I - Nos termos do artigo 615º nº 1 al. d) do CPC é nula a sentença que deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Sanciona este normativo, em respeito pelo princípio do pedido e do impulso processual associado ao princípio da contradição, consagrados desde logo no artigo 3º do CPC, a violação do disposto no artigo 608º nº 2 do CPC. É em função do objeto processual delineado pelo autor, conformado este pelo pedido e causa de pedir, bem como pelas questões/exceções ao mesmo opostas pelo réu que a atividade do tribunal se desenvolverá, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso. II - O erro na forma do processo tem de ser aferido em função da pretensão formulada e da adequação da espécie adotada pelo requerente a tal pretensão. III - Não está vedado o recurso à via judicial quando em causa esteja a cessação do contrato de arrendamento com fundamento na mora do pagamento de rendas por período superior a 3 meses. Apresentando-se o recurso ao PED, sustentado entre o mais na comunicação extrajudicial de resolução prevista no artigo 1084º nº 2, num meio alternativo à ação comum de despejo. IV - Na falta de domicílio convencionado a que se reporta a al. c) do nº 7 do artigo 9º do NRAU, é de aplicar a regra dos nºs 1 e 2 do artigo 9º do NRAU à comunicação do senhorio para resolução do contrato nos termos do nº 2 do artigo 1084º do CC, sendo válida a comunicação por carta registada com AR dirigida ao arrendatário para o local arrendado que seja rececionada por este, por força do disposto no artigo 10º do NRAU que regula as vicissitudes das comunicações.
Processo nº. 257/19.3T8STS.P1 3ª Secção Cível Relatora – Juíza Desembargadora M. Fátima Andrade Adjunta - Juíza Desembargadora Eugénia Cunha Adjunta - Juíza Desembargadora Fernanda Almeida Tribunal de Origem do Recurso – T J Comarca do Porto – Jz. Local Cível de Santo Tirso Apelante/ B…. Apelados/ C… e outro Sumário (artigo 663º nº 7 do CPC): ………………….. ………………….. ………………….. Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto I- Relatório C… e marido D… instauraram a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra B…, peticionando pela procedência da ação que seja decretado “o despejo imediato do local arrendado, sendo o Réu condenado a deixá-lo livre de pessoas e bens e, no estado de conservação em que se encontrava à data da celebração do contrato de arrendamento atrás identificado”. Para tanto e em suma alegaram: - a celebração do contrato de arrendamento da fração descrita na p.i. e o seu incumprimento, por não pagamento pontual das rendas acordadas – nomeadamente as rendas relativas aos meses de maio a dezembro de 2017 e janeiro de 2018 - fundamento de resolução do contrato já operada por missiva enviada ao R. em 17/12/2017 nos termos do artigo 1084º nº 3 do CC; - a manutenção da ocupação do locado e não pagamento das rendas; - a falta de pagamento da renda em tempo e lugar próprios ou a ausência de depósito liberatório é (fundamento) de resolução do contrato de arrendamento e consequente despejo imediato do local arrendado (vide 17º da p.i.).*Contestou o R., entre o mais alegando: - Tendo os AA. optado pela resolução extrajudicial do contrato, cabia-lhes o recurso ao procedimento especial despejo. Implicando enfermar a presente ação do vício de falta de interesse processual o que deverá determinar a absolvição do R. da instância; - A comunicação de resolução contratual não seguiu a forma válida, pelo que é ineficaz, com a consequente absolvição do R. da instância; - Estando pendente ação executiva [processo 206/18 a correr termos no Jz. Execução da Maia] onde se discute a falta de pagamento das rendas e a ausência ou não de depósito liberatório, é a mesma prejudicial em relação ao que nestes autos se discute, pelo que deverá esta ação ser suspensa até decisão da ação executiva. No mais impugnou o alegado, bem como invocou litigarem os AA. de má-fé. Termos em que concluiu nos seguintes termos: “deverá ser recebida a presente contestação, julgada procedente por provada e, por via dela: a) ser o Réu absolvido da instância por falta de interesse processual e nulidade de todo o processo e, caso assim não seja entendido, declarada a suspensão da presente instância até à decisão da ação executiva (melhor identificada supra); b) mesmo que assim não se entenda, deverá ser julgada procedente a impugnação e dada como provada a falta de fundamento da resolução do contrato de arrendamento porquanto foram provados os pagamentos das rendas respeitantes aos meses invocados pelos Autores e, consequentemente, provada a inexistência de motivo para desocupação do imóvel arrendado; c) e mesmo que tal não colha, sempre se decidirá pela não entrega imediata do imóvel porquanto o Réu padece de uma incapacidade permanente de 70%, pelo que a mesma poderá causar danos irreversíveis na vida pessoal do Réu e da sua família; d) serem os Autores julgados como litigantes de má-fé, e em consequência, condenados em multa exemplar.” Responderam os AA., concluindo pela improcedência das exceções e do pedido de condenação como litigantes de má-fé. Mais tendo pugnado pela condenação do R. como litigante de má-fé em multa e indemnização a arbitrar pelo tribunal.*Na pendência da ação deduziram ainda os AA. incidente de despejo imediato do R. atento o não pagamento ou depósito das rendas que se foram vencendo no decurso da ação. Tendo ainda invocado o caso julgado face ao decidido no processo 206/18 que correu seus termos no Jz. de Execução da Maia. Respondeu o R. pugnando pela improcedência do requerido.*Agendada audiência prévia, foi no seu âmbito proferida decisão de mérito, concluindo: “Decisão: Nestes termos, julgo procedente por provada a presente ação, pelo que, condeno o Réu a despejar o locado, deixando-o livre de pessoas e bens, procedendo à sua entrega aos Autores no estado de conservação em que se encontrava à data da celebração do contrato de arrendamento.”*Do assim decidido, apelou o R. oferecendo alegações e formulando as seguintes CONCLUSÕES: ………………….. ………………….. ………………….. *Não se mostram apresentadas contra-alegações.*O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito suspensivo. Foram colhidos os vistos legais. *** II - FACTUALIDADE PROVADA. (O tribunal a quo julgou provada a seguinte factualidade) “1. Os Autores são donos e legítimos possuidores de um imóvel destinado a habitação, sito na Rua …, …, apartamento …, . …, a que corresponde a uma fração autónoma denominada “AZ” da União de Freguesias de … (… …), concelho da Trofa, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 3743 e descrito na Conservatória do Registo Predial da … sob o n.º 1755. 2. Por contrato de arrendamento celebrado em 20 de abril de 2010, os Autores deram de arrendamento ao Réu, que tomou para si de arrendamento, o prédio urbano identificado em 1. 3. Destinado o local à sua habitação. 4. Com início em 01 de maio de 2010, pelo prazo de 5 anos. 5. Mediante o pagamento da renda mensal de €280 (duzentos e oitenta euros), a pagar no 1.º dia útil do mês anterior a que disser respeito, por transferência bancária e atualizável nos termos da lei. 6. No dia 17.12.2017, os Autores enviaram ao Réu uma carta registada com aviso de receção, por este rececionada em 21.12.2017, no qual solicitaram a liquidação das rendas em dívida relativa aos meses de maio a dezembro de 2017 e janeiro de 2018, no valor de €2.520 (dois mil e quinhentos e vinte euros). 7. Na referida carta, foi dada a possibilidade do Réu por fim à mora mediante o pagamento do montante em dívida acrescido de 50% do valor das rendas em dívida, no valor de €1.260 (mil, duzentos e sessenta euros), o que perfazia o montante global de €3.780 (três mil, setecentos e oitenta euros), destinada a afastar a resolução do contrato de arrendamento. 8. Os Autores instauraram ação executiva na qual formularam os seguintes pedidos: pedido de pagamento das rendas em atraso vencidas e as que se forem vencendo até efetiva entrega do locado e pedido de entrega do locado livre de pessoas e bens, a qual veio a ter o n.º 206/18.8T8MAI – Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo de Execução da Maia – Juiz 1. 9. O aqui Réu deduziu embargos de executado, invocando o pagamento das rendas. 10. Os Autores deduziram oposição aos embargos. 11. Por despacho proferido no âmbito da identificada execução foi decidido que a carta expedida ao Réu não constituía título executivo para a entrega do locado, servindo aquela apenas como título executivo relativamente às rendas peticionadas, determinando-se o arquivamento da execução quanto à entrega do imóvel.” Julgou ainda o tribunal a quo não provados os seguintes factos “com interesse para a decisão da causa: a) Que o Réu tenha procedido ao pagamento das rendas vencidas em maio a dezembro de 2017 e janeiro de 2018.” III- Âmbito do recurso. Delimitado como está o recurso pelas conclusões das alegações, sem prejuízo de e em relação às mesmas não estar o tribunal sujeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito nem limitado ao conhecimento das questões de que cumpra oficiosamente conhecer – vide artigos 5º n.º 3, 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3 do CPC – resulta serem as seguintes as questões a apreciar (elencadas pela ordem por que serão conhecidas em respeito pelo disposto no artigo 608º nº 2 ex vi 663º nº 2 do CPC);: 1) se a sentença recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia – vide conclusão 1; 2) erro na forma do processo - vide conclusões 3 e 4; 3) erro na aplicação do direito – vide conclusões 2 e 4. *IV- Fundamentação de direito. Perante a factualidade provada que o R. não impugnou e assim se tem como assente, cumpre apreciar as questões suscitadas no recurso, pela sua precedência lógica, nos termos do artigo 608º nº1 do CPC ex vi 663º nº 2 do CPC.*** *Assim a primeira questão a apreciar é a da invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia. Nos termos do artigo 615º nº 1 al. d) do CPC é nula a sentença que deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Sanciona este normativo, em respeito pelo princípio do pedido e do impulso processual associado ao princípio da contradição, consagrados desde logo no artigo 3º do CPC, a violação do disposto no artigo 608º nº 2 do CPC o qual dispõe que o “juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.” É portanto em função do objeto processual delineado pelo autor, conformado este pelo pedido e causa de pedir, bem como pelas questões / exceções ao mesmo opostas pelo réu que a atividade do tribunal se desenvolverá, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso. O mesmo é dizer que a pronúncia judicial deve recair “sobre a causa de pedir, o pedido, as exceções dilatórias e perentórias invocadas e os pressupostos processuais, se for controvertida a sua verificação”, sob pena de nulidade por omissão ou excesso de pronúncia. Já não sobre «os fundamentos (de facto ou direito) apresentados pelas partes para defender a sua posição, os raciocínios, argumentos, razões, considerações ou pressupostos - que, podem, na terminologia corrente, ser tidos como “questões”», mas das mesmas se distinguem, pois «é diferente “(…) deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão (…)”[1] Tendo presentes estes considerandos importa relembrar que na sua contestação invocou o R. a ineficácia da resolução contratual extrajudicial invocada pelos AA. Ineficácia da qual o R. extraiu a consequência da nulidade de todo o processo com a sua consequente absolvição da instância. Analisada a decisão recorrida constata-se que efetivamente sobre esta questão não ocorreu qualquer pronúncia. Tal omissão fere a decisão proferida de nulidade. Nulidade que todavia cumpre a este tribunal suprir em obediência à regra da substituição do tribunal recorrido consagrada no artigo 665º nº 2 do CPC. Em suma, julga-se procedente a arguida nulidade. A omissão reconhecida será infra suprida por apreciação da pretensão formulada.*Em segundo lugar cumpre conhecer do arguido uso indevido da ação comum com vista à obtenção do despejo. Alegou nesta sede o recorrente que tendo os AA. optado pela resolução extrajudicial do contrato de arrendamento, lhes está vedado o recurso à ação comum com vista à restituição do locado. Antes lhes cabendo o recurso ao PED. O tribunal a quo conheceu desta questão na perspetiva do interesse em agir – tal como inicialmente na contestação o R. a havia enquadrado – julgando a exceção invocada improcedente. Cumpre apreciar. O erro na forma do processo constitui uma nulidade – vide artigo 193º e 196º do CPC – consequência da opção pela parte de uma tramitação processual desadequada à sua pretensão. Dito de outra forma, o erro na forma do processo tem de ser aferido em função da pretensão formulada e da adequação da espécie adotada pelo requerente a tal pretensão: a “forma de processo escolhida pelo autor deve ser adequada à pretensão que deduz e deve determinar-se pelo pedido que é formulado e adjuvantemente pela causa de pedir”[2] Nos termos do disposto no artigo 546º do CPC o processo declarativo pode assumir a forma de processo comum ou especial, assumindo o processo comum natureza residual porquanto é a forma aplicável sempre que à pretensão deduzida não corresponda processo especial – vide 546º nº 2 do CPC. In casu os AA. recorreram à forma do processo comum peticionando o despejo do R. e a efetiva entrega do locado livre de pessoas e bens. Para tanto fundaram a sua pretensão no incumprimento do contrato de arrendamento que mais alegaram com o R. ter sido celebrado – por não pagamento de rendas. Não pagamento das rendas que mais alegaram ter permanecido mesmo após o envio da declaração resolutiva nos termos do artigo 1084º nº 3 do CC.. Permanecendo o R. no uso do locado. Em suma fizeram uso da forma legal prevista no artigo 14º do NRAU. Argumenta o recorrente que tendo os AA. optado pela resolução extrajudicial do contrato de arrendamento – e independentemente da validade da comunicação que a corporizou e que questiona – lhe cabia o recurso ao PED e não à ação comum. Pelos motivos que exporemos não lhe assiste razão. Na sequência da publicação do NRAU suscitaram-se dúvidas sobre a possibilidade de o senhorio recorrer à ação comum com vista a obter o despejo nos termos do artigo 14º do NRAU, nas situações em que é fundamento do mesmo a mora superior a três meses no pagamento da renda face à nova redação dada aos artigos 1083 n.º 3 e 1084º n.º 1 do C.C. em conjugação com o n.º 7 do artigo 9º do NRAU e artigo 14º do mesmo diploma. Como fundamento para estas dúvidas, foi invocada logo de início a redação dada a este artigo 14º o qual assim preceitua “1. A ação de despejo destina-se a fazer cessar a situação jurídica do arrendamento, sempre que a lei imponha o recurso à via judicial para promover tal cessação, e segue a forma de processo comum declarativo.”. Defenderam então alguns autores com eco na jurisprudência que da letra da lei resultava uma imposição de recurso à via judicial nas situações previstas no n.º 2 do artigo 1083º do CC conjugado com o n.º 1 do artigo 1084º que define ser a resolução pelo senhorio decretada nos termos da lei do processo quando tenha como fundamento uma das causas previstas no n.º 2 do dito artigo 1083º. Pelo que e a contrario resultava que a resolução extrajudicial prevista no n.º 3 do artigo 1084º (por referência ao n.º 3 do artigo 1083º) era impositiva, não dando ao senhorio a opção de recorrer à via judicial para obter o despejo. Neste sentido se pronunciou nomeadamente - embora desde logo admitindo não ser a questão líquida - Fernando B. Oliveira in “A Resolução do Contrato no Novo Regime do Arrendamento Urbano”, p. 129/130. A questão tem vindo desde a entrada em vigor deste diploma a ser discutida pela doutrina e jurisprudência, sendo agora maioritariamente defendido que o legislador não pretendeu com a redação do artigo 1084º retirar direitos ao senhorio denegando-lhe o direito de ação consagrado pelo artigo 20º do CRP e nomeadamente impedindo-o de recorrer à ação judicial, para tal invocando para além do mais o preceituado nos artigos 21º e 15º n.º 1 al. e) do NRAU. Destes artigos resulta, do 1º que o senhorio obrigatoriamente tem de recorrer à via judicial se quiser impugnar os depósitos das rendas mesmo que tenha feito a comunicação para resolução extrajudicial e do segundo que para que a comunicação sirva de título executivo tem de ser acompanhada do contrato de arrendamento. O que se revelaria num óbice nas situações em que não houvesse contrato escrito. Invocado é ainda o resultado do confronto entre os n.ºs 2 e 3 do artigo 1084º, ambos referentes a situações de resolução extrajudicial, dos quais resulta que só no 2º se fala em “quando opere por comunicação à outra parte” a permitir a conclusão de que também pode a resolução operar por via judicial, em alternativa à via extrajudicial. Sobre a “mens legislatoris” e no mesmo sentido, foi desde logo afirmado no Ac. RP de 20/04/2009 in http://www.dgsi.pt/jtrp ser o que também decorre da Exposição de Motivos da Proposta de Lei do Arrendamento Urbano nº 34/X - ponto 2 «intitulado “A agilização processual” (em particular o último parágrafo do Ponto 2 da Exposição de Motivos» e do qual se extrai «nos casos de cessação por resolução com base em mora no pagamento da renda superior a 3 meses, ou devido a oposição do arrendatário à realização de obra … se o senhorio proceder à notificação judicial avulsa do arrendatário e este mantiver a sua conduta inadimplente, permite-se a formação de título executivo extrajudicial - ou o parágrafo constante do Ponto 1, com o seguinte teor “O regime jurídico manterá a sua imperatividade em sede de cessação do contrato de arrendamento, mas abre-se a hipótese à resolução extrajudicial do contrato, com base em incumprimento que, pela sua gravidade, ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento”), evidencia que se pretendeu apenas permitir/facultar a formação de título executivo extrajudicial, possibilitando ao senhorio o recurso imediato à ação executiva, mas não impor-lhe esta via». Subentende-se desta exposição de motivos a intenção de conferir ao senhorio um recurso adicional ao exercício dos seus direitos e não uma intenção restritiva, por via da exclusão ao recurso da ação comum. Na mesma linha, são ainda invocados no Ac. que vimos de citar adicionais argumentos «a favor da possibilidade de recurso à ação de despejo, mesmo no caso de mora no pagamento da renda com duração superior a três meses, por Laurinda Gemas, Albertina Pedroso e João Caldeira Jorge[1] e por Gravato Morais[2]” (in Arrendamento Urbano, Novo Regime Anotado e Legislação Complementar, 2ª ed., págs. 324 e segs. e “Novo Regime do Arrendamento Comercial, págs. 104 e 105 respetivamente)» dos quais reproduziremos os que para o caso se mantêm pertinentes atentas as alterações legislativas posteriores: “- evitar o “compasso de espera” de 3 meses de duração da mora para o senhorio poder efetuar a comunicação destinada à resolução extrajudicial do contrato; - evitar um novo “compasso de espera” de mais 3 meses[3], subsequentes à comunicação do senhorio, para eventual purgação da mora, conforme previsto no art.º 1084º, nº3, do CC, e para a exigibilidade da desocupação do locado nos termos do art.º 1087º do CC (já que na ação de despejo pode decretar-se o despejo imediato); - evitar as vicissitudes e dificuldades inerentes à notificação avulsa ou contacto pessoal exigidos pela lei para efetivar a resolução extrajudicial, em especial nos casos em que o paradeiro do arrendatário é desconhecido[4]; (…) - obviar a uma eventual responsabilização nos termos do art.º 930º-E[5], do CPC, norma cujo campo de aplicação se circunscreve à execução fundada em título extrajudicial; - cumular o pedido de resolução com o de indemnização ou rendas, ou com o de denúncia, quando esta tenha de operar pela via judicial (art.º 1086º do CC) ou cumular vários fundamentos de resolução, evitando assim que o litígio sobre a resolução do contrato seja tratado em dois processos distintos, ou seja, na ação de despejo e na oposição à execução; - permitir ao arrendatário que deduza logo pedido reconvencional, em especial com fundamento em benfeitorias, evitando que a discussão dessa matéria seja relegada para a oposição à execução; - forçar a uma purgação da mora mais célere (até ao termo do prazo para a contestação), esgotando-se o recurso a essa faculdade, já que apenas pode ser usada uma única vez na fase judicial (art.º 1048º, nºs 1 e 2 do CC); - lançar mão do incidente de despejo imediato previsto no art.º 14º, nºs 4 e 5, do NRAU.» A intenção de reforçar os meios ao alcance do senhorio foi reiterada na exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 38/XII, que esteve na origem da Lei n.º 31/2012, através da qual e tendo sido retirada força de título executivo à comunicação da resolução do contrato, foi criado o PED. Exposição de motivos na qual se afirma: “A reforma do regime do arrendamento urbano que agora se propõe procura encontrar soluções simples, assentes em quatro dimensões essenciais: (i) alteração ao regime substantivo, vertido no Código Civil; (ii) revisão do sistema de transição dos contratos antigos para o novo regime; (iii) agilização do procedimento de despejo; e (iv) melhoria do enquadramento fiscal. (…) No que respeita ao regime processual, reconhece-se a necessidade e a premência de reforçar os mecanismos que garantam aos senhorios meios para reagir perante o incumprimento do contrato, assim tornando o mercado de arrendamento e o investimento na reabilitação urbana para colocação no mercado de arrendamento uma verdadeira opção para os proprietários e, mais relevantemente ainda, uma opção segura. Esta medida, concretizada mediante a agilização do procedimento de despejo, é fundamental para recuperar a confiança dos proprietários. Até à presente data, o senhorio tinha de recorrer a um processo de despejo apresentado junto de um tribunal. Mesmo dispondo de um título executivo nos termos previstos na Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, verificou-se que o tempo médio de duração da correspondente ação executiva é ainda de dezasseis meses. Tal longa espera, muitas vezes acompanhada pelo não recebimento das rendas, revelou ser um motivo de desincentivo para a colocação de imóveis no mercado do arrendamento pelos proprietários, ou ainda para a elevação do valor da renda como forma de controlo do risco. Para tornar o arrendamento num contrato mais seguro e com mecanismos que permitam reagir com eficácia ao incumprimento, é criado um novo procedimento extrajudicial que permite que a desocupação do imóvel seja realizada de forma célere e eficaz, num prazo médio estimado de três meses, no caso de incumprimento do contrato por parte do arrendatário. Promove-se, por esta via, a confiança do senhorio no funcionamento ágil do mercado de arrendamento e o investimento neste sector da economia.” Do exposto resulta em nossa opinião como acertado o entendimento de que ao senhorio não foi vedado o recurso à via judicial para obter o despejo por resolução contratual com fundamento no não pagamento das rendas por mora superior a 3 meses. Neste sentido cfr. também in http://www.dgsi.pt: - Ac. STJ de 06/05/2010 nº de processo 438/08.5YXLSB.LS.S1 e mais recentemente Ac. STJ de 14/09/2021, nº de processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/202720" target="_blank">407/19.0T8ENT.E1</a>.S1 pronunciando-se expressamente sobre a alternatividade de qualquer um dos meios ao dispor do senhorio “a ação judicial de despejo ou do procedimento especial de despejo.”; - Ac. RP 26/02/08 nº de processo 0820751; Ac. RP de 19/02/2009, nº de processo 459/08.8TJVNF; Ac. RP de 17/10/2013, nº de processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/140021" target="_blank">2541/11.5TBOAZ.P1</a> de cujo sumário consta “Embora o senhorio tenha ambas as possibilidades ao seu dispor, optando pela via judicial deve ser-lhe reconhecido interesse em agir”; Ac. RP de 06/05/2014, nº de processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/139282" target="_blank">747/13.1TBPVZ.P1</a>; Ac. RP de 26/03/2019 nº de processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/135019" target="_blank">1208/17.5T8MTS.P1</a>; Ac. RP de 19/05/2020, nº de processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/133938" target="_blank">1918/18.0T8PVZ.P1</a>; - Ac. RLx. de 17/04/2008, nº de processo 2308/08-2; Ac. RLx. de 31/03/09, nº de processo 2150/08.6TBBRR.L1-7; Ac. RLx. de 28/05/2009, nº de processo 3896/07-2 e Ac. R.Lx de 11/12/2018 nº de processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/104607" target="_blank">10901/17.1T8LSB.L1-2</a> (este último com vasta referência a doutrina, bem como jurisprudência). Em conclusão, não está vedado o recurso à via judicial quando em causa esteja a cessação do contrato de arrendamento com fundamento na mora do pagamento de rendas por período superior a 3 meses. Apresentando-se o recurso ao PED, sustentado entre o mais na comunicação extrajudicial de resolução prevista no artigo 1084º nº 2, num meio alternativo à ação comum de despejo. O facto de no caso dos autos os AA. terem alegadamente enviado comunicação extrajudicial para resolução do contrato nos termos do artigo 1084º nº 3 do CC. ao R., não altera os dados da equação. A comunicação efetuada não constitui título executivo, como aliás os AA. viram já ser decidido no processo executivo que previamente intentaram contra o R., nos termos que alegaram e não mereceu impugnação do R.. A obtenção do despejo pretendido pelos AA. sempre estaria dependente do recurso ao PED, ou em alternativa do recurso à ação comum. Tendo sido esta última a opção seguida pelos AA.. Opção que os AA. justificaram atenta a oposição deduzida pelo R. nos embargos, nomeadamente a invocação por este de que a comunicação extrajudicial é ineficaz por não observância dos formalismos legais impostos pelo artigo 9º nº 7 do NRAU. Os AA., certamente cientes das objeções levantadas e que já tinham sido contra si suscitadas na oposição à execução que o R. deduziu no âmbito do processo 206/18, optaram por diretamente instaurar ação de despejo contra o R. invocando tal contexto, aliado à manutenção da ocupação do locado e à manutenção da falta de pagamento das rendas, reiterando esta como fundamento de resolução contratual e consequentemente peticionando o despejo. Assegurando assim a resolução definitiva da questão, salvaguardando entendimento diverso quanto à regularidade da comunicação por si efetuada[6]. O recurso à ação comum mostra-se neste contexto justificado. A questão da não indicação no pedido final da declaração de resolução contratual é questão que será apreciada em sede de mérito do recurso pois apenas relevará para a procedência ou não da pretensão dos AA.. Tal como será esse o momento oportuno para apreciar da alegada ineficácia da resolução extrajudicial e da sua relevância para o mérito dos autos – assim se suprindo a omissão já supra reconhecida. Estas questões não são contudo óbice a que o senhorio opte, no contexto já supra justificado, por intentar ação declarativa comum como o fez, recorrendo à forma de processo correta em função da pretensão por si formulada de acordo com o objeto processual delineado na p.i.. Sendo manifesto o seu interesse em agir - tal como decidido pelo tribunal a quo - em função do por si alegado não pagamento das rendas por parte do R. de quem alegaram ser senhorios, usando o meio processual adequado – a ação declarativa comum. Em conclusão, improcedem os argumentos do recorrente quer quanto à forma do processo utilizada que se julga adequada, quer quanto ao interesse em agir dos AA. afirmado pelo tribunal a quo e cujo entendimento nenhuma censura merece, pelo que se mantém o decidido por este também nesta sede.*Cumpre finalmente apreciar se ocorreu erro na apreciação do direito. Sendo agora o momento oportuno para apreciar a questão da invocada ineficácia da resolução extrajudicial e relevância desta mesma questão para os autos. Assim se suprindo a omissão de pronúncia já assinalada. No mais se apreciando ainda a questão do pedido formulado pelos AA. e se o mesmo exclui o conhecimento da resolução contratual que é pressuposto do decidido despejo, ou antes e por via interpretativa do articulado dos AA. – para tanto recorrendo à denominada teoria da impressão do destinatário, aplicável também ao alegado pelas partes nos respetivos articulados processuais[7], de acordo com a qual a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal colocado na posição real do declaratário deduz do comportamento do declarante (consagrada no artigo 236º do CC) - está implícito no pedido formulado em função do alegado. Recorda-se que a factualidade provada não foi impugnada e como tal tem-se por definitivamente assente entre as partes. Nos termos do artigo 14º nº 1 do NRAU “A ação de despejo destina-se a fazer cessar a situação jurídica do arrendamento sempre que a lei imponha o recurso à via judicial para promover tal cessação e segue a forma de processo comum declarativo.” O mesmo é dizer que a ação de despejo, ou seja, a ação em que se peticiona o despejo do locado para sua entrega livre de pessoas e bens ao senhorio, tem sempre e necessariamente como pressuposto a cessação da relação contratual entre as partes. In casu, tal cessação tem como invocado fundamento o não pagamento das rendas e esta situação de incumprimento contratual confere ao senhorio o direito de resolver o contrato. O despejo é na verdade “a pretensão que corresponde à resolução, caducidade ou denúncia do contrato de arrendamento (…)”.[8] A resolução contratual é admitida quando fundada na lei ou em convenção das partes – artigo 432º n.º 1 do CC. Entre outros fundamentos está e para o que ora releva, o direito à resolução consagrado legalmente para o caso de incumprimento contratual fundado no não pagamento das rendas por período superior a 3 meses, operando por comunicação à contraparte com fundamento na mencionada falta de pagamento da renda por período igual ou superior a 3 meses [cfr. artigos 1083º nº 3 e 1084º nº 3 do CC]. Alega o recorrente que os AA. não peticionaram a resolução contratual e que como tal a ação está condenada à improcedência por o peticionado despejo estar dependente da prévia resolução contratual. É correta a precedência alegada, tal como já o afirmámos. Já não a alegada inexistente pretensão de declaração resolutiva. Tendo presente que o objeto processual é conformado pelo pedido e causa de pedir delineados na p.i., relembram-se os termos em que os AA. delinearam o objeto da presente ação de acordo com o pelos mesmos alegado na p.i.: - no seu artigo 7º que o R. não pagou as rendas de maio a dezembro de 2017 e janeiro de 2018 tendo por tal facto interpelado o mesmo ao pagamento por missiva de 17/12/2017 rececionada a 21/12/2017; - que nessa missiva comunicaram ao R. a possibilidade de pôr fim à mora nos termos do artigo 1084º nº 3 do CC com vista a afastar a resolução contratual (vide artigo 8º); - que intentaram ação executiva na qual pugnavam pela entrega do locado, tendo ali sido decidido que a carta enviada não configurava título executivo; - que o R. continua sem proceder ao pagamento das rendas e a ocupar o imóvel. Face ao que se viram obrigados a intentar a presente ação (vide artigo 15º da p.i.). O assim alegado visou justificar a instauração desta ação. Prosseguindo na sua alegação, afirmam os autores que face à operada resolução do contrato de arrendamento – reportando-se à comunicação de 17/12/2017 - peticionam nos autos a entrega imediata do locado (16º da p.i.). Mas mais alegam que a falta de pagamento é motivo de resolução contratual e consequente despejo imediato. Sendo “fundamento do despejo do local arrendado” o alegado e assim assistindo o direito aos AA. de exigirem a entrega imediata do arrendado, direito que assim exercem (vide o alegado de 17º a 19º da p.i.). Temos portanto alegado como causa de pedir o não pagamento das rendas por período superior a 3 meses. Não pagamento este fundamento de resolução contratual, tal como expressamente afirmado pelos AA. com vista ao peticionado despejo. A resolução contratual consiste numa manifestação de vontade - mediante declaração à outra parte, por um dos contraentes que pretende fazer regressar as partes à situação em que se encontrariam caso o contrato não tivesse sido celebrado. "A resolução opera-se por meio de declaração unilateral recetícia do credor, art.º 436º do C.C., que se torna irrevogável, logo que chega ao poder do devedor ou dele é conhecida.”[9] Não há dúvidas que os AA. pretendem o reconhecimento da resolução do contrato entre as partes celebrado. Resolução que invocam ter operado pela comunicação de 2017. Mas que na p.i. reiteraram. Salvaguardando assim a hipótese de não ser considerada válida a comunicação de 2017. E nesta ação convocaram os AA. a declaração resolutiva manifestada em 2017 que reafirmaram com a instauração da ação, invocando desde então a manutenção da falta de pagamento das rendas, bem como a ocupação do locado, fundamento resolutivo legitimador do despejo peticionado e que aquela resolução pressupõe. Ao tribunal cabe, em função do pedido formulado, do alegado e apurado, interpretar e aplicar o direito[10]. Ora, sempre por via desta ação deram os AA. a conhecer ao R. com a sua citação para os autos a sua vontade de resolver o contrato – reiterando o que antes já haviam comunicado em 17/12/2017. Vontade resolutiva fundamentada na falta de pagamento de rendas e que é premissa necessária do despejo imediato peticionado. Qualquer declaratário normal colocado na posição do R. interpretaria o alegado pelos AA. na sua p.i. (vide em concreto artigos 17º e 18º) como uma declaração resolutiva do contrato de arrendamento, temporalmente situada num primeiro momento na comunicação de 2017 e reiterada no presente pela manutenção do quadro factual que a justifica, tal como o alegam. E que tal foi assim entendido pelo R. é o que o demonstra a sua defesa aduzida em sede de contestação, ao alegar que a declaração resolutiva de 2017 é ineficaz por não observância dos formalismos legais (vide pontos 4 a 12 da contestação). E ao mais alegar em sede de impugnação que os AA. fundam a resolução do contrato na falta de pagamento das rendas dos meses de maio a dezembro de 2017 e janeiro de 2018 e que inexiste fundamento para tal resolução porque sempre pagou – pugnando seja julgada “procedente a impugnação e dada como provada a falta de fundamento da resolução do contrato de arrendamento” – o R. de novo reconhece a pretensão resolutiva manifestada pelos AA.. Porque a declaração resolutiva uma vez recebida produz os seus efeitos, analisemos então a regularidade da declaração de 2017. Não há dúvidas – porque tal está provado e não foi impugnado – que os AA. enviaram ao R. em 2017 uma carta registada com AR por este rececionada em 21/12/2017 a solicitar o pagamento das rendas em dívida. Mais dando a possibilidade de pôr fim à mora como meio de afastar a resolução contratual . Resolução contratual que expressamente ali declararam – tal como consta da carta enviada e cuja cópia se mostra junta a fls. 10 dos autos. Tal comunicação enviada para o local arrendado foi pelo próprio R. recebida tal como consta do AR junto a fls. 9 verso. Em suma inexistem dúvidas de que a mesma chegou ao conhecimento do R., habilitando-o a exercer os seus direitos de acordo com o por si tido como mais oportuno. Alega o recorrente que esta comunicação, não obstante por si recebida não é eficaz já que não foi entre as partes convencionado domicílio para efeitos de comunicação entre as partes e que como tal não podiam os AA. ter feito uso da faculdade prevista na al. c) do nº 7 do artigo 9º do NRAU. Afigura-se-nos não assistir razão ao recorrente. Na falta de domicílio convencionado a que se reporta a al. c) do nº 7 do artigo 9º do NRAU – elemento contratual que aliás apenas passou a figurar como mero conteúdo eventual do contrato com a introdução da alteração prevista pelo DL 266-C/2012 de 31/12 ao artigo 3º nº 1 al. g) do DL 160/2006 de 08/08 quer aprovou os elementos do contrato de arrendamento e os requisitos a que obedece a sua elaboração – é de aplicar a regra dos nºs 1 e 2 do artigo 9º do NRAU à comunicação do senhorio para resolução do contrato nos termos do nº 2 do artigo 1084º do CC, sendo válida a comunicação por carta registada com AR dirigida ao arrendatário para o local arrendado que seja rececionada por este, por força do disposto no artigo 10º do NRAU que regula as vicissitudes das comunicações[11]. O formalismo especial previsto neste nº 7 visa a nosso ver conferir às partes uma acrescida garantia do efetivo conhecimento e prova das comunicações entre as mesmas trocadas, quando em causa está a comunicação de resolução contratual com fundamento na mora no pagamento das rendas pelas consequências à mesma inerentes. Esta garantia está de igual forma assegurada quando a comunicação é enviada – na ausência de cláusula contratual em contrário - para o local arrendado e recebida pela contraparte contratual/inquilino. Concluímos portanto ter a comunicação enviada pelos AA. ao R. operado de forma regular os seus efeitos, nomeadamente operando pela sua receção a resolução contratual. Operada a resolução contratual e não tendo o R. provado – como lhe incumbia – o pagamento das rendas vencidas entre maio e dezembro de 2017 [cfr. al. a) dos factos não provados] resta concluir pela procedência do peticionado despejo como consequência da operada resolução contratual em 2017. Ainda que assim se não entendesse, porquanto sempre a intenção resolutiva é uma realidade processual nos autos reiterada, nos termos que acima já expusemos, então também por esta via seria de concluir nos mesmos termos. O depósito liberatório no prazo de um mês previsto no artigo 1084º nº 3 do CC não se mostra efetuado nos autos – sendo que ao R. incumbia igualmente o ónus de provar tal realidade. Termos em que se tem de concluir pela total improcedência do recurso interposto.*** V. Decisão. Pelo exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em julgar totalmente improcedente o recurso interposto pelo R. consequentemente se mantendo a decisão recorrida. Custas do recurso pelo recorrente. Porto, 2021-10-28 Fátima Andrade Eugénia Cunha Fernanda Almeida ________________________________________________ [1] Citando ALBERTO DOS REIS, “Código de Processo Civil Anotado”, Volume V, Reimpressão, Coimbra Editora, pág. 143 e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Janeiro de 2000, B.M.J. n.º 493, pág. 387, vide Ac. STJ de 08/01/2015, Relator João Trindade in www.dgsi.pt/jstj. [2] Cfr. António Abrantes Geraldes in “Temas da Reforma do Processo Civil, I Vol. 2ª ed. revista e ampliada, edição Almedina, p. 280. [3] Hoje um mês por via da alteração introduzida no artigo 1084º nº 3 pela Lei 31/2012 de 14/08 [4] Na atual redação introduzida pela Lei 79/2014 de 19/12 no artigo 7º al. c), também evitar as mesas dificuldades e vicissitudes inerentes à notificação por escrito assinado pelo senhorio nos termos previstos em tal al.c). [5] Hoje com correspondência ao artigo 15º R do NRAU no âmbito do PED. [6] Cfr. Ac. TRL de 11/12/2018, nº de processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/104607" target="_blank">10901/17.1T8LSB.L1-2</a> in www.dgsi.pt onde se analisa paralela situação em que não obstante o senhorio ter optado pela cessação extrajudicial do contrato de arrendamento, por falta de pagamento de rendas, se entendeu poder subsequentemente instaurar ação judicial para efetivação dos direitos do senhorio, em detrimento da instauração de procedimento especial de despejo com base em dificuldades invocadas pelo senhorio. [7] Cfr. neste sentido Ac. TRP de 10/11/2020, nº de processo <a href="https://acordao.pt/decisoes/133546" target="_blank">358/19.8T8VNG.P1</a> in www.dgsi.pt [8] Antunes Varela ; J. M. Bezerra e Sampaio e Nora in Manual de Processo Civil, 2ª edição revista e atualizada, p. 463. [9] Cfr. neste sentido, A. Varela in Das Obrigações Em Geral, vol. II, p. 103. [10] Cfr. Ac. TRL de 20/05/2008 nº de processo 7388/2007-1, onde em situação similar se defendeu o “despejo é a consequência jurídica e prática da cessação do contrato de arrendamento. A averiguação em torno do contrato de arrendamento, quer no sentido de continuar a vigorar, quer no sentido de se resolver pela verificação do fundamento invocado, é um trabalho lógico, jurídico, técnico, do jurista- na bipartição entre facto e direito, é direito. E da indagação, interpretação e aplicação do direito conhece o tribunal – artigo 664º do C.P.C. (…) Não é necessário pedir autonomamente que se decrete a resolução do contrato, porque, embora possível, e tecnicamente certo, esse pedido sem o de despejo, tornar-se-ia inócuo. O que interessa à parte é o despejo e a entrega do locado livre de pessoas e bens. Formulou esse pedido. O mais é direito, cabendo ao tribunal indagar do mesmo, interpretá-lo e aplicá-lo.” [11] Jorge Pinto Furtado in “Comentário ao Regime do Arrendamento Urbano”, 2ª edição revista e atualizada, em anotação ao artigo 1084º , nota 3 p. 560 a 563, expressa o entendimento de na falta de domicílio convencionado ser facultado ao senhorio o envio da comunicação fundada na falta de pagamento de rendas para o prédio arrendado nos termos gerais do nº 2 do artigo 9º do NRAU. No mesmo sentido José A. França Pitão e Gustavo França Pitão in “Arrendamento Urbano Anotado”, edição de 2017, em anotação ao artigo 9º do NRAU p. 21/22
Processo nº. 257/19.3T8STS.P1 3ª Secção Cível Relatora – Juíza Desembargadora M. Fátima Andrade Adjunta - Juíza Desembargadora Eugénia Cunha Adjunta - Juíza Desembargadora Fernanda Almeida Tribunal de Origem do Recurso – T J Comarca do Porto – Jz. Local Cível de Santo Tirso Apelante/ B…. Apelados/ C… e outro Sumário (artigo 663º nº 7 do CPC): ………………….. ………………….. ………………….. Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto I- Relatório C… e marido D… instauraram a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra B…, peticionando pela procedência da ação que seja decretado “o despejo imediato do local arrendado, sendo o Réu condenado a deixá-lo livre de pessoas e bens e, no estado de conservação em que se encontrava à data da celebração do contrato de arrendamento atrás identificado”. Para tanto e em suma alegaram: - a celebração do contrato de arrendamento da fração descrita na p.i. e o seu incumprimento, por não pagamento pontual das rendas acordadas – nomeadamente as rendas relativas aos meses de maio a dezembro de 2017 e janeiro de 2018 - fundamento de resolução do contrato já operada por missiva enviada ao R. em 17/12/2017 nos termos do artigo 1084º nº 3 do CC; - a manutenção da ocupação do locado e não pagamento das rendas; - a falta de pagamento da renda em tempo e lugar próprios ou a ausência de depósito liberatório é (fundamento) de resolução do contrato de arrendamento e consequente despejo imediato do local arrendado (vide 17º da p.i.).*Contestou o R., entre o mais alegando: - Tendo os AA. optado pela resolução extrajudicial do contrato, cabia-lhes o recurso ao procedimento especial despejo. Implicando enfermar a presente ação do vício de falta de interesse processual o que deverá determinar a absolvição do R. da instância; - A comunicação de resolução contratual não seguiu a forma válida, pelo que é ineficaz, com a consequente absolvição do R. da instância; - Estando pendente ação executiva [processo 206/18 a correr termos no Jz. Execução da Maia] onde se discute a falta de pagamento das rendas e a ausência ou não de depósito liberatório, é a mesma prejudicial em relação ao que nestes autos se discute, pelo que deverá esta ação ser suspensa até decisão da ação executiva. No mais impugnou o alegado, bem como invocou litigarem os AA. de má-fé. Termos em que concluiu nos seguintes termos: “deverá ser recebida a presente contestação, julgada procedente por provada e, por via dela: a) ser o Réu absolvido da instância por falta de interesse processual e nulidade de todo o processo e, caso assim não seja entendido, declarada a suspensão da presente instância até à decisão da ação executiva (melhor identificada supra); b) mesmo que assim não se entenda, deverá ser julgada procedente a impugnação e dada como provada a falta de fundamento da resolução do contrato de arrendamento porquanto foram provados os pagamentos das rendas respeitantes aos meses invocados pelos Autores e, consequentemente, provada a inexistência de motivo para desocupação do imóvel arrendado; c) e mesmo que tal não colha, sempre se decidirá pela não entrega imediata do imóvel porquanto o Réu padece de uma incapacidade permanente de 70%, pelo que a mesma poderá causar danos irreversíveis na vida pessoal do Réu e da sua família; d) serem os Autores julgados como litigantes de má-fé, e em consequência, condenados em multa exemplar.” Responderam os AA., concluindo pela improcedência das exceções e do pedido de condenação como litigantes de má-fé. Mais tendo pugnado pela condenação do R. como litigante de má-fé em multa e indemnização a arbitrar pelo tribunal.*Na pendência da ação deduziram ainda os AA. incidente de despejo imediato do R. atento o não pagamento ou depósito das rendas que se foram vencendo no decurso da ação. Tendo ainda invocado o caso julgado face ao decidido no processo 206/18 que correu seus termos no Jz. de Execução da Maia. Respondeu o R. pugnando pela improcedência do requerido.*Agendada audiência prévia, foi no seu âmbito proferida decisão de mérito, concluindo: “Decisão: Nestes termos, julgo procedente por provada a presente ação, pelo que, condeno o Réu a despejar o locado, deixando-o livre de pessoas e bens, procedendo à sua entrega aos Autores no estado de conservação em que se encontrava à data da celebração do contrato de arrendamento.”*Do assim decidido, apelou o R. oferecendo alegações e formulando as seguintes CONCLUSÕES: ………………….. ………………….. ………………….. *Não se mostram apresentadas contra-alegações.*O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito suspensivo. Foram colhidos os vistos legais. *** II - FACTUALIDADE PROVADA. (O tribunal a quo julgou provada a seguinte factualidade) “1. Os Autores são donos e legítimos possuidores de um imóvel destinado a habitação, sito na Rua …, …, apartamento …, . …, a que corresponde a uma fração autónoma denominada “AZ” da União de Freguesias de … (… …), concelho da Trofa, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 3743 e descrito na Conservatória do Registo Predial da … sob o n.º 1755. 2. Por contrato de arrendamento celebrado em 20 de abril de 2010, os Autores deram de arrendamento ao Réu, que tomou para si de arrendamento, o prédio urbano identificado em 1. 3. Destinado o local à sua habitação. 4. Com início em 01 de maio de 2010, pelo prazo de 5 anos. 5. Mediante o pagamento da renda mensal de €280 (duzentos e oitenta euros), a pagar no 1.º dia útil do mês anterior a que disser respeito, por transferência bancária e atualizável nos termos da lei. 6. No dia 17.12.2017, os Autores enviaram ao Réu uma carta registada com aviso de receção, por este rececionada em 21.12.2017, no qual solicitaram a liquidação das rendas em dívida relativa aos meses de maio a dezembro de 2017 e janeiro de 2018, no valor de €2.520 (dois mil e quinhentos e vinte euros). 7. Na referida carta, foi dada a possibilidade do Réu por fim à mora mediante o pagamento do montante em dívida acrescido de 50% do valor das rendas em dívida, no valor de €1.260 (mil, duzentos e sessenta euros), o que perfazia o montante global de €3.780 (três mil, setecentos e oitenta euros), destinada a afastar a resolução do contrato de arrendamento. 8. Os Autores instauraram ação executiva na qual formularam os seguintes pedidos: pedido de pagamento das rendas em atraso vencidas e as que se forem vencendo até efetiva entrega do locado e pedido de entrega do locado livre de pessoas e bens, a qual veio a ter o n.º 206/18.8T8MAI – Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo de Execução da Maia – Juiz 1. 9. O aqui Réu deduziu embargos de executado, invocando o pagamento das rendas. 10. Os Autores deduziram oposição aos embargos. 11. Por despacho proferido no âmbito da identificada execução foi decidido que a carta expedida ao Réu não constituía título executivo para a entrega do locado, servindo aquela apenas como título executivo relativamente às rendas peticionadas, determinando-se o arquivamento da execução quanto à entrega do imóvel.” Julgou ainda o tribunal a quo não provados os seguintes factos “com interesse para a decisão da causa: a) Que o Réu tenha procedido ao pagamento das rendas vencidas em maio a dezembro de 2017 e janeiro de 2018.” III- Âmbito do recurso. Delimitado como está o recurso pelas conclusões das alegações, sem prejuízo de e em relação às mesmas não estar o tribunal sujeito à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito nem limitado ao conhecimento das questões de que cumpra oficiosamente conhecer – vide artigos 5º n.º 3, 608º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4 e 639º n.ºs 1 e 3 do CPC – resulta serem as seguintes as questões a apreciar (elencadas pela ordem por que serão conhecidas em respeito pelo disposto no artigo 608º nº 2 ex vi 663º nº 2 do CPC);: 1) se a sentença recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia – vide conclusão 1; 2) erro na forma do processo - vide conclusões 3 e 4; 3) erro na aplicação do direito – vide conclusões 2 e 4. *IV- Fundamentação de direito. Perante a factualidade provada que o R. não impugnou e assim se tem como assente, cumpre apreciar as questões suscitadas no recurso, pela sua precedência lógica, nos termos do artigo 608º nº1 do CPC ex vi 663º nº 2 do CPC.*** *Assim a primeira questão a apreciar é a da invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia. Nos termos do artigo 615º nº 1 al. d) do CPC é nula a sentença que deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Sanciona este normativo, em respeito pelo princípio do pedido e do impulso processual associado ao princípio da contradição, consagrados desde logo no artigo 3º do CPC, a violação do disposto no artigo 608º nº 2 do CPC o qual dispõe que o “juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.” É portanto em função do objeto processual delineado pelo autor, conformado este pelo pedido e causa de pedir, bem como pelas questões / exceções ao mesmo opostas pelo réu que a atividade do tribunal se desenvolverá, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso. O mesmo é dizer que a pronúncia judicial deve recair “sobre a causa de pedir, o pedido, as exceções dilatórias e perentórias invocadas e os pressupostos processuais, se for controvertida a sua verificação”, sob pena de nulidade por omissão ou excesso de pronúncia. Já não sobre «os fundamentos (de facto ou direito) apresentados pelas partes para defender a sua posição, os raciocínios, argumentos, razões, considerações ou pressupostos - que, podem, na terminologia corrente, ser tidos como “questões”», mas das mesmas se distinguem, pois «é diferente “(…) deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão (…)”[1] Tendo presentes estes considerandos importa relembrar que na sua contestação invocou o R. a ineficácia da resolução contratual extrajudicial invocada pelos AA. Ineficácia da qual o R. extraiu a consequência da nulidade de todo o processo com a sua consequente absolvição da instância. Analisada a decisão recorrida constata-se que efetivamente sobre esta questão não ocorreu qualquer pronúncia. Tal omissão fere a decisão proferida de nulidade. Nulidade que todavia cumpre a este tribunal suprir em obediência à regra da substituição do tribunal recorrido consagrada no artigo 665º nº 2 do CPC. Em suma, julga-se procedente a arguida nulidade. A omissão reconhecida será infra suprida por apreciação da pretensão formulada.*Em segundo lugar cumpre conhecer do arguido uso indevido da ação comum com vista à obtenção do despejo. Alegou nesta sede o recorrente que tendo os AA. optado pela resolução extrajudicial do contrato de arrendamento, lhes está vedado o recurso à ação comum com vista à restituição do locado. Antes lhes cabendo o recurso ao PED. O tribunal a quo conheceu desta questão na perspetiva do interesse em agir – tal como inicialmente na contestação o R. a havia enquadrado – julgando a exceção invocada improcedente. Cumpre apreciar. O erro na forma do processo constitui uma nulidade – vide artigo 193º e 196º do CPC – consequência da opção pela parte de uma tramitação processual desadequada à sua pretensão. Dito de outra forma, o erro na forma do processo tem de ser aferido em função da pretensão formulada e da adequação da espécie adotada pelo requerente a tal pretensão: a “forma de processo escolhida pelo autor deve ser adequada à pretensão que deduz e deve determinar-se pelo pedido que é formulado e adjuvantemente pela causa de pedir”[2] Nos termos do disposto no artigo 546º do CPC o processo declarativo pode assumir a forma de processo comum ou especial, assumindo o processo comum natureza residual porquanto é a forma aplicável sempre que à pretensão deduzida não corresponda processo especial – vide 546º nº 2 do CPC. In casu os AA. recorreram à forma do processo comum peticionando o despejo do R. e a efetiva entrega do locado livre de pessoas e bens. Para tanto fundaram a sua pretensão no incumprimento do contrato de arrendamento que mais alegaram com o R. ter sido celebrado – por não pagamento de rendas. Não pagamento das rendas que mais alegaram ter permanecido mesmo após o envio da declaração resolutiva nos termos do artigo 1084º nº 3 do CC.. Permanecendo o R. no uso do locado. Em suma fizeram uso da forma legal prevista no artigo 14º do NRAU. Argumenta o recorrente que tendo os AA. optado pela resolução extrajudicial do contrato de arrendamento – e independentemente da validade da comunicação que a corporizou e que questiona – lhe cabia o recurso ao PED e não à ação comum. Pelos motivos que exporemos não lhe assiste razão. Na sequência da publicação do NRAU suscitaram-se dúvidas sobre a possibilidade de o senhorio recorrer à ação comum com vista a obter o despejo nos termos do artigo 14º do NRAU, nas situações em que é fundamento do mesmo a mora superior a três meses no pagamento da renda face à nova redação dada aos artigos 1083 n.º 3 e 1084º n.º 1 do C.C. em conjugação com o n.º 7 do artigo 9º do NRAU e artigo 14º do mesmo diploma. Como fundamento para estas dúvidas, foi invocada logo de início a redação dada a este artigo 14º o qual assim preceitua “1. A ação de despejo destina-se a fazer cessar a situação jurídica do arrendamento, sempre que a lei imponha o recurso à via judicial para promover tal cessação, e segue a forma de processo comum declarativo.”. Defenderam então alguns autores com eco na jurisprudência que da letra da lei resultava uma imposição de recurso à via judicial nas situações previstas no n.º 2 do artigo 1083º do CC conjugado com o n.º 1 do artigo 1084º que define ser a resolução pelo senhorio decretada nos termos da lei do processo quando tenha como fundamento uma das causas previstas no n.º 2 do dito artigo 1083º. Pelo que e a contrario resultava que a resolução extrajudicial prevista no n.º 3 do artigo 1084º (por referência ao n.º 3 do artigo 1083º) era impositiva, não dando ao senhorio a opção de recorrer à via judicial para obter o despejo. Neste sentido se pronunciou nomeadamente - embora desde logo admitindo não ser a questão líquida - Fernando B. Oliveira in “A Resolução do Contrato no Novo Regime do Arrendamento Urbano”, p. 129/130. A questão tem vindo desde a entrada em vigor deste diploma a ser discutida pela doutrina e jurisprudência, sendo agora maioritariamente defendido que o legislador não pretendeu com a redação do artigo 1084º retirar direitos ao senhorio denegando-lhe o direito de ação consagrado pelo artigo 20º do CRP e nomeadamente impedindo-o de recorrer à ação judicial, para tal invocando para além do mais o preceituado nos artigos 21º e 15º n.º 1 al. e) do NRAU. Destes artigos resulta, do 1º que o senhorio obrigatoriamente tem de recorrer à via judicial se quiser impugnar os depósitos das rendas mesmo que tenha feito a comunicação para resolução extrajudicial e do segundo que para que a comunicação sirva de título executivo tem de ser acompanhada do contrato de arrendamento. O que se revelaria num óbice nas situações em que não houvesse contrato escrito. Invocado é ainda o resultado do confronto entre os n.ºs 2 e 3 do artigo 1084º, ambos referentes a situações de resolução extrajudicial, dos quais resulta que só no 2º se fala em “quando opere por comunicação à outra parte” a permitir a conclusão de que também pode a resolução operar por via judicial, em alternativa à via extrajudicial. Sobre a “mens legislatoris” e no mesmo sentido, foi desde logo afirmado no Ac. RP de 20/04/2009 in http://www.dgsi.pt/jtrp ser o que também decorre da Exposição de Motivos da Proposta de Lei do Arrendamento Urbano nº 34/X - ponto 2 «intitulado “A agilização processual” (em particular o último parágrafo do Ponto 2 da Exposição de Motivos» e do qual se extrai «nos casos de cessação por resolução com base em mora no pagamento da renda superior a 3 meses, ou devido a oposição do arrendatário à realização de obra … se o senhorio proceder à notificação judicial avulsa do arrendatário e este mantiver a sua conduta inadimplente, permite-se a formação de título executivo extrajudicial - ou o parágrafo constante do Ponto 1, com o seguinte teor “O regime jurídico manterá a sua imperatividade em sede de cessação do contrato de arrendamento, mas abre-se a hipótese à resolução extrajudicial do contrato, com base em incumprimento que, pela sua gravidade, ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento”), evidencia que se pretendeu apenas permitir/facultar a formação de título executivo extrajudicial, possibilitando ao senhorio o recurso imediato à ação executiva, mas não impor-lhe esta via». Subentende-se desta exposição de motivos a intenção de conferir ao senhorio um recurso adicional ao exercício dos seus direitos e não uma intenção restritiva, por via da exclusão ao recurso da ação comum. Na mesma linha, são ainda invocados no Ac. que vimos de citar adicionais argumentos «a favor da possibilidade de recurso à ação de despejo, mesmo no caso de mora no pagamento da renda com duração superior a três meses, por Laurinda Gemas, Albertina Pedroso e João Caldeira Jorge[1] e por Gravato Morais[2]” (in Arrendamento Urbano, Novo Regime Anotado e Legislação Complementar, 2ª ed., págs. 324 e segs. e “Novo Regime do Arrendamento Comercial, págs. 104 e 105 respetivamente)» dos quais reproduziremos os que para o caso se mantêm pertinentes atentas as alterações legislativas posteriores: “- evitar o “compasso de espera” de 3 meses de duração da mora para o senhorio poder efetuar a comunicação destinada à resolução extrajudicial do contrato; - evitar um novo “compasso de espera” de mais 3 meses[3], subsequentes à comunicação do senhorio, para eventual purgação da mora, conforme previsto no art.º 1084º, nº3, do CC, e para a exigibilidade da desocupação do locado nos termos do art.º 1087º do CC (já que na ação de despejo pode decretar-se o despejo imediato); - evitar as vicissitudes e dificuldades inerentes à notificação avulsa ou contacto pessoal exigidos pela lei para efetivar a resolução extrajudicial, em especial nos casos em que o paradeiro do arrendatário é desconhecido[4]; (…) - obviar a uma eventual responsabilização nos termos do art.º 930º-E[5], do CPC, norma cujo campo de aplicação se circunscreve à execução fundada em título extrajudicial; - cumular o pedido de resolução com o de indemnização ou rendas, ou com o de denúncia, quando esta tenha de operar pela via judicial (art.º 1086º do CC) ou cumular vários fundamentos de resolução, evitando assim que o litígio sobre a resolução do contrato seja tratado em dois processos distintos, ou seja, na ação de despejo e na oposição à execução; - permitir ao arrendatário que deduza logo pedido reconvencional, em especial com fundamento em benfeitorias, evitando que a discussão dessa matéria seja relegada para a oposição à execução; - forçar a uma purgação da mora mais célere (até ao termo do prazo para a contestação), esgotando-se o recurso a essa faculdade, já que apenas pode ser usada uma única vez na fase judicial (art.º 1048º, nºs 1 e 2 do CC); - lançar mão do incidente de despejo imediato previsto no art.º 14º, nºs 4 e 5, do NRAU.» A intenção de reforçar os meios ao alcance do senhorio foi reiterada na exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 38/XII, que esteve na origem da Lei n.º 31/2012, através da qual e tendo sido retirada força de título executivo à comunicação da resolução do contrato, foi criado o PED. Exposição de motivos na qual se afirma: “A reforma do regime do arrendamento urbano que agora se propõe procura encontrar soluções simples, assentes em quatro dimensões essenciais: (i) alteração ao regime substantivo, vertido no Código Civil; (ii) revisão do sistema de transição dos contratos antigos para o novo regime; (iii) agilização do procedimento de despejo; e (iv) melhoria do enquadramento fiscal. (…) No que respeita ao regime processual, reconhece-se a necessidade e a premência de reforçar os mecanismos que garantam aos senhorios meios para reagir perante o incumprimento do contrato, assim tornando o mercado de arrendamento e o investimento na reabilitação urbana para colocação no mercado de arrendamento uma verdadeira opção para os proprietários e, mais relevantemente ainda, uma opção segura. Esta medida, concretizada mediante a agilização do procedimento de despejo, é fundamental para recuperar a confiança dos proprietários. Até à presente data, o senhorio tinha de recorrer a um processo de despejo apresentado junto de um tribunal. Mesmo dispondo de um título executivo nos termos previstos na Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, verificou-se que o tempo médio de duração da correspondente ação executiva é ainda de dezasseis meses. Tal longa espera, muitas vezes acompanhada pelo não recebimento das rendas, revelou ser um motivo de desincentivo para a colocação de imóveis no mercado do arrendamento pelos proprietários, ou ainda para a elevação do valor da renda como forma de controlo do risco. Para tornar o arrendamento num contrato mais seguro e com mecanismos que permitam reagir com eficácia ao incumprimento, é criado um novo procedimento extrajudicial que permite que a desocupação do imóvel seja realizada de forma célere e eficaz, num prazo médio estimado de três meses, no caso de incumprimento do contrato por parte do arrendatário. Promove-se, por esta via, a confiança do senhorio no funcionamento ágil do mercado de arrendamento e o investimento neste sector da economia.” Do exposto resulta em nossa opinião como acertado o entendimento de que ao senhorio não foi vedado o recurso à via judicial para obter o despejo por resolução contratual com fundamento no não pagamento das rendas por mora superior a 3 meses. Neste sentido cfr. também in http://www.dgsi.pt: - Ac. STJ de 06/05/2010 nº de processo 438/08.5YXLSB.LS.S1 e mais recentemente Ac. STJ de 14/09/2021, nº de processo 407/19.0T8ENT.E1.S1 pronunciando-se expressamente sobre a alternatividade de qualquer um dos meios ao dispor do senhorio “a ação judicial de despejo ou do procedimento especial de despejo.”; - Ac. RP 26/02/08 nº de processo 0820751; Ac. RP de 19/02/2009, nº de processo 459/08.8TJVNF; Ac. RP de 17/10/2013, nº de processo 2541/11.5TBOAZ.P1 de cujo sumário consta “Embora o senhorio tenha ambas as possibilidades ao seu dispor, optando pela via judicial deve ser-lhe reconhecido interesse em agir”; Ac. RP de 06/05/2014, nº de processo 747/13.1TBPVZ.P1; Ac. RP de 26/03/2019 nº de processo 1208/17.5T8MTS.P1; Ac. RP de 19/05/2020, nº de processo 1918/18.0T8PVZ.P1; - Ac. RLx. de 17/04/2008, nº de processo 2308/08-2; Ac. RLx. de 31/03/09, nº de processo 2150/08.6TBBRR.L1-7; Ac. RLx. de 28/05/2009, nº de processo 3896/07-2 e Ac. R.Lx de 11/12/2018 nº de processo 10901/17.1T8LSB.L1-2 (este último com vasta referência a doutrina, bem como jurisprudência). Em conclusão, não está vedado o recurso à via judicial quando em causa esteja a cessação do contrato de arrendamento com fundamento na mora do pagamento de rendas por período superior a 3 meses. Apresentando-se o recurso ao PED, sustentado entre o mais na comunicação extrajudicial de resolução prevista no artigo 1084º nº 2, num meio alternativo à ação comum de despejo. O facto de no caso dos autos os AA. terem alegadamente enviado comunicação extrajudicial para resolução do contrato nos termos do artigo 1084º nº 3 do CC. ao R., não altera os dados da equação. A comunicação efetuada não constitui título executivo, como aliás os AA. viram já ser decidido no processo executivo que previamente intentaram contra o R., nos termos que alegaram e não mereceu impugnação do R.. A obtenção do despejo pretendido pelos AA. sempre estaria dependente do recurso ao PED, ou em alternativa do recurso à ação comum. Tendo sido esta última a opção seguida pelos AA.. Opção que os AA. justificaram atenta a oposição deduzida pelo R. nos embargos, nomeadamente a invocação por este de que a comunicação extrajudicial é ineficaz por não observância dos formalismos legais impostos pelo artigo 9º nº 7 do NRAU. Os AA., certamente cientes das objeções levantadas e que já tinham sido contra si suscitadas na oposição à execução que o R. deduziu no âmbito do processo 206/18, optaram por diretamente instaurar ação de despejo contra o R. invocando tal contexto, aliado à manutenção da ocupação do locado e à manutenção da falta de pagamento das rendas, reiterando esta como fundamento de resolução contratual e consequentemente peticionando o despejo. Assegurando assim a resolução definitiva da questão, salvaguardando entendimento diverso quanto à regularidade da comunicação por si efetuada[6]. O recurso à ação comum mostra-se neste contexto justificado. A questão da não indicação no pedido final da declaração de resolução contratual é questão que será apreciada em sede de mérito do recurso pois apenas relevará para a procedência ou não da pretensão dos AA.. Tal como será esse o momento oportuno para apreciar da alegada ineficácia da resolução extrajudicial e da sua relevância para o mérito dos autos – assim se suprindo a omissão já supra reconhecida. Estas questões não são contudo óbice a que o senhorio opte, no contexto já supra justificado, por intentar ação declarativa comum como o fez, recorrendo à forma de processo correta em função da pretensão por si formulada de acordo com o objeto processual delineado na p.i.. Sendo manifesto o seu interesse em agir - tal como decidido pelo tribunal a quo - em função do por si alegado não pagamento das rendas por parte do R. de quem alegaram ser senhorios, usando o meio processual adequado – a ação declarativa comum. Em conclusão, improcedem os argumentos do recorrente quer quanto à forma do processo utilizada que se julga adequada, quer quanto ao interesse em agir dos AA. afirmado pelo tribunal a quo e cujo entendimento nenhuma censura merece, pelo que se mantém o decidido por este também nesta sede.*Cumpre finalmente apreciar se ocorreu erro na apreciação do direito. Sendo agora o momento oportuno para apreciar a questão da invocada ineficácia da resolução extrajudicial e relevância desta mesma questão para os autos. Assim se suprindo a omissão de pronúncia já assinalada. No mais se apreciando ainda a questão do pedido formulado pelos AA. e se o mesmo exclui o conhecimento da resolução contratual que é pressuposto do decidido despejo, ou antes e por via interpretativa do articulado dos AA. – para tanto recorrendo à denominada teoria da impressão do destinatário, aplicável também ao alegado pelas partes nos respetivos articulados processuais[7], de acordo com a qual a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal colocado na posição real do declaratário deduz do comportamento do declarante (consagrada no artigo 236º do CC) - está implícito no pedido formulado em função do alegado. Recorda-se que a factualidade provada não foi impugnada e como tal tem-se por definitivamente assente entre as partes. Nos termos do artigo 14º nº 1 do NRAU “A ação de despejo destina-se a fazer cessar a situação jurídica do arrendamento sempre que a lei imponha o recurso à via judicial para promover tal cessação e segue a forma de processo comum declarativo.” O mesmo é dizer que a ação de despejo, ou seja, a ação em que se peticiona o despejo do locado para sua entrega livre de pessoas e bens ao senhorio, tem sempre e necessariamente como pressuposto a cessação da relação contratual entre as partes. In casu, tal cessação tem como invocado fundamento o não pagamento das rendas e esta situação de incumprimento contratual confere ao senhorio o direito de resolver o contrato. O despejo é na verdade “a pretensão que corresponde à resolução, caducidade ou denúncia do contrato de arrendamento (…)”.[8] A resolução contratual é admitida quando fundada na lei ou em convenção das partes – artigo 432º n.º 1 do CC. Entre outros fundamentos está e para o que ora releva, o direito à resolução consagrado legalmente para o caso de incumprimento contratual fundado no não pagamento das rendas por período superior a 3 meses, operando por comunicação à contraparte com fundamento na mencionada falta de pagamento da renda por período igual ou superior a 3 meses [cfr. artigos 1083º nº 3 e 1084º nº 3 do CC]. Alega o recorrente que os AA. não peticionaram a resolução contratual e que como tal a ação está condenada à improcedência por o peticionado despejo estar dependente da prévia resolução contratual. É correta a precedência alegada, tal como já o afirmámos. Já não a alegada inexistente pretensão de declaração resolutiva. Tendo presente que o objeto processual é conformado pelo pedido e causa de pedir delineados na p.i., relembram-se os termos em que os AA. delinearam o objeto da presente ação de acordo com o pelos mesmos alegado na p.i.: - no seu artigo 7º que o R. não pagou as rendas de maio a dezembro de 2017 e janeiro de 2018 tendo por tal facto interpelado o mesmo ao pagamento por missiva de 17/12/2017 rececionada a 21/12/2017; - que nessa missiva comunicaram ao R. a possibilidade de pôr fim à mora nos termos do artigo 1084º nº 3 do CC com vista a afastar a resolução contratual (vide artigo 8º); - que intentaram ação executiva na qual pugnavam pela entrega do locado, tendo ali sido decidido que a carta enviada não configurava título executivo; - que o R. continua sem proceder ao pagamento das rendas e a ocupar o imóvel. Face ao que se viram obrigados a intentar a presente ação (vide artigo 15º da p.i.). O assim alegado visou justificar a instauração desta ação. Prosseguindo na sua alegação, afirmam os autores que face à operada resolução do contrato de arrendamento – reportando-se à comunicação de 17/12/2017 - peticionam nos autos a entrega imediata do locado (16º da p.i.). Mas mais alegam que a falta de pagamento é motivo de resolução contratual e consequente despejo imediato. Sendo “fundamento do despejo do local arrendado” o alegado e assim assistindo o direito aos AA. de exigirem a entrega imediata do arrendado, direito que assim exercem (vide o alegado de 17º a 19º da p.i.). Temos portanto alegado como causa de pedir o não pagamento das rendas por período superior a 3 meses. Não pagamento este fundamento de resolução contratual, tal como expressamente afirmado pelos AA. com vista ao peticionado despejo. A resolução contratual consiste numa manifestação de vontade - mediante declaração à outra parte, por um dos contraentes que pretende fazer regressar as partes à situação em que se encontrariam caso o contrato não tivesse sido celebrado. "A resolução opera-se por meio de declaração unilateral recetícia do credor, art.º 436º do C.C., que se torna irrevogável, logo que chega ao poder do devedor ou dele é conhecida.”[9] Não há dúvidas que os AA. pretendem o reconhecimento da resolução do contrato entre as partes celebrado. Resolução que invocam ter operado pela comunicação de 2017. Mas que na p.i. reiteraram. Salvaguardando assim a hipótese de não ser considerada válida a comunicação de 2017. E nesta ação convocaram os AA. a declaração resolutiva manifestada em 2017 que reafirmaram com a instauração da ação, invocando desde então a manutenção da falta de pagamento das rendas, bem como a ocupação do locado, fundamento resolutivo legitimador do despejo peticionado e que aquela resolução pressupõe. Ao tribunal cabe, em função do pedido formulado, do alegado e apurado, interpretar e aplicar o direito[10]. Ora, sempre por via desta ação deram os AA. a conhecer ao R. com a sua citação para os autos a sua vontade de resolver o contrato – reiterando o que antes já haviam comunicado em 17/12/2017. Vontade resolutiva fundamentada na falta de pagamento de rendas e que é premissa necessária do despejo imediato peticionado. Qualquer declaratário normal colocado na posição do R. interpretaria o alegado pelos AA. na sua p.i. (vide em concreto artigos 17º e 18º) como uma declaração resolutiva do contrato de arrendamento, temporalmente situada num primeiro momento na comunicação de 2017 e reiterada no presente pela manutenção do quadro factual que a justifica, tal como o alegam. E que tal foi assim entendido pelo R. é o que o demonstra a sua defesa aduzida em sede de contestação, ao alegar que a declaração resolutiva de 2017 é ineficaz por não observância dos formalismos legais (vide pontos 4 a 12 da contestação). E ao mais alegar em sede de impugnação que os AA. fundam a resolução do contrato na falta de pagamento das rendas dos meses de maio a dezembro de 2017 e janeiro de 2018 e que inexiste fundamento para tal resolução porque sempre pagou – pugnando seja julgada “procedente a impugnação e dada como provada a falta de fundamento da resolução do contrato de arrendamento” – o R. de novo reconhece a pretensão resolutiva manifestada pelos AA.. Porque a declaração resolutiva uma vez recebida produz os seus efeitos, analisemos então a regularidade da declaração de 2017. Não há dúvidas – porque tal está provado e não foi impugnado – que os AA. enviaram ao R. em 2017 uma carta registada com AR por este rececionada em 21/12/2017 a solicitar o pagamento das rendas em dívida. Mais dando a possibilidade de pôr fim à mora como meio de afastar a resolução contratual . Resolução contratual que expressamente ali declararam – tal como consta da carta enviada e cuja cópia se mostra junta a fls. 10 dos autos. Tal comunicação enviada para o local arrendado foi pelo próprio R. recebida tal como consta do AR junto a fls. 9 verso. Em suma inexistem dúvidas de que a mesma chegou ao conhecimento do R., habilitando-o a exercer os seus direitos de acordo com o por si tido como mais oportuno. Alega o recorrente que esta comunicação, não obstante por si recebida não é eficaz já que não foi entre as partes convencionado domicílio para efeitos de comunicação entre as partes e que como tal não podiam os AA. ter feito uso da faculdade prevista na al. c) do nº 7 do artigo 9º do NRAU. Afigura-se-nos não assistir razão ao recorrente. Na falta de domicílio convencionado a que se reporta a al. c) do nº 7 do artigo 9º do NRAU – elemento contratual que aliás apenas passou a figurar como mero conteúdo eventual do contrato com a introdução da alteração prevista pelo DL 266-C/2012 de 31/12 ao artigo 3º nº 1 al. g) do DL 160/2006 de 08/08 quer aprovou os elementos do contrato de arrendamento e os requisitos a que obedece a sua elaboração – é de aplicar a regra dos nºs 1 e 2 do artigo 9º do NRAU à comunicação do senhorio para resolução do contrato nos termos do nº 2 do artigo 1084º do CC, sendo válida a comunicação por carta registada com AR dirigida ao arrendatário para o local arrendado que seja rececionada por este, por força do disposto no artigo 10º do NRAU que regula as vicissitudes das comunicações[11]. O formalismo especial previsto neste nº 7 visa a nosso ver conferir às partes uma acrescida garantia do efetivo conhecimento e prova das comunicações entre as mesmas trocadas, quando em causa está a comunicação de resolução contratual com fundamento na mora no pagamento das rendas pelas consequências à mesma inerentes. Esta garantia está de igual forma assegurada quando a comunicação é enviada – na ausência de cláusula contratual em contrário - para o local arrendado e recebida pela contraparte contratual/inquilino. Concluímos portanto ter a comunicação enviada pelos AA. ao R. operado de forma regular os seus efeitos, nomeadamente operando pela sua receção a resolução contratual. Operada a resolução contratual e não tendo o R. provado – como lhe incumbia – o pagamento das rendas vencidas entre maio e dezembro de 2017 [cfr. al. a) dos factos não provados] resta concluir pela procedência do peticionado despejo como consequência da operada resolução contratual em 2017. Ainda que assim se não entendesse, porquanto sempre a intenção resolutiva é uma realidade processual nos autos reiterada, nos termos que acima já expusemos, então também por esta via seria de concluir nos mesmos termos. O depósito liberatório no prazo de um mês previsto no artigo 1084º nº 3 do CC não se mostra efetuado nos autos – sendo que ao R. incumbia igualmente o ónus de provar tal realidade. Termos em que se tem de concluir pela total improcedência do recurso interposto.*** V. Decisão. Pelo exposto, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em julgar totalmente improcedente o recurso interposto pelo R. consequentemente se mantendo a decisão recorrida. Custas do recurso pelo recorrente. Porto, 2021-10-28 Fátima Andrade Eugénia Cunha Fernanda Almeida ________________________________________________ [1] Citando ALBERTO DOS REIS, “Código de Processo Civil Anotado”, Volume V, Reimpressão, Coimbra Editora, pág. 143 e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Janeiro de 2000, B.M.J. n.º 493, pág. 387, vide Ac. STJ de 08/01/2015, Relator João Trindade in www.dgsi.pt/jstj. [2] Cfr. António Abrantes Geraldes in “Temas da Reforma do Processo Civil, I Vol. 2ª ed. revista e ampliada, edição Almedina, p. 280. [3] Hoje um mês por via da alteração introduzida no artigo 1084º nº 3 pela Lei 31/2012 de 14/08 [4] Na atual redação introduzida pela Lei 79/2014 de 19/12 no artigo 7º al. c), também evitar as mesas dificuldades e vicissitudes inerentes à notificação por escrito assinado pelo senhorio nos termos previstos em tal al.c). [5] Hoje com correspondência ao artigo 15º R do NRAU no âmbito do PED. [6] Cfr. Ac. TRL de 11/12/2018, nº de processo 10901/17.1T8LSB.L1-2 in www.dgsi.pt onde se analisa paralela situação em que não obstante o senhorio ter optado pela cessação extrajudicial do contrato de arrendamento, por falta de pagamento de rendas, se entendeu poder subsequentemente instaurar ação judicial para efetivação dos direitos do senhorio, em detrimento da instauração de procedimento especial de despejo com base em dificuldades invocadas pelo senhorio. [7] Cfr. neste sentido Ac. TRP de 10/11/2020, nº de processo 358/19.8T8VNG.P1 in www.dgsi.pt [8] Antunes Varela ; J. M. Bezerra e Sampaio e Nora in Manual de Processo Civil, 2ª edição revista e atualizada, p. 463. [9] Cfr. neste sentido, A. Varela in Das Obrigações Em Geral, vol. II, p. 103. [10] Cfr. Ac. TRL de 20/05/2008 nº de processo 7388/2007-1, onde em situação similar se defendeu o “despejo é a consequência jurídica e prática da cessação do contrato de arrendamento. A averiguação em torno do contrato de arrendamento, quer no sentido de continuar a vigorar, quer no sentido de se resolver pela verificação do fundamento invocado, é um trabalho lógico, jurídico, técnico, do jurista- na bipartição entre facto e direito, é direito. E da indagação, interpretação e aplicação do direito conhece o tribunal – artigo 664º do C.P.C. (…) Não é necessário pedir autonomamente que se decrete a resolução do contrato, porque, embora possível, e tecnicamente certo, esse pedido sem o de despejo, tornar-se-ia inócuo. O que interessa à parte é o despejo e a entrega do locado livre de pessoas e bens. Formulou esse pedido. O mais é direito, cabendo ao tribunal indagar do mesmo, interpretá-lo e aplicá-lo.” [11] Jorge Pinto Furtado in “Comentário ao Regime do Arrendamento Urbano”, 2ª edição revista e atualizada, em anotação ao artigo 1084º , nota 3 p. 560 a 563, expressa o entendimento de na falta de domicílio convencionado ser facultado ao senhorio o envio da comunicação fundada na falta de pagamento de rendas para o prédio arrendado nos termos gerais do nº 2 do artigo 9º do NRAU. No mesmo sentido José A. França Pitão e Gustavo França Pitão in “Arrendamento Urbano Anotado”, edição de 2017, em anotação ao artigo 9º do NRAU p. 21/22