Nos crimes de jogo de fortuna e azar não há erro notório na apreciação da prova pelo facto de os peritos não terem visualizado as máquinas em funcionamento. Uma peritagem não é um exame. No caso do exame, que é um meio de obtenção de prova, o que se requer é a pura descrição do objecto de prova examinado (em funcionamento, ou não), em resultado da observação presencial feita pelo examinador. Exige-se-lhe que o descreva, fazendo menção dos pormenores captáveis pelos sentidos. No caso de uma perícia, que é ela própria um meio de prova, visa-se a aplicação de especiais conhecimentos técnicos ou científicos a determinado objecto da prova, para que, através dessa avaliação se possa concluir, com elevado grau de certeza, um facto até aí desconhecido. Tratando-se do resultado de um relatório pericial em que a aquisição probatória feita se reporta aos juízos técnicos formulados relativos ao modo de funcionamento das máquinas, quando activadas pelos códigos correspondentes ao software que têm incorporado, é absolutamente irrelevante alguém tê-las observado em efectivo funcionamento, pelo que a aplicação do valor probatório vinculado está justificada.
Acordam os Juízes, em conferência, na 3ª Secção Criminal, deste Tribunal: *** I–Relatório: Em processo comum, com intervenção do Tribunal a arguida SP______, foi condenada pela prática, em autoria material, concurso real e na forma consumada, de dois crimes de exploração ilícita de jogo de fortuna ou azar, previstos e punidos pelo artigo 108º/1 e 2, do Decreto-Lei 422/89, de 2 de Dezembro, nas penas respectivas de quatro meses de prisão e cem dias de multa, à razão diária de €5,50, e de cinco meses de prisão e cento e cinquenta dias de multa, à razão diária de €5,50. Em cúmulo jurídico foi condenada na pena única de oito meses de prisão, substituída por duzentos dias de multa, à razão diária de €5,50, num total de €1.100 e na pena única de duzentos dias de multa, à razão diária de €5,50, num total de € 1.100, o que perfaz a multa global de €2.200. Declararam-se perdidas a favor do Estado as máquinas apreendidas e as quantias pecuniárias depositadas à ordem dos presentes autos. *** A arguida recorreu, concluindo as alegações nos termos que se transcrevem: « I.–A Arguida não se conforma, quer da matéria de facto dado como provada, quer da matéria de Direito e ainda das penas que lhe foram aplicadas, relativamente ao crime pelo qual foi acusada, crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108.° n.° 1 e 2 do Decreto-Lei n.° 422/89, de 2 de Dezembro, considerando não ter sido devidamente levado em conta a prova produzida e não produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, tendo mesmo sido apreciada de forma errada aquando da motivação da decisão sobre a matéria de facto. II.–Os factos considerados provados e constantes da Douta Sentença são a cópia integral da Douta Acusação Pública!!! Sem que tivesse sido levado em linha de conta que, ao inquirir as testemunhas, a Sra. Procuradora não individualizou o processo sobre os quais as questionava, considerando que os autos, são compostos por duas intervenções inspectivas realizadas em dias diferentes!!!! III.–Cumprindo o disposto no artigo 412.°, n.° 3 do CPP, os pontos que foram incorretamente julgados e que impõem decisão diversa da recorrida foram os pontos A) a U) dos factos dados como provados. Devendo tais factos serem dados como não provados, absolvendo-se a Arguida dos crimes. IV.–O Tribunal “a quo” limitou a sua convicção quanto aos factos provados baseando-se nas regras de experiência comum, inclusive das testemunhas, cujo critério jamais poderá neste tipo de ilícito ser aplicado, considerando que estão em causa máquinas de diversão/jogo que deverão obrigatoriamente passar por uma avaliação e peritagem técnica, provando-se que as máquinas apreendidas são as peritadas. V.– Por outro lado, os agentes da autoridade policial que foram ouvidos como testemunhas não correspondem às pessoas que efectuaram as perícias às máquinas (inspectores da ASAE e da inspecção de jogos que não prestaram nos autos qualquer depoimento) e, que no entender da Recorrente, mais não fizeram do que aprender as máquinas preventivamente (não viram as máquinas em funcionamento, aliás afirmado pelos mesmos que as máquinas estavam completamente inoperativas). VI.–Desconhece-se a forma como as máquinas foram apreendidas, se foram seladas ou como e quando foram enviadas para a peritagem. VII.–A Douta Sentença dá credibilidade aos depoimentos dos senhores agentes, bem como se alicerça em declarações que a Arguida terá supostamente prestado perante aqueles, já naquela qualidade processual, aquando da ação de fiscalização, tirando conclusões de meras "presunções" apresentadas por aqueles. VIII.–A identificação e ficheiros executáveis não faz com que esses ficheiros tenham sido executados, no estabelecimento, nem faz com que a Arguida tenha conhecimento dessa existência (dos ficheiros), nem faz com que haja responsabilidade criminal, não se podendo dar portanto como provados os pontos A) a U) dos factos provados. IX.–Ficou por demonstrar de forma cabal que os equipamentos desenvolviam efectivamente jogos de fortuna ou azar (apesar da sentença recorrida ter entendido que as perícias o ressalvaram ou evidenciaram, a verdade é que somente resulta das perícias a comparação com máquinas semelhantes e o que resulta da experiência comum), até porque as testemunhas ouvidas não as diferenciaram enquanto máquinas, computadores e em que situações concretas foram aprendidas e a que dia da apreensão diziam respeito, limitando-se a recorrer à experiência comum. X.–Dos testemunhos dos senhores agentes da autoridade não resulta que tenham visto as máquinas em jogo e a funcionar, confirmaram que as máquinas se encontravam inoperativas e que uma delas se encontrava num anexo sem acesso ao cliente. XI.–Existe erro notório na apreciação da prova quando esse erro é de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem médio facilmente dele se dá conta. Por isso é notório e não só visível aos juristas. XII.–Entende a Recorrente que inexistem factos provados imputados à mesma, no que respeita à verificação dos elementos objectivo e subjectivo do tipo do crime em apreço e pelo qual foi condenada. As próprias testemunhas e a decisão recorrida reconhecem que a prova resulta, no âmbito da audição daquelas, de conversas obtidas pelas testemunhas no âmbito da fiscalização operada, sem que para isso seja especificado em que qualidade. XIII.– Conversas aquelas que, não podem ser reproduzidas em sede de julgamento, uma vez que a Recorrente exerceu o direito ao silêncio, a acrescer o facto de as testemunhas não tomaram conhecimento directo e pessoal com determinados factos, antes receberam informações da Recorrente, que as reproduziram nos autos de notícia, ao mesmo momento em que aquela era Arguida. As testemunhas sobre os factos que lhe foram relatados pela Arguida, falam pela "boca do arguido" o que equivale a dizer que essas passagens não podiam ser valoradas pela decisão recorrida e foram-no, em violação do n.° 7 do art.° 356.° do CPP. XIV.– Acresce ao alegado (da falta de visualização de jogos de fortuna ou azar e quais, pelos autuantes e peritagem) que a Douta Sentença recorrida esgrima ainda o argumento de que os aludidos jogos não foram colocados em funcionamento e a confirmar esta alegação surge o relatório pericial que menciona não ter sido possível a visualização de qualquer jogo de fortuna ou azar no equipamento em questão; nos factos provados A) a U), decide-se que os equipamentos desenvolviam esses denominados jogos e na fundamentação, argumenta-se que das perícias se extrai que foram localizados, na análise aos discos rígidos dos computadores ficheiros informáticos que permitem o desenvolvimento desses aludidos jogos, mas, não se refere nessas perícias, o que era de esperar que se referisse, e que sustentaria a decisão da sentença recorrida, e que é um facto essencial que se traduziria na informação constante dos discos rígidos dos pcs, que demonstrasse ao tribunal recorrido em que dia, hora, minuto e segundo os aludidos jogos de fortuna ou azar teriam sido executados; esta era e é uma informação essencial para que pudesse ocorrer a sustentação dos factos provados referidos, mas se observarmos a perícia, esta informação não se encontra na mesma e porquê? Porque pura e simplesmente os aludidos jogos de fortuna ou azar descritos nos factos provados mencionados nunca foram desenvolvidos nos computadores apreendidos à ordem destes autos! Mais os equipamentos apreendidos eram portáteis pelo que poderiam ser ligados em qualquer lado, o facto de se encontrarem no estabelecimento não se infere que tenham sido utilizados ilicitamente nesse espaço. XV.–Ouvidos os agentes de autoridade que levaram a cabo as acções de fiscalização no estabelecimento em causa, os mesmos declararam a similitude das acções de fiscalização que desenvolveram ao longo dos anos. Remetendo a descrição dos supostos jogos para fotogramas.... Declarando sempre que as acções de fiscalização se desenvolvem de forma mecanizada, pouco específica, centrada num rol de procedimentos "habituais" que, no entender da Recorrente e na esmagadora maioria delas, inquinou a recolha de provas e informação nos presentes autos. XVI.–Não foram carreados para os autos quaisquer elementos probatórios quanto à realidade dos factos anteriores à fiscalização, pelo que se desconhece se e por quanto tempo as máquinas encontradas já se encontrariam nos correspondentes locais ou se de facto foram utilizadas. XVII.–No mesmo sentido, apesar de ter sido testemunhado que se mostravam ligadas à corrente eléctrica, desconhece-se se a actividade que as mesmas terão desenvolvido ocorreu no estabelecimento comercial onde foram encontradas. XVIII.–Analisando o teor dos relatório periciais, o Tribunal a quo considerou provadas as características do hardware ali descrito — características que foram apreendidas directamente pelo "examinador" —, e, no que se refere ao funcionamento das mesmas, apenas considerou como suficientemente demonstrada a existência de uma possibilidade de utilização do software encontrado: a clássica ligação à internet e a existência da possibilidade de desenvolver aplicações. No mais, já que não foi possível colocar em funcionamento os programas ali contidos, por falta de código ou palavra-passe e/ou por comprometimento dos ficheiros, pelo que não podia o Tribunal aceitar os juízos ali vertidos como inabaláveis por se tratarem de meras suposições com base em imagens de arquivo e histórico de anteriores análises realizadas. Máxime não podia o Tribunal considerar assente a conclusão de que as máquinas apreendidas desenvolviam jogos cujo resultado não depende da destreza ou qualidade do jogador: porque se tratam de juízos e conclusões formulados sem apoio em análise do funcionamento destas máquinas e meramente baseados em modos de funcionamento habituais de jogos com designação igual ou semelhante aos programas cujo acesso foi detectado em datas anteriores à apreensão da máquinas, estas não se podem mostrar suficientes, na perspectiva da Recorrente, para convencer inequivocamente o Tribunal a quo de que aquelas máquinas concretas desenvolveram, no estabelecimento identificado autos, jogos com as características que os poderiam enquadrar na classificação de fortuna ou azar. O teor dos documentos em referência mostra-se, pois, construído numa cascata de suposições e de raciocínios apenas fundados em casos semelhantes anteriormente identificados e analisados pelo respectivo autor, mas sem apoio em matéria de facto concreta suficiente recolhida no âmbito dos presentes autos para que se possa considerar que tais raciocínios não tenham sido levados a cabo sem quebras no encadeamento das premissas que levaram às apresentadas "conclusões". XIX.–Desta análise resulta a não prova dos factos descritos na Acusação. XX.–Nos presentes autos apenas se pode considerar provado que na data/local e circunstâncias consideradas assentes foram apreendidas máquinas em acção de fiscalização levadas a cabo pelos agentes de autoridade. XXI.–Não estão, assim, preenchidos os elementos objectivos e subjectivo típicos supra referidos. XXII.–Acresce que, devemos atentar ainda no facto de não ter ficado demonstrado, cabalmente, que a Recorrente, tinha, sequer, conhecimento da existência de quaisquer jogos proibidos naqueles equipamentos. XXIII.–Quanto aos factos provados A) a U) por referência à Recorrente, nenhuma prova foi produzida que permitisse à decisão recorrida considerá-los, o que origina a nulidade prevista na al. a) do n.° 1 do art.° 379.° do CPP por violação do art.° 374.°, n.° 2 do CPP. XXIV.–A utilização do chavão clássico de que pode ser dado como provado um facto desconhecido ou não provado, que tem por base um outro facto acessório conhecido e que ao desconhecido possa conduzir com segurança o julgador, não tem aqui aplicabilidade, pois que o conhecimento do interior do equipamento, da sua operacionalidade, da sua capacidade de receber descargas de ficheiros via net e da sua qualificação e classificação, são factos específicos e não acessíveis ao cidadão comum e por isso mesmo carecem de explicação de um perito, nomeadamente que esse perito e por referência a estes autos, tivesse, sem qualquer dúvida, demonstrado na perícia que os aludidos ficheiros informáticos existentes no disco rígido, tinham sido executados para desenvolvimento dos jogos de fortuna ou azar, naquele equipamento, momentos antes da fiscalização e da consequente apreensão e esta prova era essencial para a decisão de facto, cuja sindicância e impugnação se verte neste recurso. XXV.–A omissão da análise do facto essencial que é a prova da data da execução dos ficheiros no hardware apreendido (o que não sucedeu) e que permitiria colocar em desenvolvimento os aludidos jogos descritos nos factos provados A) a U), em momento anterior às fiscalizações e apreensões desses mesmos equipamentos, constitui, também ela (omissão), uma outra nulidade, por violação do n.° 2 do art.° 374.° do CPP, constituindo, em simultâneo, erro de julgamento, ou conduzindo à verificação de erro de julgamento. XXVI.–A Recorrente entende que foi violado o art.° 127.° do CPP; o art.° 374, n.° 2 do CPP; o art.° 108.° do DL 422/89, porque não existe prova concludente de que os equipamentos tenham desenvolvido jogos de fortuna ou azar antes da fiscalização e apreensão e antes da intervenção dos peritos em sede de perícia. Na Douta Sentença, menciona-se por diversas vezes em sede de fundamentação a aplicação das regras de experiencia comum, no entanto entende a Recorrente estarem violados os PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E O PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO, dois princípios que andam intimamente ligados entre si e se completam e fundamentam o acima vertido, porquanto em sede de inquérito o titular do mesmo e depois em julgamento, o julgador não entendeu que as máquinas dos autos contivessem jogos de fácil percepção, requisitando os serviços de um perito para que viesse aos autos transmitir para que serviria o objecto apreendido, acaso assim não tivesse sido, nunca a douta decisão recorrida se serviria da perícia para fundamentar ou motivar o funcionamento do equipamento. XXVIII.–Nessa medida está por demonstrar a verificação do dolo (que é especifico) na actuação que é imputada à Recorrente, sendo que este tipo de crime só é punível a título de dolo. XXIX.–Sobre a Arguida apenas consta da motivação da convicção do Juiz, o que foi dito pelas testemunhas, que não mais se trata de um depoimento indirecto que não pode ser admitido. XXX.–A decisão recorrida contém um erro notório na apreciação da prova, que impõe a modificação da decisão recorrida nos termos do artigo 437.°, alínea a), do CPP. XXXI.–Dúvidas não restam de que os factos que serviram para condenar a Recorrente deverão ser dados como não provados, pois não se pode concluir a sua participação com fundamento nas regras da experiência comum. XXXII.–A Arguida apela pela sua inocência e consequente absolvição. Se mesmo assim V.a Exas. não entenderem, é também excessiva a medida da pena concretamente fixada à Arguida, considerando que se trata de cidadã inserida social, profissional e familiarmente. XXXIII.–Sendo que, pelas razões e fundamentos supra elencados, caso a Arguida não venha a ser absolvida nesta instância, sempre a sua pena se deverá fixar pelos mínimos legais, considerando os seguintes dispositivos legais arts.° 70.° e 71.° ambos do Código Penal. Nestes termos e nos demais de Direito que Vossas Excelências, Venerandos Desembargadores, doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando a decisão recorrida que deverá ser substituída por outra consentânea com o ora alegado, assim fazendo a já costumada, justiça». *** Contra-alegou o Ministério Público, concluindo as respectivas alegações no sentido da improcedência do recurso. *** Nesta instância o Exmº Procurador-Geral Adjunto aderiu à resposta dada pelo MP na instância recorrida. *** II–Questões a decidir: Do artº 412º/1, do CPP resulta que são as conclusões da motivação que delimitam o objecto do recurso e consequentemente, definem as questões a decidir em cada caso ([1]), exceptuando aquelas questões que sejam de conhecimento oficioso ([2]). Não obstante o aperfeiçoamento das conclusões produzido pela recorrente não corresponder ao efectivo cumprimento do despacho produzido, na medida em que tirando pequenos excertos copiou as conclusões anteriores, que por sua vez são a cópia da motivação, o Tribunal conhecerá do recurso. As questões colocadas pela recorrente, arguida, são: - Impugnação do provado de A) a U); - Violação do artigo 356°/7 do CPP; - Nulidade prevista no artigo 379°/1-a), do CPP; - Violação dos artigos 127º e 374º/2 do CPP e 108° do DL 422/89; - Violação dos princípios da presunção de inocência e o princípio do in dubio pro reo. *** *** III–Fundamentação de facto: Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes os factos: A)- No dia 26 de Março de 2018, cerca das 11H30, no interior do estabelecimento comercial “ sito na Rua, Mafra, existia uma máquina electrónica sem qualquer referência exterior quanto à sua designação ou modelo, ligada à corrente eléctrica, em pleno funcionamento e à disposição dos clientes que ali se encontravam. B)- O referido estabelecimento comercial estava a ser explorado pela arguida, incluindo a exploração lucrativa dos jogos desenvolvidos na referida máquina. C)- Tal máquina permitia aos clientes desenvolver jogos do tipo “roleta electrónica”, cujos resultados dependem exclusivamente ou fundamentalmente da sorte e, consequentemente, qualificados como jogos de fortuna ou azar. D)- O jogo de roleta tem como objectivo conseguir que o ponto luminoso se imobilize num dos orifícios com direito a prémio, sendo que para tanto basta o jogador introduzir uma moeda no orifício existente para o efeito. As pontuações eventualmente alcançadas no jogo são posteriormente convertidas em dinheiro, à razão de €1,00 (um euro) por ponto. O jogo desenvolve-se da seguinte forma: após a introdução de uma das moedas aceites pela máquina, acendem-se automaticamente os doze pontos luminosos e é emitido um sinal sonoro, sendo que os pontos vão-se apagando até que o sinal sonoro termina. Daí podem suceder três situações, todos os pontos luminosos se apagam, terminando a jogada sem que o jogador tenha direito a prémio, um dos pontos luminosos identificados com números e letras fica aceso, ganhando o jogar os pontos correspondentes ou um dos pontos luminosos identificado com a imagem de uma estrela fica aceso e, nesse caso, a máquina emite um sinal sonoro, momento em que é atribuído ao jogador um determinado número de jogadas bónus ou é facultado ao mesmo o acesso a outro jogo. Nestes dois últimos casos, o jogador pode optar em continuar a jogar com os pontos ganhos ou terminar a jogada para conversão dos pontos ganhos. E)-No dia 26 de Maio de 2018, cerca das 19H05, no interior do mesmo estabelecimento comercial, existiam duas máquinas electrónicas sem qualquer referência exterior quanto à sua designação ou modelo, um delas (a tipo roleta) ligada à corrente eléctrica, e ambas em pleno funcionamento e à disposição dos clientes que ali se encontravam. F)-O referido estabelecimento comercial estava a ser explorado pela arguida, incluindo a exploração lucrativa dos jogos desenvolvidos na referida máquina. G)-A primeira máquina permitia aos clientes desenvolver jogos do tipo vídeo-rolos/slot machine (Halloween), bem como jogos do tipo vídeo-poker (Extra-Poker 2) e um jogo do tipo bingo (Nitroball) cujos resultados dependem exclusivamente ou fundamentalmente da sorte e, consequentemente, qualificados como jogos de fortuna ou azar. H)-O jogo de vídeo-rolos (slot machine) tem como objectivo obter combinações de símbolos premiados, descritos na tabela de prémios, e desenvolve-se da seguinte forma, após a introdução de créditos em jogo, são visualizadas cinco colunas e três linhas, perfazendo quinze símbolos com imagens alusivas ao respectivo tema. Escolhido o número de linhas e o número de créditos que se pretende apostar por cada linha, é iniciado o jogo, através do accionamento do botão. Os rolos (símbolos) giram e após detêm-se rapidamente, um de cada vez, sequencialmente, da esquerda para a direita. Quando todos os rolos estão imobilizados, ocorre uma de duas situações, ou não se obtém qualquer combinação premiada sob qualquer das linhas de aposta e termina a jogada, ou obtém-se uma combinação premiada, sob pelo menos uma das linhas de aposta e o jogador ganha os créditos correspondentes. I)-O jogo vídeo-póquer, tem como objectivo conseguir combinações premiadas, tais como sequência real, sequência numérica, sequência de cor, fullen, trios, pares. Para iniciar o jogo é necessária a introdução de créditos e, de seguida, é escolhido o valor que se quer apostar por jogada. Através do accionamento de um botão, é iniciado o jogo e surge então, em simultâneo, de forma aleatória e dispostas em linha no centro do ecrã 5 cartas de face voltada, cada uma destas pertencente a um baralho convencional, de entre as 52 cartas ou joker, que para efeito de combinações substitui qualquer carta. O jogador pode fixar algumas das cartas para aumentar a probabilidade de obter uma sequência premiada. De seguida, prossegue a jogada aparecendo novas cartas a substituir aquelas que não foram fixadas. Assim, pode acontecer que a combinação que saiu não seja premiada e nesse caso o jogo termina, ou pode a combinação que saiu ser premiada e cabe ao jogador optar entre receber os pontos obtidos ou duplicar os créditos ganhos, efectuando a dobra. J)-O jogo bingo, tem como objectivo conseguir determinados alinhamentos de números, que vão aparecendo de forma aleatória e dispostos num quadro. Para iniciar o jogo é necessária a introdução de créditos e, de seguida, é escolhida uma quantidade de cartões de um a quatro, após o que se efectua a aposta e é iniciado o jogo através do acionamento do respectivo botão, começando o sorteio aleatório de números ou bolas. Terminado o sorteio dos números, se existirem cartões com alinhamentos premiados, o valor dos prémios é adicionado no respectivo contador, podendo o jogador iniciar outra jogada. Caso contrário, o jogador nada ganha. K)-A segunda máquina era igual à descrita em C) e D). L)-A arguida não tinha autorização especial para explorar os jogos acima descritos naquele estabelecimento comercial. M)-Com a exploração das referidas máquinas de jogo conseguia a arguida receber os proveitos delas resultantes, sendo que a primeira e segunda máquinas descritas continham no seu interior os montantes de € 121,50 (cento e vinte e um euros e cinquenta cêntimos) e €2,00 (dois euros), respectivamente, em notas e moedas emitidas pelo Banco Central Europeu. N)-A arguida conhecia as características das máquinas e dos jogos que elas desenvolviam e sabia que tais jogos não dependiam da perícia ou destreza do jogador, não podendo ele influenciá-los pois o resultado apenas depende da sorte e, não obstante tal conhecimento, actuou com o propósito concretizado de permitir a sua colocação no estabelecimento supra identificado e de facultar o acesso do público às referidas máquinas a fim de a explorar economicamente. O)-Agiu sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei. P)-A arguida é empresária em nome individual, explorando o café-restaurante “O Burrito”, auferindo, mensalmente, a quantia de €600. Q)-A arguida é solteira e não tem companheiro. R)-A arguida tem dois filhos, com 5 meses e 4 anos de idades, que residem consigo, não auferindo qualquer pensão de alimentos. S)-A arguida reside com os filhos e com a sua progenitora em habitação arrendada, ascendendo o montante mensal da renda a €300. T)-A arguida frequentou o sistema de ensino até ao 9.° ano de escolaridade. U)-A arguida foi condenada, em 29/09/2015, pela prática, em 28/05/2014, de um crime de exploração ilícita de jogo, previsto e punido pelos artigos 1.°, 3.°, n.°1, 4.°, n.°1, alínea g) e 108.°, n.°1, todos do Decreto-Lei n.° 422/89, de 2 de Dezembro, numa pena de 1 mês de prisão substituído por 55 dias de multa, e uma pena de 85 dias de multa. *** Não há factos não provados *** IV–Fundamentação probatória: O Tribunal a quo justificou a aquisição probatória nos seguintes termos: « O tribunal estribou a sua convicção, no que concerne aos factos pelos quais a arguida vinha acusada, na prova documental junta aos autos e nas declarações produzidas pela arguida e pelas testemunhas LP_____(militar da Guarda Nacional Republicana) e NC______ (militar da Guarda Nacional Republicana) em sede de audiência de discussão e julgamento. A actividade desempenhada pela arguida, a firma do estabelecimento comercial que explora e a respectiva localização resultaram provados com base no teor de fls. 69 conjugado com as declarações produzidas pela arguida e pelas testemunhas LP_____ e NC_____ em audiência de discussão e julgamento. Efectivamente, a arguida admitiu pronta e espontaneamente ser a proprietária do estabelecimento comercial mencionado na acusação, explorando-o desde o ano de 2007 e até à actualidade. Por sua vez LP_____ referiu que aquando da sua deslocação ao estabelecimento começou por contactar com uma senhora que percebeu tratar-se da mãe da arguida, tendo a própria arguida comparecido no local quando se procedia à abertura da máquina. NC_____ foi peremptório em relatar ao tribunal que na sua deslocação ao estabelecimento que identificou no auto de fls. 64, identificou-se como sendo militar da Guarda Nacional Republicana e que ali se encontrava no âmbito de uma acção de fiscalização, tendo-se a arguida apresentado como sendo a responsável pelo estabelecimento. Do cotejo da prova produzida resultou pois demonstrada a referida factualidade. A prova da factualidade descrita em A) a D) e L) a O) resultou do cotejo do teor do auto de notícia de fls. 5, das fotografias de fls. 8 a 10, do auto de apreensão de fls. 11, do auto de abertura de fls. 12, do talão de depósito de fls. 15, da ficha de fls. 33 e do exame pericial de fls. 41 com as declarações produzidas pelo militar LP______ que, prestando um depoimento espontâneo e firme, relatou ao tribunal, evidenciando um conhecimento pessoal dos factos, que na data e hora mencionadas no auto de fls. 5, deslocou-se ao estabelecimento ali referido, o qual se encontrava aberto ao público. Na parte interior do balcão do estabelecimento encontrou uma máquina ligada à corrente eléctrica mas com o botão em “off”. No local procederam à testagem da máquina, ligando-a, tendo a mesma apresentado o jogo descrito no exame pericial de fls. 41. Denotando isenção, referiu que pese embora da porta de entrada do estabelecimento não se visse a máquina em causa, colocando-se junto ao balcão era a mesma visível. Procedeu então à abertura da máquina arrombando-a, encontrando, no seu interior, a quantia de fls. 15. Com firmeza, mencionou que apreendeu a máquina (confirmando o teor de fls. 11) tendo-lhe aposto o nuipc, sendo que após cada fiscalização deslocam-se até ao Posto onde elaboram o expediente necessário, após o que rumam a outro estabelecimento. Não procedem, pois, a várias fiscalizações seguidas. O militar foi peremptório em afirmar que a máquina apreendida no estabelecimento é a de fls. 41 e seguintes. Usando de espontaneidade, mencionou que não havia qualquer autorização para a máquina em causa se encontrar no estabelecimento, sendo que naquela localidade e com o nome em causa apenas existe este estabelecimento. A factualidade descrita em E) a O) resultou demonstrada com base no cotejo do teor do auto de notícia de fls. 64 e 73, das fotografias de fls. 67, 79 e 80, do auto de apreensão de fls. 66 e 77, dos exames periciais de fls. 124 e 130, dos talões de fls. 68 e 83, do manuscrito de fls. 68 verso, 81 e 82, do depósito de fls. 84 e da cópia do cartão de fls. 105 e 106 com as declarações produzidas pelo militar NC_____ em audiência de discussão e julgamento. Com efeito, o militar da Guarda Nacional Republicana, prestando um depoimento espontâneo e firme, relatou ao tribunal que na data e hora mencionadas a fls. 64 (que confirmou tratar-se da situação em causa nos autos, tanto mais que, conforme o depoente mencionou, apenas nesta ocasião esteve neste local) deslocou-se ao estabelecimento comercial aí indicado no âmbito de uma acção de fiscalização. Identificou-se como sendo militar da Guarda Nacional Republicana, tendo encontrado as duas máquinas que apreendeu (conforme auto de fls. 66), explicitando que a máquina tipo roleta se encontrava sobre o balcão e a outra máquina encontrava-se numa sala cuja porta se encontrava aberta e com mesas e cadeiras dispostas, sem qualquer menção a espaço privado ou inacessível ao público. Por conseguinte, qualquer pessoa poderia aceder ao espaço em questão, embora no momento não estivessem ali clientes. Com firmeza, referiu que a arguida não forneceu os códigos de acesso às máquinas quando solicitada para o efeito, tendo mencionado que era o seu irmão quem tratava das questões das máquinas, tendo o mesmo comparecido no local e contactado telefonicamente uma terceira pessoa que também não forneceu os códigos, tendo a arguida mencionado que o seu irmão não tem qualquer responsabilidade no estabelecimento em causa nos autos. NC_____ acrescentou que procederam ao arrombamento das máquinas tendo encontrado, numa delas, a quantia mencionada no depósito de fls. 84. Espontaneamente, referiu que a arguida não possuía qualquer autorizaço para deter as referidas máquinas, as quais confirmou tratarem-se das que constam a fls. 67, tendo-as identificado logo antes de saírem do estabelecimento com a caneta tipo corretor conforme consta das fotografias de fls. 124 e 130. Usando de determinação, o militar mencionou que fls. 81 e 82 correspondem a manuscritos que se encontravam no interior do balcão junto à caixa, os quais apreendeu por geralmente corresponderem à repartição do lucro obtido com as máquinas. Do cotejo da prova produzida e atento o modo espontâneo, firme e circunstanciado com que os militares da Guarda Nacional Republicana prestaram o seu depoimento, tendo a arguida admitido explorar o estabelecimento à data dos factos (o que aliás é corroborado pelo teor de fls. 69 que o militar NC_____ confirmou ter sido obtido no momento da fiscalização) não tendo pretendido prestar mais declarações a respeito da demais factualidade descrita na acusação, ficou o tribunal convencido da demonstração da factualidade elencada. Refira-se que o nuipc 69/18.1F1EVR corresponde a um inquérito que foi incorporado nos presentes autos por despacho de fls. 59. No que tange às condições sócio-económicas da arguida, o tribunal tomou em consideração as declarações por aquela prestadas por se afigurarem verosímeis, atendendo à forma espontânea e clara com que foram produzidas. Relativamente aos antecedentes criminais, o tribunal valorou o certificado do registo criminal junto aos autos.». *** *** V–Fundamentos de direito: 1–Nulidade prevista nos artigos 374º/2 e 379°/1-a), do CPP: A arguida entende que a sentença recorrida cometeu a nulidade prevista no artigo 374º/2 e 379º/1-a) do CPP mediante três fundamentos distintos, a saber: i- « Quanto aos factos provados A) a U) por referência à Recorrente, nenhuma prova foi produzida que permitisse à decisão recorrida considerá-los, o que origina a nulidade prevista na al. a) do n.º 1 do art.º 379.º do CPP por violação do art.º 374.º, n.º 2 do CPP»; ii- A omissão da análise do facto essencial que é a prova da data da execução dos ficheiros no hardware apreendido (o que não sucedeu) e que permitiria colocar em desenvolvimento os aludidos jogos descritos nos factos provados A) a U), em momento anterior às fiscalizações e apreensões desses mesmos equipamentos, constitui, também ela (omissão), uma outra nulidade, por violação do n.º 2 do art.º 374.º do CPP, constituindo, em simultâneo, erro de julgamento, ou conduzindo à verificação de erro de julgamento». iii- «A Recorrente entende que foi violado (…) o art.º 374, n.º 2 do CPP (…) porque não existe prova concludente de que os equipamentos tenham desenvolvido jogos de fortuna ou azar antes da fiscalização e apreensão e antes da intervenção dos peritos em sede de perícia (nem aqui os equipamentos apresentaram esse género de jogos ou foram sequer identificadas as datas concretas em que o ficheiros responsáveis pelos desenvolvimentos dos mesmos foram executados, porque, conforme já se disse e repetiu os equipamentos não permitem o desenvolvimento desses aludidos jogos).» O artº 374º/2 reporta-se à exigência de fundamentação da sentença, quer de facto quer de direito. Essa falta de motivação, a verificar-se, determina a nulidade da peça, por força do artº 379º/1-a). Falta de fundamentação não se confunde com discordância de fundamentação. A nulidade em apreço acontece, no campo da fundamentação de factos provados, sempre que a sentença não explique, ainda que de forma sintética, os factos e os raciocínios que utilizou como fundamento da aquisição desses factos. A omissão só acontece quando ocorre falta de menção da fundamentação. Esta é, portanto, a questão que urge apreciar. i e iii- O entendimento de que não há prova sobre os factos contidos nos pontos A a U da enumeração dos factos provados, ou sobre se os equipamentos desenvolveram jogos de fortuna e azar antes da fiscalização, nos termos em que o recurso se mostra redigido, está dependente do pedido de reapreciação de prova formulado, sendo que nunca seria fundamento de nulidade de sentença mas, quanto muito de alteração do provado com a consequente reapreciação sobre se ocorreu, ou não, a prática de crime, pois que a sentença contem fundamentação adequada e suficiente à consideração dos factos impugnados como provados. ii- A prova da data da execução dos ficheiros é irrelevante porque o tipo de crime se preenche pela exploração de jogos de fortuna e azar sem licença, exploração essa que se basta à exposição dos referidos jogos para uso dos clientes, independentemente da utilização efectiva que deles tenham feito. O crime consuma-se pela exposição em qualquer estabelecimento, ainda que seja completamente destituído de clientela. Face ao exposto, improcede a questão em apreço. *** 2-Violação do artigo 356°/7 do CPP: A recorrente entende que foi violado o referido normativo porque « As próprias testemunhas e a decisão recorrida reconhecem que a prova resulta, no âmbito da audição daquelas, de conversas obtidas pelas testemunhas no âmbito da fiscalização operada, sem que para isso seja especificado em que qualidade. Ora estas conversas não podem ser reproduzidas em sede de julgamento, uma vez que a Recorrente exerceu o direito ao silêncio, a acrescer o facto de as testemunhas não tomaram conhecimento directo e pessoal com determinados factos, antes receberam informações da Recorrente, que as reproduziram nos autos de notícia, ao mesmo momento em que aquela era Arguida. As testemunhas sobre os factos que lhe foram relatados pela Arguida, falam pela "boca do arguido" o que equivale a dizer que essas passagens não podiam ser valoradas pela decisão recorrida e foram-no, em violação do n.° 7 do art.° 356.° do CPP. » A questão é manifestamente improcedente. Em primeiro lugar a arguida prestou declarações em audiência como consta da respectiva acta. Em segundo lugar não refere a arguida que declarações proibidas foram essas que foram tomadas em consideração em sede de apreciação da prova, o que inviabiliza a análise sobre o assunto. Em terceiro lugar, apreciada a fundamentação da aquisição probatória, dela não consta que tenham sido consideradas quaisquer declarações abrangidas pela referida proibição de prova. *** 3-Impugnação do provado de A) a U) e erro notório na apreciação da prova: A arguida impugna expressamente todo o provado, de A) a U) invocando, à vez, dois institutos jurídicos: o erro notório na apreciação da prova e o disposto no artigo 412º/CPP que define o regime de reapreciação de prova em recurso. Na realidade há duas formas de ataque à matéria de facto: ou pela invocação de vícios ou por um pedido de reapreciação. Os primeiros subordinam-se à disciplina do artº 410º/2, do CPP e a segunda à disciplina do artº 412º/3 e 4 do mesmo diploma. A recorrente invocou erro notório na apreciação da prova e remeteu para o artº 410º/CPP, o que tem que ser entendido apenas na parte da norma respeitante ao vício invocado, ou seja, quanto ao disposto no nº 2 alínea c). Na impugnação restrita (artº 410º/CPP), a apreciação dos vícios atem-se, exclusivamente, à letra da decisão, só por si ou conjugada com regras de experiência comum, não interferindo na análise quaisquer outros dados, ainda que resultantes do julgamento ou documentados nos autos; na situação da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artº 412º/CPP, a apreciação pretendida implica uma reapreciação da prova produzida e documentada, dentro dos condicionalismos legais, aí referidos. No caso, a recorrente estruturou o seu pensamento extravasando do âmbito da literalidade da sentença e alicerçando a impugnação do provado exclusivamente na sua opinião sobre a valoração que deveria ter sido feita da prova produzida, que é discordante daquela que fez o Tribunal recorrido. A recorrente longe de se ater à literalidade da decisão recorrida, estruturou o seu recurso como uma discordância dos factos e da condenação aí contidas e fundamentou-se, essencialmente, numa valoração da prova mediante um descrédito absoluto àquilo que foi o depoimento das testemunhas, que transcreveu. Pretende que os factos sejam todos reapreciados à luz desse descrédito, que provem unicamente de uma discordância sua sobre factos que foram afirmados pelas mesmas. Conclui-se, pois, que a impugnação que deduz não tem cabimento no regime dos vícios de sentença mas apenas poderia ter a ver com um pretenso erro de julgamento, do âmbito exclusivo da reapreciação de prova, regida pelo artº 412º/CPP. Só que a formulação válida de um pedido de reapreciação depende do cumprimento de requisitos de forma e de substância. No que se refere a requisitos formais, o recorrente que queira ver reapreciados determinados pontos da matéria de facto tem que dar cumprimento a um duplo ónus, a saber (artº 412º/3 e 4, do CPP): - Indicar, dos pontos de facto, os que considera incorrectamente julgados – o que só se satisfaz com a indicação individualizada dos factos que constam da decisão, sendo inapta ao preenchimento do ónus a indicação genérica de todos os factos relativos a determinada ocorrência ou, mais ainda, de todos os factos considerados provados; - Indicar, das provas, as que impõem decisão diversa, com a menção concreta das passagens da gravação em que funda a impugnação – o que determina que se identifique qual o meio de prova ou de obtenção de prova que impõe decisão diversa, que decisão se impõe face a esse meio de prova e porque se impõe. Caso o meio de prova tenha sido gravado, a norma exige a indicação do início e termo da gravação e a indicação do ponto preciso da gravação onde se encontra o fundamento da impugnação (as concretas passagens a que se refere o nº 4 do artº 412º/CPP). O que se pretende é a delimitação objectiva do recurso, com a fundamentação da pretensão e o esclarecimento dos objectivos a que o recorrente se propõe. Impõe-se-lhe o dever de tomar posição clara, sobre o objecto do recurso, especificando o que, no âmbito factual, pretende ver reponderado, especificando as provas que devem ser renovadas (alínea c) do nº 3 do artigo 412º/CPP). Apreciados os termos do recurso, logo se percebe que a recorrente jamais ensaiou, sequer, a enunciação dos concretos pontos de facto que considerada incorrectamente julgados. Remete para todos os pontos de factos nos quais se contem toda a factualidade penalmente relevante para a apreciação do mérito da causa, circunstancial e mesmo a relativa às suas condições pessoais, económicas e antecedentes criminais. O que a recorrente pretende é efectivamente retirar da sentença todo e qualquer facto, independentemente da prova produzida, como se o processo se resumisse a uma série de documentos e actos sem qualquer relevância jurídica. Para isso transcreve a pretensa prova produzida, de fio a pavio, desde a identificação das testemunhas até à sua dispensa, como se fosse ónus do Tribunal de recurso procurar nessa produção de prova quaisquer erros ou fundamentos que sirvam o propósito do recurso, que ela se dispensa de fundamentar em termos juridicamente aptos a produzir quaisquer efeitos. Mas, mais do que ónus formais, uma qualquer reapreciação pressupõe que a argumentação aduzida tenha a virtualidade de impor solução distinta daquela que foi acolhida pelo Tribunal recorrido. O recurso da matéria de facto vem concebido pela lei como remédio jurídico e não como instrumento de refinamento jurisprudencial ([3]). Dito de outro modo o recurso da matéria de facto não foi concebido como instrumento ao serviço da realização de novo julgamento, com reapreciação de toda a prova que fundamenta a decisão recorrida, como se o julgamento efectuado na primeira instância não tivesse existido. Trata-se, tão-somente, de um instrumento concebido para a correcção de erros de julgamento e de procedimentos, devidamente discriminados pelas partes ([4]). A intromissão da Relação no domínio factual cingir-se-á a uma intervenção "cirúrgica", no sentido de delimitada, restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correcção, se for caso disso, e apenas na medida do que resultar do filtro da documentação. «O tribunal superior procede então à reanálise dos meios de prova concretamente indicados (ou as questões cuja solução foi impugnada) para concluir pela verificação ou não do erro ou vício de apreciação da prova e daí pela alteração ou não da factualidade apurada (ou da solução dada a determinada questão de direito» ([5]). A doutrina e jurisprudência penais entendem que a reapreciação da prova, na segunda instância, deverá limitar-se a controlar o processo da convicção decisória da primeira instância e da aplicação do princípio da livre apreciação da prova, tomando sempre como ponto de referência a motivação da decisão. Na apreciação do recurso da matéria de facto, o Tribunal de segundo grau vai aferir se a convicção expressa pelo Tribunal recorrido tem suporte adequado naquilo que a gravação da prova (com os demais elementos existentes nos autos) pode exibir perante si e, consequentemente, a Relação só pode alterar a decisão sobre a matéria de facto em casos excepcionais, de falta desse suporte. Assim, a reapreciação só pode determinar alteração à matéria de facto assente se o Tribunal da Relação concluir que os elementos de prova impõem uma decisão diversa e não apenas permitem uma outra decisão. Os condicionamentos ou imposições a observar no caso de recurso de facto, referidos nos nºs 3 e 4 do artigo 412° constituem mera regulamentação, disciplina e adaptação aos objectivos do recurso, já que a Relação não fará um segundo julgamento de facto, mas tão só o reexame dos erros de procedimento ou de julgamento, que tenham sido referidos no recurso e às provas que imponham (e não apenas sugiram ou permitam outra) decisão diversa, indicada pelo recorrente. Ora, a impugnação aduzida tem por fundamento uma reapreciação da prova produzida com recurso exclusivo à valoração que a recorrente faz dos depoimentos das testemunhas, que afirmam os factos que ela vem negar, em verdadeiras argumentações filosóficas porquanto desprovidas de qualquer relação com a prova produzida. Nas transcrições feitas a arguida encontrará resposta às questões que coloca quanto à actuação dos agentes, designadamente quanto à verificação das máquinas, à sua situação, à identidade entre as máquinas apreendidos e as peritadas, aos factos de as máquinas se encontrarem operacionais – um dos agentes até referiu ter utilizado uma delas -, etc. Nos relatórios periciais encontra a resposta às demais questões que coloca, designadamente acerca da forma de funcionamento das máquinas, dos jogos que tinham instalados e que tinham tido instalados (porque foram apagados do disco rígido, mas mantiveram registo informático), do facto de terem sido executados – em datas próximas à apreensão, inclusive, o que se confirma pela existência de dinheiro nas máquinas, na altura dessa apreensão. Nitidamente, a recorrente ignora a prova produzida, a não ser para a descredibilizar, mediante considerações genéricas sem suporte algum no provado. A questão é de mera e pura discordância da valoração probatória feita pelo Tribunal recorrido, sem argumentação que imponha, de qualquer forma, a consideração de que essa valoração violou norma expressa ou não tem suporte na prova produzida. Temos então por assente, que para além de inobservados os ónus formais, a fundamentação exarada pela recorrente não tem a virtualidade de produzir uma alteração do provado, o que determina a manutenção do mesmo, nos precisos termos em que foi decidido. *** No que concerne à existência de erro notório na apreciação da prova a arguida coloca a questão de que, por não se ter visualizado as máquinas em funcionamento, não existir certeza quanto à sua operacionalidade nem quanto ao concreto modo de funcionamento dos jogos. O que está em causa é a pretensa violação de regras sobre prova vinculada, mediante a consideração de que a presunção iuris tantum que a norma atribui aos juízos técnicos inerentes à prova pericial não se aplica, no caso concreto, aos factos descritos no provado, pois que eles (isto é, a descrição do modo de funcionamento das máquinas enquanto máquina que desenvolvem jogos de fortuna e azar ) não resultaram da observação daquelas concretas máquinas em funcionamento, mas de conhecimentos adquiridos pelos peritos face à observação do funcionamento de máquinas em tudo idênticas. Esta invocação pressupõe, desde logo, que se tenha atribuído ao resultado do exame pericial valor probatório vinculado, eximido à livre apreciação do Juiz por força da aplicação do artº 163º/CPP. Conforme consta dos factos provados, as máquinas em causa, finalizado o arranque, apresentavam no menu temáticas de jogos, todos eles de diversão. Contudo, analisados os respectivos discos-rígidos, continham ficheiros que desenvolviam os jogos referidos, nos termos contidos no provado. Não obstante o desconhecimento pelos peritos dos códigos que permitiam a visualização dos mesmos a desenvolverem-se tal não inquina o valor pericial e o provado. A fundamentação relativa ao modo de funcionamento das máquinas remete para os relatórios periciais, o que significa que se acolheram esses juízos técnicos, por sua natureza sujeitos ao valor probatório vinculado, que a lei lhe atribui, em contraposição com o princípio geral de livre apreciação (artºs 163º e 127º/CPP). Os relatórios periciais, para que a fundamentação remete, contêm, entre o mais, a descrição e caracterização das máquinas (na sua aparência e componentes) e a descrição do respectivo funcionamento, a partir das suas características e das características do software que lhes está inserido, capítulo em que se dá conta da falta dos códigos que activam os jogos. A recorrente funda o alegado erro no facto de o perito não ter relatado o funcionamento das máquinas a partir de constatações retiradas da observação delas em efectivo funcionamento. Ora, salvo melhor entendimento, a questão é falaciosa. Não foi pedido um exame à máquina, nem o relatório para que a fundamentação de facto remete se reporta a qualquer exame. Foi pedida uma perícia e o relatório para o qual a fundamentação de facto da sentença remete é precisamente o relativo ao resultado dessa perícia. A diferença é absolutamente determinante: no caso do exame, que é um meio de obtenção de prova, o que se requer é a pura descrição do objecto de prova examinado (em funcionamento, ou não), em resultado da observação presencial feita pelo examinador. Exige-se-lhe que o descreva, fazendo menção dos pormenores captáveis pelos sentidos. No caso de uma perícia, que é ela própria um meio de prova, visa-se a aplicação de especiais conhecimentos técnicos ou científicos a determinado objecto da prova, para que, através dessa avaliação se possa concluir, com elevado grau de certeza, um facto até aí desconhecido. A perícia supõe a aplicação de especiais conhecimentos técnicos ou científicos a um determinado objecto de prova para daí se retirar, com a segurança adequada à exigida aos meios de prova, se determinado facto com relevo para a prática do crime, ocorreu e em que termos ocorreu, para o que é irrelevante saber como foram adquiridos os especiais conhecimentos (se por formação académica, estudo científico, ou outra forma). Porque se trata de um meio de prova fundado em juízos técnico/científicos é-lhe atribuído um valor probatório reforçado. Parte-se do princípio que os conhecimentos técnicos aplicados são de tal modo especiais que não se compadecem com o princípio da livre apreciação da prova. Em consequência, só são susceptíveis de ser arredados, quando rebatidos numa fundamentação suficientemente convincente assente, também ela, em razões da mesma ordem técnica ou científica. Manifestamente o Tribunal recorrido aceitou como bom o resultado da perícia no que se reporta ao funcionamento das máquinas, porque para elas remeteu, sem sequer tentar rebatê-la, ou manifestar divergência quanto aos factos em que se apoiou. E fê-lo de forma que não merece reparo. É que aquilo que foi acolhido na sentença, com base nas perícias, são factos que resultam da aplicação à análise das máquinas dos falados especiais conhecimentos técnicos. Não resultam de nenhuma observação empírica do funcionamento das máquinas, porque aí estaríamos no âmbito do puro exame, aliás num dos casos efectuado por um dos agentes da GNR, conforme consta da transcrição das suas declarações feita pela recorrente, mas, repete-se, do resultado da aplicação de conhecimentos especializados a uma dada realidade de facto, de modo a perceber como ela funciona ou está apta a funcionar. Uma perícia não se limita à descrição do funcionamento de algo conhecido. Porque se baseia na aplicação de conhecimentos técnicos inquestionados a uma dada realidade, nada obsta a que se conclua por determinada forma de funcionamento (no que ao caso interessa) independentemente de o objecto de prova ter sido posto a funcionar ou não. Aliás o interesse da perícia está precisamente na percepção daquilo que, não tendo sido objecto de directa observação, só se pode percepcionar mediante a aplicação de regras de ordem técnica ou científica, fora do alcance do homem comum, a dada realidade de facto. Não se exige, por exemplo, que o perito que elabora um relatório de autópsia, onde se caracterizam determinados golpes de faca, tenha presenciado a forma como eles foram desferidos. O que se lhe pede é que, face ao estado do seu conhecimento científico, descreva aquilo que é viável que tenha acontecido face aos vestígios deixados, esses sim, susceptíveis de análise e estudo. E foi algo semelhante com isso que aconteceu, no caso dos autos. Perante as características das máquinas (e dos respectivos “softwares” inseridos), ou seja, os mecanismos que a compõem, os peritos, mediante a aplicação dos seus especiais conhecimentos técnicos, concluiram que elas funcionavam de determinada maneira, que descreveram. É absolutamente irrelevante ao caso saber se viram, ou não, estas precisas máquinas a funcionar. O que releva é que, face às características observadas nas máquinas e àquilo que são as regras de funcionamento de sistemas com características semelhantes, se concluiu, num juízo puramente pericial, que elas estão aptas a funcionar de determinado modo, que os peritos descreveram. Resta concluir que, tratando-se do resultado de um relatório pericial em que a aquisição probatória feita se reporta aos juízos técnicos formulados relativos ao modo de funcionamento das máquinas, quando activadas pelos códigos correspondentes ao software que têm incorporado, é absolutamente irrelevante alguém tê-las observado em efectivo funcionamento, pelo que a aplicação do valor probatório vinculado a que respeita o artº 163º/CPP está absolutamente justificada. Aliás, a argumentação do recorrente reconduzir-se-ia a que, sempre que apreendida uma máquina sem que se conheçam os códigos activadores do sistema, a averiguação da aptidão para o funcionamento como meio de jogo estava prejudicada porque, ou a máquina não trabalhava sem os ditos códigos, ou, ao substituírem-se os mesmos, se estaria a produzir uma modificação nas máquinas. Assim se descobria a “pólvora” quanto à inviabilização da aquisição de elementos de prova indispensáveis à caracterização dos materiais apreendidos! Não há violação de norma probatória especial e, consequentemente, decai a invocada questão. *** 4–Violação dos artigos 127º do CPP e 108° do DL 422/89: A recorrente entende que há violação das normas supra citadas em decorrência do pedido de reapreciação da prova. Refere ela que «Dúvidas não restam de que os factos que serviram para condenar a Recorrente deverão ser dados como não provados, pois não se pode concluir a sua participação com fundamento nas regras da experiência comum. Estamos, assim, perante uma situação de não verificação do elemento subjectivo do crime de exploração ilícita de jogo, por falta absoluta de prova, existindo apenas ilações e presunções por parte do Tribunal a quo no que a esta matéria diz respeito. Violando, assim, o Tribunal a quo o art.° 127.° do C. P. P., dado que utilizou as regras de experiência comum numa situação em que se encontrava vedada essa possibilidade, - vide neste sentido Acórdão <a href="https://acordao.pt/decisoes/122668" target="_blank">21/08.5FDCBR.C2</a>, o Acórdão do STJ no 04/2010, entre outros. A douta sentença recorrida violou, assim, as normas constantes dos arts. 127° do C. P. P.; 1.°, 3.°, 4.°, e 108.° do D. L. 422/89, assim como os principio da presunção de inocência do arguido e do "in dubio pro reo".» Na verdade, a pressuposta violação dos normativos invocados, carece de fundamentação. No que concerne à pressuposta violação do princípio da livre apreciação, ele foi devidamente aplicado pois que, conforme a arguida refere, o elemento subjectivo de qualquer crime apenas é susceptível de ser apurado mediante prova indirecta, ou seja, por presunções retiradas dos factos materialmente executados pelo agente. Não há prova directa sobre intenções, vontade ou conhecimento de circunstâncias. O que há é uma apreciação da globalidade dos factos materiais praticados, à luz das regras da experiência comum, que permite ao julgador ter a percepção sobre a existência no agente da vontade de os praticar, da liberdade de acção e do conhecimento da sua contrariedade à lei. Sendo a arguida a proprietária e a pessoa que explorava o estabelecimento, estando as máquinas situadas nesse mesmo estabelecimento, prontas a ser usadas, com dinheiro dentro o que significa que tinha sido efectivamente usadas, não é admissível que a arguida, pessoa a quem não são conhecidas anomalias de capacidade intelectiva, não soubesse do que se tratava, tanto mais que em 2014 já tinha sofrido condenação por idêntico crime. Dir-se-á que decidiu mesmo que o crime compensava. No que concerne à violação do artigo 108º do DL 422/89, a arguida não apresenta qualquer fundamentação, sendo a questão manifestamente improcedente. *** 5–Violação dos princípios da presunção de inocência e do in dubio pro reo: A recorrente fundamenta a questão dizendo que « Na Douta Sentença, menciona-se por diversas vezes em sede de fundamentação a aplicação das regras de experiencia comum, no entanto entende a Recorrente estarem violados os PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E O PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO, dois princípios que andam intimamente ligados entre si e se completam e fundamentam o acima vertido, porquanto em sede de inquérito o titular do mesmo e depois em julgamento, o julgador não entendeu que as máquinas dos autos contivessem jogos de fácil percepção, requisitando os serviços de um perito para que viesse aos autos transmitir para que serviria o objecto apreendido, acaso assim não tivesse sido, nunca a douta decisão recorrida se serviria da perícia para fundamentar ou motivar o funcionamento do equipamento. ». Se bem interpretamos, a questão resume-se a que a fundamentação da aquisição probatória em regras de experiência colide com a necessidade de peritagem das máquinas. A peritagem foi feita e é um meio de prova que não se sujeita à livre apreciação, conforme foi referido. No demais, está por explicar em que termos ocorre tal colisão – que não existe, pois que a sentença usa as duas formas de aquisição probatória em momentos e para factos distintos – e em que termos ela colide com os princípios invocados, extravasando da competência deste Tribunal a apreciação de eventualidades que não correspondam a questões efectivamente colocadas, definidas e fundamentadas. *** VI–Decisão: Acorda-se, pois, negando provimento ao recurso, em manter a decisão recorrida nos seus precisos termos. Custas pelo recorrente, com taxa de justiça de 4 ucs. (Texto processado e integralmente revisto pela relatora). Lisboa, 03/ 12/2020 Maria da Graça dos Santos Silva A. Augusto Lourenço _______________________________________________________ [1] Cf. Germano Marques da Silva, em «Curso de Processo Penal», III, 2ª edição, 2000, pág. 335, e Acs. do S.T.J. de 13/5/1998, em B.M.J. 477-º 263; de 25/6/1998,em B.M.J. 478º-242 e de 3/2/1999, em B.M.J. 477º-271. [2] Cf. Artºs 402º, 403º/1, 410º e 412º, todos do CPP e Ac. do Plenário das Secções do S.T.J., de 19/10/1995, D.R., I – A Série, de 28/12/1995. [3] Cf. Simas Santos e Leal Henriques, em “Recursos em Processo Penal” 7ª edição, actualizada aumentada, 2008, pág. 105. [4] Cf Ac. do TC n 59/206, de 18/01/2006, no proc. 199/2005, em www.tribunalconstitucional.pt, e Acs. dos STJ de 27/01/2009, e de 20/11/2008, tirados respectivamente nos procs. 08P3978 e 08P3269, em www.dgsi.pt, e de 17/05/2007, na CJSTJ, 2007, II, 197. [5] Cf. Ac TC. Nº 59/2006, de 18 de Janeiro de 2006, proferido no processo n° 199/05, da 2.a secção, publicado no DR - II Série, de 13-04-2006.
Acordam os Juízes, em conferência, na 3ª Secção Criminal, deste Tribunal: *** I–Relatório: Em processo comum, com intervenção do Tribunal a arguida SP______, foi condenada pela prática, em autoria material, concurso real e na forma consumada, de dois crimes de exploração ilícita de jogo de fortuna ou azar, previstos e punidos pelo artigo 108º/1 e 2, do Decreto-Lei 422/89, de 2 de Dezembro, nas penas respectivas de quatro meses de prisão e cem dias de multa, à razão diária de €5,50, e de cinco meses de prisão e cento e cinquenta dias de multa, à razão diária de €5,50. Em cúmulo jurídico foi condenada na pena única de oito meses de prisão, substituída por duzentos dias de multa, à razão diária de €5,50, num total de €1.100 e na pena única de duzentos dias de multa, à razão diária de €5,50, num total de € 1.100, o que perfaz a multa global de €2.200. Declararam-se perdidas a favor do Estado as máquinas apreendidas e as quantias pecuniárias depositadas à ordem dos presentes autos. *** A arguida recorreu, concluindo as alegações nos termos que se transcrevem: « I.–A Arguida não se conforma, quer da matéria de facto dado como provada, quer da matéria de Direito e ainda das penas que lhe foram aplicadas, relativamente ao crime pelo qual foi acusada, crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artigo 108.° n.° 1 e 2 do Decreto-Lei n.° 422/89, de 2 de Dezembro, considerando não ter sido devidamente levado em conta a prova produzida e não produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, tendo mesmo sido apreciada de forma errada aquando da motivação da decisão sobre a matéria de facto. II.–Os factos considerados provados e constantes da Douta Sentença são a cópia integral da Douta Acusação Pública!!! Sem que tivesse sido levado em linha de conta que, ao inquirir as testemunhas, a Sra. Procuradora não individualizou o processo sobre os quais as questionava, considerando que os autos, são compostos por duas intervenções inspectivas realizadas em dias diferentes!!!! III.–Cumprindo o disposto no artigo 412.°, n.° 3 do CPP, os pontos que foram incorretamente julgados e que impõem decisão diversa da recorrida foram os pontos A) a U) dos factos dados como provados. Devendo tais factos serem dados como não provados, absolvendo-se a Arguida dos crimes. IV.–O Tribunal “a quo” limitou a sua convicção quanto aos factos provados baseando-se nas regras de experiência comum, inclusive das testemunhas, cujo critério jamais poderá neste tipo de ilícito ser aplicado, considerando que estão em causa máquinas de diversão/jogo que deverão obrigatoriamente passar por uma avaliação e peritagem técnica, provando-se que as máquinas apreendidas são as peritadas. V.– Por outro lado, os agentes da autoridade policial que foram ouvidos como testemunhas não correspondem às pessoas que efectuaram as perícias às máquinas (inspectores da ASAE e da inspecção de jogos que não prestaram nos autos qualquer depoimento) e, que no entender da Recorrente, mais não fizeram do que aprender as máquinas preventivamente (não viram as máquinas em funcionamento, aliás afirmado pelos mesmos que as máquinas estavam completamente inoperativas). VI.–Desconhece-se a forma como as máquinas foram apreendidas, se foram seladas ou como e quando foram enviadas para a peritagem. VII.–A Douta Sentença dá credibilidade aos depoimentos dos senhores agentes, bem como se alicerça em declarações que a Arguida terá supostamente prestado perante aqueles, já naquela qualidade processual, aquando da ação de fiscalização, tirando conclusões de meras "presunções" apresentadas por aqueles. VIII.–A identificação e ficheiros executáveis não faz com que esses ficheiros tenham sido executados, no estabelecimento, nem faz com que a Arguida tenha conhecimento dessa existência (dos ficheiros), nem faz com que haja responsabilidade criminal, não se podendo dar portanto como provados os pontos A) a U) dos factos provados. IX.–Ficou por demonstrar de forma cabal que os equipamentos desenvolviam efectivamente jogos de fortuna ou azar (apesar da sentença recorrida ter entendido que as perícias o ressalvaram ou evidenciaram, a verdade é que somente resulta das perícias a comparação com máquinas semelhantes e o que resulta da experiência comum), até porque as testemunhas ouvidas não as diferenciaram enquanto máquinas, computadores e em que situações concretas foram aprendidas e a que dia da apreensão diziam respeito, limitando-se a recorrer à experiência comum. X.–Dos testemunhos dos senhores agentes da autoridade não resulta que tenham visto as máquinas em jogo e a funcionar, confirmaram que as máquinas se encontravam inoperativas e que uma delas se encontrava num anexo sem acesso ao cliente. XI.–Existe erro notório na apreciação da prova quando esse erro é de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando o homem médio facilmente dele se dá conta. Por isso é notório e não só visível aos juristas. XII.–Entende a Recorrente que inexistem factos provados imputados à mesma, no que respeita à verificação dos elementos objectivo e subjectivo do tipo do crime em apreço e pelo qual foi condenada. As próprias testemunhas e a decisão recorrida reconhecem que a prova resulta, no âmbito da audição daquelas, de conversas obtidas pelas testemunhas no âmbito da fiscalização operada, sem que para isso seja especificado em que qualidade. XIII.– Conversas aquelas que, não podem ser reproduzidas em sede de julgamento, uma vez que a Recorrente exerceu o direito ao silêncio, a acrescer o facto de as testemunhas não tomaram conhecimento directo e pessoal com determinados factos, antes receberam informações da Recorrente, que as reproduziram nos autos de notícia, ao mesmo momento em que aquela era Arguida. As testemunhas sobre os factos que lhe foram relatados pela Arguida, falam pela "boca do arguido" o que equivale a dizer que essas passagens não podiam ser valoradas pela decisão recorrida e foram-no, em violação do n.° 7 do art.° 356.° do CPP. XIV.– Acresce ao alegado (da falta de visualização de jogos de fortuna ou azar e quais, pelos autuantes e peritagem) que a Douta Sentença recorrida esgrima ainda o argumento de que os aludidos jogos não foram colocados em funcionamento e a confirmar esta alegação surge o relatório pericial que menciona não ter sido possível a visualização de qualquer jogo de fortuna ou azar no equipamento em questão; nos factos provados A) a U), decide-se que os equipamentos desenvolviam esses denominados jogos e na fundamentação, argumenta-se que das perícias se extrai que foram localizados, na análise aos discos rígidos dos computadores ficheiros informáticos que permitem o desenvolvimento desses aludidos jogos, mas, não se refere nessas perícias, o que era de esperar que se referisse, e que sustentaria a decisão da sentença recorrida, e que é um facto essencial que se traduziria na informação constante dos discos rígidos dos pcs, que demonstrasse ao tribunal recorrido em que dia, hora, minuto e segundo os aludidos jogos de fortuna ou azar teriam sido executados; esta era e é uma informação essencial para que pudesse ocorrer a sustentação dos factos provados referidos, mas se observarmos a perícia, esta informação não se encontra na mesma e porquê? Porque pura e simplesmente os aludidos jogos de fortuna ou azar descritos nos factos provados mencionados nunca foram desenvolvidos nos computadores apreendidos à ordem destes autos! Mais os equipamentos apreendidos eram portáteis pelo que poderiam ser ligados em qualquer lado, o facto de se encontrarem no estabelecimento não se infere que tenham sido utilizados ilicitamente nesse espaço. XV.–Ouvidos os agentes de autoridade que levaram a cabo as acções de fiscalização no estabelecimento em causa, os mesmos declararam a similitude das acções de fiscalização que desenvolveram ao longo dos anos. Remetendo a descrição dos supostos jogos para fotogramas.... Declarando sempre que as acções de fiscalização se desenvolvem de forma mecanizada, pouco específica, centrada num rol de procedimentos "habituais" que, no entender da Recorrente e na esmagadora maioria delas, inquinou a recolha de provas e informação nos presentes autos. XVI.–Não foram carreados para os autos quaisquer elementos probatórios quanto à realidade dos factos anteriores à fiscalização, pelo que se desconhece se e por quanto tempo as máquinas encontradas já se encontrariam nos correspondentes locais ou se de facto foram utilizadas. XVII.–No mesmo sentido, apesar de ter sido testemunhado que se mostravam ligadas à corrente eléctrica, desconhece-se se a actividade que as mesmas terão desenvolvido ocorreu no estabelecimento comercial onde foram encontradas. XVIII.–Analisando o teor dos relatório periciais, o Tribunal a quo considerou provadas as características do hardware ali descrito — características que foram apreendidas directamente pelo "examinador" —, e, no que se refere ao funcionamento das mesmas, apenas considerou como suficientemente demonstrada a existência de uma possibilidade de utilização do software encontrado: a clássica ligação à internet e a existência da possibilidade de desenvolver aplicações. No mais, já que não foi possível colocar em funcionamento os programas ali contidos, por falta de código ou palavra-passe e/ou por comprometimento dos ficheiros, pelo que não podia o Tribunal aceitar os juízos ali vertidos como inabaláveis por se tratarem de meras suposições com base em imagens de arquivo e histórico de anteriores análises realizadas. Máxime não podia o Tribunal considerar assente a conclusão de que as máquinas apreendidas desenvolviam jogos cujo resultado não depende da destreza ou qualidade do jogador: porque se tratam de juízos e conclusões formulados sem apoio em análise do funcionamento destas máquinas e meramente baseados em modos de funcionamento habituais de jogos com designação igual ou semelhante aos programas cujo acesso foi detectado em datas anteriores à apreensão da máquinas, estas não se podem mostrar suficientes, na perspectiva da Recorrente, para convencer inequivocamente o Tribunal a quo de que aquelas máquinas concretas desenvolveram, no estabelecimento identificado autos, jogos com as características que os poderiam enquadrar na classificação de fortuna ou azar. O teor dos documentos em referência mostra-se, pois, construído numa cascata de suposições e de raciocínios apenas fundados em casos semelhantes anteriormente identificados e analisados pelo respectivo autor, mas sem apoio em matéria de facto concreta suficiente recolhida no âmbito dos presentes autos para que se possa considerar que tais raciocínios não tenham sido levados a cabo sem quebras no encadeamento das premissas que levaram às apresentadas "conclusões". XIX.–Desta análise resulta a não prova dos factos descritos na Acusação. XX.–Nos presentes autos apenas se pode considerar provado que na data/local e circunstâncias consideradas assentes foram apreendidas máquinas em acção de fiscalização levadas a cabo pelos agentes de autoridade. XXI.–Não estão, assim, preenchidos os elementos objectivos e subjectivo típicos supra referidos. XXII.–Acresce que, devemos atentar ainda no facto de não ter ficado demonstrado, cabalmente, que a Recorrente, tinha, sequer, conhecimento da existência de quaisquer jogos proibidos naqueles equipamentos. XXIII.–Quanto aos factos provados A) a U) por referência à Recorrente, nenhuma prova foi produzida que permitisse à decisão recorrida considerá-los, o que origina a nulidade prevista na al. a) do n.° 1 do art.° 379.° do CPP por violação do art.° 374.°, n.° 2 do CPP. XXIV.–A utilização do chavão clássico de que pode ser dado como provado um facto desconhecido ou não provado, que tem por base um outro facto acessório conhecido e que ao desconhecido possa conduzir com segurança o julgador, não tem aqui aplicabilidade, pois que o conhecimento do interior do equipamento, da sua operacionalidade, da sua capacidade de receber descargas de ficheiros via net e da sua qualificação e classificação, são factos específicos e não acessíveis ao cidadão comum e por isso mesmo carecem de explicação de um perito, nomeadamente que esse perito e por referência a estes autos, tivesse, sem qualquer dúvida, demonstrado na perícia que os aludidos ficheiros informáticos existentes no disco rígido, tinham sido executados para desenvolvimento dos jogos de fortuna ou azar, naquele equipamento, momentos antes da fiscalização e da consequente apreensão e esta prova era essencial para a decisão de facto, cuja sindicância e impugnação se verte neste recurso. XXV.–A omissão da análise do facto essencial que é a prova da data da execução dos ficheiros no hardware apreendido (o que não sucedeu) e que permitiria colocar em desenvolvimento os aludidos jogos descritos nos factos provados A) a U), em momento anterior às fiscalizações e apreensões desses mesmos equipamentos, constitui, também ela (omissão), uma outra nulidade, por violação do n.° 2 do art.° 374.° do CPP, constituindo, em simultâneo, erro de julgamento, ou conduzindo à verificação de erro de julgamento. XXVI.–A Recorrente entende que foi violado o art.° 127.° do CPP; o art.° 374, n.° 2 do CPP; o art.° 108.° do DL 422/89, porque não existe prova concludente de que os equipamentos tenham desenvolvido jogos de fortuna ou azar antes da fiscalização e apreensão e antes da intervenção dos peritos em sede de perícia. Na Douta Sentença, menciona-se por diversas vezes em sede de fundamentação a aplicação das regras de experiencia comum, no entanto entende a Recorrente estarem violados os PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E O PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO, dois princípios que andam intimamente ligados entre si e se completam e fundamentam o acima vertido, porquanto em sede de inquérito o titular do mesmo e depois em julgamento, o julgador não entendeu que as máquinas dos autos contivessem jogos de fácil percepção, requisitando os serviços de um perito para que viesse aos autos transmitir para que serviria o objecto apreendido, acaso assim não tivesse sido, nunca a douta decisão recorrida se serviria da perícia para fundamentar ou motivar o funcionamento do equipamento. XXVIII.–Nessa medida está por demonstrar a verificação do dolo (que é especifico) na actuação que é imputada à Recorrente, sendo que este tipo de crime só é punível a título de dolo. XXIX.–Sobre a Arguida apenas consta da motivação da convicção do Juiz, o que foi dito pelas testemunhas, que não mais se trata de um depoimento indirecto que não pode ser admitido. XXX.–A decisão recorrida contém um erro notório na apreciação da prova, que impõe a modificação da decisão recorrida nos termos do artigo 437.°, alínea a), do CPP. XXXI.–Dúvidas não restam de que os factos que serviram para condenar a Recorrente deverão ser dados como não provados, pois não se pode concluir a sua participação com fundamento nas regras da experiência comum. XXXII.–A Arguida apela pela sua inocência e consequente absolvição. Se mesmo assim V.a Exas. não entenderem, é também excessiva a medida da pena concretamente fixada à Arguida, considerando que se trata de cidadã inserida social, profissional e familiarmente. XXXIII.–Sendo que, pelas razões e fundamentos supra elencados, caso a Arguida não venha a ser absolvida nesta instância, sempre a sua pena se deverá fixar pelos mínimos legais, considerando os seguintes dispositivos legais arts.° 70.° e 71.° ambos do Código Penal. Nestes termos e nos demais de Direito que Vossas Excelências, Venerandos Desembargadores, doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando a decisão recorrida que deverá ser substituída por outra consentânea com o ora alegado, assim fazendo a já costumada, justiça». *** Contra-alegou o Ministério Público, concluindo as respectivas alegações no sentido da improcedência do recurso. *** Nesta instância o Exmº Procurador-Geral Adjunto aderiu à resposta dada pelo MP na instância recorrida. *** II–Questões a decidir: Do artº 412º/1, do CPP resulta que são as conclusões da motivação que delimitam o objecto do recurso e consequentemente, definem as questões a decidir em cada caso ([1]), exceptuando aquelas questões que sejam de conhecimento oficioso ([2]). Não obstante o aperfeiçoamento das conclusões produzido pela recorrente não corresponder ao efectivo cumprimento do despacho produzido, na medida em que tirando pequenos excertos copiou as conclusões anteriores, que por sua vez são a cópia da motivação, o Tribunal conhecerá do recurso. As questões colocadas pela recorrente, arguida, são: - Impugnação do provado de A) a U); - Violação do artigo 356°/7 do CPP; - Nulidade prevista no artigo 379°/1-a), do CPP; - Violação dos artigos 127º e 374º/2 do CPP e 108° do DL 422/89; - Violação dos princípios da presunção de inocência e o princípio do in dubio pro reo. *** *** III–Fundamentação de facto: Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes os factos: A)- No dia 26 de Março de 2018, cerca das 11H30, no interior do estabelecimento comercial “ sito na Rua, Mafra, existia uma máquina electrónica sem qualquer referência exterior quanto à sua designação ou modelo, ligada à corrente eléctrica, em pleno funcionamento e à disposição dos clientes que ali se encontravam. B)- O referido estabelecimento comercial estava a ser explorado pela arguida, incluindo a exploração lucrativa dos jogos desenvolvidos na referida máquina. C)- Tal máquina permitia aos clientes desenvolver jogos do tipo “roleta electrónica”, cujos resultados dependem exclusivamente ou fundamentalmente da sorte e, consequentemente, qualificados como jogos de fortuna ou azar. D)- O jogo de roleta tem como objectivo conseguir que o ponto luminoso se imobilize num dos orifícios com direito a prémio, sendo que para tanto basta o jogador introduzir uma moeda no orifício existente para o efeito. As pontuações eventualmente alcançadas no jogo são posteriormente convertidas em dinheiro, à razão de €1,00 (um euro) por ponto. O jogo desenvolve-se da seguinte forma: após a introdução de uma das moedas aceites pela máquina, acendem-se automaticamente os doze pontos luminosos e é emitido um sinal sonoro, sendo que os pontos vão-se apagando até que o sinal sonoro termina. Daí podem suceder três situações, todos os pontos luminosos se apagam, terminando a jogada sem que o jogador tenha direito a prémio, um dos pontos luminosos identificados com números e letras fica aceso, ganhando o jogar os pontos correspondentes ou um dos pontos luminosos identificado com a imagem de uma estrela fica aceso e, nesse caso, a máquina emite um sinal sonoro, momento em que é atribuído ao jogador um determinado número de jogadas bónus ou é facultado ao mesmo o acesso a outro jogo. Nestes dois últimos casos, o jogador pode optar em continuar a jogar com os pontos ganhos ou terminar a jogada para conversão dos pontos ganhos. E)-No dia 26 de Maio de 2018, cerca das 19H05, no interior do mesmo estabelecimento comercial, existiam duas máquinas electrónicas sem qualquer referência exterior quanto à sua designação ou modelo, um delas (a tipo roleta) ligada à corrente eléctrica, e ambas em pleno funcionamento e à disposição dos clientes que ali se encontravam. F)-O referido estabelecimento comercial estava a ser explorado pela arguida, incluindo a exploração lucrativa dos jogos desenvolvidos na referida máquina. G)-A primeira máquina permitia aos clientes desenvolver jogos do tipo vídeo-rolos/slot machine (Halloween), bem como jogos do tipo vídeo-poker (Extra-Poker 2) e um jogo do tipo bingo (Nitroball) cujos resultados dependem exclusivamente ou fundamentalmente da sorte e, consequentemente, qualificados como jogos de fortuna ou azar. H)-O jogo de vídeo-rolos (slot machine) tem como objectivo obter combinações de símbolos premiados, descritos na tabela de prémios, e desenvolve-se da seguinte forma, após a introdução de créditos em jogo, são visualizadas cinco colunas e três linhas, perfazendo quinze símbolos com imagens alusivas ao respectivo tema. Escolhido o número de linhas e o número de créditos que se pretende apostar por cada linha, é iniciado o jogo, através do accionamento do botão. Os rolos (símbolos) giram e após detêm-se rapidamente, um de cada vez, sequencialmente, da esquerda para a direita. Quando todos os rolos estão imobilizados, ocorre uma de duas situações, ou não se obtém qualquer combinação premiada sob qualquer das linhas de aposta e termina a jogada, ou obtém-se uma combinação premiada, sob pelo menos uma das linhas de aposta e o jogador ganha os créditos correspondentes. I)-O jogo vídeo-póquer, tem como objectivo conseguir combinações premiadas, tais como sequência real, sequência numérica, sequência de cor, fullen, trios, pares. Para iniciar o jogo é necessária a introdução de créditos e, de seguida, é escolhido o valor que se quer apostar por jogada. Através do accionamento de um botão, é iniciado o jogo e surge então, em simultâneo, de forma aleatória e dispostas em linha no centro do ecrã 5 cartas de face voltada, cada uma destas pertencente a um baralho convencional, de entre as 52 cartas ou joker, que para efeito de combinações substitui qualquer carta. O jogador pode fixar algumas das cartas para aumentar a probabilidade de obter uma sequência premiada. De seguida, prossegue a jogada aparecendo novas cartas a substituir aquelas que não foram fixadas. Assim, pode acontecer que a combinação que saiu não seja premiada e nesse caso o jogo termina, ou pode a combinação que saiu ser premiada e cabe ao jogador optar entre receber os pontos obtidos ou duplicar os créditos ganhos, efectuando a dobra. J)-O jogo bingo, tem como objectivo conseguir determinados alinhamentos de números, que vão aparecendo de forma aleatória e dispostos num quadro. Para iniciar o jogo é necessária a introdução de créditos e, de seguida, é escolhida uma quantidade de cartões de um a quatro, após o que se efectua a aposta e é iniciado o jogo através do acionamento do respectivo botão, começando o sorteio aleatório de números ou bolas. Terminado o sorteio dos números, se existirem cartões com alinhamentos premiados, o valor dos prémios é adicionado no respectivo contador, podendo o jogador iniciar outra jogada. Caso contrário, o jogador nada ganha. K)-A segunda máquina era igual à descrita em C) e D). L)-A arguida não tinha autorização especial para explorar os jogos acima descritos naquele estabelecimento comercial. M)-Com a exploração das referidas máquinas de jogo conseguia a arguida receber os proveitos delas resultantes, sendo que a primeira e segunda máquinas descritas continham no seu interior os montantes de € 121,50 (cento e vinte e um euros e cinquenta cêntimos) e €2,00 (dois euros), respectivamente, em notas e moedas emitidas pelo Banco Central Europeu. N)-A arguida conhecia as características das máquinas e dos jogos que elas desenvolviam e sabia que tais jogos não dependiam da perícia ou destreza do jogador, não podendo ele influenciá-los pois o resultado apenas depende da sorte e, não obstante tal conhecimento, actuou com o propósito concretizado de permitir a sua colocação no estabelecimento supra identificado e de facultar o acesso do público às referidas máquinas a fim de a explorar economicamente. O)-Agiu sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei. P)-A arguida é empresária em nome individual, explorando o café-restaurante “O Burrito”, auferindo, mensalmente, a quantia de €600. Q)-A arguida é solteira e não tem companheiro. R)-A arguida tem dois filhos, com 5 meses e 4 anos de idades, que residem consigo, não auferindo qualquer pensão de alimentos. S)-A arguida reside com os filhos e com a sua progenitora em habitação arrendada, ascendendo o montante mensal da renda a €300. T)-A arguida frequentou o sistema de ensino até ao 9.° ano de escolaridade. U)-A arguida foi condenada, em 29/09/2015, pela prática, em 28/05/2014, de um crime de exploração ilícita de jogo, previsto e punido pelos artigos 1.°, 3.°, n.°1, 4.°, n.°1, alínea g) e 108.°, n.°1, todos do Decreto-Lei n.° 422/89, de 2 de Dezembro, numa pena de 1 mês de prisão substituído por 55 dias de multa, e uma pena de 85 dias de multa. *** Não há factos não provados *** IV–Fundamentação probatória: O Tribunal a quo justificou a aquisição probatória nos seguintes termos: « O tribunal estribou a sua convicção, no que concerne aos factos pelos quais a arguida vinha acusada, na prova documental junta aos autos e nas declarações produzidas pela arguida e pelas testemunhas LP_____(militar da Guarda Nacional Republicana) e NC______ (militar da Guarda Nacional Republicana) em sede de audiência de discussão e julgamento. A actividade desempenhada pela arguida, a firma do estabelecimento comercial que explora e a respectiva localização resultaram provados com base no teor de fls. 69 conjugado com as declarações produzidas pela arguida e pelas testemunhas LP_____ e NC_____ em audiência de discussão e julgamento. Efectivamente, a arguida admitiu pronta e espontaneamente ser a proprietária do estabelecimento comercial mencionado na acusação, explorando-o desde o ano de 2007 e até à actualidade. Por sua vez LP_____ referiu que aquando da sua deslocação ao estabelecimento começou por contactar com uma senhora que percebeu tratar-se da mãe da arguida, tendo a própria arguida comparecido no local quando se procedia à abertura da máquina. NC_____ foi peremptório em relatar ao tribunal que na sua deslocação ao estabelecimento que identificou no auto de fls. 64, identificou-se como sendo militar da Guarda Nacional Republicana e que ali se encontrava no âmbito de uma acção de fiscalização, tendo-se a arguida apresentado como sendo a responsável pelo estabelecimento. Do cotejo da prova produzida resultou pois demonstrada a referida factualidade. A prova da factualidade descrita em A) a D) e L) a O) resultou do cotejo do teor do auto de notícia de fls. 5, das fotografias de fls. 8 a 10, do auto de apreensão de fls. 11, do auto de abertura de fls. 12, do talão de depósito de fls. 15, da ficha de fls. 33 e do exame pericial de fls. 41 com as declarações produzidas pelo militar LP______ que, prestando um depoimento espontâneo e firme, relatou ao tribunal, evidenciando um conhecimento pessoal dos factos, que na data e hora mencionadas no auto de fls. 5, deslocou-se ao estabelecimento ali referido, o qual se encontrava aberto ao público. Na parte interior do balcão do estabelecimento encontrou uma máquina ligada à corrente eléctrica mas com o botão em “off”. No local procederam à testagem da máquina, ligando-a, tendo a mesma apresentado o jogo descrito no exame pericial de fls. 41. Denotando isenção, referiu que pese embora da porta de entrada do estabelecimento não se visse a máquina em causa, colocando-se junto ao balcão era a mesma visível. Procedeu então à abertura da máquina arrombando-a, encontrando, no seu interior, a quantia de fls. 15. Com firmeza, mencionou que apreendeu a máquina (confirmando o teor de fls. 11) tendo-lhe aposto o nuipc, sendo que após cada fiscalização deslocam-se até ao Posto onde elaboram o expediente necessário, após o que rumam a outro estabelecimento. Não procedem, pois, a várias fiscalizações seguidas. O militar foi peremptório em afirmar que a máquina apreendida no estabelecimento é a de fls. 41 e seguintes. Usando de espontaneidade, mencionou que não havia qualquer autorização para a máquina em causa se encontrar no estabelecimento, sendo que naquela localidade e com o nome em causa apenas existe este estabelecimento. A factualidade descrita em E) a O) resultou demonstrada com base no cotejo do teor do auto de notícia de fls. 64 e 73, das fotografias de fls. 67, 79 e 80, do auto de apreensão de fls. 66 e 77, dos exames periciais de fls. 124 e 130, dos talões de fls. 68 e 83, do manuscrito de fls. 68 verso, 81 e 82, do depósito de fls. 84 e da cópia do cartão de fls. 105 e 106 com as declarações produzidas pelo militar NC_____ em audiência de discussão e julgamento. Com efeito, o militar da Guarda Nacional Republicana, prestando um depoimento espontâneo e firme, relatou ao tribunal que na data e hora mencionadas a fls. 64 (que confirmou tratar-se da situação em causa nos autos, tanto mais que, conforme o depoente mencionou, apenas nesta ocasião esteve neste local) deslocou-se ao estabelecimento comercial aí indicado no âmbito de uma acção de fiscalização. Identificou-se como sendo militar da Guarda Nacional Republicana, tendo encontrado as duas máquinas que apreendeu (conforme auto de fls. 66), explicitando que a máquina tipo roleta se encontrava sobre o balcão e a outra máquina encontrava-se numa sala cuja porta se encontrava aberta e com mesas e cadeiras dispostas, sem qualquer menção a espaço privado ou inacessível ao público. Por conseguinte, qualquer pessoa poderia aceder ao espaço em questão, embora no momento não estivessem ali clientes. Com firmeza, referiu que a arguida não forneceu os códigos de acesso às máquinas quando solicitada para o efeito, tendo mencionado que era o seu irmão quem tratava das questões das máquinas, tendo o mesmo comparecido no local e contactado telefonicamente uma terceira pessoa que também não forneceu os códigos, tendo a arguida mencionado que o seu irmão não tem qualquer responsabilidade no estabelecimento em causa nos autos. NC_____ acrescentou que procederam ao arrombamento das máquinas tendo encontrado, numa delas, a quantia mencionada no depósito de fls. 84. Espontaneamente, referiu que a arguida não possuía qualquer autorizaço para deter as referidas máquinas, as quais confirmou tratarem-se das que constam a fls. 67, tendo-as identificado logo antes de saírem do estabelecimento com a caneta tipo corretor conforme consta das fotografias de fls. 124 e 130. Usando de determinação, o militar mencionou que fls. 81 e 82 correspondem a manuscritos que se encontravam no interior do balcão junto à caixa, os quais apreendeu por geralmente corresponderem à repartição do lucro obtido com as máquinas. Do cotejo da prova produzida e atento o modo espontâneo, firme e circunstanciado com que os militares da Guarda Nacional Republicana prestaram o seu depoimento, tendo a arguida admitido explorar o estabelecimento à data dos factos (o que aliás é corroborado pelo teor de fls. 69 que o militar NC_____ confirmou ter sido obtido no momento da fiscalização) não tendo pretendido prestar mais declarações a respeito da demais factualidade descrita na acusação, ficou o tribunal convencido da demonstração da factualidade elencada. Refira-se que o nuipc 69/18.1F1EVR corresponde a um inquérito que foi incorporado nos presentes autos por despacho de fls. 59. No que tange às condições sócio-económicas da arguida, o tribunal tomou em consideração as declarações por aquela prestadas por se afigurarem verosímeis, atendendo à forma espontânea e clara com que foram produzidas. Relativamente aos antecedentes criminais, o tribunal valorou o certificado do registo criminal junto aos autos.». *** *** V–Fundamentos de direito: 1–Nulidade prevista nos artigos 374º/2 e 379°/1-a), do CPP: A arguida entende que a sentença recorrida cometeu a nulidade prevista no artigo 374º/2 e 379º/1-a) do CPP mediante três fundamentos distintos, a saber: i- « Quanto aos factos provados A) a U) por referência à Recorrente, nenhuma prova foi produzida que permitisse à decisão recorrida considerá-los, o que origina a nulidade prevista na al. a) do n.º 1 do art.º 379.º do CPP por violação do art.º 374.º, n.º 2 do CPP»; ii- A omissão da análise do facto essencial que é a prova da data da execução dos ficheiros no hardware apreendido (o que não sucedeu) e que permitiria colocar em desenvolvimento os aludidos jogos descritos nos factos provados A) a U), em momento anterior às fiscalizações e apreensões desses mesmos equipamentos, constitui, também ela (omissão), uma outra nulidade, por violação do n.º 2 do art.º 374.º do CPP, constituindo, em simultâneo, erro de julgamento, ou conduzindo à verificação de erro de julgamento». iii- «A Recorrente entende que foi violado (…) o art.º 374, n.º 2 do CPP (…) porque não existe prova concludente de que os equipamentos tenham desenvolvido jogos de fortuna ou azar antes da fiscalização e apreensão e antes da intervenção dos peritos em sede de perícia (nem aqui os equipamentos apresentaram esse género de jogos ou foram sequer identificadas as datas concretas em que o ficheiros responsáveis pelos desenvolvimentos dos mesmos foram executados, porque, conforme já se disse e repetiu os equipamentos não permitem o desenvolvimento desses aludidos jogos).» O artº 374º/2 reporta-se à exigência de fundamentação da sentença, quer de facto quer de direito. Essa falta de motivação, a verificar-se, determina a nulidade da peça, por força do artº 379º/1-a). Falta de fundamentação não se confunde com discordância de fundamentação. A nulidade em apreço acontece, no campo da fundamentação de factos provados, sempre que a sentença não explique, ainda que de forma sintética, os factos e os raciocínios que utilizou como fundamento da aquisição desses factos. A omissão só acontece quando ocorre falta de menção da fundamentação. Esta é, portanto, a questão que urge apreciar. i e iii- O entendimento de que não há prova sobre os factos contidos nos pontos A a U da enumeração dos factos provados, ou sobre se os equipamentos desenvolveram jogos de fortuna e azar antes da fiscalização, nos termos em que o recurso se mostra redigido, está dependente do pedido de reapreciação de prova formulado, sendo que nunca seria fundamento de nulidade de sentença mas, quanto muito de alteração do provado com a consequente reapreciação sobre se ocorreu, ou não, a prática de crime, pois que a sentença contem fundamentação adequada e suficiente à consideração dos factos impugnados como provados. ii- A prova da data da execução dos ficheiros é irrelevante porque o tipo de crime se preenche pela exploração de jogos de fortuna e azar sem licença, exploração essa que se basta à exposição dos referidos jogos para uso dos clientes, independentemente da utilização efectiva que deles tenham feito. O crime consuma-se pela exposição em qualquer estabelecimento, ainda que seja completamente destituído de clientela. Face ao exposto, improcede a questão em apreço. *** 2-Violação do artigo 356°/7 do CPP: A recorrente entende que foi violado o referido normativo porque « As próprias testemunhas e a decisão recorrida reconhecem que a prova resulta, no âmbito da audição daquelas, de conversas obtidas pelas testemunhas no âmbito da fiscalização operada, sem que para isso seja especificado em que qualidade. Ora estas conversas não podem ser reproduzidas em sede de julgamento, uma vez que a Recorrente exerceu o direito ao silêncio, a acrescer o facto de as testemunhas não tomaram conhecimento directo e pessoal com determinados factos, antes receberam informações da Recorrente, que as reproduziram nos autos de notícia, ao mesmo momento em que aquela era Arguida. As testemunhas sobre os factos que lhe foram relatados pela Arguida, falam pela "boca do arguido" o que equivale a dizer que essas passagens não podiam ser valoradas pela decisão recorrida e foram-no, em violação do n.° 7 do art.° 356.° do CPP. » A questão é manifestamente improcedente. Em primeiro lugar a arguida prestou declarações em audiência como consta da respectiva acta. Em segundo lugar não refere a arguida que declarações proibidas foram essas que foram tomadas em consideração em sede de apreciação da prova, o que inviabiliza a análise sobre o assunto. Em terceiro lugar, apreciada a fundamentação da aquisição probatória, dela não consta que tenham sido consideradas quaisquer declarações abrangidas pela referida proibição de prova. *** 3-Impugnação do provado de A) a U) e erro notório na apreciação da prova: A arguida impugna expressamente todo o provado, de A) a U) invocando, à vez, dois institutos jurídicos: o erro notório na apreciação da prova e o disposto no artigo 412º/CPP que define o regime de reapreciação de prova em recurso. Na realidade há duas formas de ataque à matéria de facto: ou pela invocação de vícios ou por um pedido de reapreciação. Os primeiros subordinam-se à disciplina do artº 410º/2, do CPP e a segunda à disciplina do artº 412º/3 e 4 do mesmo diploma. A recorrente invocou erro notório na apreciação da prova e remeteu para o artº 410º/CPP, o que tem que ser entendido apenas na parte da norma respeitante ao vício invocado, ou seja, quanto ao disposto no nº 2 alínea c). Na impugnação restrita (artº 410º/CPP), a apreciação dos vícios atem-se, exclusivamente, à letra da decisão, só por si ou conjugada com regras de experiência comum, não interferindo na análise quaisquer outros dados, ainda que resultantes do julgamento ou documentados nos autos; na situação da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artº 412º/CPP, a apreciação pretendida implica uma reapreciação da prova produzida e documentada, dentro dos condicionalismos legais, aí referidos. No caso, a recorrente estruturou o seu pensamento extravasando do âmbito da literalidade da sentença e alicerçando a impugnação do provado exclusivamente na sua opinião sobre a valoração que deveria ter sido feita da prova produzida, que é discordante daquela que fez o Tribunal recorrido. A recorrente longe de se ater à literalidade da decisão recorrida, estruturou o seu recurso como uma discordância dos factos e da condenação aí contidas e fundamentou-se, essencialmente, numa valoração da prova mediante um descrédito absoluto àquilo que foi o depoimento das testemunhas, que transcreveu. Pretende que os factos sejam todos reapreciados à luz desse descrédito, que provem unicamente de uma discordância sua sobre factos que foram afirmados pelas mesmas. Conclui-se, pois, que a impugnação que deduz não tem cabimento no regime dos vícios de sentença mas apenas poderia ter a ver com um pretenso erro de julgamento, do âmbito exclusivo da reapreciação de prova, regida pelo artº 412º/CPP. Só que a formulação válida de um pedido de reapreciação depende do cumprimento de requisitos de forma e de substância. No que se refere a requisitos formais, o recorrente que queira ver reapreciados determinados pontos da matéria de facto tem que dar cumprimento a um duplo ónus, a saber (artº 412º/3 e 4, do CPP): - Indicar, dos pontos de facto, os que considera incorrectamente julgados – o que só se satisfaz com a indicação individualizada dos factos que constam da decisão, sendo inapta ao preenchimento do ónus a indicação genérica de todos os factos relativos a determinada ocorrência ou, mais ainda, de todos os factos considerados provados; - Indicar, das provas, as que impõem decisão diversa, com a menção concreta das passagens da gravação em que funda a impugnação – o que determina que se identifique qual o meio de prova ou de obtenção de prova que impõe decisão diversa, que decisão se impõe face a esse meio de prova e porque se impõe. Caso o meio de prova tenha sido gravado, a norma exige a indicação do início e termo da gravação e a indicação do ponto preciso da gravação onde se encontra o fundamento da impugnação (as concretas passagens a que se refere o nº 4 do artº 412º/CPP). O que se pretende é a delimitação objectiva do recurso, com a fundamentação da pretensão e o esclarecimento dos objectivos a que o recorrente se propõe. Impõe-se-lhe o dever de tomar posição clara, sobre o objecto do recurso, especificando o que, no âmbito factual, pretende ver reponderado, especificando as provas que devem ser renovadas (alínea c) do nº 3 do artigo 412º/CPP). Apreciados os termos do recurso, logo se percebe que a recorrente jamais ensaiou, sequer, a enunciação dos concretos pontos de facto que considerada incorrectamente julgados. Remete para todos os pontos de factos nos quais se contem toda a factualidade penalmente relevante para a apreciação do mérito da causa, circunstancial e mesmo a relativa às suas condições pessoais, económicas e antecedentes criminais. O que a recorrente pretende é efectivamente retirar da sentença todo e qualquer facto, independentemente da prova produzida, como se o processo se resumisse a uma série de documentos e actos sem qualquer relevância jurídica. Para isso transcreve a pretensa prova produzida, de fio a pavio, desde a identificação das testemunhas até à sua dispensa, como se fosse ónus do Tribunal de recurso procurar nessa produção de prova quaisquer erros ou fundamentos que sirvam o propósito do recurso, que ela se dispensa de fundamentar em termos juridicamente aptos a produzir quaisquer efeitos. Mas, mais do que ónus formais, uma qualquer reapreciação pressupõe que a argumentação aduzida tenha a virtualidade de impor solução distinta daquela que foi acolhida pelo Tribunal recorrido. O recurso da matéria de facto vem concebido pela lei como remédio jurídico e não como instrumento de refinamento jurisprudencial ([3]). Dito de outro modo o recurso da matéria de facto não foi concebido como instrumento ao serviço da realização de novo julgamento, com reapreciação de toda a prova que fundamenta a decisão recorrida, como se o julgamento efectuado na primeira instância não tivesse existido. Trata-se, tão-somente, de um instrumento concebido para a correcção de erros de julgamento e de procedimentos, devidamente discriminados pelas partes ([4]). A intromissão da Relação no domínio factual cingir-se-á a uma intervenção "cirúrgica", no sentido de delimitada, restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correcção, se for caso disso, e apenas na medida do que resultar do filtro da documentação. «O tribunal superior procede então à reanálise dos meios de prova concretamente indicados (ou as questões cuja solução foi impugnada) para concluir pela verificação ou não do erro ou vício de apreciação da prova e daí pela alteração ou não da factualidade apurada (ou da solução dada a determinada questão de direito» ([5]). A doutrina e jurisprudência penais entendem que a reapreciação da prova, na segunda instância, deverá limitar-se a controlar o processo da convicção decisória da primeira instância e da aplicação do princípio da livre apreciação da prova, tomando sempre como ponto de referência a motivação da decisão. Na apreciação do recurso da matéria de facto, o Tribunal de segundo grau vai aferir se a convicção expressa pelo Tribunal recorrido tem suporte adequado naquilo que a gravação da prova (com os demais elementos existentes nos autos) pode exibir perante si e, consequentemente, a Relação só pode alterar a decisão sobre a matéria de facto em casos excepcionais, de falta desse suporte. Assim, a reapreciação só pode determinar alteração à matéria de facto assente se o Tribunal da Relação concluir que os elementos de prova impõem uma decisão diversa e não apenas permitem uma outra decisão. Os condicionamentos ou imposições a observar no caso de recurso de facto, referidos nos nºs 3 e 4 do artigo 412° constituem mera regulamentação, disciplina e adaptação aos objectivos do recurso, já que a Relação não fará um segundo julgamento de facto, mas tão só o reexame dos erros de procedimento ou de julgamento, que tenham sido referidos no recurso e às provas que imponham (e não apenas sugiram ou permitam outra) decisão diversa, indicada pelo recorrente. Ora, a impugnação aduzida tem por fundamento uma reapreciação da prova produzida com recurso exclusivo à valoração que a recorrente faz dos depoimentos das testemunhas, que afirmam os factos que ela vem negar, em verdadeiras argumentações filosóficas porquanto desprovidas de qualquer relação com a prova produzida. Nas transcrições feitas a arguida encontrará resposta às questões que coloca quanto à actuação dos agentes, designadamente quanto à verificação das máquinas, à sua situação, à identidade entre as máquinas apreendidos e as peritadas, aos factos de as máquinas se encontrarem operacionais – um dos agentes até referiu ter utilizado uma delas -, etc. Nos relatórios periciais encontra a resposta às demais questões que coloca, designadamente acerca da forma de funcionamento das máquinas, dos jogos que tinham instalados e que tinham tido instalados (porque foram apagados do disco rígido, mas mantiveram registo informático), do facto de terem sido executados – em datas próximas à apreensão, inclusive, o que se confirma pela existência de dinheiro nas máquinas, na altura dessa apreensão. Nitidamente, a recorrente ignora a prova produzida, a não ser para a descredibilizar, mediante considerações genéricas sem suporte algum no provado. A questão é de mera e pura discordância da valoração probatória feita pelo Tribunal recorrido, sem argumentação que imponha, de qualquer forma, a consideração de que essa valoração violou norma expressa ou não tem suporte na prova produzida. Temos então por assente, que para além de inobservados os ónus formais, a fundamentação exarada pela recorrente não tem a virtualidade de produzir uma alteração do provado, o que determina a manutenção do mesmo, nos precisos termos em que foi decidido. *** No que concerne à existência de erro notório na apreciação da prova a arguida coloca a questão de que, por não se ter visualizado as máquinas em funcionamento, não existir certeza quanto à sua operacionalidade nem quanto ao concreto modo de funcionamento dos jogos. O que está em causa é a pretensa violação de regras sobre prova vinculada, mediante a consideração de que a presunção iuris tantum que a norma atribui aos juízos técnicos inerentes à prova pericial não se aplica, no caso concreto, aos factos descritos no provado, pois que eles (isto é, a descrição do modo de funcionamento das máquinas enquanto máquina que desenvolvem jogos de fortuna e azar ) não resultaram da observação daquelas concretas máquinas em funcionamento, mas de conhecimentos adquiridos pelos peritos face à observação do funcionamento de máquinas em tudo idênticas. Esta invocação pressupõe, desde logo, que se tenha atribuído ao resultado do exame pericial valor probatório vinculado, eximido à livre apreciação do Juiz por força da aplicação do artº 163º/CPP. Conforme consta dos factos provados, as máquinas em causa, finalizado o arranque, apresentavam no menu temáticas de jogos, todos eles de diversão. Contudo, analisados os respectivos discos-rígidos, continham ficheiros que desenvolviam os jogos referidos, nos termos contidos no provado. Não obstante o desconhecimento pelos peritos dos códigos que permitiam a visualização dos mesmos a desenvolverem-se tal não inquina o valor pericial e o provado. A fundamentação relativa ao modo de funcionamento das máquinas remete para os relatórios periciais, o que significa que se acolheram esses juízos técnicos, por sua natureza sujeitos ao valor probatório vinculado, que a lei lhe atribui, em contraposição com o princípio geral de livre apreciação (artºs 163º e 127º/CPP). Os relatórios periciais, para que a fundamentação remete, contêm, entre o mais, a descrição e caracterização das máquinas (na sua aparência e componentes) e a descrição do respectivo funcionamento, a partir das suas características e das características do software que lhes está inserido, capítulo em que se dá conta da falta dos códigos que activam os jogos. A recorrente funda o alegado erro no facto de o perito não ter relatado o funcionamento das máquinas a partir de constatações retiradas da observação delas em efectivo funcionamento. Ora, salvo melhor entendimento, a questão é falaciosa. Não foi pedido um exame à máquina, nem o relatório para que a fundamentação de facto remete se reporta a qualquer exame. Foi pedida uma perícia e o relatório para o qual a fundamentação de facto da sentença remete é precisamente o relativo ao resultado dessa perícia. A diferença é absolutamente determinante: no caso do exame, que é um meio de obtenção de prova, o que se requer é a pura descrição do objecto de prova examinado (em funcionamento, ou não), em resultado da observação presencial feita pelo examinador. Exige-se-lhe que o descreva, fazendo menção dos pormenores captáveis pelos sentidos. No caso de uma perícia, que é ela própria um meio de prova, visa-se a aplicação de especiais conhecimentos técnicos ou científicos a determinado objecto da prova, para que, através dessa avaliação se possa concluir, com elevado grau de certeza, um facto até aí desconhecido. A perícia supõe a aplicação de especiais conhecimentos técnicos ou científicos a um determinado objecto de prova para daí se retirar, com a segurança adequada à exigida aos meios de prova, se determinado facto com relevo para a prática do crime, ocorreu e em que termos ocorreu, para o que é irrelevante saber como foram adquiridos os especiais conhecimentos (se por formação académica, estudo científico, ou outra forma). Porque se trata de um meio de prova fundado em juízos técnico/científicos é-lhe atribuído um valor probatório reforçado. Parte-se do princípio que os conhecimentos técnicos aplicados são de tal modo especiais que não se compadecem com o princípio da livre apreciação da prova. Em consequência, só são susceptíveis de ser arredados, quando rebatidos numa fundamentação suficientemente convincente assente, também ela, em razões da mesma ordem técnica ou científica. Manifestamente o Tribunal recorrido aceitou como bom o resultado da perícia no que se reporta ao funcionamento das máquinas, porque para elas remeteu, sem sequer tentar rebatê-la, ou manifestar divergência quanto aos factos em que se apoiou. E fê-lo de forma que não merece reparo. É que aquilo que foi acolhido na sentença, com base nas perícias, são factos que resultam da aplicação à análise das máquinas dos falados especiais conhecimentos técnicos. Não resultam de nenhuma observação empírica do funcionamento das máquinas, porque aí estaríamos no âmbito do puro exame, aliás num dos casos efectuado por um dos agentes da GNR, conforme consta da transcrição das suas declarações feita pela recorrente, mas, repete-se, do resultado da aplicação de conhecimentos especializados a uma dada realidade de facto, de modo a perceber como ela funciona ou está apta a funcionar. Uma perícia não se limita à descrição do funcionamento de algo conhecido. Porque se baseia na aplicação de conhecimentos técnicos inquestionados a uma dada realidade, nada obsta a que se conclua por determinada forma de funcionamento (no que ao caso interessa) independentemente de o objecto de prova ter sido posto a funcionar ou não. Aliás o interesse da perícia está precisamente na percepção daquilo que, não tendo sido objecto de directa observação, só se pode percepcionar mediante a aplicação de regras de ordem técnica ou científica, fora do alcance do homem comum, a dada realidade de facto. Não se exige, por exemplo, que o perito que elabora um relatório de autópsia, onde se caracterizam determinados golpes de faca, tenha presenciado a forma como eles foram desferidos. O que se lhe pede é que, face ao estado do seu conhecimento científico, descreva aquilo que é viável que tenha acontecido face aos vestígios deixados, esses sim, susceptíveis de análise e estudo. E foi algo semelhante com isso que aconteceu, no caso dos autos. Perante as características das máquinas (e dos respectivos “softwares” inseridos), ou seja, os mecanismos que a compõem, os peritos, mediante a aplicação dos seus especiais conhecimentos técnicos, concluiram que elas funcionavam de determinada maneira, que descreveram. É absolutamente irrelevante ao caso saber se viram, ou não, estas precisas máquinas a funcionar. O que releva é que, face às características observadas nas máquinas e àquilo que são as regras de funcionamento de sistemas com características semelhantes, se concluiu, num juízo puramente pericial, que elas estão aptas a funcionar de determinado modo, que os peritos descreveram. Resta concluir que, tratando-se do resultado de um relatório pericial em que a aquisição probatória feita se reporta aos juízos técnicos formulados relativos ao modo de funcionamento das máquinas, quando activadas pelos códigos correspondentes ao software que têm incorporado, é absolutamente irrelevante alguém tê-las observado em efectivo funcionamento, pelo que a aplicação do valor probatório vinculado a que respeita o artº 163º/CPP está absolutamente justificada. Aliás, a argumentação do recorrente reconduzir-se-ia a que, sempre que apreendida uma máquina sem que se conheçam os códigos activadores do sistema, a averiguação da aptidão para o funcionamento como meio de jogo estava prejudicada porque, ou a máquina não trabalhava sem os ditos códigos, ou, ao substituírem-se os mesmos, se estaria a produzir uma modificação nas máquinas. Assim se descobria a “pólvora” quanto à inviabilização da aquisição de elementos de prova indispensáveis à caracterização dos materiais apreendidos! Não há violação de norma probatória especial e, consequentemente, decai a invocada questão. *** 4–Violação dos artigos 127º do CPP e 108° do DL 422/89: A recorrente entende que há violação das normas supra citadas em decorrência do pedido de reapreciação da prova. Refere ela que «Dúvidas não restam de que os factos que serviram para condenar a Recorrente deverão ser dados como não provados, pois não se pode concluir a sua participação com fundamento nas regras da experiência comum. Estamos, assim, perante uma situação de não verificação do elemento subjectivo do crime de exploração ilícita de jogo, por falta absoluta de prova, existindo apenas ilações e presunções por parte do Tribunal a quo no que a esta matéria diz respeito. Violando, assim, o Tribunal a quo o art.° 127.° do C. P. P., dado que utilizou as regras de experiência comum numa situação em que se encontrava vedada essa possibilidade, - vide neste sentido Acórdão 21/08.5FDCBR.C2, o Acórdão do STJ no 04/2010, entre outros. A douta sentença recorrida violou, assim, as normas constantes dos arts. 127° do C. P. P.; 1.°, 3.°, 4.°, e 108.° do D. L. 422/89, assim como os principio da presunção de inocência do arguido e do "in dubio pro reo".» Na verdade, a pressuposta violação dos normativos invocados, carece de fundamentação. No que concerne à pressuposta violação do princípio da livre apreciação, ele foi devidamente aplicado pois que, conforme a arguida refere, o elemento subjectivo de qualquer crime apenas é susceptível de ser apurado mediante prova indirecta, ou seja, por presunções retiradas dos factos materialmente executados pelo agente. Não há prova directa sobre intenções, vontade ou conhecimento de circunstâncias. O que há é uma apreciação da globalidade dos factos materiais praticados, à luz das regras da experiência comum, que permite ao julgador ter a percepção sobre a existência no agente da vontade de os praticar, da liberdade de acção e do conhecimento da sua contrariedade à lei. Sendo a arguida a proprietária e a pessoa que explorava o estabelecimento, estando as máquinas situadas nesse mesmo estabelecimento, prontas a ser usadas, com dinheiro dentro o que significa que tinha sido efectivamente usadas, não é admissível que a arguida, pessoa a quem não são conhecidas anomalias de capacidade intelectiva, não soubesse do que se tratava, tanto mais que em 2014 já tinha sofrido condenação por idêntico crime. Dir-se-á que decidiu mesmo que o crime compensava. No que concerne à violação do artigo 108º do DL 422/89, a arguida não apresenta qualquer fundamentação, sendo a questão manifestamente improcedente. *** 5–Violação dos princípios da presunção de inocência e do in dubio pro reo: A recorrente fundamenta a questão dizendo que « Na Douta Sentença, menciona-se por diversas vezes em sede de fundamentação a aplicação das regras de experiencia comum, no entanto entende a Recorrente estarem violados os PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E O PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO, dois princípios que andam intimamente ligados entre si e se completam e fundamentam o acima vertido, porquanto em sede de inquérito o titular do mesmo e depois em julgamento, o julgador não entendeu que as máquinas dos autos contivessem jogos de fácil percepção, requisitando os serviços de um perito para que viesse aos autos transmitir para que serviria o objecto apreendido, acaso assim não tivesse sido, nunca a douta decisão recorrida se serviria da perícia para fundamentar ou motivar o funcionamento do equipamento. ». Se bem interpretamos, a questão resume-se a que a fundamentação da aquisição probatória em regras de experiência colide com a necessidade de peritagem das máquinas. A peritagem foi feita e é um meio de prova que não se sujeita à livre apreciação, conforme foi referido. No demais, está por explicar em que termos ocorre tal colisão – que não existe, pois que a sentença usa as duas formas de aquisição probatória em momentos e para factos distintos – e em que termos ela colide com os princípios invocados, extravasando da competência deste Tribunal a apreciação de eventualidades que não correspondam a questões efectivamente colocadas, definidas e fundamentadas. *** VI–Decisão: Acorda-se, pois, negando provimento ao recurso, em manter a decisão recorrida nos seus precisos termos. Custas pelo recorrente, com taxa de justiça de 4 ucs. (Texto processado e integralmente revisto pela relatora). Lisboa, 03/ 12/2020 Maria da Graça dos Santos Silva A. Augusto Lourenço _______________________________________________________ [1] Cf. Germano Marques da Silva, em «Curso de Processo Penal», III, 2ª edição, 2000, pág. 335, e Acs. do S.T.J. de 13/5/1998, em B.M.J. 477-º 263; de 25/6/1998,em B.M.J. 478º-242 e de 3/2/1999, em B.M.J. 477º-271. [2] Cf. Artºs 402º, 403º/1, 410º e 412º, todos do CPP e Ac. do Plenário das Secções do S.T.J., de 19/10/1995, D.R., I – A Série, de 28/12/1995. [3] Cf. Simas Santos e Leal Henriques, em “Recursos em Processo Penal” 7ª edição, actualizada aumentada, 2008, pág. 105. [4] Cf Ac. do TC n 59/206, de 18/01/2006, no proc. 199/2005, em www.tribunalconstitucional.pt, e Acs. dos STJ de 27/01/2009, e de 20/11/2008, tirados respectivamente nos procs. 08P3978 e 08P3269, em www.dgsi.pt, e de 17/05/2007, na CJSTJ, 2007, II, 197. [5] Cf. Ac TC. Nº 59/2006, de 18 de Janeiro de 2006, proferido no processo n° 199/05, da 2.a secção, publicado no DR - II Série, de 13-04-2006.