facto nas acções de processo comum, pois só assim é admissível que o Julgador fique com a convicção segura da existência do direito acautelado e, por via disso, dispense o requerente da propositura da acção declarativa de que o procedimento cautelar seria dependente. ● Os direitos inerentes à quota indivisa não podem ser exercidos, junto da sociedade respectiva, por todos os contitulares da mesma, só podendo ser exercidos pelo representante comum destes. ● A nomeação do representante comum da quota indivisa não pode ter lugar em assembleia geral extraordinária da sociedade, por se tratar de acto extra-societário; não se formando a maioria necessária para o efeito [entre os contitulares da quota], essa nomeação não passa pela convocação de qualquer assembleia geral da sociedade, mas sim pelo recurso à via judicial. ● O óbito do único gerente da sociedade por quotas não provoca o vazio no exercício dos poderes de gerência; estes poderes passam integralmente, a título provisório, para os sócios da mesma, até que novo(s) gerente(s) venha(m) a ser designado(s). ● A requerente só poderia convocar assembleia geral extraordinária da sociedade, com vista à sua nomeação como gerente, se já estivesse nomeada como representante comum dos herdeiros, contitulares da quota indivisa.* * *V. Decisão: Em conformidade que o exposto, os Juízes desta secção cível do Tribunal da Relação do Porto acordam em: 1º) Julgar procedente o recurso [excepto no segmento atinente à má fé] e revogar a decisão recorrida, com a consequente improcedência do procedimento cautelar. 2º) Condenar a recorrente nas custas, nas duas instâncias.* * *Porto, 2015/03/10 M. Pinto dos Santos Francisco Matos Maria de Jesus Pereira __________ [Nota do relator: A condenação da recorrente em custas deveu-se a manifesto lapso de escrita e foi oficiosamente rectificada, por posterior acórdão do mesmo Colectivo, ficando as custas, como não podia deixar de ser, a cargo da recorrida]